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INTRODUÇÃO À MECÂNICA ORTODÔNTICA

PROF ALEXANDRE PROTÁSIO | ODONTOPEDIATRIA II

A ortodontia, na prática, é um ajuste oclusal feito às custas de movimentação dentária. Tudo que
envolve movimento, envolve mecânica. No sistema estomatognático, existem as forças naturais, as
forças anormais (que estão relacionadas muitas vezes aos hábitos) e as forças terapêuticas.

As forças naturais são aquelas provenientes dos músculos da mastigação, ou mesmo da interação
entre os dentes; além disso, temos os chamados músculos peribucais, que são os responsáveis pela
motricidade facial, que dissipam uma certa quantidade de força no sistema. Cada dente fica na posição
ideal porque existe uma anulação dessas forças. Por exemplo: a força que a bochecha faz de fora para
dentro de um dente é contraposta à força exercida pela língua de dentro para fora. O contato interproximal
do dente pela mesial e o dente pela distal sobre faz com que as forças se anulem. Se fazermos o
planejamento mantendo os dentes em uma posição onde essas forças se equilibram e se anulam,
conseguimos ter estabilidade. Quando colocamos dentes muito pra fora ou muito pra dentro em relação à
zona neutra, pode haver movimentação. Se isso é feito com um tratamento ortodôntico, ao final do
tratamento temos maiores chances de recidivas.

 Ação dos músculos mastigatórios


 Proveniente dos dentes
 Ação dos músculos peribucais

As forças anormais correspondem aos hábitos, como a interposição lingual, a sucção digital e a
respiração bucal. Na respiração bucal, abrimos a boca e a musculatura da bochecha encosta mais ainda
nos dentes e a língua fica no assoalho (ou seja, tira a língua que toca no céu da boca, que se contraporia a
esse movimento), o que pode gerar desequilíbrio das forças, que gera movimento, como mordida cruzada
posterior.

EQUAÇÃO DE DOCKRELL: causas agindo em épocas sobre tecidos geram resultados. Como
assim? Se temos um paciente com menos de um ano que acabou de amamentar, usa chupeta; dormiu, os
pais vão e tiram a chupeta da criança. O hábito nesse caso tem uma baixa frequência e é usado
pontualmente, o que não terá tanta relevância, especialmente se o uso da chupeta for interrompido bem
cedo, antes dos 2 anos de idade – potencial para desenvolvimento normal.

Causas Épocas Tecidos Resultados

Caso o paciente seja respirador bucal, com hipertrofia de adenoides: as adenoides ficam na região
posterior da orofaringe; dentro da cavidade nasal, temos o septo e os cornetos nasais; atrás da cavidade
nasal, temos o tecido adenoideano, que é um tecido de defesa, um órgão linfocitopoiético. Ele libera
células de defesa para ajudar o indivíduo a se defender na fase inicial da vida dele, onde o sistema
imunológico (imunoglobulinas) ainda não existe ou não foram desenvolvidas. As adenoides existem até os
12 anos de idade, e a partir disso elas involuem. Como o paciente tem hipertrofia de adenoides, elas vão
ocupar um espaço maior na orofaringe, da via aérea superior do paciente. O ar sairia do nariz e cairia na
via aérea superior, mas a orofaringe está ocupada pelas adenoides, então o paciente vai acabar respirando
pela boca. Conduta correta: entrar com medicação e observar. Depois da melhora, é esperado que as vias
aéreas sejam liberadas e o paciente volte a respirar pelo nariz. O paciente que tem rinite etc vive
eternamente com as adenoides hipertrofiadas, as quais vão involuir apenas aos 12 anos. Nesse caso, o
paciente passa pelos surtos de crescimento respirando pela boca – a maxila e face não vão se desenvolver
adequadamente nesse caso.

Causa (respiração bucal) Épocas (longo tempo) Alterou os tecidos


Problemas

Os hábitos levam em conta a tríade: duração, frequência e intensidade.

 Há quanto tempo faz o hábito?


 Quantas horas por dia?
 Qual a intensidade da força muscular envolvida?

Ex: paciente usou chupeta até os 6/7 anos, e quando tirava a chupeta do rosto ficava marca de tanto usar.
Duração longa, frequência alta e intensidade alta = problemas. Todas as vezes que estamos diante de uma
criança onde o pai relata que existe o hábito, temos que fazer essas três perguntas, que vão determinar a
severidade do hábito.

A oclusão traumática e o bruxismo: o bruxismo pode ser fisiológico. 100% das pessoas fazem
bruxismo – na transição entre o sono superficial e o sono profundo, existe um período do sono REN, que
está relacionado ao estado de alguma quantidade de bruxismo (normal de 12 a 15min). O bruxismo se
torna patológico quando o paciente passa a noite toda rangendo os dentes.

As forças terapêuticas são forças usadas para corrigir algum tipo de má oclusão; podem ser
naturais (presentes no próprio presente estomatognático) ou forças biomecânicas (o profissional introduz
no sistema para romper o equilíbrio entre as forças – essa força não precisa ser pesada, precisa ser LEVE!).

Mecânica é a ciência que trata da ação das forças na forma e movimento dos corpos (MOYERS,
1991). Uma força agindo sobre um corpo pode provocar duas coisas: movimento e alteração de forma.
Corpos rígidos tendem a entrar em movimento, corpos flexíveis tendem a deformar. Força = massa x
aceleração. Por que o rosto das pessoas muda? A ação da gravidade vai agindo sobre a pele que não tem
mais tanta rigidez, jogando-a pra baixo.

Força é uma energia ou intensidade desencadeada para provocar movimentos ou induzir mudanças
em um corpo. As forças são grandezas vetoriais (pode ser representada graficamente por vetor), possuem
módulo, direção e sentido. Quanto maior o vetor, maior a força.

 Módulo: intensidade, quantidade


 Direção: vertical, horizontal ou oblíqua

 Sentido: mesial pra distal, distal pra mesial, de frente pra trás etc

1ª LEI DE NEWTON OU LEI DA INÉRCIA: os corpos tendem a permanecer imóveis ou em MRU


(movimento retilíneo uniforme = repouso), se não houver uma força agindo sobre eles ou quando a
resultante das forças que atuam sobre um corpo é nula = EQUILIBRIO.

2ª LEI DE NEWTON: força = massa x aceleração (F r = m.a); uma força resultante produz uma
aceleração que tem a mesma direção e o mesmo sentido da força resultante e suas intensidades são
proporcionais

3ª LEI DE NEWTON: para toda ação existe uma reação equivalente e em sentido oposto. Mesma
intensidade, mesma direção e sentido oposto.

Centro de resistência é o ponto central de massa de um objeto, quando livre de qualquer


influência. Forças atuando no CR de um corpo geram movimentos sem rotação. Corresponde ao centro de
massa de um corpo, é um ponto fixo. O dente não é um corpo
livre, tem raiz e envelope periodontal que cobre parte da sua
estrutura.

 Em dentes unirradiculares, fica entre o 1/3 cervical


e o 1/3 médio da raiz, partindo da crista alveolar;
 Em dentes multirradiculares, fica de 1 a 2mm
abaixo da furca, apicalmente.

Onde o ortodontista trabalha? Cola-se os brackets na coroa.


Como esse dente se move sem rotacionar? Trabalha-se basicamente com movimentos com rotação,
trabalhando fora do centro de resistência. Caso queira fazer uma movimentação sem rotação, forças
conjuntas devem ser utilizadas, chegando a uma força de equilíbrio. Para movimentos de corpo, como
trabalhamos fora do centro de resistência, precisa ser feito a associação de forças; toda vez que colocamos
uma força fora do centro de resistência de um corpo, criamos o centro de rotação.

Centro de rotação (CRot) é o ponto ao redor do qual o corpo gira ou inclina mediante aplicação
de uma força externa. Pode localizar-se entre o centro de resistência (CR) do corpo e o infinito. O corpo
girará ou inclinará, o ponto é variável, pode localizar-se em qualquer lugar, vai depender do ponto de
aplicação.

Momento é quando uma força passa distante do centro de resistência de um corpo, formando
uma tendência a rotação. É a tendência a rotação de um corpo mediante aplicação de uma força fora do
centro de resistência.

FORÇAS TERAPÊUTICAS são forças introduzidas no sistema mastigatório para movimentar dentes,
permitir mudanças na posição mandibular ou afetar a morfologia ou o crescimento das bases ósseas.

 Naturais (amamentação, língua, lábio)


o Amamentação: o individuo trabalha a musculatura, estimulando o crescimento mandibular.
O individuo ao nascer é retrognata e no final do primeiro ano a mandíbula e maxila estão
alinhados, por consequência da amamentação.
o Interposição labial: apinhamento. Quando há certo grau de interposição labial, o lábio
pressiona os incisivos, provocando movimento, jogando-os para trás. Podemos tirar o lábio,
colocando um aparelho PLA (placa lábio-ativa, que tem o objetivo de tirar a pressão do lábio
sobre os incisivos). Tirando o lábio, tirando a força do sentindo vestibular para lingual; a
língua continua fazendo a força no sentido lingual para vestibular, alinhando os dentes que
antes estavam lingualizados. Nesse caso, a própria língua corrigiu os incisivos.
 Biomecânicas (aparelhos ortodônticos)
o Força no sistema, que não estava presente; é o aparelho que vai exercer essa força para
promover a movimentação desejada.
o As forças são leves, exceto quando precisa-se movimentar as bases ósseas, que serão os
movimentos ortopédicos, um pouco mais pesadas.
 Força contínua: introduzida por aparelhos ortodônticos fixos e fios com memória (elásticos – pode
ser amassado e volta a sua forma original), e atua por um longo tempo. Continua acontecendo e
não vai a zero no intervalo entre as consultas ortodônticas.
 Força dissipante ou interrompida: contínua, mas vai descendo dentro de um curto espaço de
tempo; aumento da proliferação celular necessária às mudanças do tecido. O paciente sai do
consultório com a força lá em cima e, gradativamente, essa força vai desativando/dissipando até
chegar a zero; geralmente chega a zero um pouco antes da próxima consulta, na qual será a
ativação. É inicialmente continua, depois vai decrescendo. Estimula a proliferação celular porque,
em geral, entre uma ativação e outra, existe um período de repouso para o osso. A gente pensa
sempre que a força contínua é a melhor para a ortodontia, mas tem maior risco de ter mais danos
ao organismo, então nem sempre é. Com a força dissipante e a estimulação da proliferação celular,
o organismo se refaz diante da agressão.
 Força intermitente: atua por ligeiros impulsos retidos. O aparelho removível, por exemplo, só é
retirado da boca para comer e higienizar. Nesses momentos, a força está em zero; quando
recoloca, a força tem um ápice novamente. Exemplo: aparelhos removíveis, extrabucais, forças
elásticas, força durante a função normal. Para movimentos ortopédicos, forças intermitentes são
melhores que as contínuas, mas para movimentos dentários a força contínua é melhor.
 Suave: 60 a 100g – 1 dente
HUTTLE
 Média: 100 a 120g – grupo de dentes
 Pesada: acima de 200g – bases ósseas. No aparelho extrabucal, inicia-se a ativação com 250g por
lado, e vai subindo gradativamente até chegar a 500g por lado.
 Força ideal: 20 a 25g/cm2 – o que vai determinar a quantidade de força é a área da raiz.
o Capaz de desencadear resposta tissular máxima, sem dor, desconforto ou reabsorção
radicular, mantendo a saúde do ligamento periodontal e do osso alveolar. Deve-se ter
cuidado na aplicação de forças e levar em conta as características individuais de cada
paciente.

MOVIMENTOS ORTODÔNTICOS

1. Inclinação: maior movimentação na coroa. O movimento


acontece em torno de um centro de rotação, dentro da raiz e/ou
próximo do ápice. Quando é aplicada uma força na coroa, o
movimento vai repercurtir na raiz
 Forças leves: 50-75g
 Durante o tratamento ortodôntico, um dente pode ser
inclinado com certas variações em direção vestibulo-lingual
ou mesio-distal. Figura 1 - Inclinação
 O resultado característico de uma inclinação é quase sempre a formação de uma zona
hialinizada ligeiramente abaixo da crista alveolar.

2. Verticalização: semelhante à inclinação, entretanto, nesse caso, a coroa


permanece estática, enquanto a raiz movimenta-se.
 Força entre 75 e 125h
 Este movimento é muito empregado durante o fechamento de
espaços de extração.
Figura 2 - Verticalização
3. Extrusão: movimento fisiológico no qual o dente sai do alvéolo.

4. Intrusão: movimento do dente para dentro do alvéolo; compressão de


grande parte dos ligamentos periodontais e do feixe vásculo nervosos.
Pode haver reabsorção ao redor do ápice. Força de direção oblíqua de
oclusal para apical. O ápice aqui é a área mais pressionada (e pequena),
então pra provocar intrusão a força deve ser leve, pois a área é pequena.
 Força de 08 a 15g

Figura 3 - Intrusão
5. Translação: movimento paralelo ao longo eixo do dente; coroa e raiz
movem-se na mesma direção e ao mesmo tempo. Força passa pelo centro de resistência.
 Força de 100 a 150g
 É como se no momento em que acontece este movimento, o
dente conseguisse se movimentar como um todo, sem
inclinações coronárias ou radiculares. Isso ocorre graças ao
momento de forças criado dentro do slot do brácket, que
anularia o movimento de inclinação que uma força aplicada
distante do centro de resistência causaria.
Figura 4 - Translação
6. Rotação: movimento do dente ao redor do seu longo eixo. Obtém-
se rotação quando aplica-se sobre o dente um binário (uma força
pra lá e uma força pra cá). É de difícil estabilidade. O centro de
resistência bate em cima do centro de rotação.
 Força de 50 a 75g

7. Torque: movimento utilizado para corrigir as inclinações das raízes


no sentido vestíbulo-lingual. Movimento exclusivo da ortodontia fixa, Figura 5 - Rotação
pois depende do contato do fio quadrado com o bracket quadrado
NOTAS:

 Aparelhos removíveis produzem somente movimentos pendulares


 Movimentos ortodônticos mais complexos e delicados estão associados aos
aparelhos fixos, onde o contato entre o fio e os brackets pode propiciar um
melhor controle dos movimentos nos três planos do espaço.

Figura 6 - Torque

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