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1.

INTRODUÇÃO AO DIREITO FISCAL

1.1. Direito Financeiro e Direito Fiscal

As exigências de satisfação das necessidades económicas de carácter público (Educação,


Saúde, Segurança, etç) e de obtenção de meios indispensáveis à respectiva cobertura impõem
ao Estado, e às outras entidades públicas uma actividade económica com características
próprias, a Actividade Financeira1

A actividade financeira, ou dito de outro modo, as finanças públicas, é regulada por um


complexo de normas jurídicas que constituem um ramo de Direito – O Direito Financeiro.

O Direito financeiro, baseado numa ideia de limitação de poderes das entidades públicas,
constitui uma definição juridical dos poderes das entidades públicas na obtenção e no
emprego dos meios económicos destinados à realização dos seus fins2 e define um equilíbrio
entre os interesses patrimoniais do Estado e os dos particulares.

O Direito Financeiro abrange as receitas públicas, as despesas públicas e a sua articulação e


dele são excluídas as receitas de origem privada cujas relações jurídicas são de outros ramos
de Direito.

O Direito Financeiro, ou mais rigorosamente, o Direito Financeiro Público, que tem em vista
acautelar interesses dos particulares por regular a obtenção, a gestão e o dispêndio dos meios
financeiros públicos, com a sua heterogeneidade normativa compreende as seguintes áreas ou
ramos:

 O Direito das Receitas;


 O Direito das Despesas; e

1
Esta temática será desenvolvida no título nº 9.

2
Soares Martinez.

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 O Direito da Administração ou gestão Financeira ou da Administração Fazendária.

Estes ramos, por sua vez, admitem divisões, interessando mais para o nosso estudo, as divisões
relativas ao Direito das Receitas Públicas, onde ganha relevo o Direito dos Impostos, o Direito
Tributário e o Direito Fiscal.

Esquematicamente, vejamos o enquadramento possível do Direito Fiscal:

* Direito das Receitas Patrimoniais

* Dt. das Receitas Públicas * Direito do Crédito Público

* Direito Tributário * Direito Fiscal

Direito Financeiro * Direito das Despesas Públicas * Dt. das taxas e outras contribuições

*Direito da Administração *Direito Orçamental e da


Co Contabilidade Pública

Nb: Dt. = Direito.

Do Direito das Receitas encontramos 3 grandes grupos:

 Direito Patrimonial – é relativo às receitas patrimoniais derivadas do património


mobiliário (receitas provenientes da venda de bens patrimoniais).
 Direito do Crédito Público – Disciplina o recurso aos empréstimos pelas entidades
públicas.
 Direito Tributário – Trata precisamente das receitas coativas.

Do Direito Tributário destaca-se o Direito Fiscal que é relativo ao mais importante sector das
receitas coercivas, de carácter unilateral, que são os impostos.

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Na generalidade da doutrina, a expressão Direito Fiscal é empregue como sinónimo do Direito
Tributário, tratando ambos de estudo de Direito relativo aos impostos, sendo certo porém, que a
expressão Direito Tributário é para alguns autores mais ampla que o Direito Fiscal uma vez que
esta “Direito Fiscal”, designa o direito relativo apenas às receitas provenientes dos impostos e, a
primeira “Direito Tributário”, é mais abrangente incluindo as taxas e outras categorias de receitas
públicas.

O objecto de estudo do Direito Fiscal são as receitas coativas, ou simplesmente, o imposto.

Assim, podemos definir o Direito Fiscal como sendo o conjunto de normas que disciplinam as
relações que se estabelecem entre o Estado e os outros entes públicos, com vista a arrecadação
das receitas públicas.

Mais concretamente, é o conjunto de normas que regulam o imposto em todas as suas fases, isto
é, o conjunto de normas que reflectem a incidência, o lançamento, a liquidação e a cobrança dos
impostos.

1.2.Caracteres essenciais do fenómeno tributário

O imposto pode corresponder a uma Prestação, a uma Relação Jurídica ou a um Instituto Jurídico.

• Imposto como prestação jurídica.


À luz do artigo 70 do Código do IRPS, a liquidação do IRPS deve ser efectuada no ano imediato
àquele a que os rendimentos respeitam, nos seguintes prazos:

a) Até 30 de Abril, do ano seguinte àquele a que respeitam os rendimentos, quando não
compreendidos na Segunda Categoria e nos casos em que tenha havido autoliquidação,
com base na declaração apresentada no prazo referido na alínea a) do n.º 1 do artigo 56;
b) Até ao dia 30 de Maio, com base na declaração apresentada no prazo referido na alínea b)
do n.º 1 do artigo 56 e até 31 de Julho no caso previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo
Quando se preceitua que o imposto deve ser pago até o dia 30 de Abril e/ou de Maio, o termo
imposto ganha a designação de prestação tributária.

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• Imposto como relação jurídica.
Os sujeitos passivos do IRPS, os seus representantes e as pessoas solidárias ou subsidiariamente
responsáveis pelo pagamento do imposto poderão reclamar contra a respectiva liquidação ou
impugná-la nos termos e com os fundamentos estabelecidos no Regulamento do Contencioso das
Contribuições e Impostos e demais legislação aplicável. Artigo 124 do código do IRPS.
Ao se determinar que o sujeito passivo poderá reclamar, tem-se em vista o conceito da relação
jurídica do imposto.

• Imposto como Instituto Jurídico.


À luz do artigo 1 do Código do IRPS, o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares –
IRPS, é um imposto directo que incide sobre o valor global anual dos rendimentos, mesmo
quando provenientes de actos ilícitos.
Ao se afirmar que o IRPS incide sobre o valor anual dos rendimentos, o termo imposto é tido
como Instituto Jurídico.

2. CARACTERÍSTICAS DA RELAÇÃO JURÍDICA DO IMPOSTO


A relação jurídica do imposto tem carácter obrigacional ou creditício, tem por fim a realização de
uma receita pública e não depende de outros vínculos jurídicos, nem determina para o sujeito
activo, respectivo qualquer dever de prestar específico.
Fica assim estabelecido que o imposto não depende de qualquer prestação anterior e nem o seu
pagamento resulta o seu pagamento futuro.
Não dependendo de outros vínculos jurídicos nem determinando para o sujeito activo qualquer
dever de prestar específico, a relação de imposto não implica qualquer contraprestação para as
entidades públicas credoras; nem cria para as entidades públicas, o dever de reembolsar as
prestações tributárias por elas recebidas.
Ora, ao se afirmar que o Estado não tem obrigação de contraprestar, não significa de modo algum
que o Estado não tenha algo a dar ao contribuinte. São tarefas do Estado, velar pela saúde,
educação, defesa da soberania, entre outras. Contudo, o facto de os contribuintes pagarem o
imposto, não significa que o Estado tenha obrigações específicas para cada sujeito passivo, como

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por exemplo, construir uma estrada para cada contribuinte; contratar um médico para cada
contribuinte.

3. FONTES DO DIREITO FISCAL


3.1 Sentido Geral de fonte
Não se estuda nenhuma disciplina da enciclopédia jurídica sem se conhecer e discutir as
respectivas fontes.
O entendimento consagrado é o de que Direito, na acepção técnico-jurídica ou formal, são os
modos de formação e revelação das regras jurídicas, ou seja, as formas do seu aparecimento e
manifestação (Waty, 2007).
Definem-se fontes de direito como o modo de formação e revelação do direito objectivo, isto é,
fontes de direito são os diversos processos de gestação das normas jurídicas.
O processo mais vulgarizado de criação do direito é constituído pela lei (Assis, 1974).

3.2 Fontes de Direito em Geral (Direito Comum)

São fontes de direito em geral:


 A Lei
 O Costume
 A Jurisprudência
 A Doutrina

A lei é o processo de formação ou criação do Direito que se traduz numa declaração solene e
directa da norma jurídica por meio de um órgão competente.

A palavra lei pode ter, para além da aceitação de Direito, os seguintes sentidos:

• Lato, significa toda e qualquer decisão tomada por entidade competente.


• Restrito, para significar apenas os diplomas provindos da Assembleia da República.

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O Costume constitui outro processo de formação do Direito distinto da lei. Define-se e consiste
numa prática social constante, acompanhada do sentimento da obrigatoriedade da norma
correspondente.

A jurisprudência é outra fonte de Direito. Este termo tanto se usa para significar a orientação
geral seguida pelos tribunais no julgamento dos diversos casos concretos da vida real, como para
significar o próprio conjunto das decisões, despachos, sentenças, acórdãos e assentos.

A Doutrina compreende as opiniões ou juízos dos jurisconsultos sobre a regulamentação


adequada das diversas relações sociais.

3.3 Fontes do Direito Fiscal

 A lei;
 Os regulamentos
 As convecções e tratados internacionais

3.3.1 A lei

De acordo com Assis (1974), a mais importante das fontes de Direito Fiscal é a lei formal,
entendendo-se por esta a regra geral e abstracta estabelecida pelo órgão ou órgãos que a que
compete a criação a modificação do sistema jurídico, como função normal, ou seja, o poder
legislativo.

À luz do artigo 100o da Constituição da República, os impostos são criados ou alterados por lei,
que os fixa segundo critérios de justiça social.

O artigo 127 o do dispositivo que temos vindo a citar, estabelece o sistema fiscal e ainda se pode
ver no número 2 que os impostos sao criados ou alterados por lei, que determina a incidência, a
taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuíntes.

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3.3.2 Regulamentos

Segundo Marcelo Caetano, citado por Waty (2007), por regulamento, entende-se o conjunto de
de normas jurídicas de carácter geral e execução permanente emanadas de uma autoridade
administrativa sobre matéria própria da sua competência.

Os regulamentos vertem-se em internos e do poder central. Os regulamentos do poder central


são diplomas expedidos pelo Governo, contendo normas gerais e abstractas e destinadas a
permitir a boa execução das leis.

A sua eficácia está evidentemente subordinada aos preceitos legais em cujo âmbito se devem
manter.

Os regulamentos internos são as ordens ou directivas, sob a forma de despachos, instruções e


circulares, emitidos pelos órgãos superiores da Administração e dirigidos aos seus funcionários
para regularem o funcionamento dos serviços e imporem critérios na interpretação das leis e
regulamentos.

Os regulamentos não são propriamente uma fonte de direito fiscal. Apenas obrigam
disciplinarmente os órgãos administrativos como expressão do poder hierárquico, não se
impondo as suas determinações e critérios aos contribuintes nem aos tribunais. Tem, no entanto,
um certo interesse o seu conhecimento, pois permite prever a actuação do fisco em certos casos
regulados por disposições confusas ou contraditórias (Waty, 2007).

3.3.3 As conveções e tratados internacionais

Uma outra fonte de Direito Fiscal a considerar é constituída pelas convenções internacionais.

As convenções e tratados internacionais fazem parte do Direito Internacional. É o conjunto de


normas que visam as relações entre os Estados soberanos.

Em matéria fiscal, as conveções e tratados internacionais visam evitar a dupla tributacão e


também a evasão fiscal.

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Nos termos da alínea g) do artigo 204o da Constituição da República, compete ao Conselho de
Ministros, preparar a celebração de tratados internacionais e celebrar, ractificar, aderir e
denunciar acordos internacionais, em matérias da sua competência governativa.

Ao abrigo da alínea t) do número 2 do artigo 179o da Constitução, é da exclusiva competência da


Assembléia da República, ractificar e denunciar os tratados internacionais.

3.4 CONCLUSÕES

Importa referir, antes de mais que alguns manuais consideram a jurisprudência como fonte do
Direito Fiscal. Essa tese é discutível, pois os tribunais, normalmente não criam normas jurídicas
através das suas sentenças e seus acórdãos.

O costume define-se como fonte de Direito, mas tal não acontece no campo tributário, pois as
normas não são criadas espontaneamente pelos destinatários.

Em geral pode se dizer que o Direito Fiscal tem uma e única fonte (a nível interno): A Lei. Acima
da lei, é a Constituição da República.

Ora, quando falarmos das fontes de Direito Fiscal, no sentido latu, olhamos para a Constituição e
no sentido strictu sensu, a lei (Aquela que vem da Assembléia da República). A nível externo,
olhamos para os tratados e convenções internacionais.

Os motivos da admissibilidade da lei como fonte exlusiva do direito fiscal é que as demais
normas são tidas como complementares. A lei é fonte por excelência do Direito.

A alínea o) do número 2 do artigo 179 da Constituição da República salienta que é da exlusiva


competência da Assembleia da República, definir as bases da política de impostos e o sistema
fiscal.

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4. NATUREZA JURÍDICA/ ENQUADRAMENTO DO DIREITO FISCAL

A generalidade dos autores é unânime em considerar que o Direito Fiscal enquadra-se no Direito
Público; porque vejamos:

a) Pelo critério dos interesses – o Direito Fiscal destina-se à satisfação das necessidades da
comunidade, as suas normas visam tutelar os interesses da colectividade, daí que as
normas enquadram-se no Direito Público.
b) Pelo critério da posição dos sujeitos da relação – se olharmos para a posição dos
sujeitos na relação jurídico-fiscal em que por um lado encontra-se o Estado ou outro ente
público e, pelo outro, os cidadãos, concluímos facilmente que o Direito Fiscal é sem
dúvida Direito Público na medida em que um dos sujeitos da relação – o Estado – está
num plano superior ao do outro sujeito – o cidadão.

O Direito Fiscal é um ramo do Direito Público porquanto:

• Tutela imediatamente interesses colectivos;


• Nas obrigações tributárias um dos intervenientes é um ente público ou que exerce funções
públicas;
• Nas respectivas relações jurídicas, esses entes públicos surgem em posição de supremacia.

5. ÂMBITO DO DIREITO FISCAL

No Direito Fiscal, como já se disse, em termos largos, integram-se as normas relativas à


incidência e ao procedimento fiscal, isto é, as que disciplinam organizacional e
procedimentalmente o lançamento, a liquidação e a cobrança dos impostos (Waty, 2007).

Ora, não fica aqui esgotado o âmbito do Direito Fiscal, abarcando-se também as normas de
soberania fiscal, de organização de serviços, de fiscalização, de sansãoe as do contecioso
tributário.

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5.1 Normas de soberania fiscal.

Segundo Waty (2007), estas normas definem o poder de tributar, fixam os limites de exigência de
sacrifícios patrimoniais dos particulares pelo poder político.

São aquelas que impõem a obrigatoriedade de todos os cidadãos pagarem o imposto. Estas
normas fazem parte do Direito Constitucional, formando aquilo que se poderá chamar Direito
Constitucional Fiscal.

5.2. Normas qu e regulam o nascimento, desenvolvimento e extinção do vínculo


obrigacional entre o Estado ou outros entes públicos e os cidadãos contribuintes.

Estas normas constituem o núcleo central do Direito Fiscal; disciplinam o nascimento e a


extinção da obrigatoriedade do pagamento do imposto.

5.3 Normas de organização de serviços

São normas de natureza administrativa que cuidam da organização dos serviços do Estado ou de
outros entes públicos com titularidade das receitas fiscais.

5.4 Normas de fiscalização

As normas de fiscalização podem dizer respeito à fiscalização dos contribuíntes e de terceiros e à


fiscalização de serviços. São igualmente de natureza administrativa, e apesar de nao suscitarem
os mesmos problemas que as normas de organização de serviços, por implicarem sujeições para
os contribuíntes, exigem particulares cautelas para o respeito e defesa das liberdades destes
(Waty, 2007).

5.5 Normas de sanção

As normas de sanção destinam-se a penalizar os contribuíntes e terceiros por actos ilícitos que
possam comprometer as operações de lançamento, liquidação e cobrança. Estas normas visam
sancionar o incumprimento ou pagamento tardio do imposto.

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5.6 Normas de contecioso tributário e as que disciplinam a cobrança coerciva das dívidas
tributárias

As normas do contecioso tributário disciplinam os processos conteciosos de impugnação judicial,


de execução fiscal, e os punitivos de contra-ordenação e aduaneiro.

Encontra-se aqui os preceitos respeitantes ao processo fiscal.

5.7 Normas que disciplinam os conflitos internacionais de tributação – Inclui-se aqui o


Direito Internacional Fiscal

6. DIREITO FISCAL MATERIAL E FORMAL

Por reconhecer que as normas que regulam a obrigação e as outras matérias tributárias são de
natureza diferente fala-se de Direito Fiscal material e formal.

Estão no âmbito do Direito Fiscal material as normas que disciplinam a obrigação do imposto.
Estabelecem as regras básicas sobre a colecta do imposto, isto é o principal quadro jurídico do
imposto. Ditam toda a filosofia do imposto.

Integram no Direito Fiscal Material as disposições definidoras dos poderes e deveres fiscais dos
contribuintes e do Estado ou outros entes públicos, isto é, as normas que regulam a existência
orgânica do imposto e as obrigações derivadas da respectiva relação jurídica.

Deste modo, são preceitos do Direito Fiscal Material os do Direito Constitucional Fiscal e os
referentes à incidência, as taxas dos impostos bem como todo o Direito Penal Fiscal.

São do âmbito do Direito Fiscal formal aquelas normas que à administração fiscal cumpre
observar para determinar os elementos da obrigação tributária (lançamento), para fixar o
montante da prestação e para exercer as fiscalizações para evitar ilegalidades e irregularidades,
entre as quais se destaca a evasão fiscal.

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No Direito Fiscal Formal pertencem as normas instrumentais disciplinadoras do processo de
determinação e percepção do imposto e da sua tutela jurisdicional. Cabem no Direito Fiscal
Formal, as normas do processo administrativo de liquidação, a cobrança do imposto e ao
processo declarativo e executivo fiscal.

7. AUTONOMIA DO DIREITO FISCAL

A autonomia dum ramo do saber jurídico não pode entender-se configurado a ideia de isolamento
ou independência em relação aos outros ramos, em termos absolutos, pois nenhum ramo pode
prescindir dos outros.

O Direito Fiscal é uma disciplina autónoma. É uma autonomia relativa e não obsoluta pois,
apesar de possuir seus métodos e objecto de estudo próprios, vezes há em que socorre-se do saber
de outros ramos de direito.

Ex: Uma das formas de o Estado arrecadar as receitas é por via de arrendamento de imóveis. Ora,
as regras usadas são buscadas do direito comum.

8. RELAÇÃO DO DIREITO FISCAL COM OUTRAS DISCIPLINAS

8.1 Direito Fiscal vs Direito Constitucional

O Direito Constitucional é o conjunto de regras jurídicas que regulam a organização política do


Estado e fixa os deveres e direitos fundamentais dos cidadãos. Assegura a proctecção efectiva da
constitucionalidade e dos direitos dos cidadãos. Define as tarefas do Estado, assim como os
grandes objectivos da Governação.

Dentro do Direito Constitucional encontramos as normas do Direito Fiscal.

Não são muitas as normas que constituem o Direito Constitucional Fiscal, isto é, as que se
inserem na Constitucão ou que respeitem os princípios fundamentais da organização tributária
estadual.
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Rigorosamente, em termos específicos, só os artigos 100o e 127o da Constituição da República
são exclusivamente fiscais.

O artigo 35o, embora não seja exclusivo do Direito Fiscal é neste perfilhado por sustentar o
princípio da igualdade jurídica (tributária) dos cidadãos.

8.2 Direito Fiscal e Direito Administrativo

O Direito administrativo é o conjunto de normas que regulam a administração pública. Regulam a


organização e funcionamento da função pública.

As entidades competentes para a cobrança dos impostos são entidades administrativas. Essas
entidades usam, obviamente as normas do Direito Administrativo.

8.3 Direito Fiscal e Direito Privado

O Direito Fiscal socorre-se do Direito Privado. Quando se fala por exemplo dos sujeitos activo e
passivo, credores; devedores; relação obrigação do imposto, está se fazendo o uso de expressões
do Direito privado.

8.4 Direito Fiscal e Direito Internacional

O Direito Internacional é o conjunto de normas que visam as relações entre Estados soberanos.

No caso de Moçambique, o direito internacional verte-se em acordos e tratados internacionais.


Vide alínea g) do artigo 204 da Constituição da República.

Como fruto do incessante convite à cooperação entre Estados, que se manifesta no Direito Fiscal,
assiste-se à celebração de numerosos tratados, convenções, acordos, sendo de destacar as que
visam evitar a dupla tributação internacional ou a evasão fiscal.

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8.5 Direito Fiscal e Direito Processual

Direito processual – Direito que trata da regulamentação de como vamos até tribunal. Conjunto
de normas que regulamentam os nossos direitos em sede de tribunal.
Na relação jurídica tributária, podem surgir situações litigiosas, por exemplo, um sujeito
(passivo) recusar-se de pagar o imposto. Para que seja coagido, recorre-se às leis de direito
processual. O direito processual oferece normas para serem usadas quando houver situações
litigiosas.

9. ACTIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO

9.1 Actividade Financeira

A actividade Financeira pode ser exercida por entes públicos ou privados.

As entidades públicas: Estado; autarquias ou pessoas colectivas de direito público, são as que
exercem actividades tendentes à satisfação das necessidades públicas.

A satisfação de muitas outras necessidades humanas pertecem a actividade económica privada.

É da actividade financeira do Estado e de outros entes públicos que iremos tratar neste capítulo.

A actividade financeira pública é complexa, heterogénea e tem especificidades advindas da


circunstância de as necessidades que visa suprir não se situarem no mesmo plano de livres
opções, nem obedecem às pressões do mercado que requer o equilíbrio entre o custo e a utilidade
económica dos bens e serviços.

9.2 Finanças públicas; necessidades colectivas

Finanças públicas/ Actividade Financeira/ Direito Financeiro – são todas as actividades


económicas do Estado tendentes a acfectar bens à satisfação de necessidades que lhe estão
confiadas.

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Finanças públicas ainda se pode definir como sendo a disciplina que estuda os procedimentos de
angariação dos recursos para a satisfação do Estado.

Quaisquer necessidades são satisfeitas mediante a utilização dos bens.

As necessidades colectivas são caracterizadas pela passsividade do consumo a qual se traduz na


indivisibilidade, inexcluibilidade e irrivalidade.

Exemplo: A prestação dos serviços das FADM (defesa e segurança) é consumida passivamente
por todos os cidadãos. Este serviço é irrival, no sentido de que o seu consumo por um cidadão
não conflitua com o feito pelos outros.

9.3 Actividades Financeira do Estado

O estado desenvolve uma actividade que permite:

 Obtenção de meios económicos que asseguram a satisfação das necessidades colectivas;


 O correcto emprego dos meios obtidos;
 A coordenação entre os meios obtidos e as necessidades públicas a satisfazer.

Esta actividade denomina-se actividade financeira do estado.

Estes meios obtidos pelo Estado e depois usados para a satisfação das necessidades públicas têm
a designação de RECEITAS PÚBLICAS.

Podemos dizer que a receita pública é um recurso patrimonial definitivo obtido, num período
financeiro, pelo Estado, ou outros entes públicos ou com funções públicas, para cobrir
necessidades públicas.

Neste conceito podemos identificar três elementos, de natureza objectiva, subjectiva e


teleológica, a saber:

a) Elementos objectivos: A receita constitui um recurso patrimonial, obtido num determinado


período financeiro. Esta fonte de financiamento da actividade de Estado tem de ser patrimonial,

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isto é, apesar de admissíveis casos de ela poder expressar-se em espécie, é sempre calculada de
forma monetária.

A referência ao período financeiro é importante na medida em que, um determinado fluxo que


constitui-se receita pode, noutro, constituir-se em despesa. Tal será o caso de um empréstimo
público. O período financeiro, já se disse, coincide com o período orçamental, portanto, é de ano
civil.

a) Elemento subjectivo: O elemento subjectivo descobre-se na referência aos possíveis


beneficiários dos recursos: o Estado, em primeiro lugar, outros antes públicos ou com funções
públicas.

c) Elemento teleológico: A finalidade dos recursos orçados tem de ser a satisfação de


necessidades públicas através da cobertura de despesas públicas.

As receitas públicas são geralmente de natureza muito diversa com classificações por vezes muito
complexas.

Para o nosso caso, interessa conhecer as receitas públicas mais frequentes em Moçambique, como
sejam:

 Receitas patrimonias;
 Receitas provenientes das taxas, emolumentos ou outras de natureza similar;
 Receitas provenientes das multas ;
 Receitas provenientes de empréstimos públicos , voluntarios ou forçados, internos ou
externos
 Receitas públicas multilaterais, bilaterais e unilaterais provenientes dos paises
estrangeiros ou organizações não governamentais, a título de donativos ou doações.
 Receitas provenientes dos impostos, que constitui a mais importante receita do Estado.

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10. DESPESA PÚBLICA

É o conjunto dos dispêndios do Estado ou de outra pessoa de direito público, para o


funcionamento dos serviços públicos (a despesa é parte do orçamento, onde se encontram
classificadas todas as autorizações para os gastos => custeio dos diferentes setores da
administração).

A Despesa pública pode ser definida como o encargo do Estado ou outro ente público para
aquisição de bens ou prestação de serviços susceptiveis de satisfazer necessidades públicas.

É a aplicação de certa quantia em dinheiro por parte da autoridade ou do agente público


competente, por autorização legislativa, para execução de fim à cargo do governo. Assim, toda
Despesa Pública pressupõe como elemento essencial, emprego de dinheiro para objetivos
públicos.

A Despesa Pública é uma das fases do fenômeno financeiro do Estado. O conjunto de gastos
efetuados para o atendimento de necessidades públicas É a aplicação de qualquer parcela da
Receita Pública, com o fim de administração e, realizada por funcionário (agente) público.

Para Veiga Filho, Despesa Pública "uso efetivo que o Estado faz de seus bens e recursos, para
ocorrer às necessidades morais e materiais da vida civil e política".

Por fim, afirma Tangorra: Despesa Pública "é a consignação feita da receita pública para o fim de
conseguir um objetivo qualquer da administração".

10.1 Aspectos jurídicos das Despesas Públicas:

 Legalidade da despesa pública (art. 130o da Constituição da República);

 As despesas, quaisquer que sejam, devem ser previamente autorizadas pelo Poder
Legislativo ao Poder Executivo (orçamento público ou créditos adicionais);

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 Em princípio, nenhuma autoridade, sem exceção (entende-se também o Presidente da
República), pode ordenar ou efetuar despesas sem a autorização do Poder Legislativo (ou
acima dos limites ou desviar para fins diversos);
 Crime de responsabilidade (para quem contrariar a regra )

10.2 São requisitos da Despesa Pública:

 Utilidade - atender a uma necessidade pública (deve ser o mais geral possível); vale dizer,
que atenda o maior número possível de pessoas (contribuintes).

 Possibilidade (contributiva do povo) - As Despesas Públicas devem ser compatíveis com


as possibilidades contributivas do contribuinte;

 Discussão Pública - Toda despesa deve ser precedida de discussão. O Poder Executivo
presta ao Poder Legislativo, anualmente, as contas de sua gestão;

 Oportunidade - A Despesa Pública deve ser aplicada no momento certo, oportuno;

 Legalidade - Forma de aplicação da Despesa Pública autorizada pelo poder competente.

10.3 Classificação da Despesa Pública:

10.3.1 Quanto ao tempo ou duração:

Ordinárias - despesas periódicas, frequentes; aquelas previstas no orçamento público.

Exemplo: pagamento de funcionários;

Extraordinárias - despesas imprevistas, eventuais; aquelas não previstas no orçamento público.


Exemplo: compra de vacina contra um surto de doenças.
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10.3.2 Quanto ao lugar:

 Interna - despesas realizadas no país, em dinheiro do país;


 Externa - despesas realizadas fora do país, em moeda forte ou conversível. Exemplo:
pagamento de funcionários a serviço externo;

10.3.3 Quanto a intensidade da necessidade de ser atendida:

Úteis - despesa normal passível de adiamento;

Necessárias - aquelas que são permanentes e que não podem ser adiadas.

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