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TUTORIA UCXII – CENÁRIO 8 • Alterações cutâneas, como prurido, urticária,

exantema, edema generalizado ou localizado.


REAÇÕES TRANFUSIONAIS
CONDUTAS INICIAIS
INTRODUÇÃO
Ao se identificar uma potencial reação adversa à
A transfusão de sangue é um procedimento
transfusão, independentemente de qual tipo seja,
universalmente aceito e com efeitos benéficos
as condutas iniciais são as que se seguem:
comprovados, mas que não é isento de riscos.
• Interromper a transfusão e comunicar ao
As reações adversas à transfusão de sangue
médico assistente;
podem ocorrer mesmo quando o procedimento
• Manter acesso venoso com SF 0,9;
é bem indicado; por esse motivo, é importante
• Conferir as identificações do
que toda a equipe envolvida no processo
hemocomponentes e do receptor e verificar, à
transfusional esteja capacitada, a fim de
beira do leito, se o hemocomponente foi
minimizar os erros relacionados à indicação,
corretamente administrado ao paciente
preparo e instalação dos hemocomponentes, além
indicado;
de identificar e conduzir precocemente e de
forma adequada as reações transfusionais. • Verificar os sinais vitais; se indicado, coletar e
enviar amostras de sangue do paciente junto
Reação transfusional é definida como qualquer com a bolsa e o equipo de transfusão para o
intercorrência que ocorra como consequência serviço de hemoterapia, bem como enviar
da transfusão de sangue, durante ou após a amostras de sangue e ou urina para o
sua administração. laboratório clínico;
• Registrar as ações no prontuário do paciente e
As reações transfusionais podem ser notificar o serviço de hemoterapia.
classificadas de acordo com: o tempo de
aparecimento do quadro clínico ou laboratorial; REAÇÕES TRANSFUSIONAIS IMEDIATAS
a gravidade; o mecanismo fisiopatológico; a IMUNES
correlação com a transfusão (imputabilidade).

REAÇÃO HEMOLÍTICA AGUDA IMUNE (RHAI)

Definição: Reação em que ocorre hemólise


intravascular das hemácias incompatíveis
transfundidas, devido à presença de anticorpos
pré-formados na circulação do paciente. Sua
gravidade e prognóstico estão em grande parte
relacionados ao volume de hemácias infundido
e às características da reação entre antígeno e
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS anticorpo, principalmente quanto à capacidade
desse último de fixar complemento.
Os sinais e sintomas mais comumente
relacionados às reações transfusionais Incidência: Sua incidência, estimada a partir de
imediatas são os seguintes: dados reunidos de estudos de hemovigilância de
vários países, revela taxa de 1:76.000, sendo o
• Febre e/ou calafrios; número de mortes relacionadas a esse tipo de
• Náuseas, com ou sem vômitos; reação de 1:1.800.000 de unidades transfundidas.
• Dor no local da infusão, e dor na região
Etiologia: A principal causa é atribuída a erros
torácica ou lombar;
de identificação do receptor ou das amostras
• Alterações agudas da pressão arterial:
coletadas para os testes pré-transfusionais.
hipotensão ou hipertensão;
Causada pela ação de anticorpos presentes no
• Alterações respiratórias, como dispneia,
receptor que interagem com antígenos do
taquipneia, hipóxia, sibilos;
doador. As principais reações estão relacionadas
à transfusão de hemácias ABO incompatíveis, e dímeros D), função renal e hemograma
mas também pode acontecer com a transfusão de com contagem de plaquetas;
plasma ABO incompatível, caso o doador • A análise do esfregaço de sangue periférico
apresente altos títulos de anticorpos ABO. pode mostrar hemácias fragmentadas e
Anticorpos anti-Lea, com amplitude térmica, esferócitos;
anti-vel, anti-PP1 e anti-P1, também podem • Uma vez identificada a RHAI, infundir
estar implicados nesse tipo de reação. solução cristaloide com o intuito de manter
Anticorpos da classe IgM e algumas subclasses de uma diurese de 100 mL/h por, pelo menos,
IgG (IgG4 não fixa complemento), especialmente 18 a 24 horas. Observação: A administração
em altos títulos, são fortes ativadores de de diuréticos pode ser recomendada, bem
complemento e podem ativar C3a e C5a e como o uso de aminas vasoativas, em caso de
promover a liberação de histamina e serotonina hipotensão refratária a volume;
dos mastócitos, levando à vasodilatação e • O tratamento da CIVD pode requerer a
contração da musculatura lisa, especialmente transfusão de concentrado de plaquetas,
de brônquios e trato gastrointestinal. Também plasma e, eventualmente, crioprecipitado,
ocorre a liberação de citocinas, leucotrienos, fator além de outras medidas específicas.
de necrose tumoral (TNF-α), radicais livres e óxido
nítrico, com efeitos clínicos variáveis. Esse Prevenção: Identificação ativa do paciente e
processo de fixação de complemento resulta na conferência de seus dados pessoais no
formação de um “poro” na membrana das momento da coleta da amostra pré-
hemácias, seguida do extravasamento de seu transfusional e no momento da instalação do
conteúdo (hemólise intravascular). Em hemocomponente. Também deve ser feita a
consequência, haveria aumento dos níveis de conferência com os dados da bolsa e da
hemoglobina livre (hemoglobinemia), que, por requisição de transfusão/prescrição. Além disso,
sua vez, seria filtrada pelos glomérulos, podendo outros cuidados recomendados são infusão lenta
ser detectada na urina (hemoglobinúria). dos primeiros 50 mL da transfusão e
monitoramento dos sinais vitais e de possíveis
Quadro Clínico e Diagnóstico: O paciente pode queixas.
apresentar dores torácica, lombar e/ou no local
da punção, febre e/ou calafrios, mal-estar, Observação: Durante a transfusão, no caso de
náusea e vômitos, hipotensão grave, pacientes anestesiados ou inconscientes, devem
ansiedade, inquietação e sensação de morte ser monitorados o volume e a coloração da
iminente. Além do quadro clínico, os achados diurese, uma vez que, nessa situação, a ausência
laboratoriais evidenciam provas de hemólise de sintomas pode retardar o diagnóstico.
positivas (teste direto da antiglobulina positivo
REAÇÃO FEBRIL NÃO HEMOLÍTICA (RFNH)
[TDA], queda de hemoglobina e hematócrito,
hemoglobinúria e haptoglobina diminuída; mais Definição: Caracterizada como o aumento da
tardiamente, pode-se observar elevação da temperatura corporal em 1°C ou mais, com ou
desidrogenase lática e da bilirrubina indireta). O sem calafrios, sensação de frio e desconforto,
paciente pode cursar com alteração da função que ocorre durante ou até 24 horas após o
renal e das provas de coagulação. início da transfusão, sem outros motivos
associados. É a reação adversa à transfusão
Tratamento:
mais comumente descrita na literatura.
• Deve-se interromper a transfusão e manter Incidência: Varia de 0,33% a 6% para
o acesso venoso com solução salina;
transfusões de concentrados de hemácias não
• Conferir a identificação da bolsa e do leucorreduzidos, e de 0,11% a 0,5% para
receptor (número e ABO/Rh da bolsa, e nome, hemácias leucorreduzidas. Para concentrados
registro e ABO/Rh do paciente) para de plaquetas não leucorreduzidos, a incidência
evidenciar possível troca de amostra/paciente; pode variar de 1,7% a 38%. Reações recorrentes
• Colher sangue da bolsa e do paciente para podem ocorrer nesses pacientes e, nessas
a realização de hemocultura (para descartar situações, justifica-se a pesquisa de anticorpos
contaminação bacteriana dos HLA.
hemocomponentes);
• Enviar a bolsa de sangue e amostra do Etiologia: Há dois mecanismos etiológicos
receptor para realização de exames imuno- envolvidos e, em ambos, a presença dos
hematológicos (tipagem sanguínea, PAI e leucócitos nos hemocomponentes é condição
TDA). Colher exames para avaliação de fundamental: (1) Presença de citocinas pró-
hemólise (LDH, bilirrubinas, haptoglobina), inflamatórias e interleucinas nos componentes
hemostasia (TP, TTPa, TT, fibrinogênio, PDF celulares que são liberadas pelos leucócitos
residuais; (2) Presença de anticorpos
antileucocitários, no paciente, que interagem com
antígenos do doador, como, por exemplo, da usualmente presente no plasma do doador.
classe HLA, levando à formação do complexo Mastócitos são ativados, resultando na sua
antígeno-anticorpo, ativação do complemento e degranulação e liberação de histamina pré-
liberação de pirógenos endógenos. formada, fatores quimiotáticos, proteases e
proteoglicanos. Além disso, ocorre a liberação de
Quadro Clínico e Diagnóstico: A RFNH ocorre metabólitos do ácido araquidônico, leucotrienos,
no momento da transfusão ou até 24 horas prostaglandina D2 e fator ativador de plaquetas.
após a instalação do hemocomponente. O
paciente pode cursar com febre (t > 38°C) Quadro Clínico e Diagnóstico: A maioria das
associada à elevação de pelo menos 1°C da manifestações é de comprometimento cutâneo e
temperatura inicial, tremor e/ou calafrios. O pode cursar com eritema cutâneo, prurido,
quadro é benigno e autolimitado, porém justifica- pápulas, exantema, urticária, e edema
se a coleta de microbiológico e provas palpebral. A intensidade das lesões pode ser de
imunohematológicas se houver dúvida entre a leve a grave, com acometimento de vias aéreas
possibilidade de contaminação bacteriana e superiores e/ou inferiores. Os pacientes podem
reação hemolítica aguda. Observação: queixar-se ou apresentar edema de laringe,
Normalmente, não acontece no início da tosse, rouquidão, estridor laríngeo e sensação
transfusão porque o aparecimento dos sinais e de aperto na garganta ou sibilos, sensação de
sintomas está relacionado com a quantidade de aperto torácico, dor subesternal, dispneia,
leucócitos e/ou citocinas que o receptor recebeu. ansiedade ou cianose. Os pacientes também
podem apresentar manifestações
Tratamento: Interromper a transfusão e manter gastrintestinais, que incluem náuseas, vômitos,
o acesso com solução salina SF 0,9%. O uso de dor abdominal e diarreia.
antitérmicos e/ou meperidina é recomendado
para o alívio dos sintomas. O hemocomponente Classificação:
envolvido deve ser descartado e, depois que o
paciente se restabelecer, novo • Reação alérgica: lesões cutâneas, que
hemocomponente pode ser instalado. podem variar desde pápulas pruriginosas,
placas eritematosas e elevadas e ou
Prevenção: Pelo fato de as RFNH serem vermelhidão da pele;
condições autolimitadas e benignas, o uso de pré- • Reação anafilactoide: lesões de pele
medicações (como antitérmicos e/ou meperidina) combinadas aos sintomas de hipotensão e
em pacientes sem história prévia de reações comprometimento de vias aéreas;
não está justificado. Após dois ou mais • Reação anafilática: sintomas semelhantes ao
episódios de RFNH, ou após o primeiro, se ele for da reação anafilactoide, porém com
considerado grave, é indicada a transfusão de hipotensão e perda da consciência, e de difícil
hemocomponentes celulares leucorreduzidos. manejo.
Observação: O seu uso reduz a quantidade de
leucócitos para menos que 5x106 /unidade, Tratamento: A maioria das reações alérgicas é
minimizando ou eliminando as reações. considerada benigna e pode cessar após a
interrupção do hemocomponente. Caso a
REAÇÕES ALÉRGICAS reação persista, pode ser administrado anti-
histamínico VO ou IV e, em algumas situações,
Definição: Aparecimento de reação de
pode ser necessário o uso de corticoide. Se os
hipersensibilidade durante a transfusão ou até
sintomas cessarem, e a reação tiver sido
24 horas após o seu início. Em geral, é benigna
considerada leve, a unidade de
e autolimitada, mas pode ser grave,
hemocomponente pode ser REINSTALADA.
principalmente quando houver comprometimento
Observação: Se as lesões cutâneas forem
respiratório ou circulatório.
extensas ou houver comprometimento de vias
Incidência: A frequência das reações alérgicas aéreas, hipotensão ou sintomas gastrointestinais,
corresponde a 1% a 3% das transfusões, pode ser necessário o uso de corticoide,
podendo representar até 30% das reações adrenalina, reposição com solução fisiológica
transfusionais. Pápulas e urticária são 0,9% e/ou suplementação de oxigênio. Nessas
relativamente comuns, enquanto reações situações, o hemocomponente não deve ser
anafilactoides e anafiláticas são bem menos reinstalado.
frequentes, tendo uma frequência de 1:20.000 a
Prevenção: Em pacientes com episódios
1:50.000 transfusões.
frequentes de reação alérgica, ou mesmo único,
Etiologia: Causada pela presença, no receptor, de mas grave, pode ser administrada medicação
anticorpos contra proteínas plasmáticas do anti-histamínica profilática 30 minutos antes da
doador. Anticorpos pré-formados (geralmente da transfusão. Caso a medicação não evite a
classe IgE) no receptor interagem com o alérgeno, ocorrência de reação alérgica, pode-se optar pela
lavagem com solução fisiológica do após o término da transfusão de um
hemocomponente celular, a fim de remover o hemocomponente. O paciente pode apresentar
plasma nele contido. Observação: No caso de desde dispneia até insuficiência respiratória
concentrado de plaquetas, a lavagem somente aguda, associada ou não a febre, tremores,
estaria indicada em reações graves, já que ela hipotensão arterial e taquicardia. A pressão
reduz consideravelmente a eficácia transfusional. venosa central é normal, bem como a dosagem
Recomenda-se pesquisar a presença de IgA e de BNP (peptídeo natriurético cerebral), já que o
anti-IgA no paciente e, quando se identificar mecanismo fisiopatológico é explicado pelo
receptor deficiente de IgA, deve-se transfundir, se aumento da permeabilidade capilar. Observação:
disponível, hemocomponentes de doadores Quando o suporte ventilatório é prontamente
também deficientes de IgA, ou então transfundir instituído, 80% dos pacientes evoluem com
produtos celulares lavados, como acima melhora clínica em 48 a 96 horas.
mencionado.
Tratamento: Baseia-se somente no suporte
LESÃO PULMONAR AGUDA RELACIONADA À clínico e respiratório, de forma rápida e eficaz
TRANSFUSÃO (TRALI) diante do quadro clínico do paciente. A maior parte
dos pacientes necessita de oxigênio e, em
Definição: Lesão pulmonar aguda que se inicia algumas situações é necessária a intubação
durante ou até seis horas após o término da orotraqueal e ventilação mecânica.
transfusão de um hemocomponente.
Representada por quadro de hipoxemia aguda, Prevenção: Caso sejam identificados
com edema pulmonar bilateral e ausência de anticorpos (anti-HLA ou antineutrófilos) no
hipertensão arterial esquerda. paciente, recomenda-se o uso de filtros de
leucorredução em produtos celulares que o
Incidência: Não se sabe a real incidência de paciente venha receber. Quando os anticorpos
TRALI, por ser uma reação ainda identificados estão presentes no doador, não
subdiagnosticada devido à dificuldade de sua são necessárias medidas específicas com o
identificação, mas estima-se que varia entre paciente. Entretanto, sugerem-se algumas
1/1.300 a 1/5.000 transfusões. medidas a serem tomadas com o doador:
Etiologia: Em 70% dos casos, esse quadro é
• Excluir doadores cujo sangue tenha estado
atribuído à existência de anticorpos
envolvido em casos de TRALI (doadores
antileucocitários no plasma do doador. Esses
implicados e/ou associados a m ltiplos eventos
anticorpos são dirigidos contra antígenos do
de RALI) ou, pelo menos, não fazer uso
sistema HLA (classe I ou II) ou contra antígenos clínico de seu plasma;
presentes nos neutrófilos. Em 5% a 20% das
• Não utilizar plasma de doadoras que já
ocorrências, o anticorpo implicado está
tiveram gestação ou submeter seu sangue
presente no próprio paciente. No restante dos
à pesquisa de anticorpos anti-HLA e
casos, a minoria, portanto, não se identificam
anticorpos antineutrófilos antes da sua
anticorpos nem no doador nem no receptor.
utilização;
Acredita-se que, para que ocorra essa reação, • Remover o plasma do hemocomponente
seriam necessários alguns eventos adicionais, quando se tratar de doação específica e
o que justificaria a maior frequência de TRALI em não houver outro doador disponível para o
pacientes de maior gravidade clínica: (1) Lesão ou receptor em questão.
estresse pulmonar subjacente, resultado de
sequestro de polimorfonucleares nos pulmões,
como acontece nos quadros de sepse, pneumonia,
queimaduras e CIVD; e (2) Infusão de lípides
e/ou citocinas presentes no plasma do doador
ou no hemocomponente, que lesariam os
leucócitos sequestrados, resultando em lesão
endotelial e síndrome de extravasamento capilar.

Quadro Clínico e Diagnóstico: É


essencialmente clínico e de exclusão, porém a
identificação de anticorpos anti-HLA (classe I
ou II) ou antineutrófilos no doador ou no
receptor reforça o diagnóstico, da mesma forma
que a presença de uma reação linfocitária cruzada
positiva entre o soro do doador e os linfócitos do
paciente. O quadro consiste na manifestação de
sintomas respiratórios durante ou até seis horas

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