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MUNICÍPIO: Dom Joaquim

INTERESSADO: Hugo Renan do Carmo Celestino – Assessor de Gabinete

ASSUNTO: Dívida tributária – Termo de Confissão de Dívida – Parcelamento –


Natureza - Considerações.

CONSULTA

O Assessor de Gabinete Hugo Renan do Carmo Celestino encaminhou,


para exame desta Consultoria, uma série de documentos relacionados ao débito
tributário do contribuinte Euclydes Ferreira Filho, que teria protocolizado perante a
Administração Pública Municipal pedido de parcelamento.

O Consulente nos informou que, apesar do pedido de parcelamento,


ainda não houve assinatura do Termo de Confissão de Débito – TCD, de modo que
indaga-se se a rubrica do TCD seria requisito indispensável à formalização do acordo.

Salienta-se que toda a legislação correlata foi encaminhada pelo


Consulente, em especial a Lei Municipal nº 708/99, que “Consolida a Legislação
Tributária Municipal e contém outras providências”.

Ante o exposto, passa-se ao exame do objeto da consulta.

PARECER

Antes de adentrar a algumas questões fáticas que envolvem a presente


circunstância, deve-se, preambularmente, efetuar algumas ponderações que serão
úteis na resolução quanto às dúvidas que ensejaram esta consulta.

O Poder Constituinte de 1988, a fim de moralizar a iniciativa pública,


instituiu diversos princípios regimentais da Administração. Dentre estes, incluem-se os
postulados da legalidade administrativa, pelos quais o administrador deve estar sempre
adstrito à vontade da lei.

Para se compreender com maior exatidão todo o enredo, cabe


estabelecer um breve cotejo entre a legalidade no âmbito privado e a legalidade
administrativa.

Acerca da legalidade privada, o artigo 5º, II, da Constituição Federal


expõe que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei”. Trata-se da vertente negativa, também conhecida como o subprincípio
da primazia da lei, donde prevalece a máxima “o que não é proibido é permitido”.

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Todavia, a legalidade administrativa não pode ser vista somente pelo
subprincípio da primazia da lei. Isto, porque o artigo 37, caput, do texto constitucional
vem a consagrar aquilo que os doutrinadores denominam como sendo o subprincípio
da reserva legal, que tutela que os atos praticados pela administração estão restritos a
uma prévia determinação legislativa.

Assim, o princípio da legalidade administrativa nada mais é do que uma


conjunção entre o subprincípio da primazia da lei (art. 5º, II) e o da reserva legal (art.
37, caput). Em logicidade, não pode o administrador público contrariar ou até mesmo
extrapolar os limites legais.

Imperioso trazer aqui as lições de Alexandre Mazza 1:

“A doutrina europeia costuma desdobrar o conteúdo da legalidade em duas


dimensões fundamentais ou subprincípios: a) princípio da primazia da lei; e
b) princípio da reserva legal.
O princípio da primazia da lei, ou legalidade em sentido negativo, enuncia
que os atos administrativos não podem contrariar a lei. Trata -se de uma
consequência da posição de superioridade que, no ordenamento, a lei
ocupa em relação ao ato administrativo. Quanto ao princípio da reserva
legal, ou legalidade em sentido positivo, preceitua que os atos
administrativos só podem ser praticados mediante autorização legal,
disciplinando temas anteriormente regulados pelo legislador. Não
basta não contradizer a lei. O ato administrativo deve ser expedido
secundum legem. A reserva legal reforça o entendimento de que
somente a lei pode inovar originariamente na ordem jurídica”. (g.n.).

Estes esclarecimentos introdutórios são primaciais para que se esclareça


que toda a atuação do Poder Público Municipal está adstrita à legislação vigente, não
podendo a Administração extrapolar tais limites.

No que tange aos tributos, a Constituição de 1988, a fim de preservar o


pacto federativo, distribuiu a capacidade de tributar entre cada ente federado, levando
em consideração a natureza do tributo, a espécie, bem como o seu fato gerador.

Especificamente quanto aos municípios, a Carta Republicana dispôs:

“Art. 30. Compete aos Municípios:


(…)
III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como
aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas
e publicar balancetes nos prazos fixados em lei” (g.n.).

Os tributos, em sentido amplo, englobam os impostos, as taxas e as


contribuições de melhoria.

Ciente disso, é preciso esclarecer que o Código Tributário Nacional


reserva o Título II para tratar das obrigações tributárias, merecendo especial enfoque o
artigo 119, que define sujeito ativo da obrigação como “a pessoa jurídica de direito
1
MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo, 2ª ed. Saraiva. São Paulo: 2012.
2
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público, titular da competência para exigir o seu cumprimento”, sendo que o sujeito
passivo é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, a teor
do que dispõe o artigo 121. Dessa relação existente entre ente arrecadador e
contribuinte exsurge o crédito tributário, nos termos dos seguintes dispositivos do CTN:
“Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma
natureza desta.
Art. 140. As circunstâncias que modificam o crédito tributário, sua extensão
ou seus efeitos, ou as garantias ou os privilégios a ele atribuídos, ou que
excluem sua exigibilidade não afetam a obrigação tributária que lhe deu
origem.
Art. 141. O crédito tributário regularmente constituído somente se modifica
ou extingue, ou tem sua exigibilidade suspensa ou excluída, nos casos
previstos nesta Lei, fora dos quais não podem ser dispensadas, sob pena
de responsabilidade funcional na forma da lei, a sua efetivação ou as
respectivas garantias”.

Cabe-nos ressaltar, a princípio, as diferenças entre extinção, exclusão e


suspensão do crédito tributário. Nas palavras de Ricardo Alexandre 2, “excluir o crédito
tributário significa impedir a sua constituição. Trata-se de situações em que, não
obstante a ocorrência do fato gerador e o consequente nascimento da obrigação
tributária, não pode haver lançamento, de forma que não surgirá o crédito tributário,
não existindo, portanto, obrigação de pagamento”.

A princípio, a exclusão impede a constituição do crédito tributário em si,


diferentemente do que ocorre na hipótese de extinção, na qual o crédito pode ser
constituído, mas por algum motivo perderá sua exigibilidade. A principal causa extintiva
do crédito tributário é o próprio pagamento, conforme prevê o artigo 156, I, do CTN.

Por sua vez, as hipóteses de suspensão não encerram a exigibilidade do


crédito tributário em si, isto é, o crédito constituído continua a ser exigível. Tampouco
há que se falar em encerramento de sua exigibilidade, pois o devedor tributário
continua a ser responsável pela dívida, que continua a existir. A principal hipótese de
suspensão do crédito tributário é o parcelamento, a teor do que dispõe o artigo 151, VI,
do CTN:

“Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:


(...)
VI – o parcelamento”

Segundo Ricardo Alexandre, “o parcelamento consiste numa medida de


política fiscal com a qual o Estado procura recuperar créditos e criar condições práticas
para que os contribuintes que se colocaram numa situação de inadimplência tenham a
possibilidade de voltar para a regularidade, usufruindo os benefícios daí decorrentes”.

Segundo o artigo 155-A do CTN, o parcelamento será concedido na forma


e condição estabelecidas em lei específica. A lei específica reclamada pelo dispositivo

2
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário – 11 ed. Ver. Atual. E ampl. – Salvador – Ed Juspodivm, 2017.
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é a própria lei do membro da federação. Em outras palavras, teremos de examinar com
afinco a legislação do Município de Dom Joaquim.

Tal tema ficou a cargo da Lei Municipal nº 708/1999, que “Consolida a


Legislação Tributária Municipal e contém outras providências”. A lei em questão
disciplina pormenorizadamente o instituto do parcelamento do crédito tributário,
disciplinando o seguinte:

“Art. 56 - Os créditos tributários e fiscais, inclusive os denunciados


espontaneamente pelo contribuinte, poderão ser parcelados em até 48
(quarenta e oito) parcelas mensais e consecutivas, com incidência de juros
e atualização monetária, na forma regulamentar.
§ 1º - O pedido de parcelamento será acompanhado de Termo de
Confissão de Débito, implicando na confissão irretratável do débito e a
expressa renúncia ou desistência de qualquer recurso ou ação, nas
áreas administrativas ou judicial.
§ 2º - O crédito tributário decorrente da denúncia espontânea de
tributo, cuja forma de lançamento é por homologação, se não
cumprido integralmente o parcelamento, será inscrito em Dívida Ativa
independente de qualquer ato homologatório ou autuação.” (g.n.)

Como se vê, segundo a dogmática da Lei Municipal nº 708/1999, é


imprescindível a assinatura do Termo de Confissão de Débito para que haja,
efetivamente, o parcelamento do crédito tributário. Em outras palavras, a assinatura do
Termo de Confissão de Débito – TCD é conditio sine qua non para que haja o
parcelamento.

Com o adequado parcelamento e a correta assinatura do Termo de


Confissão de Débito, o contribuinte deixa de estar em situação de inadimplência com a
Administração Tributária. Isso não significa dizer, entretanto, que não exista mais
nenhuma dívida, pois basta o não pagamento de uma única parcela, que o restante do
crédito poderá ser inscrito em dívida ativa. Novamente há que se recordar: estamos
diante de uma situação de suspensão do crédito tributário, e não de extinção.

Assinado o Termo de Confissão de Débito – TCD, as relações tributárias


acessórias, como é o caso, por exemplo, da expedição de alvará, será possível.
Entretanto, basta que uma parcela deixe de ser paga, para que o Município de Dom
Joaquim possa adotar medidas cabíveis, como, por exemplo, efetuar a inscrição em
dívida ativa.

Atendo-se ao caso concreto, a teor do que exige o artigo 56 da Lei


Municipal nº 708/1999, é indispensável que o contribuinte assine o Termo de Confissão
de Débito – TCD, tendo em vista que tal medida é imperativa ao parcelamento, e a
consequente suspensão do crédito tributário.

Por fim, o pagamento da última parcela, sem que haja nenhuma


pendência, fará com que o crédito tributário deixe de ser suspenso, e passe a ser
considerado extinto, conforme previsto no artigo 156, I, do Código Tributário Nacional.

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CONCLUSÃO

Diante do exposto, considerando as razões acima alinhadas, é de se


chegar às seguintes conclusões:

a) o parcelamento é hipótese de suspensão do crédito tributário, e sua realização


faz com que o contribuinte, caso esteja em dia com cada parcela, deixe de ser
reconhecido como inadimplente para todos os efeitos, o que não significa dizer
que a dívida deixe de existir;

b) de acordo com o artigo 56 da Lei Municipal nº 708/1999, para que haja o


parcelamento do crédito tributário, é indispensável a assinatura do Termo de
Confissão de Débito – TCD. Sem a assinatura do TCD, o contribuinte continuará
em situação irregular perante a Administração Tributária;

c) com o pagamento da última parcela sem que haja qualquer outra pendência
relativa ao débito, haverá a extinção do crédito tributário, nos termos do artigo
156, I, do CTN.

É o nosso entendimento, s.m.j.

Belo Horizonte, 28 de novembro de 2022.

Pedro Victor Piassi Franco


OAB/MG nº 161.620

PEDRO VICTOR PEDRO VICTOR PIASSI


PIASSI FRANCO:11000037622
OAB/MG 161.620
FRANCO:110000376
22 2022.11.30 16:08:11-03'00'

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