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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIOS DOS SINOS

DJULIE WIELICZKO

O filme escolhido para compor esse trabalho foi “The Help” traduzido para o português
como “Histórias Cruzadas”. Tal tema é de suma importância para a nossa formação enquanto
psicologos, Bento (2003, p. 1) traz que “No Brasil, o branqueamento é freqüentemente
considerado como um problema do negro que, descontente e desconfortável com sua
condição de negro, procura identificar-se como branco, miscigenar-se com ele para diluir
suas características raciais.”, nesse viés é importante que nós como psicólogos estudemos
sobre o tema para poder dar o suporte necessário a todas pessoas de diferentes raças,
compreendendo que elas já tem uma trajetória que provavelmente será diferente a partir do
momento que estão inseridas no mundo de relações sociais.
Para nossa formação da psicologia levar em conta a cor da pessoa é além de querer
enquadrar ela numa “caixa”, mas sim compreender que os processos de subjetivação daquelas
pessoas serão diferentes dos nossos como pessoas brancas, para assim conseguirmos
qualificar mais a nossa escuta e entender mais sobre o local que transitam esses corpos.
Um trecho que me chamou atenção do filme é quando Eugenia vai procurar as domésticas
para falarem sobre suas trajetórias, e Aibileen questiona se ela não gostar do que vai ouvir,
Skeeter lhe diz “isso não se trata de mim, não importa como eu me sinto”, nesse sentido,
Bento (2003, p. 3)
“No campo da teoria da discriminação como interesse, a noção de privilégio é essencial. A discriminação

racial teria como motor a manutenção e a conquista de privilégios de um grupo sobre outro,

independentemente do fato de ser intencional ou apoiada em preconceito.”

Assim, percebemos ao longo da trama que Skeeter vai percebendo o seu local de privilégio
e sustentando as consequências de se pôr contra esse sistema, pois ela perde suas
consideradas amigas, seu namorado e a relação com seus familiares torna-se tensa. Perceber o
seu papel enquanto branco no mundo das relações sociais faz com que notamos as diferenças
de luta entre essas pessoas, e até mesmo as diferenças de luta de gênero, enquanto para as
mulheres brancas seus problemas giravam em torno de engravidar, ter uma casa bonita para
receber as convidadas, o das mulheres negras giravam em saber se viveriam mais um dia ou
serem mortas por conta da cor da sua pele.
Outro ponto a ser considerado ao longo da trama é o fato de que essas mulheres negras já
tinham a vida desenhada assim que nasciam, Aibileen quando questionadas por Skeeter se já
sabia que seria doméstica respondeu que sim, pois todas suas progenitoras também foram,
também como dito no citado filme por uma das personagens domésticas “ela não escolheu a
vida dela, a vida escolheu ela”. Nesse sentido, Gomes (2005, p. 43) traz que
“A identidade negra é entendida, aqui, como uma construção social, histórica, cultural e plural. Implica a

construção do olhar de um grupo étnico/racial ou de sujeitos que pertencem a um mesmo grupo

étnico/racial, sobre si mesmos, a partir da relação com o outro Construir uma identidade negra positiva em

uma sociedade que, historicamente, ensina aos negros, desde muito cedo, que para ser aceito é preciso

negar-se a si mesmo é um desafio enfrentado pelos negros e pelas negras brasileiros(as). Será que, na

escola, estamos atentos a essa questão? Será que incorporamos essa realidade de maneira séria e

responsável, quando discutimos, nos processos de formação de professores(as), sobre a importância da

diversidade cultural?.”

Mesmo que Gomes (2005) traga essa identidade mais voltada para a formação dela
enquanto brasileiros, podemos aplicar o seu conhecimento em outras partes do mundo, dessa
forma, vemos como essa identidade negra já estava instaurada no ano de 1960, onde se você
nasceu nesse meio, basicamente só havia um caminho para seguir - por mais que tivesse
outros sonhos e desejos, o seu destino provavelmente seria abandonar eles para se dedicar ao
fato de tentar viver mais um dia, trabalhar desde cedo para ajudar a pagar as contas da
família. Poucos tomavam esse caminho diferente, como foi o caso dos filhos de Cicely, os
quais ela trabalhou para mandar para Universidade, e que para ela acabou resultando em estar
na prisão, contribuindo para reafirmar a posição dessas identidades das mulheres pretas.
Sendo assim, artículo essa questão da formação em psicologia de como é importante que nós
aprendamos a romper com esse ciclo de repetição, tal como citado por Gomes (2005, p. 43) a
construção dessa identidade negra é um processo contínuo contruida pelos negros e negras
nos vários espaços − institucionais ou não -, sendo formada, também, pela escola, dito isso, é
importante pensarmos em como a Psicologia pode se fazer presente nesses espaços, trazendo
sempre esse debate a tona, através de oficinas, por exemplo, para que isso seja discutido e
lembrado que é importante ser dito, que precisamos falar sobre toda essa trajetória, de fazer
com que esses sujeitos tenham outras referências, além das já pradonizadas em esteriótipos,
do caminho que eles podem seguir.
Outro ponto a ser levantado, é a questão da personagem Hilly não reconhecer-se como uma
pessoa racista, tal como citado por ela “há verdadeiros racistas nessa cidade” como se ela não
fosse. O que é totalmente cético, pois só a ideia da sua empregada Minny usar o mesmo
banheiro que ela lhe causava repugnância, tanto que a demitiu por isso. Bento (2002, p. 12)
cita
“Representar o outro como arauto do mal serviu de pretexto para ações racistas em diferentes partes do

mundo. A agressividade pôde ser dirigida contra esse inimigo comum (a outra raça), sentida como

ameaça, ainda que na maioria dos lugares ela não tivesse nenhum poder. Os sujeitos perdem a capacidade

de discernir entre o que é deles e o que é alheio, e então tudo vira falsa-proJeção, exterioridade. Sob a

pressão do superego, o ego projeta no mundo exterior, como intenções más, os impulsos agressivos que

provêm do id e que, por causa de sua força, constituem uma ameaça para ele próprio. Ao projetar os

impulsos consegue livrar-se deles e, ao mesmo tempo, reagir a eles, como algo que pertence ao mundo

exterior. É um tipo de paranóia que caracteriza freqüentemente quem está no poder e tem medo de perder

seus privilégios. Assim, projeta seu medo e se transforma em caçador de cabeças.”

Holly apresenta esse medo citado por Bento (2003) de mostrar-se superior, de não aceitar
que Minny não é alguém ruim, e percebemos que ela faz isso com todas as mulheres negras
do filme, com Minny foi de menosprezá-la por pensar que usou um banheiro, com Cicely a
mandando para a prisão, até mesmo com Aibileen a demitindo do seu emprego, com o
pretexto de que ela havia roubado a prataria. Holly projeta nessas mulheres tudo aquilo que
tem de ruim em si, frustrada em sua própria vida busca sempre querer tornar a dos outros
pior. Nesse sentido, quando Minny fez sua torta de merda para Holly a mesma não queria de
forma nenhuma que isso viesse à tona, mandando sua mãe para o asilo por rir, tentando
sabotar Skeeter para sua mãe, sempre projetando frustrações dela em outras pessoas.
Retornando o ponto de que Hilly não reconhece-se como uma pessoa racista Bento (2003. p,
5) pontua que
“Assim, o que se observa é uma relação dialógica: por um lado, a estigmatização de um grupo como

perdedor, e a omissão diante da violência que o atinge; por outro lado, um silêncio suspeito em torno do

grupo que pratica a violência racial e dela se beneficia, concreta ou simbolicamente”

Holly praticava a violência diariamente com o grupo de pessoas negras em sua vida, ficava
omissa em todas situações, aproveita-se desse poder que tinha sobre essas pessoas. Outro
ponto que penso, é da cena em questão que um homem negro foi morto pela Ku Klux Klan,
em que o motoristo falou para todas “pessoas de cor” desceram do ônibus, para que os
brancos ali presentes não fossem colocados em perigo. Nesse sentido, penso sobre esse
privilégio que Bento (2003) cita ao decorrer do texto de que esse silêncio do branco tem um
componente de autopreservação porque ele se caracteriza por um pesado investimento na
colocação desse grupo como grupo de referência da condição humana, nesse viés, todas essas
pessoas brancas do citado filme não queriam abrir mão desse lugar de serem superiores, de
terem seus locais ocupados somente por aqueles que consideravam iguais, de poderem ter
algo para se apoiar e mostrar como poderiam ser melhores.
Dito isso, acredito que a nossa formação em psicologia precisa mostrar como foi
construído esse papel das pessoas brancas, os motivos pelos quais os autores que estudamos
são em sua maioria homens brancos, de que forma a ideia deles se torna algo ultrapassado,
sendo importante trazer outros materiais, outros atores de referências para além desses
homens brancos.
Por fim, trago em questão o curta-metragem “Cores e Botas” que retrata um pedaço da
vida de Joana, uma criança que nasceu numa família preta rica nos anos 80 que sonhava em
ser uma paquita. Na sua escola abriram audições para tornar-se uma Paquita, entusiasmada
Joana e outras meninas fizeram o teste, e Joana foi a única menina - dentre todas brancas -
que não passou. Nesse sentido, o curta metragem retrata bem como o racismo está instaurado
em nossa sociedade, por mais que essas pessoas pretas tenham todos os meios para alcançar
seus objetivos para elas sempre será mais difícil, pois não dependem apenas do querer e
esforço próprios para chegarem ao patamar, é toda uma civilização - ainda majoritariamente
composta por pessoas brancas no poder - que irão dizer até onde podem ou não ir, assim
como retratado no filme.

REFERÊNCIAS:

GOMES, Nilma Lino. Alguns Termos e Conceitos Presentes no Debate Sobre Relações
raciais no Brasil uma Breve Discussão. In: Educação anti-racista: caminhos abertos pela
Lei Federal nº. 10.639/03 / SECAD: Brasília: 2005. P. 39-61.

Bento, Maria Aparecida Silva. Branqueamento e Branquitude no Brasil. in:CARONE,


Iray (org). Psicologia Social do Racismo. Editora Vozes, 2003. p. 1-29.

The Help. Tate Taylor. Chris Columbus; Michael Barnathan; Michael Radcliffe. Estados
Unidos. Walt Disney Studios Motion Pictures, 2011. Stremio.

Cores e Botas. Juliana Vicente. Brasil, 2010. Disponível em: (516) Cores e Botas (Colors &
Boots) - by Juliana Vicente - YouTube.

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