Você está na página 1de 138

Direitos fundamentais

de crianças e
adolescentes:

sistemas de proteção
integral
Direitos fundamentais de
crianças e adolescentes:
sistemas de proteção integral

Organizador

Autoras
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

ARCE, Sergio Ruiz Díaz (Org.)

Direitos fundamentais de crianças e adolescentes: sistemas de


proteção integral [Livro Eletrônico]. Sergio
Ruiz Díaz Arce, Organizador -- 1 ed. Brasília, DF ;
Efeito Sete : Universidade de Brasília, 2022.
PDF/Digital.

138p.

Bibliografia
ISBN 978-65-993617-3-9
DOI https://doi.org/10.36599/esete.978-65-993617-3-9

1. Processos Socieducativos. 2. Medidas Socieducativas.
3. ARCE, Sergio Ruiz Díaz

CDD - 341.413
323.3

Índices para catálogo sistemático:

1. Problemas sociais e serviço sociais : Brasil : 360


2. Direitos humanos : Brasil : 323
Antoine de Saint-Exupéry
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................9
Sergio Ruiz Díaz Arce

PREFÁCIO.................................................................................................................11
Sergio Ruiz Díaz Arce

CAPÍTULO I
Estratégias de trabalho em rede para a execução do Serviço de Convivência e
Fortalecimento de Vínculos no município de Chapecó – SC.................................16
Emanuelle Borsoi

CAPÍTULO II
Direitos fundamentais e princípio da proteção integral: uma análise exploratória
sobre a situação do trabalho infantil no município de São Luiz –
Maranhão...................................................................................................................44
Fátima de Nazaré dos Santos Nunes

CAPÍTULO III
Trabalho Infantil e o ciclo vicioso da pobreza e violência no Estado de
Sergipe..................................................………………...…........................................67
Ana Paula Lomes Cardoso
8

CAPÍTULO IV
A inserção da CIF no contexto da rede de atendimento para crianças e
adolescentes com diversidade funcional: um estudo de caso na perspectiva da
equoterapia...............................................................................................................94
Kelly Jackeline Oliveira Pereira Andrade

REFLEXÕES FINAIS...............................................................................................132

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS...................................................................135


9

A obra coletiva DIREITOS FUNDAMENTAIS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES: SISTEMAS


DE PROTEÇÃO INTEGRAL nasce como resultado do curso de Especialização em Garantia
dos Direitos e Política de Cuidados à Criança e ao Adolescente, do Programa de Pós-
Graduação em Educação – modalidade profissional, da Faculdade de Educação da
Universidade de Brasília. Além disso, esta especialização desenvolve-se no âmbito
do projeto “Boas Práticas em Redes de Sistemas de Informação para Criança e
Adolescente”, em parceria com a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente – SNDCA e com o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento – PNUD, com intermediação da Fundação de Apoio à Pesquisa –
FUNAPE.
Deste modo, o curso de Especialização tem por objetivo formar, em nível de
pós-graduação lato sensu, profissionais que atuam no Sistema de Garantia de Direitos
da Criança e do Adolescente – SGDCA e no Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo – SINASE, contribuindo para o desenvolvimento dos recursos
humanos e na promoção, defesa e atendimento a crianças e adolescentes, com base
nos marcos legais da política dos direitos da criança e do adolescente. Objetiva
também debater concepções interdisciplinares e implicações no trabalho pedagógico,
a fim de desenvolver propostas efetivas de qualificação do atendimento e propiciar
aos profissionais do SGDCA e SINASE a ampliação e aprofundamento da análise
crítica de temas contemporâneos.
Como atividade final, os(as) cursistas elaboraram um trabalho de conclusão de
curso (TCC), com auxílio e orientação acadêmica de um professor responsável, a
partir das discussões e temáticas abordadas ao longo do curso e em relação à
atividade profissional que cada estudante desempenha. Assim, cada participante
passou a desenvolver uma pesquisa acadêmica sobre temas relativos à proteção dos
10

direitos da criança e do adolescente, a fim de contribuir com a prática profissional dos


atores do sistema de proteção integral e com os estudos científicos na matéria.
Nesse percurso, como professor e orientador da disciplina Elaboração e
apresentação de TCC, tive a oportunidade de aprender, compartilhar conhecimentos
e trocar experiências junto com Ana Paula, Emanuelle, Fátima e Kelly. Durante o
processo de pesquisa, as autoras do livro me permitiram compreender melhor o
trabalho que cada uma delas realiza na defesa, proteção e promoção de direitos de
crianças e adolescentes em seus respectivos municípios e Estados, assim como
também, sobre as características particulares no funcionamento do sistema de
proteção integral a partir da função profissional que elas desempenham. Acredito que
nossas conversas sobre metodologia de pesquisa e direitos da criança fizeram que
esses meses de trabalho juntos, marcados pela pandemia e seus múltiplos
desdobramentos, se tornassem mais leves e menos cinzas.
Desse modo, a riqueza dos textos produzidos está não apenas no fato de
apresentar trabalhos de relevância para nosso campo de estudo, mas também na
heterogeneidade do grupo, formado por pesquisadoras de vários lugares do Brasil,
com idades, experiências e interesses distintos. Espera-se, portanto, que a leitura
deste livro possa contribuir nas discussões e debates nos espaços de atuação
profissional e acadêmica, assim como também, para renovar compromissos e levar
adiante ações e projetos para a proteção dos direitos fundamentais de crianças e
adolescentes.

Sergio Ruiz Díaz Arce


Organizador
11

O impacto da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança pode ser


compreendido como o início de uma nova etapa na concepção da infância na América
Latina. A partir deste instrumento normativo, a afirmação de que crianças e
adolescentes são sujeitos de direitos ganha força e relevância no discurso jurídico e
político sobre seus direitos fundamentais em distintos países da região.
Nesse sentido, o surgimento da Convenção e de novas legislações nacionais
específicas para este grupo de pessoas, levou os Estados a iniciar uma série de
mudanças significativas que permitissem acompanhar as reformas realizadas no
âmbito jurídico e, sobretudo, adotar as medidas mais adequadas para proteger as
crianças e adolescentes contra as violações de seus direitos. Para a literatura
regional, esse processo significou abandonar o chamado sistema de situação irregular
para a incorporação de um sistema de proteção integral, instalando assim uma nova
perspectiva na abordagem do Estado para a proteção de crianças e adolescentes.
Nesse contexto, a Lei 8069/90 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA
marca esse processo transição no Brasil, e também na América Latina, a partir de um
conjunto normas que reconhecem os direitos fundamentais deste grupo de pessoas,
e sua situação de alta vulnerabilidade social. Dessa forma, as crianças e adolescentes
são considerados seres humanos livres e com plenos direitos, mas que se encontram
sob a responsabilidade da família, da sociedade e do Estado, segundo dispõem os
instrumentos normativos de proteção nesta matéria.
No entanto, a confirmação da condição de sujeito de direitos —condição
inerente a toda pessoa humana— também traz implícitas consequências que
transcendem o campo meramente jurídico, uma vez que o reconhecimento dessa
condição constitui apenas o ponto de partida para reflexão e análise da situação das
crianças e adolescentes e seu lugar na sociedade.
12

Portanto, embora tenham acontecido mudanças legislativas e reformas


institucionais nos mecanismos de proteção de direitos para crianças e adolescentes,
resulta também adequado analisar a estrutura desses sistemas de proteção integral
que foram adotados a partir do ECA, devido a sua relevância para a garantia de
direitos e a proteção especializada. Para isso, torna-se necessário uma descrição,
caracterização e avaliação do funcionamento deste tipo de sistema de proteção
adotado no âmbito nacional, mas conforme sua implementação e as experiências em
cada município e Estado do país.
Nesse sentido, resulta ainda mais pertinente e qualificado quando essa
atividade de pesquisa é realizada pelos próprios atores do sistema, cujo trabalho
profissional na proteção, defesa e promoção de direitos de crianças e adolescentes
permite identificar, compreender e apontar as estratégias para aprimorar o
funcionamento do sistema de proteção integral.
Deste modo, esta obra de criação coletiva divide-se em quatro capítulos ou
trabalhos de investigação, em que são analisadas distintas problemáticas que afetam
os direitos da criança e do adolescente, com especial ênfase no funcionamento dos
sistemas de proteção integral em alguns municípios e Estados.
No capítulo I, Emanuelle Borsoi apresenta o texto intitulado: ESTRATÉGIAS DE

TRABALHO EM REDE PARA A EXECUÇÃO DO SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO DE

VÍNCULOS NO MUNICÍPIO DE CHAPECÓ – SC. O trabalho teve como objetivo determinar as


características do trabalho em rede na execução do Serviço de Convivência e
Fortalecimento de Vínculos (SCFV), no município de Chapecó – SC. A metodologia
utilizada permitiu realizar uma análise documental exploratória e descritiva, com uma
abordagem qualitativa. Os resultados da pesquisa revelaram que os atores da rede
são os agentes públicos, os quais têm por função atender a demanda dos serviços e
desenvolver ações integradas. Observou-se também que, os serviços estão
organizados de acordo com a Tipificação dos Serviços Socioassistenciais, dos
cadernos de orientações e de um conjunto de legislações específicas. Portanto,
conclui-se que no SCFV de Chapecó – SC, urge a necessidade de aprimorar o
trabalho para além de orientações legais, como também o desenvolvimento de um
olhar atento ao potencial de cada território, de modo a somar forças na qualificação
do serviço. Contudo, de acordo com as características da cidade de Chapecó, que
oferece potencial imensurável se comparadas a forma de execução do SCFV,
demanda-se sensibilizar a sociedade e ampliar as ligações de rede, expandindo e
13

buscando potenciais parceiros, o que abrirá um leque maior de possibilidades e,


assim, a qualificação na oferta do serviço.
Por sua vez, no capítulo II, Fátima de Nazaré dos Santos Nunes realiza uma
aproximação e análise sobre a situação do trabalho infantil no texto DIREITOS
FUNDAMENTAIS E PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL: UMA ANÁLISE EXPLORATÓRIA SOBRE A

SITUAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL NO MUNICÍPIO DE SÃO LUIZ – MARANHÃO. A autora


assinala que o trabalho infantil deve ser entendido como todo tipo de atividade que
possa colocar uma criança ou adolescente em uma situação de risco, pois a dedicação
ao trabalho antes da idade mínima permitida pode afastá-los do exercício de seus
direitos fundamentais. Diante desse cenário, o texto tem como objetivo geral abordar
a problemática do trabalho infantil, elucidando, assim, o aspecto do princípio da
proteção integral à criança e ao adolescente, tendo enfoque no estado do Maranhão.
Metodologicamente, trata-se de um estudo exploratório, descritivo, de abordagem
qualitativa e quantitativa. Para isso, realizou-se uma pesquisa bibliográfica, de artigos
e livros publicados no Brasil no período de 2008 a 2018, e análise documental, junto
aos dados de órgãos governamentais sobre o trabalho infantil para responder ao
seguinte problema de pesquisa: de que forma as políticas públicas voltadas a
diminuição dos índices de trabalho infantil têm contribuído com a redução de crianças
e adolescentes nesta situação em São Luís, Maranhão? O intuito é discutir sobre os
efeitos de tais políticas na redução desses índices, o que justifica a relevância social
do estudo.
No contexto dessa mesma problemática, no capítulo III, Ana Paula Lomes
Cardoso descreve e analisa o TRABALHO INFANTIL E O CICLO VICIOSO DA POBREZA E

VIOLÊNCIA NO ESTADO DE SERGIPE. O trabalho examina as relações existentes entre


trabalho infanto-juvenil e a efetivação do princípio da proteção integral na
materialização das políticas públicas no Estado de Sergipe. Para isto, foram definidos
três objetivos específicos: traçar o perfil de crianças e adolescentes que se encontram
em situação de trabalho infantil em Sergipe; analisar as condições sociodeterminantes
desta atividade no território sergipano; e identificar, no âmbito na política de
Assistência Social, a oferta de serviços, programas e projetos destinados ao segmento
infanto-juvenil em Sergipe. Esta pesquisa de cariz exploratório, bibliográfico e
documental, embasada no materialismo históricodialético, apresenta como principais
resultados a forma na qual o racismo estrutural tem legitimado e dado sustentação à
naturalização do trabalho infantil. Igualmente, assinala como as ações de
14

enfretamento, desenvolvidas no âmbito da assistência social, no Estado sergipano,


ainda não foram suficientes para contribuir de forma eficaz com a materialização da
proteção integral de crianças e adolescentes que experienciam situações de pobreza
e privação de bens necessários à sua subsistência.
Por último, no capítulo IV, Kelly Jackeline Oliveira Pereira Andrade realiza uma
análise e proposta para o sistema de proteção integral no texto A INSERÇÃO DA CIF NO
CONTEXTO DA REDE DE ATENDIMENTO PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DIVERSIDADE

FUNCIONAL: UM ESTUDO DE CASO NA PERSPECTIVA DA EQUOTERAPIA. O trabalho discute


conceitos e um novo modelo de atendimento da rede de serviços que compõem o
Sistema de Garantia de Direitos das Crianças e Adolescentes com diversidade
funcional. Para tanto, trabalha-se os conceitos de diversidade funcional e de
interdisciplinaridade, trazendo à tona a importância de se refletir sobre os contextos
que vivem crianças e adolescentes com diversidade funcional, utilizando a
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) como
modelo biopsicossocial baseado na integralidade e na centralidade família.
Metodologicamente, o trabalho apresenta uma vivência da aplicação da CIF e a
utilização desta ferramenta não só pela saúde, mas também em outros campos como
educação, assistência social ou em toda rede. Assim, para desenvolver o Estudo de
Caso foram convidadas quatro profissionais inseridas na equoterapia, de diferentes
áreas, para realizar individualmente a classificação no modelo da CIF com um
participante do Projeto Thomas, conforme critérios preestabelecidos. Após a
aplicação, que aconteceu separadamente pelas profissionais, foi realizada uma
análise dos dados coletados e observou-se que as classificações geraram um perfil
muito próximo do pesquisado e seu contexto social. Os resultados mostram que a CIF
possibilita a tomada de decisão das condutas terapêuticas, psicossociais e de políticas
públicas a serem traçadas para estes indivíduos, sobretudo aqueles com diversidade
funcional, e por isso sua importância ser inserido no Sistema de Garantias de Direitos
das Crianças e Adolescentes.
Desta maneira, o livro também registra o trabalho e compromisso destas jovens
pesquisadoras que atuam no âmbito do sistema de proteção para crianças e
adolescentes em diferentes cidades e Estados do Brasil. Sem dúvidas, a experiência
obtida em seus lugares de trabalho e o olhar crítico de cada uma delas perante a
diversidade de problemas e situações que afetam os direitos da criança e do
adolescente no cotidiano fazem desta obra de criação coletiva um livro com
15

importantes contribuições para compreender, refletir e aprimorar o funcionamento dos


sistemas de proteção integral no país.

Sergio Ruiz Díaz Arce


Organizador
16

Capítulo I

Estratégias de trabalho em rede para a execução do


Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos no
município de Chapecó – SC
Emanuelle Borsoi

1. Introdução

A partir de uma análise sobre o trabalho das redes de cooperação pública e,


especificamente, no que tange o trabalho articulado entre os serviços
socioassistenciais, foi possível constatar que desde a década de 1930 a assistência
social brasileira passou por diversas transformações até chegar ao modelo atual.
Nesse percurso pode ser observado que a história dos serviços socioassistenciais
teve seus inícios na caridade e na filantropia, o que vem sendo desconstruído
gradativamente.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, os órgãos prestadores de
serviços socioassistenciais passaram a se articular em redes de cooperação para
tornar os processos mais ágeis e eficientes. Desse modo, a assistência social ficou
reconhecida como direito do cidadão e dever do Estado, conforme os artigos 203 e
204 (BRASIL, 1988). Nesse contexto, em 2004, foi criado o Ministério de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), que acelerou e fortaleceu o
processo de construção do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) 1 e editou o
texto da nova Política Nacional de Assistência Social (PNAS).
Diante da realidade do nosso país, e em contraste ao que prevê a legislação,
nos deparamos também com impactantes reflexões e grandes desafios em relação à
proteção integral de crianças e adolescentes. Diante disso, torna-se necessário que

1 “O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é um sistema público que organiza os serviços de
assistência social no Brasil. Com um modelo de gestão participativa, ele articula os esforços e os
recursos dos três níveis de governo, isto é, municípios, estados e a União, para a execução e o
financiamento da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), envolvendo diretamente estruturas e
marcos regulatórios nacionais, estaduais, municipais e do Distrito Federal” (BRASIL, 2015).
17

todos os atores desta rede de cooperação pública realizem adequadamente suas


funções para que sejam produzidos resultados significativos dentro do sistema de
proteção integral.
Um ponto importante e que precisa ser refletido é sobre os atores que
participam na defesa dos direitos de crianças e adolescentes e que,
permanentemente, precisam tomar iniciativas para proteger a um grupo de pessoas
em situação de vulnerabilidade, especialmente quando seus direitos estiverem
ameaçados e ou violados. Ao respeito, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
menciona no seu artigo 86 que, “[...] [a] política de atendimento dos direitos da criança
e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais
e não-governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”.
(BRASIL, 1990).
Desse modo, o trabalho realizado na Política de Assistência Social é articulado
entre as diferentes esferas de governo, sendo elas: nacional, estadual e municipal. O
Comando Único, em cada esfera de governo, é uma das diretrizes que organiza a
Política de Assistência Social. Deve ser realizado de forma integrada às políticas
setoriais, considerando as desigualdades socioterritoriais, visando seu enfrentamento
e à garantia de direitos.
Em 2009, foi aprovada pelo CNAS (Conselho Nacional de Assistencial Social)
a Tipificação dos Serviços Socioassistenciais, com isso o SUAS organiza as ações da
assistência social em dois tipos de proteção social. A primeira refere-se à “Proteção
Social Básica” e objetiva à prevenção de riscos sociais e pessoais por meio da oferta
de programas, projetos, serviços e benefícios a indivíduos e famílias em situação de
vulnerabilidade social devendo exclusivamente ser ofertado nos Centros de
Referência de Assistência Social.
A segunda, à “Proteção Social Especial” (PSE), destinada às famílias e
indivíduos que já se encontram em situação de risco e que tiveram seus direitos
violados. Esta divide-se em: PSE de média complexidade e PSE de alta
complexidade. Na média complexidade oferta-se atendimento especializado a
famílias e indivíduos geralmente inseridos no núcleo familiar, por meio do Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). Por sua vez, os serviços de
PSE de alta complexidade são aqueles que oferecem atendimento às famílias e
indivíduos, necessitando de acolhimento fora de seu núcleo familiar de origem.
18

Desta maneira, o enfoque principal do presente trabalho será no Serviço de


Convivência e Fortalecimento de Vínculos (doravante SCFV), que é regulamentado
pela Tipificação dos Serviços Socioassistenciais de 2009 e reordenado em 2013
através da resolução do CNAS n.º 01/2013. Esse serviço está diretamente ligado à
Proteção Social Básica, sendo o principal encaminhador o Centro de Referência de
Assistência Social (CRAS).
O SCFV para crianças e adolescentes é ofertado de modo complementar ao
trabalho realizado pelo CRAS2 e dos demais serviços socioassistenciais, é de caráter
preventivo e proativo para garantir direitos, desenvolver potencialidades, fortalecer a
função protetiva da família, para o enfrentamento e superação das vulnerabilidades
sociais, proporcionando o desenvolvimento da autonomia dos usuários.
Neste contexto, abordaremos especificamente elementos relativos ao
município de Chapecó – SC, onde são desenvolvidas atividades dos SCFV para
crianças e adolescentes. O enfoque será nas faixas etárias de 6 a 17 anos. Importante
mencionar que a Prefeitura de Chapecó conta com oito Centros de Convivência
distribuídos de forma descentralizada.
Nos mencionados centros, o trabalho é realizado com crianças e adolescentes
em situação de vulnerabilidade ou violação de direitos, divididos por faixa etária,
considerando as especificidades dos ciclos de vida. Em sua maioria, os projetos são
executados em grupos e planejados previamente através de percursos 3, em que são
pormenorizados os assuntos, sempre em cunho reflexivo, a serem abordados por
diferentes profissionais de acordo com a área de conhecimento. Também podem ser
ofertadas oficinas como, por exemplo, de teatro, musicalização, dança, desenho,
grafitagem, entre outras, uma vez que o leque de possibilidades pode ser ampliado
de acordo com a realidade.

2 “O CRAS é a porta de entrada da assistência social. É um local público, localizado prioritariamente


em áreas de maior vulnerabilidade social, onde são oferecidos os serviços de Assistência Social, com
o objetivo de fortalecer a convivência com a família e com a comunidade” (BRASIL, 2015).
3 “O SCFV é realizado em grupos e as atividades são organizadas considerando um período

de tempo para a sua execução. Isso significa que, a partir dos eixos orientadores do serviço,
o planejamento das atividades a serem executadas junto aos grupos deve prever início, meio
e fim para o seu desenvolvimento, conforme objetivos e estratégias de ação reestabelecidas.
Isto não significa que ao final de um percurso a participação do usuário no serviço deve ser
encerrada. O usuário pode permanecer participando de quantos percursos forem necessários,
a partir da avaliação técnica, da disponibilidade de vagas para o SCFV e de seu desejo,
quando for o caso” (BRASIL, 2017, p. 62).
19

Pretendemos, a partir dos documentos que normatizam os serviços e a função


dos atores, identificar as características que apresentam as diferentes formas de
parceria entre o SCFV e a rede. Assim, tenciona-se levantar ideias e enfatizar a
importância de realizar a prevenção no SUAS através do SCFV em parcerias com os
serviços e terceiro setor, a fim de ofertar um serviço de qualidade e com efetividade.
Nesse sentido, a presente pesquisa apresenta o seguinte questionamento:
como o trabalho em rede pode contribuir na execução do Serviço de Convivência e
Fortalecimento de Vínculos?
Justifica-se este estudo tendo em vista que a orientação do SUAS em relação
ao trabalho realizado pelos técnicos que executam a Política de Assistência Social,
em âmbito municipal, deve objetivar ações integradas entre os diferentes serviços
visando o atendimento integral às famílias.
Para tanto, as ações integradas são essenciais para que os diferentes serviços
e profissionais trabalhem em busca de um objetivo comum, qual seja, o atendimento
às famílias em prol da superação da condição de vulnerabilidade social em que vivem.
Do mesmo modo, esta pesquisa poderá servir de base como adequação das ações já
desenvolvidas.
Ainda, o estudo surgiu de uma inquietação da autora, que atua como Assistente
Social em um CRAS de Chapecó e é Técnica de Referência do SCFV, pensando em
melhor aproveitar os recursos do território e o potencial das instituições, por acreditar
nas parcerias público privado. Portanto, define-se como objetivo geral deste trabalho:
determinar as características do trabalho em rede na execução do Serviço de
Convivência e Fortalecimento de Vínculos de Chapecó – SC.
Enquanto aos objetivos específicos, foram estabelecidos os seguintes: (i)
identificar os atores da rede pública de cooperação dos serviços socioassistenciais,
em relação a suas funções e articulação com o SCFV; (ii) compreender a função do
SCFV e o papel dos técnicos que o executam; e, (iii) apontar possíveis atores a serem
parceiros dos SCFV de modo a qualificar o trabalho ofertado.
Para obter os resultados desejados, o trabalho foi organizado a partir de um
referencial teórico construído sob a luz de diferentes autores, o que possibilitou a
fundamentação necessária para realizar uma análise das categorias de base.
Posteriormente, considerou-se uma metodologia que permitiu realizar a identificação
de atores que prestam o serviço e a função que desempenham dentro da rede,
conforme uma amostra de dados coletados para realizar a análise. Por último, são
20

apresentados alguns apontamentos que poderão contribuir com as atividades da


SEASC, especialmente do SCFV, e para futuras pesquisas.

2. Trabalho em rede

Diante do que será exposto neste estudo torna-se importante destacar o


conceito de rede. Duarte (2003, p. 38) informa que é um sistema composto por “[...]
vários objetos sociais (pessoas), funções (atividades dessas pessoas) e situações
(contexto) que oferece apoio instrumental e emocional à pessoa, em suas diferentes
necessidades [...]”.
Segundo a definição de Carvalho (2003), a palavra rede é utilizada há muito
tempo e pode ser citada: em rede escolar, rede de unidades básicas de saúde, rede
hospitalar, entre outros. Entende-se, portanto, que a conceituação de rede não é
recente, porém tem evoluído na sociedade contemporânea. De fato,

A rede sugere uma teia de vínculos, relações e ações entre indivíduos


e organizações. Elas se tecem ou se dissolvem continuamente em
todos os campos da vida societária, estão presentes na vida cotidiana
(nas relações de parentesco, nas relações de vizinhança, nas relações
comunitárias), no mundo dos negócios, na vida pública e entre elas. O
que explica a existência de múltiplas redes são as necessidades
humano- sociais que colocam em movimento a busca de interação e
formação de vínculos afetivos, de apoio mútuo, para
empreendimentos etc. Uma rede envolve processos de circulação,
articulação, participação, cooperação. (CARVALHO, 2003, p. 01).

Com efeito, ao se tratar de rede, se faz pertinente trazer à tona a discussão


sobre laços ou ligações que compreendem a relação entre seus atores, tais laços
podem ser mais ou menos fortes, sendo que essa característica será determinada por
vários fatores, entre os quais a amizade, elo de ligação e tempo de convivência. Torna-
se mister destacar que laços fortes influenciam diretamente na fluidez da rede.
Em se tratando de redes e laços, Baldini (2012, p. 27 apud POWELL; SMITH-
DOERR, p. 377) colabora:

[...] é composta por um conjunto de relações ou laços entre atores


(indivíduos ou organizações). Um laço entre os atores tem conteúdo
(o tipo de relação). O conteúdo dos laços pode incluir informação ou
fluxo de recursos, conselho ou amizade, pessoal ou membros de um
conselho de diretores; de fato qualquer tipo de relação social pode ser
21

definido como um laço. Portanto, organizações estão tipicamente


inseridas em redes múltiplas e muitas vezes sobrepostas.

Para aprimorar a discussão torna-se necessário adentrar nas questões de


estrutura de rede, ou seja, a posição ocupada pelos atores na rede, a fluidez através
dos laços e a importância dos diferentes laços para os atores. Compreender a
estrutura e arquitetura de uma rede é fator estratégico para sua sobrevivência.
Trabalhar em rede tem se constituído fator preponderante para toda sociedade,
garantindo a sobrevivência e melhoria dos serviços prestados pelas instituições
públicas e privadas. Não resta dúvida de que o trabalho em rede permite vantagens a
todos os cidadãos. No entanto, a problemática que envolve as ações integradas entre
os serviços depende do entendimento dos atores sobre o trabalho a ser realizado de
forma compartilhada.
Resgatando o pensamento de Xavier, Silva, Ramos e Gonçalves (2009),
verifica-se que a rede socioassistencial possui as características inerentes a este tipo
de organização, já que nenhum ator possui, por si só, o poder sobre as decisões, ou
de realizar o trabalho de forma isolada. Na perspectiva da organização horizontal, é
necessário que este trabalho seja realizado de forma compartilhada.
A relação entre rede e administração pública permite o entendimento de que
redes são compostas por pessoas que formam grupos, e por sua vez, esses grupos
fazem parte da sociedade que compõe o Estado.
Na bibliografia consultada verificou-se que:

As redes de atores são feitas de fios e nós. Assim, os fios representam


as expectativas, objetivos e demandas em relação à atuação dos
atores, e os nós representam os próprios atores e suas ações
conjuntas. Juntos, eles constituem a estrutura de uma rede. A rede
tem a função de reunir atores com interesses parcialmente
diferenciados e parcialmente conflitantes, viabilizando seu trabalho
conjunto. Os atores estão presos à rede, ou seja, não podem agir de
acordo com seus interesses particulares tanto quanto talvez
gostariam. Devem sujeitar-se aos processos de negociação, aceitar os
resultados negociados e ajustar-se uns aos outros. Ao
compreendermos por que isso ocorre, saberemos por que e de que
forma surgem as redes sociais e as alianças e o que assegura sua
sobrevivência. (KISSLER; HEIDEMAN, 2006, p.495).

Nesse contexto, é necessário expor a importância da rede pública de


cooperação e seus benefícios, pois as redes de cooperação são formadas de grupos
de pessoas ou instituições e possuem diversos formatos e naturezas, ou seja, nas
22

redes públicas a competição aliada à cooperação e formação de parcerias faz com


que se cumpra mais facilmente com os objetivos.
Em seus estudos, Malmegrin (2010, p. 73) externa a convicção de que:

Nossa proposta de entendimento é que redes públicas de cooperação,


isto é, prestadoras de serviços públicos, estatais ou híbridas, dos
campos movimentos sociais, produção e circulação, e Estado e
políticas públicas, podem ser alternativas importantes para os desafios
nacionais de prestação de serviços públicos com qualidade à
sociedade.

Dessa forma, a rede é articulada em torno de um objetivo em comum, seus


atores e organizações buscam organizar as parcerias necessárias, o que fortalece os
laços e o alcance social.
Com relação a esse aspecto, Malmegrin (2010) trata sobre as diferentes formas
de rede e as diferentes formas de implementação. Mais especificamente, sobre redes
sociais sistêmicas de iniciativa estatal, e assevera que dizem respeito às
problemáticas socioassistenciais. Para a autora,

Em alguns casos, os municípios não aguardaram iniciativas do


Governo central, tomando iniciativas de mobilização para construção
de redes com o objetivo de resolver problemas sociais locais.
Exemplos de redes, nesse contexto, são as redes que estão sendo
implementadas no Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Tal
sistema busca integrar programas e ações, já implementadas, com o
atendimento às novas demandas priorizadas nas políticas públicas
dos governos federal, estadual e municipal. (MALMEGRIN, 2010, p.
92).

A vantagem do trabalho com ações integradas é, primeiramente, a união de


forças, a descentralização, negociação e participação dos sujeitos envolvidos, vários
saberes pensando a solução de um problema.
No que tange à rede socioassistencial, esta é formada pelo conjunto integrado
de ações de iniciativa publica, que ofertam e executam benefícios, serviços,
programas e projetos, havendo a necessidade de articulação entre esses serviços e
seus atores, sob a hierarquia e forma em que estão organizados e estruturados.
Dentro dos interesses individuais e coletivos, o Estado precisa ser orientado
para a produção do bem comum. Operar o Estado em rede implica em ampliar o
acesso da sociedade ao consumo dos serviços públicos. O Estado em rede também
23

traz desafios, pois as organizações e seus atores precisam repensar ações, para gerar
efetivos benefícios para segmentos expressivos da sociedade civil.
A realização de um trabalho com ações integradas entre os serviços requer
cooperação e troca complementar. O trabalho em rede permite que o Estado chegue
até o cidadão e atenda às suas necessidades, com o propósito de gerar o bem
comum.
Para Xavier, Silva, Ramos e Gonçalves (2009, p. 05), “[...] rede pressupõe uma
forma de organização horizontal, conectada, autônoma, participativa, colaborativa e
de decisão compartilhada, onde o cidadão, as famílias são atendidas em todas as
suas necessidades, por todas as políticas de maneira integral [...]”.
É importante aprofundar o conceito de rede nas relações humanas, para tanto
o pensamento de Guará (2010) ressalta que para construir redes é necessário apostar
em relações humanas articuladas entre pessoas e grupos e, mesmo nas diferenças,
trabalhar de forma produtiva visando o bem comum.

Tal interpretação permite perceber a rede como um canal por onde


fluem expectativas, culturas, valores, temores, e não apenas a
comunicação racional de informações e projetos comuns. Os
caminhos construídos pelos participantes das redes refletem o
entrelaçamento de intenções e resistências nem sempre capturáveis
pelo discurso explícito dos sujeitos. Daí porque o esforço de
convergência para o alcance dos objetivos da rede não anula as
diferenças de cada participante, e sim, por vezes, o explicita. (GUARÁ,
2010, p. 15).

Nos serviços socioassistenciais compreender esse conceito é de fundamental


importância, haja vista que não se trabalha com produtos e sim com pessoas e suas
relações, e a atenção se redobra quando se trata de realizar prevenção na área da
infância e adolescência para garantir o direito a convivência familiar e comunitária.

3. Procedimentos metodológicos

Quanto à metodologia trata-se de pesquisa documental exploratória e descritiva


de abordagem qualitativa. Ao respeito, dentro da pesquisa exploratória Gil (2002, p.
11) menciona que:

Esta pesquisa tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com


o problema, [...] tem como objetivo principal o aprimoramento de ideias
24

ou a descoberta de intuições. Seu planejamento é, portanto, bastante


flexível de modo de que possibilite a consideração dos mais variados
aspectos relativos aos fatos estudados.

A classificação quanto aos meios é bibliográfica, baseada em dados já


publicados em livros, artigos, revistas, jornais e material eletrônico, o que favorece
uma análise e a apropriação de categorias referentes ao trabalho. Esta pesquisa que
será alicerçada em revisão bibliográfica nos permitirá verificar de que forma o trabalho
em rede pode contribuir na execução do SCFV.
Para obter tal empreendimento, no primeiro capítulo serão identificados os
atores da rede pública de cooperação dos serviços socioassistenciais de Chapecó –
SC, suas funções e como se articular com o SCFV. Os dados foram coletados a partir
de uma análise da Tipificação dos Serviços Socioassistenciais e do Plano Municipal
da SEASC (2022 a 2025). Igualmente, as informações foram embasadas a partir dos
Cadernos de Orientações Técnicas dos serviços da Proteção Social Básica e
Proteção Social Especial, os quais serão sistematizados, adiante, por meio de uma
tabela contendo os atores, suas funções e como devem se articular.
Dessa maneira, os dados necessários para a pesquisa estão ancorados e
complementados numa investigação, anteriormente realizada, que objetivou analisar
a rede pública de cooperação dos serviços socioassistenciais da Secretaria de
Assistência Social de Chapecó (SEASC). Nessa pesquisa de tipo qualitativa
(BORSOI; NUNES; COTO, 2014) os autores expuseram sobre o processo de
articulação em rede e propuseram algumas sugestões para melhorar o serviço. Assim
também, contou com a participação dos técnicos responsáveis pelos serviços da
SEASC, dos seis Centros de Referência de Assistência Social, bem como dos dois
Centros de Referência Especializados de Assistência Social e das três modalidades
de acolhimento institucional.
Diante do exposto, no terceiro capítulo trataremos de compreender a função do
SCFV e o papel dos técnicos que a executam, a partir de uma análise dos cadernos
de orientações técnicas do serviço e do Plano Municipal de Assistência Social de
Chapecó-SC/2022 – 2025 - PMAS.
No quarto capítulo, visando qualificar o trabalho ofertado, apontaremos
possíveis atores a serem parceiros dos SCFV, tanto na esfera pública quanto privada,
a partir das normas técnicas de como deve ser executado o serviço. Para isso, são
analisadas algumas instituições existentes no município de Chapecó – SC, segundo
25

as características da cidade e aproveitando o potencial de cada território e do


município como um todo.

4. Identificação e atribuição dos atores da Rede Pública de


Cooperação dos Serviços Socioassistenciais da SEASC

No período entre 2005 a 2012 a Política de Assistência Social em Chapecó foi


executada por meio da Fundação de Ação Social de Chapecó - FASC, sendo que por
uma decisão de gestão, em 2012 transformou-se em Secretaria de Assistência Social
- SEASC, instituída pela Lei Complementar n.º 498 de 17 de dezembro de 2012.
Em 2018 passou a vigorar a Lei n.º 7.175 que dispõe sobre o Sistema Único de
Assistência Social do Município de Chapecó (SUAS), conforme seu Art. 2º: “A Política
de Assistência Social do Município de Chapecó tem por objetivos: I - a proteção social,
que visa a garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos
[...]”.
A referida Lei está em consonância com a Tipificação do Serviços
Socioassistenciais4, bem como sendo aplicada da mesma forma na realidade do
município de Chapecó, já que exerce gestão plena aplicando, portanto, as ações
socioassistencias na sua totalidade.
Os espaços de participação são os Conselhos Municipais, realização de Fóruns
e Conferências Municipais, não só de Assistência Social, mas dos demais segmentos:
mulheres, idosos, pessoas com deficiência, bem como crianças e adolescentes.
O Quadro 1, a seguir, tendo por base PMAS da SEASC, apresenta a
organização dos Serviços, Programas e Projetos que atendem à demanda de crianças
e adolescentes e suas famílias:

4 A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais foi aprovada pela Resolução n.º 109
do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e tipifica os Serviços Socioassistenciais
disponíveis no Brasil organizando-os por nível de complexidade do Sistema Único de
Assistência Social: Proteção Social Básica e Proteção Social Especial de Média e Alta
Complexidade. (GESUAS, [2022]). Disponível em: http:// www.gesuas.com.br. Acesso em: 27
jan. 2022.
26

Quadro 1 - Identificação dos atores e articulação

Ator Função Articulação dos serviços com o


SCFV
Serviços e programas da Proteção Social Básica
07 CRAS Garante o direito à A equipe do CRAS identifica a
convivência familiar e demanda e realiza o
comunitária; contribui para o encaminhamento ao SCFV, por
processo da autonomia e da meio do técnico de referência que
emancipação social das auxilia no planejamento e
famílias. acompanhamento dos casos, bem
como o trabalho articulado com as
famílias, parcerias e gestão do
território.
Programa Renda Assegura renda temporária às Caso necessário repassa meio
Cidadã. famílias em situação de risco salário mínimo às famílias com
Lei n.º 4.550 de 8 pessoal. idosos ou PCDs que não
de abril de 2003. conseguiram acessar benefício
previdenciário.
Programa Programa com vagas por Possibilita acesso à vaga de
Frentes de vulnerabilidade gerando trabalho as pessoas de 16 a 59
Trabalho emprego e renda. anos em situação de
Lei n.º 7.509 de vulnerabilidade com dificuldade de
22 de julho de inserção em mercado de trabalho.
2021.
Serviços e programa da Proteção Social Especial de Média Complexidade
02 CREAS Constitui-se numa unidade Durante o acompanhamento ou
pública estatal, de prestação ao desligar do acompanhamento,
de serviços especializados e a equipe de referência expõe a
continuados a indivíduos e situação ao CRAS e sugere
famílias com seus direitos inserção no SCFV.
violados.
01 Medidas Realiza o acompanhamento Ao desligar do acompanhamento
socioeducativas aos adolescentes envolvidos a equipe de referência expõe a
em meio aberto com ato infracional. situação ao CRAS e sugere
inserção no SCFV.
PETI 5
Objetiva a prevenção e A equipe do PETI pode realizar
erradicação de todas as trabalhos articulados com os
formas de Trabalho Infantil. serviços da rede de modo a
prevenir o trabalho infantil sendo o
SCFV uma das possibilidades de
encaminhamento.
Serviços da Proteção Especial de Alta Complexidade
Acolhimento Espaço de acolhimento e de Durante o acompanhamento ou
Institucional para proteção a crianças e ao desligar do acompanhamento a
crianças e adolescentes, em caráter equipe de referência expõe a
adolescentes provisório e excepcional

5 “Assim, a participação das crianças e dos adolescentes retirados do trabalho infantil no Serviço de
Convivência e Fortalecimento de Vínculos e/ou em outras atividades socioeducativas da rede é
considerada estratégia fundamental para a interrupção do trabalho infantil e para a oferta de novas
oportunidades de desenvolvimento às crianças e aos adolescentes. [...]. É importante manter
articulação com a gestão do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil do município e com o PAEFI,
buscando integrar as ações realizadas com as famílias e com os usuários no SCFV.” (BRASIL, 2017,
p. 24).
27

Ator Função Articulação dos serviços com o


SCFV
conforme parágrafo único do situação ao CREAS e sugere
art. 101 do ECA. inserção no SCFV.
Casas Lares Redimensiona o Abrigo Durante o acompanhamento ou
Municipal em um novo modelo ao desligar do acompanhamento a
de atendimento a crianças e equipe referência a situação ao
adolescentes numa CREAS e sugere inserção no
perspectiva de convívio SCFV.
familiar em casas lares.
Serviço de Objetiva oferecer um lar Durante o acompanhamento ou
Acolhimento familiar para crianças, ao desligar do acompanhamento a
Familiar adolescentes, violados em equipe de referência expõe a
(Famílias seus direitos; proporciona situação ao CREAS e sugere
acolhedoras e ambiente sadio de inserção no SCFV.
extensas) convivência; oportuniza
condições de socialização; e
integra a comunidade.

Casa Abrigo para Proporciona atendimento de Ao desligar do acompanhamento


Mulheres vítimas proteção com acolhimento a equipe referência a situação ao
de violência temporário para garantia de CREAS ou CRAS e sugere
integridade física e psicológica inserção no SCFV.
de mulheres em risco de vida
e seus filhos.
Fonte: elaborado pela autora a partir do Plano Municipal de Assistência Social de Chapecó

No Quadro 1 identifica-se a função e relevância de cada serviço para atender


às diferentes demandas e suas complexidades, também a importância de termos
clareza da função para assim compreendermos como se articulam. Nesse sentido,
torna-se primordial realizar esta leitura de acordo com a realidade, de modo a
constantemente aprimorar relações desta rede para que se estabeleçam novos pontos
de ligação.
Após a identificação dos atores da rede socioassistencial que atendem crianças
e adolescentes é primordial que se compreenda como entendem o seu papel neste
contexto, o envolvimento dos sujeitos e o compromisso individual, sendo o primeiro
passo para unir os vários pontos dessa rede.
Sobre a articulação dos atores para o desenvolvimento dos Serviços
Socioassistenciais da SEASC, apresenta-se alguns elementos identificados em
pesquisa realizada outrora pela autora deste estudo, com parceria com demais
28

pesquisadores, que objetivou analisar a rede pública de cooperação dos serviços


socioassistenciais da SEASC6, sendo que nesta rede está inserido o SCFV.
Convém destacar que em referência às ações entre os serviços da SEASC,
observa-se a necessidade de aprimoramento da comunicação, da integração entre os
serviços para troca de experiências, bem como o desenvolvimento de ações
conjuntas.
Ao longo desse estudo, em contato com a literatura, dos questionários e da
observação, constatou-se que a rede está posta, existe de forma organizada, no
entanto, quanto aos serviços, existe a possibilidade de melhorar seu fluxo. Entende-
se que os atores têm autonomia para inovar, melhor se articular, contudo a pesquisa
revela que tais atores ainda não estão engajados o suficiente, que a rede necessita
de maior movimento, mais vida e mais dinamismo.
Existe a compreensão do papel individual dentro de um contexto mais amplo,
no qual cabe aos atores o planejamento das ações, de modo a realizar práticas
integradas, tanto para tratar de questões pontuais dos usuários quanto para questões
gerais da própria dinâmica da rede na relação com os demais serviços. Em vista disso,
o fluxo da rede depende muito de os atores compreenderem, de fato, e executarem
sua função enquanto sujeitos atuantes, proativos e cooperativos. A função será
desempenhada de acordo com o perfil do ator e espera-se que sendo integrante de
uma rede não só realize as tarefas pertinentes ao cargo ou função que ocupa, mas
que possa ir além contribuindo para a melhoria do fluxo. Guará (2010, p.19) destaca
que:

A rede demanda uma reflexão contínua sobre as suas formas de


funcionamento e as diferentes estratégias empregadas em sua
constante mobilização. Queremos dizer com isso que, em suas
diferentes etapas, a estrutura deve assegurar relativa flexibilidade para
se adequar às novas necessidades, podendo haver modificações
sempre que o momento assim o justificar.

A seguir, Quadro 2, apresenta-se a síntese dos resultados da pesquisa de


acordo com os objetivos:

6BORSOI, Emanuelle; NUNES, Rogério da Silva; COTO, Gabriela Cordioli. O Trabalho em Rede
Entre os Serviços Socioassistenciais da Secretaria de Assistência Social de Chapecó/SC-
SEASC. 2015. 23 f. Artigo (Especialização em Gestão Pública Municipal) – Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2014.
29

Quadro 2 - Síntese dos resultados


Objetivos específicos Resultados
1. Identificar os atores da rede pública Os atores desta rede são os diferentes
de cooperação dos serviços profissionais que atuam nos serviços,
socioassistenciais da SEASC. programas, benefícios e projetos da rede
socioassistencial da SEASC.

2. Compreender a função dos atores Tem por função atender a demanda


da rede pública de cooperação dos correspondente ao objetivo de cada serviço e
serviços socioassistenciais da SEASC. realizar o trabalho com ações integradas.

De modo geral, realizam conjuntamente estudos


de casos, reuniões de rede, planejamento de
ações, capacitações, trabalho de prevenção.
3. Descrever como os atores se Os atores reconhecem a importância e realizam
articulam para o desenvolvimento dos o trabalho com ações integradas, fazem uso de
serviços socioassistenciais da SEASC. alguns instrumentais tais como: Plano de
Acompanhamento Familiar, Registro das ações
de forma integrada e informatizada, Relatórios de
Acompanhamento, referência e contra-
referência. Contudo é necessário intensificá-los
e incorporá-los à rede, utilizando-os como
protocolo nas ações.
Fonte: Elaborado pela autora de acordo com Borsoi, Nunes e Coto (2015)

Após a descrição geral sobre a rede de serviços socioassistenciais, no capítulo


a seguir optou-se por pormenorizar o trabalho executado nos Centros de Convivência
em relação às crianças e adolescentes.

5. A execução do Serviço de Convivência de Fortalecimento de


Vínculos para crianças e adolescentes no município de
Chapecó – SC

Conforme descrito na Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, o


SCFV se caracteriza pelo trabalho com grupos, respeitando os ciclos etários.
Conforme a descrição geral do serviço, contida na tipificação:

Serviço realizado em grupos, organizado a partir de percursos, de


modo a garantir aquisições progressivas aos seus usuários, de acordo
com o seu ciclo de vida, a fim de complementar o trabalho social com
famílias e prevenir a ocorrência de situações de risco social. Forma de
intervenção social planejada que cria situações desafiadoras, estimula
e orienta os usuários na construção e reconstrução de suas histórias
30

e vivências individuais e coletivas, na família e no território. (BRASIL,


2009, p. 9).

É serviço da Proteção Social Básica diretamente ligado ao CRAS que no


trabalho do PAIF (Programa de Atenção Integral à Família) identifica a maior parte
das situações a serem encaminhadas ao SCFV, tendo como critérios estar em
situação de vulnerabilidade e risco, conforme descrito na tipificação (BRASIL, 2009,
p. 16), “[...] possui articulação com o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à
Família – PAIF, de modo a promover o atendimento das famílias dos usuários destes
serviços, garantindo a matricialidade sociofamiliar da política de assistência social.”.
No que se refere à oferta do serviço, a Resolução n.º 01 de 21 de fevereiro de
2013 do CNAS em seu Art. 3º trata: considera-se em situação prioritária para inclusão
no SCFV as crianças, adolescentes:

I. Em situação se isolamento;
II. Trabalho infantil;
III. Vivencia de violência e, ou negligencia;
IV. Fora da escola ou com defasagem escolar superior a 2(dois) anos;
V. Em situação de acolhimento;
VI. Em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto;
VII. Egressos de medidas socioeducativas;
VIII. Situação de abuso e /ou exploração sexual;
IX. Com medidas de proteção do estatuto da criança e do adolescente-ECA;
X. Criança e adolescente em situação de rua;
XI. Vulnerabilidade que diz respeito às pessoas com deficiência.

Cada situação deverá ser estudada pelas equipes para identificar como caso
prioritário, e, de acordo com as realidades, realizar o planejamento a fim de que
contribua na superação da condição pela qual foi encaminhado. O objetivo do serviço
será em primazia a superação das diferentes vulnerabilidades e quando isso é
percebido ocorrerá o desligamento aliado a outros encaminhamentos que se fizerem
necessários, para as diferentes políticas públicas e/ou privadas.
Importante frisar que os profissionais realizam todo o planejamento e percursos
consoante aos eixos previstos para o SCFV:
31

Embora o SCFV seja organizado a partir dos ciclos de vida dos


usuários, a fim de considerar as especificidades de cada etapa do
desenvolvimento, há aspectos da vida humana que perpassam todas
elas, tais como a participação, a convivência social e o direito de ser –
esses são os eixos orientadores do SCFV. (BRASIL, 2017, p.15).

De acordo com o PMAS de Chapecó, no município este serviço


socioassistencial é desenvolvido pela SEASC e também por entidades de Assistência
Social que conveniadas com o município atendem crianças e adolescentes em
situação de vulnerabilidade social no território municipal. Os dados do SISC referente
a 2021 foi atendido pelos Centros de Convivência em média um total de 450 crianças
e adolescentes. As entidades (ONGs) de Assistência Social, as quais somam cinco,
prestam um amplo apoio ao poder público como SCFV. Segundo o questionário
enviado pela Vigilância Socioassistencial da SEASC e respondido pelas entidades
(2021), tais organizações atendem em média 575 crianças e adolescentes.
Este trabalho precisa ser realizado com diálogo estreito e em consonância com
o CRAS, conforme descrito no caderno de orientações do Serviço de Proteção e
Atendimento Integral à Família e Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculos, “[...] Tanto o SCFV quanto os projetos e programas da proteção básica que
são desenvolvidos no território de abrangência do CRAS devem ser a ele
referenciados e devem manter articulação com o PAIF [...]” (BRASIL, 2016, p. 08).
Sobre a periodicidade dos encontros no SCFV o mesmo caderno (BRASIL,
2016, p.14) assinala:

Quanto à periodicidade dos encontros dos grupos do SCFV, é


importante que sejam regulares, haja vista que têm por finalidade
fortalecer vínculos familiares, incentivar a socialização e a convivência
comunitária.

Especificamente, em relação às crianças e adolescentes do SCFV são


organizadas em grupos, a partir de faixas etárias:
1. Crianças e adolescentes de 6 a 15 anos.
2. Adolescentes de 15 a 17 anos.
Sobre essas faixas etárias, cada fase de desenvolvimento requer atividades
elaboradas, visando o estímulo e o desenvolvimento por meio da participação dos
percursos sociais desenvolvidos em cada grupo. Este trabalho previne as situações
32

de risco e se complementa ao trabalho social com as famílias. Além disso, a troca de


experiências permite o convívio de forma coletiva.
Quanto ao ambiente físico deve manter uma organização de modo a ofertar o
serviço com segurança e salubridade, permitindo estimular a convivência, a
socialização, com salas de atendimento individualizados, coletivo e comunitária, além
de instalações sanitárias, seguindo parâmetros de limpeza e acessibilidade em
conformidade com as normas da Associação Brasileira de Normas e Técnicas
(ABNT). Ademais, um ambiente acolhedor, criativo, ético e humanizado facilita a
vinculação e permanência no serviço.
Conforme orientações técnicas para a execução do SCFV, a equipe deve ser
constituída por um técnico de referência do CRAS com atuação no SCFV, com
formação de nível superior, que poderá ser o Assistente Social ou o Psicólogo ou,
ainda, outro profissional que integre a equipe do CRAS, consoante a Resolução CNAS
n.º 17/2011; e por orientador(es) social(is) ou educador(es) social(is), como descrição
apresentada na Resolução CNAS n.º 9/2014.
Destacamos, adiante, algumas das atribuições da equipe do SCFV, formada
pelo Técnico de Referência, pelo Orientador Social e pelos facilitadores de oficinas, a
fim de ilustrar a execução do serviço:
Quanto às atribuições do Técnico de Referência citadas no caderno salienta-
se (BRASIL, 2017, p. 55-56):

• Conhecer as situações de vulnerabilidade social e de risco das


famílias beneficiárias de transferência de renda (BPC, PBF e outras)
e as potencialidades do território de abrangência do CRAS;
• Acolher os usuários e ofertar informações sobre o serviço;
• Realizar atendimento particularizado e visitas domiciliares a famílias
referenciadas ao CRAS;
• Desenvolver atividades coletivas e comunitárias no território;
• Contribuir tecnicamente para a oferta do SCFV, tendo em vista as
diretrizes nacionais, dentro de suas atribuições específicas;
• Encaminhar usuários ao SCFV;
• Participar da definição dos critérios de inserção dos usuários no
serviço;
• Assessorar as unidades que desenvolvem o SCFV no território;
• Assessorar tecnicamente ao(s) orientador(es) social(ais) do SCFV
nos temas relativos aos eixos orientadores do serviço e às suas
orientações técnicas, bem como ao desligamento de usuários do
serviço e quanto ao planejamento de atividades;
• Acompanhar o desenvolvimento dos grupos existentes nas unidades
ofertantes do serviço, acessando relatórios, participando em reuniões,
etc.;
33

• Manter registro do planejamento do SCFV no CRAS;


• Articular ações que potencializem as boas experiências no território
de abrangência do CRAS;
• Avaliar, com as famílias, os resultados e impactos do SCFV;
• Garantir que as informações sobre a oferta do SCFV estejam sempre
atualizadas no SISC e utilizá-las como subsídios para a organização
e planejamento do serviço.

Quanto ao Orientador Social ou Educador Social é uma função que deve ser
exercida por profissional com no mínimo nível médio de escolaridade e lhe caberá:

• Desenvolver atividades socioeducativas e de convivência e


socialização visando à atenção, defesa e garantia de direitos;
• Organizar, facilitar oficinas e desenvolver atividades individuais e
coletivas de vivência nas unidades e/ou, na comunidade;
• Acompanhar, orientar e monitorar os usuários na execução das
atividades;
• Apoiar na organização de eventos artísticos, lúdicos e culturais as
unidades e/ou na comunidade;
• Participar das reuniões de equipe para o planejamento das
atividades, avaliação de processos, fluxos de trabalho e resultado;
• Desenvolver atividades que contribuam com a prevenção de
rompimentos de vínculos familiares e comunitários, possibilitando a
superação de situações de fragilidade social vivenciadas;
• Acompanhar o ingresso, frequência e o desempenho dos usuários
nos cursos para os quais foram encaminhados por meio de registros
periódicos;
• Acompanhar e registrar a assiduidade dos usuários por meio de
instrumentais específicos, como listas de frequência, atas, sistemas
eletrônicos próprios, etc. (BRASIL, 2017, p. 56-57).

Sobre os Facilitadores de Oficinas ressalta-se que eles serão responsáveis


pela realização de oficinas de convívio feitas com os Grupos. Ainda, deverão planejar,
junto ao Orientador Social, as oficinas que serão desenvolvidas por meio de atividades
esportivas, culturais, artísticas e de lazer, visando garantir a integração das atividades
aos objetivos gerais planejados.
Desta forma, compreende-se que a oportunidade de crianças e adolescentes
estarem inseridos no SCFV tem ligação direta com a transformação de realidades já
que acessam conteúdos reflexivos, de cunho educativo e experienciando
possibilidades por meio das oficinas. Trata-se de um primeiro passo para
planejamento de projeto de vida que venha a romper com violações de direitos
transgeracionais. Portanto, caracteriza-se como um trabalho de prevenção e que dada
a sua importância necessita de apoio da rede para fortalecimento e aprimoramento.
34

De acordo com o PMAS de Chapecó, a gestão realizou um diagnóstico com os


profissionais dos Centros de Referência que foram instigados a pensar sobre
preocupações e dificuldades em executar os SCFV, para que assim fosse possível
identificar demandas para compor o planejamento da Assistência Social visando os
próximos quatro anos.
No ciclo etário de 6 a 15 anos de idade, as preocupações são:

Evasão escolar; trabalho infantil; ausência de vagas para o jovem


aprendiz no território de abrangência; Demandas que necessitam
trabalhar a prevenção do trabalho infantil; Necessidade de preparação
e inserção no mercado de trabalho; Envolvimento com ilícitos; Saúde
mental fragilizada; Fragilidade dos vínculos familiares, percebemos a
dificuldade das famílias em desempenhar sua função protetiva;
Gravidez na adolescência, trabalho infantil; isolamento, dificuldade na
convivência, evasão escolar, uso de drogas; Gravidez; A maior
preocupação é com a saúde física e mental das crianças e
adolescentes, devido a restrição do convívio social por conta da
pandemia; Abandono escolar; Envolvimento com drogas, tráfico,
ilegalidade; Falta de atividades de lazer, esporte, cultura. (CHAPECÓ,
2022-2025, p. 69).

O ciclo etário de 15 a 17 anos é uma preocupação para o município e necessita


urgentemente ser analisado, bem como criar propostas de trabalhos com o público.
Nesse sentido, são identificadas as seguintes preocupações nesse ciclo etário:

Evasão escolar; trabalho infantil; casamento infantil; contato com


substâncias psicoativas; Preparação e inserção no mercado de
trabalho Envolvimento com ilícitos; Saúde mental Prevenção uso de
drogas, gravidez na adolescência, abandono escolar, trabalho infantil,
vivencia de violência; Falta acesso a iniciação ao trabalho; isolamento,
dificuldade na convivência, evasão escolar, saúde mental pandemia;
A maior preocupação é com a saúde física e mental das crianças e
adolescentes, devido à restrição do convívio social por conta da
pandemia; abandono escolar, - envolvimento com drogas, tráfico,
ilegalidade, falta de atividades de lazer, esporte, cultura, falta de vagas
de trabalho (jovem aprendiz, estágio). (CHAPECÓ, 2022-2025, p. 69).

Diante do exposto, sobre a execução do SCFV e principalmente das


preocupações listadas pelos profissionais, no próximo capítulo apontaremos
possibilidades de parcerias visando a qualificação do serviço.
35

6. Possibilidades de parcerias com o Serviço de Convivência e


Fortalecimento de Vínculos de Chapecó – SC

Conforme consta no PMAS, Chapecó é palavra de origem Kaingang na língua


dos nativos significa ‘donde se avista o caminho da roça’. Sua localização, no oeste
de Santa Catarina, lhe concede o título de maior cidade da região oeste.
A criação do Município de Chapecó foi em 25 de agosto de 1917, a população
cresce desde sua colonização indicando a pujança local e vem se mostrando como
uma das cidades que mais se desenvolve no Estado de Santa Catarina. Analisar os
indicadores populacionais permite constatar esta realidade. (IBGE, 2021).
De acordo com a estimativa populacional do IBGE de 2021, o município de
Chapecó conta com 227.587 habitantes, é considerado polo agroindustrial do sul do
Brasil e centro econômico, político e cultural do oeste do Estado, e ocupa uma área
de 626,060 de quilômetros quadrados. Destaca-se, economicamente, na exportação
de produtos alimentícios industrializados de natureza animal. É também considerada
a Capital Latino-Americana de Produção de Aves e Centro Brasileiro de Pesquisas
Agropecuárias
O ramo industrial é diversificado, sendo que os setores que mais se sobressam
são: o metalmecânico (que vem se especializando na produção de equipamentos para
frigoríficos), o de plásticos e embalagens, transportes, móveis, bebidas, software e
biotecnologia. A construção civil e o comércio são também importantes fonte de renda.
Além dos mais, a região tem grandes perspectivas derivadas da posição central
no Mercosul, do alto potencial e da disponibilidade de energia elétrica, das condições
favoráveis para a produção agropecuária, dentre outros fatores.
A cidade que possui Shopping entre outras grandes empresas, tem também o
maior aeroporto regional do país e assim se desenvolve e se expande
initerruptamente, com novos investidores e empresas que se instalam gerando uma
cadeia de crescimento.
São mais de 16.000 estudantes universitários, distribuídos em mais de 50
cursos de graduação e de pós-graduação Latu e Strictu Sensu. Entre as principais
universidades e instituições de ensino superior situadas no município, está a
Universidade Federal da Fronteira Sul, Universidade do Estado de Santa Catarina,
36

Universidade Comunitária Regional de Chapecó, UCEFF e a Universidade do Oeste


de Santa Catarina.
Chapecó tem um potencial imensurável, em vista disso a Tipificação dos
Serviços Socioassistenciais descreve que o trabalho em rede se faz necessário na
execução dos serviços da proteção básica com a rede de serviços e deve ser
articulado de forma ousada:

ARTICULAÇÃO EM REDE: - Serviços socioassistenciais de proteção


social básica e proteção social especial; - Serviços públicos locais de
educação, saúde, trabalho, cultura, esporte, segurança pública e
outros conforme necessidades; - Conselhos de políticas públicas e de
defesa de direitos de segmentos específicos; - Instituições de ensino
e pesquisa; - Serviços de enfrentamento à pobreza; - Programas e
projetos de preparação para o trabalho e de inclusão produtiva; e -
Redes sociais locais: associações de moradores, ONG’s, entre outros.
(BRASIL, 2009, p. 15).

Considerando os apontamentos dos servidores lotados nos SCFV citados no


terceiro capítulo, nota-se a necessidade de aprimoramento. Para tanto, uma das
formas encontra-se nas parcerias a serem firmadas aproveitando o potencial que o
município oferece de acordo com as suas características.
Ainda, o caderno de orientações técnicas aponta o caminho de como deve ser
executado o serviço por meio de oficinas e parcerias:

Os encontros dos grupos do SCFV devem criar oportunidades para


que os usuários vivenciem as experiências anteriormente
mencionadas. Isso pode ser efetivado mediante variadas ações. Entre
elas, as oficinas, que consistem na realização de atividades de
esporte, lazer, arte e cultura no âmbito do grupo do SCFV. Essas
atividades podem ser resultado, inclusive, de articulações
intersetoriais no âmbito municipal [...]. (BRASIL, 2016, p.16).

Em conformidade com as características citadas da cidade de Chapecó, se


comparadas a forma de execução do SCFV, urge a necessidade de ampliar ligações
de rede expandindo o olhar e buscando potenciais parceiros em cada território, quais
sejam: Sistema S, sendo que Chapecó conta com SESI, SENAI, SEBRAE, SENAC,
SINE, SEST/SENAT, CIEE, SESC, os quais possuem a cultura da participação em
projetos sociais e que podem ser aprimorados constantemente na questão de
aprendizagem e jovem aprendiz, de cursos profissionalizantes e qualificação
profissional, no empreendedorismo e projetos sociais.
37

As empresas representam uma fonte inesgotável de possibilidades já que são


potenciais a serem sensibilizados pelos profissionais, a contribuírem de acordo com o
ramo de negócio ou vocação, apurar o olhar social dessas empresas de modo a
investirem na qualificação das oficinas diferenciadas no SCFV, e a cumprir as cotas
de jovem aprendiz com visão voltada para as situações de vulnerabilidade.
Outra frente necessária são as Universidades que podem auxiliar em projetos,
e oficinas diferenciadas, gerando produção de conhecimento e sentimento de
pertencimento.
Importante também que os equipamentos públicos estabeleçam relação de
confiança com os diferentes atores do território, conforme citam as orientações
técnicas. E, nesta esfera, ir em busca das lideranças, associações de moradores,
clubes de serviço, dos quais Chapecó apresenta com diversidade. Estes são os olhos
que conhecem mais a fundo algumas realidades que os profissionais não alcançam,
sendo que podem ser pontos de apoio e de divulgação e busca ativa das situações
que necessitam estar inseridas no SCFV.
As sugestões acima mencionadas podem ser materializadas também através
da proximidade com diferentes atores que preveem fontes de recursos como o FIA,
Editais para projetos sociais, entre outros.
Cabe fazer um registro de que essas parcerias precisam contemplar a família
na sua totalidade e não somente a criança e ao adolescente, em concordância com o
que prevê o SUAS.

7. Conclusão

Esta pesquisa atendeu ao objetivo geral de descrever as características do


trabalho em rede na execução do Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculos de Chapecó – SC. Cabe elencar que a SEASC possui os serviços
organizados conforme prevê a Tipificação dos Serviços Socioassistenciais, com uma
rede estruturada e de forma descentralizada.
Quanto aos atores desta rede, são constituídos por diferentes profissionais que
atuam nos serviços, programas, benefícios e projetos da rede socioassistencial e do
SGDCA, os quais têm por função atender à demanda correspondente ao objetivo de
cada serviço e realizar o trabalho com ações integradas. Percebe-se que há uma
38

compreensão coletiva do papel como membro da rede, o que difere é o perfil de cada
ator, a posição que ocupa e o grau de iniciativa.
É notório o empenho dos gestores em atender às necessidades com novos
serviços, e no redirecionamento daqueles já existentes. Observa-se experiências
exitosas, inovadoras no que tange às novas demandas. Entretanto, refletindo a
importância social da rede, a pesquisa revelou a carência de maior aproximação dos
atores e de serviços. Considera-se que tal aproximação garantirá melhoria na
integração das ações, na comunicação, no fluxo e na troca de experiências.
Identificou-se a necessidade dos atores conhecerem melhor a própria rede em que
estão inseridos de modo a aprimorar tais ações.
Outro fator relevante apurado é a constatação de que o CRAS, espaço
territorial, necessita manter-se atento e promover o diálogo e articulação com as
entidades e diferentes instituições, além disso, precisa circular pelo território e
estabelecer vínculos. Os cidadãos primeiramente têm de acessar os serviços do
CRAS de modo a prevenir a violação de direitos.
Considerando que na Assistência Social o trabalho é na sua maior parte
subjetivo, sempre pode ser aprimorado, contudo se faz necessário aperfeiçoar o
trabalho com o capital humano através de capacitações constantes, promovendo,
dessa forma, a cultura proativa, atualização e unificação das ações.
Tornar esta rede proativa, com vida, com interação dos atores deverá ser uma
tarefa constante a ser realizada pelos técnicos e gestores. Cabe ir além, incorporando
ações de plano de capacitação contínua com a integração dos agentes públicos das
demais Secretarias, observando que as ações ultrapassam as fronteiras da SEASC.
Nesse sentido, o desenvolvimento de programas de capacitações se faz
imprescindível, pois mesmo que o ambiente possua características positivas, mas não
são implementados novos elementos motivadores, corre-se o risco de estagnação dos
recursos humanos, comprometendo significativamente a efetividade no atendimento
ao público.
Em relação ao SCFV é executado conforme a Tipificação dos Serviços e
Cadernos de orientação, porém é premente o aprimoramento do trabalho para além
de orientações legais, desenvolver um olhar atendo ao potencial de cada território, de
modo a somar forças na qualificação do serviço por meio de parcerias.
Ao atender crianças e Adolescentes no SCFV é importante saber suas
aptidões, desejos e ao que estão vocacionados para que diante das constatações
39

possa se planejar ações como oficinas, busca por cursos profissionalizantes e


parcerias que complementem o trabalho. Além de outros encaminhamentos e ligações
necessárias com as demais secretarias da Cultura, Esporte, Saúde e Educação.
Nossos atores principais precisam ser ouvidos, considerados e orientados
enquanto seres humanos em situação de vulnerabilidade absoluta e em constante
desenvolvimento, cujas capacidades cognitivas devem ser consideradas e
valorizadas. Permitir a participação é o mesmo que incentivar a desenvolver atitudes
proativas e ser protagonista diante dos múltiplos contextos da vida.
O desafio dos profissionais, a exemplo do técnico de referência e das
coordenações, é sensibilizar a sociedade objetivando orientar na temática a fim de
também construir laços e parcerias que venham qualificar a oferta, abrindo um leque
maior de possibilidades com as empresas de cada território, lideranças,
Universidades, Clubes de Serviço, Sistema S, além de projetos de prevenção e
erradicação do trabalho infantil, encaminhando ao SCFV para preparação e em ato
contínuo ter a possibilidade de inserção em vagas de jovem aprendiz por
vulnerabilidade social.
O conteúdo do estudo poderá ser utilizado e aprimorado para fins de novas
parcerias e captação de recursos destinados à prevenção, objetivando qualificar as
oficinas do SCFV.
É importante destacar que este estudo pretende contribuir para um
aprofundamento em termos da compreensão dos fatores que promovem o trabalho
em rede e SCFV, para a abertura de possibilidades metodológicas de pesquisa a eles
relacionadas e para a melhoria das próprias organizações, constituindo-se, assim,
como uma contribuição efetiva ao estudo no campo da prevenção.
Por fim, para aprimoramento desta pesquisa sugere-se novo estudo com
entrevistas direcionadas às famílias e às crianças e aos adolescentes, público alvo do
SCFV, para obter a real necessidade e expectativas do serviço, e que permitirão
aprofundar os conhecimentos no assunto.

Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 6023: informação


e documentação: referências: elaboração referências. Rio de Janeiro: ABNT, 2018.
40

BALDINI, Juliana Previatto. Cineclubismo e políticas culturais: uma análise das


implicações das políticas do governo Lula na configuração da rede no Rio Grande do
Sul. 2012. 161 f. Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.

BORSOI, Emanuelle; NUNES, Rogério da Silva; COTO, Gabriela Cordioli. O Trabalho


em Rede Entre os Serviços Socioassistenciais da Secretaria de Assistência Social de
Chapecó/SC (SEASC). In: NETTO, Luis Moretto; COSTA, Alexandre Marino;
MORITZ, Gilberto de Oliveira; BUNN, Denise Aparecida (org.). Contribuição para a
Gestão Pública Municipal. v. 2, Florianópolis: Departamento de Ciências da
Administração, 2014. p. 125-150. Disponível em: https://bit.ly/36L1n1D. Acesso em:
17 jan. 2022.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de


outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2002.

BRASIL. Decreto n.º 99.710, de 21 de novembro de 1990. Promulga a Convenção


sobre os Direitos da Criança. Brasília, DF, 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d99710.htm. Acesso em: 20
nov. 2021.

BRASIL. Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança
e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial: República Federativa do
Brasil, Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266. Acesso em: 11 jan.
2021.

BRASIL. Lei n.º 8.742 de 07 de dezembro de 1993. Lei Orgânica da Assistência


Social. [Dispõe sobre a organização da assistência social e dá outras providências, e
legislação correlata]. Câmara dos Deputados: Brasília, 4. ed. 2016.

BRASIL. Ministério da Cidadania. Serviço de Convivência e Fortalecimento de


Vínculos (SCFV) – Perguntas Frequentes. Brasília, DF: Ministério da Cidadania,
2017. 136 p. Disponível: http://blog.mds.gov.br/redesuas/wp-
content/uploads/2021/10/perguntas-frequentes-scfv-1.pdf. Acesso em: 10 dez. 2021.

BRASIL. Ministério da Cidadania. Vínculos crianças de zero até seis anos. Brasília,
DF: Ministério da Cidadania, 2011. Disponível em:
http://blog.mds.gov.br/redesuas/servico-de-convivencia-e-fortalecimento-de-vinculos-
para-criancas-de-0-a-6-anos/. Acesso em: 10 dez. 2021.

BRASIL. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Resolução n.º 113
de 19 de abril de 2006. Dispõe sobre os parâmetros para a institucionalização e
fortalecimento do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Brasília, DF: Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda),
2006. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-
informacao/participacao-social/conselho-nacional-dos-direitos-da-crianca-e-do-
adolescente-conanda/resolucoes/resolucao-no-113-de-19-04-06-parametros-do-
sgd.pdf/view. Acesso em: 20 jan. 2022.
41

BRASIL. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Conselho


Nacional de Assistência Social. Resolução CNAS n.º 269, de 13 dez. 2006. Aprova
Norma Operacional Básica de Recursos Humanos/Sistema Único de Assistência
Social – NOB-RH/SUAS. Brasília, DF: MDS, dez. 2006. Disponível em:
http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/publicacoes-para-impressao-emgrafica.
Acesso em: 08 set. 2021.

BRASIL. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Conselho


Nacional de Assistência Social CNAS. Norma Operacional Básica/Sistema Único de
Assistência Social NOB/SUAS. Resolução CNAS n.º 130, 15 de julho de 2005.
Brasília, DF: Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2005.
Disponível em: http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/publicacoes-para-impressao-
em-grafica. Acesso em: 08 set. 2021.

BRASIL. Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Instituto de


Estudos Especiais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Planos de
Assistência Social: Diretrizes para Elaboração. 1. ed. Brasília: MDS, 2008. 120 p.
Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/SUAS
_Vol3_planos.pdf. Acesso em: 12 dez. 2021.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Conselho


Nacional de Assistência Social CNAS. Resolução n.º 145 de 15 de outubro de 2004.
Aprova a Política Nacional de Assistência Social. Brasília, DF: Conselho Nacional de
Assistência Social CNAS, 2004.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Proteção Social


Especial no Sistema Único de Assistência Social. Revista FONSEAS, Brasília, 2. ed.
n. 11, dez. 2013. Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Revista/Revista-
FONSEAS-GESTAO_SOCIAL_edicao2.pdf. Acesso em: 20 jan. 2022.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Revista CREAS


– Centro de Referência Especializado de Assistência Social 2008- MDS. Brasília:
MDS, 2008. 44 p. Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Revista/RevistaC
reas.pdf. Acesso em 20 jan. 2022.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria


Nacional de Assistência Social. Sistema Único de Assistência Social – SUAS.
Orientações Técnicas sobre o PAIF. 1. ed. Brasília: Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome, v. 2, 2012. Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Orient
acoes_PAIF_2.pdf. Acesso em 12 dez. 2021.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria


Nacional de Assistência Social. Caderno de Orientações: Serviço de Proteção e
Atendimento Integral à Família e Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculos: Articulação necessária na Proteção Social Básica. Brasília, DF: MDS,
2016. 36 p. Disponível:
42

https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Cartilh
a_PAIF_1605.pdf. Acesso em: 16 dez. 2021.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria


Nacional de Assistência. Gestão do Trabalho no âmbito do SUAS: Uma
contribuição necessária para ressignificar as ofertas e consolidar o direito
socioassistencial. Brasília, DF: MDS, Secretaria Nacional de Assistência, 2011. 176 p.
Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Livros/gestaodotr
abalhosuas.pdf. Acesso em: 12 dez. 2021.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria


Nacional de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social – PNAS/
2004 e Norma Operacional Básica de Serviço Social – NOB/SUAS. Brasília, DF:
MDS, 2005. Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNA
S2004.pdf. Acesso em: 10 nov. 2021.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria


Nacional de Assistência Social. Rede SUAS: gestão e sistemas de informação do
Sistema Único de Assistência Social 2007 – SNAS. Brasília: Secretaria Nacional de
Assistência Social, 2007. 141 p. Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Livros/RedeSuas
_gestaoesistema.pdf. Acesso em: 23 jan. 2022.

BRASIL. Resolução nº 01, de 21 de fevereiro de 2013. Dispõe sobre o reordenamento


do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos - SCFV, no âmbito do
Sistema Único da Assistência Social – SUAS. Diário Oficial da União: seção 1,
Brasília, DF, ano 150, n. 38, p. 1-7, 26 fev. 2013.

CARVALHO, Maria do Carmo Brant de. A ação em rede na implementação de


políticas e programas sociais públicos. Información del Tercer Sector, [S. l.], abril,
2003.

CHAPECÓ. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. [San Francisco, CA: Wikimed ia


Foundation, 2022]. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Chapec%C3%B3.
Acesso em: 21 jan. 2022.

CHAPECÓ. Lei n.º 7.175, de 11 de setembro de 2018. Dispõe sobre o Sistema Único
de Assistência Social do Município de Chapecó e dá outras providências. Chapecó:
Câmara Municipal, 2018. Disponível em:
https://leismunicipais.com.br/a1/sc/c/chapeco/lei-ordinaria/2018/717/7175/lei-
ordinaria-n-7175-2018-dispoe-sobre-o-sistema-unico-de-assistencia-social-do-
municipio-de-chapeco-e-da-outras- providencias?r=p. Acesso em: 13 jan. 2022.

CHAPECÓ. Prefeitura de Chapecó. Plano Municipal de Assistência Social, Ano


2022 – 2025. Chapecó, [2021]. 155 p.
43

DUARTE, Jorge. Redes Sociais: um novo enfoque. Correio do Senac, São Paulo,
2003. Disponível em: http://www.senac.br/media/10182/correio697.pdf. Acesso em:
17 de set. 2022.

GIL, Carlos, A. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

GOVERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Conheça


SC/municípios/Chapecó. Florianópolis: Centro Administrativo do Governo de Santa
Catarina, [201-?] Disponível em: https://www.sc.gov.br/conhecasc/municipios-de-
sc/chapeco. Acesso em: 19 jan. 2022.

GUARÁ, Isa Maria F. R (org.). Redes de proteção social.1. ed. São Paulo:
Associação Fazendo História: NECA - Associação dos Pesquisadores de Núcleos de
Estudos e Pesquisas sobre a Criança e do Adolescente, 2010. 97 p.

IBGE. Pesquisa Nacional por amostra. Síntese de indicadores 2009. Rio de


Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2009/.
Acesso em: 23 jan. 2022.

KISSLER, Leo; HEIDEMANN, Francisco G. Governança pública: novo modelo


regulatório para as relações entre Estado, mercado e sociedade? RAP: Rio de
Janeiro, v. 40, n. 3, p. 479-499, maio/jun. 2006. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rap/a/rwrQDBzcvb7qVLGgdBvdWDH/?format=pdf. Acesso em:
20 jan. 2022.

MALMEGRIN, Maria Leonídia. Redes públicas de cooperação local. Florianópolis:


Departamento de Ciências da Administração/UFSC [Brasília: CAPES, UAB], 2010.
140 p. Disponível em: https://acervo.cead.ufv.br/conteudo/pdf/Apostila%20-
%20Redes%20P%C3%BAblicas%20de%20Coopera%C3%A7%C3%A3o%20Local
%20Maria%20Leon%C3%ADdia%20Malmegrin%20%202010.pdf. Acesso em 20 jan.
2022.

SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Desenvolvimento Social. Caderno de


orientações: Referências Técnicas para Construção do plano de Acompanhamento
Familiar. São Paulo: Secretaria de Desenvolvimento Social do Governo de São Paulo,
2013. 57 p. Disponível em:
https://www.desenvolvimentosocial.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/407.pd
f. Acesso em: 8 set. 2022.

TIPIFICAÇÃO dos Serviços Sócio Assistenciais 2009. Resolução n.º 109 de 11 nov.
2009 – Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Gesuas, Minas Gerais,
[201-?]. Disponível em: http://www.gesuas.com.br. Acesso em: 27 jan. 2022.

XAVIER, Helen Cristina Osório; SILVA, Jacqueline Ribeiro; RAMOS, Vanessa Martins;
GONÇALVES, Vera Lucia Canhoto. SUAS: Desafios para sua efetivação. Intertemas,
[S. l.], p. 1-21, [2009]. Disponível em:
http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.php/ETIC/article/viewFile/1358/1297.
Acesso em: 20 nov. 2021.
44

Capítulo II

Direitos fundamentais e princípio da proteção integral:


uma análise exploratória sobre a situação do trabalho
infantil no Maranhão
Fátima de Nazaré dos Santos Nunes

1. Introdução

O trabalho da criança e do adolescente existe desde a antiguidade, entretanto,


na sociedade contemporânea, ainda é um grande problema social. Muitas vezes,
crianças e adolescentes deixam de ir à escola e de ter seus direitos preservados
para trabalhar e garantir a sua subsistência e de seus familiares. O trabalho infantil
é expressamente proibido, conforme dispõe o Art. 7º, XXXIII, da Constituição Federal
(CF/1988, BRASIL, 1988). Promulgado por meio da Lei Nº 8.069/1990, o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) (BRASIL, 1990), a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) e as Conveções internacionais ratificadas pelo Brasil vedam a
realização de qualquer trabalho por menores de 16 anos de idade, salvos os casos
em que existe a condição de menor aprendiz, a partir de 14 anos de idade.
A Doutrina da Proteção Integral foi introduzida no ordenamento juridico
brasileiro por meio do Art. 227 da Constituição Federal. A doutrina de proteção
integral dispõe sobre os direitos básicos de crianças e adolescentes. O artigo
apresenta como obrigação da familia, da sociedade e do Estado a criação de
condições reais capazes de assegurar a utilização desses direitos. Tal dispositivo é
considerado relevante para o enfrentamento do panorama brasileiro de trabalho
infantil na medida em que estabelece normas básicas e procedimentos para a
efetivação do principio da proteção integral. A partir do momento em que as crianças
e adolescentes são inseridos precocemente no mercado de trabalho, passam a ser
vítimas, muitas vezes, de danos que devem ser reparados para que essas crianças
e adolescentes entendam que não foram abandonados e que serão acolhidos.
Trabalho infantil é toda forma de trabalho exercida por crianças e adolescentes
45

de ambos os sexos, abaixo da idade mínima legal permitida, conforme legislação


específica. A Constituição Federal Brasileira estabelece que, até 16 anos
incompletos, meninos e meninas são proibidos de trabalhar, exceto na condição de
aprendiz, a partir dos 14 anos (Art. 7º, inciso XXXIII, CF-1988). Permite-se o exercício
de atividades que cumprem os requisitos legais para a aprendizagem profissional.
Embora o trabalho seja permitido para adolescentes de 16 a 18 anos, há restrições
legais quanto às atividades que podem ser realizadas. Além disso, o trabalho não
pode ser realizado em horário noturno ou em períodos que comprometam a
frequência escolar, não pode ser perigoso, insalubre ou penoso e nem ser exercido
em locais prejudiciais ao desenvolvimento físico, psíquico, moral e social. Estando
nessas condições e sendo exercido por menores de 18 anos, será considerado como
pior forma de trabalho infantil, conforme classificação da Organização Internacional
do Trabalho (OIT), que regulamentou, na Convenção 182, as piores formas de
trabalho infantil, ratificada por vários países, incluindo o Brasil.
Os motivos pelos quais as crianças são inseridas no mercado de trabalho
precocemente são diversos, desde a questão da condição econômica até a
ideológica valoração cultural do trabalho no Brasil. É comum escutar que é melhor
“o menino trabalhando do que na rua, nas drogas ou roubando”, sendo esta uma
forma de culpabilizar o sujeito ou a família por uma questão estrutural da sociedade.
(CAMPOS; ALVERGA, 2001). No Brasil, o tema erradicação do trabalho infantil
ganhou espaço necessário e importante nos anos 1980, sendo este marcado pelo
movimento de defesa dos direitos de crianças e adolescentes, com forte mobilização,
o que culminou na inscrição dos direitos da criança e do adolescente na Constituição
Federal de 1988, direitos regulamentados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente
– ECA (BRASIL, 1990). Apresenta-se ações essenciais para a garantia dos direitos
de crianças e adolescentes.
A Lei confere às crianças e adolescentes o direito fundamental de não
trabalhar, reconhecido na Constituição da República e amparado pelo Princípio da
Proteção Integral. Mesmo assim, o trabalho precoce permanece como uma realidade
na sociedade brasileira. O princípio da proteção integral da criança e do adolescente
tem como marco de origem legal a Constituição Federal de 1988, mais precisamente
o seu dispositivo 227, que estabeleceu como “dever da família, da sociedade e do
Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
46

cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,


além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão”.
Por essas razões, a eliminação da exploração do trabalho infantil e sua correta
inserção no mercado de trabalho se faz tão importante e está entre as prioridades da
sociedade atual. Porém, a ausência de políticas de inclusão social e, principalmente,
econômica, destinadas ao segmento em questão, acarreta o crescimento da miséria
e da pobreza, levando crianças e adolescentes à inserção precoce no âmbito do
mercado de trabalho. Tais situações são geradas em razão da necessidade de
ajudarem no sustento de suas famílias. Sendo assim, é no universo da análise dos
abusos e danos causados pelo trabalho precoce de crianças e adolescentes inseridas
na população economicamente ativa que este estudo se faz presente. Desta forma,
esta pesquisa tem por escopo analisar o trabalho infantil a partir da inserção de
crianças e adolescentes no mercado de trabalho, identificando práticas abusivas e
danosas a sua saúde e ao seu desenvolvimento.
Para a análise das questões aqui levantadas, utilizar-se-á de pesquisas
bibliográficas e legislações sobre o tema em questão para embasar o presente
trabalho, o que configura esta pesquisa como exploratória e descritiva. Os dados
serão apresentados a partir de uma abordagem qualitativa.
Esta pesquisa tem por escopo analisar o trabalho infantil a partir da inserção
de crianças e adolescentes no mercado de trabalho, identificando práticas abusivas e
danosas a sua saúde e ao seu desenvolvimento. Assim sendo, a pesquisa irá
considerar as crianças e adolescentes do município de São Luís, Maranhão, em
situação de trabalho infantil, cujas famílias, incluindo essas crianças e adolescentes,
são atendidas pelo CRAS. Pensa-se de que modo as medidas adotadas pelo CRAS,
que se ampara nas orientações do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
(PETI), têm ajudado na redução desses números.
Conforme aponta Diniz (2020), o Maranhão é o quinto estado que mais explora
o trabalho infantil no Brasil. De acordo com dados levantados pelo Ministério Público
do Trabalho no Maranhão (MPT-MA) e pelo Fórum Estadual de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente no Trabalho (FEPETIMA)
sobre a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE), baseada
em dados coletados em 2016, o estado possui 147 mil crianças e adolescentes de 5
a 17 anos de idade em situação de trabalho infantil, o que representa 8,1% da
47

população maranhense nessa faixa etária. Podemos citar também um levantamento


sobre o trabalho infantil agropecuário. No Maranhão, de acordo com dados do Censo
Agropecuário de 2017, foram identificadas 37.549 crianças e adolescentes com
menos de 14 anos de idade em situação de trabalho neste setor.
Destas, 55,8% eram meninos e 44,2% eram meninas, sendo que 85% se
encontravam ocupadas em estabelecimentos da agricultura familiar e 14,5% na
agricultura não familiar. Ainda de acordo com o levantamento, 89,8% desse total de
crianças e adolescentes tinham algum grau de parentesco com o proprietário do
estabelecimento. Contudo, 10,2% dos trabalhadores precoces não tinham nenhum
laço de parentesco com o proprietário, condição que representa maior grau de
exposição à exploração mercantil direta. Sendo assim, esse trabalho se faz de grande
relevância ao abordar os direitos básicos da criança e do adolescente, elucidando
mais especificamente o contexto do Estado do Maranhão. Apresenta estratégias
capazes de ajudar a diminuir as altas taxas de trabalho infantil, o que justifica a sua
proposição.
A partir do cenário aqui elucidado, chegou-se ao seguinte problema de
pesquisa: de que forma as políticas públicas voltadas a diminuição dos índices de
trabalho infantil têm contribuído com a redução de crianças e adolescentes nesta
situação em São Luís, Maranhão?
Este trabalho tem como objetivo abordar sobre a problemática do trabalho
infantil, elucidando, assim, sob o aspecto do Princípio da Proteção Integral à criança
e ao adolescente, tendo enfoque no Estado do Maranhão.
Nesse sentido, os objetivos específicos são:
 Abordar as concepções acerca do Trabalho Infantil e do Estatuto da
Criança e do Adolescente;
 Abordar o Princípio da Proteção Integral e o Programa de Erradicação
do Trabalho Infantil (PETI), apresentando suas particularidades;
 Verificar o panorama do trabalho infantil no estado do Maranhão nos
últimos anos, apresentando informações relacionadas ao PETI e suas ações no
estado.
Podemos encontrar na Constituição Federal, em seu Art. 7º, XXXIII, a fixação
mínima da idade permitida para o trabalho do adolescente, sendo ela de 16
(dezesseis) anos, excepcionalmente na condição de aprendiz, que se permite a idade
de 14 (quatorze) anos, seguindo o Art. 403 da CLT. Ademais, considera-se trabalho
48

infantil ou trabalho adolescente. Sendo assim, o trabalho infantil é proibido, conforme


elucida Ferreira citado por Oliva, pois: “o período de crescimento, no ser humano, que
vai do nascimento até a puberdade”. Neste contexto, podemos considerar o Estado
do Maranhão como uma das regiões de maior concentração de trabalho infantil do
país, o que revela uma problemática de grande relevância para a sociedade, fazendo-
se necessário uma reflexão sobre este tema e, assim, um aprofundamento, que, no
caso deste trabalho, aborda o Princípio da Proteção Integral, aplicada à temática
abordada.

2. Referencial teórico

2.1 O trabalho infantil no Brasil e o Estatuto da Criança e do


Adolescente (ECA)

A exploração do trabalho de crianças e adolescentes é fato vivenciado não


somente na sociedade atual. É uma prática corriqueira desde tempos mais
antigos. Porém, a exploração do trabalho infantil só ganhou relevância a partir do
período da Revolução Industrial. No Brasil, desde o seu “descobrimento”, em 1.500
d.C., é possível verificar o abuso na exploração do trabalho infantil. Nas caravelas
portuguesas, crianças e adolescentes entre 9 e 16 anos eram submetidas a trabalhos
perigosos, conhecidos como “pequenos grumetes”, ocasião em que iniciavam a
carreira na Armada. Estima-se que 10% da frota de Cabral era formada por estes
pequenos marinheiros, que trabalhavam no convés, fazendo faxina nos porões e
remendando velas (RIBEIRO, 2009).
Além disso, sabe-se que os escravos não eram vistos como pessoas e sim
como coisas, estando sujeitos aos mandos de seus senhores, que os forçavam a
trabalhar desde a tenra idade. Essa realidade é mencionada por Erotilde Ribeiro dos
Santos Minharro:

Aos quatro anos de idade os escravos desempenhavam tarefas


domésticas leves nas fazendas; aos oito anos poderiam pastorear
gado; as meninas aos onze anos costuravam; e, aos quatorze anos,
tanto os meninos quanto as meninas, já laboravam como adultos
(MINHARRO, 2003, p. 22).
49

No mesmo sentido, José Ribeiro Dantas Oliva (2006, p. 84-85), em sua crítica
sobre a sociedade atual, alerta que "[...] mais de um século depois, trabalhadores
brasileiros ainda são reduzidos à condição análoga a de escravos, de diversas formas,
inclusive, crianças e adolescentes". Vale dizer, por fim, que a primeira norma brasileira
que tratou de proteger o trabalhador infantil ocorreu por meio do Decreto Nº 1.313, de
1891, no qual proibia-se o trabalho de crianças e adolescentes nas fábricas (BRASIL,
1891). Diante das experiências de vida de milhares de crianças e de seus familiares,
deparamo-nos com um problema social complexo e que gera debates desde o século
XX, em nível nacional e internacional, que é a questão do trabalho infantil.
Mesmo diante de uma legislação rígida, que proíbe o trabalho desse público,
mesmo com as lutas das organizações não governamentais e com a criação de
serviços e programas voltados para o combate do trabalho infantil, esse problema
ainda faz parte do universo de muitas crianças e adolescentes brasileiros e parece ser
uma questão “impossível” de ser resolvida (NASCIMENTO, 2011). É considerado
trabalho infantil todo trabalho realizado por menores de 14 anos de idade; todo o
trabalho desempenhado por adolescentes entre 14 e 16 anos de idade que não esteja
configurado como aprendizado e que esteja de acordo com os requisitos legais dessa
modalidade profissional; todo trabalho realizado por crianças e adolescentes, com
idade inferior a 18 anos, que seja caracterizado como perigoso, penoso, insalubre,
noturno, prejudicial à moralidade, realizado em locais ou horários que possam
prejudicar a frequência escolar ou com possibilidade de causar prejuízos ao
desenvolvimento físico e psicológico. O Art. 227 da Constituição Federal, determina
que:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao


adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar
e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão (BRASIL, 1988).

O Art. 7°, inciso XXXIII, estabelece que a idade mínima para o ingresso no
mercado de trabalho é de 16 anos, exceto em condições de aprendiz, com idade a
partir de 14 anos. Ainda se tratando dos marcos legais brasileiros relacionados ao
combate e a erradicação do trabalho infantil, podemos utilizar como base: o Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA); a Lei Nº 8.069/1990, especialmente os seus
50

artigos 60 e 69; o artigo 402 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo
Decreto-Lei Nº 5.452, de maio de 1943; a Convenção Nº 138/1973 da OIT, que aponta
os limites de idade mínima para o trabalho, promulgada pelo Brasil em 1999; a
Convenção Nº 10.097, de dezembro de 2000, responsável por regulamentar a
aprendizagem; o Decreto Nº 6.481, de junho de 2008, que lista as piores formas de
trabalho infantil. Tais artigos são relevantes a esta discussão.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é o principal diploma legal
acerca dos direitos de crianças e adolescentes e veio para regulamentar os preceitos
constitucionais a favor da infância e juventude; baseado na doutrina de proteção
integral reforça a ideia de prioridade, estabelecida anteriormente pela Constituição
Federal de 1988. Ao contrário do Código de Menores (que era direcionado às crianças
e adolescentes que se encontravam em situação irregular), o ECA se preocupa com
a proteção integral de todos os menores de 18 anos, criando instrumentos legais que
observam a garantia dos direitos que lhes são assegurados, independentemente da
condição (COSTA; DIEHL, 2016).
De acordo com Saraiva (2003), o ECA se firma no princípio de que todas as
crianças e adolescentes são detentores dos mesmos direitos, independentemente da
sua condição, desfazendo a ideia de que os Juizados de Menores eram destinados
apenas às crianças e adolescentes que se encontram em risco moral e social, sem
distinção entre menores infratores ou abandonados, conforme previa o Código de
Menores, a partir da doutrina da situação irregular. Sendo assim, o estabelecimento
dos limites de idade mínima para o trabalho está fundamentado na garantia do
desenvolvimento pleno das crianças e adolescentes que não podem ser prejudicados
pelas consequências advindas do trabalho infantil e pela garantia da conclusão de
escolaridade obrigatória no nível básico com tempo livre para estudar, brincar, lazer,
cultura, arte e esporte, bem como prevê a proteção contra as vulnerabilidades sociais.
No Brasil, por meio do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o
Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário atua para implementar projetos,
serviços e programas que atuam na rede de proteção socioassistencial à criança e ao
adolescente. Fazem parte deste sistema único: o Centro de Referência Especializado
de Assistência Social (CREAS) e o Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS) e dentro deles encontra-se o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
(PETI).
51

2.2 O princípio da proteção integral

O princípio da proteção integral surgiu na década de 80, delimitado pela


Comissão de Direitos Humanos da ONU, no lugar do paradigma da situação irregular,
entendo, assim, as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. Após a
aprovação da Convenção Internacional dos Direitos da Criança eliminou-se, assim, o
instituto jurídico do menor, pois modificou-se completamente a forma que crianças e
adolescentes deveriam ser tratados. Consolidou-se com isso a Doutrina da Proteção
Integral. Sendo assim, no Brasil, o princípio da proteção integral da criança e do
adolescente se originou legalmente na Constituição Federal de 1988, mais
especificamente no seu dispositivo 227. No texto legal, se estabelece como dever da
família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los à salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Um tempo depois, com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente,
esse princípio se tornou ainda mais notável em sua estrutura, principalmente referente
aos direitos fundamentais destes seres humanos. Reproduziu-se, assim, no Estatuto,
como já indicava a Carta Magna, os meios e instrumentos necessários para a
efetivação e garantia de cada um dos direitos fundamentais da criança e do
adolescente.
Neste sentido, Cury, Garrido e Marçura abordam ainda:

A proteção integral tem como fundamento a concepção de que


crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à
sociedade e ao Estado. Rompe com a ideia de que sejam simples
objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares
de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos
especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo
de desenvolvimento (2002, p. 21).

Desta feita, pode-se discutir sobre o Programa de Erradicação do Trabalho


Infantil (PETI).
52

2.3 Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI)

A presença de políticas públicas no Brasil que objetivam a proteção e, ao


mesmo tempo, almejam minimizar a exploração de crianças e adolescentes que se
encontram em situação de risco e vulnerabilidade social, além do trabalho em zonas
urbanas e rurais e vias públicas, e até mesmo dentro de suas próprias residências,
ocorre por intermédio do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), criado
em 1996 pelo governo federal. O objetivo até hoje é a retirada de crianças e
adolescentes, com idade entre 7 e 14 anos, de atividades laborativas insalubres e
perigosas. O PETI é um programa de âmbito nacional que vincula diversas ações com
o intuito de proteger e retirar crianças e adolescentes com idade inferior a 16
(dezesseis) anos de atividades laborais precoces, exceto de trabalhos na condição de
menor aprendiz, a partir de 14 anos, de acordo com que é estabelecido pela lei de
aprendizagem Nº 10.097/2000 (BRASIL, 2000).
Trata-se de um programa de natureza intersetorial e intergovernamental que
presume, em três esferas de governo, a integração de um conjunto de organizações
governamentais e não governamentais, em prol do desenvolvimento de iniciativas,
ações e estratégias. Visa-se o enfrentamento do trabalho infantil. A partir da portaria
do Ministério do Desenvolvimento Social Número 666, de dezembro de 2005, o PETI
foi integrado ao Programa Bolsa Família, que não se pautou na extinção, mas na
integração de dois programas. Assim sendo, preserva as suas especificidades. Isto
faz com que, ao mesmo tempo, os dois programas ajam em conjunto, pois ambos têm
como objetivo combater a pobreza e erradicar o trabalho precoce. O PETI ampliou
seu foco para atender as várias situações de trabalho de crianças e adolescentes com
idade inferior a 16 anos (BRASIL, 2005).
Cabe ressaltar que o PETI se articula com a política de educação e tem como
objetivo garantir o acesso, a permanência e o sucesso escolar das crianças e
adolescentes que foram identificadas em situação de trabalho infantil ponto final neste
contexto. Destaca-se a relevância da inclusão prioritária deste grupo em uma escola
de tempo integral (BRASIL, 2010). Entretanto, para que seja possível um
acompanhamento e a fiscalização em todo país, criou-se o Sistema de Garantia de
Direitos da Criança e do Adolescente (SGDGA). Ele conta com diversas ações e
metas indispensáveis para o controle a erradicação do trabalho infantil. Para Muzzio
53

e Costa (2012), as políticas públicas vão de encontro à promoção e ao exercício pleno


da cidadania. Para tal, é necessário um diagnóstico nacional, local e regional. Este
deve contemplar a realidade da população de crianças e adolescentes em situação
de vulnerabilidade e que sobrevivem do trabalho imposto pela necessidade de se
alimentar ou por outras situações de sobrevivência
Diante das informações expostas, para solucionar o problema da exploração
do trabalho infantil, é necessária a participação da sociedade civil por meio de
denúncias. Além disso, há que se chamar a atenção das instituições governamentais
e das organizações não governamentais para que criem projetos que garantam que
estas crianças e adolescentes tenham o direito de viver com dignidade, tornando-se
adultos ativos na sociedade.

3. Metodologia

Para o desenvolvimento do presente estudo optou-se por uma abordagem


descritiva, de caráter bibliográfico e documental. Para tal, foi realizada uma busca em
artigos científicos e livros. Além de consultas em importantes documentos como a
Constituição Federal Brasileira, o Estatuto da Criança e do Adolescente, documentos
que regulamentam o PETI também foram considerados. Para a pesquisa de
embasamento teórico foram utilizadas as plataformas: Portal de Periódicos do
CAPES, Google Acadêmico e SCIELO. Considerou-se os seguintes descritores:
“trabalho infantil” e “Programas de erradicação do trabalho infantil”, e então foram
inseridos os seguintes filtros: idioma português, textos completos, publicação no
período de 2008 a 2018.
Foi realizada uma busca detalhada em demais fontes da internet, cujo intuito
foi o de levantar informações acerca dos números de crianças e adolescentes em
situação de trabalho infantil nos últimos anos. Focou-se no panorama que assola o
estado do Maranhão há muitos anos, porém, que tem sido reduzido por meio das
políticas públicas. Os dados coletados serão apresentados de forma descritiva, pois
essa é uma forma de evidenciar o cenário e as ações para combatê-lo.
Posteriormente, foi realizada uma pesquisa no Sistema de Avaliação e Gestão da
informação (SAGI). Para tanto, utilizou-se o VIS DATA 3, pois este permite a
visualização de programas, ações e serviços do Ministério da Cidadania. A partir das
54

ferramentas de filtro disponibilizadas pelo programa, levantou-se a quantidade de


famílias com pelo menos um membro em situação de trabalho infantil inscritas no
Cadastro Único, com o objetivo de identificar e caracterizar os casos de trabalho
infantil registrados no Estado Maranhão entre janeiro de 2018 e dezembro de 2020.
Os dados obtidos encontram-se apresentados no decorrer deste estudo, pois,
assim, possibilita-se uma visão mais abrangente da dimensão deste problema social
que assola tantas famílias há vários anos. Para responder ao problema de pesquisa
delimitado, que é analisar de que forma as políticas públicas voltadas a diminuição
dos índices de trabalho infantil tem contribuído com a redução de crianças e
adolescentes nesta situação em São Luís, Maranhão, optou-se por analisar os dados
equivalentes às famílias em que há pelo menos um membro em situação de trabalho
infantil que se encontravam registradas no CadÚnico e que foram auxiliadas pelo
CRAS na cidade de São Luís, Maranhão. Em um primeiro momento, considerou-se
os dados fornecidos pela Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI),
pois eles exprimem a realidade das crianças e adolescentes nessa situação.
Os critérios para a escolha das famílias onde habitam essas crianças e
adolescentes foram: (I) famílias da cidade de São Luís, Maranhão, registradas no
CadÚnico; (II) dados do período de janeiro de 2018 a dezembro de 2020; (III)
informações disponibilizadas pelo Ministério Público do Trabalho no Maranhão (MPT-
MA) e pelo Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e
Proteção ao Adolescente no Trabalho (FEPETIMA) quanto à situação do trabalho
infantil no Maranhão; dados do Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a
Famílias e Indivíduos (PAEFI) e Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Famílias
(PAIF) para a análise dos efeitos das políticas públicas mobilizadas no CRAS que têm
como objetivo a minimização das crianças e adolescentes em situação de trabalho
infantil.
55

4. Levantamento, análise e resultados

4.1 Leitura, sistematização dos dados ou das informações


obtidas

O trabalho infantil trata-se de uma forma de violação dos direitos fundamentais


de crianças e adolescentes inerentes a fatores vitais, como, por exemplo, a vida, à
saúde, ao brincar, à educação, ao lazer, à convivência familiar e à formação
profissional (PAGANINI, 2011; CUSTÓDIO; CABRAL, 2019; PINHEIRO; MOREIRA,
2019). Todas as formas de trabalho infantil são proibidas para crianças e adolescentes
com idade inferior a 16 anos (Art. 7°, inciso XXXIII da Constituição Federal de 1988),
salvas as exceções para os casos de aprendizagem profissional, pois essa
possibilidade é permitida, desde que o adolescente tenha quatorze anos de idade.
Nos anos 2000, o Brasil ratificou a Convenção 182 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT). A partir de então o país assumiu o compromisso de adotar medidas
eficazes e imediatas para garantir a proibição e eliminação das piores formas de
trabalho infantil em caráter de urgência.
Em cumprimento à referida convenção, o país elaborou uma lista que
contempla as piores formas de trabalho infantil, chamada de lista TIP. O documento
destaca algumas dessas formas, tais como: trabalho infantil doméstico; trabalho
infantil na agricultura; trabalho infantil na produção e no tráfico de drogas; trabalho
infantil no lixo ou com lixo; trabalho infantil informal urbano; e a exploração sexual de
crianças e adolescentes. Mesmo diante da evolução social do país e da criação de
políticas públicas e legislações com o intuito de reverter o número e de erradicar esse
tipo de situação, muitas crianças e adolescentes precisam abrir mão de seus direitos
garantidos e se submeter a situações que não são de sua responsabilidade, o que
ressalta a necessidade de mais atenção a esse problema mundial.
De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD), no ano de 2019, 1.758 milhões de crianças e adolescentes com idade entre
5 e 17 anos se encontravam em situação de trabalho infantil no país antes da
pandemia. Deste total, 706 mil vivenciavam as piores formas de trabalho infantil. Os
números não incluem adolescentes que trabalham legalmente no país por meio de
contratos de trabalho devidamente regulamentados. De acordo com o Estatuto da
56

Criança e do Adolescente (ECA), diariamente, quase dois milhões de crianças e


adolescentes têm sua infância violada por uma situação que deve ser combatida não
apenas pelo Estado, mas também pela sociedade e família dos menores sujeitos a
tais situações. No Maranhão, aproximadamente 147 mil jovens desempenham algum
tipo de atividade irregular. Essa realidade fomenta as iniciativas dedicadas ao
combate do trabalho infantil (ALBUQUERQUE JÚNIOR et al., 2019). Como esta
pesquisa é exploratória e descritiva, os dados serão interpretados do ponto de vista
da abordagem qualitativa.
Para responder ao problema de pesquisa delimitado, que é analisar de que
forma as políticas públicas voltadas a diminuição dos índices de trabalho infantil tem
contribuído com a redução de crianças e adolescentes nesta situação em São Luís,
Maranhão, optou-se por analisar os dados equivalentes às famílias em que há pelo
menos um membro em situação de trabalho infantil que se encontravam registradas
no CadÚnico e que foram auxiliadas pelo CRAS na cidade de São Luís, Maranhão.
Em um primeiro momento, considerou-se os dados fornecidos pela Secretaria de
Avaliação e Gestão da Informação (SAGI), pois eles exprimem a realidade das
crianças e adolescentes nessa situação. Os critérios para a escolha das famílias onde
habitam essas crianças e adolescentes foram: (I) famílias da cidade de São Luís,
Maranhão, registradas no CadÚnico; (II) dados do período de janeiro de 2018 a
dezembro de 2020; (III) informações disponibilizadas pelo Ministério Público do
Trabalho no Maranhão (MPT-MA) e pelo Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação
do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente no Trabalho (FEPETIMA) quanto à
situação do trabalho infantil no Maranhão; dados do Serviço de Proteção e
Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) e Serviço de Proteção e
Atendimento Integral a Famílias (PAIF) para a análise dos efeitos das políticas
públicas mobilizadas no CRAS que têm como objetivo a minimização das crianças e
adolescentes em situação de trabalho infantil.
As informações a serem consideradas para o entendimento da situação atual
do Maranhão serão consultadas na Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação
(SAGI) e pelo Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e
Proteção ao Adolescente no Trabalho (FEPETIMA). Além disso, para a análise da
efetividade das políticas públicas que visam à erradicação do trabalho infantil,
considerar-se-á os resultados apresentados no Caderno de Orientações do Programa
de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI. Para compreender a dimensão da
57

problemática apresentada no presente estudo, primeiramente, cabe apresentar o


número de famílias com pelo menos um membro em situação de trabalho infantil.
Essas famílias foram inscritas no Cadastro Único. Utiliza-se como exemplo o
município de São Luís – MA, pois houve uma redução significativa nesses números,
de acordo com dados da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI),
sendo assim, na Tabela 1 é possível observar os dados apurados.

Tabela 3 - Situação do trabalho infantil segundo dados das famílias inseridas no CadÚnico em São
Luís - MA (janeiro de 2018 – dezembro de 2020)

MÊS ANO
2018 2019 2020
Janeiro 156 86 60
Fevereiro 153 85 55
Março 148 84 54
Abril 146 82 53
Maio 145 81 53
Junho 145 80 53
Julho 141 79 52
Agosto 126 78 52
Setembro 123 73 52
Outubro 118 70 52
Novembro 118 70 51
Dezembro 108 61 50

Fonte: 1 - VIS DATA 3 (2022)

Com base nas informações apresentadas na Tabela 1, é possível verificar a


redução significativa do número de famílias inseridas no Cadastro único (CadÚnico)
com pelo menos um membro em situação de trabalho infantil. No ano de 2018, 156
famílias tinham pelo menos um membro em situação de trabalho infantil, enquanto na
última pesquisa, relacionada a dezembro de 2020, esse número havia caído para 50
famílias. Os dados são alarmantes, pois, em razão disso, mais crianças e
adolescentes não conseguem se dedicar a outras atividades essenciais a sua
formação, como é o caso da educação. Entretanto, é importante salientar a
necessidade de zerar esses números, demandando ainda mais atenção por parte dos
órgãos competentes.
Os dados demonstram um avanço para as políticas de erradicação do trabalho
infantil, porém, não exime a necessidade de mais atenção a este segmento da
população, visto que, os dados apontam apenas informações oficiais, de famílias
cadastradas, mas, existem ainda diversas crianças sujeitas a essa situação, que se
58

encontram omitidas. De acordo com informações divulgadas pelo Ministério Público


do Trabalho no Maranhão (MPT-MA) e pelo Fórum Estadual de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente no Trabalho (FEPETIMA),
no ano de 2016, o Maranhão ocupava o 5° lugar do país em exploração de trabalho
infantil (DINIZ, 2020).
Na Tabela 2 apresenta-se o panorama do trabalho infantil no Maranhão,
utilizando o último PNAD do ano de 2016, como referência, as informações são
apresentadas em grupos diferenciados por faixa de idade, sendo:

Tabela 4 - Índice de trabalho infantil no Maranhão em 2016

FAIXA ESTIMATIVA TRABALHO TAXA RANKING COR OU RAÇA


ETÁRIA IBGE CONSUMO OCUPAÇÃO NACIONAL
PRÓPRIO

05-09 anos 02 mil 09 mil 1,4% 5º 5 mil


10-13 anos 11 mil 31 mil 5,4% 4º 21 mil
14-15 anos 25 mil 39 mil 13,2% 8º 29 mil
16-17 anos 56 mil 68 mil 22,6% 10º 33 mil
TOTAL 94 mil 147 mil 108 mil

Fonte: PNAD (2016)

Dados do Ministério da Cidadania apontam que, em 2015, 18.298 famílias


maranhenses inseridas no CadÚnico tiveram registros de trabalho infantil, enquanto
no ano de 2020 essa estatística caiu para 2.226 famílias. Esse número é um dos
indicadores de que o plano de enfrentamento à essa nova prática tem obtido êxito. As
crianças e adolescentes foram retiradas da condição de violação dos direitos, sendo
inseridas em serviços socioassistenciais com acompanhamento familiar no âmbito da
política de assistência social. Esses serviços, somados aos outros tipos de iniciativas
governamentais, dentre outras políticas públicas, geraram bons resultados. O gráfico
a seguir aponta os municípios com maior concentração do trabalho infantil no estado
do Maranhão.

Gráfico 1 - Municípios com maior concentração de trabalho infantil no estado do Maranhão


59

Por meio de políticas públicas eficientes, o Governo do Estado reduziu em


87,8% o número de famílias inseridas no CadÚnico. A Secretaria de Desenvolvimento
Social (SEDES), aliada ao Fórum Estadual de Prevenção do Trabalho Infantil no
Maranhão (FEPETIMA) e demais órgãos, tem desenvolvido ações com o intuito de
garantir oportunidade de desenvolvimento humano e social para todas crianças e
adolescentes do Estado. De acordo com a pesquisa supracitada, no ano de 2016, o
Estado tinha 147 mil crianças e adolescentes, com idades entre 5 e 17 anos, em
situação de trabalho infantil. Isso representava 8,1% do total da população
maranhense nessa faixa etária. O ranking nacional de vítimas do trabalho infantil é
liderado pelos seguintes estados: Acre (10,6%), Rondônia (10,5%), Pará (9,3%), Piauí
(8,8%) e Maranhão (8,1%). No ano de 2016, em todo o Brasil, 2,4 milhões de crianças
e adolescentes trabalhavam, totalizando 6% da população nesta faixa etária e naquela
época.
Entre os anos de 2010 e 2019 houve uma queda de 144.000 para 86.977, isto
é, uma redução de 60% no número de casos. O estado apresenta uma constante
tendência de queda nas últimas décadas. Segundo as últimas Pesquisas Nacionais
por Amostra de Domicílios (PNAD), realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), entre os anos de 2014 e 2015, aproximadamente 55 mil crianças
deixaram de lado atividades laborais. O percentual de ocupados de 5 a 17 anos de
idade é de 7,80%. O Estado do Maranhão possui o maior índice de trabalho infantil
agropecuário do Nordeste (53,1%) e o maior índice de trabalho infantil doméstico da
região (8,3%). Mesmo diante da pandemia da Covid-19, cuja determinação era o
isolamento social, crianças e adolescentes foram vistos exercendo atividades laborais.
Conforme Araújo (2021), o Ministério Público do Trabalho no Maranhão (MPT-MA),
60

em 2021, apontou que mesmo durante a pandemia foram registradas 46 denúncias


de trabalho infantil no Estado do Maranhão.
Araújo (2021) também pontua que a Secretaria Municipal da Criança e
Assistência Social (SEMCAS) informou que nos primeiros cinco meses do ano de
2021, em São Luís – MA, foram identificadas 106 crianças ou/e adolescentes em
situação de trabalho infantil. Araújo (2021) também reitera que, no ano de 2020, o
órgão ministerial trabalhista ajuizou oito ações civis públicas para busca e condenação
de empregadores flagrados em prática de trabalho infantil. Foram abertos quatro
exemplos promocionais que tratam de ações para prevenção do trabalho infantil e
firmados três termos de ajuste de condutas para a prevenção do trabalho infantil.
Conforme Saldanha (2020), podemos citar também que, desde 1998, o governo
brasileiro, sob a presidência do Presidente Fernando Henrique Cardoso, tem
desenvolvido programas e ações na área social visando à proteção e ao
desenvolvimento infantil, abrangendo as diversas áreas de trabalho, educação, saúde,
cultura, direitos humanos e previdência social, combatendo também o trabalho infantil
no Brasil. Dentre as ações do Governo do Maranhão que influenciam diretamente na
redução do número de crianças e adolescentes em situação de trabalho precoce, há
que se frisar a proposta do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do
Adolescente do Maranhão (CEDCA/MA), pois, em parceria com a Secretaria Estadual
de Educação, coordenou o processo de construção do Plano Estadual de Prevenção
e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador, que
resultou na sua atualização para vigência de 10 anos.
Esse plano tem como objetivo orientar ações voltadas para a eliminação e
prevenção do trabalho infantil no Estado. É um marco referencial que colabora com a
criação de estratégias voltadas à elaboração de ações, projetos, programas e serviços
que contemplam diversas políticas públicas voltadas para a eliminação e combate do
trabalho de crianças e adolescentes. O plano é estruturado em 7 (sete) eixos
estratégicos:
61

Figura 1 - Eixos estratégicos do PETI

Fonte: Maranhão, 2021

A rede socioassistencial identifica e acompanha famílias de crianças e


adolescentes que se encontram nessa situação por meio do Serviço de Proteção e
Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI), sendo encaminhadas ao
Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Famílias (PAIF), visando complementar
o trabalho social que já é desenvolvido com essas famílias. É uma forma de prevenir
a ocorrência de situações de risco social e de fortalecer os vínculos familiares e
também comunitários a partir da convivência (MDS, 2018). Geralmente, essa
identificação é realizada pela equipe volante do CRAS, já que este trabalha por
território, o que facilita a identificação de grupos vulneráveis na zona rural,
comunidades indígenas, quilombolas, etc., e também pelo Serviço de Abordagem
Social, que é realizado pelas equipes dos CREAS.
O desafio consiste em identificar crianças e adolescentes inseridos nessas
atividades, de difícil visibilidade e identificação, e inseri-los nos serviços da rede
socioassistencial e das demais políticas públicas. Esse redesenho do PETI fortalece
o papel de articulação e gestão da Rede de Proteção ao prever a realização de Ações
Estratégicas para enfrentamento do trabalho infantil e prevê financiamentos
específicos para que municípios e estados possam desenvolver suas ações
estruturadas em cinco eixos:
62

1. Informação e mobilização: Sensibilização, Mobilização Social, Campanhas,


Audiências Públicas;
2. Identificação: Busca Ativa, Notificação Integrada, Registro CADÚNICO;
3. Proteção Social: Transferência de Renda; Inserção em Serviços de Assistência
Social, Saúde, Educação, Cultura, Esporte e Lazer, e Trabalho p/ as famílias;
4. Defesa e Responsabilização: Fiscalização e autuação dos empregadores,
Aplicação de Medidas protetivas à família, Audiência pública para pactuação;
5. Monitoramento: Identificação, Atendimento criança, adolescente e família,
metas pactuadas.

Esse redesenho do PETI propõe o aperfeiçoamento do modelo de gestão.


Potencializa o enfrentamento as práticas de trabalho infantil por meio da articulação
dos serviços socioassistenciais, da interlocução com o Sistema de Garantia de
Direitos e de ações intersetoriais com órgãos de defesa de direitos e com a sociedade
civil. O Caderno de Orientações do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil –
PETI, é o documento que define o que é o trabalho infantil, os tipos de trabalho infantil,
os mitos sobre tais trabalhos, ações estratégias para a erradicação do trabalho infantil
e discute sobre a importância da intersetorialidade no combate ao trabalho infantil e
sobre as formas de financiamento de ações estratégicas. Os resultados dessas ações
podem ser visualizados nos Cadernos lançados anualmente.

5. Conclusão

Conforme elucidam Costa e Diehl (2016), o trabalho infantil é uma prática


observada ao longo da história. Esta prática conta com características distintas, pois,
em cada tempo e sociedade, há diferentes processos de reconhecimento e
valorização dos direitos humanos das crianças e adolescentes. A conscientização de
seus prejuízos ao desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, o estabelecimento
de regras que restringem o limite de idade para ingresso no mercado de trabalho, o
reconhecimento das piores formas de trabalho infantil e a efetividade de normas de
proteção especial para os infantes são desafios enfrentados ainda na atualidade e que
colocam à prova o sistema de proteção integral e as políticas públicas de prevenção
63

e combate. Segundo dados do Governo do Maranhão (2021), o trabalho infantil é um


dos problemas sociais mais graves existentes no Brasil.
Há alguns motivos para que este problema seja considerado como grave. Além
de reproduzir o ciclo de pobreza da família, a prática ilegal prejudica o aprendizado da
criança e do adolescente, pois, em muitas vezes, são retirados da escola e se tornam
vulneráveis em diversos aspectos, como nas áreas que envolvem a saúde, exposição
à violência, assédio sexual, esforços físicos intensos, acidentes com máquinas e
animais no meio rural, além de privá-los de viver uma infância normal e de desenvolver
suas habilidades. No Maranhão, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) de 2015 apontam que, aproximadamente, 166 mil crianças e
adolescentes são exploradas no trabalho. Além das marcas físicas e psicológicas
irreparáveis causadas nas vítimas, a prática é uma grave violação dos direitos
humanos e dos direitos e princípios fundamentais no trabalho.
Neste contexto, de acordo com Perez (2008, p. 77), o princípio da proteção
integral ou da prioridade absoluta da criança e do adolescente “apresenta-se como
marco para o estabelecimento de novos parâmetros de atuação dos órgãos estatais
e de toda sociedade”. Sendo assim, as crianças e os adolescentes podem ser
classificados como seres em pleno desenvolvimento. A família, que tem
responsabilidade universalmente reconhecida como um dever moral, decorrente da
consanguinidade e do fato de ser o primeiro ambiente em que a criança toma contato
com a vida social, é o núcleo onde o adolescente tem a possibilidade de revelar mais
rapidamente suas deficiências e as agressões e ameaças. A família, então, deve
assegurar a integridade física, a formação psíquica e moral e proporcionar o que de
melhor houver e estiver ao seu alcance para um desenvolvimento sadio e completo
da criança e do adolescente.
Em geral, a comunidade e a sociedade devem facilitar a integração daqueles
que estão em formação, pois essa é uma forma de respeitar a sua individualidade
enquanto pessoas e de empreender todos os meios possíveis para ajudar a
desenvolver as suas potencialidades. A participação por meio de organizações
representativas (ONGs) e da formulação de políticas voltadas para o atendimento
infantil e do controle das ações em todos os níveis é fundamental. O Estado,
personificado no Poder Público pelo ECA, tem, por sua vez, o dever de elaboração
legislativa compatível com o princípio acolhido, adotando, nos seus três níveis (União,
Estados e Municípios), providências que assegurem o acesso das crianças e
64

adolescentes aos seus direitos, ou seja, deve proporcionar a necessária proteção por
meio do desenvolvimento de ações governamentais direcionadas e de políticas
públicas e sociais de inclusão. Deve prestar educação, investir na saúde, propiciar
uma tutela jurisdicional diferenciada, enfim, converter impostos em bem-estar, o que
nada mais é do que sua obrigação.
Sendo assim, entende-se que para alcançar a proteção integral é essencial a
efetivação dos chamados direitos sociais de crianças e adolescentes, principalmente
“educação, saúde, profissionalização, direito ao não-trabalho no seu imbricamento
com direito à alimentação”. Neste contexto, é compromisso da família, da sociedade
e do Estado a efetiva concretização dos direitos infantis. Se houver uma conjugação
de esforços e todos cumprirem com a sua parte, as crianças e adolescentes “poderão
desfrutar, de fato e na sua plenitude, das conquistas que o ordenamento jurídico lhes
assegura, [...] justamente em razão do peculiar estágio da vida em que se encontram,
ou seja, do seu desenvolvimento incompleto” (OLIVA, 2006, p. 110). Portanto, com o
desenvolvimento deste trabalho, foi possível abordar a contextualização da temática
do trabalho infantil, elucidando, assim, os principais conceitos relacionados, bem
como o Princípio da Proteção Integral e sua aplicação no contexto nacional, visando
garantir os direitos fundamentais as crianças e adolescentes.
Para tanto, abordou-se mais especificamente o contexto do Maranhão, com
foco nos efeitos das políticas de incentivo de proteção a esses sujeitos nesse Estado
específico. Tendo em vista a problemática do trabalho infantil e suas implicações para
a sociedade, este trabalho é de extrema importância para os estudos sociais de modo
geral, visto que abordou conceitualmente os principais aspectos do trabalho infantil e
seus prejuízos no meio social. Elucidou também sobre o Princípio da Proteção Integral
como medida legal para combater esse problema, para, assim, garantir que os direitos
fundamentais das crianças e adolescentes sejam efetivados. Por fim, abordamos esse
contexto elucidando o Estado do Maranhão e as principais estatísticas que envolvem
o trabalho infantil nesse Estado, bem como apresentamos as políticas de combate ao
trabalho infantil existentes a nível nacional.
Esperamos, assim, com o desenvolvimento deste estudo, proporcionar uma
visão mais abrangente sobre o tema do trabalho infantil, bem como é uma forma de
esclarecer a atuação do Princípio da Proteção Integral, pois, assim, desenvolve-se
cada vez mais as habilidades necessárias para o exercício da profissão.
65

Referências
ALBUQUERQUE JUNIOR, A. B. de. et al. A política pública proeja (informática) no
instituto federal de educação, ciência e tecnologia do Ceará (IFCE) de UMIRIM:
análise de influências na evasão escolar. Brazilian Applied Science Review, v. 3, n.
6, p. 2323-2331, 2019.

ARAÚJO, I. MA: MPT recebeu 46 denúncias de trabalho infantil na pandemia. O


Estado, 2021. Disponível em:
https://imirante.com/oestadoma/noticias/2021/06/18/ma-mpt-recebeu-46-denuncias-
de-trabalho-infantil-na-pandemia/. Acesso em: 16 fev. 2022.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Casa Civil, Brasília,1988. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso: 16 fev.
2022.

BRASIL. Decreto nº 1.313, de 17 de janeiro de 1891. Estabelece providencias para


regularizar o trabalho dos menores empregados nas fabricas da Capital Federal.
Senado Federal, Brasília, 1891. Disponível em:
http://legis.senado.leg.br/norma/392104/publicacao/15722580. Acesso em: 23 dez.
2021.

BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e


do Adolescente e dá outras providências. Casa Civil, Brasília, 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 23 dez. 2021.

CAMPOS, H. R.; ALVERGA, A. R. Trabalho Infantil e ideologia: contribuição ao estudo


da crença indiscriminada na dignidade do trabalho. Estudos de Psicologia, v.6, n. 2,
p. 227-233, 2001.

COSTA, F.D.C. Plano estadual de prevenção e erradicação do trabalho infantil e


proteção ao adolescente trabalhador no Maranhão. Disponível em:
https://www.mpma.mp.br/arquivos/CAOPIJ/docs/PEPETIPAT_FINAL_2021_2.pdf.
Acesso em: 18 jan. 2022.

COSTA, M. M. da.; DIEHL, R. C. O papel da organização internacional do trabalho na


promoção do trabalho decente: diálogos com Amartya Sen. Prolegómenos, v. 19, n.
38, p. 97-108, 2016.

CURY, M.; GARRIDO, P. A.; MARÇURA, J. N. Estatuto da criança e do adolescente


anotado. 3ª ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

CUSTÓDIO, A. V.; CABRAL, M. E. L. Trabalho infantil na agricultura familiar: Uma


violação de direitos humanos perpetuada no meio rural. Revista Jurídica em Pauta,
v. 1, n. 2, p. 3-15, 2019.

DINIZ, A. Maranhão é o quinto estado do Brasil que mais explora o trabalho


infantil, diz pesquisa. G1, 2020. Disponível em:
https://g1.globo.com/ma/maranhao/noticia/2020/06/09/maranhao-e-o-quinto-estado-
66

do-brasil-que-mais-explora-o-trabalho-infantil-diz-pesquisa.ghtml. Acesso em: 16 fev.


2022.

MARANHÃO. No Maranhão, o trabalho infantil é combatido, o direito à educação


é garantido e crianças e adolescentes são protegido. 2021. Disponível em:
https://bit.ly/3NpoX4Q. Acesso em: 18 jan. 2022.

MINHARRO, E. R. S. A criança e o adolescente no direito do trabalho. São Paulo:


LTr, 2003.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL. Caderno de Orientações


Técnicas para o aperfeiçoamento da gestão do Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil. Brasília: PETI, 2018.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL. Caderno de Orientações


Técnicas para o aperfeiçoamento da gestão do Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil. Brasília: PETI, 2018.

MUZZIO, H.; COSTA, F. J. da. Para além da homogeneidade cultural: a cultura


organizacional na perspectiva subnacional. Cad.EBAPE.BR, v. 10, n. 1, p. 146–161,
2012.

OLIVA, J. R. D. O princípio da proteção integral e o trabalho da criança e do


adolescente no Brasil: com as alterações promovidas pela Lei nº 11.180, de 23 de
setembro de 2005, que ampliou o limite de idade nos contratos de aprendizagem para
24 anos. São Paulo: LTr, 2006.

PAGANINI, J. O trabalho infantil no Brasil: uma história de exploração e sofrimento.


Revista Amicus Curiae, v. 5, p. 1-11, 2011.

PEREZ, V. M. G. Regulação do trabalho do adolescente: uma abordagem a partir


dos direitos fundamentais. Curitiba, PR: Juruá, 2008.

PINHEIRO, M. dos. S.; MOREIRA, R. B. da. R. A violação da dignidade da pessoa


humana frente a exploração do trabalho infantil. In: Seminário Internacional
Demandas Sociais e Políticas Públicas na Sociedade Contemporânea, 2019.

RIBEIRO, G. S. O trabalho infanto-juvenil proibido: prevenção e erradicação.


Artigos Jus. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13093/o-trabalho-infanto-
juvenil-proibido-prevencao-e-erradicacao. Acesso em: 24 dez. 2021.

SALDANHA, J.R.L. Trabalho infantil e políticas públicas de erradicação. 2020.


Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/trabalho-infantil-
politicas-publicas-erradicacao.htm. Acesso em: 17/01/2022.

SARAIVA, J. B. C. Reflexões sobre o instituto da remissão e o Estatuto da Criança e


do Adolescente. Revista da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude, n.
5, p. 25-36, 2003.
67

Capítulo III

Trabalho Infantil e o ciclo vicioso da pobreza e violência


no Estado de Sergipe
Ana Paula Lomes Cardoso

1. Introdução

A política social no Brasil carrega um traço peculiar do nosso processo


de formação sócio-histórica, em especial, pela dinâmica como se deu a formação
da sociedade capitalista brasileira. Para Behring e Boschetti (2011), a condição
subalterna do país atribui marcas ao sistema de política social brasileiro, que estão
presentes ainda nos dias atuais. O desenvolvimento econômico-social exógeno, a
configuração de um sistema capitalista tardio, bem como a perpetuação de um perfil
colonialista/escravista, são traços que marcam profundamente as relações sociais no
Brasil, cuja lógica, orientada pela engrenagem de um desenvolvimento desigual e
combinado7, legitima a consolidação do Estado racial que, enquanto instrumento
centralizador de poder, opera sob o racismo. (ALMEIDA, 2019).
Neste sentido, é relevante situar a criança e o(a) adolescente negro(a) dentro
desse contexto, cujos corpos também foram marcados pela mais brutal violência que
o período escravocrata trouxe em seu bojo. Para além disso, conforme destaca
Noguera (2020), estes infantes foram submetidos, além da tortura, ao violento
paradigma do abuso infantil consentido pelo Estado, “a infância negra foi um terreno
de exercício da perversidade branca. Todos os corpos negros eram coisificados; mas,
as crianças eram indefesas numa medida psicológica e física ainda mais profunda”
(NOGUERA, 2020, s.p).

7As autoras Behring e Boschetti (2011) se utilizam do conceito de Trotsky para tratar
especificamente da particularidade brasileira. Pela teoria trotskista “o desenvolvimento de uma
nação historicamente atrasada conduz, necessariamente, a uma combinação original das diversas
fases do processus histórico. A órbita descrita toma, em seu conjunto, um caráter irregular,
complexo, combinado” (TROTSKY, 1978, p. 25, grifo do autor).
68

A raça, enquanto instrumento segregador, surge como elemento fundamental


na justificativa de dominação e escravização de povos. Dessa forma, a classificação
de seres humanos opera com eficácia, servindo, “mais do que para o conhecimento
filosófico, como uma das tecnologias europeias de dominação e submissão de corpos
na nova investida do incipiente modelo produtivo capitalista (ALMEIDA, 2019, p.28)”.
Corroborando com essa discussão, Munanga (2003, s.p.) aponta que “o conceito de
raças ‘puras’ foi transportado da Botânica e da Zoologia para legitimar as relações de
dominação e de sujeição entre classes sociais”.
As avaliações científicas e filosóficas da época colocavam os(as)
colonizados(as) em posições de bestialidade e brutalidade. Devido ao vínculo que
estas populações estabeleciam com o meio natural, suas culturas e costumes,
tornavam-se álibi para “desumanização científica” ou, como aborda a literatura,
racismo científico. O que mais tarde, no pós-abolição, traria o argumento da
necessidade de “purificação da raça”, como estratégia genocida de branqueamento
das populações multirraciais.
Dessa forma, o conceito de raça sempre esteve “ligado ao ato de estabelecer
diferenciação”, criando categorias e classificações. As ciências biológicas são
pioneiras ao trazer definições desta magnitude. Sua teorização contribuiu, em certa
medida, para o surgimento das hierarquias das diferenças. Para melhor compreensão
deste termo, é preciso pensá-lo a partir da dualidade tempo/espaço. Neste sentido,
Luiz Silvio de Almeida (2019, p. 24-25, grifos do autor) argumenta que:

Raça não é um termo fixo, estático. Seu sentido está inevitavelmente


atrelado às circunstâncias históricas em que é utilizado. Por trás da
raça sempre há contingências, conflito, poder e decisão, de tal sorte
que se trata de um conceito relacional e histórico. Assim, a história
da raça ou das raças é a história da constituição política e econômica
das sociedades contemporâneas.

Para o autor, essa perspectiva colonialista de inferioridade racial é o que dá


sustento ao racismo estrutural. Sendo este um elemento político-ideológico que
faz perpetuar a dominação de um povo sobre o outro, gestando desigualdades
e legitimando o genocídio de grupos socialmente discriminados e marginalizados.
Assinaladas tais marcas da composição econômica e político-social do Brasil,
leva-se adiante o exercício de compreender as formas que o Estado brasileiro tem
encontrado para assistir as necessidades da juventude negra periférica. Essa
juventude tem sido amontoada cada vez mais nos espaços de privação de liberdade,
69

conforme dados divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública,


apresentado em 2020, onde aponta que 66,7% da composição populacional
carcerária em 2019 é negra, realidade que se reflete no sistema socioeducativo.
De certo, o Estado, enquanto produto do sistema, de “exploração, de opressão
e de dominação”, cumpre com eficácia o seu papel, focaliza sua atuação na
reprodução da força de trabalho. E, para isso, se utiliza das políticas públicas para
cumprir essa função, ao tempo em que estas surgem como forma de reduzir as
desigualdades sociais gestadas pelo capital, sua contradição se dá à medida que se
apresentam como respostas focalizadas e seletivas, que se reproduzem através de
ações excludentes destinadas a grupos específicos, enquanto os que não são
abarcados por tais respostas acabam sendo marginalizados e criminalizados pelo
aparelho punitivo do Estado.
As autoras Elaine Behring e Ivanete Boschetti destacam em sua obra Política
social: Fundamentos e história (2011), os limites das políticas públicas em assegurar
direitos e justiça social revelando o caráter contraditório e multifuncional destas.
Sendo estudadas a partir de dois ângulos: do ponto de vista histórico, que as relaciona
ao surgimento da questão social; e, do ponto de vista econômico, que estabelece a
relação da política social com o movimento da economia e seus rebatimentos na vida
social.
Diante de tais considerações, faz-se necessário apreender o lugar da negra e
do negro dentro dessa ordem social. Ao analisar a composição sociorracial do sistema
socioeducativo brasileiro, pode-se observar que é majoritariamente negra. Segundo
dados do Levantamento anual do SINASE 2017, 40% dos(as) socioeducandos(as)
se declaram negros(as) ou pardos(as) e este número ainda não inclui os(as)
adolescentes que não declararam sua cor (BRASIL, 2018). A importante escritora
negra Lélia Gonzalez e o sócio Carlos Hasenbalg (1982), em sua discussão sobre o
lugar do(a) negro(a) na sociedade brasileira, apontam para a relação imbricada entre
racismo, o processo de industrialização e o desenvolvimento do capitalismo. De
acordo com os autores, essa tríade tem determinado a reprodução de desigualdades
raciais e de classe, que no período pós-abolição ganham novos contornos e se
disfarçam no manto do “mito da democracia racial”.
Conforme demarca Gonzalez e Hasenbalg (1982, p. 89-90):

Deste ponto de vista, não parece existir nenhuma lógica inerente


ao desenvolvimento capitalista que leve a uma incompatibilidade
70

entre racismo e industrialização. A raça como atributo social e


historicamente elaborado, continua a funcionar como um dos critérios
mais importantes na distribuição de pessoas na hierarquia social. Em
outras palavras, a raça se relaciona fundamentalmente com um dos
aspectos da reprodução das classes sociais, isto é, a distribuição dos
indivíduos nas posições da estrutura de classes e dimensões
distributivas da estratificação social.

Neste sentido, o racismo pode então ser compreendido enquanto elemento


fundamental e estruturante da ordem capitalista. Como aponta Almeida (2019), a
raça é elemento político utilizado para legitimar e naturalizar as desigualdades
sociais. O conceito de raça serve, sobretudo, para designar um lugar, uma
classificação, em outro aspecto, que justifica a dominação de um grupo sobre o
outro e determina por fim, quem é o(a) dominador(a) e quem é o(a) dominado(a).
Sobre isso, convém chamar a atenção para a subalternidade do(a)
jovem negro(a) em nossa sociedade, as múltiplas violações de direitos as quais
são acometidos(a) desde a infância, a exploração sexual, o trabalho infantil (TI) e
o tráfico de drogas configuram-se como as piores condições de exploração.
Uma realidade tão distante dos princípios e garantias de direitos estabelecidos
pela Constituição Federal e leis esparsas (VOLPI, 1997).
Neste aspecto, observa-se que, o perfil das crianças e
adolescentes brasileiras submetidas às explorações de TI são majoritariamente
negras (RIBEIRO, 2017). O estudo realizado pelo Fórum Nacional de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI8)revela que 62,5% das crianças em
situação de TI no Brasil, em 2013, são negras. E, isto ocorre, não simplesmente
porque no Brasil a maior parte da população é negra, mas sim porque essa
população é a mais vulnerabilizada e a que menos têm acesso a direitos básicos
como educação, moradia, programas de geração de renda, saúde, lazer etc.
O encarceramento juvenil se apresenta como expressão patente da política
de criminalização da pobreza. Dessa forma, trazer à luz o debate acerca das
questões étnico-raciais envolvendo crianças e adolescentes tem sido uma
importante tarefa, que demanda maior conexão entre as unidades dialéticas (teoria
e prática), a fim de, enquanto categoria profissional, contribuir para uma postura
transformadora da realidade.

88 Disponível em: https://fnpeti.org.br/cenario/. Acesso em: jan. 2022.


71

Até os dias atuais, a questão da seletividade penal com o viés


racial tem sido pouco levada em consideração na militância e
ativismos. Ou seja, muito se fala, e se coloca como bandeira de luta,
sobre o “leite já derramado”, quando a violência racista já atingiu o
campo da agressão do corpo negro. Mas como afirmam
diversas intelectuais negras, é preciso darmos mais atenção ao
caráter simbólico, do tipo de construção social e política que se
produz e reproduz e ocasiona a morte social dos indivíduos negros
(BORGES, 2019, p.73).

Essa (des)proteção social compreende a forma com a qual o Estado


naturaliza e criminaliza a pobreza, visto que sua ação encontra-se ausente frente
às demandas sociais e presente enquanto aparelho punitivo. Este
segmento populacional é o mais desprotegido social e economicamente. Grande
parte dos(as) adolescentes que se encontram hoje em sistemas de privação
de liberdade tiveram contato com alguma forma de TI.
Outro dado importante deste perfil é que o maior número de pessoas que se
encontram em situação de TI são ou estão entrando na fase da adolescência,
conforme aponta os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio
Contínua (PNADC) 2019, em 2016, que afirma que a maior concentração de TI está
na faixa etária entre 14 e 17 anos (BRASIL, s.d.). Ao realizar uma comparação com
o número de adolescentes que cumprem algum tipo de medida socioeducativa ou
estão em conflito com a lei, percebe-se que estes dados se relacionam e isso não
é uma coincidência, é um fato. O TI marginaliza crianças e adolescentes e os(as)
deixa ainda mais suscetíveis à criminalização.
A atual conjuntura do mundo do trabalho impacta diretamente na vida
de adolescentes e jovens brasileiros, demandando uma ação pública
menos pontual e mais focalizada, voltada ao protagonismo infanto-juvenil e com
vistas a uma reparação histórica pelo processo de subalternização de pessoas
negras em decorrência do racismo estrutural.
Certamente, não se busca com tais proposições incorrer ao risco de pensar
as políticas públicas sob uma perspectiva “fenomênica da aparência” (BEHRING;
BOSCHETTI, 2011), numa visão unilateral e/ou economicista, ou seja, sem
considerar a historicidade e a totalidade que permeia a origem da política social.
Antes, precisa-se compreender as políticas públicas enquanto um produto da
sociedade burguesa que envolve um complexo de múltiplas mediações.
Nesse contexto, o objetivo deste trabalho é analisar as relações existentes
entre trabalho infanto-juvenil e a efetivação do princípio da proteção integral na
72

materialização das políticas públicas no estado de Sergipe. Para isso, são


considerados os seguintes objetivos específicos: traçar o perfil do(a)
criança/adolescente submetido(a) ao TI em Sergipe; analisar as condições
sociodeterminantes do TI no território sergipano, e; identificar, no âmbito na política
de Assistência Social, a oferta de serviços, programas e projetos destinados ao
segmento infanto-juvenil em Sergipe.

2. Procedimentos metodológicos

A temática central da pesquisa em tela e seu objeto estão definidos através


da análise da relação que se estabelece entre as categorias “racismo estrutural” e
“trabalho infantil”. Previamente, destaca-se o método de análise adotado, cuja
fundação se dá por meio do materialismo histórico-dialético. Netto (2011), em sua
análise sobre o materialismo histórico-dialético, explica que o método de análise
tem por objetivo principal a apreensão dos elementos essenciais do objeto, ou seja,
a sua estrutura e dinâmica, depurando daí a sua essência. “Numa palavra: o
método de pesquisa que propicia o conhecimento teórico, partindo da aparência,
visa alcançar a essência do objeto” (NETTO, 2011, p. 22, grifos do autor), o que,
portanto, levaria a reprodução, no plano ideal da essência do objeto ao qual se
destina a pesquisa. O autor enfatiza que, para Marx, “a crítica do conhecimento
acumulado consiste em trazer ao exame racional, tornando-os conscientes, os seus
fundamentos, os seus condicionamentose os seus limites [...] (NETTO, 2011, p. 18,
grifos do autor).
Conforme sinalizado por Minayo (2007, p. 19), “[...] fazer pesquisa constitui
um processo de trabalho complexo que envolve método, operacionalização e
criatividade”. Desse modo, inicialmente foi realizado um levantamento bibliográfico
para identificação das literaturas que discutem sobre o tema em análise na
atualidade. A partir daí, foram selecionados(as) autores(as), cuja linha teórica
conversa com o materialismo histórico-dialético, quais sejam: Ângela Davis (2020),
Dario Melossi e Massimo Pavarini (2004; 2006), Elaine Behring e Ivanete Boschetti
(2011), Juliana Borges (2019; 2020), Lélia Gonzalez e Carlos Hasenbalg (1982),
73

Loic Wacquant (2001; 2008), Mário Volpi (1997), Karl Marx (2008), Luiz Silvio
Almeida (2019), Myrdal (1957) dentre outros.
Por conseguinte, foi elaborado material de apoio, com tabelas, gráficos e
figuras que possibilitem a coleta e sistematização de dados utilizados durante as
análises desta pesquisa. Por meio dessa coleta de dados e caracterização dos
mesmos, pretendeu-se descrever a situação das crianças e adolescentes no estado
de Sergipe em situação de TI e a relação dessa problemática com o racismo
estrutural.
Para fins desta análise, foram utilizadas as legislações pertinentes ao tema,
em especial a Constituição Federal de 1988 (CF/88), o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), o Plano de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e
Proteção ao Trabalhador Adolescente. Bem como, as bases de dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD), Contínua 2020 sobre o TI, dentre outros disponibilizados nas
plataformas digitais disponíveis para análise pública.
Ademais, no primeiro tópico será apresentado o perfil de crianças e
adolescentes inseridas no trabalho infantil no estado sergipano. No segundo tópico, a
ênfase estará nos condicionantes socioeconômicos que levam à violação do trabalho
infantil. O terceiro e último tópico possui o escopo de apresentar as ações de
enfrentamento para erradicação do trabalho infantil.

3. Trabalho infantil tem cor e endereço: o perfil da população


infantojuvenil submetidas ao TI em Sergipe

Apesar de configurar grave violação dos direitos humanos, o TI no Brasil ainda


é uma prática naturalizada no contexto social. Em alguns casos, é visto de forma
preventiva à marginalização, a exemplo das feiras livres e do trabalho doméstico
invisibilizado. Não se trata aqui de qualquer infância, mas de um público específico
que, no processo histórico foi sendo caracterizado e lido de forma inferiorizada,
“taxado pelo menos”, afinal reproduz-se no senso comum a equivocada ideia de que
“pelo menos está trabalhando, não está roubando”. Mas, por que taxa-se “pelo
menos” um público que por lei é garantido tratamento prioritário? Estes não são
74

crianças? Estes não são adolescentes? Parafraseando Bell Hooks, um importante


intelectual do movimento feminista negro.
Em respostas a estas questões, a 1 denota o racismo que perpassa infâncias
negras e traz um pouco o retrato das desigualdades sociais, que vivenciam negros e
negras que tem sua infância ceifada pelo duro processo de exploração da força de
trabalho infantil. Mesmo após o fim do regime escravista, no pós-abolição, existe ainda
uma narrativa perpétua de naturalização do trabalho precoce, em sua maioria de
meninos e meninas negras.

Figura 2 - Pessoas de 05 a 17 anos de idade em situação de trabalho infantil em Sergipe por gênero
e raça

Fonte: elaboração da autora, a partir de dados da PNAD Contínua 2019 (BRASIL, 2020b).
Obs.: a) negros: pretos e pardos; b) não negros: brancos, amarelos e indígenas.

Os dados demonstram que o perfil de crianças e adolescentes, alvo da violação


do TI, está focado no sexo masculino e negro. Em Sergipe, conforme pode ser
observado, o padrão predominante no TI é de crianças e adolescentes do sexo
masculino, que representa um percentual de 74,3%, em comparação as mulheres,
25,7% da população ocupada. Pessoas pretas e pardas somam 12.694 do valor total,
enquanto não negros foram identificadas 4.153 pessoas. Com efeito, “o racismo define
furtivamente estruturas sociais e econômicas de maneiras difíceis de identificar e,
portanto, mais prejudiciais” (DAVIS, 2020, p. 40).
Ao que concerne ao gênero, os dados coletados em Sergipe apontam uma
sobreposição do sexo masculino em relação ao feminino, 74,3% são meninos e 25,7%
são meninas. Contudo, uma análise mais detalhada precisa ser feita de modo a
identificar o Trabalho Infantil Doméstico (TID) que, dentro dos moldes sociais sexista,
é designado como uma atividade com maior tendência para o perfil feminino. De toda
75

forma, é possível depreender ainda na análise do TI, a existência de uma divisão


sexual do trabalho que é reflexo das estruturas sociais de gênero, de raça e de classe.
O TID é classificado pelas organizações nacionais e internacionais como uma
das piores formas de trabalho, e se distingue da realização de tarefas domésticas ou
afazeres que buscam desenvolver cooperação no ambiente familiar. O TID
compreende as atividades econômicas que são desenvolvidas por crianças e/ou
adolescentes com idade inferior a 16 (dezesseis) anos, quando não na condição de
aprendiz, para garantia de sobrevivência, com ou sem fins lucrativos. Contudo, é
possível caracterizar a exploração do TID no âmbito da própria família, quando a
criança ou o(a) adolescente assume as responsabilidades típicas de adultos(a),
incompatíveis com o seu processo de desenvolvimento.
sta é uma violação difícil de ser combatida, pois perpassa aspectos culturais-
históricos e estruturais que envolvem relações de poder e está mais associada ao
gênero feminino, como uma ação inerente ao universo da mulher, o que acentua o
caráter sexista desta violação. De todo modo, crianças e adolescentes que realizam
atividades domésticas são “trabalhadores invisíveis”, que experienciam de forma
precoce e extenuante o mundo do trabalho. Este tipo de trabalho é comumente
confundido como uma ajuda, sem regulamentação, sem garantias de direitos ou
qualquer tipo de proteção, sinônimo de subserviência e desproteção.
OFNPETI divulgou em sua análise da PNAD Contínua 2019 que 200.826 das
crianças e adolescentes sergipanos(as) exercem afazeres domésticos. Os dados
ainda não evidenciam a exploração da mão de obra infantil no ambiente doméstico,
mas já sinaliza uma potencial situação de risco que carece de maior avaliação.
O trabalho precoce, de modo geral, é uma realidade comum na vida de crianças
e adolescentes pobres. As múltiplas situações de vulnerabilidade às quais estão
expostos(as) acabam inserindo-os(as) em atividades laborais perigosas. Na pesquisa
da PNAD Contínua de 2019-2020 foram identificadas 1.768 mil pessoas na condição
de TI em todo território brasileiro; do total, 706 mil exercem as piores formas de
trabalho, conforme a Lista com as Piores Formas de Trabalho Infantil (lista TIP)
(BRASIL, 2020a). A igura abaixo ilustra a distribuição de pessoas por grupo de idade
que realizam atividade econômica dentro do que se considera as piores formas de TI.
76

Figura 3 - Pessoas de 5 a 17 anos de idade que realizavam trabalho infantil perigoso no Brasil

Fonte: elaboração da autora, a partir dos dados produzidos pelo IBGE, via Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios Contínua (BRASIL, 2020b)

Conforme ilustrado, há uma maior incidência de adolescentes entre 16 e 17


anos expostos(a) a situações de exploração de alta periculosidade – a exemplo de do
tráfico de drogas, a exploração sexual infantil em pontos turísticos e rodovias
estaduais, a mendicância, o trabalho infantil doméstico muito concentrado nos
interiores do estado, na citricultura e lixões. Em 2019, foram identificados 418 mil
jovens nesta condição. Cabe ainda destacar que, não obstante o público de 05 a 13
anos apresentar o menor percentual de inserção em atividades perigosas, 104 mil é
um número expressivo em se tratando de crianças.
Em Sergipe, há um total de 13.897 adolescentes em trabalhos informais, 46,6%
destes estão inseridos nas piores formas, com aproximadamente 16,5 horas de
trabalho dedicado ao dia. Como ilustrado na bela 1, destacam-se as ocupações:
trabalhadores elementares da agricultura, trabalhadores elementares da pecuária e
vendedores de quiosques e postos de mercados. Chama atenção esta última pelo
grau de exposição a outras violências, como a exploração sexual.
77

Tabela 5 - Principais ocupações no trabalho infantil em Sergipe

Fonte: IBGE, via PNAD Contínua (BRASIL, 2020b), elaborado pela FNPETI

Destarte, o trabalho precoce e a violência sexual são heranças daquilo que é


considerado ser um dos maiores crimes contra a humanidade: a escravização de
pessoas negras. Dentre essas violações, a que está submetida o público
infantojuvenil, a violência sexual inclui “os casos de assédio, estupro, pornografia
infantil e exploração sexual”. (BRASIL, 2018, p. 3). Sendo esta última uma das piores
formas de TI, conforme já sinalizado na lista TIP.
A violência sexual contra crianças e adolescentes está localizada como uma
violação de direitos humanos com previsão legal na Declaração Universal dos Direitos
Humanos, CF/88 e ECA. No entanto, apesar de todo aparato legislativo que garante
a defesa e proteção de crianças e adolescentes brasileiros(as), tal violência é uma
realidade que acomete este público em diversos espaços, inclusive no seio familiar
(no caso da violência intrafamiliar).
78

Em 2018, o Ministério da Saúde (MS) divulgou dados da Análise epidemiológica


da violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil, que traz o perfil das
notificações de violência sexual contra crianças, onde meninos e meninas negras são
identificadas como as principais vítimas. Do total de entrevistados, 74,2% eram do
sexo feminino, enquanto 25,8% eram do sexo masculino; do total, 45,5% eram de pele
negra, 38,5% brancos, 0,5% amarela, 1,2% indígena e 13,8% ignorado.
Na avaliação do Perfil das notificações de violência sexual contra adolescentes,
observou-se que 92,4% eram do sexo feminino e 7,6% eram do sexo masculino, na
faixa etária de 10 a 14 anos. No dado desagregado por cor, identificou-se que 55,5%
são negras, 32,5% brancas, 0,7% amarela, 1,1% indígena e 10,1% ignorado. Pelos
dados elencados, observa-se que o corpo negro permanece sendo coisificado de
forma precoce, isto é, a hipersexualização de jovens negras é naturalizada pela lógica
colonial de racialização e objetificação destes corpos.
No estado sergipano, os equipamentos socioassistenciais acolheram 150
casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes, conforme notificações
apresentadas no Registro Mensal de Atendimento (RMA). Somente em 2020, a Polícia
Civil9 do estado reportou 550 crianças e adolescentes (0 a 17 anos) vítimas de
violência sexual. Embora espantosos os números, estes são apenas os casos
recepcionados pelos canais de denúncia. O estado tem desenvolvido ações de
promoção, de prevenção e proteção, através da identificação, acompanhamento e
encaminhamento dos casos de violências contra crianças e adolescentes, por meio
de campanhas, apoios técnicos, socialização de dados e divulgação ampliada em
canais de comunicação social. Os impactos destas ações podem ser observados com
a redução dos índices conforme demonstra o Gráfico 1, com a variável dos três
últimos.

9 Disponível em: https://www.policiacivil.se.gov.br/violencia-sexual-contra-criancas-saiba-como-


identificar-sinais-prevenir-os-casos-e-formalizar-denuncia/. Acesso em: jan. 2022.
79

Gráfico 2 - Público Prioritário - 07 A 14 ANOS – SCFV em SERGIPE

1709

1253

969

742

541

381

41 59 59

Crianças e adol. em Fora da escola/defasagem Trabalho infantil


situação de rua escolar
2019 2020 2021

Fonte: elaboração da autora, a partir de dados da CECAD 2.0 (BRASIL, 2021)

Os instrumentais para coleta de dados sobre violência sexual contra crianças e


adolescentes, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), ainda não
produzem dados desagregados por cor e raça. Outras bases de dados podem ser
apuradas para uma análise que especifique melhor estes detalhes.
Uma outra forma, que deve ser inserida ao debate pela falta de registros e
estatísticas e, principalmente, pelo discurso moral que se cria ao seu entorno, é o TI
associado ao tráfico de substâncias psicoativas. Ao que concerne a este tipo de
violação, enquanto uma das práticas do TI, a Convenção nº 182 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), bem como o Decreto nº 6.481/2008, que lista as
Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), inclui o tráfico de drogas como uma
delas. Se destacando este como o segundo ato infracional mais praticado nas regiões
Sudeste e Sul do Brasil, obtendo representação de 32% e 24%, respectivamente,
conforme o Panorama Nacional: a execução das medidas socioeducativas de
internação (CNJ, 2012).
Pela análise da lista TIP, o tráfico de drogas é a única violação classificada
entre as piores formas de exploração em que a vítima é culpabilizada pelo ato. À vista
disto, a “indústria punitiva” opera em perfeita sincronia com o modus operandi
80

capitalista, “[...] funciona ideologicamente como um local abstrato no qual os


indesejáveis são depositados” (DAVIS, 2020, p. 16).
Em se tratando de adolescente, o Estado brasileiro tem deixado evidenciar
muito mais o seu caráter punitivista, através da aplicação de uma medida
socioeducativa, em regra, de internação, a uma circunstância que deveria ser tratada
de forma protetiva. Pois, conforme previsão legal, o Art. 98, inciso I, do ECA (BRASIL,
1990), a situação de risco se faz presente quando uma criança ou adolescente está
com seus direitos fundamentais ameaçados ou violados, podendo ocorrer por ação
ou omissão da sociedade ou do Estado.
Desta forma, quando o Estado negligencia a fiscalização do TI, em suas
múltiplas formas, mas se mostra máximo nas punições de adolescentes negros(as),
em especial, quando estas situações, no âmbito do tráfico de drogas, trata-se de uma
inclusão punitiva. Ou seja, a forma como os(as) adolescentes negros(as) acessam as
políticas estatais tem sido, em grande medida, pela responsabilização penal.

4. Condições sociodeterminantes para violação do direito de


crianças e adolescentes pelo trabalho infantil em Sergipe

Em 2020, mais um caso fatídico de trabalho precoce comoveu a população


sergipana e denunciou, o que muitos atores do Sistema de Garantia dos Direitos da
Criança e do Adolescente (SGDCA) vem pautando em seus debates, qualquer política
pública isolada é insuficiente para garantir a proteção integral. Vitor da Silva Santos,
Juninho da cocada, como era conhecido na sua comunidade, uma criança negra de
11 anos, que vendia cocadas nas ruas da cidade onde morava. O menino foi
executado em uma das ações famigeradas de “combate ao tráfico de drogas” da
Polícia Militar do estado. Ainda que tenha sido usuário do SUAS desde cedo,
passando por todas as proteções socioassistenciais10, Juninho experienciava a
situação do TI e foi vitimado por ter sido considerado pela Polícia Civil como “usuário
de drogas” e “traficante”.

10 A Proteção Social Básica (PSB) atua de forma preventiva e proativa, a fim de evitar situações de
vulnerabilidades e riscos sociais. A Proteção Social Especial (PSE) oferta serviços, programas e
projetos que objetivam a superação de situações de risco e a reconstrução de vínculos familiares e
comunitários. Está estruturada em dois níveis de complexidade, Média e Alta Complexidade. A PSE de
Média Complexidade destina-se ao atendimento de pessoas e famílias que vivenciam situações de
risco em decorrência de violação de direitos.
81

Seja vendendo doces, seja no tráfico de drogas, o fato é que o pré-adolescente,


antes de tudo, teve seus direitos violados, as garantias preconizadas no ECA, como
a proteção integral, não se materializaram para ele. Foi vítima da extrema pobreza,
que o levou a perder sua infância com o TI e, por fim, teve a sua vida ceifada de forma
precoce. Embora apresente perfil, Vitor e sua família não foram considerados, entre
as políticas públicas, como situação prioritária pela sua condição peculiar de
desenvolvimento e vulnerabilidade socioeconômica.
O caso elucidado demonstra com definição o ciclo vicioso da pobreza/violência
no estado de Sergipe, como a falta de acesso ou a insuficiência na oferta de direitos
sociais básicos (educação, assistência social, saúde e esporte/lazer), não
materializam a proteção integral, e a desproteção social, produto dessa
desarticulação, pode ser considerada uma Necropolítica. Para além disso, é possível
ainda perceber como o racismo estrutural opera reproduzindo “corpos indesejáveis” e
higienização social. Não foi uma criança branca que teve seu corpo lido como
“traficante” e “usuário de drogas” e por isso alvejado de balas. Sem embargo, não há
como considerar uma causalidade a morte de uma pessoa negra em um confronto
policial, quiçá de uma criança. Isso denota se não outra coisa, a expressão patente
da necropolítica, enquanto um dispositivo de poder que opera na ordem do “fazer
morrer” uma determinada parcela da sociedade, pretos e pobres.
Trabalhando o conceito focaultiano da gerência da vida sob a morte
Mbembe (2018, p. 5, grifos nossos), avança na análise do biopoder e apresenta a
necropolítica que para ele pode ser traduzida de tal modo:

[...] a expressão máxima da soberania reside, em grande medida, no


poder e na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer.
Por isso matar ou deixar viver constituem os limites da soberania,
seus atributos fundamentais. Ser soberano é exercer controle sobre a
mortalidade e definir a vida como a implantação e manifestação do
poder.

Como pode ser observado, a insegurança e instabilidade econômica tem


lesado vidas de crianças e adolescentes em todo território nacional, em especial
negros e negras. Em contrapartida as políticas de transferência de renda estão sendo
enxutas a cada fase cíclica do capital. A partir daí o racismo começa a ser evidenciado
enquanto uma estratégia política de segregação e controle social, pois sabe-se que,
em sua grande maioria, quem compõe os guetos, favelas e cárceres brasileiros é a
82

população negra, que, estando historicamente relegada à marginalização, é,


sobretudo nos dias de hoje, criminalizada mediante a sua condição socioeconômica.
Se falta acesso aos mínimos sociais básicos à sobrevivência, o que resta é a
violência como forma de sobrevivência. Antes, contudo, a população irá buscar meios
de suprir suas necessidades, ainda que estes comprometam o pleno desenvolvimento
físico e social.
De acordo com os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA),
divulgados pelo Observatório de Sergipe, o estado apresentou, em 2015-2016, o
Índice de Vulnerabilidade Social (IVS) de 0,30. Entre as unidades federativas, Sergipe,
apesar de ser o estado com menor extensão territorial, está entre as cinco maiores
taxas de desemprego no país (17,0%). Um número significativo da população
sergipana sobrevive na informalidade, o percentual de pessoas desocupadas e
subocupadas é de 42,0% no último trimestre de 2021.
Esta realidade impacta diretamente nos índices de TI. A pobreza material é um
dos principais fatores que deixa o estado vulnerável a este tipo de violação. O gráfico
2 ilustra, em valores absolutos, o quantitativo de crianças e adolescentes em situação
de TI em Sergipe contempladas com o programa de transferência de renda, Bolsa
Família, em novembro de 2021.
83

Gráfico 3 - Pessoa em situação de trabalho infantil identificadas no PBF (novembro 2021)

Fonte: elaboração da autora, a partir de dados da CECAD 2.0 (BRASIL, 2021)

Como já sinalizado em linhas anteriores, 13.897 é o número de crianças e


adolescentes em situação de TI no estado. Destas, apenas 269 recebem o benefício
socioassistencial, conforme divulgado em sites oficiais. Ainda assim, a população
preta é a que manos tem acesso, sendo que pretos(as) e pardos(as) são a maior
representação na marcação de trabalho infantil em Sergipe.
De fato, não se promove proteção integral com apenas uma única política. Se
há ruptura na rede socioassistencial, certamente para uma família que vive à sombra
do desemprego e da informalidade, os riscos e as vulnerabilidades sociais são cada
vez maiores. Principalmente, quando se tem na ordem do dia, discursos anuentes de
“inimigos a serem combatidos” voltado aos movimentos sociais de esquerda e, mais
precisamente, ao encarceramento massivo da população jovem e negra.
Nesta ceara, é substancial trazer à baila desta discussão a teoria desenvolvida
por Myrdal (1957) sobre o princípio da causação circular cumulativa, que ajuda a
compreender como as desigualdades sistêmicas, em especial, a discriminação racial,
são mecanismos de um círculo vicioso, em que a discriminação gera mais
desigualdade. Quando crianças e adolescentes negros(as) são discriminados(as) no
acesso à direitos fundamentais básicos, como a educação, é previsível que ao atingir
maioridade tenham dificuldades de se inserir no trabalho formal que lhes garanta
melhores condições de sobrevivência. No Gráfico 3 pode ser observado os municípios
sergipanos com maior defasagem escolar na variação dos anos 2019 a 2021.
84

Gráfico 4 - Crianças e adolescentes fora da escola ou com defasagem escolar superior a 2 (dois)
anos

181

131 130

105

86
82 79
77
72
67
61 59
56 56 57
53 53
49
45 44
40
26
15
11

Poço Redondo Itaporanga Monte Alegre Barra dos Pedra Mole Aracaju Ilha das Flores Tobias Barreto
d'Ajuda de Sergipe Coqueiros

2021 2020 2019

Fonte: Elaboração da autora, a partir de dados da CECAD 2.0 (BRASIL, 2021).

Dos setenta e cinco municípios sergipanos, oito destacam-se pelo quantitativo


de crianças e adolescentes com idade superior a dois anos inseridos no programa
Bolsa Família, mas que estão fora da escola. De modo geral, observa-se, dentre a
variação de tempo de 2019 a 2021, que houve redução da defasagem escolar, com
exceção dos municípios Barra dos Coqueiros e Pedra Mole, este último com aumento
significativo em 2021. Tobias Barreto, Aracaju e Ilha das Flores, que são os municípios
que apresentam maior defasagem, seguem também em uma escala regressiva dos
índices.
Pela variação de tempo selecionada para esta análise, é provável que os
números estejam refletindo o impacto causado pela pandemia nos últimos dois anos.
Somado ainda a outros fatores conjunturais, como a crise econômica que tem incidido
nos orçamentos públicos municipais, em especial, nas regiões interioranas, como é o
caso da maioria dos municípios apresentados no gráfico.
No primeiro mês de 2022, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP) criou o Censo Escolar 2021. Nos resultados
apresentados pela pesquisa Sergipe, apresentou 2.070 escolas fechadas, sendo 322
na rede estadual, 10 escolas na rede federal, 1.302 na rede municipal e 436 escolas
85

privadas. As escolas particulares tiveram uma perda significativa, porém, a rede


municipal, que atende a maior parte da população vulnerável, foi a mais afetada
(BRASIL, 2022).
Já não é novidade que a pandemia do COVID-19 tem aprofundado ainda mais
as desigualdades sociorraciais no Brasil em todos os setores, quais sejam, saúde,
economia, educação, acesso às políticas públicas de um modo geral etc. O fato é que,
em se tratando especificamente de educação, este nunca foi um direito ofertado para
todas as crianças e adolescentes negros(as) brasileiros(as), contradizendo as
legislações que resguardam estes direitos. A educação na história brasileira sempre
foi privilégio dos(as) brancos(as), aos negros e às negras foram negados o acesso a
esse direito. Nas primeiras legislações sobre o sistema educacional no Brasil, já se
expressava que o acesso à escola era privilégio da classe dominante.
As primeiras legislações vetavam o acesso de pretos(as) e escravizados(as) às
escolas. A luta por justiça educacional é uma pauta que se estende desde o período
pós-abolição, no entanto, a garantia ao direito à educação para crianças e
adolescentes é bem recente, ela vem com a CF/88 e é reafirmada com o ECA em
1990. Contudo, mesmo com toda previsão legal, a população preta ainda encontra
muitas dificuldades para acessar a escola como um direito. Pois, não se trata somente
de ter matrículas efetivadas, é necessário que existam condições que garantam a
permanência escolar. Além da desigualdade racial, tem ainda a desigualdade de
gênero e condição econômica, o que agrava ainda mais essa situação.
Com o isolamento social vivenciado nos últimos anos, o desafio da
escolarização se tornou ainda maior, principalmente, porque a modalidade de ensino
à distância (EAD) foi assumida, praticamente, como única estratégia de atendimento
aos(às) estudantes, e a maioria deles(as) esbarra em dificuldades diversas para
acessar as plataformas digitais. Alguns(mas) ainda possuem dispositivos eletrônicos,
outros(as) não; dentre os(as) que têm, ainda tem o agravante de que o acesso à
internet é limitado, muitas vezes insuficiente para transmissão de uma aula inteira,
quiçá concluir um ano letivo em tais condições.
Na verdade, o acesso da população negra a recursos para a escolarização,
historicamente, foi limitado. A realidade brasileira sempre foi de negação de direitos.
Ou trabalha, ou estuda. Se estuda, como vai ter o que comer? Então, trabalha. Daí as
chances de construir um futuro melhor vão sendo apagadas. Assim, a exclusão da
população negra do sistema educacional no Brasil ainda permanece como uma
86

estratégia racista contínua, em que, além de uma negação de direito social básico, é,
sobretudo uma das formas de genocídio.
Não se trata exclusivamente da morte do corpo físico, mas da morte simbólica
de corpos pretos, que ocorre por meio de processos de exclusão social que vai sendo
validado pelo racismo estrutural e sistêmico. Em decorrência dessas condições, o
trabalho precoce acaba sendo a única alternativa de sobrevivência oportunizada.
Outrossim, com o crescimento da crise sanitária e o isolamento social, não há
como negar que as pessoas não-brancas foram as mais afetadas com a precarização
do ensino à distância (EAD) e o aprofundamento das desigualdades. Dados da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) – COVID-19, realizada no ano
passado, revelaram que, em setembro, 6,4 milhões de estudantes, que correspondem
a 13,9% do total, não tiveram acesso às atividades escolares no Brasil. O mesmo
levantamento mostrou que estudantes negros(as) e indígenas sem atividade escolar
são o triplo de estudantes brancos(as): 4,3 milhões de crianças e adolescentes
negros(as) e indígenas da rede pública e 1,5 milhão de adolescentes brancos(as),
respectivamente(BRASIL, 2020a).
Os impactos do período pandêmico irão repercutir durante muitos anos,
principalmente, no processo de desenvolvimento social e cognitivo dessas crianças e
adolescentes pretos(as) e não-brancos. Os atores do SGDCA precisarão encontrar
estratégias para reparar os danos causados. O caminho que é possível vislumbrar
neste momento é, primeiramente, estruturar um modelo de educação antirracista, que
possa equalizar os impactos dessa desigualdade história e pandêmica. Sob o
propósito de que eles(as) possam de fato acessar uma educação de qualidade, que é
um direito básico, e traçar novas rotas e novas perspectivas de vida sem a experiência
fatídica do TI.
Apreendido sobre tais acepções, o que se pretende discorrer desta análise é
que, embora os avanços nas legislações brasileiras no que concerne aos direitos de
crianças e adolescentes e de todo o aparato legislativo internacional, existe um
racismo estrutural que impede o acesso igualitário de pessoas negras a esse conjunto
essencial de direitos. Aqueles(as) que por anos foram escravizados(as) e
coisificados(as), mesmo após o período abolicionista e as legislações posteriores,
ainda se encontram extirpados(as) do acesso aos direitos igualitários e universais, de
que a toda pessoa humana deve ser assegurada.
87

Sem articulação da rede de proteção e sem investimento público para os


principais setores de atendimento aos vulneráveis, não há como garantir a proteção
integral para estes infantes. Desta forma o TI torna-se a principal garantia de
reprodução da vida material de crianças e adolescentes que se encontram em
situação de vulnerabilidade social.

5. Ações para o enfrentamento do trabalho infantil em Sergipe

Em 2018, o Governo Federal suspende o cofinanciamento de um dos principais


programas de enfrentamento ao TI, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
(PETI). O programa foi criado em 1996, como uma estratégia do SUAS para o
enfrentamento da violação do TI em todas as formas. O PETI estruturava-se em três
linhas de atuação: transferência de renda, trabalho social com famílias e serviços
socioeducativos.
No ano de 2013, o Governo Federal apresenta uma novo desenho 11para o
programa, baseado nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), e passa a
ser conhecido como as Ações Estratégicas do PETI, compostas por cinco eixos: I –
Informação e mobilização para prevenção e erradicação do trabalho infantil; II –
Identificação de crianças e adolescentes em trabalho infantil; III – Proteção social para
crianças e adolescentes em trabalho infantil e suas famílias; IV – Apoio e
acompanhamento das ações de defesa e responsabilização; e, V – Monitoramento
das ações do PETI. Com o redesenho das AEPETI, continuam sendo de execução
direta nos Centro de Referência de Assistência Social (CREAS), em articulação com
o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), com orçamento
compartilhado.
O PETI, além de orçamento próprio, possuía Sistema de Monitoramento das
Ações (SIMPETI), com obrigatoriedade de manutenção e alimentação de dados pelos
municípios cofinanciados. O sistema permanece sendo utilizado nas AEPETI, com
orientação para preenchimento de todas as unidades municipais e estaduais.

11 Informativo sobre o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e o redesenho das ações


estratégicas. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/wp-content/uploads/2015/10/Folder-
A%C3%A7%C3%B5es-Estrat%C3%A9gicas-do-PETI-Encontros-Estaduais1.pdf. Acesso em: jan.
2022
88

Ao que concerne às ações do TI no estado, a gestão segue o Plano Nacional


de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente
Trabalhador, o qual visa atender o pacto internacional estabelecido nos ODS, no qual
o Brasil é signatário.
As intervenções ocorrem a partir de cinco eixos: Informação e mobilização,
que compreende a realização de capacitações, eventos estaduais, campanhas de
enfrentamento ao TI, oficinas de capacitação etc.; Identificação, onde são realizados
levantamento das marcações de situações de TI no Cadastro Único (CadÚnico) e
reuniões periódicas com a Comissão Estadual Intersetorial do PETI, para a definição
dos fluxos; Proteção Social tem sido trabalhado através dos apoios técnicos aos 75
municípios sergipanos, participação em audiência pública e reuniões com o CEDCA;
Defesa e Responsabilização tem trabalhado de forma articulada o Fórum Estadual
de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FEPETI) e fórum nacional FNPETI
e OIT, promovendo uma agenda intersetorial para a realização de ações estratégicas;
e, Monitoramento, os trabalhos são desenvolvidos junto à equipe da Vigilância
Socioassistencial, através do acompanhamento dos sistemas do SUAS e CadÚnico,
fomentando a construção da Agenda Intersetorial de Enfrentamento ao Trabalho
Infantil e sensibilização dos municípios para elaboração e manutenção de banco de
dados referente à temática. O Gráfico a seguir ilustra o quantitativo de ações que
foram desenvolvidas por eixo de atuação.
89

Gráfico 5 - Quantitativo das ações executadas - AEPETI

DEFESA E RESPONSABILIZAÇÃO 9

MONITORAMENTO 31

PROTEÇÃO SOCIAL 45

IDENTIFICAÇÃO 46

INFORMAÇÃO E MOBILIZAÇÃO 193

Fonte: elaboração da autora, a partir de dados do Relatório SIMPETI - Estado SE, 2021.

Desde a inauguração do programa, a gestão estadual do SUAS em Sergipe


desenvolveu ações estratégicas de combate ao TI em todos os eixos estratégicos.
Contabilizando, assim, para o ano de 2021, 193 ações no eixo Informação e
Mobilização, 46 ações no eixo Identificação, 45 ações no eixo de Proteção Social, 31
ações no eixo Monitoramento, e no eixo Defesa e Responsabilização 9 ações.
Mesmo após o desfinanciamento, os municípios sergipanos, que ainda
possuem recursos em conta, podem reprogramar o orçamento para utilização no ano
em vigência. Dos 75 municípios da unidade federativa de Sergipe, 14 deles recebiam
o cofinanciamento federal para o desenvolvimento de ações para erradicação do TI e,
atualmente, 11 municípios possuem saldo remanescente.
Muitas ações de enfrentamento e proteção contra o TI podem ainda ser
desenvolvidas no território sergipano, como ações integradas com movimentos sociais
nas comunidades (periferias e povos tradicionais), articulação com órgãos de controle
social para fiscalização da destinação privilegiada de recursos orçamentários,
capacitação continuada e estendida a outros segmentos de políticas sociais que
compartilhem o mesmo público, elaboração de diagnóstico com participação de
Instituições de Ensino superior para monitoramento e avaliação do TI no território
sergipano, alimentação sistemática dos sistemas de monitoramento de dados e
incrementação dos instrumentais de coleta de dados para identificação do TI em
especial, as piores formas, dentre outras ações Dessa maneira, cabe às gestões
municipais e estaduais garantir, além da destinação privilegiada de recursos,
90

conforme preconiza o ECA, a utilização proficiente destes valores destinados às


AEPETI, com base na garantia de direitos, na matricialidade sociofamiliar e no
provimento de estratégias de fortalecimento da rede socioassistencial. Com o intuito
de que se promova condições seguras de sobrevivência para crianças e adolescentes
inseridos(as) em TI, em especial, negros e negras que são maioria da população no
território. Reconhecendo, assim, estes(as) como sujeitos(as) de direito, respeitando e
protegendo seu desenvolvimento social e cognitivo e a sua dignidade.

6. Considerações finais

Refletir e problematizar o TI e suas configurações na contemporaneidade,


diante do avanço do neoconservadorismo, do crescimento vertiginoso da pobreza e
desigualdades, é, sobretudo, um exercício da práxis que requer, para além de um
posicionamento crítico e ético-político, ações coletivas e integralizadas voltadas à
defesa intransigente dos direitos de crianças e adolescentes e a transformação da
realidade. Por isso, exige análises que permitam compreender as condições
sociodeterminantes do TI, considerando a sua relação estreita com problemas
estruturais vigentes na ordem societária.
Em virtude disso, o cerne deste trabalho esteve centrado na análise da oferta
de direitos fundamentais destinados às crianças e adolescentes no estado de Sergipe,
em especial, aqueles(as) que mais são afetados com a violação do TI, negros e
negras. Diante do que foi exposto, fica evidenciado que o enfrentamento ao TI no
estado sergipano é atravessado por uma série de tensionamentos envolvendo forças
sociais que expressam interesses diversos, além da incidência do racismo estrutural
e da naturalização da pobreza.
O fato de as transformações sociais terem promovido avanços significativos,
não equacionam as desigualdades gestadas no seio do sistema capitalista. O peso
do racismo estrutural em nossa realidade, confere sentido e aprofunda assimetrias,
que impõe a lógica racializada do lugar (e no não-lugar) de negros e negras nessa
sociabilidade.
A partir da discussão sobre a oferta de serviços, programas socioassistenciais
e legislações voltadas ao público infantojuvenil, foi possível perceber o princípio da
incompletude das políticas públicas que, desarticuladas, são incapazes de por si só
91

fornecer as bases para uma real proteção dos direitos deste segmento, em sua
universalidade. Esse fato agrava-se quando se trata de crianças e adolescentes
negros(as). Mas, isso se explica quando compreendemos que, ao tempo em que as
políticas surgem para atender a população vulnerabilizada, estas caminham também
no sentido de assegurar a reprodução do capitalismo. E, para isso, é necessário que
se apresentem por ora seletivas.
Segundo as análises consolidadas, foi possível compreender que raça e classe
dão sustentação para a hegemonia de um sistema que reifica, fetichiza e desumaniza
pessoas em detrimento da sua raça e condição socioeconômica. E isso ocorre desde
o momento que elas nascem, quando lhes é retirado os direitos básicos para um
desenvolvimento pleno e saudável. A essas crianças e adolescentes, são negados o
mínimo existencial para a manutenção da vida. Sem acesso pleno à saúde, à
educação e ao lazer, suas vidas são conduzidas a uma adultização precoce com
reduzidas chances de sobrevivência.
Em linhas gerais, as conexões que se buscou estabelecer neste trabalho, visam
demonstrar o perfil socioeconômico da população sergipana submetida ao TI. Bem
como, a falta de acesso somado às condições precarizadas de sobrevivência e ao
racismo estrutural, são fatores determinantes para a pulverização do TI no território
sergipano. E, até mesmo, a legitimação desta violação no senso comum como uma
prática emancipatória, quando, na realidade produz subjetividades dicotomizadas e
alienadas de si, do seu lugar no mundo e de suas potencialidades.
Nada que exclua ou que exproprie a experiência da infância pode ser
considerado uma prática emancipatória. Melhor que qualquer tipo de violência e
violação, é ter seus direitos resguardados e sua dignidade protegida. A infância é um
direito comum e precisa ser respeitado por todos(as), família, Estado e comunidade.
Do contrário, todo arcabouço legislativo conquistado até aqui, representará apenas
letra morta e a ordem vigente permanecerá sendo o ciclo vicioso da pobreza e
desumanização.

Referências

ALMEIDA, S. L. de. Racismo estrutural. 1 ed. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen,
2019.
92

BEHRING, E. R.; BOSCHETTI, I. Política Social: fundamentos e história. 9 ed.


Coleção Biblioteca Básica do Serviço Social, v. 02. São Paulo: Cortez, 2011.

BORGES, J. Encarceramento em massa. 1 ed. São Paulo: Sueli Carneiro;


Pólen, 2019.

BRASIL. Ministério dos Direitos Humanos (MDH). Levantamento Anual SINASE


2016. Brasília: Ministério dos Direitos Humanos, 2018. Disponível em:
https://www.gov.br/mdh/ptbr/assuntos/noticias/2018/marco/Levantamento_2016Final
.pdf. Acesso em: 17 abr. 2020.

BRASIL. Ministério da Economia. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNAD COVID19. Rio de Janeiro:
Ministério da Economia, 2020a. Disponível em:
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101778.pdf. Acesso em: 02 de fev.
de 2022.

BRASIL. Ministério da Economia. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


TRABALHO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES DE 5 A 17 ANOS DE IDADE. PNAD
Contínua 2019. Rio de Janeiro: Ministério da Economia, 2020b. Disponível
em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101777_informativo.pdf. Acesso
em: 13 jan. 2021.

BRASIL. Ministério da Economia. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


Estatísticas. PNAD Contínua 2019. Rio de Janeiro: Ministério da Economia, s.d.
Disponível em: https://www.chegadetrabalhoinfantil.org.br/trabalho-infantil/estatisticas/.
Acesso em: 18 dez. 2020.

BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas


Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Censo Escolar 2021. Brasília: Ministério da
Educação, 2022. Disponível em:
https://inepdata.inep.gov.br/analytics/saw.dll?Portal&NQUser=inepdata&NQPasswor
d=Inep2014&PortalPath=%2Fshared%2FCenso%20da%20Educa%C3%A7%C3%A
3o%20B%C3%A1sica%2F_portal%2FMatr%C3%ADcula%20Inicial. Acesso em: 02
fev. 2022.

BRASIL. Ministério da Cidadania. Tabulador do Cadastro Único. CECAD 2.0. Brasília:


Ministério da Cidadania, 2021. Disponível em:
https://cecad.cidadania.gov.br/tab_cad.php. Acesso em: jan. 2022.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim


Epidemiológico. Análise epidemiológica da violência sexual contra crianças e
adolescentes no Brasil, 2011 a 2017.v. 49, jun. 2018. Disponível em:
https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/boletim-epidemiologico-no-27/.
Acesso em: dez. 2021.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Panorama Nacional: A execução de


medidas socioeducativas de internação. 2012. Programa Justiça ao Jovem.
Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-
93

content/uploads/2011/02/panorama_nacional_doj_web.pdf. Acesso em: 10 de jan. de


2022.

DAVIS, A. Estarão as prisões obsoletas?. 6 ed. Rio de Janeiro: Difel, 2020.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. s.n. Petrópolis: Vozes, 2018.

GONZALEZ, L.; HASENBALG, C. Lugar de negro. 1 ed. Coleção 2 pontos, v. 03. Rio
de Janeiro: Marco Zero, 1982.

MINAYO, M. C. de S. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 13


ed. Petrópolis: Vozes. 2007.

MYRDAL, G. Teoria Econômica e Regiões Subdesenvolvidas. 2 ed. Rio de Janeiro:


Editora Saga, 1957.

MUNANGA, K. Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade


e etnia. In: 3º SEMINÁRIO NACIONAL RELAÇÕES RACIAIS E EDUCAÇÃO-
PENESB, Rio de Janeiro-RJ, 05 nov. 2003. Anais eletrônicos [...]. Rio de Janeiro,
2003. Disponível em:
http://www.acaoeducativa.org.br/downloads/09abordagem.pdf. Acesso em: 16 mar.
2020.

NETTO, J. P. Introdução ao estudo do Método de Marx. 1 ed. São Paulo: Expressão


Popular, 2011.

NOGUERA, R. Necroinfância: por que as crianças negras são assassinadas?. 09 dez.


2020. Lunetas. Disponível em: https://lunetas.com.br/necroinfancia-criancas-negras-
assassinadas/. Acesso em: 13 dez. 2020.

RIBEIRO, B. Mais de 60% das crianças que trabalham no Brasil são negras. 16 jun.
2017. Portal Géledes. Disponível em: https://www.geledes.org.br/mais-de-60-das-
criancas-que-trabalham-no-brasil-sao-negras/. Acesso em: 18 dez. 2020.

TROTSKY, L. A história da revolução russa. 3 ed. v. 01. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1978.

VOLPI, M (org.). O adolescente e o ato infracional. 1 ed. São Paulo: Cortez, 1997.
94

Capítulo IV

A inserção da CIF no contexto da rede de atendimento


para crianças e adolescentes com diversidade
funcional: um estudo de caso na perspectiva da
equoterapia
Kelly Jackeline Oliveira Pereira Andrade

1. Introdução

Cada etapa da vida em sociedade é dada por modificações históricas, não


diferentemente acontece com a infância e a adolescência no Brasil, cada intervalo
apresenta um contexto social distinto, os padrões de cada época e as diferentes
formas como são construídos os seus direitos e como são tratadas e cuidadas. Para
Kuhlmann (2010) a infância tem um significado genérico e, como qualquer outra fase
da vida, esse significado é em função das transformações sociais.
Cada etapa da vida em sociedade é dada por modificações históricas e cada
intervalo da mesma apresenta um contexto social distinto. Não diferentemente
acontece com a infância e a adolescência no Brasil, em que os padrões de cada época
e a construção social deste grupo de pessoas têm delimitado a estrutura dos seus
direitos e a forma em que devem ser tratadas e cuidadas. Para Kuhlmann (2010) a
infância tem um significado genérico e, como qualquer outra fase da vida, esse
significado é em função das transformações sociais.
Os estudos das relações entre sociedade e infância teve início a partir do século
XIX, quando se entende a criança como sujeito de direitos. A partir deste momento,
percebe-se a necessidade de entender a criança como parte deste processo.
O conceito de criança surge no século XX, mais precisamente na década de
1970 com a publicação do livro “História Social da Infância e da Família”, (ARIÈS,
2006). A partir deste evento, concepções de infância começaram a ser pensada por
estudiosos, esta passava a ser compreendida no seu contexto social e econômico a
partir das diferentes idades. Ariès (2006) foi um dos pioneiros nesta discussão e
95

apontou a necessidade de compreender a criança a partir das suas necessidades


inerentes a idade, como um período distinto da vida, algo que até então, nenhum
estudioso havia feito.
Das análises realizadas por Ariés, perpassando por vários períodos históricos
importantes até chegar aos dias atuais, o conceito de infância trazido e considerado
pela sociedade ao longo da história tem se constituído por meio de períodos de
construção e descobertas relacionadas à inserção da criança no convívio social e sua
valorização enquanto ser social que age e interage modificando e reconfigurando o
meio no qual está inserido.
Na atualidade, essa compreensão sobre a situação das crianças e
adolescentes na sociedade encontra-se respaldada pela afirmação de seus direitos
fundamentais estabelecida em vários instrumentos jurídicos internacionais de
proteção dos direitos humanos, como por exemplo, a Declaração Universal dos
Direitos Humanos (1948), a Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente
(1959), e a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e do Adolescente
(1989). Igualmente, no âmbito nacional esta proteção também é garantida na
Constituição da República Federativa do Brasil (1988), e principalmente, no Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA) de 1990.
Nesse contexto, a concepção de infância e adolescência no Brasil, a partir da
implementação de políticas públicas torna-se possível perceber uma maior
preocupação com essa fase da vida, antes considerada apenas biológica. Portanto,
pode-se dizer que esta corresponde a uma fase biopsicossocial que necessita ser
mais estudada, ou ainda, que pode trazer respostas aos inúmeros problemas em que
a sociedade vive, especialmente, advindo do ECA como regulador das garantias e
direitos das crianças e adolescentes no Brasil.
Este instrumento normativo enfatiza os direitos fundamentais relacionando-os
às políticas prioritárias e seus eixos centrais: sobrevivência (saúde), desenvolvimento
pessoal e social (educação, cultura e esporte) e integridade física, moral, psicológica
e social (proteção integral). No entanto, a realidade atual nos mostra que ainda é
necessário adotar políticas públicas capazes de combater e superar as desigualdades
geográficas, sociais e étnicas existentes do país, principalmente, devido à diversidade
de contextos e situações de vulnerabilidade em que se encontra este grupo de
pessoas.
96

Para indagar sobre esta problemática, em nível municipal e tendo em vista a


intervenção equoterapêutica, será realizado um estudo de caso no marco do Projeto
Thomás, que oferece atendimento de equoterapia gratuita para crianças e
adolescentes com diversidade funcional em situação de vulnerabilidade social, na
cidade de São João Del Rei, Minas Gerais. Para tanto será discutido conceitos de
deficiência e diversidade funcional, assim como a apresentação da Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF, como instrumento e a
sua utilização interdisciplinar, especificamente na equoterapia, e vislumbrando sua
utilização por outras redes de atendimento como a assistência social e a educação.
Estimativas realizadas pelo IBGE em 2019 o Brasil possui uma população de
210,1 milhões de pessoas, dos quais 53.759.457 têm menos de 18 anos de idade
(IBGE para 2019), ainda sabe-se que 23% da população geral têm diversidade
funcional e estima-se que, ao menos, 7,5% das crianças brasileiras (até 14 anos de
idade) têm um déficit diagnosticado, segundo pesquisa do IBGE de 2010.
Em relação ao conceito de diversidade funcional, este é um termo relativamente
novo e alternativo ao de deficiência, que tem sido utilizado por iniciativa das próprias
pessoas com diversidade funcional. Pretende substituir a outros, cuja semântica pode-
se considerar pejorativa, como “deficiência”. Trata-se, assim, de uma mudança para
uma terminologia não negativa sobre a diversidade funcional. O termo foi proposto no
Fórum de Vida Independente em janeiro de 2005, na Espanha.
Considerando o conceito de diversidade funcional, o ser biopsicossocial, existe
um instrumento utilizado na área de saúde e também reconhecido pelos direitos
humanos denominada CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade,
Incapacidade e Saúde). O termo do modelo da CIF é a funcionalidade, que cobre os
componentes de funções e estruturas do corpo, atividade e participação social. A CIF
é baseada, portanto, numa abordagem biopsicossocial que incorpora os componentes
de saúde nos níveis corporais e sociais (OMS, 2003).
Assim, Farias e Buchalla, (2005) trazem que na avaliação de uma pessoa com
diversidade funcional, a CIF incorpora as três dimensões: a biomédica, a psicológica
(dimensão individual) e a social, cada nível age sobre e sofre a ação dos demais,
sendo todos influenciados pelos fatores ambientais, inclusive a Organização Mundial
da Saúde (OMS) incorporou os fatores pessoais, importantes na forma de lidar com
as condições limitantes, estão inseridos nas versões atuais.
97

Os conceitos apresentados na CIF introduzem um novo paradigma para pensar


e trabalhar a diversidade funcional traz que esta não é apenas uma consequência das
condições de saúde/doença, mas são influenciadas pelo contexto do meio ambiente
físico e social, pelas diferentes percepções culturais e atitudes em relação à
deficiência, pela disponibilidade de serviços e de legislação (FARIAS; BUCHALLA,
2005).
Dessa forma, a CIF não constitui apenas um instrumento para medir o estado
funcional dos indivíduos. Pois, apresenta em sua estrutura a transversalidade, permite
avaliar as condições de vida e fornecer subsídios para políticas de inclusão social.
Considerando os conceitos mencionados aqui, a importância da criança e do
adolescente com diversidade funcional, a CIF como instrumento que avalia o ser
biopsicossocial, e reconhecendo a equoterapia como uma terapia interdisciplinar que
atende crianças e adolescentes com diversidade funcional, nas áreas da saúde,
educação e esporte, o entendendo como ser integral, o estudo pretende trazer uma
dialógica entre estes.
Sobre a equoterapia, este é um método terapêutico e educacional, regulado
pela lei nº 13.380 de 2019, que tem o cavalo dentro de uma abordagem multidisciplinar
e interdisciplinar, nas áreas de saúde, educação e equitação, buscando o
desenvolvimento biopsicossocial de pessoas com deficiências e/ou necessidades
especiais (ANDE-BRASIL, 2009). A equoterapia é, portanto, aplicada por intermédio
de programas individualizados organizados de acordo com as necessidades e
potencialidades do praticante, a finalidade do programa e os objetivos a serem
alcançados.
Desta maneira, entendendo a CIF como um modelo de instrumento
reconhecido pela OMS e pelos Direitos Humanos e que enxerga o indivíduo com
diversidade funcional em todos os seus contextos e a considerando um instrumento
interdisciplinar e biopsicossocial. Nesse sentido, esta pesquisa se questiona sobre
como implementar a CIF nas políticas (saúde, educação e assistência social) de
atendimento de crianças e adolescentes com diversidade funcional?
Esta pesquisa encontra fundamento na necessidade de aprofundar nos
estudos voltados para uma visão ampliada em relação às crianças e adolescentes,
em um modelo biopsicossocial, centrada no contexto familiar, transversalmente da
CIF, especialmente, quanto à conduta terapêutica e psicossocial a ser adotada para
98

aquelas com diversidade funcional, respeitando o contexto social, as particularidades


e a integralidade a partir de um praticante da equoterapia.
Por conseguinte, o objetivo do trabalho é apresentar o modelo de instrumento
da CIF utilizado na equoterapia como possibilidade de utilização em outros campos,
como saúde, educação e assistência social no munícipio, contextualizando a situação
da criança e adolescente com diversidade funcional assistida e também a sua família.
Para tal será realizado um estudo de caso, com um praticante de equoterapia
no Projeto Thomás, que oferece equoterapia gratuita para crianças e adolescentes
com diversidade funcional em situação de vulnerabilidade social, em São João Del
Rei.
Para isso, esta pesquisa se propõe:
 Descrever a classificação dos domínios da CIF de um praticante de
equoterapia;
 Comparar os domínios indicados por profissionais de diferentes áreas;
 Discutir o modelo transversal da CIF como possibilidade de classificação
multi e interdisciplinar, com pessoas com diversidade funcional, em
diferentes contextos.
Assim, de modo a alcançar os objetivos propostos, passamos a apresentar o
marco teórico que discute e dialoga sobre os conceitos presentes no desenvolvimento
desse trabalho.

1.1 Da deficiência à diversidade funcional

A Lei Brasileira de Inclusão (13.146/2015) concretizou na esfera da legislação


ordinária o denominado modelo social de deficiência, estabelecendo em seu art. 2º,
um conceito aberto e dinâmico, dependendo sua aplicação da análise do caso
concreto.
Art. 2o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade
de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2015).

Os direitos refletem necessidades básicas das crianças e adolescentes, mas o


quê as difere é a responsabilidade, assim quando se baseia nos direitos denotam a
obrigação, o dever do Estado em garanti-los.
99

Como já dito, os direitos destes indivíduos, tendo em vista o princípio da


igualdade, dizem respeito também às pessoas com diversidade funcional, e não
podem ser implantados separadamente.
Neste sentido:

Todos os direitos são indivisíveis e estão correlacionados, sendo todos


eles inerentes à dignidade humana da criança. A aplicação de cada
artigo disposto na Convenção deve, portanto, levar em conta a
aplicação de (e o respeito por) muitos outros direitos da criança
(UNICEF, 1999).

Para Tibyricá (2012), na Declaração Universal dos Direitos da Criança:

A Convenção dá um grande passo, pois passa do modelo médico para


o modelo social e nos remete a CIF (Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde) da Organização Mundial de
Saúde (OMS) de 2001, que permite descrever situações relacionadas
com a funcionalidade do ser humano e suas restrições (TIBYRICÁ,
2012, on-line).

Ainda “todos os direitos são indivisíveis e estão correlacionados, sendo todos


eles inerentes à dignidade humana da criança. A aplicação de cada artigo disposto na
Convenção deve, portanto, levar em conta a aplicação de (e o respeito por) muitos
outros direitos da criança” (UNICEF, 1999, on-line).

A Convenção possui quatro princípios gerais que lhe dá sustentação,


quais sejam: a) não discriminação, no art. 2.º; b) interesse superior da
criança, no art. 3.º; c) sobrevivência e o desenvolvimento, no art. 6.º;
d) respeito pelas opiniões da criança, no art. 12 (ALBERNAZ JR;
FERREIRA, 2012).

Em conformidade com o ECA, observa-se que em questão de dispositivos


legais destinados a proteção dos direitos das crianças e adolescentes, o ordenamento
jurídico encontra-se bem embasado. No entanto, se é difícil ser plenamente acolhido
pelas políticas públicas, quando se trata de crianças e adolescentes, a maior
dificuldade é para os com diversidade funcional que ainda tem o combate ao
preconceito e discriminação.
A modificação na nomenclatura de pessoa com deficiência para pessoa com
diversidade funcional, surgi com o objetivo semântico para substituir termos como
deficiência, termo este pouco usado ainda na produção do saber, na prática clínica
por profissionais que acompanham pessoas com diversidade funcional e
100

principalmente nas políticas públicas, este termo nasceu no Fórum de Vida


Independente, em 2005, na Espanha (PEREIRA, 2009).
No livro O normal e o Patológico, Canguilhem (1978, p. 101-102) afirma, “com
irretocável consistência, que a anomalia é fato biológico”. E, nesse sentido,
acrescentamos que a condição que costumamos chamar de deficiência também o é.
Ou seja, a deficiência, qualquer que seja, é fato biológico de diferenciação
física, sensorial, orgânica ou intelectual.
Essa caracterização emprestada de Canguilhem é pertinente mesmo em
relação à deficiência adquirida, cujas limitações decorrentes são contornadas pela
reabilitação, pelo reaprendizado das funções alteradas ou perdidas, pelo uso de
próteses ou por alguma adaptação desencadeada no próprio organismo.
Na deficiência adquirida o fato biológico não existe por si só, posto que haja
fatores ambientais ocorrendo para o seu surgimento. Mas, ainda assim, é na
dimensão orgânica que as modificações acontecem, ou, usando palavras de
Canguilhem (1978, p.109), na dimensão orgânica “o ser é capaz de instituir novas
normas”.
O fato biológico presente na deficiência produz, em algum grau, uma diferença
funcional. Dessa forma, em vez de ineficiência e incapacidade, sentido literal de
deficiência, a condição deficiência é, de fato, uma diferença funcional.
Para quem lida diretamente com a diversidade funcional, sempre estiveram
claros os aspectos negativos, discriminatórios, limitados e contraditórios da
terminologia em uso. Sabe-se que a conceituação e a terminologia aplicadas às
deficiências foram desenvolvidas inicialmente para atender a uma clientela que toma
decisões sobre a vida das pessoas que apresentam alguma diferença funcional, a
saber, a medicina, a seguridade social e a reabilitação (PEREIRA, 2006).
Em termos práticos, a terminologia responsabiliza diretamente a pessoa por
sua condição física ou orgânica, ao mesmo tempo em que parece isentar a sociedade
e o ambiente físico de qualquer responsabilidade ou participação, apesar da
generalizada falta de meios sociais e ambientais para todos integrar de modo pleno.
Por ironia, as chamadas pessoas com deficiência tornam-se limitadas
exatamente naqueles pontos em que a sociedade e/ou o ambiente são excludentes
em relação à diversidade funcional. A responsabilidade recai sobre a pessoa que
apresenta diferença funcional quando se espera ou se exige que ela se reabilite, se
“normalize”, se adapte a uma sociedade que, de fato, foi construída para atender
101

àqueles que correspondem ao padrão de “normalidade”. A diversidade funcional


sempre foi percebida, compreendida e tratada a partir de um conjunto de
representações próprio da cultura ou da sociedade em que está inserida.
O fundamento de tais representações é formado por padrões religiosos,
familiares, sociais, econômicos e culturais, que compõem os ideais de forma,
aparência e funcionamento de nosso corpo.
Assim, cada cultura e cada época apresentam concepções próprias de
diversidade funcional, englobando crenças ou mitos explicativos, bem como formas
de tratamento da questão, o que resulta num leque de procedimentos e atitudes que
variam entre segregação social, eliminação sumária, divinização, acolhimento ou
indiferença. Independentemente da concepção de diferença funcional, dos rituais ou
das formas de tratamento, ou mesmo do status social dessas pessoas em uma
sociedade, a diversidade funcional e tudo aquilo que a ela se vincula constituem partes
integrantes daquela sociedade e daquela cultura, mesmo que nela a segregação ou a
eliminação sejam práticas comuns. Surgem, assim, concebidos e reforçados pela
cultura, os modelos tomados como referência para a aparência, a forma e o
funcionamento do corpo.
Quando pensa no indivíduo, criança ou adolescente com diversidade funcional,
rapidamente associa-se à CIF, pois a mesma traz em si uma classificação do ser de
forma biopsicossocial, leva em consideração a estrutura do corpo, a função da
estrutura, a atividade e participação, e fatores ambientais, e fatores pessoais, através
de uma linguagem padronizada que é reconhecida em todo o mundo, sendo CIF e
CID 10 complementares.

1.2. A Classificação Internacional de Funcionalidade e


Incapacidade – CIF

A CIF cria um arcabouço para uma linguagem unificada de descrição da


funcionalidade em nível individual e populacional.
Conceitos como capacidade e desempenho representam a matriz da
informação gerada por ela. Embasa a descrição das barreiras e dos facilitadores
ambientais, incluindo tecnologias, como no caso das órteses e das próteses.
102

Alterações fisiológicas e anatômicas também ganham uma descrição


padronizada a partir da CIF. Por sua vez, as limitações de atividades e as restrições
da participação social passam a ter uma organização formal.
A linguagem dos profissionais entra numa diretriz única, permitindo uma melhor
comunicação interprofissional em saúde, possibilitando uma abordagem
interdisciplinar que possa efetivamente atender todas as demandas de um indivíduo
que procura um serviço de saúde. Além da linguagem, a CIF está enraizada no
“modelo biopsicossocial e espiritual” da OMS, que substituiu o modelo centrado em
uma doença ou condição mórbida. No modelo biopsicossocial e espiritual, o
entendimento da funcionalidade finalmente considera a relação dependente de vários
fatores que existem na presença (ou não) de uma doença específica.
Ao usar os conceitos da CIF, o profissional não classifica o indivíduo, mas a
atual situação na qual ele se encontra. Finalmente, a codificação de diagnósticos
permite o tratamento estatístico e a criação de indicadores de saúde para políticas
públicas, que por sua vez, vão auxiliar na educação em saúde, tanto dos profissionais
quanto da população em geral.
A figura abaixo, usada em uma das apresentações do último encontro da OMS,
mostra as relações entre os principais objetivos da CIF:

Figura 4. Modelo da CIF Biopsicossocial

Fonte: WHO World Health Organization

Em 2005 foi elaborada a CIF- CJ desenvolvida em necessidade de uma versão


da CIF que fosse utilizada universalmente para crianças e adolescentes nos setores
sociais, de saúde e de educação.
103

As condições de saúde de crianças e jovens são diferentes em natureza,


intensidade e impacto, assim estas precisam levar em conta, de modo que esta seja
sensível às mudanças com o desenvolvimento e associada a diferentes grupos etários
e ambientes. A faixa etária da CIF- CJ vai do nascimento até 18 anos (CIF- CJ, 2005).
No entanto, a CIF e a CIF- CJ atualmente compartilham uma ontologia comum
e de acordo com as ontologias compartilhadas em discussão na WHO-FIC, decidiu-
se que os itens da CIF- CJ fossem adicionados à estrutura básica da CIF, durante o
processo de atualização ou incorporados na estrutura básica da CIF, em congruência
com o modelo de informação. Assim, a CIF-CJ foi mantida como uma classificação
derivada especial (como uma linearização da estrutura básica da CIF), compartilhando
a estrutura básica comum.
Portanto, não houve atualizações da CIF-CJ separadas, mas um processo
unificado para todas as atualizações da CIF e o Conselho Consultivo solicitou aos
comitês pertinentes (tais como o FDRG) que trabalhassem no modelo de informação
e que apresentas sem um relatório ao Conselho. Existindo hoje uma única versão da
CIF atualizada.

1.3 Interdisciplinaridade e transversalidade

Com a interdisciplinaridade questiona-se essa segmentação dos diferentes


campos de conhecimento. Buscam-se, por isso, os possíveis pontos de convergência
entre as várias áreas e a sua abordagem conjunta, propiciando uma relação
epistemológica entre as disciplinas.
Com ela aproximamo-nos com mais propriedade dos fenômenos naturais e
sociais, que são normalmente complexos e irredutíveis ao conhecimento obtido
quando são estudados por meio de uma única disciplina.
Considera-se a transversalidade como o modo adequado para o tratamento
destes temas. Eles não devem constituir uma disciplina, mas permear toda a prática
educativa: uma abordagem "transversal", perpassando as disciplinas. Um modo
particularmente eficiente de se elaborar os programas de ensino é fazer dos temas
transversais um eixo unificador, em torno do qual se organizam as disciplinas. Todas
se voltam para eles como para um centro, estruturando os seus próprios conteúdos
104

sob o prisma dos temas transversais. As disciplinas passam, então, a girar sobre esse
eixo.
Para Garcia (2007) a transversalidade e a interdisciplinaridade são modos de
se trabalhar o conhecimento que buscam uma reintegração de aspectos que ficaram
isolados uns dos outros pelo tratamento disciplinar. Há temas cujo estudo exige uma
abordagem particularmente ampla e diversificada. Alguns deles foram inseridos nos
parâmetros curriculares nacionais, que os denominam temas transversais e os
caracterizam como temas que “tratam de processos que estão sendo intensamente
vividos pela sociedade, pelas comunidades, pelas famílias, pelos alunos e educadores
em seu cotidiano”. São debatidos em diferentes espaços sociais, em busca de
soluções e de alternativas, confrontando posicionamentos diversos tanto em relação
à intervenção no âmbito social mais amplo quanto à atuação pessoal. São questões
urgentes que interrogam sobre a vida humana, sobre a realidade que está sendo
construída e que demandam transformações macrossociais e também de atitudes
pessoais, exigindo, portanto, ensino e aprendizagem de conteúdos relativos a essas
duas dimensões.

1.4 Equoterapia

Todo ser humano com necessidade especial tem direito natural e


social de escolher a equoterapia e de ter acesso a ela. Adaptação da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo XXV.

O uso de cavalos em práticas terapêuticas (regulamentada por lei, e


reconhecida como método terapêutico pelo Conselho Federal de Medicina, em 1997)
traz benefícios biopsicossociais em pessoas com diversidade funcional.
Denominado equoterapia, vem sendo utilizado desde algum tempo em todo o
mundo, e mais recentemente no Brasil. A terapia com cavalos nasceu na França, em
1965, e como marco, a autora Lalleri publicou A Reeducação através da Equitação.
Nesse livro, ela relata, empiricamente, a história de uma jovem com diversidade
funcional tratada com natação e equitação com resultados surpreendentes. O
tratamento terapêutico com cavalo tornou-se matéria didática na França e, em 1969,
surgiu o primeiro trabalho científico de reeducação equestre no Centro Hospitalar
Universitário de Salpitrieri.
105

A utilização deste tratamento já era proeminente após o término da segunda


Guerra Mundial na recuperação física e psicológica dos mutilados de guerra. E em
1972, a Dra. Collete Picart Tritelin, defendeu a primeira tese de doutorado em
medicina, reabilitação equestre na Universidade de Paris em Val-de-Marte. Esse
método chegou ao Brasil em 1971, trazido pela Dra. Gabriele Brigitte Walter, e vem
sendo estudado e aplicado com sucesso através dos anos (Uzun, 2005).
Com a criação da ANDE-Brasil, em 1989, foi dado um grande impulso à
implantação de centros de equoterapia no país, contando atualmente com entidades
em território nacional.
A palavra equoterapia foi criada pela ANDE-Brasil, em 1989, para caracterizar
todas “as práticas que utilizem o cavalo com técnicas de equitação e atividades
equestres, objetivando a reabilitação e/ou educação de pessoas com deficiência ou
com necessidades especiais” (ANDE-BRASIL, 1989).
Entre os benefícios da equoterapia, pode-se destacar: equilíbrio e coordenação
motora, força muscular, consciência corporal, organização espaço temporal,
sensorial, funcionalidade, controle da respiração, concentração para a realização das
atividades, iniciativa, autoestima, autocontrole, autoconfiança, empoderamento,
aprendizagem, desenvolvimento cognitivo e intelectual, independência nas atividades
da vida diária (AVD´s), maior interação social com as pessoas e com o mundo, além
de um momento prazeroso de contato com os animais, com a natureza e prática
esportiva.
A ANDE-Brasil (Associação Nacional de Equoterapia), em Brasília, instituição
que regulamenta a equoterapia, incentiva a pesquisa e presta atendimento de
equoterapia com 100% de filantropia. Segundo Furtado (2004), estima-se que, para
cada sela disponível neste tipo de atividade, existam cerca de 800 interessados a
realizarem esta prática terapêutica.
A equoterapia, por meio do movimento tridimensional realizado pelo cavalo,
proporciona inputs sensório-motores que influenciam adequadamente no
processamento sensorial e neuromotor, refletindo no equilíbrio, postura, força e
coordenação sensório-motora, pois ocorrem inúmeros estímulos ao sistema vestibular
e proprioceptivo, devido ao constante deslocamento do centro de gravidade,
dissociação escapular e pélvica, mudanças no campo visual, estímulos táteis e
olfativos (BENDA; Mc GIBBON; GRANT, 2003; MEREGILLANO, 2004).
106

Uma vez que a equoterapia favorece o desenvolvimento da capacidade de


manter a atenção e concentração, estabelece vínculos afetivos e de autoconfiança
dos indivíduos que a praticam, empoderando-se quando estão sobre o cavalo, ela
assume um caráter de suma importância, se aliada ao processo pedagógico de
crianças e adolescentes com distúrbios de aprendizagem diversos (ANDE-BRASIL,
2007).
Por se tratar de um ambiente rico, ao ar livre, a equoterapia se torna menos
cansativa para o praticante, tendo maior aceitação e melhor desempenho dos
mesmos, além da presença do cavalo com o seu movimento tridimensional, o
ambiente é lúdico, rico em cores, atividades, brincadeiras, músicas e também a
interação com toda a equipe. Este ambiente lúdico permite que os praticantes possam
ter contato com a natureza, com o cavalo, ter experiências diferentes e prazerosas, e
vivenciem o brincar.
Neste sentido, ao conceituar o lúdico, Hermann (1982) afirma que, a partir da
atividade lúdica, a criança procura exercitar e organizar seus conteúdos mentais e
seus impulsos instintivos. O “era uma vez” é uma forma de introdução do imaginário
como espaço de simbolização em que a criança “eu mundo interno e suas relações
com o mundo externo”.
Winnicott (1997) destaca que as crianças brincam por prazer, mas também
para dominar angústias, controlar ideias ou impulsos que conduzem à angústia, se
não forem dominados. Refere-se à atividade lúdica como uma experiência criativa,
uma experiência na continuidade espaço-tempo, ou seja, uma forma básica de viver.
“É no brincar, e talvez apenas no brincar, que a criança ou o adulto fruem sua
liberdade de criação”.
Conclui que, somente sendo criativo, que o indivíduo descobre seu eu, (1975,
p.79). Na concepção de Winnicott (1982), a base do viver criativamente está no
brincar. Daí sua importância para o desenvolvimento da criança e é tão importante na
equoterapia.
Na cidade de São João Del Rei e nas circunvizinhas, atualmente existe um
único Centro que oferece Equoterapia e de forma gratuita, através da Associação Vale
dos Passos e o Programa Thomás, para crianças e adolescentes em situação de
vulnerabilidade social.
O Estatuto da Criança e do Adolescente enfatiza os direitos fundamentais
relacionando-os às políticas prioritárias e seus eixos centrais: sobrevivência (saúde),
107

desenvolvimento pessoal e social (educação, cultura e esporte) e integridade física,


moral, psicológica e social (proteção integral), todos estes devem ser garantias pela
equoterapia.
O marco regulatório que orienta a equoterapia no Projeto está voltado
principalmente para o eixo de promoção que envolve: direito a saúde, à educação, ao
esporte e ao brincar.

2. Procedimentos metodológicos

Para atingir esse propósito este trabalho baliza-se na inovação e flexibilidade,


considerando a pluralidade dos saberes e da interdisciplinaridade caminhando para a
transdiciplinariedade, e transversalidade, conceitos atuais e os direitos da criança e
do adolescente, objetivando uma avaliação biopsicossocial através da CIF, a partir de
uma visão competente e cidadã dos envolvidos e melhor absorção das tecnologias
pela sociedade.
A ação dialógica é relevante, produzindo uma linguagem que fomenta de
subjetividade, considerando todo ser humano como um todo inacabado que se
constitui de suas relações sociais.

2.1 Percurso metodológico

A investigação científica fundamenta-se na lógica da metodologia empírica


(POPPER, 2003), visto que, configura-se como um procedimento sistemático e
reflexivo que objetiva a aquisição do conhecimento através da descoberta de fatos
e/ou leis (ANDER-EGG, 1978; COLLIS; HUSSEY, 2005).
Quanto à universalidade da pesquisa científica, Booth, Colomb e Williams
(2000) salientam que este processo é desenvolvido em todas as áreas do
conhecimento.
Todavia, para assegurar o prestígio e confiabilidade deste processo, é
necessária a adoção de um método de pesquisa adequado, capaz de contemplar da
melhor forma possível o problema de investigação (VERA, 1980).
108

Deste modo, a metodologia das pesquisas científicas pode ser classificada e


definida conforme sua abordagem, finalidade e procedimentos técnicos empregados
(GIL, 2010; VERGARA 2006).
O estudo de caso envolve o estudo profundo e exaustivo de um objeto de
maneira que se permita o seu amplo e detalhado conhecimento no contexto em que
é vivenciado.
Diante disso, considera-se que o referido método será o mais adequado para a
investigação profunda sobre o serviço de acolhimento familiar.
Para Yin (2001), o Estudo de caso se caracteriza como:

[...] uma investigação científica que investiga um fenômeno


contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente
quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente
definidos; enfrenta uma situação tecnicamente única em que haverá
muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados e, como
resultado, baseia-se em várias fontes de evidência [...] e beneficia-se
do desenvolvimento prévio de proposições teóricas para conduzir a
coleta e análise dos dados (YIN, 2001, p. 32-33).

Com vistas a isso, a pesquisa de natureza qualitativa, dar-se-á por meio de


estudo de caso de cunho explicativo e caráter exploratório.
A pesquisa explicativa registra fatos, analisa-os, interpreta-os e identifica suas
causas. Essa prática visa ampliar generalizações, definir leis mais amplas, estruturar
e definir modelos teóricos, relacionar hipóteses em uma visão mais unitária do
universo ou âmbito produtivo em geral e gerar hipóteses ou ideias por força de
dedução lógica (LAKATOS; MARCONI, 2011). A pesquisa explicativa, por sua vez,
está baseada em experimentos, envolvendo hipóteses especulativas e a definição de
relações causais (VERGARA 2006). Santos (1999) destaca que a finalidade da
pesquisa explicativa consiste na criação e explicação de determinada teoria sobre um
processo, fenômeno e/ou fato.
O caráter exploratório visa à descoberta, o achado, a elucidação de fenômenos
ou a explicação daqueles que não eram aceitos apesar de evidentes. A exploração
representa, atualmente, um importante diferencial competitivo em termos de
concorrência (GONÇALVES, 2014). O estudo exploratório tem por objetivo
proporcionar familiaridade com o problema, maximizando o conhecimento do
pesquisador em relação a este. Normalmente consiste no primeiro passo para quem
pretende estudar sobre um campo o qual não detém conhecimento suficientemente
(SELLTIZ, 1967), servindo como ponto inicial para estudos futuros (COLLIS;
109

HUSSEY, 2005). Explicativo e exploratório pretende-se identificar as relações entre


um conjunto de variáveis e informações contidas nos levantamentos feitos e relatórios
apresentados. E o percurso metodológico deste trabalho toma como referencial os
objetivos específicos traçados e relacionados conforme quadro a seguir:

Quadro 6. Percurso metodológico

Objetivos específicos Coleta de dado Análise de quadro de dado


Descrever a classificação Busca na plataforma da Os dados serão analisados por
dos domínios da CIF de um Biblioteca Digital de Tese meio de revisão bibliográfica
praticante de equoterapia e Dissertações, na base
Scielo, e PubMed, de
modo a realizar a coleta
de trabalhos que
apresentam teoricamente
a definição, descrição e
conceito a serem
analisados.
Comparar os domínios Prontuários de um Os dados serão analisados por
indicados por profissionais praticante atendido no meio de estudo de caso do
de diferentes áreas marco do Projeto Thomas instrumento CIF
de São João De Rei –
MG.
Discutir o modelo Aplicar a CIF de um Os dados serão analisados por
transversal da CIF como praticante atendido no meio de estudo de caso do
possibilidade de Projeto Thomas, e realizar instrumento CIF
classificação multi e registro fotográfico do
interdisciplinar, com método.
pessoas com diversidade
funcional, em diferentes
contextos.

Fonte: elaboração da autora

O delineamento do estudo de caso como metodologia de investigação mostra


a possibilidade da definição de quatro fases relacionadas: delimitação da unidade-
caso, coleta de dados, seleção, análise e interpretação dos dados e elaboração do
relatório do caso.
Considerando os referenciais aqui expostos e diante da problemática entorno
a: como implementar a CIF nas políticas (saúde, educação e assistência social) de
atendimento de crianças e adolescentes com diversidade funcional? Será realizado
um estudo de caso com praticante com diversidade funcional, do Projeto Thomás,
utilizando como instrumento de análise a CIF, por meio da aplicação pela equipe
interdisciplinar (fisioterapeuta, psicóloga, assistente social e pedagoga).
110

A equoterapia é uma terapia interdisciplinar que busca a transdiciplinariedade,


nesta obrigatoriamente estão inseridos vários profissionais especialistas, sendo
considerada a equipe mínima fisioterapeuta, psicólogo e equitador, mas estão
inseridos como profissionais especialistas complementares: pedagogo, educador
físico, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional. Desde a avaliação, até o atendimento
todas as decisões passam pela interdisciplinaridade da equipe, isto inclui a
classificação da CIF e seus domínios.
A interdisciplinaridade é fundamental para a compreensão do conjunto de
questões que interferem na vida de uma pessoa. O contexto em que a pessoa vive
é altamente relevante, pois os fatores ambientais e pessoais interagem com as
atividades e a participação.
Logo, se um ambiente é acessível ou inacessível, se disponibiliza ou não
tecnologia assistida, se as atitudes das pessoas são positivas ou negativas, e se
sistemas, normas e leis estimulam uma sociedade inclusiva ou não, esses são
fatores ambientais que interferem na funcionalidade da pessoa e precisam ser
ajustados.
111

Figura 5. Raciocínio clínico baseado na Classificação Internacional de Funcionalidade e


Incapacidade – CIF (OMS, 2021)

Condição de saúde

Estrutura e funções do corpo Atividade Participação


Deficiências: Limitações: Restrições:

Fatores contextuais

Fatores ambientais Fatores pessoais


Facilitadores:

Barreiras:

Fonte: CIF, 2001

O modelo biopsicossocial tem um enfoque maior para a comunidade e para


o ambiente social. Ele compreende a diversidade funcional como uma
característica, leva em consideração a incapacidade associada à falta de recursos
de acessibilidade no ambiente onde a pessoa vive. Desta forma, não atribui a
incapacidade à pessoa, mas a considera uma responsabilidade coletiva.
As intervenções demandam uma ação social, e dependem de diversas
dimensões para inclusão, que vão além das questões de saúde.
A CIF está baseada na integração dos dois modelos tendo como resultado
uma abordagem “biopsicossocial”, que considera uma perspectiva biológica,
individual e social. Oferece uma estrutura organizada de dados que pode dar
respaldo a sistemas de informação em diferentes áreas, serviços e para dados
populacionais relevantes para as políticas. Se os registros, pesquisas e estatísticas
sobre funcionalidade e incapacidade forem baseados no modelo e quadro da CIF, eles
contribuirão de forma mais eficiente para uma compreensão nacional e internacional
112

coerente da funcionalidade e incapacidade e para dados comparáveis entre contextos


e épocas.
Lusk e Faker (2013) destacam no contexto da CIF a importância da inserção
familiar no processo de cuidado, como um facilitador da funcionalidade e
potencializador de resultados relevantes focados nas necessidades da criança e sua
família.
Desta forma, o cuidado centrado na família é baseado no preceito de que a
criança e adolescente, e a família são parceiros ativos no processo de cuidado,
construindo relações mútuas de compartilhamento de poder e tomada de decisões
com base nas reais necessidades do paciente.
A abordagem de cuidado centrado na família tem se mostrado uma prática
crítica para melhora da qualidade de vida de lactentes, crianças e adolescentes com
alguma diversidade, bem como no autocuidado e maior conhecimento sobre o estado
de saúde. E que para que essa abordagem seja inserida de maneira efetiva, é
necessário o uso de instrumentos de qualidade que auxiliem na condução de
orientações para a educação da família (SOUSA e FIGUEIREDO, 2010).
É importante que esses instrumentos também comtemplem os domínios da
CIF, permitindo a aplicabilidade de uma abordagem biopsicossocial, com a
participação ativa do paciente e da família.
Segundo Rosenbaum e Gorter (2012) dentre os instrumentos, destaca-se o “F-
Words for Childhood Disability”, criado em 2012 pela equipe do Can Child (McMaster
University, Canadá).
Esse instrumento visa associar de maneira simples os domínios da CIF, com
as principais áreas da vida de crianças e adolescentes com diversidade, de modo a
facilitar a abordagem biopsicossocial na prática clínica e no contexto das famílias.
As “F-Words”, traduzidas em sua primeira forma para o português brasileiro
como “Minhas Palavras Favoritas” pelo Laboratório de Ensino e Pesquisa em Terapia
Ocupacional, Infância e Adolescência (LEPTOI), são um conjunto de seis palavras
iniciadas pela letra F em sua versão original em inglês, sendo: function/funcão,
family/família, fitness/saúde, fun/diversão, friends/amigos e future/futuro. A partir da
abordagem baseada neste contexto, facilita-se a classificação e que intervenções
sejam orientadas visando buscar melhorias na qualidade de vida das crianças e das
famílias, ressaltando que a CIF não é avaliação, ela facilita esta, é uma classificação.
113

No mais é relevante entender que não existe hierarquia entre os domínios da CIF, eles
estão interligados e que ela é um instrumento centrado no sujeito e na família.

2.1.1 O estudo de caso e o Projeto Thomás


No Projeto Thomás os ensinamentos são transmitidos a partir das brincadeiras,
enquanto as crianças observam um espaço cercado por natureza, animais como
cachorros e pássaros, além de outros personagens que compõem o Instituto Passos
do Vale na cidade de São João Del Rei. Em um meio rico em estímulos naturais, o
imaginário das crianças e adolescentes, corpo, linguagem e técnica são
desenvolvidos em perfeita interação com o meio e com a equipe multi e
interdisciplinar.
Mais do que uma diversão, a prática toda equoterapia traz ganhos no aspecto
biopsicossocial, enquanto estimula o controle postural, traz noções de cuidado com
os cavalos, respeito às normas de convívio e alinhamento corporal.
A equoterapia é muito mais que cavalgar ou montar no cavalo, começa desde
o momento que a criança chega ao Centro e olha para o cavalo, ali já acontece à
primeira troca, o primeiro contato, existe além do montar todo um trabalho de solo e
também o processo de aproximação. Em um atendimento, temos o acolhimento do
praticante, o equipamento de segurança, a aproximação do cavalo, a montaria
(quando o praticante já monta), as atividades do dia, retirada do equipamento de
segurança e a despedida.
A personalidade e o condicionamento dos cavalos são itens importantes a
serem observados quando lidamos com crianças. Os animais são escolhidos para
atender as especificidades próprias, precisam ser treinados para não reagir, o cavalo
precisa confiar plenamente no praticante, lidar com o cavalo faz com que a criança e
o adolescente desenvolvam o sentido de cuidado e responsabilidade.
A seleção da criança ou adolescente seguiu os critérios do Projeto Thomás que
inclui, além do critério idade, ter comprometimentos no desenvolvimento
biopsicossocial, encaminhamento médico para a equoterapia e viver em situação de
vulnerabilidade social.
114

2.1.2 Critérios sociais para a inclusão no Projeto Thomás


Passar pela entrevista socioeconômica com a assistente social do Projeto
Thomás, na qual a família do assistido deverá apresentar documentos que
comprovem na seguinte ordem:
 A renda familiar ser igual ou inferior a um salário mínimo vigente no ano, renda
per capta;
 A renda familiar superior a um salário mínimo vigente no ano, porém ser
mantenedor sozinho das despesas da casa, devidamente comprovadas.
Passando por avaliação a cada seis meses;
 A renda familiar ser superior a um salário mínimo vigente no ano, porém existir
na família idoso com comorbidades, ou mais algum membro da família com
diversidade funcional;
 Visita familiar na casa do assistido pela assistente social, quando esta acreditar
ser necessário.

2.1.3 Critérios para seleção do praticante pela equipe interdisciplinar no Projeto


Thomás
Após a família do assistido, passar pela avaliação da assistente social, o
responsável preencherá uma ficha individualizada com os dados pessoais e foto do
praticante.
Logo, cabe à equipe da equoterapia formada por fisioterapeuta/equoterapeuta,
psicóloga/equoterapeuta, receber a autorização médica, avaliar o praticante, planejar
através de reuniões de estudos de caso a conduta e realizar os atendimentos.
A equipe realiza um protocolo de avaliação e acompanhamento, que
correspondem a dez sessões iniciais, e o andamento dos atendimentos. (ANEXO 1)

2.2 Seleção do participante para estudo de caso

A pesquisadora do presente estudo trabalha no Instituto Passos do Vale, no


Projeto Thomás no qual acontecerá o mesmo, o Projeto atende um total de sessenta
crianças e adolescentes, analisando os prontuários, a equipe interdisciplinar optou por
três praticantes que poderiam demonstrar a aplicação da CIF em todos os seus
115

domínios e com qualificadores deste modo foram realizados os convites e a mãe do


praticante escolhido para o estudo, aceitou prontamente a participação. (ANEXO 2)
As limitações do método de coleta e análise dos dados, de acordo com Sá-
Silva, Almeida e Guindani (2009) está na capacidade do pesquisador de interpretação,
síntese, vislumbrar tendências e fazer inferências a partir dos dados retiradas no
documento.
Para justificar tal assertiva citam May (2004, p. 206) que diz: “os documentos
não existem isoladamente, mas precisam ser situados em uma estrutura teórica para
que o seu conteúdo seja entendido” (AVELINO, 2018).
Neste sentido complementa Silva, Damasceno, Martins, Sobral, Faria (2009,
p. 4561) a coleta de dados e sua análise exigem sensibilidade e competência teórica
do pesquisador, pois todas as fases do procedimento se concretizam a partir de um
“processo sistemático, exaustivo, coerente, sensível e criativo” (AVELINO, 2018).

2.2.1. Análise do prontuário


Segundo Devereaux (2013), a informação relativa ao paciente, obtida pelos
profissionais de saúde em razão do seu cuidado, e registrada em seu prontuário, tem
como finalidade primária a qualidade e a continuidade do cuidado do paciente, na
medida em que cria um meio de comunicação entre os profissionais de saúde sobre
o plano de tratamento, medidas preventivas e outros temas afetos ao paciente.
Contudo, essa informação pode ser utilizada para outros fins, como a pesquisa
cientifica, e é denominado de “segundo uso”. Com efeito, a pesquisa científica que
envolve o “segundo uso” de informação constante do prontuário do paciente é
amplamente disseminada no Brasil e em outros países.
A sua relevância para a produção de conhecimento científico é patente, na
medida em que permite a coleta de informação sobre a saúde do paciente, que poderá
ser utilizada em pesquisas epidemiológicas e biomédicas. Quanto aos pacientes,
segundo a Council for International Organizations of Medical Sciences - CIOMS, “a
grande maioria das pessoas não se opõe ao fato de seus dados serem armazenados
e utilizados em pesquisas que visem o bem comum”.

2.2.2. Prontuário do praticante


Praticante JV, 11 anos, masculino, diagnóstico médico e interdisciplinar de
Transtorno do Espectro Autista (TEA), grau III, CID 10 - F84, aos 3 anos, filho mais
116

novo de uma família de 3 filhos, pais casados, moradores do Distrito de Ribeirão de


Paulo Antônio, no Município de Resende Costa, Minas Gerais. Os pais são lavradores,
possuem nível de escolaridade Ensino Fundamental 1, casa própria com 7 cômodos,
feita de adobro, abastecimento de água do poço, água sem tratamento, filtrada, tem
saneamento básico pela rede pública, recentemente começou a receber o BPC.
Entrou na escola regular, mas não se adaptou, a escola demorou a encaminhá-
lo para a Associação de Pais e Amigos de Excepcionais (APAE), somente em 2017 o
JV começou o acompanhamento com o fonoaudiólogo e pedagógico, duas vezes por
semana, porém segundo a mãe “as duas fonoaudiólogas recusaram continuar os
atendimentos do JV devido às crises sensoriais”.
Ainda, de acordo com a mesma “todos os médicos que o JV passou, falaram
que ele iniciou as terapias muito tardiamente, principalmente a fonoaudiologia que ele
não fez, e a psicóloga que a APAE não disponibilizou, o que prejudicou muito o seu
quadro”, em 2021 uma médica psiquiatra da infância e da adolescência o encaminhou
para várias terapias, e orientou a mãe que era direito do JV acesso as terapias e que
a mãe deveria lutar por este direito, foi deste modo que ele chegou até a equoterapia.
O JV é aluno da APAE, local onde é acompanhado neste momento pela
psicopedagoga, era pela psicóloga, mas com o final do contrato da profissional, ainda
não começou a nova contratada, a fonoaudiologia foi solicitada pela médica, mas a
APAE não disponibilizou para ele ainda.
Chegou até a equoterapia por encaminhamento médico, na avaliação
interdisciplinar, apresentou as principais características: não verbal, não simboliza,
dificuldade de comunicação, não faz contato visual, características de desorganização
sensorial severa (tátil, olfativa, visual, auditiva), dificuldade de interação e de
habilidades sociais, estereotipias, skin picking, crises frequentes e com autoagressão.
Encaminhamos para outras terapias que são fundamentais para o quadro
clínico dele, como: Terapia Ocupacional e Terapia Comportamental, mas não
conseguiu vaga pelo SUS e a família não consegue pagar pelas terapias particulares.
Além disto, estas terapias que ele faz, o praticante depende do carro do município
para leva-lo, assim como acontece com a equoterapia.
O JV é autista grau 3, altamente dependente e apresenta extrema dificuldade
para lidar com mudanças, o que impacta significativamente a sua vida, além de gerar
sofrimento para o JV, assim como para a família.
117

A mãe é muito dedicada, cuida integralmente dele, porém sofre quando as


crises acontecem, estas são frequentes, e também por não conseguir oferecer todas
as terapias, já que ele necessita de atendimento multidisciplinar, mas este
atendimento não condiz com a realidade socioeconômica familiar. Há relatos da mãe
que algumas vezes as terapias foram iniciadas, mas logo os profissionais desistiram
do atendimento por causa das crises sensoriais severas.
Em relação à equoterapia, é acompanhado pela equipe interdisciplinar
equoterapeuta/fisioterapeuta, equoterapeuta/psicóloga, auxiliar lateral e equitador,
estabeleceu bom vínculo com a equipe, à mãe diz que ele demonstra saber o dia que
tem equoterapia. Enquanto está com a equipe, a mãe recebe acolhimento terapêutico
com outra psicóloga também do Projeto Thomás.
O JV passou por um processo de aproximação do cavalo demorado, porque
ele demonstra dificuldade de simbolizar e de interesse, às vezes tem crise sensorial
antes ou quando chega, mas depois de algum tempo utilizando o espaço e os recursos
equoterapêuticos, conseguimos que olhasse e alimentasse o cavalo, logo veio à
montaria, por alguns minutos ele ficava sobre o cavalo, mas neste momento a equipe
chegou ao entendimento que se ele não fizer as terapias de integração sensorial e
comportamental, só a equoterapia e a psicopedagogia, não tem serão suficientes, as
crises aumentaram, e agora além da autoagressão vêm junto à heteroagressão.
Modula com alimentos, alimentando-se rapidamente, coloca tudo na boca, sem
controle e gosta de ficar na gangorra.

2.2.3 Entrevista aplicada


As questões propostas na entrevista foram elaboradas, considerando a
peculiaridade de da entrevistada; a sua interação com o objeto de pesquisa e por fim,
considerando a possibilidade de serem complementadas caso surja o interesse do
entrevistado em ampliar as informações. (ANEXO 3)
A entrevista foi transcrita e analisada. Para garantir o compromisso ético
estabelecido na realização da pesquisa, conforme as orientações do Comitê de Ética
em Pesquisa com Humanos da Universidade de Brasília; serão arquivados por cinco
anos e depois de descartadas.
Ao se tratar de Ética na Pesquisa é preciso garantir a preservação da integridade
e do bem-estar dos sujeitos, o compromisso em evitar qualquer constrangimento, danos
morais ou psicológicos são algumas precauções a serem tomadas pelo pesquisador.
118

Kramer (2002) ressalta a importância do cuidado em expor a imagem do pesquisado e


também sua identidade, ao apresentar o resultado de pesquisa.
Assim, foi elaborado o roteiro da entrevista, objetivando testar o instrumento de
coleta de dados, a fim de aprimorar os conteúdos dos dados e, também, os
procedimentos a serem utilizados. A entrevista traz perguntas relacionadas à
localidade do Distrito de Ribeirão, uma comunidade quilombola no município de
Resende Costa, sobre a participação do JV e a família na comunidade. Segundo o
IBGE, no Censo (2010) havia 10.913 habitantes em Resende Costa e a população
estimada pelo IBGE é que em 2021 seria de 11.578 habitantes.
A economia da cidade vem do agronegócio, artesanato e turismo, localiza-se
no Campo das Vertentes, em região conhecida por ser o Circuito do Ouro, ser histórica
e pertencer a Estrada Real.

2.2.4 Aplicação da CIF


A aplicação acontecerá interdisciplinarmente, seguindo o modelo
biopsicossocial, no ambiente da equoterapia, no Projeto Thomás, por quatro
profissionais, funcionárias do Instituto e de áreas diferentes: a pesquisadora que é
equoterapeuta/fisioterapeuta, a equoterapeuta/psicóloga, assistente social e
pedagoga, separadamente.
Depois da aplicação, a pesquisadora fará uma análise demonstrando o
instrumento aplicado pelas quatro profissionais. Inicialmente será realizada uma
coleta de dados do prontuário do praticante escolhido, um questionário aplicado na
mãe do praticante e posteriormente a CIF. Segue em anexos.

3. Levantamento, análise e resultado dos dados coletados na


aplicação da CIF

Neste estudo a pesquisadora tem familiariedade com a utilização da CIF, tem


curso atualizado da prática e possui a versão impressa e também online, assim foi
disponibilizado o manual prático da CIF em PDF da USP para as outras profissionais
que não conheciam a CIF, somente a psicóloga/equoterapeuta, mas esta nunca havia
aplicado.
119

A presente pesquisadora explicou o que era a CIF e como os seus domínios


eram utilizados, enviou vídeos explicativos sobre a aplicação da CIF e também artigos
científicos foram disponibilizados para as profissionais, o prontuário e a entrevista com
a mãe de JV, posto que todas estão vinculadas ao Projeto Thomás, e conhecem o
praticante, a despeito de ser atendido semanalmente somente pela
fisioterapeuta/equoterapeuta e psicóloga/equoterapeuta. Não houve interferência na
aplicação, cada profissional aplicou em dias e locais diferentes, sem comunicação, a
pesquisadora decidiu por fazer deste modo para que não houvesse interferência desta
e que este estudo possa chegar a mais fiel resposta da sua hipótese.
Observa-se que as quatro profissionais através da aplicação da CIF fizeram
uma classificação e um perfil biopsicossocial similar, o que remete que as quatro
profissionais entenderam os domínios e dimensões da CIF, e também o seu contexto,
mostrando uma constância, um alinhamento do instrumento, “a CIF cria um arcabouço
para uma linguagem unificada de descrição da funcionalidade em nível do individual
e populacional” (CIF, 2005).
Conseguiram com o instrumento, identificar estruturas e funções
comprometidas, atividade e participação do JV, fatores ambientais (facilitadores e
barreiras), e fatores pessoais. Pode-se inferir que qualquer profissional que não
conheça o JV, se tiver acesso ao instrumento aplicado, será capaz de enxerga-lo de
forma integral; traçar estratégias ou condutas para inseri-lo em programas sociais, de
políticas públicas, saúde, educação, ou seja, na rede de atendimento que compõe
SGDCA; e ter uma conduta traçada nele e também centrada na família em
conformidade com Lusk e Faker (2013).
Ainda em acordo com o ECA, as questões de dispositivos legais destinados a
proteção dos direitos das crianças e adolescentes, estão bem embasadas. No
entanto, existe uma dificuldade de ser plenamente acolhido pelas políticas públicas,
quando se trata de crianças e adolescentes, principalmente os com diversidade
funcional que ainda tem de enfrentar o preconceito e discriminação.
A CIF aplicada poderá fomentar o processo de acolhimento, visto que ela traz
um modelo integral destes indivíduos em diversos contextos e também da família,
agilizando o processo e a conduta ou política que poderá ser tomada.
A CIF foi aplicada no ambiente equoterapêutico, e apesar da proximidade da
classificação realizada pelas profissionais, o modo de escrita demonstra-se
característico das profissões exercidas, mas isto não comprometeu em nenhum
120

momento a CIF e sua aplicação, pelo contrário demonstra o quanto esta pode ser
inserida em diversas áreas, interdisciplinarmente e transversalmente, e o quanto pode
contribuir para entender as crianças e adolescentes assistidos em vários setores,
principalmente aqueles com diversidade funcional, em situação de vulnerabilidade
social.
Assim, a CIF não constitui apenas um instrumento para medir o estado
funcional dos indivíduos em sua estrutura demonstra a transversalidade, permite
avaliar as condições de vida e fornecer subsídios para políticas de inclusão social
(CIF, 2015). A CIF e a equoterapia, dialogam, pois ambas possuem uma linguagem
biopsicossocial, interdisciplinar, transversal e também centrada na família.
As quatro profissionais, menos a pesquisadora, que já conhecia e aplicava,
pensaram que á princípio seria difícil à aplicação, pois não eram familiarizadas com o
instrumento, mas conseguiram aplicar após terem acesso ao material explicativo
disponibilizado pela pesquisadora. Ao aplicar a CIF, relataram que consideram o
instrumento importante, reconheceram a sua relevância e que com a prática da
aplicação o olhar delas ficará treinado para as futuras aplicações e para o enxergarem
um indivíduo biopsicossocial em seus diferentes ambientes ou contextos, não só do
atendimento.
Nota-se que a aplicação do instrumento pelas profissionais de diferentes áreas
e a análise, está em acordo com Farias e Buchalla (2005) que os domínios inseridos
na CIF trazem um novo paradigma para pensar e trabalhar a diversidade funcional, e
que esta não é apenas uma consequência das condições de saúde/doença, mas são
influenciadas pelo contexto do ambiente, social e pessoal, pelas diferentes
percepções culturais e atitudes em relação à deficiência, pela disponibilidade de
políticas públicas, de acesso à informação, acesso também aos serviços e de
legislação mais atuante que tenha um olhar atento para as crianças e adolescentes
principalmente com diversidade funcional, seja na saúde, educação, assistência
social, enfim em toda a rede de atendimento que compõe o SGDCA, na comunidade
ou qualquer outro setor.
121

3.1 Análise da CIF aplicada pela fisioterapeuta, psicóloga,


assistente social e pedagoga

3.1.1 Dimensões
 Estruturas e Funções: Observa-se que nesta dimensão, em relação ao
praticante JV, todas as profissionais colocaram as estruturas em comum
Sistema Nervoso e Sistema Sensorial, a fisioterapeuta e psicóloga
descreveram mais detalhadamente as regiões acometias, possivelmente
devido as suas formações profissionais, mas isto não comprometeu a
classificação já que as quatro identificaram as estruturas principais.
 Quanto às funções, as profissionais descreveram cada uma á seu modo, e
colocaram as funções em comum: não verbal; desorganização sensorial,
aprendizagem, comportamento e estereotipias.
 Atividades (limitações): Todas as profissionais colocaram que ele é não
verbal, descreveram que JV tem crises, não realiza as AVD´s sozinho sendo
dependente da mãe, não frequenta escola regular, e também alterações nas
atividades que envolvam aprendizagem e comunicação.
 Participação (restrições): Todas as profissionais colocaram que o JV não tem
participação e interação social com outras crianças, restringi a participação
somente no ambiente familiar, não tem participação na comunidade, não tem
momentos de lazer e não é alfabetizado.
 Fatores Ambientais:
o Facilitadores: Todas as profissionais citaram o ambiente em que mora,
contato com a natureza e menos estímulos externos que geram crises, a
boa relação com a mãe e que é beneficiário do BPC. Fisioterapeuta, a
psicóloga e pedagoga citaram a equoterapia, a assistente social que os
medicamentos do JV que são de altos custos são cedidos pela Regional de
Saúde, e a pedagoga e psicóloga colocaram que ele faz atendimento
psicopedagógico na APAE.
o Barreiras: As quatro profissionais trazem o início tardio das terapias, falta
de acesso socioeconômico e a informação e consequentemente nas
terapias, localização da moradia (sítio que fica em uma comunidade
quilombola, localizado a 18 quilômetros de distância, estrada de terra) e a
122

dificuldade de profissionais para atendê-lo devido às crises de auto e


heteroagressão. A mãe não tem rede de apoio.
 Fatores Pessoais: JV tem 11 anos, gênero masculino, filho caçula, 2 irmãos,
moram com os pais, diagnóstico aos 3 anos, terapias iniciadas tardiamente,
somente equoterapia e psicopedagoga neste momento, a única atividade de
lazer é a caminhada com a mãe, e vão sozinhos sempre. Gosta muito da irmã
e de gangorra.
 O instrumento apontou o que o JV consegue ou não fazer nas suas atividades
de vida diária, relacionando as estruturas e funções corporais, e as limitações
para realização de atividades e da participação, os facilitadores e barreiras e
fatores pessoais, portanto é possível inferir que a CIF é fundamentada na visão
biopsicossocial englobando o praticante ao meio social, ambiental e pessoal.
Com isso a CIF não se resume em classificar o estado de saúde funcional dos
indivíduos. Mas também analisar as condições de vida e prover informações para
políticas de inclusão social, inclusive centrada na criança e adolescente e na família.
Embora a CIF existir a um tempo considerável, ser um instrumento
biopsicossocial validado e usado nacional e internacionalmente, ainda não é um
instrumento conhecido por todos profissionais, principalmente para quem não é da
área da saúde, no entanto a própria CIF traz que é um instrumento biopsicossocial, e
após conhecer o instrumento e visualizar o indivíduo dentre todos os domínios, é
possível entender como esta pode ser utilizada em várias áreas e também como é
ampla a visão que se tem do sujeito, não é preciso buscar prontuários, ficar folheando
ou buscando dados porque a CIF traz informações como um todo, integralmente do
indivíduo (CIF, 2005). Esta é a sua magnitude, e com aplicação frequente, leituras e
cursos sobre a CIF, é possível uma aplicação e um olhar mais apurado.
A Universidade do Estado de São Paulo (USP) disponibiliza um manual prático
para a utilização da CIF em PDF, gratuitamente, o que auxilia muito. Com o
reconhecimento e relevância que esta possui, atualmente temos sites e softwares que
são exclusivos para a aplicação da CIF, o profissional preenche o instrumento modelo
e o site ou software emite o relatório e até laudos, e estes ficam registrados e salvos
com total sigilo, tem o site CIF Fácil gratuito e o Check list da CIF online de fácil
preenchimento, assim teria como ser usada a classificação CIF na rede de SGDCA
de modo mais prático e direto no sistema ou drive, pontos positivos ser um instrumento
prático e gratuito.
123

Deste modo a CIF (2011) fornece uma descrição das situações relacionadas
às funções do ser humano e suas restrições e serve como uma estrutura para
organizar estas informações de maneira significativa, integrada e facialmente
acessível.
Conforme é possível ver no Modelo a seguir, que trás o compendio da avaliação
das quatro profissionais envolvidas no atendimento do praticante JV, 11 anos; os
Modelos de Classificação individuais das Profissionais de Assistência Social,
Fisioterapia, Pedagogia e Psicologia fazem parte do presente estudo como anexos.
Figura 6. Resultados do raciocínio baseado na CIF, analisado pela equipe de profiss

Fonte: elaboração da autora


124
sionais

A seguir apresentamos os Resultados do Raciocínio Clinico das quatro


Profissionais; Assistente Social, Fisioterapeuta, Pedagoga e Psicóloga em gráficos de
linha, onde se verifica a classificação de cada profissional, observa-se também que
algumas classificações encontram intersecção com duas, três ou com as quatro
profissionais.
As Estruturas do corpo: são as partes anatômicas do corpo com órgãos,
membros e seus componentes. Enquanto que as Funções do corpo: são as funções
fisiológicas dos sistemas orgânicas (incluindo funções psicológicas).

Gráfico 6. Estruturas e funções do corpo

Fonte: elaboração da autora

Atividade: é execução de uma tarefa ou ação por um indivíduo.


*Limitação: são dificuldades que um indivíduo pode encontrar na execução das
atividades.

Gráfico 7. Atividade

Fonte: elaboração da autora


126

Participação: é o envolvimento em uma situação da vida.


*Restrições: são problemas que um indivíduo pode experimentar no
envolvimento nas situações de vida.

Gráfico 8. Participação

Fonte: elaboração da autora

Fatores Ambientais: constituem ambiente físico, social e de atitude no qual as


pessoas vivem e conduzem suas vidas. Estes fatores são externos aos indivíduos e
podem ter influência negativa ou positiva sobre seu desempenho.
*Facilitadores (Vem acrescido do símbolo (+))
*Barreiras

Gráfico 9. Fatores ambientais

Fonte: elaboração da autora


127

4. Conclusão

A CIF é uma ferramenta de muita utilidade na atenção básica e pode ser


aplicada por profissionais de diversas áreas. As informações sobre funcionalidade e
incapacidade coletadas, após aplicação do instrumento, podem servir para nortear as
instituições de saúde, programas sociais, de políticas públicas, educacionais e de
mudanças ambientais que visem garantir o bem-estar das pessoas.
Por meio dessa ferramenta foi possível observar que o atendimento às crianças
e adolescentes, com diversidade funcional, se deu de forma integral e transversal,
podendo resultar ao longo do tratamento, na melhora da funcionalidade, na
participação social e na qualidade de vida dos assistidos.
Quanto à aplicação da CIF nos diferentes ambientes que compõe o Sistema de
Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente - SGDCA constatou-se que os
profissionais da saúde e da assistência social, participantes da pesquisa, perceberam
durante a aplicação da ferramenta, a possibilidade de perpassar por todas as
composições do ser e contextos vivenciados, permitindo também uma atuação
interdisciplinar na área acompanhada.
Inserir a CIF em áreas diferentes e na rede de atendimento inserida no SGDCA
trataria de uma evolução e de uma mudança positiva no olhar integral e
biopsicossocial sobre o sujeito, a criança, o adolescente e a família, já que se pode
ter mais do que o conhecimento limitado à frequência de doenças nas populações.
Com este estudo conclui-se que a CIF é dialética com diferentes dimensões,
áreas, interdisciplinarmente e transversalmente, e com tanta magnitude poderá
contribuir para que as crianças e adolescentes, e que suas famílias sejam vistos de
modo diferente independente da área atendida e que as abordagens sejam voltadas
e centradas na família, no entanto para isto se faz necessário pesquisas com maior
amostra, com a inserção e treinamento desta nas graduações e também para os
profissionais que atuam no SDGCA, além da saúde, educação e demais setores
sociais.
No mundo e quê vivemos tão diversos, ter um instrumento de classificação que
guie os profissionais que acolhem crianças e adolescentes, tantas vezes com
diversidade funcional, em situação de vulnerabilidade social, e poder enxergá-los
como indivíduos de direitos que precisam de cuidados e ser vistos pelo Estado e a
128

sociedade, a CIF poderá garantir com os seus domínios ou dimensões as garantias,


políticas e melhores condições de vida para estes.

Referências

ALBERNAZ JÚNIOR, V. H.; FERREIRA, P. R. V. Convenção Sobre Os Direitos Da


Criança. São Paulo: In: Portal da PGE-SP, 2012. Disponível em:
http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/direitos/tratado11.html.
Acesso em: 28 jul. 2021.

ANDE-BRASIL. Curso Básico de Equoterapia. Coordenação de Ensino, Pesquisa e


Extensão COEPE. 2009.

ANDER-EGG, E. Introducción a las técnicas de investigación social: para


trabajadores sociales. 7. ed. Buenos Aires: Humanitas, 1978.

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 2006.

AVELINO, D. A. O. A. Política Social no Brasil: Um Estudo da Práxis de


Acolhimento Familiar Para Crianças e Adolescentes em Camapuã-MS e Viçosa-
MG. Tese de Doutorado, 2018.

BENDA, W. Hippotherapy and the significance of complementary and alternative


medicine. Alternative & Complementary Therapies. v. 13, n. 5, p. 266-268, 2007.

BOOTH, W. C.; COLOMB, G. G.; WILLIAMS, J. M. A arte da pesquisa. São Paulo:


Martins Fontes, 2000.

BRASIL. Constituição Federal (1988). Brasília: Senado Federal, 2000.

BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente.


Brasília: Ministério da Justiça, 1990. Disponível em:

BRASIL, Lei nº 13.830, de 13 de maio de 2019. Dispõe sobre a prática da


equoterapia. Disponível em: www.coffito.gov.br. Acesso em: 08 jan. 2022.

CANGUILHEM, G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense. 1978.

CARVALHO-FREITAS, M. N.; SILVA, O. A.; TETTE, R. P. G. et al. Diversidade em


contextos de trabalho: pluralismo teórico e questões conceituais. Economia e
Gestão, [Lisboa], v. 17, n. 48, p. 174-191, 2017.

COLLIS, J.; HUSSEY, R. Pesquisa em Administração: um guia prático para


alunos de graduação e pós-graduação. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.

CONSELHO DAS OGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS DE CIÊNCIAS MÉDICAS.


Diretrizes éticas internacionais para pesquisas relacionadas à saúde
envolvendo seres humanos. 2016. Disponível em: https://cioms.ch/wp-
129

content/uploads/2018/11/CIOMSfinal-Diretrizes-Eticas-Internacionais-Out18.pdf.
Acesso em: 25 jan. 2021.

CREPALDI, Daniel. Idade: Quando é Criança e Quando se torna Adolescente.


Disponível em: http://ecaeconselhotutelar.blogspot.com.br/2013/01/idade-quando-e-
crianca-e-quando-se_10.html. Acesso em 28 dez. 2021.

Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, 1989.

Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente, 1959.

DEVEREAUX M. The Use of Patient Records (EHR) for Research. 2013.

FRABBONI, F. A escola infantil entre a cultura da infância e a ciência pedagógica


e didática. In: ZABALZA, M. Qualidade em educação infantil. Porto Alegre: Artmed,
1998. cap. 4, p. 63-92.

GARCIA, L. A. M. Transversalidade E Interdisciplinaridade, 2007.


Disponível em: GARCIA, 2007. Disponível em: Transversalidade E
Interdisciplinaridade | PDF | Interdisciplinaridade | Realidade (scribd.com) Acesso em:
28 dez. 2021.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

FURTADO, C; E. Perspectivas da Equinocultura no Brasil. ZOOTEC 2004, 28 a 31


de maio de 2004 – Brasília, DF. 2004.

IBGE. Censo 2010. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/resende-


costa/panorama https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/resende-costa/panorama.
Acesso em: 24 de jan. de 2022.

KUHLMANN JÚNIOR, M. Infância e educação infantil: uma abordagem histórica.


Porto Alegre: Mediação, 2010.

LAKATOS, E. M. e MARCONI, M. A. Metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Atlas,


2011.

LUSK J.M. e FATER K. A concept analysis of patient-centered care. Nurs Forum.


2013; 48(2): 89-98

LIMONGI-FRANÇA, A. C. Práticas de Recursos Humanos: Conceitos


Ferramentas e Procedimentos. São Paulo: Atlas, 2007.

MENDEZ, E. G. Adolescentes E Responsabilidade


Penal: Um Debate Latino Americano. Buenos Aires, 2000. Por uma
Reflexão sobre o Arbítrio e o Tarantismo na Jurisdição Sócio Educativa. Disponível
em: www.justica21.org.br/interno.php?ativo=BIBLIOTECA. Acesso em: 10 abr. 2021.

MCGIBBON, V.; HAEHL, N. Conceptual Framework for Hippotherapy: is it useful


to practice of physical therapy?, 2009.
130

MCGIBBON, N. H.; BENDA, N. H.; DUNCAN, B. R.; SILKWOOD-SHERER, D.


Immediate and long-term effects of hippotherapy on symmetry of adductor
muscle activity and functional ability in children with spastic cerebral palsy.
Archives of Physical Medicine and Rehabilitation, v. 90, n. 6, p. 966-974. 2009

FARIAS, N. e BUCHALLA, C. M. A Classificação Internacional de Funcionalidade,


Incapacidade e Saúde da Organização Mundial da Saúde: Conceitos, Usos e
Perspectivas Instituto de Saúde - Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. São
Paulo, SP, Brasil. 2 Departamento de Epidemiologia- Faculdade de Saúde Pública da
Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil, 2005.

OMS. Organização Mundial da Saúde, CIF: Classificação Internacional de


Funcionalidade, Incapacidade e Saúde [Centro Colaborador da Organização
Mundial da Saúde para a Família de Classificações Internacionais, org.;
coordenação da tradução Cassia Maria Buchalla]. São Paulo: Editora da Universidade
de São Paulo – EDUSP, 2003.

PALACIOS, A.; ROMAÑACH, J. El modelo de la diversidad: la bioética y los


derechos humanos como herramientas para alcanzar la plena dignidad en la
diversidad funcional. Madrid: Diversitas, 2006.

PEREIRA, Ray. Diversidade funcional: a diferença e o histórico modelo de


homem-padrão. Revista Hist. Cienc. Saúde - Manguinhos, 16 Setembro, 2009.

POPPER, K. R. A lógica da pesquisa científica. 10 ed. São Paulo: Cultrix, 2003.

ROSEMBAUM P, GORTER JW. The “F-words” in childhood disability: I swear this


is how we should think! Child Care Health Dev. 2012; 38(4): 457-63.

SANTOS, A. R. Metodologia científica: a construção do conhecimento. Rio de


Janeiro: DP&A, 1999.

SELLTIZ, C. et. al. Métodos de pesquisa nas relações sociais. São Paulo: Herder,
1967.

SILVA, V.A.C. Reflexões sobre os aspectos políticos de políticas públicas.


Pensar BH/Política Social, p 26-36. 2005.

SOUSA FGM, FIGUEIREDO MCAB, Erdmann AL. Instrumentos para avaliação e


intervenção na família: um estudo descritivo. Rev Pesq Saude. 2010; 11(1): 60-3.

TIBYRIÇÁ, R. F. O conceito de pessoa com deficiência na legislação Brasileira.


2012. Disponível em: https://aliberdadeehazul.com/2012/11/27/o-conceito-de-pessoa-
com-deficiencia-na-legislacao-brasileira/. Acesso em: 5 dez. 2021.

UNICEF. Declaração Universal Dos Direitos Das Crianças. –- 20 de novembro de


1959. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/c_a/lex41.html. Acesso
em: 10 jul. 2021.
131

USP. Manual Prático da CIF. Disponível em: http://www.fsp.usp.br/cbcd/wp-


content/uploads/2015/11/Manual-Pra%CC%81tico-da-CIF.pdf. Acesso em 15 jan.
2022.

VERA, A. Metodologia da pesquisa científica. Porto Alegre: Globo, 1980.

VERGARA, S. C. Métodos de pesquisa em administração. São Paulo: Atlas, 2005.

WHO World Health Organization. Towards a Common Language for Functioning,


Disability and Health - ICF. [WHO/EIP/GPE/CAS/01.3] Genebra; 2002.

WINNICOTT, Donald.W. O Brincar & a Realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975. BELO,
F.; SCODELER K. A Importância do Brincar. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010148382013000107.
Acesso em: 10 maio. 2021.

YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2 ed. Porto Alegre: Bookman,


2001.
132

As reformas e adaptações legais que foram introduzidas nos diversos


ordenamentos jurídicos, com base na Convenção dos Direitos da Criança e no
Estatuto da Criança e do Adolescente, marcam, em certa medida, o início de uma
nova etapa para a proteção de um grupo de pessoas que se encontram em situação
de especial vulnerabilidade. O reconhecimento desse catálogo de direitos implica
também o estabelecimento de sistemas de proteção integral que garantam o
cumprimento destes, por meio de uma estrutura capaz de responder a todas as
demandas ou tipos de problemas que afetam crianças e adolescentes.
O denominado sistema de proteção integral tem como foco o melhor interesse
da criança, que encontra fundamento nas características especiais deste grupo de
pessoas, assim como na necessidade de promover o desenvolvimento destes. Nesse
contexto, foram analisados e discutidos alguns aspectos que involucram o
funcionamento dos sistemas de proteção integral em diferentes municípios e Estados
do país, a partir de uma série de problemas e contextos que afetam direitos de
crianças adolescentes.
Desse modo, no primeiro capítulo, foram descritas as características e as
estratégias do trabalho em rede para a execução do Serviço de Convivência e
Fortalecimento de Vínculos no município de Chapecó – SC. Na análise, constatou-se
que os atores desta rede estão constituídos por diferentes profissionais que atuam
nos serviços, programas, benefícios e projetos da rede socioassistencial e do SGDCA,
os quais têm por função atender à demanda correspondente ao objetivo de cada
serviço e realizar o trabalho com ações integradas. Percebeu-se também que há uma
compreensão coletiva da função dos atores dentro do sistema e como membro desta
rede, apesar do perfil de cada ator, a posição que ocupa e o grau de iniciativa.
No segundo capítulo, foi realizada uma análise exploratória sobre a situação do
trabalho infantil no município de São Luiz – Maranhão e seus efeitos nas políticas
públicas de proteção. Conforme o princípio da proteção integral, considera-se
essencial a efetivação dos chamados direitos econômicos, sociais e culturais de
133

crianças e adolescentes, principalmente, educação, saúde e alimentação. Com base


nos dados coletados foi possível verificar a redução significativa do número de
famílias, inseridas no Cadastro Único em São Luís – MA, com pelo menos um membro
em situação de trabalho infantil. No ano de 2018, 156 famílias tinham pelo menos um
membro em situação de trabalho infantil, enquanto na última pesquisa, relacionada a
dezembro de 2020, esse número havia caído para 50 famílias. Porém, esses dados
ainda mostram um alto número de crianças e adolescentes que são limitados ao
acesso de seus direitos fundamentais, como a educação, e que as políticas públicas
adotadas pelo município precisam de uma maior atenção por parte dos órgãos
competentes que compõem o sistema de proteção.
Perante essa mesma problemática, no capítulo III são analisadas as
características do trabalho Infantil e sua relação com pobreza e violência, no Estado
de Sergipe. A pesquisa deixou evidenciado que o enfrentamento ao trabalho infantil
no estado sergipano é atravessado por uma série de tensionamentos envolvendo
forças sociais que expressam interesses diversos, além da incidência do racismo
estrutural e da naturalização da pobreza. A partir da discussão sobre a oferta de
serviços, programas socioassistenciais e legislações voltadas à crianças e
adolescentes, foi possível perceber a incompletude das políticas públicas que,
desarticuladas, são incapazes de fornecer as bases para uma real proteção dos
direitos da criança e do adolescente no município. Como resultado da pesquisa,
verificou-se também que essa situação de desproteção, em que se encontram
crianças e adolescentes, agrava-se quando se trata de crianças e adolescentes
negros(as).
Por último, no capítulo IV, foi proposta a inserção da Classificação Internacional
de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF no contexto da rede de atendimento
para crianças e adolescentes com diversidade funcional, a partir de um estudo de caso
na perspectiva da equoterapia. A CIF é uma ferramenta de muita utilidade na atenção
básica e pode ser aplicada por profissionais de diversas áreas, para nortear as
instituições de saúde, programas sociais, de políticas públicas, educacionais e de
mudanças ambientais que visem garantir o bem-estar das pessoas. Quanto à
aplicação da CIF nos diferentes ambientes que compõe o Sistema de Garantia de
Direitos da Criança e do Adolescente – SGDCA, os profissionais da saúde e da
assistência social, participantes da pesquisa, perceberam durante a aplicação da
ferramenta a possibilidade de perpassar por todas as composições do ser e contextos
134

vivenciados, permitindo assim uma atuação interdisciplinar na área acompanhada.


Destarte, considera-se que inserir a CIF em áreas diferentes e na rede de atendimento
do SGDCA significaria uma evolução e uma mudança positiva no olhar integral e
biopsicossocial da criança ou adolescente e da sua família, devido que possibilitaria
ter mais do que o conhecimento limitado à frequência de doenças nas populações.
Dessa forma, podemos concluir que os sistemas de proteção integral são
responsáveis por fiscalizar a execução das políticas públicas dos Estados e
estabelecer os mecanismos de proteção destinados a garantir a plena vigência dos
direitos. Para isso, torna-se necessário: articular e adaptar todos os programas e
ações em nível nacional e local às diferentes realidades; fazer maior investimento
público; promover a participação cidadã na proteção de crianças e adolescentes;
coordenar o trabalho entre todas as instituições envolvidas; e monitorar e avaliar
constantemente o funcionamento dos mecanismos e ações realizadas pelo sistema.
Portanto, os mecanismos de proteção não devem ser dissociados da realidade social
e devem levar em consideração as características particulares de cada criança ou
adolescente e do contexto no qual se encontra inserido.
135

AEPETI Ações Estratégicas do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil


ANDE Brasil Associação Nacional de Equoterapia
APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
AVD´s Atividades da Vida Diária
CadÚnico Cadastro Único
CEDCA/MA Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do
Maranhão
CF Constituição Federal Brasileira
CID 10 Código Internacional de Doenças na Décima Versão (1994)
CIEE Centro de Integração Empresa-Escola
CIF – CJ Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
para Crianças e Jovens.
CIF Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
CIOMS Council for International Organizations of Medical Sciences (Inglês)
CLT Consolidação das Leis do Trabalho
CNAS Conselho Nacional de Assistência Social
CNJ Conselho Nacional de Justiça
COEPE Coordenação de Ensino, Pesquisa e Extensão
COVID-19 Corona Vírus Disease
CRAS Centro de Referência de Assistência Social
CREAS Centro de Referência Especializado da Assistência Social
EAD Ensino à Distância
EAMEQ Escala de Avaliação de Mobilidade para Equoterapia
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
ENDICA Escola Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
ENS Escola Nacional de Socioeducação
136

F84 Transtorno c/ hipercinesia associada a retardo mental e movimentos


estereotipados
FDRG Grupo Mundial de Funcionamiento y Discapacidad (WHO-FIC)
FEPETIMA Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e
Proteção ao Adolescente no Trabalho
FIA Fundo da Infância e Adolescência
FNPETI Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil
IBGE Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IVS Índice de Vulnerabilidade Social
LEPTOI Laboratório de Ensino e Pesquisa em Terapia Ocupacional, Infância e
Adolescência.
MDSA Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário
MPT-MA Ministério Público do Trabalho no Maranhão
ODS Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável
OIT Organização Internacional do Trabalho
OMS Organização Mundial da Saúde
ONU Organização das Nações Unidas
PAEFI Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e
Indivíduos
PCD Pessoa com Deficiência
PETI Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
PMAS Plano Municipal de Assistência Social
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PSB Proteção Social Básica
PSE Proteção Social Especial
SAGI Sistema de Avaliação e Gestão da informação
SCFV Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos
SEASC Secretaria de Assistência Social de Chapecó
SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SEDES Secretaria do Desenvolvimento Social
SEMCAS Secretaria Municipal da Criança e Assistência Social
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
137

SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial


SENAT Serviço Nacional de aprendizagem do Transporte
SESC Serviço Social do Comércio
SESI Serviço Social da Industria
SEST Serviço Social do Transporte
SGDCA Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente
SINE Sistema Nacional de Emprego
SISC Sistema de Informações do Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculos
SUAS Sistema Único de Assistência Social
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TEA Transtorno do Espectro Autista
TI Trabalho Infantil
TID Trabalho Infantil Doméstico
UnB Universidade de Brasília
UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância
USP Universidade do Estado de São Paulo
Direitos fundamentais de
crianças e adolescentes:
sistemas de proteção integral

Organizador

Autoras

Você também pode gostar