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AMINOÁCIDOS

SOARES, H. F., 2011

Uma curiosidade interessante é sobre a quiralidade envolvendo o C


central dos aminoácidos, que poderia levar à formação de D-isômeros ou L-
isômeros, porém na natureza somente a forma L dos aminoácidos é encontrada
como ativa, já que os sítios enzimáticos são assimétricos. Não entraremos em
detalhes neste curso, mas se você tiver curiosidade, vale a pena uma busca pela
internet em torno dos conceitos de quiralidade.
A tabela que você acabou de ver apresenta a
classificação dos aminoácidos quanto à natureza do seu grupamento R, esta
classificação é dita “quanto ao substituinte”, havendo os aminoácidos apolares,
polares neutros (ou não carregados), ácidos e básicos. Outra classificação é a
dita “nutricional” e envolve a essencialidade dos aminoácidos para nós, havendo
os não essenciais (que nosso organismo consegue sintetizar): alanina,
asparagina, ácido aspártico, ácido glutâmico e serina; aminoácidos essenciais
(que devem ser ingeridos por meio da alimentação, já que não conseguimos
sintetizar em nosso corpo): fenilalanina, isoleucina, leucina, lisina, metionina,
treonina, triptofano, histidina e valina; e ainda os aminoácidos condicionalmente
essenciais (é necessário obtê-los pela alimentação, porém somente para
determinadas situações fisiológicas): arginina, cisteína, glicina, glutamina,
prolina e tirosina.
Existe uma classificação menos comum que é determinada quanto ao
destino do aminoácido após sua metabolização (excreção do grupamento
amina). Os de destino cetogênico são os que formam alcoóis, que vão para
qualquer fase do ciclo de Krebs. Os aminoácidos leucina e lisina são
exclusivamente cetogênicos. Já outro grupo é o dos aminoácidos de destino
glicogênico, quando o álcool resultante da quebra dos aminoácidos vai para a
via glicolítica.
Os aminoácidos fenilalanina, triptofano, isoleucina e tirosina são tanto
cetogênicos quanto glicogênicos, e os outros 14 restantes são exclusivamente
glicogênicos. Porém, não fique preocupado agora com essa classificação, você
compreenderá melhor quando estudarmos essas vias metabólicas nos próximos
módulos.
Eu já comentei um pouquinho sobre a quiralidade anteriormente e além
desta propriedade de atividade óptica dos aminoácidos (com exceção da glicina),
os aminoácidos podem ser definidos como incolores e a maioria de sabor
adocicado quanto às suas propriedades organolépticas. Já fisicamente, as
propriedades dos aminoácidos englobam sua solubilidade em água variável e
todas se encontram na forma sólida nas condições normais de temperatura e
pressão (CNTP).
Quimicamente os aminoácidos podem ser definidos como anfóteros, já
que possuem na molécula um grupamento de característica ácida (-COOH) e um
grupamento de característica básica (-NH2), o que os tornam muito
interessantes por reagirem tanto com ácidos quanto com bases para formar sais
orgânicos.
Para finalizar nosso conteúdo de aminoácidos, vale ressaltar que estes
20 aminoácidos apresentados (ditos α-aminoácidos) não são os únicos
presentes na natureza. Mais de 700 aminoácidos já foram descritos, muitos sem
ainda ter um papel biológico definido. Alguns são simplesmente derivados dos
aminoácidos que estudamos, outros possuem estruturas incomum, alguns ainda
são até tóxicos para alguns organismos (a azasserina, por exemplo, é utilizada
como antibiótico).
Quanto à importância biológica dos aminoácidos, além da sua
participação na composição de todos os produtos descritos anteriormente, temos
também as funções especializadas dos aminoácidos. Essas incluem a utilização
dos aminoácidos como mensageiros químicos na comunicação entre células.
Por exemplo, a glicina, o GABA e a dopamina são neurotransmissores, já a
histamina é um potente mediador local em reações alérgicas, e a tiroxina é um
hormônio tireóideo, que contém iodo e que geralmente estimula o metabolismo
em vertebrados.
Alguns aminoácidos são importantes como intermediários em vários
processos metabólicos, entre eles a citrulina e a ornitina, intermediários na
biossíntese da ureia, a homocisteína, um intermediário do metabolismo dos
aminoácidos e a S-adenossilmetionina, um reagente biológico para metilações.
Os aminoácidos podem reagir entre si, unindo-se por ligações ditas peptídicas.
A reação para esta formação é chamada de “condensação” ou “desidratação”, já
que libera uma molécula de água após o grupo carboxila de um aminoácido se
ligar ao grupo amino de outro aminoácido, formando uma amida com ligação
covalente C-N, segundo a equação química abaixo:
CASTRO, F. F., 2011

Vemos na figura acima a ligação entre dois aminoácidos, mas repare que
as extremidades dos aminoácidos ainda podem reagir com outros aminoácidos,
formando cadeias de tamanhos variados, desde muito pequenos com dois ou
três milhares de resíduos de aminoácidos até grandes cadeias. Essas ligações
são muito estáveis, tendo meia-vida média de sete anos nas condições
intracelulares e, por convenção, o terminal amino é sempre representado à
esquerda, de onde começamos a dar o nome para a cadeia de aminoácidos.
Quanto à nomenclatura, dois aminoácidos unidos pela ligação peptídica
são ditos dipeptídeos, três aminoácidos nas mesmas condições formam um
tripeptídeo, e assim segue até que alguns aminoácidos unidos passam a ser
chamados de oligopeptídeos. Muitos aminoácidos unidos formam um
polipeptídeo, e embora muitas vezes os termos se confundam, quando o peso
molecular do composto ultrapassa os 10.000 Da, temos uma proteína.
Muitos peptídeos apresentam importante biológica e isso independe de
seu tamanho. O aspartame, um conhecido adoçante artificial, por exemplo, é
formado pelo dipeptídeo L- aspartil-L-fenilalanil metil éster. Alguns hormônios
são peptídeos pequenos também, e mesmo em concentrações muito baixas
exercem seus efeitos, por exemplo, a ocitocina, que contém nove resíduos de
aminoácidos e é responsável por estimular as contrações uterinas durante o
parto.
Ainda, alguns polipeptídeos pequenos (ou oligopeptídeos) também
possuem importância biológica, como o glucagon, um hormônio pancreático,
composto por 29 resíduos e a corticotropina, um hormônio de 30 resíduos de
aminoácidos da glândula hipofisária anterior que estimula o córtex adrenal. Em
geral, os peptídeos não ultrapassam 2.000 resíduos de aminoácidos (e aqui já
temos uma proteína!), mas a titina, uma constituinte do músculo de vertebrados
chega a 27.000 resíduos.
Quanto às proteínas, além do peso molecular citado anteriormente,
podemos dizer que elas sempre possuem mais de 20 aminoácidos. Uma grande
parte delas são completamente sintetizada no citosol das nossas células pela
tradução do RNA, e após sua síntese são destinadas ao local em que exercerá
sua função por intermédio de “sinais” de reconhecimento pela célula. Do ponto
de vista estrutural são as biomoléculas mais importantes para o organismo e sua
importância já era reconhecida desde o começo dos estudos com proteínas,
conforme podemos notar pela frase do químico sueco Jöns Jacob Berzelius em
uma carta ao também químico Gerardus Johannes Mulderm, em 1838:A palavra
proteína que proponho a você... gostaria que derivasse de proteios, porque ela
parece ser a substância principal ou primitiva da nutrição animal que as plantas
preparam para os herbívoros, e que esses depois fornecem aos carnívoros (Jöns
Jacob Berzelius,1838).
Dependendo dos tipos de aminoácidos que constituem a proteína, assim
como do tamanho da cadeia, temos uma configuração espacial desta cadeia, e
assim podemos dividir, didaticamente, nos níveis de organização das proteínas
em estruturas: primária, secundária, terciária e quaternária.

- Estrutura primária: Esse nível é composto pela sequência dos


aminoácidos ao longo da cadeia polipeptídica. Assim, embora o primeiro e mais
simples nível de organização seja também o mais importante, pois as
características químicas e físicas de cada resíduo de aminoácido utilizado
contribuirão para toda a organização espacial final da proteína. Esta sequência
é determinada geneticamente e é representada por meio das
ligações peptídicas entre os resíduos de aminoácidos, conforme vimos
anteriormente.

- Estrutura secundária: Como as ligações peptídicas podem


sofrer rotações afim de minimizar a energia em contato com o meio em que se
encontram, os aminoácidos próximos entre si sofrem um arranjo espacial,
resultando nas estruturas secundárias. Muitas vezes os
arranjos secundários ocorrem de forma regular, isto é, os ângulos das
ligações se repetem ao longo de um segmento da proteína, resultando em
estruturas cilíndricas estabilizadas por ligações de hidrogênio entre os resíduos
de aminoácidos (α-hélice) ou em estruturas achatadas e rígidas por ligações de
hidrogênio entre regiões vizinhas (folha β-pregueada). Uma ilustração destas
duas possibilidades de estrutura secundária das proteínas é apresentada a
seguir.

- Estrutura terciária: Ligações de hidrogênio e pontes dissulfeto,


além de interações hidrofóbicas e eletrostáticas, estabilizam as estruturas
secundárias resultando em um enrolamento desta. Esta estrutura é o
dobramento final da proteína, sendo caracterizada por ligações entre regiões
de longa distância entre os aminoácidos (lembre-se que na estrutura
secundária as ligações ocorrem a curta distância). Como as sequências de
aminoácidos são diferentes, as proteínas apresentam estruturas terciárias
diferentes, responsáveis por diferentes efeitos biológicos.

- Estrutura quaternária: Esta estrutura é menos comum, mas


ocorrem quando a proteína é composta por mais de uma cadeia polipeptídica,
unidas entre si pelas ligações químicas citadas anteriormente, podendo resultar
em funções diferentes para a estrutura resultante. Um exemplo clássico de
estrutura quaternária é a hemoglobina, formada por quatro cadeias
polipeptídicas.
As proteínas podem conter em sua composição outros
compostos que não aminoácidos. Caso isso ocorra a proteína é dita conjugada
e o radical não peptídico dela é dito grupo prostético. Exemplos deste caso são
as metaloproteínas, que contém metal em sua composição, hemeproteínas,
lipoproteínas, glicoproteínas, dentre outras.
Outra classificação das proteínas se dá pelo número de cadeias
polipeptídicas, sendo monoméricas quando formadas por apenas uma cadeia ou
oligoméricas quando formadas por mais de uma cadeia (em geral são proteínas
estruturais e de funções mais complexas em nosso organismo).
As proteínas podem, ainda, ser classificadas em fibrosas ou globulares
de acordo com sua forma. As primeiras são insolúveis em água, possuem peso
molecular elevado e geralmente são formadas por longas moléculas mais ou
menos retilíneas e paralelas ao eixo das fibras. Temos nesse grupo as proteínas
de estrutura, como o colágeno, a queratina e a miosina.
Uma proteína interessante deste grupo é a tubulina, que embora
apresente múltiplas subunidades globulares, classifica-se como fibrosa pela sua
disposição helicoidal. Já as proteínas globulares são mais ou menos esféricas,
espacialmente mais complexas, geralmente solúveis no meio aquoso e incluem
as proteínas ativas, como as enzimas e os transportadores.
Quanto à importância biológica das proteínas, poderíamos ficar discutindo
durante muitas páginas todas as contribuições que temos por esta classe de
biomoléculas. Mas vou apenas citar alguns exemplos que mostram a
participação das proteínas em nosso corpo para ilustrar sua importância.
As proteínas podem desempenhar funções hormonais, especificamente
em algum órgão ou estrutura, como a insulina, que retira a glicose em excesso
do sangue. Podem ainda participar das funções de defesa do organismo, como
os anticorpos, especializados no reconhecimento e neutralização de vírus,
bactérias e substâncias exógenas. Outras proteínas de defesa são o fibrinogênio
e a trombina, responsáveis pela coagulação sanguínea em caso de cortes e
ferimentos.
As proteínas também estão presentes na nutrição, exercendo função
energética e fornecendo aminoácidos. Deficientes proteicas
nutricionais podem levar a um desequilíbrio homeostático e na infância à
deficiência no crescimento. O recomendado por nutricionistas é a ingestão diária
de 0,8 a 0,9 gramas de proteínas por kg do nosso corpo na fase adulta. As
enzimas também são proteínas importantes que atuam nas reações químicas e
serão abordadas em um tópico, no próximo módulo.
Além destas funções, as proteínas ainda são encontradas no transporte
dos gases (principalmente do oxigênio), como por exemplo, a hemoglobina e a
hemocianina, e no armazenamento, como a ferritina, localizada no fígado e
responsável pela reserva do ferro. Para finalizar o tópico sobre Aminoácidos e
Proteínas falaremos sobre a desnaturação das proteínas, que é a perda da sua
estrutura secundária e/ou terciária, ou seja, seu arranjo tridimensional, fazendo
com que sua atividade biológica seja perdida na maioria dos casos.
A desnaturação não rompe as ligações peptídicas (lembra que estas são
muito fortes e podem sobreviver por anos no nosso organismo?) e pode ser
causada pelo aumento da temperatura (de importância relevante quando temos
febres altas), extremos de pH, solventes orgânicos (por exemplo, a acetona ou
o etanol), solutos (ureia), exposição a detergentes e agitações vigorosas (estas
últimas de maior aplicação em laboratórios de pesquisa e análises clínicas). A
renaturação pode ocorrer caso o meio volte à sua composição anterior, como
visto para a ribonuclease, porém nem sempre isso acontece.

ENZIMAS

Começaremos esse módulo pelas enzimas devido à sua proximidade com


as proteínas, que estudamos no módulo anterior. Por definição, as enzimas são
os catalisadores das reações bioquímicas dos sistemas biológicos. E qual a
importância dessa catálise? Explicaremos por meio de um exemplo bem simples.
Utilizamos o açúcar (sacarose) para gerar energia para todas nossas atividades
diárias. Essa energia é gerada com a conversão do açúcar em CO2 e H2O na
presença de oxigênio.
Mas não vemos o açúcar se transformar em CO2 e H2O
quando o compramos no mercado. Essa reação é termodinamicamente
favorável, porém é muita lenta. E aí entram os catalisadores, com a função de
aumentar a velocidade das reações (por intermédio da diminuição da energia de
ativação necessária para que a reação ocorra), possibilitando o aproveitamento
destas em uma escala de tempo útil para a manutenção da nossa vida.
Em geral as enzimas são proteínas altamente especializadas, com
exceção de um pequeno grupo de enzimas que são compostas por moléculas
de RNA catalítico. O estudo das enzimas é de grande importância prática, seja
na área da saúde (quando algumas deficiências genéticas podem levar às
alterações enzimáticas, comprometendo funções vitais) ou na indústria
(farmacêutica e alimentícia, em que algumas enzimas são utilizadas na produção
de antibióticos em larga escala), havendo uma área de estudo específica para
esta classe de biomoléculas: a enzimologia.
Vamos começar a estudar as enzimas por meio da sua nomenclatura,
para facilitar futuramente, quando alguns termos mais técnicos forem utilizados.
A nomenclatura das enzimas é normatizada pelo NC-IUBMB (Comitê de
Nomenclatura da União Internacional de Bioquímica e Biologia Molecular) e é
dividida em seis classes, segundo a natureza das reações químicas que elas
catalisam. Estas classes foram organizadas no formato de tabela para facilitar a
visualização. Não é necessário memorizá-las, mas é interessante conhecê-las.

Classe da Enzima Função enzimática

1. Oxidorredutase Reações de oxidorredução, transferindo prótons (H+) ou hidretos (H-)

2. Transferase Reações com transferência de grupos químicos funcionais

3. Hidrolase Reações de hidrólise, utilizando a água como receptor de grupos


químicos funcionais
4. Liase Reações envolvendo ligações duplas

5. Isomerase Reações de transformação de uma molécula em seu isômero

6. Ligase Reações com formação de ligação química, utilizando o ATP como


fornecedor de energia

Ainda, as enzimas são subdivididas em outras categorias, sendo


identificadas por um número denominado EC. Por exemplo, a EC 3.5.1.5. é a
urease (e pertence à classe 3 – hidrolase). Dica: Repare que geralmente as
enzimas terminam pelo sufixo –ase adicionado ao nome do substrato ou da ação
que exerce. Assim, a urease catalisa a hidrólise da ureia.
Caso você tenha interesse, existe uma base de dados muito interessante
para nomenclatura e classificação enzimática. O site chama-se BRENDA
(http://www.brenda- enzymes.org) e traz a nomenclatura, os números EC, dados
físicos e funcionais, propriedades moleculares e dados sobre a estrutura de cada
enzima para diversos organismos. Vale à pena conferir.
Devido à sua natureza proteica, devemos considerar alguns fatores que
podem afetar o funcionamento das enzimas. O primeiro deles é a temperatura,
que pode desnaturar a enzima por intermédio da alteração da sua estrutura
terciária por afetar as ligações fracas que a mantém, alterando o sítio ativo, que
é o local onde as moléculas (substratos) se ligam à enzima para que a reação
ocorra.
Outro fator importante é o pH do meio, que em valores extremos pode
exercer o mesmo efeito da temperatura sobre as enzimas. Geralmente a faixa
de trabalho destas é em pH entre 5 e 9, e leves alterações podem afetar a ligação
do substrato à enzima (por exemplo, ionizando-o) ou afetar o sítio de ligação.
Aqui entra a importância dos tampões que estudamos no último
módulo, você se lembra deles?
Ainda, a atividade enzimática pode ser afetada pela ausência de
cofatores. Os cofatores são moléculas não proteicas que se ligam às enzimas
para que estas exerçam suas funções catalíticas. Assim, a anidrase carbônica,
por exemplo, necessita de moléculas de zinco para atuar (logo, o zinco é o
cofator desta enzima, e sua ausência pode afetar o funcionamento enzimático).
Este é um esquema da anidrase carbônica, mostrando o zinco atuando
como cofator – esfera clara central. Esta enzima é importante no transporte de
CO2 e no controle do pH sanguíneo. Outros fatores que afetam o funcionamento
das enzimas são a concentração do substrato e da própria enzima. Como são
os dois componentes principais da reação enzimática, alterações em suas
concentrações levam a mudanças na velocidade da reação enzimática, descrita
por diferentes modelos matemáticos, sendo o principal deles a Equação de
Michaelis- Menten:

Nesta equação, o v é a velocidade da reação, definida pela multiplicação


entre a velocidade máxima da reação e a concentração do substrato, dividida
pela somatória da concentração do substrato e da constante Km (denominada
constante de Michaelis), que é a constante de dissociação do complexo
substrato-enzima, medindo, portanto, a estabilidade deste complexo. Essa
equação descreve um gráfico em hipérbole retangular:
A equação e o gráfico de Michaelis-Menten são muito utilizados nos
estudos de cinética enzimática por representar a grande maioria das enzimas e
são muito importantes na elucidação do mecanismo catalítico enzimático.
Voltando aos fatores que afetam o funcionamento das enzimas, temos a inibição
enzimática, que pode ser ocasionada por moléculas que se ligam às enzimas,
alterando a ligação destas com os substratos ou o número de enzimas
disponíveis e, consequentemente, reduzindo a atividade enzimática.
A maioria dos inibidores são substâncias muito parecidas com os
substratos, mas que não reagem da mesma forma frente às enzimas. Essa
inibição pode ser “competitiva”, “incompetitiva” ou “não competitiva”. Vale à pena
aprofundarmos um pouco mais nestes mecanismos de inibição, já que a partir
de dados de inibição enzimática podemos obter informações quanto à natureza
da química e da conformação do sítio de ligação ao substrato, além da
importância desta área no desenvolvimento de quimioterápicos (por meio do
bloqueio da ação de enzimas específicas).
O inibidor é competitivo quando compete diretamente com o substrato
pelo sítio de ligação da enzima. Normalmente possui estrutura muito semelhante
com o substrato, mas pequenas diferenças provocam diferentes tipos de
interações com o sítio de ação, fazendo com que a ligação enzima-substrato não
seja reativa. Logo, um inibidor competitivo atua reduzindo a concentração de
enzima livre disponível para se ligar ao substrato.
Essa ligação do inibidor com a enzima pode ser temporária (reversível)
ou irreversível. Neste último caso o inibidor é dito inativador da enzima, por
inativar a ação desta definitivamente. Um exemplo de inibição
competitiva é a reação entre o metotrexato (inibidor) e a succinato-
desidrogenase, uma enzima do ciclo do ácido ciclo (nos próximos módulos
estudaremos os metabolismos).
Já na inibição incompetitiva o inibidor liga-se ao complexo enzima-
substrato, e não à enzima livre. Este inibidor não possui, necessariamente, uma
semelhança estrutural com o substrato, e afeta a afinidade entre este e a enzima.
A terceira forma de inibição é a “mista” ou “não competitiva”, em que o inibidor
liga-se tanto à enzima quanto ao complexo enzima- substrato. Na prática estes
mecanismos de ação são mais importantes para enzimas que possuem vários
substratos e são importantes em experimentos bioquímicos.
Embora todas as enzimas tenham sua importância biológica em nossas
vidas, algumas merecem destaque. Uma delas é a glutationa e suas enzimas
relacionadas, que possuem papel central na biotransformação e eliminação de
compostos exógenos e na defesa das células contra o estresse oxidativo.
Você se lembra da nossa conversa sobre as proteínas? Repare nesta
molécula as duas ligações peptídicas. Trata-se de um tripeptídeo, que devido às
suas atividades catalíticas e reações com recuperação da forma inicial molecular
pode ser classificado como enzima. Vamos finalizar esta primeira parte de
nossos estudos falando um pouco sobre as vitaminas.
Elas atuam no nosso organismo como precursoras de coenzimas. As
coenzimas possuem mecanismo semelhante aos cofatores. Em geral, as
enzimas não são muito adaptadas para catalisarem reações de oxidorredução.
As coenzimas facilitam essas reações, porém diferentemente das enzimas têm
suas estruturas químicas modificadas após a reação.
Por definição, as vitaminas são compostos orgânicos presentes nos
alimentos e embora essenciais para o correto funcionamento do organismo,
podem levar a doenças em caso de falta ou excesso. Ainda, não podem ser
digeridas pelo ser humano em quantidades apreciáveis.
Podem ser classificadas em lipossolúveis ou hidrossolúveis de acordo
com suas solubilidades em água e são representadas por letras ou letras e
números. Assim, o ácido ascórbico também é chamado de
vitamina C e/ou ácido fólico de vitamina B9. As vitaminas lipossolúveis são as
vitaminas A, D, E e K (memorize isto), e não são precursoras de coenzimas.
Todas as outras são hidrossolúveis e seguem o que foi dito nos parágrafos
anteriores.
Curiosidade: Acredita-se que nossos antepassados tivessem a
capacidade de sintetizar as vitaminas, assim como as plantas e alguns
microrganismos ainda as produzem. Porém, com a evolução as vitaminas
passaram a estar presentes nas dietas, tendo sido perdida a maquinaria celular
para suas sínteses (com exceção da vitamina D).

CARBOIDRATOS

Os carboidratos (hidratos de carbono) são as biomoléculas mais


abundantes na natureza. Muitas vezes são chamados de açúcares ou
sacarídeos e são definidos pela sua composição química característica: carbono,
hidrogênio e oxigênio, embora algumas vezes possam apresentar nitrogênio,
fósforo ou enxofre em suas moléculas.
Duas principais funções são relacionadas aos carboidratos. A primeira é
a energética, em que as moléculas são convertidas em energia para os trabalhos
celulares, armazenada em nosso organismo sob a forma de ATP. O carboidrato
pode ser armazenado para posterior utilização. Nas plantas este processo ocorre
nos amiloplastos e a forma armazenada é o amido. Já nos animais armazena-
se o glicogênio no fígado e nos músculos.
Outra função importante dos carboidratos é a estrutural, em que
polímeros insolúveis funcionam como elementos estruturais e de proteção nas
paredes celulares bacterianas e vegetais e nos tecidos conjuntivos de animais.
Ainda atuam como lubrificante e participam do processo de reconhecido e
coesão entre células, participam da composição dos ácidos nucleicos e quando
covalentemente ligados a proteínas ou lipídeos podem atuar na sinalização para
determinação da localização intracelular ou destino metabólico de compostos.
Os monossacarídeos são as unidades básicas dos
carboidratos e é o número de unidades que define a classificação do carboidrato.
Assim, temos os monossacarídeos, os dissacarídeos, os oligossacarídeos e os
polissacarídeos. Outra classificação é quanto ao produto de hidrólise do
carboidrato, que é classificado em holosídeo quando a hidrólise gera somente
monossacarídeos (ex.: rafinose) ou heterosídeo quando a hidrólise gera
monossacarídeos e outros compostos.
Vamos agora estudar um pouco mais sobre as propriedades dos
carboidratos, de acordo com a classificação pelo número de monossacarídeos,
a nomenclatura e a importância biológica de alguns carboidratos. Os
monossacarídeos são os carboidratos mais simples e são compostos por
aldeídos ou cetonas contendo grupos hidroxila na molécula. As moléculas
possuem de três a sete átomos de carbono, que muitas vezes pode ser quiral.
Comumente, quando a molécula possui mais de cinco átomos de carbono ocorre
ciclização na estrutura química. Os monossacarídeos podem ser classificados
de acordo com a natureza química de seus grupos carbonila e o número de
átomos de carbono.
Assim, se o grupo carbonila é um aldeído o açúcar é uma aldose e se o
grupo carbonila é uma cetona o açúcar é uma cetose. Já de acordo com o
número de carbonos, temos trioses, tetroses, pentoses e assim sucessivamente.
Os monossacarídeos são compostos incolores, sólidos cristalinos, naturalmente
solúveis em água e a maior parte deles possui sabor doce. A quiralidade destas
biomoléculas pode ser representada pelas fórmulas de projeção de Fischer (vale
à pena buscar textos explicativos sobre este assunto) e os D-carboidratos são
mais abundantes na natureza do que os L-carboidratos.
A tabela abaixo mostra a estrutura de alguns monossacarídeos, suas
classificações, principal importância biológica e estruturas químicas:

Carboidrato Classificação Importância biológica Estrutura química


composto intermediário
gliceraldeído triose da glicólise

desoxirribose pentose matéria-prima para a


síntese do DNA

Glicose Hexose Utilizada para a


obtenção de energia

Os dissacarídeos são formados pela ligação covalente entre dois


monossacarídeos, ligação esta denominada O-glicosídica. Esta ligação é um
análogo em carboidratos da ligação peptídica em proteínas e pode ser
hidrolisada por enzimas denominadas glicosidases. Abaixo está uma tabela
contendo alguns dissacarídeos disponíveis na dieta humana:

Carboidrato Constituintes Importância biológica Estrutura química

função energética; encontrada


sacarose glicose + frutose na beterraba e na cana de
açúcar

função energética; encontrada


lactose glicose + galactose
no leite

função energética; encontrada


maltose glicose + glicose
em vegetais

Quanto à nomenclatura dos dissacarídeos, primeiro escreve-se a


configuração do monossacarídeo à esquerda, seguido do seu
nome. Indica-se então entre parênteses os átomos de carbono que estão
fazendo parte da ligação glicosídica e depois a configuração e o nome da
segunda unidade monomérica. Assim, a maltose também pode ser denominada
α-D- glicopiranosil-(1 4)-β-D-glicopiranose, onde os termos “pirano” são
utilizados para indicar que o anel possui 6 átomos de carbono (o termo seria
“furano” caso o anel possuísse 5 átomos de carbono).
Uma propriedade importante em grande parte dos carboidratos é a
capacidade de serem oxidados por íons cúpricos (Cu2+) e férricos (Fe3+). Os
açúcares que apresentam esta propriedade são ditos redutores e não formam
glicosídeos, devido à facilidade com que os grupos aldeídos presentes na
molécula reduzem agentes oxidantes fracos.
Quanto aos polissacarídeos, também denominados glicanos, diferem
entre si de acordo com a natureza das unidades monossacarídicas, os tipos de
ligações glicosídicas, o comprimento das cadeias e o grau de ramificação destas.
Assim, quando o polissacarídeo é composto por apenas um único tipo de
unidade monomérica ele é dito homopolissacarídeo, e quando possui mais de
um tipo, heteropolissacarídeo.
Os homopolissacarídeos mais importantes são o amido e o glicogênio,
utilizados para o armazenamento de energia pelas células, e a celulose e a
quitina, utilizados na composição da estrutura das paredes celulares vegetais e
de exoesqueletos de animais, respectivamente.
Repare que diferente das proteínas e dos ácidos nucleicos, os
polissacarídeos formam polímeros lineares e também ramificados, já que as
ligações glicosídicas podem ser feitas com qualquer hidroxila dos
monossacarídeos. Mas, felizmente para nossa compreensão, a maioria é linear
e os poucos polissacarídeos ramificados apresentam formas bem definidas.
Dentre os heteropolissacarídeos, temos como exemplo os
glicosaminoglicanos, compostos por monossacarídeos ligados ao ácido urônico
ou sulfato, e os peptideoglicanos, que são monossacarídeos ligados a peptídeos.
Os primeiros fazem parte da lubrificação nas articulações e como matriz
extracelular no tecido conjuntivo, já os segundos atuam
estruturalmente no envoltório celular de bactérias.

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