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NOVO MARCO REGULATÓRIO DO TERCEIRO SETOR: CONSIDERAÇÕES


SOBRE A PARCERIA ENTRE O SETOR PÚBLICO E O PRIVADO

HONORIO, Vitor Hugo Pereira dos Santos1


DE PAIVA, Rosilene Terezinha2

RESUMO

O Terceiro setor é composto de organizações que embora de caráter


privado, executam atividades de interesse estatal e, por essa razão, recebem
diversos incentivos e isenções do Estado. Dentre as atividades prestadas por
este setor, cabe ressaltar que, usualmente, tem relação com a área da saúde e
educação, não ficando restritas à estas áreas, entretanto. Em 31 de julho de
2014, foi promulgada uma nova lei que regulamenta a atuação deste setor,
chamada de Marco regulatório do Terceiro Setor. O presente trabalho tem por
objetivo um estudo pormenorizado do Terceiro Setor, abordando seus conceitos,
como são realizadas as prestações de serviços pelas diferentes organizações
que o constituem, bem como entender a nova legislação em vigência sobre o
tema. Trata de um estudo com a revisão bibliográfica sobre o assunto. Visa
entender e aprofundar os conhecimentos sobre a atuação prática e como
legislação incide sobre este setor de tamanha relevância na atualidade.

Palavras-chave: Terceiro Setor; Marco Regulatório; Prestação de Serviços;


Organizações Sociais; Parceria Estatal.

ABSTRACT

The Third Sector is composed of organizations that, although private, carry


out activities of state interest and, for this reason, receive various incentives and
exemptions from the State. Among the activities provided by this sector, it should
be emphasized that, usually, it is related to health and education, not being
restricted to these areas, however. On July 31, 2014, a new law was promulgated
that regulates the performance of this sector, called the Regulatory Framework
of the Third Sector. The purpose of the present work is to study the Third Sector
in detail, discussing its concepts, how services are performed by the different
organizations that constitute it, and understand the new legislation in force on the
subject. It is about a study with the bibliographical revision on the subject. It aims
to understand and deepen the knowledge about the practical action and how
legislation affects this sector of such relevance at the present time.

1
Estudante de Direito da Universidade Estadual de Maringá (UEM)
2
Professora Adjunta do Departamento de Direito Privado Processual da Universidade Estadual
de Maringá (UEM)
2

1. INTRODUÇÃO

O Terceiro setor é caracterizado como aquele que possui iniciativa


privada, que pode ter fins lucrativos, desde que investido na própria atividade da
organização e que preste serviços de interesse público.
A sociedade civil, que pode ser interpretada como "o conjunto dos
organismos vulgarmente chamados privados [...] e que correspondem à função
de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade" (Gramsci,
1972, p. 16 apud Wanderley, 2012, p. 07), pode ser dividida em três setores,
primeiro, segundo e terceiro. O primeiro setor é formado pelo Governo, o
segundo setor é formado pelas empresas privadas, e o terceiro setor são as
organizações sem fins lucrativos ou que, embora tenha atividade lucrativa,
investem os lucros na própria atividade.
O terceiro setor contribui para chegar a locais onde o Estado não
conseguiu chegar, fazendo ações solidárias e, portanto, possui um papel
fundamental na sociedade, sendo composto, por exemplo, pelas ONGs
(Organizações Não Governamentais), OSCIPs (Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público) e OS (Organizações Sociais) (CARVALHO, 2017).
Costumeiramente esse setor tem por escopo atividades de interesse
estatal e público, como atendimento médico, campanhas educacionais, eventos
culturais, proteção aos animais e ao meio ambiente, entre outros.
As parcerias celebradas com as Organizações Sociais representam, por
conseguinte, um instrumento de manifestação da consensualidade
administrativa. Ou seja, o Estado não só permite a atuação dessas organizações,
mas também ajuda financeiramente, como na isenção de impostos, em alguns
casos.
Embora seja de tamanha importância as atividades prestadas por este
setor, passaram anos sem uma regulamentação apropriada dos termos
referentes a ele, como da área específica de atuação das organizações ou dos
profissionais atuantes na área, entre outros fatores de destaque que, somente
em 2014 com o Marco Regulatório do Terceiro Setor passaram a ser
apropriadamente regulados.
Portanto, a relevância do tema se dá não somente por seu caráter de
ajuda aos necessitados, mas também por sua direta relação com o Estado,
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sendo inclusive considerado membro da Administração indireta (Serviços


Sociais Autônomos, Organizações Sociais, Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público e Fundações de Apoio) e, não obstante, por sua recente
legislação a respeito do tema, o que demonstra o caráter de emergente
importância deste setor.
Nesse sentido, o presente estudo busca elucidar a natureza jurídica desse
setor, analisando as definições elaboradas pela doutrina, bem como sua
constituição histórica. Posteriormente, será explicitado a respeito das pessoas
jurídicas que compõem o Terceiro Setor (sociedades simples, fundações e
associações) e, por fim, serão demonstrados os aspectos jurídicos da prestação
de serviços pelas entidades em parceria ao Estado, em consonância com a
legislação vigente sobre o tema.

2. NATUREZA JURÍDICA
2.1 DEFINIÇÃO

O terceiro setor é composto de entidades privadas, as quais compõem um


dos setores da economia nacional. Assim sendo, segundo a doutrina
predominante, verifica-se a existência de três setores: o primeiro setor
compreenderia o Estado com sua missão de realizar a atividade administrativa
para satisfazer as necessidades da coletividade; o segundo setor compreenderia
o mercado no qual vale a livre iniciativa e tem como paradigma o lucro; o terceiro
setor compreenderia entidades privadas sem fins lucrativos, mas que podem
auferir lucro se investidos na própria entidade, que exercem atividades de
interesse social e coletivo, razão pela qual podem receber incentivos do Estado
a título de fomento e, por fim, em dissonância à doutrina majoritária, haveria
ainda o quarto setor, que compreenderia a economia informal.
Ocorre que, quando discutidas as terminações e conceitos jurídicos, há
certa imprecisão conceitual e divergência doutrinária, de sorte que, para alguns
autores, fica pouco elucidada a diferença entre entidades paraestatais e terceiro
setor. Enquanto, para outros, a diferença é clara e a confusão inexistente.
Nesse sentido, sobre a imprecisão conceitual referente as entidades
paraestatais, Mello (2008, p. 224), assevera:
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Ocorre que não existindo uma lei que as caracterize inequivocamente,


e estando tal palavra solta e tresmalhada no meio jurídico, reputamos,
como no passado o dissemos que “não há um objeto à procura de um
nome, porém um nome à procura de um objeto”. Daí a possibilidade de
distintas intelecções.

Mais adiante, a respeito da origem e conceituação do Terceiro Setor,


Mello (2008, p. 224), entende que o termo designa entidades não estatais e
também não prepostas à objetivos mercantis, predispondo-se, ao menos
formalmente, à realização de objetivos socialmente valiosos e economicamente
desinteressados. Continuando, afirma que se enquadram na categoria as
Organizações Sociais, previstas na Lei 9.637, de 15.5.1998, e as Organizações
da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPS), reguladas na Lei 9.790, de
23.3.1999). Além disso, entende que também se encaixariam no “Terceiro Setor”
as notórias entidades de Utilidade Pública.
No entendimento de Carvalho (2016, p. 686), estas entidades, também
conhecidas como paraestatais, as quais fariam parte do terceiro setor, podem
ser conceituadas como:

[...] entidades privadas que atuam, sem finalidade lucrativa, visando


garantir o interesse da sociedade, executando atividades de interesse
social, gozando, desta forma, de benefícios pagos pelo ente estatal,
como forma de incentivar a atuação do particular. A doutrina costuma
chamá-las de entidades paraestatais, haja vista sua atuação ao lado
da Administração Pública, praticando atos e realizando atividades de
interesse do Estado, na busca de trazer benefícios à sociedade.

Assim, uma entidade do Terceiro Setor, só passa a ser considerada


entidade paraestatal, quando se conecta ao Estado, assumindo diretrizes e, por
isso, recebendo fomentos. Nesse sentido, Mello (2013, pag. 163) entende o
seguinte sobre as entidades paraestatais:

[...] sujeitos não estatais, isto é, de direito privado que, em paralelismo


com o Estado, desempenham cometimentos que este poderia
desempenhar por se encontrarem no âmbito de interesses seus, mas
não exclusivamente seus. Caracterizam-se pelo fato de que o Poder
Público enfaticamente os assume como colaboradores emprestando-
lhes o significativo amparo de colocar a seu serviço o poder de império
de que dispõe ao instituir tributo em favor deles, como ocorre
justamente com os chamados serviços sociais autônomos,
circunstância esta que lhes confere uma peculiar singularidade entre
os sujeitos alheios à Administração indireta que concorrem para
objetivos sociais de interesse público.
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Di Pietro (2014, p. 565) entende que os componentes do Terceiro Setor:

No mesmo sentido de entidades paralelas ao Estado, adotado por


Celso Antônio Bandeira de Mello para definir os entes paraestatais,
podem ser consideradas, hoje, além dos serviços sociais autônomos,
também as entidades de apoio (em especial fundações, associações e
cooperativas), as chamadas organizações sociais e as organizações
da sociedade civil de interesse público.

Assim sendo, para Lins (2015), o terceiro setor é composto por entidades
não estatais e sem fins lucrativos, voltadas ao oferecimento de atividades de
interesse coletivo à população em geral. As entidades qualificadas como
Organizações Sociais e OSCIPs, pelas suas características, integram o terceiro
setor.
Estas instituições, que constituem o terceiro setor, devido ao fato de
exercerem atividades que, embora privadas, são do interesse do Estado, podem
receber determinadas colaborações no seu funcionamento. Segundo Di Pietro
(2014), essas entidades são incluídas entre as entidades chamadas
paraestatais, abrangendo tanto as pessoas privadas que colaboram com o
Estado desempenhando atividade não lucrativa como as entidades que recebem
especial proteção do Poder Público.
Para Medauar (2004), cada uma dessas entidades possui personalidade
jurídica própria, que não se confunde com a personalidade jurídica da entidade
maior com que se vinculam (União ou Estado-membro Município) e, devido a
essa personalidade jurídica, são sujeitos de direitos e deveres por sua própria
existência, podendo realizar atividades e atos jurídicos em seu próprio nome.
Pereira (2011) elenca requisitos básicos para a qualificação de uma
entidade paraestatal, afirmando que, para definir e identificar quais são as
organizações ou entidades sem fins lucrativos que integram o Terceiro Setor,
são utilizadas metodologias baseadas em critérios e classificações
internacionais, ocorrendo inclusive para que seja possível a comparação dos
dados em perspectiva nacional e internacional. Prossegue, então, afirmando que
especificamente em relação a definição e identificação das organizações, é
utilizado a metodologia baseada no “Manual sobre as Instituições sem Fins
Lucrativos no Sistema de Contas Nacionais” recomendado pela ONU e, segundo
essa metodologia, para ser caracterizada como sem fins lucrativos e integrar,
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assim, o Terceiro Setor, a organização ou entidade deve preencher, ao mesmo


tempo, cinco critérios, que elenca como: privadas, sem fins lucrativos,
institucionalizadas, auto-administradas e voluntárias.
No entendimento de Di Pietro (2014), as entidades paraestatais podem
ser definidas como pessoas jurídicas de direito privado, instituídas por
particulares, com ou sem autorização legislativa, para o desempenho de
atividades privadas de interesse público, mediante fomento e controle do Estado.
Em consonância aos entendimentos Carvalho (2016), este ressalta que
as entidades que fazem parte do terceiro setor, não integram a estrutura
administrativa como entes da Administração Direta ou Indireta, pois, se assim
fosse, estariam localizadas no primeiro setor da economia. Para o autor, as
entidades são particulares em colaboração e sem fins lucrativos, que atuam ao
lado do Estado na prestação de serviços públicos não exclusivos, mas de cunho
social. Por derradeiro, os incentivos recebidos pelo Poder Público, mediante a
dotação orçamentaria, cessão de bens públicos, entre outros, só acontece em
decorrência do fato de atuarem na prestação de serviços e, por receberem esses
benefícios, se submetem às restrições de controle impostas ao ente estatal.
Portanto, para fins desse estudo, se entende que “Terceiro setor” e as
ditas “entidades paraestatais”, embora passíveis de confusão - vez que possuem
semelhanças-, não se confundem. Constituindo, assim, o “terceiro setor” as
organizações sociais, as fundações ou entidades de apoio e as organizações da
sociedade civil de interesse público. Desta forma, possui um caráter privado e
origem na iniciativa privada e, portanto, a única relação com o erário se dá pela
possibilidade de efetuar contratos de parceria com próprio Estado, pelo qual se
comprometem à mútua cooperação e à consecução de finalidades de interesse
público e recíproco, mediante a execução de atividades ou projetos previamente
estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração,
fomento ou acordos de cooperação e os quais são, atualmente, regulados pela
Lei 13.019 (Marco Regulatório do Terceiro Setor), que será objeto de estudo nos
tópicos seguintes.

2.2 CONSTITUIÇÃO/HISTÓRICO
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O Terceiro Setor, embora recentemente regularizado, não é novidade no


mundo ou no Brasil, já que a primeira entidade que tinha como proposta atender
pessoas desamparadas pelo Estado surgiu em 1543. A Irmandade da
Misericórdia, localizada em São Vicente, litoral paulista, seguia as regras ditadas
pela Igreja Católica e desenvolvia ações na área de saúde, bem como efetuava
doações para órfãos (OLIVEIRA; GODÓI-DE-SOUSA, 2015).
Todavia, foi nas últimas décadas do século XX que, no Brasil, surgiu o
fenômeno “terceiro setor”. Entre os anos 1960 e 1970, devido aos protestos e
manifestações contra a ditadura militar, houve o fortalecimento da sociedade
civil, o que acabou propiciando o aparecimento de movimentos os quais
buscavam ajuda mútua para a garantia dos direitos e pela democracia,
intensificando a importância de se pôr em prática a cidadania e a solidariedade.
Este era o início da transição da ditadura militar para o regime
democrático. A população conquistava novas oportunidades de exercer direitos.
Com as eleições diretas, o relacionamento da sociedade com o Estado
gradativamente se tornou mais complexo, pois os novos canais de participação
e questionamentos se abriam.
Enquanto o novo tipo de relacionamento estabelecido entre o “primeiro
setor” e a sociedade civil tomava rumos diferentes, o Estado passava por
problemas econômicos e o empresariado passava a “entender seu papel social”,
já que começava a se configurar mais uma oportunidade de desenvolvimento de
estratégias para o fortalecimento mercadológico, originando, assim, uma prática
onde o Estado e o mercado passam a atuar de forma “misturada” e, uma vez
que suas ações se mesclam e começam a girar em torno de uma parceria cujos
papéis também se confundem.
Neste ciclo a sociedade civil passa a ser responsabilizada pelas
demandas não atendidas por aquelas esferas, tendo em vista que na medida em
que o Estado delega suas responsabilidades ao terceiro setor, também fortalece
o mercado que se amplia e se redimensiona para “atender” a esta demanda
negligenciada.
Mello (2013, grifo do autor), a respeito do surgimento do Terceiro Setor,
assevera que o Terceiro Setor é outra invenção oriunda da criatividade dos
administradores ou economistas do período do apogeu do neoliberalismo entre
as pessoas. Ainda no mesmo sentido, mais adiante, afirma que tais criações,
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consideradas por ele filhas queridas do neoliberalismo, foram alimentadas pela


assertiva corrente de que o Estado é mau prestador de serviços e, no seu ponto
de vista, o Estado é, sem dúvida alguma, pior fiscalizador do que prestador de
atividades.
Por derradeiro, no final da década de 1990, em 15 de maior de 1998, foi
criada a Lei nº 9.637 que trazia diretrizes de funcionamento e convênio com o
Governo e dispunha sobre a qualificação de entidades como Organizações
Sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos
e entidades que menciona e a absorção de suas atividades por organizações
sociais, entre outras providencias. Além desta, no final da década de 1990, foi
promulgada a Lei nº 9.790 de 23 de março de 1999, a qual dispunha sobre a
qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público e, além disso, instituiu e
disciplinou o Termo de Parceria.
Estas entidades ofereciam certificações que davam às organizações da
sociedade civil acesso a novos recursos por meio de um Termo de Parceria entre
elas e o Poder Público para suas finalidades, assumindo obrigações de
transparência administrativa.
Não obstante, o Brasil sediou em junho de 1992, no Rio de Janeiro, a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
(CNUMAD), também conhecida como Rio’92 ou Eco 92. Sendo que nesta
conferência a expressão Organização Não Governamental (ONG) passou a
frequentar os meios de comunicação e, desde então, o Brasil passou a se
mobilizar em campanhas a favor de temas como a erradicação da fome e
miséria, contra a corrupção ou pela redução da violência urbana, lideradas por
‘organizações não-governamentais’ em nome dos ‘direitos da cidadania’
(FALCONER, 1999).
Assim sendo, a partir dos diversos acontecimentos supramencionados, o
Terceiro Setor começou a ser visualizado como um tema de reiterada relevância
nos diversos segmentos da sociedade civil, da academia, como também nos
outros setores. Entretanto, ainda há diversas dúvidas com relação aos
relacionamentos entre algumas dessas organizações e as esferas
governamentais, no que se refere à transparência para utilização do dinheiro
público e privado (BRASIL, 2006; CRUZ et al., 2010).
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Tão grande é a importância deste setor, que no ano de 2014, foi


promulgada a Lei 13.019/2014, também conhecida como Novo Marco
Regulatório do Terceiro Setor, que traz uma série de mudanças para a
formalização de parcerias entre as organizações da sociedade civil e a
Administração Pública e à qual será objeto de estudo mais profundado nos
tópicos seguintes.

3. PESSOAS JURIDICAS QUE COMPOEM O TERCEIRO SETOR


3.1 SOCIEDADES

As sociedades são instituições privadas, formadas por pessoas que


possuem um objetivo em comum e a intenção de obter lucro pelas suas
atividades.
A respeito do tema, o Código Civil Brasileiro traz o conceito de sociedade
em seu art. 981, dispondo o seguinte:

Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que


reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o
exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou
mais negócios determinados (BRASIL, 2002).

Assim, a respeito das sociedades, Farias e Rosenvald (2006), preceitua


que as sociedades são pessoas jurídicas que visam o lucro, tendo como objetivo
reparti-los entre os sócios. Afirma, também, que podem possuir diferentes
finalidades, como ser sociedade simples (quando exercem atividades
econômicas, visando o lucro, porém o seu objeto não diz respeito a uma
atividade típica de empresário, conforme preceituam os arts. 997 a 1038, do
Código Civil) ou assumir feição de sociedade empresarial, o que ocorre quando
estas tendem ao exercício de atividade mercantil, relacionada com atividade
econômica organizada para a produção ou a circulação de bens e serviços, nos
moldes dos arts. 966 e 982, também do Código Civil.
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Insta mencionar que o que diferencia as sociedades das associações é a


finalidade lucrativa das sociedades. Nesse sentido, também o doutrinador
Tartuce (2016, p. 172), conceitua a sociedade simples da seguinte maneira:

b) Sociedades simples - são as que visam, também, a um fim


econômico (lucro), mediante exercício de atividade não empresária.
São as antigas sociedades civis. Como exemplos, podem ser citados
os grandes escritórios de advocacia, as sociedades imobiliárias e as
cooperativas. Quanto às cooperativas, prevê o Enunciado n. 69 do
CJF/STJ, aprovado na 1 Jornada de Direito Civil, que "As sociedades
cooperativas são sociedades simples sujeitas a inscrição nas juntas
comerciais".

Marcondes (1977, p. 13-14.), em relação ao Código Civil, afirma o que se


segue:

No Projeto de Código Civil, a associação e as sociedades têm um


tratamento diverso, inclusive pela natureza jurídica dos respectivos
institutos. A associação é ato de união de pessoas. Não há entre os
associados, direitos e obrigações recíprocos. Ao passo que a
sociedade é contrato, cuja natureza parece hoje bem assentada na
doutrina de Ascarelli: um contrato plurilateral, dadas as relações dos
sócios, reciprocamente, entre si, dos sócios com a sociedade, da
sociedade com terceiros e dos sócios com terceiros. É nesta
qualificação de contrato plurilateral que o projeto define a sociedade
[...]

Ou seja, a sociedade é assentada em um contrato estipulado entre duas


ou mais pessoas, com objetivos comuns e o intuito de aferir lucros através da
atividade empreendida pelos sócios, sendo tais lucros repartidos em diferentes
cotas entre si.

3.2 ASSOCIAÇÕES

Por associações se entende aquelas corporações que não visam a


finalidade lucrativa, ou seja, é um grupo de pessoas que agem como se fossem
uma só, buscando realizar os mesmos objetivos, sendo submetidas às mesmas
regras ou estatutos. Nesse sentido, preceitua o Código Civil o que se segue: “Art.
53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para
fins não econômicos”.
Farias e Rosenvald (2006), afirmam, à título exemplificativo que: “Não é
raro encontrar, por todo o território nacional, associações estudantis,
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beneficentes, filantrópicas, recreativas, esportivas, de determinadas classes ou


categorias profissionais, de moradores de bairro etc”.
Assim, associações são pessoas jurídicas de direito privado e deverão ser
regidas por um estatuto que deve ser confeccionado nos moldes do artigo 54 da
Lei Civil, sob pena de acarretar a sua nulidade.
A respeito das associações, Tartuce (2016, p. 163) afirma o seguinte:

A associação deve sempre ser registrada, passando com o registro a


ter aptidões para ser sujeito de direitos e deveres na ordem civil. Como
ocorre com todas as pessoas jurídicas, a associação tem identidade
distinta dos seus membros (teoria da realidade orgânica, nos termos
do art. 20 do CC/1916)

O mesmo autor também diferencia as associações das sociedades,


declarando que:

Não se podem confundir as associações com as sociedades. Quando


não há fim lucrativo no conjunto de pessoas constituído, tem-se a
associação. Ao contrário, as sociedades visam sempre a um fim
econômico ou lucrativo, que deve ser repartido entre os sócios.
Também não se podem confundir as associações com as fundações.
Enquanto as primeiras são formadas por um conjunto de pessoas
(corporações), as fundações são conjuntos de bens.

Por isso, é importante ressaltar que a maior diferenciação entre


associações e sociedades se dá pela ausência de um fim econômico e lucrativo
nas associações, em detrimento do que se verifica nas sociedades, que tem por
escopo principal os fins lucrativos.
O Código Civil, ao determinar em seu parágrafo único do artigo 53, que
não há entre os associados direitos e obrigações recíprocas, dá permissão clara
à diferenciação de “classes” e “posições” na associação, podendo haver
associados-proprietários, associados beneméricos, associados honorários,
entre outros.
Também é importante salientar que há associações de direito público, às
quais se dá a denominação de “associações públicas”, sendo regidas também
pela Lei Civil, conforme preceitua o parágrafo único do art. 41, vejamos:

Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas


de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado,
regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas
deste Código (BRASIL, 2002).
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Ocorre que, para regimento e melhor regulamentação destas


associações, foi promulgada a Lei 11.107/05, que criou os consórcios públicos.
Assim, conforme Carvalho (2016, p. 160):

As associações públicas decorrem da edição da lei 11.107/05 que


criaram os chamados consórcios públicos. A lei dispõe sobre normas
gerais para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
contratarem consórcios públicos para a realização de objetivos de
interesse comum e estabelece que a nova entidade criada, ou seja, o
consórcio público constituirá associação pública ou pessoa jurídica de
direito privado.

Portanto, pode se afirmar que são as pessoas jurídicas criadas a partir da


celebração de um contrato público por entidades federativas. Além disso,
quando as entidades federativas celebram um consórcio público, elas podem
decidir se essa nova pessoa criada será de direito público ou de direito privado.
Se for de direito público, será caracterizada como Associação Pública. Se for de
direito privado, não há um nome específico. Para tanto, de forma a esclarecer o
tema em pauta, Alexandrino e Paulo (2016, p. 46) concluem:

A figura das associações públicas é expressamente tratada como uma


espécie de autarquia no Código Civil, nestes termos: "são pessoas
jurídicas de direito público interno as autarquias, inclusive as
associações públicas" (art. 41, IV). Os consórcios públicos, espécie de
pessoa jurídica disciplinada na Lei 11.107/2005, podem ser
constituídos sob a forma de associações públicas. Nesse caso, o
consórcio público será uma autarquia integrante, simultaneamente, da
administração indireta de mais de um ente federado, figura que a
doutrina tem chamado de autarquia interfederativa ou multifederada
(ou, ainda, multifederativa).

Cabe, por fim, dissertar a respeito dos Serviços Sociais Autônomos,


regulados pelas leis nº 8.246/91, nº 10.668/03 e nº 11.080/04, que podem ser
verificados sob a forma de associações civis ou fundações (conceituada em
tópico seguinte) e que, segundo Cunha Junior (2018) podem ser conceituados
como entidades privadas, criadas mediante autorização legal, dotadas de
patrimônio próprio, para prestar certos serviços sociais relacionados à
assistência social, médica ou de ensino profissional, sem fins lucrativos e
costumeiramente sob a forma de associações civis ou fundações. Além disso,
afirma que são fomentadas pelo Estado através incentivos decorrentes de
dotações orçamentárias específicas ou contribuições parafiscais instituídas em
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seu favor e pagas pelos empresários e todos os que exercem atividade industrial
ou comercial, sendo tais contribuições sociais (art. 149, CF) instituídas pelo
Estado e destinadas ao fomento dessas entidades paralelas do Estado.
Por fim, de maneira sucinta, associação é uma organização resultante da
reunião legal entre duas ou até mais pessoas, com ou sem personalidade
jurídica, sem fins lucrativos para a realização de um objetivo comum.

3.3 FUNDAÇÕES

As fundações também são regulamentadas pelo Código Civil, o qual


classifica as fundações como pessoas jurídicas de direito privado e sobre estas
preceitua, em seu art. 62, que:

Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura
pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando
o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de
administrá-la (BRASIL, 2002).

Todavia, em parágrafo único e incisos, o mesmo artigo da lei, estipula rol


taxativo sobre os fins permitidos às fundações:

Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins de:


I – Assistência social;
II – Cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;
III – Educação;
IV – Saúde;
V – Segurança alimentar e nutricional;
VI – Defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção
do desenvolvimento sustentável;
VII – Pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas,
modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de
informações e conhecimentos técnicos e científicos;
VIII – Promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos
humanos;
IX – Atividades religiosas [...] (BRASIL, 2002)

Ou seja, por fundação se entende toda e qualquer organização que tenha


o patrimônio afetado por uma finalidade especifica e determinada pelo seu
instituidor, com personalidade jurídica atribuída pela lei. Farias e Rosenvald
(2006, p. 349) determinam que:

[...] as fundações são entidades criadas com bens livres que são
afetados, por ato de vontade de seu titular, através de escritura pública
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ou testamento (CC, art. 62), para atender a uma finalidade específica,


que poderá ser religiosa, moral, cultural ou assistencial, consoante o
parágrafo único do art. 62 do Código Civil, podendo assumir natureza
pública ou privada”.

Ressalta-se que as fundações podem ser privadas ou públicas, sendo que


ambas possuem por escopo atividades que não visam o lucro. Assim, as
fundações ditas públicas, são regulamentadas e definidas mais precisamente
pelo decreto-lei 200/67 que, em seu art. 5º, inciso IV:

Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se: IV - Fundação Pública - a


entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins
lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o
desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos
ou entidades de direito público, com autonomia administrativa,
patrimônio próprio gerido pelos respectivos órgãos de direção, e
funcionamento custeado por recursos da União e de outras
fontes. (Incluído pela Lei nº 7.596, de 1987)

Sobre o assunto, Gonçalves (2012, p. 228), distingue as fundações


públicas das fundações de direito privado, afirmando que:

As fundações podem ser particulares e públicas. Estas são instituídas


pelo Estado, pertencendo os seus bens ao patrimônio público, com
destinação especial, regendo-se por normas próprias de direito
administrativo. As fundações particulares são reguladas no Código
Civil, arts. 62 a 69.

Também, a respeito das fundações públicas, de maneira a esclarecer o


instituto, mister ressaltar os ensinamentos de Figueiredo (2014, p. 378, grifo do
autor):

Fundações públicas são as entidades paraestatais que revestem a


forma fundacional civil, portanto, pessoas jurídicas de direito privado
nas quais recursos, que podem ser total ou parcialmente públicos, são
personificados e afetados a atividades específicas impróprias do
Estado, notadamente no campo do ordenamento social, por delegação
da lei que as institui.

Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal na ADI 191/RS: "A


distinção entre fundações públicas e privadas decorre da forma como foram
criadas, da opção legal pelo regime jurídico a que se submetem, da titularidade
de poderes e também da natureza dos serviços por elas prestados.".
Assim sendo, no Brasil, pode se inferir que as fundações públicas são
entidades sem fins lucrativos, constituídas para um fim específico de interesse
15

público, podendo assumir personalidade jurídica de direito público ou de direito


privado. Nesse sentido, as fundações públicas de direito público são criadas por
lei e as fundações públicas de direito privado são constituídas mediante
autorização legal, nos termos da legislação civil. E mesmo as fundações de
direito privado seguem algumas regras de direito público, tais como prestação
de contas ao Tribunal de Contas.
Importante, ressaltar que as fundações públicas possuem autonomia
administrativa, patrimonial, financeira e orçamentária, contraindo direitos e
obrigações em nome próprio.

4. ASPECTOS JURIDICOS DE PRESTAÇÃO - OS, OSCIPS, MARCO


REGULATÓRIO DO TERCEIRO SETOR

4.1 FORMAS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – ORGANIZAÇÕES SOCIAIS,


ORGANIZAÇÕES DA SOCIDADE CIVIL DE INTERESSE PÚBLICO E
SERVIÇOS SOCIAIS AUTONOMOS

Em relação as formas de prestação e serviço pelo Terceiro Setor, cabe


diferencia-las entre Serviços Sociais Autônomos, Organizações Sociais e
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público.
Conforme já abordado supra, os Serviços Sociais Autônomos são
entidades privadas criadas diretamente por lei, para prestar, sem fins lucrativos,
certos serviços sociais consistentes em ministrar assistência ou ensino a
determinadas categorias sociais ou profissionais, sendo que recebem do Estado
incentivo através de dotações orçamentárias específicas ou contribuições
parafiscais instituídas em seu favor (vide Leis nº 8.246, nº 10.668 e nº 11.080).
Conforme Cunha Júnior (2018, p. 196-197), exemplos de Serviços Sociais
Autônomos, seriam os entes de cooperação que integram o “Sistema S”, de que
são exemplos SESI, SENAI, SENAR, SET, SENAT e SEBRAE.
Ocorre que, estes não serão abordados neste estudo, vez que, o Novo
Marco Regulatório do Terceiro Setor (Lei nº 13.019/14), optou por abordar
apenas as ditas “OS” e “OSCIPs”.
16

Assim sendo, Organização Social é definida por Di Pietro (2014, p. 580)


como:

A qualificação jurídica dada a pessoa jurídica de direito privado, sem


fins lucrativos, instituída por iniciativa de particulares, e que recebe
delegação do Poder Público, mediante contrato de gestão, para
desempenhar serviço público de natureza social. Nenhuma entidade
nasce com o nome de organização social; a entidade é criada como
associação ou fundação e, habilitando-se perante o Poder Público,
recebe a qualificação; trata-se de título jurídico outorgado e cancelado
pelo Poder Público.

As Organizações Sociais foram determinadas primeiramente pela Lei nº


9.637/98 e foram criadas com intuito de absorver atividades hoje
desempenhadas por órgãos ou entidades da Administração Pública, causando
a extinção destes órgãos e destas entidades administrativas, com a cessão de
suas instalações, incluindo bem moveis e imóveis, e de seus servidores, para a
organização social (Cunha Júnior, 2018, p. 201). No mesmo sentido, o
dispositivo legal supracitado estipula as OS da seguinte forma:

Art. 1o O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais


pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas
atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao
desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio
ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta
Lei.

Por outro lado, conforme o determinado pela Lei nº 9.790/99,


regulamentada pelo Decreto n. 3.100/1999, Di Pietro (2014, p. 584) conceitua
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público:

Trata-se de qualificação jurídica dada a pessoas jurídicas de direito


privado, sem fins lucrativos, instituídas por iniciativa de particulares,
para desempenhar serviços sociais não exclusivos do Estado com
incentivo e fiscalização pelo Poder Público, mediante vínculo jurídico
instituído por meio de termo de parceria.

Na letra da Lei nº 9.790/99, Organização da Sociedade Civil de Interesse


Público é conceituada da seguinte forma:

Art. 1o O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais


pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas
atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao
17

desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio


ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta
Lei.

Assim, não se cuida de instituir uma nova entidade, mas de atribuir um


status ou qualidade de organização da sociedade civil de interesse público a
pessoas jurídicas criadas na conformidade do direito privado e já existentes na
sociedade (Gasparini, 2002, p. 387 apud Cunha Júnior, 2018, p. 207).
Portanto, embora semelhantes, os institutos não se confundem, sendo
que, a maior diferença verificável em ambas, além de estipuladas em diferentes
dispositivos legais, se dá pelo fato de uma ser pactuada sobre Contrato de
Gestão (Organizações Sociais) e outra por Termo de Parceria (Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público) sendo que, no caso destas, é necessário
que estejam a pelo menor 03 anos em funcionamento regular, o que não é
necessário nas OS.
Elucidando o tema, Mello (2013, p. 247), preceitua o seguinte:

Distinguem-se das “organizações sociais”, entre outros pontos


relevantes, pelos seguintes: a) a atribuição do qualificativo não é, como
naquelas, discricionária, mas vinculada e aberta a qualquer sujeita que
preencha os requisitos indicados; não prevê o trespasse de servidores
públicos para nelas prestar serviço; b) não celebram “contratos de
gestão” com o Poder Público, mas “termos de parceria”, conquanto, tal
como neles, seja especificado um programa a cumprir, com metas e
prazos fiscalizados, além da obrigação de um relatoria final, o que os
faz mais distintos, entre si, pelo nome que pelo regime; c) os vínculos
em questão não são condicionantes para a qualificação de entidade
como tal, ao contrário do que ocorrer com as “organizações sociais”; d)
o Poder Público não participa de seus quadros diretivos, ao contrário
do que ocorre naquelas; e e) o objeto da atividade delas é muito mais
amplo, compreendendo, inclusive, finalidades de benemerência social,
ao passo que as “organizações sociais” prosseguem apenas atividades
de ensino, pesquisa cientifica, desenvolvimento tecnológico, proteção
e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.

Nesse sentido, como essas instituições recebem verbas e certos


benefícios estatais, pode favorecer a ocorrência de fraudes, não só envolvendo
certos políticos, como também desviando recursos estatais que poderiam ser
aplicados em diversas melhorias sociais e de infraestrutura – justamente o que
o Terceiro Setor se propõe a fazer. Por isso, em busca de segurança jurídica
nessas relações, além de mais eficiência e transparência na gestão e no controle
de recursos públicos, foi sancionada a Lei nº 13.019/2014 que, basicamente, cria
novas regras para a assinatura de contratos entre o setor público e as
18

organizações não governamentais (OS e OSCIPs), que serão pormenorizadas a


seguir.

4.2 MARCO REGULATÓRIO DO TERCEIRO SETOR

O chamado Novo Marco Regulatório do Terceiro Setor, teve fundamento


pela Lei 13.019/2014, que traz inúmeras mudanças para a formalização de
parcerias entre as organizações da sociedade civil e a Administração Pública.
Assim, será efetuada uma análise da norma com o intuito de proporcionar
um melhor entendimento de como se dará legal, formal e operacionalmente, a
referida relação contratual, que já sofreu algumas alterações em dezembro de
2015 por meio da Lei 13.204/2015. Entretanto, tendo em vista a extensão desta,
serão abordados apenas os pontos e conceitos considerados de maior
relevância ao estudo, no caso, aqueles que tenham relação direta com os tipos
de prestação de serviços, bem como suas diferenciações e as formas como as
parcerias ocorrem, tendo por foco, principalmente, a conceituação dos institutos.
Nesse sentido, a lei começou a vigorar em janeiro de 2016 nos âmbitos
da União, Estados e Distrito Federal, entretanto, para os Municípios o início de
sua vigência foi estabelecido para 1° de janeiro de 2017.
Conforme o próprio texto legal, ela serve para estabelecer o regime
jurídico das parcerias voluntárias, envolvendo ou não transferências de recursos
financeiros, entre a administração pública e as organizações da sociedade civil,
em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse
público; define diretrizes para a política de fomento e de colaboração com
organizações da sociedade civil; institui o termo de colaboração e o termo de
fomento; e altera as Leis nos 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de
março de 1999.
A respeito das diretrizes, Andrade et al. (2017, p. 17) afirma o seguinte:

Tais diretrizes são delineadas pelo art. 6º. Os três pontos citados
(fomento, colaboração e cooperação), dentro dos limites desta Lei,
estão relacionados aos 3 instrumentos jurídicos aqui instituídos para a
formalização das parcerias (termos de colação, termos de fomento e
acordos de cooperação) e não abarcam questões conceituais que
diferenciem o que seria fomento, colaboração e cooperação em sentido
lato.
19

No mesmo sentido, continua:

Assim, a Lei irá trazer diretrizes comuns para as 3 formas de parceria,


tendo por base a busca cooperativa das melhores práticas para a
consecução do interesse público, visto que as diferenças existentes
dizem respeito apenas às diferenças entre os instrumentos jurídicos
citados (que serão analisados nos comentários ao art. 2º, VII, VIII e
VIII-A).

O dispositivo legal, em art. 2º, determina os conceitos relacionados ao


funcionamento e regulamento das parcerias e, portanto, relata o que se entende
por OSC (Organizações da Sociedade Civil), administração pública, parceria,
dirigente, administrador público, gestor, termo de colaboração, termo de
fomento, conselho de política pública, comissão de seleção, comissão de
monitoramento e avalição, chamamento público, bens remanescentes,
prestação de contas e termo aditivo.
Importante distinguir os conceitos referentes ao “Termo de colaboração”,
“Termo de fomento” e “Acordo de cooperação” vez que não se confundem. Assim
sendo, primeiramente distinguem-se os “Termos de colaboração” e “Termos de
fomento” dos “Acordos de cooperação”, pois os acordos de cooperação não
envolvem a transferência de recursos financeiros. Nesse sentido, a lei determina
em art. 2º, VII, VIII e VIII-A, o que se segue:

VII - termo de colaboração: instrumento por meio do qual são


formalizadas as parcerias estabelecidas pela administração pública
com organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades
de interesse público e recíproco propostas pela administração pública
que envolvam a transferência de recursos financeiros; (Redação dada
pela Lei nº 13.204, de 2015)
VIII - termo de fomento: instrumento por meio do qual são formalizadas
as parcerias estabelecidas pela administração pública com
organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades de
interesse público e recíproco propostas pelas organizações da
sociedade civil, que envolvam a transferência de recursos
financeiros; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
VIII-A - acordo de cooperação: instrumento por meio do qual são
formalizadas as parcerias estabelecidas pela administração pública
com organizações da sociedade civil para a consecução de finalidades
de interesse público e recíproco que não envolvam a transferência de
recursos financeiros; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015)

Portanto, embora ambos tenham finalidades de interesse público e


recíproco, diferenciam-se “Termos de colaboração” dos “Termos de fomento”
pelo fato de que o primeiro tem as finalidades propostas pela administração
20

pública, enquanto o segundo tem as finalidades propostas pela própria OSC. No


entanto, para os “Acordos de cooperação”, vez que não há a transferência de
recursos financeiros, essa distinção não é efetuada.
Sobre o assunto, Andrade et al. (2017, p. 28) tece distinções claras entre
os institutos:

Termo de colaboração: formaliza parceria proposta pela administração


pública, envolvendo transferência de recursos financeiros.
Termo de fomento formaliza parceria proposta pela organização da
sociedade civil, envolvendo transferência de recursos financeiros.
Acordo de cooperação é a única parceira regulada por esta Lei que não
envolve transferência de recursos financeiros, não importando quem
fez a proposta.

No mesmo sentido, ainda ressalva:

Atenção: Uma parceria que não envolva transferência de recursos


financeiros, ainda que tenha a transferência de outras espécies de
recursos (por exemplo, doação de bens públicos), será formalizada por
meio de acordo de cooperação.

Ainda sobre o tema, a “Seção V”, do texto legal, trata dos casos em que
devem ser adotados os Termos de Colaboração e Fomento, sendo que a
Comissão Especial de Direito do Terceiro Setor da OAB/SP (p. 36), tece
distinção a respeito dos casos em que a administração Pública adota o Termo
de Colaboração e que adota o Termo de Fomento:

A administração Pública adotará o Termo de Colaboração para a


consecução dos projetos e planos de trabalho de sua iniciativa, ou
propostos pelos conselhos de políticas públicas, que envolvam a
transferência de recursos. (art. 16 e § único da Lei 13.019/14)
Já o Termo de Fomento deve ser adotado pela Administração Pública,
em projetos e ações de iniciativa das Organizações da Sociedade Civil,
onde a administração fará transferência financeira. (art. 17 da Lei
13.019/14)

Andrade et al. (2017, p. 49), de forma a elucidar o tema, afirma que os


conselhos de políticas públicas podem fazer sugestões de propostas para a
formalização de tais termos e, em seguida, apresenta um exemplo de como isso
se daria na prática:

Exemplificando: o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do


Adolescente pode propor que o Município apresenta um plano de
21

trabalho para a formalização do termo de colaboração com


organizações da sociedade civil, tendo por finalidade custear cursos de
informática para crianças em situação de risco social.

Assim, o “Capítulo II”, de título “Da celebração do termo de colaboração


ou de fomento”, apresenta inúmeras seções, as quais preceituam
detalhadamente o processo de seleção e celebração dos contratos entre as
organizações sociais e a União, sendo elencados os requisitos necessários, bem
como as regras para que a parceria seja adequadamente celebrada.
Mais adiante, a “Seção II”, do mesmo capítulo, trata da “Da Capacitação
de Gestores, Conselheiros e Sociedade Civil Organizada” e em “Seção III”, de
tópico “Da Transparência e do Controle”, verifica-se a determinação da
obrigatoriedade de que a Administração Pública mantenha em site próprio a
relação das parcerias celebradas e dos respectivos planos de trabalho (art. 10),
bem como o dever de a Organização da sociedade Civil divulgar, pelos meios de
comunicação existentes, as ações e parcerias celebradas com a Administração
Pública (art. 11, caput).
Assim sendo, para que haja a parceria com a União, é necessário que
seja seguido um procedimento de manifestação de interesse social, devendo ser
apresentada uma proposta ao poder público para que este avalie a possibilidade
de realização de um chamamento público objetivando a celebração da referida
parceria (Seção VI, arts. 18 a 21). Na letra da lei:

Art. 18. É instituído o Procedimento de Manifestação de Interesse


Social como instrumento por meio do qual as organizações da
sociedade civil, movimentos sociais e cidadãos poderão apresentar
propostas ao poder público para que este avalie a possibilidade de
realização de um chamamento público objetivando a celebração de
parceria (BRASIL, 2014).

A respeito dos editais de “Chamamento Público”, a OAB/SP (2017)


preceitua o que se segue:

O Edital de Chamamento é o instrumento público que servirá para fazer


a seleção das OSC’s aptas a participar do chamamento público. Trará
os padrões mínimos a serem descritos nos Planos de Trabalho,
considerando o diagnóstico da realidade, descrição de metas, formas
de avaliação, plano de aplicação de recursos, custos e resultados
esperados. (art. 23 e 24 da Lei 13.019/14).
22

Cabe ressaltar que a própria lei determina que a realização do


“Procedimento de Manifestação de Interesse Social” não implica na
obrigatoriedade de efetuar o “Chamamento Público”.
É necessário, então, que seja efetuado um plano de trabalho de parcerias
celebradas mediante termo de colaboração ou de fomento e, neste plano, é
indispensável que contenha (Seção VII, art. 22):

I - descrição da realidade que será objeto da parceria, devendo ser


demonstrado o nexo entre essa realidade e as atividades ou projetos e
metas a serem atingidas;
II - descrição de metas a serem atingidas e de atividades ou projetos a
serem executados;
II-A - previsão de receitas e de despesas a serem realizadas na
execução das atividades ou dos projetos abrangidos pela parceria;
III - forma de execução das atividades ou dos projetos e de
cumprimento das metas a eles atreladas;
IV - definição dos parâmetros a serem utilizados para a aferição do
cumprimento das metas.

Plano de trabalho é, portanto, o documento norteador de todas as


parcerias celebradas mediante termo de colaboração ou de fomento (Andrade et
al., 2017, p. 54). Ou seja, Plano de Trabalho é o documento pelo qual se definem
as atividades e projetos que serão desenvolvidos, com descritivo das ações,
metas e indicadores para posterior monitoramento (art. 22 da Lei 13.019/14)
(OAB/SP, 2017, p. 40).
Também a respeito dos requisitos do referido plano, afirma a Oab/sp
(2017, p. 40):

O Plano de Trabalho deve conter a descrição da realidade objeto da


parceria, os recursos humanos, remuneração da equipe e os encargos
sociais, obrigações trabalhistas, materiais, metas que se pretendem
atingir, capacidade técnica e operacional para execução e prestação
de contas. (Art. 22 da Lei 13.019/14)

Após a abertura do Procedimento de Manifestação de Interesse Social”,


deverá haver o “Chamamento Público” (Seção VII) das instituições que a
Administração Pública considerar aptas a celebrar o “Termo de Colaboração” ou
“Termo de Fomento (art. 24). Assim, o art. 23 determina que os procedimentos
adotados sejam “claros, objetivos e simplificados que orientem os interessados
e facilitem o acesso direto aos seus órgãos e instâncias decisórias,
independentemente da modalidade de parceria prevista nesta Lei”. É vedado,
23

entretanto, “admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas


ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter
competitivo em decorrência de qualquer circunstância impertinente ou
irrelevante para o específico objeto da parceria” (art. 24, § 2º).
A respeito dos requisitos para celebração do Termo de Colaboração e do
Termo de Fomento (Seção IX), o art. 33 e incisos, preceitua que para celebrar
as parcerias previstas na Lei, as organizações da sociedade civil deverão ser
regidas por normas de organização interna que prevejam objetivos voltados à
promoção de atividades e finalidades de relevância pública e social; que, em
caso de dissolução da entidade, o respectivo patrimônio líquido seja transferido
a outra pessoa jurídica de igual natureza que preencha os requisitos da referida
Lei e cujo objeto social seja, preferencialmente, o mesmo da entidade extinta; a
escrituração de acordo com os princípios fundamentais de contabilidade e com
as Normas Brasileiras de Contabilidade, entre outros.
No mesmo sentido, deve ser mencionada a necessidade de “no mínimo,
um, dois ou três anos de existência, com cadastro ativo, comprovados por meio
de documentação emitida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, com
base no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ...” (art. 33, V, a);
experiência prévia na realização, com efetividade, do objeto da parceria ou de
natureza semelhante (art. 33, V, b); e instalações, condições materiais e
capacidade técnica e operacional para o desenvolvimento das atividades ou
projetos previstos na parceria e o cumprimento das metas estabelecidas (art. 33,
V, c).
Para os casos em que a OSC não cumprir os requisitos da dos art. 33 e
34 da Lei, preceitua a Oab/sp (2017) que depois de encerrada a fase competitiva
das propostas (plano de trabalho) ocorrerá a verificação da documentação
prevista no edital e, se a a OSC não cumprir os requisitos da lei (arts. 33 e 34 da
Lei 13.019/14) e do edital, será desclassificada. Além disso, afirma que a
segunda melhor colocada terá seus documentos também verificados e assim por
diante (art. 28 da Lei 13.019/14).
Mais adiante, na Seção X, última do Capítulo II, é apresentado as
Vedações, ou seja, verifica-se rol de casos em que as organizações da
sociedade civil não poderão celebrar os termos de parceria de qualquer
modalidade, como em art. 39 e incisos:
24

Art. 39. Ficará impedida de celebrar qualquer modalidade de parceria


prevista nesta Lei a organização da sociedade civil que:
I - não esteja regularmente constituída ou, se estrangeira, não esteja
autorizada a funcionar no território nacional;
II - esteja omissa no dever de prestar contas de parceria anteriormente
celebrada;
III - tenha como dirigente membro de Poder ou do Ministério Público,
ou dirigente de órgão ou entidade da administração pública da mesma
esfera governamental na qual será celebrado o termo de colaboração
ou de fomento, estendendo-se a vedação aos respectivos cônjuges ou
companheiros, bem como parentes em linha reta, colateral ou por
afinidade, até o segundo grau;
IV - tenha tido as contas rejeitadas pela administração pública nos
últimos cinco anos, exceto se: (Redação dada pela Lei nº 13.204, de
2015)
a) for sanada a irregularidade que motivou a rejeição e quitados os
débitos eventualmente imputados; (Incluído pela Lei nº 13.204, de
2015)
b) for reconsiderada ou revista a decisão pela rejeição; (Incluído pela
Lei nº 13.204, de 2015)
c) a apreciação das contas estiver pendente de decisão sobre recurso
com efeito suspensivo; (Incluído pela Lei nº 13.204, de 2015) [...]

Assim, finalizado o Capítulo II, o Capítulo III trata da “Formalização e da


Execução” e está dividido em oito seções, tratando a Seção I, das “Disposições
Preliminares”, tratando das cláusulas essenciais para a celebração do termo de
fomento, termo de colaboração ou acordo de cooperação, conforme pode se ver
em art. 42 e incisos:

Art. 42. As parcerias serão formalizadas mediante a celebração de


termo de colaboração, de termo de fomento ou de acordo de
cooperação, conforme o caso, que terá como cláusulas
essenciais: (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
I - a descrição do objeto pactuado;
II - as obrigações das partes;
III - quando for o caso, o valor total e o cronograma de
desembolso; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
IV -(revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
V - a contrapartida, quando for o caso, observado o disposto no § 1o do
art. 35; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de 2015)
VI - a vigência e as hipóteses de prorrogação;
VII - a obrigação de prestar contas com definição de forma,
metodologia e prazos; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de
2015)
VIII - a forma de monitoramento e avaliação, com a indicação dos
recursos humanos e tecnológicos que serão empregados na atividade
ou, se for o caso, a indicação da participação de apoio técnico nos
termos previstos no § 1o do art. 58 desta Lei;
IX - a obrigatoriedade de restituição de recursos, nos casos previstos
nesta Lei; [...]
25

Na Seção III, o art. 45 se refere às proibições de uso das verbas recebidas


pela administração pública. Sendo que em art. 46 são estipuladas despesas
específicas que poderão ser pagas com os recursos provindos do erário, dentre
outras necessárias à manutenção da organização, como a remuneração das
pessoas relacionadas ao funcionamento da organização, diárias referente a
deslocamento, hospedagem, entre outros, custos necessários à execução do
objeto, entre outras.
Na Seção IV, é determinado como se dá a liberação dos recursos e as
exceções dos casos em que ficarão retidas até a resolução das impropriedades.
E, na Seção V, apresenta-se como se procede à movimentação e aplicação
financeira dos recursos recebidos.
É possível a existência de algumas alterações na vigência da parceria,
desde que mediante solicitação da OSC, devidamente formalizada e justificada,
devendo ser apresentada diretamente à administração em no mínimo trinta dias
antes do termo inicialmente previsto (art. 55) e, além disso, há a possibilidade
que a vigência seja prorrogada de ofício pela administração pública quando ela
der causa ao atraso na liberação dos recursos financeiros (art. 55, p. único).
Também é possível rever o plano de trabalho para a alteração de valores ou de
metas, mediante termo aditivo ou por apostila ao plano de trabalho original (art.
57).
A respeito da revisão dos valores e metas, Andrade et al. (2017) preceitua
exemplos práticos das possíveis razões para as alterações nos termos, como a
insuficiência dos recursos previstos, a ocorrência de uma catástrofe da natureza
ou o surgimento de uma necessidade inicialmente não prevista.
A Seção VII do Capítulo III, segue determinando como serão feitos o
monitoramento e a avaliação das organizações, sendo que o art. 59 determina
que:

Art. 59. A administração pública emitirá relatório técnico de


monitoramento e avaliação de parceria celebrada mediante termo de
colaboração ou termo de fomento e o submeterá à comissão de
monitoramento e avaliação designada, que o homologará,
independentemente da obrigatoriedade de apresentação da prestação
de contas devida pela organização da sociedade civil.

Além disso, a administração deverá fornecer manuais específicos às


organizações da sociedade civil de forma a simplificar e racionalizar os
26

procedimentos (art. 63, §1º), sendo que, a prestação de contas apresentada pela
OSC deverá conter elementos que permitam ao gestor da parceria avaliar o
andamento ou concluir que o seu objeto foi executado conforme pactuado, com
a descrição pormenorizada das atividades realizadas e a comprovação do
alcance das metas e dos resultados esperados, até o período de que trata a
prestação de contas (art. 64, caput). Inobstante, a prestação de contas e todos
os atos que dela decorram deverá ser, sempre que possível, publicada em
plataforma eletrônica, para que qualquer um possa visualizar (art. 65, caput).
Sobre o conceito da prestação de contas, esclarece a Oab/sp (2017,
p.97):

A prestação de contas (ou tomada de contas) é uma obrigação


constitucional, cujo objetivo é apreciar e julgar as contas dos
administradores (administração direta ou indireta) e dos demais
responsáveis por dinheiros e valores públicos, bem como daqueles que
resulte prejuízo ao erário público, constatado por irregularidade ou
omissão na prestação de contas conforme disposto no artigo 70 da Lei
13.019/14.

Quanto aos prazos, a Seção II, do mesmo capítulo, determina que a OSC
deverá prestar contas da boa e regular aplicação dos recursos recebidos no
prazo de até noventa dias a partir do término da vigência da parceria ou no final
de cada exercício, se a duração da parceria exceder um ano (art. 69). Sendo que
o prazo final poderá variar de acordo com a complexidade do objeto da parceria
(art. 69, §1º).
Uma vez constatada qualquer irregularidade ou omissão da prestação de
contas, será dado prazo para que seja sanado ou que seja cumprida a obrigação
(art. 70), devendo o prazo ser limitado até 45 (quarenta e cinco) dias por
notificação e prorrogável, no máximo, pelo mesmo prazo (art. 70, §1º).
As Organizações da Sociedade Civil poderão ainda sofrer sanções
administrativas (Seção I), que são preceituadas em art. 73:

Art. 73. Pela execução da parceria em desacordo com o plano de


trabalho e com as normas desta Lei e da legislação específica, a
administração pública poderá, garantida a prévia defesa, aplicar à
organização da sociedade civil as seguintes sanções: (Redação dada
pela Lei nº 13.204, de 2015)
I - advertência;
II - suspensão temporária da participação em chamamento público e
impedimento de celebrar parceria ou contrato com órgãos e entidades
da esfera de governo da administração pública sancionadora, por
27

prazo não superior a dois anos; (Redação dada pela Lei nº 13.204, de
2015)
III - declaração de inidoneidade para participar de chamamento público
ou celebrar parceria ou contrato com órgãos e entidades de todas as
esferas de governo, enquanto perdurarem os motivos determinantes
da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria
autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que
a organização da sociedade civil ressarcir a administração pública
pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção
aplicada com base no inciso II. (Redação dada pela Lei nº 13.204, de
2015)

Assim, Andrade et al. (2017, p. 146), ressalta: “O rol de sanções é taxativo.


Logo, a administração não poderá aplicar a sanção de multa, por ausência de
previsão legal.
Por fim, o Capítulo VI traz as disposições finais da Lei, como em art. 80
que determina que o processamento das compras e contratações que envolvam
os recursos financeiros provenientes de parceria poderá ser efetuado por meio
de sistema eletrônico disponibilizado pela administração pública às OSCs e
aberto ao público via internet, de forma a permitir que os interessados formulem
propostas. Além disso, determina, em art. 83, que as parcerias já existentes ao
tempo da entrada em vigor da lei, permanecerão regidas pela legislação vigente
ao tempo de sua celebração, podendo ser aplicada a mesma de forma
subsidiária e desde que em benefício do alcance do objeto da parceria.
A lei entrou em vigor após decorridos quinhentos e quarenta dias de sua
publicação oficial (art. 88), sendo que para os municípios entrou em vigor em 1º
de janeiro de 2017 (art. 88, §1º).

5. CONCLUSÃO

O terceiro setor é composto por entidades de caráter privado, mas que


podem utilizar os recursos adquiridos pela sua atividade, no desenvolvimento e
manutenção da própria instituição.
Essas instituições costumeiramente empreendem atividades de cunho
social, ou seja, praticam ações as quais geram benefícios para grande parte da
sociedade em geral como, por exemplo, o cuidado e proteção aos animais;
assistência à idosos, moradores de ruas e dependentes químicos; incentivos a
atividades culturais e recreativas, entre outros.
28

Os entes componentes do Terceiro Setor podem ser constituídos na forma


de sociedades, associações ou fundações, dependendo dos moldes de sua
formação e em consonância ao que preceitua o Código Civil.
Há certa imprecisão conceitual no que tange à natureza jurídica do termo
“Terceiro Setor”, uma vez que parte da doutrina entende que tais entidades são
consideradas entes paraestatais e, de outra banda, que são totalmente alheias
à atuação estatal e, portanto, totalmente independentes do Estado, possuindo
personalidade jurídica própria.
Assim sendo, para o estudo, considerou-se como “terceiro setor” as
organizações sociais, as fundações ou entidades de apoio e as organizações da
sociedade civil de interesse público. Sendo que possuem um caráter privado e
origem na iniciativa privada e, portanto, a única relação com o erário se dá pela
possibilidade de efetuar contratos de parceria com próprio Estado, pelo qual se
comprometem à mútua cooperação e à consecução de finalidades de interesse
público e recíproco, mediante a execução de atividades ou projetos previamente
estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração,
fomento ou acordos de cooperação e os quais são, atualmente, regulados pela
Lei 13.019 (Marco Regulatório do Terceiro Setor).
A respeito do dito “Marco Regulatório do Terceiro Setor”, verificou-se que
esta não é a primeira legislação sobre o tema, sendo precedida, por exemplo,
pelas Lei nº 9.637/98 (regulamenta as Organizações Sociais) e a Lei 9.790/99
(regulamenta as Organizações Sociais de Interesse Público). Ressalta-se que
os termos “OS” e “OSCIPs” são termos jurídicos e, portanto, qualificações dadas
uma vez que a entidade se encaixa no perfil determinado pelas referidas leis
para a realização de parcerias.
Ocorre que as leis regulamentadoras das OS e OSCIPs, embora
tratassem do tema, apresentavam algumas lacunas e, uma vez que existe a
transferência e movimentação de recursos financeiros do Estado para estas
organizações, tais incompletudes poderiam facilitar a ocorrência de fraudes
fiscais, dentre outros atos de improbidade administrativa.
Portanto, em busca de segurança jurídica nessas relações, além de mais
eficiência e transparência na gestão e no controle de recursos públicos, foi
sancionada a Lei nº 13.019/2014 que, basicamente, unifica tais instituições
29

conceituadas como Organizações da Sociedade Civil e cria novas regras para a


assinatura de contratos entre o setor público e estas organizações.
O Marco Regulatório do Terceiro Setor diferencia os termos de fomento,
os de colaboração e os acordos de cooperação, trazendo os requisitos para a
celebração de cada um deles, demonstrando, também, passo a passo, os
tramites burocráticos para o adequado fechamento dos contratos.
Nesse sentido, embora ambos tenham finalidades de interesse público e
recíproco, diferenciam-se “Termos de colaboração” dos “Termos de fomento”
pelo fato de que o primeiro tem as finalidades propostas pela administração
pública, enquanto o segundo tem as finalidades propostas pela própria OSC. No
entanto, para os “Acordos de cooperação”, vez que não há a transferência de
recursos financeiros, essa distinção não é efetuada.
Embora a legislação regulatória do Terceiro Setor apresente conceitos
novos, esclareça e tente ajustar grande parte das lacunas verificadas nas
legislações anteriores, não está isenta de falhas. Tanto é que, após sua
promulgação, já teve sua redação alterada pela Lei 13.204/15, sem prejuízo para
as possíveis alterações futuras.
30

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