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Introdução
Este artigo visa fazer uma breve revisão teórica acerca do conceito de função materna e o
desenvolvimento infantil, de acordo com diversos autores da escola Psicanalítica.
A função materna é essencial para a organização psíquica do infante e sua constituição como
sujeito. Pode-se dizer que é a partir da organização psicológica desenvolvida do relacionamento
com a mãe ou com a sua cuidadora que a criança conquista a capacidade de se relacionar com o
resto do mundo dos objetos humanos (Coppolillo, 1990).
Para Klein (1997), a vida mental da criança é influenciada por emoções primitivas e fantasias
inconscientes. O recém-nascido experimenta uma ansiedade de natureza persecutória e sente, de
forma inconsciente, como se todos os desconfortos lhe fossem infligidos por forças hostis, o que
desencadeia uma ansiedade da qual o ego precisa se livrar, e para isso, projetar. No entanto, se
em breve lhe for proporcionado conforto, isto é, quando predominarem os impulsos amorosos,
isso originará emoções mais satisfatórias, representando um apoio contra a ansiedade. O bebê
deseja receber da mãe não apenas alimento, mas também seu amor e compreensão, que se
expressa através dos cuidados da mãe para com seu bebê.
Winnicott (1983), ao falar da mãe suficientemente boa, designou o termo holding que corresponde
ao amparo e à manutenção da criança, não somente física, mas também psíquica. É a tarefa
materna de sustentar o filho, que além do suporte psicológico, também é um suporte físico, como
a de dar colo, afagos ou a troca de fraldas. A mãe suficientemente boa tem a capacidade de se
adaptar de forma delicada e sensível às necessidades iniciais do bebê, estabelecendo uma
relação com o ego do bebê que facilita para a criança introjetar as suas ansiedades de forma
suportável (Winnicott, 1978).
No momento em que a mãe falha em sua tarefa de realizar o holding, isto é, quando a mãe não se
torna “boa o suficiente”, o bebê pode sentir uma grande aflição, devido à sensação de estar em
um estado não integrado, a sensação de não parar de cair e a perda do sentimento do real
(Winnicott, 1993).
Segundo Bleichmar (1994), quando a mãe investe em seu bebê narcisisticamente, através de atos
como acariciar o bebê, fixar o olhar em seus olhos durante a amamentação, acomodar sua
cabeça e pernas no colo, de maneira tranqüilizadora, proporciona-lhe derivações na maneira de
satisfazer uma pulsão. Pode-se dizer que o bebê adquire a representação totalizante através do
narcisismo egóico da mãe, que permite que a pulsão, intrusiva e atacante, encontre de início
formas de ligação por vias colaterais; este processo possibilita a constituição do ego, que então
inibe os processos primários e supõe a instalação do processo secundário. A criança adquire
capacidade de tolerância à frustração, pois tem o registro do princípio da realidade. Quando
ocorrem falhas nesse processo, o bebê fica exposto a uma dor constante, ficando apenas o
registro de prazer-desprazer, sem tolerância à postergação.
Em um entendimento lacaniano, a mãe sustenta para o seu bebê o lugar de Outro primordial.
Impelida pelo desejo, antecipará em seu bebê uma existência que ainda não está lá, mas que virá
a se instalar justamente porque foi suposta. Através do seu olhar, gestos e palavras, a mãe
desenha o mapa libidinal que recobre o corpo do bebê (Kupfer, 2000).
O Outro escreve as primeiras marcas no corpo do bebê, as quais serão os alicerces do seu
aparelho psíquico. O Outro, ou seja, o adulto encarregado de cuidar da criança, que geralmente é
a mãe, irá manipulá-lo de acordo com o que determinem os significantes de sua história e de
acordo com o lugar que esses significantes outorguem ao objeto que tem em suas mãos (Coriat,
1997).
A mãe sustenta para o seu bebê o lugar de Outro primordial. Impelida pelo desejo, antecipará em
seu bebê uma existência que ainda não está lá, mas que virá a se instalar justamente porque foi
suposta. Através do seu olhar, gestos e palavras, a mãe desenha o mapa libidinal que recobre o
corpo do bebê (Kupfer, 2000).
Ainda de acordo com a teoria lacaniana, quando a criança apresenta um sintoma, esse é o seu
modo de se inscrever no discurso familiar, e advém como um meio de protegê-la da alienação no
ideal dos pais, ao receber a mensagem deles de uma forma invertida, marcando a presença de
um sujeito desejante. O sintoma da criança, portanto, é uma defesa de um mínimo de
subjetividade contra a alienação nos ideais do outro. Em outro caso, quando isso não acontece, a
criança recebe a mensagem do Outro de uma forma absolutamente direta, causando a própria
anulação da sua subjetividade (Prestes, 2004).
Conforme Manonni (1999), a criança ocupa um lugar determinado no fantasma de cada um dos
pais. Enquanto sujeito, está alienada no desejo do Outro; portanto, a criança não pode ser isolada
artificialmente de um determinado contexto familiar. Quando tocamos no sintoma da criança,
possivelmente emergirá aquilo que servia para alimentar ou, ao contrário, para obturar a
ansiedade da mãe e/ou pai. Esta autora também estabelece que, ao mesmo tempo em que a mãe
tem a função de prover o bebê nas suas necessidades, ela se torna um agente de frustração. É na
ausência materna que se instaura a ordem simbólica, introduzindo, através da linguagem, uma
dimensão de novas possibilidades de relacionamentos para a criança. Assim, o dom materno
ultrapassa os cuidados básicos, e remetem aos investimentos maternos simbolizantes (Manonni,
1986).
É importante também ressaltar que o apoio emocional do marido à esposa durante o período da
gravidez contribui para uma melhor adaptação desta ao processo de gestação e parte, além de
auxiliá-la a desenvolver sua função materna mais adequadamente (Brazelton e Cramer, 1992).
Para Coppolillo (1990), o pai é um aliado de suma importância para os filhos durante a fase de
separação-individuação. A inclusão do pai na relação simbiótica entre mãe-filho é fundamental
para o desenvolvimento da autonomia da criança.
Assim, o amparo psíquico da figura materna para com seu bebê é de suma importância para a
constituição do eu, sendo a base principal para todos demais relacionamentos do bebê no mundo
externo. O sadio relacionamento mãe-bebê representa, desse modo, proteção e segurança para a
criança, contribuindo essencialmente para o desenvolvimento adequado do aparelho psíquico.
Referências Bibliográficas
Bleichmar, S. (1994). A fundação do inconsciente. Porto Alegre: Artmed.
Brazelton, T.B. & Cramer, B. (1992). As primeiras relações. São Paulo: Martins Fontes.
Coppolillo, H. (1990). Psicoterapia psicodinâmica de crianças. Porto Alegre: Artes Médicas.
Coriat, E. (1997). Psicanálise e clínica de bebês. Porto Alegre: Artes e Ofícios.
Gorayeb, R. (1985). Psicopatologia infantil. São Paulo: EPU.
Jerusalinsky, A.N. (1984). Psicanálise do autismo. Porto Alegre: Artes Médicas.
Klein, M. (1997). A psicanálise de crianças. Rio de Janeiro: Imago.
Kupfer, M. C.M. (2000). Notas sobre o diagnóstico diferencial da psicose e do autismo na infância.
Psicol. USP, 11(1), p.85-105.
Mannoni, M. (1986). De um impossível a outro. Rio de Janeiro: Zahar. Mannoni, M. (1999). A
criança, sua “doença” e os outros. São Paulo: Via Lettera Editora e Livraria.
Prestes, S. C. (2004). O sintoma da criança e o trabalho analítico com os pais.
In:http://www.escolalacaniana.com.br – Escola Lacaniana de Psicanálise do Rio de Janeiro
(acessado em 9 de novembro de 2006).
Winicott, D.W. (1978). Textos selecionados: da pediatria à Psicanálise. Rio de Janeiro: Francisco
Alves. Winicott, D.W. (1983). O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do
desenvolvimento emocional. Porto Alegre: Artmed.
Winicott, D.W. (1993). A família e o desenvolvimento individual. São Paulo: Martins Fontes.
Disponível em:
http://www.redepsi.com.br/2008/07/18/a-fun-o-materna-e-o-desenvolvimento-infantil/