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René Spitz sugeriu a necessidade de se estudar a criança diretamente, para seu

melhor entendimento, o que logicamente implicava no abandono de estudos que faziam


a extensão do desenvolvimento adulto. Para ele o recém-nascido não apresenta
atividade psíquica. A percepção dos afetos é global e só aos poucos o bebê aprende a
descriminar os vários afetos nos outros.

O nascimento torna a criança uma entidade física separada, e para tornar-se


psicológica e socialmente distinta é necessário algo mais além de tempo. As respostas
do bebê inicialmente são gerais. Não existe uma relação direta estímulo x resposta, e
qualquer parte de seu corpo pode responder. As respostas são ao acaso, não dirigidas.

O bebê não é comparável ao adulto. Sua fisiologia é diferente, bem como suas
sensações, suas reações físico-químicas, sua maneira de vivenciar no ambiente que o
cerca. (SPITZ, 1979). Ao recém-nascido faltam a percepção, a consciência e as demais
funções psicológicas. Apresenta dois estados diferentes percussores de afeto: quietude
e desprazer. Vamos analisar uma situação comum.

A secura da mucosa oral, particularmente sensível nesse momento, constitui um


dos principais rompimentos dessa quietude. As glândulas salivares, ainda pouco
desenvolvidas, não conseguem recompor a umidade natural oral que a criança se
acostumou no ambiente aquoso no qual ficou até seu nascimento.

 Fatores Determinantes
O ser humano nasce totalmente desamparado. Ele é incapaz de sobreviver por
si só, dependendo, pois, inteiramente de outra pessoa (SPITZ, 1960).

As trocas e interações com o outro levam às novas experiências e aquisição


de novas habilidades. Levam também ao estabelecimento de limites das próprias
capacidades, ajudando a criança a desenvolver seus próprios mecanismos de
defesa, iniciando-a em seu funcionamento enquanto ser social. A relação mãe-
filho encontra-se igualmente na raiz da linguagem e comunicação da criança.

Estágios do Desenvolvimento: Spitz descobriu que no processo de


estabelecimento das relações objetais a criança passa por três estágios: pré-objetal;
objeto precursor, objeto real. O bebê não somente aumenta ou diversifica suas
respostas, ele confere ao objeto um novo significado na medida do seu
desenvolvimento.

1º Estágio - Pré-Objetal Idade: até 3 meses: Inicia-se com o nascimento e termina


em torno do 3º mês. A interação da criança com o ambiente externo é fisiológica; não
existe vontade ou qualquer representação psíquica ou consciência. A criança não se
distingue do meio, ou seja, não existe um objeto. Ela recebe os estímulos externos, e
devido ao seu mecanismo de proteção interna, e nem os percebe. A única região que
opera nesse momento é a cavidade oral, a boca. Tanto servindo para alimentação,
necessidade fisiológica mais básica, quanto precursora dos futuros cinco sentidos:
olfato, paladar, visão, audição e tato. A cavidade oral funciona, assim, como um ponto
intermediário entre a percepção interna e externa.
A amamentação é um momento especial para o bebê, pois as experiências da pele,
mensagens ao ouvido unem-se à cavidade oral, transformando-o num imenso prazer
para mãe-filho.

O rosto humano estabelece-se, assim, como o primeiro sinal de memória do bebê,


pois é o que mais a criança vê em uma situação que mobiliza afeto. Nenhum outro
objeto é foco de atenção da criança neste período e/ou capaz de provocar a resposta
ao sorriso. As emoções primárias, fome, sede, prazer e desprazer, são precursores do
afeto. O sorriso surge apenas à figura humana, não acontecendo para objetos.

A criança que sorri mostra-se capaz de experimentar uma emoção positiva,


distingui-la e expressá-la. O sorriso aqui indica a maturidade emocional da criança – é
significativo dentro da evolução da criança e denota pura recepção. A ausência de
sorriso não se liga ao desenvolvimento, mas, sobretudo ao grau de envolvimento
emocional da criança.

Em algumas crianças hospitalizadas, Spitz não encontrou o sorriso. Pelo contrário,


elas, após observarem o adulto por alguns minutos, viram para o lado, tornando
impossível contato emocional. Nada parecia lhes interessar; comum em crianças
enclausuradas por muito tempo em camas de hospital, tratamentos longos e difíceis.

2º Estágio - Precursor do Objeto Idade: 3 aos 8 meses: O surgimento do tônus


muscular leva à sustentação da cabeça e do tronco, e posteriormente, a criança
consegue manter-se sentada e com capacidade de pegar e largar objetos
voluntariamente. O bebê de quatro meses pode ser visto tocando a boca, os dedos, até
mesmo junto com a mamadeira, observando seus dedos no momento de preensão. Em
torno do 6º mês, muitas vezes é visto tocando os próprios pés, interessando-se pelos
membros inferiores.

A relação com a mãe é especial, sendo que a criança mostra desconforto quando
abandonada pela mãe, o que ainda não acontece quando é privada de algum
brinquedo. Surge a reação de medo entre o 4º e 6º mês aproximadamente, dirigido a
um objeto, pessoa ou coisa, com a qual a criança teve uma experiência negativa.
É comum a criança chorar ao entrar em consultório médico, mais ainda no
consultório odontológico. Mas é passageira, basta que a criança veja a mãe para que a
angústia suma. Quando um estranho se aproxima, basta que ele se vire de costas para
que o medo da criança seja superado. No entanto, principalmente durante as consultas
médicas e odontológicas, quem deve entender primeiro essa questão do medo é a
mãe, que servirá de apoio e reforço positivo para a criança.

A manifestação de desconforto passa a ser através do choro, tampar o rosto e virar


a cabeça. As relações da criança tornam-se mais complexas, inicia-se a compreensão
de ordens, proibições, de gestos sociais como dar adeus e dar a mão.

As crianças e pais imitam-se alternadamente ou ao mesmo tempo. As imitações dos


pais são como exemplo: estalar a língua, bater palminhas, falar igual ao bebê. Isso
muito contribui para o desenvolvimento da criança. Os pais são os veículos
transmissores de cultura para a educação de seus filhos, sendo importantes as
imitações que aproximam do nível de entendimento da criança. A relação calorosa
interfere positivamente na tentativa da criança de ser como o modelo oferecido.

• 3º Estágio - Objeto Real Idade: 8 a 12 meses: Tem início quando a criança


prefere a mãe, apresentando sinais visíveis de ansiedade diante de um estranho.
Criança e mãe comunicam-se cada vez mais de forma direcionada e os gestos da mãe
passam a ter significado para a criança e vice-versa. O primeiro desse sinal é o
balançar de cabeça indicativa de “não”. A partir do 8º mês, mais ou menos, se a mãe
interrompe a atividade da criança dizendo “não” e balançando a cabeça, a criança para
a atividade evidenciando o entendimento do sinal.

A partir daí surge a linguagem na vida da criança. No início composta de palavras


incompletas, até aproximadamente 18 meses. Em regra, sua linguagem expressa suas
necessidades e representa um pedido de ajuda. Só mais tarde inicia-se a comunicação
com ajuda de símbolos verbais. Quando o bebê pronuncia “mamã”, isto pode significar
muitas coisas e até frases, como: “estou com fome”; “quero água”; “tire-me daqui”.

O gesto “não” interfere diretamente nas relações objetais, nas relações da criança
com o meio. Inicia-se a chamada fase da teimosia. A mãe que até então funcionava
como o ego externo da criança decidindo sobre os passeios, o local de ir, a
alimentação, o que pegar, vê-se obrigada a repreender e impedir uma série de
atividades. O acontecimento mais marcante dessa fase é que a criança agora sabe
usar o “não” para decidir sobre o quer e o que não quer.
O desenvolvimento precoce do bebê

René Spitz elaborou técnicas de observação direta de bebês (filmes e testes) em


estudos longitudinais usando métodos de psicologia experimental, pesquisas, estudos
em berçários e creches. Spitz enfatiza que a partir do segundo mês o bebê percebe de
modo mais diferenciado o rosto materno. Por volta do sexto mês acontece a integração
da memória, da imagem materna, com influência de um ego em evolução, o que
aumenta a ligação afetiva com a figura materna.

Organizadores Psíquicos do bebê segundo René Spitz

O primeiro organizador psíquico é a aparição do sorriso como base das relações


sociais, o que caracteriza uma reação de comportamento, uma comunicação da dupla
mãe-bebê. Desta relação surgem os primeiros processos de pensamento, as
experiências afetivas do bebê através dos traços mecânicos que fazem surgir os
primeiros processos de pensamento: prazer? sorrir / desprazer? chorar.

O segundo organizador psíquico é o aparecimento do medo de estranhos, o que


acontece em torno do oitavo mês. Percebe-se a primeira ansiedade propriamente dita.
A criança chora, reage e recusa ao contato com um estranho, estranha a face da
pessoa e sente-se privada do contato com a sua mãe.

O terceiro organizador psíquico é o início da comunicação verbal? a fala. É o domínio


do uso da palavra não pelo bebê. É o primeiro conceito abstrato adquirido. É a primeira
expressão simbólica.

o início dos anos trinta, quando René Spitz começou a sua pesquisa,
nos círculos acadêmicos pensava-se que as crianças eram incapazes de ter
depressão . Alguns psicólogos argumentavam que os sinais depressivos eram
clinicamente irrelevantes em crianças. Os psicanalistas, por outro lado, diziam que
as crianças não tinham a capacidade necessária para refletir e que, portanto, era
impossível ficarem deprimidas.
Apesar dessas crenças generalizadas, dois pesquisadores decidiram verificar
por si mesmos qual era a validade do que era afirmado. Esses dois
pesquisadores foram René Spitz, criador do conceito de depressão anaclítica,
e John Bowlby, que estudou em detalhes a relação entre mãe e filho  no início
da vida do bebê.
Spitz concluiu que as crianças, desde a mais tenra idade, também
ficavam deprimidas. Ele descobriu que esse estado incluía um quadro completo de
sintomas bem definidos e que a criança reagia com essa forma de depressão à
súbita separação de sua mãe ou aos vínculos de afeição por um período superior a
três meses.

Spitz observou que a depressão anaclítica ocorre em crianças menores de

um ano de idade. Ocorre quando o bebê desenvolve um vínculo com a mãe  e

sofre um afastamento repentino por um período de três meses. Se isso

acontecer, a criança começa a mostrar todo um conjunto de sintomas depressivos.

Os sintomas mais visíveis são os seguintes:

 O bebê perde a capacidade de se expressar através de seus


gestos. Basicamente, ele para de sorrir.
 Apresenta anorexia ou falta de apetite.
 Tem dificuldade para dormir. As horas de sono são reduzidas ou
alteradas.
 Perda de peso.
 Apresenta um atraso psicomotor global.

No caso de a privação emocional ser prolongada por um período superior a 18

semanas, todos os sintomas se agravam. A criança entra em um estado que Spitz

chamou de “hospitalismo”. O bebê se torna incapaz de estabelecer contatos

afetivos estáveis e a sua saúde se torna muito frágil. 

Para Sptiz a privação afetiva superior a 5 meses pode causar no bebê


• Sentimentos de progressiva deterioração, em parte irreversíveis;
• interrupção do desenvolvimento psicológico;
• predisposição à infecção;
• CONTINUIDADE DA PRIVAÇÃO poderá resultar em uma ALTA TAXA DE
MORTALIDADE.

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