Você está na página 1de 5

NOTA TÉCNICA Nº 07/2023

Cliente SINPOL/DF

Esclarecimentos acerca da possibilidade de


inclusão das verbas de natureza
Referência
indenizatória na base de cálculo da pensão
alimentícia.

Data Brasília, 09 de março de 2023.

1. Os alimentos podem ser conceituados como as prestações devidas para a

satisfação das necessidades pessoais daquele que não pode provê-las pelo

trabalho próprio, conforme lição dos juristas Orlando Gomes e Maria Helena

Diniz. É certo que o pagamento dos alimentos está amparado nos princípios da

dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar, ambos de índole

constitucional.

2. Nesse sentido, os alimentos devem compreender as necessidades vitais

da pessoa, cujo objetivo é a manutenção da sua dignidade: a alimentação, a

saúde, a moradia, o vestuário, o lazer, a educação, entre outros. Em resumo,

devem ser concebidos dentro da ideia de patrimônio mínimo e também

atendem à existência de pressupostos ou requisitos para o dever de prestar

alimentos, sobretudo o famoso trinômio alimentar

(necessidade/possibilidade/razoabilidade).

3. Após aferida a necessidade do alimentando, que consiste no ponto de

partida, analisa-se a possibilidade de contribuição do prestador de alimentos,

obedecendo, conforme o entendimento majoritário da doutrina e

SHIS QI 9 Conjunto 17 Casa 16, Lago Sul, Brasília www.machadogobbo.com.br


Distrito Federal – Brasil – CEP 71.625-170 tel.: +55 61 3321-0074
jurisprudência, a regra de que os alimentos devem ser fixados de acordo com os

valores efetivamente recebidos pelo alimentante.

4. À luz desse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu,

reiteradas vezes, que os alimentos incidem somente sobre verbas pagas em

caráter habitual, ou seja, aquelas incluídas permanentemente no salário do

empregado.

5. Acerca da possibilidade de incluir verbas de natureza indenizatória na

base de cálculo da pensão alimentícia, a exemplo da parcela denominada

participação nos lucros (PLR), as diárias de viagem e o tempo de espera

indenizado, que possuem caráter transitório, o STJ fixou entendimento sobre o

afastamento da incidência da pensão alimentícia sobre tais valores, senão

vejamos:

RECURSO ESPECIAL. ALIMENTOS. DIÁRIAS. VIAGEM. TEMPO DE


ESPERA. VERBAS INDENIZATÓRIAS. PENSÃO ALIMENTÍCIA. BASE
DE CÁLCULO. EXCLUSÃO. 1. Recurso especial interposto contra acórdão
publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados
Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Os alimentos incidem sobre verbas pagas
em caráter habitual, quais sejam, aquelas incluídas permanentemente no
salário do empregado. A verba alimentar incide, portanto, sobre
vencimentos, salários ou proventos auferidos pelo devedor no desempenho
de sua função ou de suas atividades empregatícias, decorrentes dos
rendimentos ordinários do devedor. 3. As parcelas denominadas diárias e
tempo de espera indenizado possuem natureza indenizatória, restando
excluídas do desconto para fins de pensão alimentícia, porquanto verbas
transitórias. 4. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1747540 SC
2018/0093953-7, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data
de Julgamento: 10/03/2020, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação:
DJe 13/03/2020). Grifo nosso.

2
6. O voto do relator, citando Maria Berenice Dias e sua lição doutrinária,

expõe que “as ajudas de custo e as despesas de viagem, auxílio-moradia e de

transferência (...) não compõem a base de cálculo dos alimentos" já que "ditas

gratificações não possuem natureza remuneratória, mas sim indenizatória”

(Maria Berenice Dias, Manual de Direito das Famílias, 9ª Edição, Revistas dos

Tribunais, p. 593).

7. Assim sendo, em atenção ao entendimento quase uníssono da

jurisprudência e doutrina, as verbas indenizatórias não integram a base de

cálculo dos alimentos.

8. No caso dos Policiais Civis do DF, é recorrente a dúvida sobre a

incidência ou não do desconto dos alimentos sobre o “Serviço Voluntário

Gratificado”.

9. Essa parcela, no entanto, consiste em indenização pela prestação de

serviços voluntários, que, segundo a Portaria nº 44 de 29 de abril de 2020, é

verba com natureza indenizatória, não se confundindo com horas extras.

Art. 5º A jornada ordinária do SVG será de 8 (oito) horas de turno ou escala


de trabalho.

§ 1º A jornada de que trata o caput pode ser fracionada até o mínimo de 6


(seis) horas ou acrescida até o máximo de 24 (vinte e quatro) horas, no
interesse da Administração.

§ 2º A fração de hora trabalhada igual ou superior a 30 (trinta) minutos é


computada como sendo de 1 (uma) hora.

§ 3º Nos termos da Lei nº 6.261, de 29 de janeiro de 2019, o valor da


indenização devida ao policial civil pelo serviço voluntário é de R$ 400,00
(quatrocentos reais), por 8 (oito) horas de turno ou escala de trabalho,

3
observada a proporcionalidade do valor da indenização na hipótese de
jornada maior ou menor de trabalho, conforme o caso.

§ 4º O limite mensal de SVG, por servidor, será de até 48 (quarenta e oito


horas), podendo excepcionalmente e a critério da Administração, atingir o
total de 60 (sessenta) horas mensais.

10. Inclusive porque, legalmente, os funcionários da Polícia Civil não

fazem jus ao recebimento de horas extras, na forma da Lei nº 11.361/06,

comprovado pelo precedente a seguir:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE


ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. AÇÃO DE CONHECIMENTO.
POLICIAIS CIVIS. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DO TEMPO EM QUE O
POLICIAL CIVIL FICA À DISPOSIÇÃO DO ÓRGÃO PARA A REALIZAÇÃO
DE CURSO DE TREINAMENTO BÁSICO DE TÉCNICAS POLICIAIS COMO
EFETIVA JORNADA DE TRABALHO. INAPLICABILIDADE DA LEI 8.112/90.
REGIME DE DEDICAÇÃO INTEGRAL. LEI FEDERAL nº 4.878/65. RECURSO
PROVIDO. 1. Agravo de instrumento com pedido de atribuição de efeito
suspensivo interposto contra decisão que deferiu a tutela de urgência para
determinar ao Distrito Federal que realize a devida adequação da Carga
Horária de trabalho dos servidores públicos, levando em consideração o
período de realização do curso de treinamento básico de técnicas policiais,
instituído pelo Projeto nº 08/2019-ESPC, no prazo de 5 (cinco) dias. 2. Rege os
Policiais Civis do Distrito Federal, a Lei Federal nº 4.878 de setembro de 1965,
que dispõe sobre o regime jurídico peculiar dos funcionários policiais civis da
União e do Distrito Federal, que prevê que os servidores policiais, em regime de
dedicação integral, devem cumprir, no mínimo, a carga de 200 (duzentas) horas
mensais de trabalho (art. 24). 3. Aos Policiais Civis do DF não se aplica a Lei
8.112/90, consoante estabelece o § 2º, do art. 19, da citada Lei, que excetua sua
aplicação aos casos em que a jornada de trabalho é regulamentada por
legislação especial. 4. A legislação infraconstitucional estabelece regime próprio
de cumprimento de jornada aos policiais civis, em razão da natureza do serviço
e das peculiaridades da função desenvolvida. 5. A finalidade do curso a que
estão submetidos os policiais civis é de aperfeiçoamento, a fim de propiciar um
bom desempenho da função. 5.1. Os cursos fornecidos pelo órgão, além de
propiciarem vantagens à sociedade, trazem benefícios para os servidores
(policiais civis), propiciando um maior nível de qualificação no desempenho de

4
suas atribuições de forma mais eficiente. 6. O regime especial de trabalho
dessa categoria afasta a incidência da limitação de jornada de trabalho
semanal de quarenta horas prevista na Lei 8.112/90, aplicando-se apenas as
limitações mensais de 200 (duzentas) horas estabelecidas na Lei Federal nº
4.878/65. 6.1. Até mesmo o cumprimento do regime de plantões e escalas
desempenhadas pelos integrantes das carreiras policiais são compatíveis com
a natureza do serviço, não sendo devidos pagamentos de horas extras aos
autores por limitação semanal da jornada de trabalho, desde que respeitada o
patamar de 200 (duzentas) horas mensais. 7. Dessa forma, incabível o
reconhecimento como efetiva hora de trabalho, do período em que o policial
civil fica à disposição do Órgão para a realização de Curso de Treinamento
Básico de Técnicas Policiais, instituído pelo Projeto nº 08/2019-ESPC,
impondo-se, portanto, a reforma da decisão agravada. 8. Recurso
provido.(TJ-DF 07127549720198070000 DF 0712754-97.2019.8.07.0000, Relator:
JOÃO EGMONT, Data de Julgamento: 11/09/2019, 2ª Turma Cível, Data de
Publicação: Publicado no DJE : 23/09/2019 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

11. Diante disso, em se tratando de verbas de natureza indenizatória, os

descontos para pagamento de pensão alimentícia não devem incidir sobre a

parcela denominada “Serviço Voluntário Gratificado”, a não ser que haja

determinação judicial expressa nesse sentido.

12. Sendo estas considerações, a equipe jurídica permanece à disposição dos

filiados e do SINPOL/DF para prestar outros esclarecimentos que se façam

necessários.

É o parecer.

Você também pode gostar