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Vieira refere, então, um exemplo bíblico que ilustra a triste sorte dos pegadores: a
familia de Herodes, que perseguiu a Sagrada Familia e que soçobrou com o seu
patriarca. Mas os pegadores não são apenas exemplo das más práticas, pois "Deus
também tem os Seus pegadores", aqueles que espalham a palavra divina: David seguiu
Deus, Santo Cristo e ambos foram bem-sucedidos.
O conselho que Vieira deixa aos pegadores é o de que se despeguem dos seus
hospedeiros, para não pagarem pelos pecados que eles cometeram: "Que morra o
tubarão porque comeu, matou-o a sua gula; mas que morra o pegador pelo que não
comeu, é a maior desgraça que se pode imaginar!"
Vieira centra, a seguir, a sua atenção nos voadores, representação dos ambiciosos.
Estes animais criados por Deus para serem peixes, como têm umas barbatanas maiores
do que a generalidade dos peixes, querem imitar as aves.
Esta ambição de se quererem transformar naquilo que verdadeiramente não são só lhes
traz sofrimento ("mata-vos a vossa presunção e o vosso capricho"), porque estão
sujeitos aos perigos do mar e aos perigos do ar: no mar morrem enganados pelo isco e
no ar morrem porque as velas as cordas e os laços dos barcos transformam-se em redes,
apanhando-os.
O conselho do pregador é o de que os homens se devem contentar com aquilo que são,
porque "Quem quer mais do que lhe convém, perde o que quer e o que tem."
Como é recorrente neste sermão, Vieira refere Santo António como exemplo de alguém
que sempre se demarcou da ambição, porque reconhecia que as asas que fazem subir
também fazem descer, o que pode precipitar a destruição. Santo António preferiu, pois,
remeter-se à sua humildade: "Não estendeu as asas para subir, encolheu-as para
descer." Tal como Santo António, também os voadores deverão, humildemente,
recolher-se às covas do mar, onde não estarão expostos à insegurança e à morte
prematura.
A última criatura marinha a ser criticada é o polvo, símbolo dos falsos, hipócritas e
traidores.
Na verdade, o polvo parece um monge "com aquele seu capelo na cabeça" e uma
estrela "com aqueles seus raios estendidos", simula brandura e mansidão por "não ter
osso nem espinha", contudo, debaixo desta aparência, o polvo é, segundo S. Basílio e
Santo Ambrósio, “o maior traidor do mar".
Com efeito, ao dissimular-se, tomando a cor daquilo que o rodeia, o polvo engana as
suas incautas vítimas com malícia e mentira, caçando-as mais facilmente. A traição é de
tal forma hedionda que Vieira afirma que o polvo é pior que Judas, o paradigma do
traidor no Evangelho, porque o apóstolo planeou a entrega de Cristo às escuras, mas
executou a traição às claras, enquanto o polvo, escurecendo a água com a sua tinta,
rouba a luz à sua presa para a apanhar. As palavras finais do pregador são violentas:
"Vê, peixe aleivoso e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparação já é
menos traidor!"
O capítulo termina com uma critica feroz aos portugueses. Partindo uma vez mais, do
exemplo de Santo António - "o mais puro exemplar da candura, da sinceridade e da
verdade, onde nunca houve dolo, fingimento ou engano"- Vieira refere a
degenerescência dos valores nacionais, uma vez que, no passado, as características
exemplares de Santo António eram extensivas a todo o povo português, não sendo, por
isso, atributos dos santos - "bastava antigamente ser português, não era necessário ser
santo."
Finalmente, o pregador, de forma irónica, sublinha que tudo o que pregou até então
seria o ideal para a conduta dos homens, se ele não tivesse estado a pregar aos
peixes não tendo, por isso, o seu sermão qualquer efeito sobre os homens: "Oh, que
boa doutrina era esta para a terra, se eu nāo pregara para o mar!"
Os Lusíadas
O Canto V é preenchido pela narrativa da viagem da armada de Vasco da Gama de
Lisboa a Melinde, sendo denominado como o "canto maritimo". Vasco da Gama conta,
então, ao rei de Melinde episódios como:
o cruzeiro do Sul
o fogo de Santelmo
a tromba marítima
o escorbuto
Após Vasco da Gama terminar a sua narrativa ao rei de Melinde, o poeta encerra o
canto com uma invetiva contra os portugueses seus contemporâneos pelo desprezo
demonstrado pelas Letras, particularmente pela poesia: "E não se ver prezado o verso e
rima, / Porque quem não sabe arte, não na estima." [est. 97].
No Canto VIII mais uma vez, o poeta dá a voz a outro narrador: Paulo da Gama. Este
navegador relatará ao Catual alguns episódios da História de Portugal, destacando, a
coragem de alguns heróis míticos elou verdadeiros: Ulisses, Viriato, Sertório o Conde
D. Henrique, Egas Moniz, Dom Fuas Roupinho, Nuno Alvares Pereira os infantes D.
Pedro e D. Henrique, entre outros. Baco, que continua a sua cruzada contra os
portugueses, aparece em sonhos a um sacerdote brâmane, indispondo-o contra os nautas
lusos na segundo o deus, apenas vinham com o intuito de saquear e pilhar. Vasco da
Gama, interrogado pelo Samorim, que fora advertido pelo sacerdote das "más intenções
do navegador, procura esclarecer a situação e chegar a um entendimento, que passará
pela troca de fazendas europeias por especiarias orientais No entanto, o Catual opõe-se
a esta decisão e prende o capitão, impedindo de regressar à armada. Vasco da Gama só
conseguirá a liberdade após subornar o Catual, que, a troco de fazendas europeias, o
deixa regressar a bordo. Lamentações do poeta acerca do vil poder do "metal luzente e
louro" enceram o canto.