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A CATEGORIA TRABALHO NOS CLÁSSICOS DA

SOCIOLOGIA

Bases Conceituais da Educação Profissional e Tecnológica


ProfEPT – IFRS – 2023

Profa. Lucília Machado


POR QUE LER OS CLÁSSICOS?

- Incentivam-nos à produção do
conhecimento;
- Contribuem para nossa formação QUEM SÃO OS AUTORES CLÁSSICOS?
intelectual integral. • São os autores fundadores ou consagrados à
- Ajudam-nos a aprofundar nossas
constituição de campos de estudos.
reflexões sobre a realidade.
• São alicerces sobre os quais as discordâncias científicas
são promovidas e sustentadas.
COMO LER UM CLÁSSICO? • Nunca terminaram de dizer aquilo que tinham para
dizer.
• Apreender bem os conceitos.
• Trazem as marcas do tempo em que escreveram.
• Por exemplo, trabalho produtivo. • Deixaram traços na nossa cultura e na linguagem que
Para Marx, é o trabalho que leva à utilizamos.
produção de mais-valia. Porém, esse
não é o sentido dado pelo • São apreciados também por quem tem perspectivas
pensamento liberal nem pelo senso opostas de ideias.
comum.
• Entendê-los no contexto histórico
em que viveram e com quem
estavam dialogando.
OS CLÁSSICOS DA SOCIOLOGIA
A CATEGORIA TRABALHO EM ÉMILE DURKHEIM

PRINCIPAIS OBRAS:
• Da divisão do trabalho social (1893)
• Regras do método sociológico (1895)
• O suicídio (1897)
• A educação moral (1902)
• Sociedade e trabalho (1907)
• As formas elementares de vida religiosa (1912)
• Lições de Sociologia (1912)
O CONTEXTO À ÉPOCA DE DURKHEIM:
• Nascimento: 1858. Morte: 1917.
• Aumento populacional, êxodo rural, condições precárias de trabalho, avanço do
sindicalismo e das ideias de Marx e Engels junto ao proletariado.
• Segunda Revolução Industrial: motor de combustão interna, dínamo, eletricidade,
telégrafo, petróleo, aço, cinema, aviação, submarino, lâmpada incandescente,
vacinas.
• Grande progresso das ciências, surgimento do fordismo, novas formas de pensar
e viver.
• Consolidação dos estados nacionais unificados.
• Muitos conflitos com destaque para a Comuna de Paris (1870-71), a eclosão da
Primeira Grande Guerra e a expansão do imperialismo.
A QUESTÃO QUE ASSOMBRAVA DURKHEIM:

• A construção da coesão da sociedade num mundo de individualismo progressivo.


• Para Durkheim, ela pode ser autêntica mesmo no contexto das sociedades
escravagistas, feudais ou de castas, independentemente dos processos de
dominação.
COMO CONSEGUIR A COESÃO SOCIAL?

• Segundo Durkheim, pela imposição de regras morais para criar uma relação entre
os indivíduos para além de seu ego, de seus próprios interesses.

• Em Durkheim, o indivíduo é dominado pelo social. O social se impõe ao


indivíduo e conduz as ações.
DIVISÃO DO TRABALHO COMO FUNDAMENTO DAS NORMAS:

• A divisão do trabalho é necessária à evolução da ordem social por definir o lugar


dos indivíduos no funcionamento da sociedade.
• Ela está dentro da evolução da ordem moral e na base do sistema jurídico.
• A divisão do trabalho seria a fonte da solidariedade social.
• Mas, não a divisão do trabalho guiada pela competição ou interesse pessoal.
• As especializações de cada um permitiriam aos indivíduos viver em harmonia
porque criaria um elo essencial entre eles, a complementaridade.
A ANOMIA:

• Trata-se da ausência de normas ou sua desintegração, da falta de valores morais


para orientar o comportamento.
• Leva à desordem, à desarmonia, à separação entre economia e moralidade.
• Trabalhadores sem nenhum tipo de contrato ou legalidade que os ampare.
• Afrouxamento das convicções morais e dos controles.
DE ONDE VEM A ANOMIA:

• Do enfraquecimento dos laços de cooperação na produção social, da não inserção


nas redes de sociabilidade profissional ou familiar, da não participação da vida
econômica ou da relação salarial, da não vinculação às trocas mercantis.
• Da ampliação da vulnerabilidade social e do desemprego.
DURKHEIM FRENTE AO MUNDO DO TRABALHO DE HOJE:

• Desemprego crescente.
• Aprofundamento da lacuna salarial.
• Expansão da informalidade.
• Diferentes formas de instabilidade.
• Negação de direitos às mulheres e aos grupos marcados pela diferença racial,
étnica e cultural.
• Ambiguidades na relação entre méritos e recompensas.
• Falta de regras claras do jogo.
• Inexistência de reciprocidade em matéria de direitos e compromissos.
O QUE VERIA DURKHEIM NA ATUALIDADE:

• O crescimento da perda da solidariedade social, do desemprego, da exclusão


social, da precariedade, da falta de seguridade social e das incertezas quanto ao
futuro.
• A solidariedade orgânica, fundada nas diferenciações sociais e nas
especializações, não se confirmou, não trazendo às sociedades modernas o
funcionamento harmonioso da sociedade.
• Formas de solidariedade mecânica têm sido reforçadas: movimentos
comunitários, feministas, ecologistas, religiosos.
AUSÊNCIAS NO QUADRO DE ANÁLISE DE DURKHEIM:
• Quem fabrica e de que modo se cimentam e difundem ideias, signos e símbolos
inerentes às normas sociais.
• As contradições de classes, étnicas, de gênero.
• As desigualdades sociais estruturais.
• Os mecanismos que fazem as classes dominadas serem conformistas.
• O papel mistificador e legitimador das religiões e igrejas.
• As visões diferenciadas dos diversos grupos sociais.
• Os laços de solidariedade inerentes a cada classe social.
• A perspectiva histórica.
A CATEGORIA TRABALHO EM MARX WEBER:

PRINCIPAIS OBRAS:

• A ética protestante e o espírito do capitalismo (1905)


• A ciência como vocação (1917)

• A política como vocação (1919)


• Economia e Sociedade (1920)

• Racionalização do mundo social.

• Teoria da dominação.
CONTEXTO:

• Nasceu em 1864 e faleceu em 1920.


• Família protestante de industriais, altos funcionários e acadêmicos.
• Conflitos e conflagrações entre nações.
• Dedicou-se às atividades intelectuais e às viagens, notadamente aos Estados
Unidos, onde conheceu as seitas protestantes (1904).
A SOCIOLOGIA DE MAX WEBER:

• Procurou compreender os motivos que levam o indivíduo a agir. (Por exemplo, a


trabalhar, a salvar alguém etc.).
• Defendia que as ciências culturais não podem repetir experimentos idênticos em
laboratórios e derivar deles leis estatísticas imutáveis.
• Deu origem à corrente chamada “individualismo metodológico”.
• Para essa corrente, um fenômeno social é o resultado da agregação de
comportamentos individuais, ditado por motivações individuais.
O QUE ELE MAIS PESQUISOU?

• O fenômeno da racionalização, a partir do qual ele definiu formas de ação


humana.
• A racionalidade em relação aos fins: descreve a ação movida pela escolha dos
meios adequados aos objetivos perseguidos. Ex: o empresário.
• A racionalidade em relação aos valores: a ação não visa um resultado concreto,
mas está de acordo com os ideais de quem age. Ex: o homem-bomba.
FORMAS DE AÇÃO NÃO RACIONAIS PARA WEBER:

• As ações afetivas que correspondem a reações instintivas.

• As ações tradicionais que são guiadas pelo costume ou uma crença de longa data.
COMO VIA A SOCIEDADE MODERNA:

• As mentalidades tradicionais teriam dado lugar à ciência e essa desencantou o


mundo, tirou-lhe o véu do engano, das ilusões.
• O pensamento mágico, mítico ou religioso declina em favor de formas
racionalistas de pensamento ou científicas.
• A racionalização das relações sociais impõe a universalização das regras do
Direito, a despersonalização no sentido de se ver nos outros menos o ser do que a
sua função e a autonomização do indivíduo com respeito à religião e à tradição.
SEU OLHAR PARA O TRABALHO:

• Busca responder: como é que o trabalho de desprezível até então passa a


referência por excelência de conduta moral?
• Sua tese: o evento responsável é a Reforma Protestante, que teria propagado uma
nova ética levando ao desenvolvimento do espírito do capitalismo.
• Iniciada por Lutero (1483-1546) no início do século 16 na Alemanha, o
protestantismo foi desenvolvido na França por Calvino (1509-1654) e se
expandiu pelo mundo.
O QUE DIZ A ÉTICA PROTESTANTE?

• Que Deus predestinou a todos a salvação ou a condenação.


• Que os homens não tem acesso aos sinais dessa predestinação.
• Mas que, apesar da incerteza de sua salvação, eles devem se esforçar para consegui-la.
• Como? Vivendo uma vida virtuosa e dedicada ao trabalho.
• Cada um deve se ocupar da tarefa recebida de Deus, a sua profissão.
• Fazendo isso estaria também louvando a Deus.
• As coisas terrenas, especialmente o prazer, pertencem à ordem do pecado.
• O caminho correto seria a vida austera sem consumo desnecessário voltado para o
trabalho (ascetismo), moral rigorosa e a condenação da futilidade (puritanismo).
WEBER: ESSA ÉTICA ESTÁ NA ORIGEM DO CAPITALISMO.

• Ela privilegia a organização racional do trabalho e da produção, favorece o


espírito empreendedor, a busca pelo lucro e a acumulação de capital.
• Com o incentivo para trabalhar, a produtividade é aumentada.
• Com o ascetismo, desacelera-se o consumo, promove-se economias que
conduzem ao acúmulo de capital.
• Ou seja, o trabalho guiado por um racionalismo em relação a fins.
O QUE É O CAPITALISMO PARA WEBER:

• É a concretização da racionalização das atividades sociais, própria da passagem


das sociedades tradicionais às modernas.
• É a organização metódica dos fatores de produção, baseada em contabilidade
rigorosa.
• É essa racionalização do trabalho que permite ao empresário reduzir seus preços.
• Países ou regiões marcados pelo protestantismo teriam, segundo Weber, saído na
frente no desenvolvimento do capitalismo.
ATUALIDADE E LIMITES DA TESE DE WEBER SOBRE A
RACIONALIZAÇÃO DA SOCIEDADE:

• A ciência e a tecnologia não eliminaram completamente a magia em favor da


racionalidade (a popularidade dos jogos de azar ou a consulta de horóscopos
testemunham isso).
• Agir racionalmente não implica necessariamente escolher os meios certos, nem
alcançar os fins.
• No próprio trabalho científico e no imaginário, é uma motivação poderosa que está
muitas vezes na origem das grandes descobertas.
• As pessoas agem em situação de incerteza e não possuem todas as informações
necessárias, não podem, portanto, avaliar todas as consequências de suas decisões.
• Os indivíduos calculam as vantagens e desvantagens da mobilização de seus
recursos.
A CATEGORIA TRABALHO EM KARL MARX
O TRABALHO NA PRODUÇÃO TEÓRICA DE MARX:

• Lugar central em toda ela e precisa ser entendido no âmbito da sua análise do
capitalismo e do seu papel determinante nesse sistema.
• Foi por ele ressaltado como:
o Manifestação do metabolismo entre o homem e a natureza;
o Manifestação ontológica do homem de se fazer no mundo criativamente;
o Ato de transformação social frente a condição de exploração e pauperização;
o Constitutivo da condição e da forma da classe trabalhadora;
o Potência de emancipação;
o Seu caráter enigmático e fetichista de ocultamento das relações sociais;
o Perspectiva para a compreensão do seu método materialista histórico dialético.
A DEFINIÇÃO DE TRABALHO EM MARX:

• Não pode ser encontrada de forma literal e categórica.


• Nos Manuscritos Econômico-Filosóficos (1844) e na Ideologia Alemã (1845-
1846), o trabalho aparece como manifestação subjetiva que, no processo da
objetivação – produção – torna-se alienante.
• Na Miséria da Filosofia (1847), nos Grundrisse (1857-1858) e n’O Capital
(1867), assume caráter materialista e o motivo condutor da transformação social.
QUEM SÃO OS INTERLOCUTORES DE MARX NESSAS
ANÁLISES:

• Na Ideologia Alemã, Marx dialoga criticamente com Hegel e Feuerbach,


utilizando-se da filosofia como ferramenta de análise.

• N’O Capital, utiliza a crítica à economia política e dialoga com ideólogos desse
campo (William Petty, Adam Smith, David Ricardo e Jean Sismondi, dentre
outros).
CONTEXTO HISTÓRICO:

• Marx viveu e acompanhou o auge da Segunda Revolução Industrial, época em que


o modo produtivo capitalista adquire musculatura.
PRIMEIRO CONCEITO FUNDAMENTAL –
A PRODUÇÃO DO MAIS-VALOR:
• Mais-valor caracteriza a essência do modo de produção capitalista: é o valor que o trabalhador cria
além do valor de sua força de trabalho, que não lhe é restituído ao trabalhador, que é apropriado
pelo capitalista.
• É o que dá origem ao capital. Na produção do mais-valor está a essência da exploração da força de
trabalho pelo capital.
• Mais-valor absoluto: quando é produzido pelo prolongamento ou intensificação da jornada de
trabalho.
• Mais-valor relativo: é produzido mediante a aplicação da ciência e da técnica e do crescimento da
produtividade.
• O mais-valor não provém da circulação das mercadorias. O mais-valor provém do processo de
produção.
• É a mercadoria força de trabalho, comprada por seu valor de uso, que agrega valor na produção e
transfere esse valor para a mercadoria.
• A taxa de mais-valor tende a se elevar com o desenvolvimento do capitalismo por conta da
intensificação do trabalho, seja por meio da produção do mais-valor absoluto ou do mais-valor
relativo.
SEGUNDO CONCEITO FUNDAMENTAL:
TRABALHO HETERÔNOMO

• Heteronomia = contrário de autonomia.


• Ocorre com a passagem da subsunção formal (parcial) para a subsunção real
(total) do trabalhador.
• Na cooperação simples, o artesão está sob o comando do capital, mas esse ainda
não modificou seu processo de trabalho.
• Na manufatura, se desqualifica, passa a ser um trabalhador parcial de um
processo parcelado.
• Na grande indústria, ele passa a ser um mero apêndice da maquinaria, completa a
subsunção real do trabalhador ao capital.
TERCEIRO CONCEITO FUNDAMENTAL:
FETICHISMO

• Refere-se à legitimação do capitalismo como ordem natural e eterna, à ocultação


da essência de suas contradições e ao mascaramento do trabalho na produção da
riqueza.
• O capital assume autodeterminação como se ele mesmo engendrasse a produção
de valor.
• Para Marx, a totalidade do sistema capitalista é manifestação do fetiche: a
mercadoria assume vida própria, o dinheiro esconde a sua real origem, o lucro é
considerado como resultado do rendimento do capital, a renda do solo seria um
presente da natureza.
A ATUALIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES DE MARX
• A compreensão:
• De que é a existência social que determina a consciência, e não o inverso.
• Da contradição entre o desenvolvimento das forças produtivas e as relações de
produção.
• Da contradição entre o caráter social da produção e a apropriação privada dos meios
de produção e dos lucros.
• Foi o primeiro a dissecar as entranhas do sistema capitalista e revelar os seus mecanismos
de funcionamento e exploração.
• Continua a ser fundamental para se compreender a sociedade em que vivemos.
• Permanece de grande validade sua metodologia de análise social: a dialética e o
materialismo histórico.
• Forneceu arsenal teórico para a organização dos trabalhadores.
• Segundo ele, “O trabalho de pele branca não pode se emancipar onde o trabalho de pele
negra é marcado a ferro.” (O Capital, Livro I, Boitempo, 2004, p. 372).
O PRINCIPAL ENSINAMENTO DE MARX:

• É preciso conhecer e interpretar o que a evolução das forças produtivas está


alterando com:
• A atual ofensiva do capital frente ao trabalho, o neoliberalismo.
• A alteração das normas: contrato de trabalho, remuneração e jornada de
trabalho.
• O crescimento da ideologia do empreendedorismo: a uberização do trabalho
vai se tornando a nova lógica em que a regra é a ausência de regras.
• A degradação da realidade do trabalho que se aproxima à da época em que
viveu.
• Os impactos destrutivos do capitalismo junto ao meio ambiente.
TRABALHO EM MARX, DURKHEIM E WEBER
DIFERENÇAS:
• São significativas.
• Diferem a forma de abordagem, as perguntas que se fazem e o método que utilizam.
• Em Marx, o trabalho é lugar das contradições; em Durkheim, da normatividade e, Weber,
da racionalidade.
• Em Marx, o trabalho é impregnado da dialética (exploração x emancipação); em
Durkheim, possibilita a solidariedade e a coesão social; em Weber, oferece as bases para
a legitimação do capitalismo.
• Em Durkheim, a causa da funcionalidade da sociedade encontra-se na moral produzida
pela divisão do trabalho social; em Weber, essa causa encontra-se nas ações individuais
das pessoas que, pelo trabalho, normatizam o capitalismo.
• Weber critica o capitalismo e sua racionalidade disciplinadora e de embotamento da
conduta humana pelo trabalho; mas Marx quer saber porque esse sistema produz
contradições irreconciliáveis.
• Para Durkheim, os conflitos sociais são anormais; para Marx, são inerentes à sociedade e
produzem a história; em Weber, a vida racional-burocrática entorpece e restringe a
liberdade humana.
PONTOS EM COMUM:

• A importância da categoria trabalho.

• O uso dessa categoria para analisar e interpretar o capitalismo e sua expansão.

• Contribuições que enriquecem o debate sobre o trabalho e seu devir na sociedade.


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