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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..................................................................................... 3

2 SAÚDE MENTAL ................................................................................. 4

3 SAÚDE MENTAL EM GESTANTES .................................................. 26

4 SAÚDE MENTAL DE ADOLESCENTES NA GRAVIDEZ .................. 35

5 SAÚDE MENTAL DE GESTANTES QUE CONVIVEM COM DOENÇAS


CRÔNICAS .............................................................................................. 39

6 TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS NA GESTAÇÃO E NO


PUERPÉRIO ............................................................................................ 42

6.3 Principais Fatores de Risco ............................................................ 45

6.4 Etiologia .......................................................................................... 46

6.5 Transtorno obsessivo-compulsivo – TOC ....................................... 46

6.6 Transtorno do pânico ...................................................................... 47

6.7 Transtornos puerperais ................................................................... 48

6.8 Mulheres com depressão pós-parto................................................ 51

6.9 Importância do diagnóstico e do tratamento precoce ..................... 52

6.10 Opções de tratamento .................................................................. 54

6.11 Utilização de psicofármacos durante a amamentação .................. 54

6.12 Tratamento hormonal .................................................................... 55

6.13 Psicoterapia .................................................................................. 56

7 BIBLIOGRAFIA ..................................................................................... 59
1 INTRODUÇÃO

Prezado aluno!

O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante


ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um
aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é
que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as
perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão
respondidas em tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da
nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à
execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da
semana e a hora que lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.

Bons estudos!
2 SAÚDE MENTAL

Saúde e saúde mental têm conceitos difíceis que foram historicamente


influenciados por contextos sócio-políticos e pelo desenvolvimento de práticas em
saúde. Nos últimos dois séculos, a ascensão do discurso hegemônico definiu esses
termos como específicos ao campo da medicina. No entanto, com a consolidação
da atenção multidisciplinar, o conhecimento em diferentes áreas foi gradualmente
incorporado a esses conceitos (ROCHA, DAVID 2015; HUNTER et al. 2013 apud
GAINO, 2018)

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Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS):A saúde é um estado de


completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de
doença ou de enfermidade. A definição começou em 1946 e é inovadora e
ambiciosa, porque não fornece conceitos inadequados de saúde, mas amplia o
conceito para incluir aspectos físicos, mentais e sociais (HUNTER et al. 2013;
ALMEIDA-FILHO, 2011; FRENK, GÓMEZ-DANTÉS, 2014 apud GAINO, 2018).
Apesar das intenções positivas predefinidas, ela foi fortemente criticada
durante seus 60 anos de existência isto se deve, em particular, ao fato de ser
proposto um significado irreal, no qual as restrições humanas e ambientais tornarão
impossível alcançar a condição de "completo bem-estar" impossível de alcançar
HUNTER et al. 2013; GÓMEZ-DANTÉS, 2014 apud GAINO, 2018).
Devido às críticas ao conceito da OMS e à adição de vários eventos políticos
e econômicos, houve uma discussão sobre o novo paradigma: saúde é produção
social. Essa nova visão é a combinação de medicina preventiva e métodos
abrangentes de assistência médica, a expansão dos conceitos de educação em
saúde e a rejeição de métodos higienistas (BIENTZLE et al. 2018; OMS/WHO, 1946;
KIND, FERREIRA-NETO, 2013 apud GAINO, 2018).
Seguindo a proposta de reforma do sistema de saúde do Brasil, o conceito
de saúde foi formalmente revisitado e influenciado pela experiência internacional
envolvendo políticas de saúde, conforme descrito na 8ª Conferência Nacional de
Saúde, em 1986. Naquela época, sugeriu-se que a saúde deveria incluir fatores
como dieta, educação, trabalho, status de moradia, renda e acesso a serviços de
saúde (ROCHA, DAVID, 2015; FERTONANI, 2015 apud GAINO, 2018).
Como resultado, considerando os princípios de universalidade, integralidade
e equidade na assistência à saúde, as pessoas passaram a entender o conceito de
saúde no Brasil de maneira mais complexa. No entanto, esses princípios coexistem
com métodos claramente relacionados à visão antiga (FERTONANI, 2015 apud
GAINO, 2018).
A palavra ‘bem-estar’, na definição da OMS é Um componente do conceito
de saúde e também de saúde mental, é compreendido como um constructo de
natureza subjetiva, intensamente influenciado pela cultura.A OMS define saúde
mental como: m estado de bem-estar no qual um indivíduo percebe suas próprias
habilidades, pode lidar com os estresses cotidianos, pode trabalhar produtivamente
e é capaz de contribuir para sua comunidade (WORLD HEALTH ORGANIZATION,
2014 apud GAINO, 2018).
A definição de saúde mental é objeto de vários tipos de conhecimento, mas,
prevalece um discurso psiquiátrico que a compreende como contrária à loucura, o
que indica que as pessoas com doença mental não podem ter nenhum grau de
saúde mental, felicidade ou qualidade de vida, por exemplo, como se suas crises
ou sintomas fossem ininterruptos (AMARANTE, 2013; FOUCAULT, 2012 apud
GAINO, 2018).
Na década de 1960, o psiquiatra italiano Franco Basaglia sugeriu uma
reafirmação do conceito de loucura, modificando o foco da doença e ampliando as
questões de cidadania e inclusão social. Essa ideia ganhou o apoio de apoiadores
e desencadeou um movimento que afetou o conceito de saúde mental no país e
levou à reforma da psiquiatria no Brasil (KYRILLOS, 2015; COSTA, 2016 apud
GAINO, 2018).
Diante do exposto, é compreensível que existam dois exemplos principais
para discutir os conceitos de saúde e saúde mental, a saber, o exemplo biomédico
e o exemplo da produção social de saúde. Antes de tudo, o foco é apenas a doença
e suas manifestações, a loucura como sendo necessariamente o objeto de estudo
da psiquiatria. No segundo, a saúde é mais complexa do que as manifestações de
doenças, incluindo aspectos sociais, econômicos, culturais e ambientais. Nesse
paradigma, a loucura não é apenas um diagnóstico psiquiátrico, porque pacientes
com doenças mentais podem ter qualidade de vida, participar de atividades
comunitárias e realizar seu potencial (GAINO, 2018).
O sistema único de saúde do Brasil adotou um conceito expandido de saúde
e priorizou o atendimento em saúde mental. No entanto, este estudo pressupõe
que essa perspectiva não foi naturalizada pelos profissionais de saúde que integram
esse sistema, ainda dominando o paradigma biomédico (GAINO, 2018).
2.1 Manuais de classificações Psiquiátricas e diagnósticos

Alguns autores refletem mais intensamente a respeito do próprio sistema de


classificação psiquiátrica, os chamados manuais como o DSM-IV e CID-10. (GAMA,
2014).
Caponi (2009) apud Gama (2014) afirma que as classificações psiquiátricas
atuais se referem a sentimentos, condutas e comportamentos de sujeitos, não
levando em conta os vínculos, as relações pessoais, de trabalho e afetivas no
momento de se definir o diagnóstico.

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Pereira (2000) faz uma problematização da própria concepção dos manuais


de diagnósticos psiquiátricos como o DSM-IV e o CID-10. Identificando que,
Atualmente, a abordagem hegemônica privilegia os sintomas do paciente e está
unida a tentativa de criar uma abordagem empírica, operacional e pragmática dos
problemas mentais (PEREIRA, 2000 apud GAMA, 2014).
Este movimento foi iniciado por um grupo de psiquiatras americanos na
década de 1970. Inicialmente, objetivou criar uma classificação de doença mental
para comunicação científica. Desta forma, esta abordagem necessitaria ser ateórica
sem pretensão de se constituir como uma psicopatologia. No entanto, o que
observamos foi uma mudança do foco inicial, porque, de uma perspectiva biológica
de problemas psicológicos, o debate sobre a etiologia da doença limitou-se à
resposta de um determino quadro a um determinado medicamento. Portanto, o
debate psicopatológico foi cancelado para apoiar o diagnóstico. Até a década de
1960, todos os efeitos da psicanálise na psicopatologia foram subitamente
substituídos pelos efeitos da psicofarmacologia. Novas entidades nosológicas são
criadas sem considerar a dinâmica ou a estrutura da doença (GAMA, 2014).
Destaca-se que as versões mais recentes desses manuais abolem o
chamado diagnóstico dimensional, que envolve alguma continuidade entre os vários
quadros não existem fronteiras claramente delineadas e rígidas, mas são
substituídas por classificações claras e objetivas. “Isso se explica devido à forma
como os sintomas eram concebidos: sendo expressões polimórficas de processos
subjacentes (que ocorriam sob a superfície) – o mesmo sintoma, ou um determinado
conjunto de sintomas, poderia, em casos diferentes, estar referidos a mecanismos
diferentes. O inverso também podia ocorrer: sintomas diferentes eram referidos a
um mesmo mecanismo subjacente. Os opositores desta visão “dimensional”
argumentavam que a falta de critérios objetivos para determinar as fronteiras entre
as categorias diagnósticas levava a uma baixa confiabilidade do diagnóstico
(RUSSO E VENÂNCIO, 2006 apud GAMA, 2014).
Uma das consequências dessa mudança é a composição do discurso
hegemônico, que delibera sobre a legitimidade das proposições neste campo. De
tal modo, o suposto “ateorismo” destes manuais acabou por tirar do debate
cientificamente autorizado, todas as outras disciplinas como a psicanálise, a
fenomenologia, e a análise existencial resultando numa percepção cada vez mais
natural do sofrimento mental deixando de lado as dimensões subjetiva, cultural e
histórica (PEREIRA, 2000 apud GAMA, 2014).
Russo e Venâncio (2006) chamam atenção para a visão totalmente biológica
articulada à hegemonia do tratamento farmacológico. Esses pesquisadores
questionam se o grande aumento no número de categorias de diagnóstico não está
diretamente relacionado à produção de novos medicamentos, ou seja, se eles têm
benefícios econômicos (RUSSO; VENÂNCIO, 2006 apud GAMA, 2014).

2.2 A demanda da saúde mental – pesquisas epistemológicas

Estudo epidemiológico sobre a prevalência de doenças mentais na


população com base na mesma lógica, apontada na construção do conceito de
saúde mental. São estudos transversais que usam escalas de sensibilidade para
determinado número de variáveis representadas pelos sintomas do sujeito. A
argumentação é totalmente estruturada a partir dos números obtidos e não se
averigua questionamento sobre os instrumentos usados na pesquisa. Como já
dissemos, essas ferramentas definirão o padrão de normalidade (CANGUILHEM,
1990 apud GAMA, 2014).
Foi identificado alguns estudos mais conexos à demanda de Saúde Mental
da Atenção Primária que estão fundamentados nos conceitos de Transtorno Mental
Comum, Sofrimento Difuso ou Transtorno Psiquiátrico Menor. Esses nomes se
referem a configurações clínicas muito semelhantes, ligadas a queixas somáticas
sem especificação como dores no corpo, dores de cabeça, mal-estar, insônia,
nervosismo, nem sempre classificado como uma síndrome psiquiátrica importante
(MARAGNO et. al., 2006; FONSECA et al., 2008; VALLA, 2001 apud GAMA, 2014).
Declarar tais reclamações é um dos principais requisitos da atenção primária
e, geralmente, não recebe tratamento. Essa demanda é classificada como:
poliqueixosos, psicossomáticos, funcionais, psicofuncionais, histéricos e pitiáticos.
Eles insistem em treinar os profissionais da atenção básica para entender a
importância desses quadros apresentados, porque muitas vezes exibem essas
queixas e são tratadas com preconceito. Apontam que a compreensão deste
problema vai bem longe da individuação do problema, é necessário expandir o foco
para o contexto social, as relações sociais, as condições socioeconômicas (Fonseca
et al., 2008 apud GAMA, 2014).
Esta configuração clínica é subnotificada, porque nenhum usuário procura
tratamento e, quando procura, não recebe a atenção e o tratamento adequado que
merece. Na pesquisa realizada, a prevalência foi de 24,95%, e os grupos mais
vulneráveis foram mulheres, idosos, baixa escolaridade e baixa renda per capita
(MARAGNO et al., 2006 apud GAMA, 2014). A relação entre incidência de
transtornos mentais e classe econômica surge em vários estudos (FLECK et al.,
2002; COSTA et al., 2002; CAPRARA, RODRIGUES, 2004; KRONBAUER,
MENEGHEL, 2005; MARAGNO et al., 2006; MARTIN et al., 2007; BANDEIRA et al.,
2007; LUDERMIR 2008; FONSECA et al., 2008; FONSECA, 2009 apud GAMA,
2014). A relação inversa entre transtornos mentais e classe econômica é um dos
resultados mais consistentes dos estudos epidemiológicos da população brasileira
e da saúde primária. Esses dados confirmam outros estudos internacionais que
vinculam baixo status socioeconômico ao aumento de problemas mentais (KAC et
al., 2006 apud GAMA, 2014).
Esses estudos nos trazem algumas reflexões, incluindo a compreensão do
conceito da pesquisa em si, que tipo de conceito de saúde / doença mental ela
apoia, o que os resultados significam, como entender a conexão com a
vulnerabilidade social e todos esses serviços e o impacto dos profissionais de saúde
(GAMA, 2014).
A primeira questão está relacionada ao aumento da sensibilidade dos
instrumentos de pesquisa. A tendência de criar categorias mais abrangentes (como
transtornos mentais comuns, morbidade psiquiátrica menor ou sofrimento mental
difusa). Pode desencadear o processo patológico do estado afetivo.
Comportamentos, sentimentos e situações fazem parte da vida cotidiana das
pessoas, ou seja, uma certa flutuação do estado afetivo pode ser considerada um
estado patológico, e a resposta para esses "problemas" geralmente é a terapia
medicamentosa (GAMA, 2014).
A Necessidade de tornar mais visível essa manifestação de sofrimento e
estabelecendo uma conexão entre essas manifestações de sofrimento e suas raízes
psicossociais. Entendemos que essas conexões devem ir além dos mecanismos
existentes na racionalidade da ciência tradicional e introduzir vários elementos que
tornarão cada situação singular (FONSECA et al., 2008 apud GAMA, 2014).

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O segundo ponto que chamou nossa atenção está relacionado à correlação


entre problemas mentais e indicadores sociais. Novamente, estamos diante de um
problema muito complexo, porque a conexão entre "pobreza" e "loucura"
geralmente é rapidamente incorporada à imaginação da população em geral e pelos
profissionais de saúde. Compreender o escopo dessa "relevância" e o
comportamento estrutural resultante da saúde mental é um desafio (GAMA, 2014).
A relação entre indicadores sociais e problemas mentais não devem induzir
ao preconceito no qual as populações das periferias permaneceriam condenadas a
uma situação estática e imutável. Por outro lado, estudos epidemiológicos
mostraram que, certas condições de vida podem predispor a população a doenças
não transmissíveis e não infecciosas, mas têm o potencial de incapacidade
equivalente a essa manifestação já reconhecida no campo da saúde pública
(Fonseca et al., 2008 apud GAMA, 2014).
2.3 O que é vulnerabilidade e sua relação com a saúde mental?

O conceito de vulnerabilidade também está imerso neste cenário de lógicas


conflitantes. assinalou-se que, na década de 1980, na perspectiva de re-conceituar
a tendência individualizada das doenças, no contexto da epidemia de aids, o
conceito de vulnerabilidade no campo da saúde foi restaurado. descrevem como se
deu a reelaboração do conceito e vulnerabilidade nessa situação. Para o autor,
neste caso, o uso do conceito de risco epidemiológico suscita uma série de
problemas principalmente relacionados à especificidade da doença (MUÑOZ et al.,
2007; AYRES et al., 2003 apud GAMA, 2014).
Ocorre que os fatores de risco utilizados para os primeiros estudos
epidemiológicos experimentaram um deslocamento discursivo de implicações
práticas extremamente relevantes. De categorias analíticas instrutoras do raciocínio
causal, o fator de risco transmutou-se no conceito operativo de grupo de risco. (...)
A noção de grupo de risco difundiu-se amplamente, especialmente através da
grande mídia, e agora não mais como categoria analítica abstrata, mas como
verdadeira categoria “ontológica”, como uma identidade concreta AYRES et al.,
2003 apud GAMA, 2014).
Este momento fortaleceu atitudes preconceituosas contra os grupos de risco,
especialmente contra os homossexuais. Estratégias preventivas foram
desenvolvidas em torno dos temas de abstinência e isolamento sexual. O conceito
de grupo de risco foi criticado tanto pela inadequação nas propostas de prevenção
quanto pelos movimentos sociais pertinentes aos grupos atingidos. De “grupo de
risco” Aposta vira estratégia de redução de risco e o conceito-chave passa para
Comportamento de Risco”. Isso é para reduzir o estigma dos grupos mais afetados
em primeiro lugar e incentivar os indivíduos a participar da prevenção. Esta
mudança foi criticada também, já que trazia consigo a tendência de culpabilizar o
indivíduo (culpabilização individual) pela contaminação (GAMA, 2014).
A ideia que começou a surgir é defender estratégias de prevenção, que não
se limitam à redução de riscos pessoais, mas também mostram que outras
estratégias têm um escopo social e estrutural mais amplo. É nessa situação que o
conceito de vulnerabilidade começa a ganhar visibilidade (GAMA, 2014).
Entender a diferença entre vulnerabilidade e risco passa por uma primeira
distinção atribuindo um caráter analítico ao risco e tendências de síntese para a
vulnerabilidade. O conceito epidemiológico de risco tenta determinar o
relacionamento entre os eventos para determinar a probabilidade de ocorrência de
um fenômeno. Objetivo de expressar as chances matemáticas de adoecimento de
qualquer indivíduo, desde que portador de certo traço identitário. Existe um
processo analítico onde ocorre o isolamento de variáveis (dependentes e
independentes) reconhecendo uma causalidade explicativa do mundo a partir de
uma casuística identificada. Esta causalidade leva os profissionais e serviços de
saúde a certas ações (AYRES et al., 2003 apud GAMA, 2014).
O conceito de vulnerabilidade é muito diferente do conceito de risco. Ele
busca identificar elementos relacionados ao processo de adoecimento em situações
mais concretas e particulares, tendo empenho em compreender as mediações e
relações que permitem estas situações, num movimento de síntese. A
vulnerabilidade tem um caráter não probabilístico. Ela tem o desígnio de divulgar o
“potencial de adoecimento relacionados a todo e cada indivíduo que vive em um
certo conjunto de condições”. A vulnerabilidade encampa todos os fenômenos que
são excluídos das análises de risco já que, não apresentam determinadas
características determinadas pelos parâmetros epidemiológicos e estatísticos.
Portanto, fenômenos que exibem inconstância, interferências, múltiplas causas, não
permanência são os objetos de estudo das análises de vulnerabilidade (AYRES et
al., 2003 apud GAMA, 2014).
As análises de Vulnerabilidade envolveriam três eixos que ficariam
interligados: o social, o individual e o programático. O individual conexo à
qualidade de informação que os indivíduos dispõem sobre o problema, a
capacidade de organizar estas informações e modifica-las em práticas de proteção
e prevenção. O componente social relacionado às possibilidades de elaborar e obter
informações, acesso aos meios escolarização, de comunicação, recursos materiais,
enfrentamento de barreiras, influência nas decisões políticas sociais. O componente
programático refere-se as políticas públicas e aos recursos sociais ligados ao
problema. Os autores destacam que as análises de vulnerabilidade não prescindem
das análises epidemiológicas de risco, mas são mais cuidadosas na constituição de
propostas de intervenção a partir dos dados epidemiológicos (AYRES et al., 2003
apud GAMA, 2014).

2.4 Vulnerabilidade e saúde mental

Nosso objetivo é mostrar que a filiação a determinado paradigma, ou seja, a


origem epistemológica de determinado conhecimento influência nas práticas ligadas
ao campo em questão (GAMA, 2014).
Não propomos demonizar a ciência tradicional e sua racionalidade, nem de
negar as várias inovações e produções e oriundas de certa forma de fazer ciência.
No entanto, em questões envolvendo seres humanos, como saúde mental,
devemos nos atentar para que as colaborações oriundas de distintas lógicas
possam contribuir na justa medida e sejam impedidas de abarcarem algumas
fronteiras intervindo de forma intrusa na própria compreensão de tratamento
(GAMA, 2014).
As tendências modeladoras estariam unidas a uma tradição de cultivo de
saberes que não reconhece e nem faz uma autocrítica a respeito do reducionismo,
presente no próprio movimento de construção de conceitos e categorias (AYRES et
al., 2003 apud GAMA, 2014).
O processo de construção teórica da ciência tradicional pressupõe recortes
imprescindíveis para estabelecer certos conceitos que possam ser explicativos e
generalizados. Porém, embora essa construção possa ser operativa, não é capaz
de expressar o fenômeno na sua integridade. Para a autora não faz sentido a crítica
sobre o pensamento científico no ser reducionismo e limitação, já que, estas
características são características deste modelo de ciência. O problema é negar o
limite da construção científica, os limites dos conceitos com relação a realidade. No
limite, nenhuma ciência consegue dar conta da realidade. A singularidade presente
em um determinado fenômeno sempre aparecerá mais complexa que os modelos
explicativos (CZERESNIA, 2003 apud GAMA, 2014).
A perspectiva construtivista, buscaria aproximar-se de forma mais complexa
com relação aos fenômenos, no sentido de obter composições com a diversidade
de relações existentes entre eles, considerando a dimensão da singularidade, da
subjetividade e da experiência concreta (GAMA, 2014).
Buscar dar conta da singularidade é estabelecer novas relações entre
qualquer conhecimento construído por meio de conceitos e modelos e o
acontecimento singular que se pretende explicar. Enfatiza-se aqui a necessidade
de redimensionar os limites da ciência, revalorizando e ampliando a interação com
outras formas legítimas de apreensão da realidade (CZERESNIA, 2003 apud
GAMA, 2014).
Na questão tratada, ou seja, as relações entre saúde mental e
vulnerabilidade é relevante trabalharmos com perspectivas que consintam uma
aproximação com o fenômeno do sofrimento mental sem prendê-lo em categorias,
consentindo maior diversidade e flexibilidade tanto propostas de intervenção quanto
na compreensão (GAMA, 2014).
Assegura que a vulnerabilidade é multidimensional, implica em gradações e
modificações no decorrer do tempo e tem caráter relacional. As pessoas podem não
ser vulneráveis, mas estão vulneráveis em relação à determinada situação e num
certo ponto do tempo e espaço. É relevante destacar o caráter relacional de alguma
situação de vulnerabilidade (GOROVITZ, 1994 apud GAMA, 2014).
Para entender a vulnerabilidade é imprescindível expandir o olhar, saindo
do individual para o plano das suscetibilidades socialmente configuradas. Desta
forma temos, por exemplo, o conceito de clínica ampliada que propõe uma prática
clínica longitudinal e mais complexa. Pensar em termos de vulnerabilidade implica
uma abertura para atos Inter setoriais e formação de redes de atenção que integrem
áreas relacionadas à saúde do sujeito com a área da saúde (CAMPOS, 2003;
CUNHA, 2005 apud GAMA, 2014).

https://www.saocristovao.se.gov.br

Outro ponto importante, relaciona-se à interface entre o serviço de saúde e a


comunidade/população. Identificamos uma tendência na relação entre profissionais
de saúde e populações que impõe a chamada racionalidade "científica" sem uma
reflexão mais profunda sobre os fenômenos que enfrentam (GAMA, 2014).
O aparecimento de uma ordem global que há uma racionalidade técnica
produzirá tensão com relação à ordem local, da comunidade. Existiria uma razão
local e uma razão global que em cada lugar se superporiam, movimentando-se
dialeticamente, às vezes se associando, outras se contradizendo. Afirmando que,
especialmente nas grandes cidades do terceiro mundo, a precariedade da vivência
de uma parcela importante da população produz irá atores sociais que irão exercer
vários tipos de ações no sentido de construção de modelos de adaptação que m
características instáveis, plásticas e criativas embasados em relações de
solidariedade. Esta condição propiciaria uma abertura nos espaços onde os pobres
vivem e favoreceria espaços de criatividade e aproximativos. Em algumas
circunstâncias, calharia a produção de debates novos sobre a realidade do dia a
dia, novas finalidades e usos para técnicas e objetos, novas normas e práticas na
vida afetiva e social (SANTOS, 2007 apud GAMA, 2014).
É relevante reconhecer subsídios que nos deixem perceber os territórios mais
vulneráveis com outros olhos, não apenas coisas negativas, mas também algum
tipo de força baseada inteiramente no tipo de exclusão. Quando deixamos a análise
macro, globalizada, e buscamos apreender as dinâmicas singulares de algumas
pessoas, percebemos que o mundo é muito fragmentado e não há globalização.
Esse aspecto é a base de nossa discussão, pois permite vislumbrar a possibilidade
de uma única produção, ou seja, a relação entre a área de saúde e a população que
vive em condições instáveis (GAMA, 2014).
Ao analisar a subjetividade atual, destaca-se uma tendência ao
empobrecimento simbólico e a necessidade de restabelecimento de um espaço
subjetivo que permita a criação de sentidos integradores no dia-a-dia (ONOCKO
CAMPOS et al., 2008 apud GAMA, 2014).
A saúde psíquica está diretamente relacionada com a capacidade
interpretativa, associativa, de elaboração e simbolização do psiquismo. Também
está ligada à capacidade de fazer laços sociais. Mostrando que as características
da sociedade atual vão precisamente atrapalhar estas operações, fragilizando o
psiquismo do sujeito (KAËS, 1991-2005 apud GAMA, 2014).
Nosso objetivo é trabalhar um conceito de saúde mental que permita ao
sujeito um certo grau de liberdade para que ele possa conversar com diferentes
instâncias sociais (saúde, justiça, trabalho) e com seus pares, sem submeter-se
completamente a um discurso normativo, deixando um espaço para sua
singularidade, para seu desejo aparecer. É importante enfatizar o aspecto de eterna
criação e recriação das condições de manutenção da saúde mental do sujeito.
Consideramos esta questão de importância vital, porque a saúde mental na atenção
básica poderá de forma fácil se transformar num programa higienista para dominar
a vida da população de baixa renda (GAMA, 2014).
Portanto, a aproximação entre saúde/doença mental e vulnerabilidade social
deve ser trabalhada com elementos que excedam o discurso técnico científico
tradicional aliando outros conhecimentos unidos aos sujeitos que são afetados pelo
sofrimento. Teria que ser repensado o papel do profissional técnico de saúde,
afastando do lugar tradicional que é de imposição de uma certa lógica para
transformar-se numa espécie de mediador entre recurso da sociedade e
comunidade no processo de construção da saúde (AYRES, 2003 apud GAMA,
2014).
Calculamos uma mudança na direção do tratamento afastando de práticas
centradas na doença, na assistência e na intervenção medicamentosa para
intervenções que apreciem a criação de sentidos para o sofrimento mental e que
produzam aumento das relações sociais do sujeito portador de sofrimento mental
(GAMA, 2014).

2.5 Estigmas relacionados às doenças mentais

A estigmatização relacionada à doença mental é um dos principais


obstáculos ao acesso aos serviços de saúde mental. Afinal, afeta não apenas as
pessoas com doenças mentais, mas também os seus familiares, profissionais e
serviços de atenção à saúde mental, e a própria psiquiatria enquanto especialidade
médica. Entre outras implicações, as pessoas com doenças mentais
frequentemente não têm sua condição reconhecida e menos ainda adequadamente
tratada. Mesmo que não seja um processo mais amplo de exclusão social, muitas
vezes encontram muitas desvantagens em termos de aprendizado, emprego,
moradia e legislação social. Essas pessoas geralmente formam um processo de
autoestigma, complexo de inferioridade, deterioração da saúde física, insatisfação
e redução da qualidade de vida. Geralmente, as políticas públicas de saúde não
incluem doenças mentais com a importância de um orçamento e ações adequados
(dada a alta prevalência e incapacidade que causam) (JORGE, 2013).
https://drjosesousa.wordpress.com

De acordo com estudo realizado no Brasil, Leitão et al. (2002) descreveram


que cerca de 70% dos pacientes com esquizofrenia não recebem tratamento
regular, situação semelhante à descrita em outras doenças mentais e em outros
países (THORNICROFT, 2008 apud JORGE, 2013).
Fatores que levam a uma maior probabilidade de tratamentos serem evitados
ou longo atraso na procura por cuidados à saúde mental incluem a falta de saberes
sobre as características e tratabilidade das doenças mentais, ignorância sobre como
ter acessos a tratamento e avaliação, preconceito contra as pessoas que têm
doença mental e expectativa de discriminação contra as pessoas que têm um
diagnóstico de doença mental (THORNICROFT, 2008 apud JORGE, 2013).
Outro estudo realizado no Brasil, tendo como objetivo avaliar a frequência e
os motivos de re-hospitalizações de portadores de psicose e transtorno bipolar,
mostrou, na amostra estudada, a taxa de re-internações no primeiro ano após a alta
foi de 42,6%. Sobre os fatores relacionados à readmissão ao hospital destacaram-
se a contenção física durante a internação, o não comparecimento às consultas
após a alta, o número de readmissões anteriores e a aprovação da família para a
hospitalização permanente de indivíduos portadores de doença mental, estimados
de forma estereotipada como não sadios e perigosos. Os autores concluíram que a
estigmatização da doença mental pela família pode levar a um aumento da
frequência de reinternações de pacientes internados (LOCH, 2012 apud JORGE,
2013).

2.6 Conceitos de transtornos mentais

Conceito atual de transtornos mentais (do inglês mental disorder, introduzido


pelo DMS-III). Refere-se a um grupo de sintomas (síndromes) ou padrões
comportamentais e psicológicos clinicamente importantes e relacionados à
sofrimento ou incapacidade (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 1980
apud JORGE, 2013).
Assim, este conceito privilegia fenômenos universais e objetiváveis (que
correspondem à noção de disease) em detrimento de experiências subjetivas (que
correspondem à noção de illness) e contrapõe o conceito de dis-order (fora da
ordem, desordem, transtorno, perturbação) O conceito clássico de doença mental.
No entanto, podemos observar variações na forma como as pessoas veem os
transtornos mentais, mesmo em pessoas que são relativamente semelhantes do
ponto de vista sociocultural (JORGE, 2013).
Estudantes de colleges norte-americanos compreendem os transtornos
mentais como uma disfunção em seus mecanismos psicológicos e nas habilidades
e enfatizam a presença de conflitos psicológicos, perturbações emocionais e
incapacidade no funcionamento. Os estudantes universitários brasileiros
compreendem que os aspectos mais distintivos do conceito dizem respeito a
anormalidades estatísticas (desvio da norma), irracionalidade, fraqueza de caráter
e reações comportamentais inesperadas (GIOSAN et al., 2001 apud JORGE, 2013).
https://www.youtube.com/watch?v=EIVpJt2Po0c

A forma que os transtornos mentais são definidos pelas concepções


populares e pelos profissionais da área, tem uma relação próxima com os
fenômenos do estigma e a discriminação sofrida por seus portadores (JORGE,
2013).

2.7 Aspectos históricos e conceituais do estigma

O estigma associado à doença mental mostra mudanças ao longo do tempo


e em diferentes culturas. O termo estigma origina-se do grego stizein e significa
marcar, pontuar. Na Grécia antiga, escravos, criminosos e traidores eram marcados
com sinais físicos, indicando que eram pessoas a serem evitadas, especialmente
em locais públicos (JORGE, 2013).
A relação entre estigma e doença mental existe há muito tempo, o que se
reflete no entendimento da loucura como uma possessão demoníaca e uma punição
por um pecado cometido, presente na Bíblia e ao longo dos séculos seguintes (p.
ex., em Malleus Maleficarum). Por outro lado, a abordagem da medicina procurando
causas naturalísticas da insanidade, relacionando-a à teoria da degenerescência –
sendo assim, uma condição intratável – até o século XVIII os doentes eram
segregados da sociedade e seu tratamento se restringia a acorrentá-los, açoitá-los
ou submetê-los a purgações (JORGE, 2013).
No século XIX, esta situação começa a mudar e grande relevância é dada a
Pinel, na França. Quando ele introduziu o conceito de insanidade parcial e sugeriu
tratamento em um ambiente apropriado (os asilos de então). Na mesma época, os
Estados Unidos da América (EUA) experimentavam uma urbanização acelerada e
imigração altíssima, o que era entendido como possíveis causas de doenças
mentais e, assim, os asilos eram um local de isolamento para o tratamento das
mesmas (JORGE, 2013).
Em seu clássico livro, Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade
Deteriorada, estabelece que, o termo estigma será usado em referência a um
atributo profundamente depreciativo, mas... (em) uma linguagem de relações e não
de atributos...” E sobre aquele sobre quem recai um estigma que,“... deixamos de
considerá-lo criatura comum e total, reduzindo-o a uma pessoa estragada e
diminuída”. Assim, Goffman caracteriza o estigma quando o efeito é grande de
descrédito da pessoa estigmatizada e o considera um tipo especial de relação entre
estereótipo e atributo (ERVING GOFFMAN, 1963 apud JORGE, 2013).
Já não bastava isolar os portadores de doenças mentais da sociedade, a
aplicação de rótulos no que eles ofereciam de diferente e a associação destes a
traços indesejáveis (estereótipos negativos) acentuaram esta separação: não são
mais considerados “um de nós” e sim constituídos como um grupo à parte (“eles x
nós”), grupo este que experimenta a discriminação e perda de status (LINK &
PHELAN, 2001 apud JORGE, 2013).
Os resultados das pesquisas realizadas nos cinco continentes são
geralmente consistentes e indicam que nenhum país, sociedade ou cultura acredita
que pessoas com doença mental tenham o mesmo valor que aquelas sem doença
mental. (THORNICROFT et al., 2009 apud JORGE, 2013).
A palavra estigma envolve distintos significados: saberes insuficiente ou
inadequado (ignorância, estereótipo), pressupostos ou emoções negativas
(preconceito) e comportamentos de esquiva e rejeição (discriminação). Como
resultado, pessoas estigmatizadas experimentaram graus variados de separação
social (JORGE, 2013).
Pesquisas realizadas desde a década de 1950 comprovaram que pessoas
com doenças mentais são vistas pela população com medo, desconfiança ou até
mesmo nojo, e são consideradas perigosas, sujas, imprevisíveis e sem valor apud
JORGE, 2013).
Phelan e colaboradores, em levantamento realizado nos EUA em 1996
usando questionamentos semelhantes a um estudo realizado por Star na década
de 1950, depararam com uma aceitação maior das doenças mentais menos grave,
porém 2,5 vezes mais medo e estigma em relação a doenças mentais graves e
quase o dobro de percepção de que as pessoas com doenças mentais são violentas
(PHELAN & LINK, 1998; PHELAN et al., 2000 apud JORGE, 2013).
Por outro lado, há pouco tempo, consultar um psiquiatra não era bem visto
publicamente e as pessoas faziam uma avaliação dos profissionais que tratavam de
doenças mentais de forma mais negativa do que aqueles que tratavam de doenças
físicas (Star, 1957, Nunnally, 1961 apud Phelan et al., 2000 apud JORGE, 2013).,
essa situação teve uma evolução positiva nos fins do século passado, contudo ainda
é frequente em determinadas regiões de praticamente todos os países (JORGE,
2013).
Estes dados podem ser entendidos em relação às doenças mentais menos
graves pela evolução do tratamento e diagnóstico das doenças mentais, como
também, pela crescente presença de temas de saúde mental em veículos de mídia
(incluindo o cinema). Porém, programas de desinstitucionalização que estão sendo
realizados sem a devida cobertura por serviços comunitários podem colaborar para
a piora do cenário no que diz respeito às pessoas com doenças mentais graves, na
medida em que a população fica mais exposta a elas, reforçando estereótipos
negativos e o estigma (p. ex, ANGERMEYER et al., 2011 apud JORGE, 2013).
No que diz respeito à relação de violência e doenças mentais, existe entre
elas uma associação suavizada, porém com pequena magnitude do risco. Contudo,
estudos demonstraram que violência pode acontecer em pacientes sem tratamento)
ou com histórico de abuso de álcool ou drogas. Além disso, descreveram que
pessoas com esquizofrenia eram mais vítimas de abuso ou violência que
perpetradores de violência. (ERONEN et al.,1998; GARMENDIA et al., 1992;
ARBOLEDA-FLOREZ et al.,1996; HÄFNER e BÖKER,1982 apud JORGE, 2013).

2.8 Estratégias para mudar atitudes estigmatizantes

Segundo Corrigan et al. (2001), os psicólogos sociais identificaram três


abordagens para mudar atitudes estigmatizantes:
 educação (que busca substituir ações estigmatizantes com
 concepções precisas sobre as doenças),
 contato (desafiando atitudes públicas sobre doenças mentais
interagindo diretamente com pessoas que tem estas doenças)
 e protesto (que suprime ações estigmatizantes direcionadas a
doenças mentais e comportamentos que promovem estas atitudes) (CORRIGAN et
al., 2001 apud JORGE, 2013).
Segundo estes autores, todas abordagens apresentam limitações:
Educação melhora nos atributos relacionados a diversas doenças mentais, mas, de
forma não duradoura e sem essencialmente mudar atitudes; o contato com
portadores produz maiores mudanças positivas que educação para algumas
doenças mentais (p. ex., depressão e psicose) porém, não para outras (p. ex., uso
habitual de cocaína e retardo mental); protesto não traz mudanças significativas nos
atributos relacionados a diversas doenças mentais (JORGE, 2013).
Através de revisão sistemática da literatura, a hipótese de que o aumento do
saber sobre os correlatos biológicos das doenças mentais na primeira década do
século XXI demonstrou melhora do conhecimento público sobre as mesmas, em
maior prontidão para buscar cuidados à saúde mental e em ações mais tolerantes
em direção a pessoas mentalmente doentes. Os resultados mostraram que existia
maior conhecimento sobre saúde mental – principalmente do modelo biológico de
doenças mentais – e uma aceitação maior de ajuda profissional para problemas de
saúde mental; em contraste, houve uma piora no que diz respeito a ações em
relação a pessoas com doença mental (SCHOMERUS ET al., 2012 apud JORGE,
2013).

https://www.antenalivre.pt

Na medida em que a questão do estigma foi crescendo e se movendo em


direção a um modelo de direitos humanos que o vê como uma forma de opressão
social resultado de um processo sociopolítico complexo, adicionam a estas três
vastamente reconhecidas estratégias, outras três: reforma das leis, defesa de
direitos e manejo do auto-estigma (ARBOLEDA-FLÓREZ; STUART, 2012 apud
JORGE 2013).
Nos últimos 15 anos, muitas iniciativas foram tomadas no campo da
psiquiatria e saúde mental em todo o mundo para combater o estigma e a
discriminação relacionados a doenças mentais. Entre algumas delas, destacamos
o Programa Global para Reduzir o Estigma e a Discriminação Relacionados à
Esquizofrenia da Associação Psiquiátrica Mundial (World Psychiatric Association,
1998), possuem grupos de ação presentes em mais de 20 países. No Brasil, este
programa iniciou em 2001, várias pesquisas e ações tem se estabelecido na
tentativa de melhor entender as raízes e combater o estigma relacionado às
doenças mentais (JORGE 2013).
3 SAÚDE MENTAL EM GESTANTES

Do ponto de vista psicológico, hormonal, físico ou social, a gravidez é um


período de muitas mudanças nas mulheres (Camacho et al., 2006A saúde mental
das mulheres durante a gravidez e o puerpério é um tópico amplamente discutido
na literatura científica (PINHEIRO, LAPREGA & FURTADO, 2005; BROWN, 2001;
LLEWELLYN, STOWE & NEMEROFF, 1997 apud ALIANE, 2008).
Isso ocorre porque muitas mulheres podem experimentar ansiedade,
distúrbios emocionais e até psicose puerperal nesta fase de suas vidas. (CAMACHO
et al. apud ALIANE, 2008). Segundo Camacho et al., o período gravídico-puerperal
esse é o estágio com maior incidência de doença mental feminina, e é necessária
atenção especial para manter ou restaurar a saúde e prevenir que as crianças
encontrem dificuldades futuramente (CAMACHO et al. apud ALIANE, 2008).
Como todos sabemos, os danos à saúde mental das mulheres grávidas terão
um impacto negativo no relacionamento entre mãe e filho e afetarão o crescimento
das crianças. No início, essas implicações podem expressar no recém-nascido em
forma de irritabilidade, choro ou apatia (MOREIRA & FURTADO, 2002. apud
ALIANE, 2008) e, futuramente, colaborar como um fator de risco para o
desenvolvimento de distúrbios afetivos na idade adulta (GROSS, 1989; DODGE,
1990. apud ALIANE, 2008).
Entre as doenças mentais mais estudadas na gravidez e no puerpério, a
ansiedade e a depressão são as que recebem maior destaque. Além disso, o uso
de álcool tem sido estudado, mesmo que não constitua uma característica
psiquiátrica de abuso ou dependência, pois terá consequências irreversíveis para a
saúde do bebê (ALIANE, 2008).
Sobre os transtornos ansiosos, um estudo realizado por pesquisadores da
Pontifícia Universidade Católica do Chile (Jadresic, Jara, Miranda, Arrau & Araya,
(1992) apud Aliane (2008), revelou que, em 108 mulheres grávidas, 23,1%
apresentaram sintomas de ansiedade, e que o diagnóstico foi em 1,9% dos casos
foi diagnosticado Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). No Brasil,
encontraram uma frequência semelhante (23,3%) de casos de ansiedade em
gestantes da cidade de Piracicaba (SP), (FREITAS; BOTEGA, 2002 apud ALIANE,
2008).
Em relação aos transtornos do humor, a incidência de sintomas depressivos
encontrada em mulheres grávidas adultas foi de 20,4% (Falcone, Mäder,
Nascimento, Santos & Nóbrega, 2005, apud Aliane 2008) 20,8% das adolescentes
grávidas sofrem de depressão (Freitas & Botega, 2002 apud Aliane, 2008). Entre os
adolescentes, a depressão está associada à ideação suicida em 16,7% dos casos.
Por outro lado, o estudo realizado no Chile, o estudo constatou que a prevalência
de transtornos depressivos entre as gestantes foi de 7,4% e entre as que estão no
pós-parto foi de 10,2% (JADRESIC et al., 1992 apud ALIANE, 2008).
Sobre o uso de álcool durante a gestação, uma pesquisa realizada em uma
maternidade filantrópica de São Paulo identificou que entre 445 puérperas, 150
(33,7%) durante a gestação consumiram álcool. Das, 79 (17,8%) consumiram
durante toda a gravidez enquanto as outras 71 puérperas (15,9%) até confirmarem
a gravidez. Isto mostra que um número importante de mulheres fez a utilização de
álcool durante a gestação, embora a maioria (84,5%) considerou que nenhuma
bebida alcoólica deva ser consumida neste período. Estes dados demonstram que
a maioria das mulheres sabem sobre os malefícios do uso de álcool no período da
gravidez (KAUP, MERIGHI & TSUNECHIRO, 2001 apud ALIANE, 2008).
A prevalência de transtornos de ansiedade, humor e alcoolismo entre
mulheres grávidas e puérperas é alta, o que indica a importância da realização de
pesquisas sobre esse tema. Nesse sentido, o estudo da prevalência de doenças
mentais durante a gravidez e o puerpério é de grande importância na formulação de
estratégias de saúde pública destinadas a manter a saúde das mulheres e prevenir
as dificuldades futuras das crianças. (ALIANE, 2008).
3.1 Atuação multiprofissional e a saúde mental da gestante

A gravidez é um tempo de transição que faz parte do processo normal do


desenvolvimento humano. Há grandes transformações organismo da mulher e no
seu bem-estar, alterando seu psiquismo e o seu papel sócio familiar (FALCONE,
2005).

Segundo Falcone, p. 613, 2005 a literatura revela que,

“O período gravídico-puerperal é o período que ocorre maior incidência de


transtornos psíquicos na mulher, carecendo de atenção especial para
recuperar ou manter o bem-estar, e prevenir possíveis dificuldades futuras
para o filho. A intensidade das mudanças psicológicas dependerá de
fatores familiares, conjugais, sociais, culturais e da personalidade da
gestante”

A depressão pós-parto é um problema que acomete cerca de 10% a 15% das


mulheres em muitos países, havendo bastantes pesquisas na área Pesquisas atuais
sugerem que a depressão pré-natal pode ter sido negligenciada, e poucos estudos
científicos tentaram avaliar mudanças psicológicas durante a gravidez (FALCONE,
2005).
Embora os resultados do estudo às vezes sejam contraditórios do ponto de
vista epidemiológico, eles ainda são insuficientes, mas existem literaturas
mostrando que fatores psicológicos podem causar complicações na gravidez, parto,
puerpério e feto. Particularmente, esses fatores podem ser o estresse e ansiedade,
agindo principalmente durante a gravidez (FALCONE, 2005).
Zucchi, ao analisar a depressão na gravidez nos últimos 10 anos, ele
descobriu dois grandes grupos de pesquisas. Aqueles que pesquisaram os fatores
de risco para depressão na gravidez, como falta de parceiro ou de suporte familiar
e social e dificuldades econômicas; e os que procuraram associar a depressão
como fator de risco para certos desfechos obstétricos, como o baixo peso ao nascer,
a irritabilidade do bebê, prematuridade ou mesmo a mortalidade neonatal
(FALCONE, 2005).
Estudos recentes mostram que a tensão da gestante incita a produção de
determinados hormônios que atravessam a barreira placentária alcançando o
organismo do feto em desenvolvimento. Dessa maneira, alteram a composição
placentária e do ambiente fetal (FALCONE, 2005).
Como dito anteriormente, prejuízos na saúde mental da gestante podem
alterar a relação mãe-feto e futuramente o desenvolvimento da criança, que de início
pode se expressar no recém-nascido em forma de choro, apatia irritabilidade e
futuramente provocar distúrbios afetivos na idade adulta (FALCONE, 2005).
A atuação multiprofissional com mulheres grávidas deve abarcar a interação
de muitos fatores. Como: a história pessoal, os antecedentes ginecológicos e
obstétricos, o momento histórico da gravidez, as características sociais, culturais e
econômicas vigentes e qualidade da assistência. A assistência integral precisa ser
capaz de proporcionar à mulher e ao concepto um tempo satisfatório de bem-estar,
visando o fortalecimento do vínculo mãe-feto (FALCONE, 2005).
Os profissionais que trabalham com gestantes precisam vê-las com uma
"concepção de pessoa humana", buscar estabelecer mecanismos de interação que
desvelem as verdadeiras necessidades e seus significados. Não devem adotar uma
posição superior, vendo as mulheres grávidas como pessoas desamparadas,
submissas e fracas. Se os profissionais e os serviço assumirem essa posição de
igualdade, respeito e confiança em relação às suas experiências e aprendizagens
obtidas, a relação será de crescimento mútuo e desenvolvimento emocional. Assim,
o aspecto básico da assistência pré-natal competente, deve conter o cuidar da
mulher grávida levando em conta as suas necessidades biopsicossociais e culturais
(FALCONE, 2005).
Os fatores que comumente influenciam negativamente no binômio materno
fetal têm seu início no período pré-concepcional ou pré-natal. Durante esse tempo,
os serviços de saúde têm oportunidade de trabalhar adequadamente tais fatores,
buscando colaborar para promoção de uma gestação mais saudável (FALCONE,
2005).
3.2 Apego materno fetal e a saúde mental da gestante

O vínculo constituído pela mãe com o feto durante a gestação tem sido
considerado um importante preditor da qualidade da relação que os dois que se
estabelecerá nos primeiros meses de vida (SHIN, PARK, & KIM, 2006 apud
AVARENGA, 2012).
Fatores psicológicos, fisiológicos, e sociais, além do próprio comportamento
do feto nos últimos meses da gravidez, interferem na formação do vínculo, e a saúde
mental da mulher tem relevantes repercussões sobre esse aspecto específico da
maternidade (DIPIETRO, 2010; HART & MCMAHON, 2006 apud AVARENGA,
2012).).
O conceito de apego materno-fetal tem sido usado na literatura para
descrever a qualidade da relação da gestante com o feto. Foi definido por Cranley
(1981) como o grau com o qual as mães se engajam em comportamentos
indicadores de interação e afiliação com o seu bebê durante a gravidez. O apego
materno-fetal pode ser avaliado com base na assiduidade de comportamentos que
demonstram cuidado e comprometimento com o feto, como, por exemplo, evitar
substâncias nocivas, alimentar-se bem, conversar com o bebê e acariciar a barriga
(SALISBURY, LAW, LAGASSE, & LESTER, 2003 apud AVARENGA, 2012).
Além dos comportamentos que demonstram envolvimento e preocupação
com a criança, o apego materno-fetal pode ser detectado através de expectativas,
sentimentos e pensamentos da gestante, como a tentar imaginar o rosto e a
personalidade do bebê, e o desejo por segurá-lo no colo ou amamentá-lo
(CRANLEY, 1981 apud AVARENGA, 2012).
Segundo Shieh, Kravitz e Wang (2001) apud Avarenga (2012) vários autores
identificaram os atributos críticos do apego materno-fetal. Desta forma, os distintos
tipos de indicadores do apego materno-fetal podem agrupa-se em três dimensões
que compõem esse construto: a cognitiva, a afetiva e a altruística:
O apego cognitivo relaciona-se ao anseio de entender, conhecer ou definir
o feto corresponde à imagem psicológica do feto produzida pela mulher grávida, sua
concepção dele como pessoa e sua atribuição às características ou intenções ao
feto. Quando as mulheres grávidas podem ver o feto como uma existência
autônoma e real, essa dimensão do apego pode ser observada, e esse processo é
especialmente favorecido devido à sua sensibilidade ao movimento fetal
(AVARENGA, 2012).
O apego afetivo corresponde ao prazer associado a fantasia e pensamentos
que envolvem o bebê, no contato indireto e interação com o feto. O fato da gestante
demonstrar entusiasmo e prazer com comportamentos como acariciar a barriga e
falar com o bebê comprova essa dimensão do apego materno fetal AVARENGA,
2012).
O apego altruístico refere-se ao fato de a mãe proteger o feto e de preparar-
se para a chegada do filho. Os comportamentos relacionados a essa dimensão são:
evitar substâncias nocivas para a saúde e o desenvolvimento do feto, preocupar-se
com a sua saúde, evitar níveis excessivos de estresse mental e físico e fazer o
acompanhamento pré-natal (CONDON, 1985 apud AVARENGA, 2012).
Alguns estudos fornecem evidências de que os indicadores do apego
materno-fetal vão aumentando ao longo da gestação, e especialmente nos últimos
meses, devido aos movimentos do feto (DIPIETRO, 2010; SHIEH et al., 2001 apud
AVARENGA, 2012).
Com base nesse conceito, alguns estudos procuram identificar os preditores
do apego materno-fetal. Características sociodemográficas da família como menor
número de filhos e maior nível de instrução, favorecem o apego materno-fetal
(Alhusen, 2008; Cannela, 2005). Além do mais, fica evidente o papel do apoio social
à gestante, de fatores fisiológicos característicos da própria gravidez como a saúde
da gestante e do bebê, e dos exames realizados no período prénatal, com destaque
para a ultrassonografia (Yarcheski et al., 2009). A literatura mostra ainda o impacto
da preocupação com a imagem corporal da gravida e os movimentos do feto
(Alhusen, 2008; Di Pietro, 2010; Huang, Wang, & Chen, 2004). Também, variáveis
psicológicas como níveis de depressão e ansiedade (Hart & McMahon, 2006;
Lindgren, 2001; Seymir, Sjögren, Welles-Nyström, & Nissen, 2009), a personalidade
e a autoestima materna têm sido associadas à formação do apego materno-fetal (DI
PIETRO, 2010; YARCHESKI, MAHON, YARCHESKI, HANKS, & CANNELLA, 2009
apud AVARENGA, 2012).

3.3 O impacto sobre a saúde mental de gestantes em relação ao diagnóstico


de malformações congênitas.

Desde início da fecundação até o nascimento, a gestante quanto o bebê


passa por experiências fisiológicas, psicológicas e sociais únicas, as quais fazem
com que a mulher tenha várias expectativas em relação ao ser que está por parir e
o papel que assumirá. Isso pode levar à super idealização da maternidade,
produzindo sintomas psicológicos, tornando esse momento um período
particularmente estressante e propenso a crises, especialmente quando ocorrem
complicações durante a gravidez (LEITHNER, 2011; PEROSA, CANAVEZ,
SILVEIRA, PADOVANI, & PERAÇOLI, 2009; ROSA et al., 2010; SETÚBAL et al.,
2004 apud CUNHA, 2016).
Obviamente, o desejo de todo casal é ter um filho perfeito e saudável, de
acordo com suas expectativas pessoais, culturais e sociais (Vasconcelos & Petean,
2009) e que origine momentos de felicidade e alegria (Perosa et al., 2009). Durante
a gravidez ocorre naturalmente um processo de projeção, gerando o desejo por um,
“bebê ideal” (Gomes & Piccinini, 2010). Porém, quando ocorre desse bebê
idealizado ser substituído por um real, com um diagnóstico de malformação
congênita, a gravidez, que é um período marcado por fantasias angustiantes em
relação à integridade do feto (Leithner, 2011; Soulé 1992), se transforma
intensamente em um momento de sofrimento e angústia emocional. Tudo isso
acontece devido à perda da possibilidade da gestação ideal (Barros, Santos, Lima,
Fonseca, & Lovisi, 2013) e a destruição de sonhos e expectativas, os quais deverão
ser refeitos à luz de uma nova realidade, sempre de difícil adaptação (ANTUNES &
PATROCÍNIO, 2007 apud CUNHA, 2016).
Enfrentar a situação requer um processo de adaptação e dependerá de
vários fatores, os quais influenciarão na capacidade de manejo desse diagnóstico.
Além da gravidade da malformação, a estrutura emocional e dinâmica familiar do
casal, as informações e o atendimento especializado prestado pela rede de saúde
são essenciais para a auto reorganização do casal e de sua família no diagnóstico
de malformação. (Setúbal et al., 2004). Portanto, enfatiza-se a importância da
atuação dos profissionais de saúde, ajudarão a família a identificar seus recursos
como suas fragilidades e necessidades, fornecendo formas de lidar com a situação
(Sunelaitis, Arruda, & Marcon, 2007). Diante da situação vivenciada, tanto a mãe
quanto a família precisarão, por parte dos profissionais de saúde, de cuidados
especiais e atenção a fim de que se sintam apoiados e respeitados, desde o prénatal
até o puerpério (Roecker et al., 2012). Segundo Ha, Anat e Longnecker (2010),
dentro esses cuidados destaca-se a relação médico-paciente pautada em
habilidades interpessoais e de comunicação do médico, que precisa ser capaz de
reunir as informações necessárias para um diagnóstico preciso, além de aconselhar
de adequadamente com instruções terapêuticas claras, dando prioridade a uma
relação acolhedora com o paciente (CUNHA, 2016).
A relação médico-paciente tem um grande desafio quando se trata da
comunicação da malformação congênita (Loaiza & Arroyave, 2009). A literatura
demonstra que os médicos se sentem apreensivos no desafio de transmitir más
notícias, já que não tiveram treinamento suficiente em habilidades de comunicação
interpessoal durante sua formação (Ha et al., 2010; Loaiza & Arroyave, 2009;
Perosa & Ranzani, 2008). Dessa forma, deixam de desempenhar seu papel de
facilitar a adesão ao tratamento e diminuir o sofrimento associado ao diagnóstico
(PEROSA & RANZANI, 2008 apud CUNHA, 2016).
Loaiza e Arroyave (2009) consideram que a má noticia precisa ser
comunicada com base em alguns princípios, desde o preparo do profissional, que
deve estar familiarizado com as informações clínicas importantes, até a escolha do
local para a comunicação onde exista o mínimo de interrupções.
Fundamentalmente, as informações sobre o diagnóstico devem ser repassadas ao
paciente de maneira fácil de entender, a fim de fornecer esperança realista para o
prognóstico da doença e fornece suporte emocional para o enfrentamento, sendo
este último também indicado por Leithner (2011). Assim, são fundamentais estudos
sobre a comunicação da notícia do diagnóstico de malformações congênitas e seus
impactos, principalmente quando se sabe que a incidência dos defeitos congênitos
é de três para cada 100 nascimentos e de uma em cada quatro mortes fetais durante
a gravidez ou na primeira semana de vida (Aymé, 2005), com prevalência de 22.985
casos para 2.913.160 nascidos vivos (BRASIL, 2013ª apud CUNHA, 2016).
Atualmente, através de exames de ultrassom, os pais já ficam sabendo da
malformação do seu bebê precocemente ao longo da gestação. Portanto, a
medicina fetal pode cumprir um duplo papel no enfretamento da situação,
acalmando ou perturbando ainda mais a reorganização do casal (Antunes &
Patrocínio, 2007). Além disso, tendo um diagnóstico precoce pode antecipar as
angústias maternas (Sousa, 2003), desencadeando sentimentos de desespero, dor,
e culpa, os quais podem causar também sequelas psicológicas graves a longo prazo
(Leithner, 2011; Loaiza & Arroyave, 2009; Perosa et al., 2009). Isso porque o choque
de um feto deficiente ou malformado pode tornar-se muito angustiante e
desestruturante para o casal e sua família (VASCONCELOS & PETEAN, 2009 apud
CUNHA, 2016).
Essa situação precisa de atenção, já que na gestação, sendo um período
sensível por si só, pode ocorrer maior ansiedade e estresse parental diante desse
tipo de notícia, os quais são vividos ao longo de todo processo de investigação
diagnóstica (Loaiza & Arroyave, 2009; Setúbal et al., 2004; Sousa, 2003).
Resultando em acelerado desinvestimento na gravidez, tendo como consequências
na saúde mental da mulher e repercussões na dinâmica familiar. Dessa forma, é
importante a realização de estudos que contribuam com dados empíricos os quais
auxiliem no entendimento dessa vivência pelo casal grávido (CUNHA, 2016).
Esse tema aborda ainda relevância social, já que, em casos de malformações
incompatíveis com a vida, os pais precisam lidar com um dilema moral: a complicada
decisão de interromper ou não o curso da gravidez (Antunes & Patrocínio, 2007;
Leithner, 2011). Essa decisão é aceita por lei no Brasil nos casos de anencefalia
(Brasil, 2013b). Ainda, o casal tem que lidar com o estigma de “imperfeitos”,
“defeituosos”, ou “anormais”, assim como potenciais transmissores de defeitos às
próximas gerações (CARDOSO, 2001 apud CUNHA, 2016).
Logo, um diagnóstico bem executado e de forma esclarecida seja
comunicado, pode servir para que o casal e toda a família enfrente de forma mais
resiliente a situação, a partir da prática de um cuidado humanizado por toda a equipe
de saúde. O cuidado humanizado ajudará na elaboração do luto vivenciado pelos
pais após as reações iniciais ao diagnóstico de malformação, ajudando-os a lidar
com os sentimentos ambivalentes de medo e esperança, confiança e sofrimento,
otimismo e pessimismo resultantes das diferentes expectativas positivas e
negativas criadas por uma gestação de risco (CHAPLIN, SCHWITZER, &
PERKOULIDIS, 2005 apud CUNHA, 2016).

4 SAÚDE MENTAL DE ADOLESCENTES NA GRAVIDEZ

4.1 Estresse

Nos últimos tempos o estresse vem sendo estudado na área da saúde,


procurando observar o resultado da dinâmica dos mundos subjetivos e objetivos.
Esta relação atribui a todo o momento, a necessidades de ajustamentos, tentativas
constantes de adaptação às várias contingências do viver. O termo estresse foi
utilizado inicialmente por Seyle em 1936, e definido como sendo uma resposta do
corpo a qualquer demanda que o forçasse a adaptar-se a uma mudança
(PANIZZON, PANIZZON, 2008; KAPCZINSKI, MARGIS 2003 apud CORREIA,
2012).
O organismo, exposto a um esforço causado por um estímulo interpretado
como ameaçador a homeostase, seja químico, físico, psicossocial, biológico,
evidencia uma tendência a reagir de forma uniforme e inespecífica, envolvendo-o
todo. A esse processo chamou-se de Síndrome Geral de Adaptação (SGA),
classificando-o em três fases: reação de alarme/alerta, fase de resistência e fase
de exaustão (SEYLE, 1936 apud CORREIA, 2012).
A fase de alarme é caracterizada pelo aparecimento de uma excitação, quer
seja de desejo de fuga agressão ou resultante da ação do estressor. Esta fase inicial
do processo de estresse pode ser compreendida como um comportamento de
adaptação. Sendo um momento entendido como reação saudável, porque existe a
probabilidade do retorno a uma situação de equilíbrio, após a experiência
estressante (RODRIGUES AL, GASPARINI, 1992, LIPP, 2003 apud CORREIA,
2012).
A segunda fase, a de resistência, o organismo modifica seus parâmetros
de normalidade e concentra a reação interna em um determinado órgão-alvo,
desencadeando a Síndrome de Adaptação Local (SAL). Nesse momento, ocorre a
manifestação de sintomas da esfera psicossocial, tais como: medo, ansiedade,
isolamento social, oscilação do apetite, roer unhas, impotência sexual
(RODRIGUES AL, GASPARINI, 1992, LIPP, 2003 Apud CORREIA, 2012).
A terceira fase, a de exaustão, o organismo está esgotado pelo excesso de
atividades e pelo alto consumo de energia na busca da homeostase. Assim ocorre,
a falência do órgão mobilizado na SAL, que se manifesta sob a forma de doenças
orgânicas (LIPP, 2003 apud CORREIA, 2012).
Lipp, pesquisadora brasileira, identificou uma outra fase no processo de
estresse, tanto clínica como estatisticamente significante, como se encontra entre a
fase de resistência e a de exaustão denominou-a de fase de quase-exaustão.
Caracteriza-se por um enfraquecimento do organismo, que não pode mais adaptar-
se ou resistir ao fator estressor. Nesta fase ocorre o surgimento de doenças, mas
as patologias ainda não são tão graves, como aquelas que aparecem na fase
posterior que é a de exaustão (LIPP, 2003 apud CORREIA, 2012).
Desta forma, a gravidez é um período que provoca modificações psíquicas e
físicas na mulher, associada a uma maior fragilidade da sua saúde mental. A
adolescência compõe-se por si só uma fase delicada do desenvolvimento humano;
fase de busca de uma nova identidade, transições de papel. No caso da ocorrência
de uma gravidez precoce, é exigido da mulher adolescente, competências
psicoemocionais de difícil enfrentamento (SABROZA, 2001 apud CORREIA, 2012).

4.2 Gravidez na adolescência e suas vulnerabilidades

O crescimento da gravidez na adolescência vem aumentando no Brasil, com


destaque na faixa que vai dos 10 aos 14 anos. Inerente a esse aumento, existe uma
alta prevalência de repercussões médicas e sociais entre as jovens que, muitas
vezes, descuidam de aspectos de sua saúde configurando como uma situação de
risco. Na rede do Sistema Único de Saúde (SUS), a gravidez é a primeira causa de
internações médicas, dos 10 aos 19 anos, que corresponde a um quarto do total de
partos. Em 2000, dos 2,5 milhões de partos concretizados nos hospitais públicos do
país, 689 mil foram de adolescentes com menos de 20 anos de idade, na maioria
pertencente às camadas populares. A literatura também mostra é maior o a
incidência de gravidez não planejada/não desejada, entre mães adolescentes, como
também um fraco vínculo entre mãe e bebê no período pré-natal (SUS, 2000).
(FREITAS; BOTEGA, 2002; DADOORIAN, 2003 apud CORREIA et al. 2011).

https://saude.to.gov.br
A gestação na adolescência é responsável por um número de mortalidade
materna e perinatal. No Brasil, esses números estão relacionados a complicações
da própria gravidez, parto e puerpério. As complicações e lesões mais frequentes
são: toxemia gravídica, disfunção uterina, maior índice de parto cesárea,
desproporção céfalo-pélvica, síndromes hemorrágicas, lacerações perineais,
amniorrexe prematura, prematuridade, anemia materna, trabalho de parto
prolongado, infecções urogenitais, abortamento, baixo peso ao nascer
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1993; FIGUEIREDO et. al., 2005 apud CORREIA et al.
2011).
Desse modo,

“As adolescentes precisam ser orientadas quanto à importância do pré-


natal com vistas à promoção da saúde e à prevenção de doenças
decorrentes da gravidez”. (Duarte, 2003)

Os riscos da gravidez nesse momento estão relacionados a aspectos


psicológicos tais como: níveis elevados de estresse, ausência de apoio familiar,
presença de sintomas depressivos, bem como alta prevalência de repercussões
emocionais, pouca expectativa em relação ao futuro; encontra-se em um terço dos
casos, altos índices de sofrimento psíquico. Os estudos destacam que a presença
do estresse exerce influência na relação da mãe com seu bebê, como por exemplo
da elevação de casos de maus tratos em filhos, quando a gravidez não é planejada
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1993; FIGUEIREDO et. al., 2005 apud CORREIA et al.
2011).
Nossa cultura valoriza a maternidade, alguns estudos destacam a relação
entre a gravidez precoce e status que ela traz a mulher, ou seja, as adolescentes
em situação de vulnerabilidade social encontram em sua gravidez uma possibilidade
de reconhecimento social, uma adaptação à circunstância de pobreza ante a falta
de oportunidades vivida por elas, diminuindo este tipo de sofrimento (DADOORIAN,
2003; FIGUEIREDO et. al., 2005 apud CORREIA et al. 2011).
Sendo afirmado por Bretas (2002),
“O contexto familiar é fundamental na definição das experiências de
crescimento, desenvolvimento e construção da identidade do adolescente
e deve ser visualizado como processo dinâmico em que histórias de vida
e projetos individuais interagem e se conformam num complexo de
relações plurais e não excludentes, de afetos, de poder e resistência, de
conflitos e dominação, de cooperação e harmonia, entre outras”.

O quadro clínico de uma pessoa pode ser avaliado pelos: sinais (evidências
objetivas do estado mórbido); sintomas (fenômenos ou mudanças referidas pela
pessoa no momento do exame, que facilitam a obtenção do diagnóstico). A
gestação é um período em que o corpo da mulher sofre várias transformações e
adaptações provocando sinais e sintomas considerados comuns a este período.
Todavia, quando os mesmos ultrapassam os níveis da normalidade aceitos, ou
surgem outros não comuns ao período, podem surgir intercorrências que resultem
em complicações, podendo trazer riscos a mulher e ao feto (CORREIA et al. 2011).

5 SAÚDE MENTAL DE GESTANTES QUE CONVIVEM COM DOENÇAS


CRÔNICAS

A gestação é uma experiência única na vida de uma mulher. Nesse período,


ocorrem mudanças físicas, sociais e emocionais que são capazes de gerar
ansiedade, medo, novas descobertas e expectativas, o que requer instruções e
ensinamentos para auxiliá-la no que tange a gestação, autocuidado, preparo para o
parto e para a maternidade (Vasques, 2006). Por ser um fenômeno fisiológico, a
gestação, tem o seu desenvolvimento, na maioria dos casos, sem intercorrências.
Entretanto, algumas mulheres por apresentarem algum tipo de patologia crônica,
sofrerem algum dano ou desenvolverem problemas, se tornam vulneráveis a evoluir
para uma gestação prejudicial, tanto para a mãe quanto para o feto (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2012 apud SILVEIRA, 2016).
A doença crônica, por várias vezes, pode significar ameaça aos planos
futuros de dos indivíduos, já que são impostas mudanças grandes nos seus padrões
de consumo, hábitos e rotina, além do controle permanente de sinais e sintomas
que, se não mantidos dentro dos padrões, podem progredir para níveis mais graves
e ocasionar a morte (Quevedo, Lopes, e Lefevre, 2006). A mulher que convive com
a doença crônica se tornará uma grávida de alto risco. Em virtude disso, poderá
encontrar dificuldades para as adaptações emocionais impostas pela nova
realidade. Em consequência da doença crônica se tornar um fator de risco à
gestação, podem acabar surgindo determinadas situações como: o medo em a
saúde do bebê e sua própria saúde; as mudanças que estão ocorrendo com seu
corpo; o medo de seu filho nascer com alguma anormalidade e, acrescentando a
esses fatores, a perda de controle em relação de si mesma e da gravidez (Quevedo,
2010). Urge que o enfermeiro no pré-natal desenvolva conhecimentos e
sensibilidade para detectar e entender o processo emocional que rodeia o
acompanhamento da gestação de alto risco (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012
SILVEIRA, 2016).).
A assistência ao pré-natal tem conquistado cuidado especial na saúde
materno-infantil, em decorrência de taxas desfavoráveis relacionada aos
coeficientes de mortalidade materna e infantil o que tem estimulado o
desenvolvimento de políticas voltadas ao ciclo gestacional e puerperal, como o
Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento (PHPN) (Duarte, 2012). Tal
programa visa assegurar a melhoria do acesso, da cobertura e da assistência ao
parto e puerpério às gestantes e aos recém-nascidos. Entre as ações realizadas
pelo programa estão: exames laboratoriais básicos e os procedimentos obstétricos
considerados essenciais, classificados como adequados, inadequados ou
intermediários (DUARTE, 2012 apud SILVEIRA, 2016).
Dessa forma, o pré-natal oferece como um conjunto de ações voltadas ao
bebê e à mulher grávida, que objetiva: confirmar ou diagnosticar enfermidades
maternas; realizar o tratamento; tratar as complicações clínicas referentes à
gravidez; acompanhar a evolução da gravidez a partir das condições da gestante e
o desenvolvimento fetal; dirigir quanto medidas de prevenção para saúde da
gestante/feto e instruir a mãe para o momento do parto e o posterior aleitamento
(CALDAS, SILVA, BOING, CREPALDI, CUSTÓDIO, 2013 apud SILVEIRA, 2016).
Com a aumento do Programa Saúde da Família, a assistência a gestante no
pré-natal acontece de forma multidisciplinar, admitindo que as condutas e cuidados
sejam divididos (DUARTE, 2012 apud SILVEIRA, 2016).
De acordo com o funcionamento atual do Sistema Único de Saúde, a atenção
básica é responsável por realizar atendimento ambulatorial de pré-natal de grávidas
que não oferecem risco e por conduzir as gestantes identificadas como “alto risco”
para os serviços de referência (CALDAS et al., 2013 apud SILVEIRA, 2016).
O objetivo da assistência pré-natal de alto risco incide em intervir para
atenuar os danos que as complicações pertinentes à patologia materna possam
causar para a mãe e para o feto (SILVEIRA, 2016).
Entretanto diante da complexidade envolvida em gestações de mulheres que
convivem com doenças crônicas (gestação de alto risco), a assistência de saúde
prestada se limita a consulta médica individual, que tem como foco a patologia e
como esta influência na vida da mãe e do feto, não sendo abordadas questões que
envolvam o estado emocional da gestante e como a mesma enfrenta as situações
impostas pela doença (SILVEIRA, 2016).
Maçola, Vale e Carmona (2010) relatam que estudos evidenciam a
importância da atenção à saúde mental da gestante e sua relação com o
desenvolvimento do vínculo mãe-filho. Porém, ainda é escassa a realização de
programas de pré-natal que abordem efetivamente as questões emocionais,
visando auxiliar a mulher a lidar com o processo de gestação e maternidade
(SILVEIRA, 2016).
Assim, a inclusão de estratégias de promoção da saúde mental das grávidas
no âmbito do pré-natal torna-se essencial, porque visa minimizar os efeitos
negativos que a presença da patologia na gestação possa gerar. Para Guerra,
Braga, Quelhas e Silva (2014) algumas estratégias marcadas como promotoras de
saúde mental em gestantes são: identificação no início da gestação de fatores de
risco, estabelecimento de uma relação de confiança com o enfermeiro especialista
em saúde materna e obstétrica, preparação para o desempenho de seu papel,
identificação da rede de suporte social, estimular o envolvimento do pai na vigilância
da gestação nos cuidados com a criança e realização de cursos de preparação para
a parentalidade em grupo (SILVEIRA, 2016).
É fato que a assistência à mulher durante o pré-natal já não se satisfaz mais
com medidas biomédicas, a gestação passou a ser vista como um momento de
mudanças não apenas fisiológicas, mas também, como um momento de profundas
transformações emocionais e biopsicossociais, onde cada casal a vivencia de forma
única, exigindo, portanto, atenção individualizada e holística (SANTOS, 2014 apud
SILVEIRA, 2016).

6 TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS NA GESTAÇÃO E NO PUERPÉRIO

6.1 Gestação e o puerpério

A gestação e o puerpério são momentos da vida da mulher que necessitam


ser avaliados com cuidado especial, já que envolvem bastantes alterações físicas,
hormonais, psíquicas e de inserção social, que podem refletir de forma direta na
saúde mental dessas pacientes (CAMACHO et al., 2006).
Tem-se dado importância cada vez maior a essa temática, e estudos
contemporâneos têm objetivado delinear os fatores de risco para os transtornos
psiquiátricos nessas fases da vida, a fim de realizar diagnóstico e tratamento o mais
precocemente possível (CAMACHO et al., 2006).

Estudos recentes revelaram que transtornos psiquiátricos subdiagnosticados


e não tratados em gestantes podem levar a graves consequências materno fetais,
até mesmo durante o trabalho de parto (JABLENSKY et al., 2005; SENG et al., 2001
apud CAMACHO et al., 2006).
É sabido que a presença de depressão ou ansiedade na gravidez está
associada a sintomas depressivos no puerpério (BLOCH et al., 2003 apud
CAMACHO et al., 2006).
https://www.naomaispelo.com.br

Esses temas têm sido mais pesquisados nas últimas décadas e ainda não há
especificação para essas patologias na Classificação Internacional de Doenças
(CID-10), a não ser como diagnóstico de exclusão, no caso dos transtornos
relacionados ao puerpério (CAMACHO et al., 2006).
O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, na sua quarta
edição e com texto revisado (DSM-IV-TR), não distingue os transtornos do humor
do pós-parto daqueles que ocorrem em outros períodos, exceto como especificador
"com início no pós-parto", que é usado quando o surgimento dos sintomas acontece
no período de quatro semanas após o parto (CANTILINO, 2003 apud CAMACHO et
al., 2006).

6.2 Epidemiologia

Apesar da gestação ser considerada um momento de bem-estar emocional


e de se acreditar que a vinda da maternidade seja uma ocasião alegre na vida da
mulher, o período perinatal não a protege dos transtornos do humor (CAMACHO et
al., 2006).
Estima-se uma prevalência de depressão na gravidez da ordem de 7,4% no
primeiro, 12,8% no segundo e 12% no terceiro trimestre (BENNETT et al., 2004
apud CAMACHO et al., 2006).).
Nas adolescentes, verificou-se prevalência entre 16% e 44%, quase duas
vezes mais elevada que nas grávidas adultas, podendo relacionar à falta de
maturidade afetiva e de relacionamentos dessas pacientes, bem como ao fato de
grande parte delas precisarem abandonar seus estudos em razão da maternidade
(SZIGETHY; RUIZ, 2001 apud CAMACHO et al., 2006).
A disforia no pós-parto (maternity blues) inclui sintomas depressivos leves e
pode ser identificada em 50% a 85% das puérperas, dependendo dos critérios
diagnósticos utilizados (CANTILINO, 2003 apud CAMACHO et al., 2006).

https://drauziovarella.uol.com.br

Um estudo com 1.558 mulheres detectou 17% das gestantes com sintomas
significativos para depressão na gestação tardia, 18% no puerpério imediato e 13%
entre a sexta e a oitava semanas do puerpério. O mesmo valor (13%) foi encontrado
no sexto mês do puerpério (JOSEFSSON et al., 2001 apud CAMACHO et al., 2006).
Um outro estudo verificou valores oscilando entre 8,6% e 10,1% para o
diagnóstico de depressão entre a 6ª e a 24ª semanas do puerpério (BOYCE;
HICKEY, 2005 CAMACHO et al., 2006)
Uma metanálise de 59 estudos evidenciou uma estimativa de prevalência de
depressão pós-parto da ordem de 13% (O’HARA; SWAIN, 1996 apud CAMACHO
et al., 2006).
A psicose puerperal é um quadro bem mais raro, e casos encontrados foi
entre 1,1 e 4 para cada 1.000 nascimentos (BLOCH et al., 2003 apud CAMACHO
et al., 2006).

6.3 Principais Fatores de Risco

Os principais fatores de risco psicossociais relacionados à depressão maior


no puerpério são: idade inferior a 16 anos, história de transtorno psiquiátrico prévio,
eventos estressantes experimentados nos últimos 12 meses, conflitos conjugais,
ser solteira ou divorciada, estar desempregada (a paciente ou o seu cônjuge) e
apresentar pouco suporte social (CAMACHO et al., 2006).
Outros fatores de risco registrados foram: personalidade vulnerável
(mulheres pouco organizadas ou responsáveis), estar aguardando um bebê do sexo
oposto ao desejado, proporcionar poucas relações afetivas satisfatórias e suporte
emocional deficiente (Boyce e Hickey, 2005). Abortos espontâneos ou de repetição
também foram indicados como fatores de risco (BOTEGA, 2006 apud CAMACHO
et al., 2006).
Mulheres mais suscetíveis aos transtornos do humor no puerpério também
teriam diagnóstico de transtorno disfórico pré-menstrual ou apresentaram sintomas
depressivos no segundo ou quarto dia do pós-parto. Pacientes que tiverem história
de sensibilidade aumentada ao uso de anticoncepcionais orais também seriam mais
vulneráveis (BLOCH et al., 2005 apud CAMACHO et al., 2006).
Um outro estudo tentou relacionar gravidez indesejada e o risco para
depressão, mas os resultados foram pouco conclusivos. Identificou-se apenas que
mulheres com melhor rendimento financeiro e escolaridade mais alta apresentavam
menor risco, já as mulheres vindas de famílias populosas apresentavam alto risco
para depressão. Levantou-se também a hipótese de que a existência prévia de
transtorno mental pode ser o mais relevante fator associado ao risco de ter novos
episódios no puerpério (SCHMIEGE; RUSSO, 2005 apud CAMACHO et al., 2006).
Mulheres portadoras de transtorno afetivo bipolar apresentaram risco
elevado de psicose puerperal (260/1.000) quando comparadas a mulheres
saudáveis, que apresentavam 1 a 2 casos a cada 1.000 puérperas (CHAUDRON;
PIES, 2003 apud CAMACHO et al., 2006).

6.4 Etiologia

A etiologia da depressão puerperal ainda não é totalmente conhecida, porém


acredita-se que, além dos fatores de risco mencionados acima, fatores hereditários
e hormonais também estejam envolvidos CAMACHO et al., 2006).
Na gestação, os níveis de estrógeno e progesterona são superiores àqueles
vistos nas mulheres fora do período gestacional e esse fator pode estar envolvido
nas alterações do humor que ocorrem nessa fase. A queda brusca desses
hormônios no pós-parto estaria envolvida na etiologia da depressão puerperal.
Bloch et al. (2003) realizaram uma revisão da literatura a fim de correlacionarem os
fatores endócrinos e hereditários com a etiologia desse transtorno. Não se
constatou relação genética diferente daquela já esperada em quadros não
puerperais. Levantou-se a hipótese de que determinadas mulheres seriam mais
sensíveis a mudanças hormonais em qualquer período de suas vidas, incluindo-se
período pré-menstrual, menarca, gravidez, puerpério, menopausa e até mesmo
durante o uso de anticoncepcionais (CAMACHO et al., 2006).

6.5 Transtorno obsessivo-compulsivo – TOC

Das gestantes portadoras de TOC, 46% apresentaram piora da


sintomatologia na primeira gestação e 50%, na segunda gestação. Sintomas de
TOC são freqüentes no pós-parto e incluem pensamentos e obsessões
relacionados a possíveis contaminações da criança e pensamentos obsessivos
negativos em relação ao trabalho de parto (LABAD et al., 2005 apud CAMACHO et
al., 2006).
A gravidez também se associa ao aparecimento do TOC em 13% das
mulheres e constatou-se o agravamento da sintomatologia em 29% das puérperas.
Mulheres portadoras de TOC podem apresentar também alto risco para o
desenvolvimento de depressão pós-parto (WILLIAMS; KORAN, 1997 apud
CAMACHO et al., 2006).

6.6 Transtorno do pânico

Fonte: https://www.vix.com

Um estudo comparou a sintomatologia em mulheres com transtorno do


pânico diagnosticado previamente e constatou que 43% dessas pacientes
apresentaram melhora dos sintomas ansiosos na gestação, 33%, piora e 24% não
apresentaram nenhuma alteração. Já no sexto mês do puerpério, 63% tiveram piora
dos sintomas de pânico (NORTHCOTT; STEIN, 1994 apud CAMACHO et al., 2006).
Um outro estudo verificou que o puerpério seria um período de alta
vulnerabilidade para o desencadeamento do primeiro episódio de pânico. Entre as
mulheres estudadas, 10,9% exibiram o surgimento dos sintomas no puerpério
(neste caso, até 12 semanas do puerpério), um número bem maior do que o
esperado, que é de 0,92% (CAMACHO et al., 2006).

6.7 Transtornos puerperais

Os transtornos psiquiátricos puerperais são caracteristicamente


classificados como: disforia do pós-parto (puerperal blues), depressão pós-parto e
psicose puerperal (CHAUDRON; PIES, 2003 apud CAMACHO et al., 2006).
A puerperal blues acomete as mulheres nos primeiros dias após o
nascimento do bebê, alcançando um pico no quarto ou quinto dia após o parto e
remitindo de forma espontânea, no máximo, em duas semanas. Inclui labilidade do
humor, irritabilidade e comportamento hostil para com familiares e acompanhantes,
choro fácil. Esses quadros geralmente não precisam de intervenção farmacológica,
e a abordagem é realizada no sentido de sustentar suporte emocional,
compreensão e ajuda nos cuidados com o bebê (Cantilino, 2003). Evidências
sugerem que a depressão pós-parto pode ser parte ou prolongamento da depressão
iniciada na gestação (RYAN et al., 2005 apud CAMACHO et al., 2006).
Os sinais e sintomas de depressão perinatal são pouco diferentes daqueles
característicos do transtorno depressivo maior não psicótico que se desenvolvem
em mulheres em outras épocas da vida. As pacientes apresentam-se com humor
deprimido, choro fácil, labilidade afetiva, irritabilidade, perda de interesse pelas
atividades habituais, sentimento de culpa e capacidade de concentração
prejudicada. Sintomas neurovegetativos, incluindo insônia e perda do apetite, são
descritos com frequência (Nonacs e Cohen, 1998; Gold, 2002). Contudo, alguns
sintomas somáticos podem ser confundidos com situações normais desse período.
Assim, sintomas como hipersonia, aumento de apetite, fadigabilidade fácil,
diminuição do desejo sexual e queixas de dor e desconfortos em diferentes sistemas
são de pouca utilidade para o diagnóstico de depressão nessa fase (CAMACHO et
al., 2006).
É relevante frisar que muitas mulheres com depressão perinatal não falam
sobre os seus sintomas de depressão com medo de possível estigmatização
(Epperson, 1999). As mulheres sentem que as expectativas sociais são de que elas
fiquem satisfeitas e acabam sentindo-se responsáveis por estarem vivenciando
sintomas depressivos num momento que deveria ser de alegria (CAMACHO et al.,
2006).
Algumas particularidades clínicas são descritas na depressão pós-parto. Há
sugestão de haver um componente ansioso mais proeminente (Ross et al., 2003),
além de pensamentos recorrentes de causar danos ao bebê (JENNINGS et al., 1999
apud CAMACHO et al., 2006).
Wisner et al. (1999) analisaram pensamentos obsessivos em mulheres
deprimidas e observaram que mulheres com depressão pós-parto tinham mais
pensamentos de agressividade contra seus filhos do que mulheres deprimidas fora
do período pós-parto, independentemente da gravidade do quadro. Godfroid et al.
(1997), em estudo polissonográfico em mulheres com depressão, mostraram que
mulheres com depressão pós-parto tinham aumento significativo na fase IV do sono
e menor tempo de estágio I quando comparadas a mulheres com depressão de
gravidade semelhante fora do período pós-parto. Hendrick et al. (2000), também
numa comparação entre mulheres com depressão no pós-parto e fora dele,
perceberam que a depressão pós-parto exige tempo maior para responder à
farmacoterapia e tem a tendência de precisar de mais agentes antidepressivos para
se obter remissão dos sintomas. Além disso, é reiterado o relato de sentimentos
ambivalentes acerca do bebê e de opressão pela responsabilidade de criar os filhos
(Beck, 1996; Nonacs e Cohen, 2000). Esses dados apresentam-se em favor da
especificidade do conceito de depressão pós-parto (CAMACHO et al., 2006).
https://dicasdadoutora.com.br

A psicose puerperal costuma ter início mais abrupto. Estudos verificaram que
2/3 das mulheres que apresentaram psicose puerperal iniciaram sintomatologia nas
duas primeiras semanas após o nascimento de seus filhos. Descreve-se um quadro
com presença de delírios, alucinações e estado confusional que parece ser peculiar
aos quadros de psicose puerperal. Pode haver sintomas depressivos, maníacos ou
mistos associados. Não foi estabelecida nenhuma apresentação típica. No entanto,
essas mulheres costumam apresentar comportamento desorganizado e delírios que
envolvem seus filhos, com pensamentos de lhes provocar algum tipo de dano.
Apesar de o suicídio ser raro no período puerperal em geral, a incidência deste nas
pacientes com transtornos psicóticos nesse período é alta, necessitando muitas
vezes de intervenção hospitalar por esse motivo, bem como pelo risco de
infanticídio. Sintomas depressivos, mais do que maníacos, em geral estão
associados aos quadros em que ocorrem infanticídio ou suicídio (CHAUDRON;
PIES, 2003 apud CAMACHO et al., 2006).
Estudos neurocientíficos atuais amparam a hipótese de que a mulher
portadora de psicose puerperal que comete infanticídio precisa mais de tratamento
e reabilitação do que de punição legal, a fim de se impedirem outros casos
decorrentes da gravidade do quadro; hoje em dia, alguns países já defendem essa
hipótese. A educação familiar também estaria presente nesse tipo de intervenção
(SPINELLI, 2004 apud CAMACHO et al., 2006).

6.8 Mulheres com depressão pós-parto

Mulheres no puerpério com frequência são examinadas por seus obstetras


ou clínicos gerais em consultas focadas na recuperação física após o parto. Além
disso, são vistas por pediatras dos seus filhos de quatro a seis vezes durante o ano
seguinte ao nascimento de seu bebê. Quando apresentam depressão, embora
busquem ajuda mais comumente com esses médicos do que com profissionais de
saúde mental (Gold, 2002), muitas vezes não são diagnosticadas ou reconhecidas
como deprimidas de forma adequada. Trabalhos recentes vêm mostrando a
utilidade do uso de escalas de auto avaliação para triagem de mulheres com
depressão pós-parto em serviços de atendimento primário (Buist et al., 2002). A
possibilidade de detectar a depressão pós-parto com essas escalas tem-se
mostrado expressivamente maior que a detecção espontânea durante avaliações
clínicas de rotina por médicos nesses serviços (Fergerson et al., 2002). As escalas
serviriam para alertar clínicos, obstetras e pediatras para aquelas mulheres que
possivelmente precisariam de avaliação mais profunda e tratamento CAMACHO et
al., 2006).
No Brasil, onde os médicos a cada dia se veem obrigados a realizar
atendimentos em um grande número de pacientes com uma disponibilidade de
tempo pequena, instrumentos desse tipo acabam tendo valor considerável.
Ademais, essas escalas são autoaplicáveis e de fácil uso por profissionais não
médicos e sem especialização em saúde mental. Essas características fazem com
que o procedimento de aplicação destas sejam, além de prático, considerados de
baixo custo, o que torna viável o seu uso em serviços de atenção primária à saúde.
Pensando nessa praticidade, foram criadas duas escalas desenhadas
especificamente para rastreamento de depressão pós-parto: a EPDS, em 1987, e a
Postpartum Depression Screening Scale (PDSS), em 2000. Ambas já possuem
tradução para o português e validação no Brasil, sendo o estudo da PDSS realizado
por um dos autores deste artigo (CANTILINO, 2003 apud CAMACHO et al., 2006).
A EPDS (Cox et al., 1987) foi o primeiro instrumento achado na literatura
desenvolvido para triar especificamente a depressão pós-parto. A EPDS é um
instrumento de auto registro que têm 10 questões de sintomas comuns de
depressão e que usa formato de respostas do tipo Likert. A mãe indica as respostas
que descrevem melhor o modo como tem se sentido na última semana (CAMACHO
et al., 2006).
Realizando um estudo fenomenológico de depressão pós-parto, Beck (1992)
percebeu temas que descreviam mais sobre a essência dessa experiência. Esses
temas tinham relação com solidão insuportável, pensamentos obsessivos,
sensação de estar fora de si, culpa sufocante, dificuldades cognitivas, perda de
interesses prévios, ansiedade incontrolável, insegurança, perda de controle das
emoções e ideias relacionadas à morte. Um outro estudo fenomenológico
administrado por Beck (1996) investigou especificamente o significado de
experiências de mães com depressão pós-parto que interagiram com seus bebês e
crianças mais velhas. Em um estudo de avaliação de instrumentos para depressão
em mulheres no pós-parto, Ugariza (2000) apontou a necessidade de uma escala
de avaliação que possa mensurar sintomas específicos de depressão pós-parto.
Considerando as observações feitas nos estudos e buscando maior acurácia na
triagem de pacientes com depressão pós-parto, idealizou-se a criação de uma nova
escala que abrangesse esses conceitos CAMACHO et al., 2006).
Existem outros instrumentos para essa avaliação.

6.9 Importância do diagnóstico e do tratamento precoce

O infanticídio e o suicídio estão entre as complicações mais graves


decorrentes de transtornos puerperais sem intervenção adequada. No entanto, a
existência de transtornos psiquiátricos não só no puerpério, mas também na
gestação, pode levar a outras graves consequências CAMACHO et al., 2006).
https://noticias.r7.com

Mulheres com diagnóstico de depressão maior ou esquizofrenia exibem


elevado risco de complicações na gravidez, trabalho de parto e período neonatal.
Entre essas complicações, existe as anormalidades placentárias, hemorragias e
sofrimento fetal. Mulheres com esquizofrenia apresentam alto risco de
descolamento prematuro de placenta e, mais frequentemente, tiveram filhos com
baixo peso ao nascer. Seus bebês também apresentaram malformações
cardiovasculares e menor circunferência encefálica do que os filhos de mães
saudáveis (JABLENSKY et al., 2005 apud CAMACHO et al., 2006).
Seng et al. (2001) constataram que mulheres portadoras de transtorno de
estresse pós-traumático exibem alto risco para gestação ectópica, abortamento
espontâneo, hiperemese gravídica, contrações uterinas prematuras e crescimento
fetal excessivo (CAMACHO et al., 2006).
O relacionamento mãe-filho também demonstrou estar prejudicado quando
foram avaliadas 507 mães e seus filhos, aos 3 meses de idade. Os filhos de mães
que apresentaram diagnóstico de depressão pós-parto tinham dificuldades para
dormir e se alimentar. Apresentavam também prejuízos de interação corporal com
o ambiente e sorriso social diminuído. Essas pacientes queixavam-se com muita
frequência de cansaço excessivo, o que acabava refletindo de forma negativa no
relacionamento com seus filhos e, por consequência, no desenvolvimento deles
(RIGUETTII-VELTEMA et al., 2002 apud CAMACHO et al., 2006).
Deve-se, assim, avaliar cada caso com especial cautela, a fim de pôr a
melhor estratégia de tratamento para cada caso em particular, da maneira mais
precoce possível (CAMACHO et al., 2006).

6.10 Opções de tratamento

Pesquisas têm utilizado técnicas de tratamento psicofarmacológico,


psicossocial, psicoterápico e tratamentos hormonais, além da eletroconvulsoterapia
(ECT), indicada para casos mais graves ou refratários a outras formas de
tratamento. A maioria das intervenções psicossociais e hormonais tem-se mostrado
pouco eficiente. Entretanto, resultados de estudos focados sobre psicoterapia
interpessoal, estratégias cognitivo-comportamentais e intervenções farmacológicas
têm-se evidenciado eficientes (CAMACHO et al., 2006).

6.11 Utilização de psicofármacos durante a amamentação

Hoje em dia, muitos antidepressivos estão sendo analisados em relação à


lactação, e os ISRS foram os menos presentes no leite materno. Entre eles, a
sertralina e a paroxetina apresentam como melhores alternativas (Haberg e
Matheson, 1997). Também foram consideradas seguras (de baixo risco) as
seguintes drogas: sulpirida, a maior parte dos tricíclicos, triptofano, moclobemida,
benzodiazepínicos em dose baixa e única, zolpidem, carbamazepina, valproato em
doses baixas e fenitoína (CAMACHO et al., 2006).
Drogas como haloperidol, fenotiazinas em baixas doses, IMAOS,
mirtazapina, ISRS, trazodona, benzodiazepínicos e betabloqueadores foram
consideradas de risco moderado (CAMACHO et al., 2006).
A clozapina é contra-indicada pelo risco de agranulocitose, e estudos
realizados em animais detectaram-na no leite. Antipsicóticos de última geração
ainda têm poucos estudos, devendo-se então não os utilizar. Deve-se evitar também
o uso do carbonato de lítio porque é tóxico para o bebê. Ainda existe poucos estudos
relacionados aos novos antidepressivos para que possam ser usados com
segurança (BOTEGA et al., 2006 apud CAMACHO et al., 2006).

6.12 Tratamento hormonal

O tratamento hormonal nos transtornos do humor é muito antigo, e


atualmente o uso de estrógenos sublinguais e transdérmicos, como o 17-B estradiol
tem sido testado no tratamento da depressão pós-parto (Murray, 1996). Embora
esses relatos proponham que o uso de estrógenos tenha bons resultados, apenas
números modestos de melhora sintomática foram apresentados. Acredita-se que os
estrógenos atuem pela interação com receptores do núcleo e de membranas
celulares (McEwen, 1999). A ação desses hormônios sobre receptores de
membrana representaria um papel relevante na síntese, na liberação e no
metabolismo de neurotransmissores, como a dopamina, a noradrenalina, a
serotonina e a acetilcolina (Stahl, 2001). Os estrógenos também atuariam sobre
neuropeptídeos (por exemplo, fator de liberação de corticotrofinas [CRF],
neuropeptídeo Y [NPY]), influenciando também a modulagem de outras atividades,
como a termo regulação em centros hipotalâmicos, e o controle da saciedade, do
apetite e da pressão arterial sanguínea. Assim, em momentos de modificações
abruptas dos níveis de estrógenos circulantes, aconteceria maior vulnerabilidade
para o desenvolvimento de transtornos psíquicos na mulher, particularmente de
cognição e do humor (CAMACHO et al., 2006).
Em relação à utilização de doses supra fisiológicas de estrogênios, são
necessários mais estudos que comprovem sua eficácia em mulheres que estão
amamentando. Essa modalidade de tratamento não é a primeira escolha ao se
considerarem riscos e benefícios do tratamento estrogênico para mulheres em fase
reprodutiva (CAMACHO et al., 2006).
6.13 Psicoterapia

http://www.ficargravida.com.br

Muitas mulheres repudiam ou não acolhem o tratamento farmacológico


quando descobrem estar grávidas, e conforme a história de evolução e menor
gravidade da doença, a psicoterapia é uma ótima opção de tratamento (CAMACHO
et al., 2006).
Segundo a pesquisa realizada pelo Instituto de Psiquiatria e Neurociência do
King's College London, no Reino Unido:

"A decisão sobre o tratamento tem que ser bem informada, para que mãe
e médico cheguem à alternativa considerada mais adequada."

A psicoterapia também pode ser uma aliada no que diz respeito a medidas
de descontinuação ou redução de dose no tratamento farmacológico, diminuindo o
risco de recaídas ou os sintomas depressivos na gestação. No entanto, é importante
ressaltar que não é adequado descontinuar a farmacoterapia em casos mais graves
ou recorrentes. Episódios depressivos leves ou depressão menor podem ter boa
resposta ao tratamento psicoterápico, sendo benéfico às pacientes e ao feto tentar
inicialmente o tratamento não farmacológico nesses casos (CAMACHO et al., 2006).
Newport et al. (2002) realizaram um estudo com 576 mulheres no pós-parto.
Foram estudadas as abordagens psicoterápicas mais significativas na redução da
sintomatologia nesses casos e verificaram-se duas modalidades mais efetivas: a
psicoterapia interpessoal, que foca o seu trabalho nos sintomas depressivos da
paciente e no seu relacionamento com o mundo, assim como o rompimento da
barreira interpessoal; e a terapia cognitivo-comportamental (TCC), que tem como
objetivo ajudar o paciente a solucionar seus comportamentos e cognições
disfuncionais por meio da aprendizagem e da reestruturação cognitiva (CAMACHO
et al., 2006).
A TCC tem como base medir quais são os pensamentos, as ideias, e as
emoções que a pessoa tem sobre si mesma e que se encontram distorcidos,
provocando uma cadeia de reações comportamentais disfuncionais (CAMACHO et
al., 2006).
Em pacientes deprimidos, é corriqueiro surgirem relatos de ideias,
pensamentos e sentimentos que deixam o paciente com humor alterado, refletindo-
se assim diretamente na vida dele e dos que o cercam. Esses pensamentos
denominados automáticos são o coração da teoria cognitivo-comportamental. A
mudança desses pensamentos, várias vezes distantes da realidade, faz com que o
paciente com depressão passe a reavaliar sua condição e reestruturar seu dia-a-
dia (CAMACHO et al., 2006).
No caso das mulheres que apresentam depressão pós-parto, é
extremamente comum apresentarem pensamentos e sentimentos relacionados a
questões referentes aos cuidados do bebê e à sua situação atual. Dessa maneira,
a atuação da TCC visa avaliar e reestruturar tais cognições que refletem em seu
comportamento (CAMACHO et al., 2006).
Foi detectado evolução significativa em grávidas e puérperas que foram
submetidas à TCC em grupos de terapia, fundamentando-se nas escalas de
Edinburgh, no Inventário de Beck para Depressão e no Profile of Mood States
(MEAGER,1996 apud CAMACHO et al., 2006).).
Um estudo com gestantes comparando dois grupos diferentes: o primeiro foi
submetido a técnicas de educação familiar e o segundo, à psicoterapia interpessoal.
As mulheres do segundo grupo foram submetidas a sessões semanais de 45
minutos, durante 16 semanas. Obtiveram-se os seguintes resultados: baseando-se
na escala de Edinburgh, notou-se melhora em 11,8% das pacientes submetidas a
técnicas de educação familiar e em 33,3% das mulheres submetidas à psicoterapia
interpessoal. Em relação à escala de Hamilton, notou-se melhora em 29,4% no
primeiro e 52,4% no segundo grupo, respectivamente. Tendo-se como base o
Inventário de Depressão de Beck, houve melhora em 23,5% das pacientes do
primeiro grupo, enquanto 52,4% das pacientes submetidas à psicoterapia
interpessoal melhoraram (SPINELLI; ENDICOTT, 2003 apud CAMACHO et al.,
2006).).
Os transtornos psiquiátricos na gravidez e no puerpério são bem mais
comuns do que se imagina, e vários casos ainda são subdiagnosticados. Tem-se
dado relevância crescente ao tema, e pesquisas atuais têm focado também o dano
que essas patologias podem acarretar não só à saúde da mãe, mas também ao
desenvolvimento do feto, ao trabalho de parto e à saúde do bebê. Múltiplos fatores
de risco estão enredados, mas a etiologia exata ainda não foi constituída. Esses
transtornos costumam acometer pacientes que já tenham história de patologia
psiquiátrica antecedente, logo, uma boa medida de prevenção é o tratamento
apropriado desses episódios. As medidas de tratamento ainda são largamente
debatidas, devendo-se levar em consideração a relação risco–benefício, sendo,
assim, o bom senso do médico é um aliado importante quanto à escolha do
tratamento nesses casos (CAMACHO et al., 2006).
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