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18/07/2022 08:13 ConJur - STJ estabelece nova fórmula para o rol de procedimentos da ANS

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GARANTIAS DO CONSUMO

STJ estabelece uma nova fórmula para o rol


de procedimentos da ANS
13 de julho de 2022, 8h01 Imprimir Enviar

Por Cristiano Heineck Schmitt

 Ouvir: STJ estabelece nova fórmula para o rol de procedim 0:00

Em 8/6/22, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, num julgamento


congregado entre a 3ª e a 4ª Turmas da referida corte, houve uma decisão sobre
o polêmico tema do rol taxativo, ou não, da Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS).
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Num score final de 6 votos a favor de um rol
Racismo e inclusão: mutações do
taxativo, contra 3 votos de um rol exemplificativo,
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venceu a tese do "rol taxativo mitigado". Antes de
comentarmos o que significaria essa figura na GARANTIAS DO CONSUMO
prática, vamos observar o um pouco o que McPicanha e Whopper Costela:
representa a atuação da ANS sobre o mercado de "verdade ou consequência"
saúde suplementar.
GARANTIAS DO CONSUMO
Em meio ao um furor de privatizações ocorridas no governo do presidente O consumidor, o mercado e a guerra
Fernando Henrique Cardoso (FHC), no final da década de 1990, foram
GARANTIAS DO CONSUMO
leiloadas empresas estatais à iniciativa privada, dando margem ao surgimento
Proteção da criança: assédio de
de empresas de telefonia, de energia elétrica, novas companhias aéreas, entre
consumo e vulnerabilidade familiar
outras concessionárias e sociedades comerciais autorizadas a preencher
espaços ocupados pelo Estado.
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Era um momento de marcante vitória da doutrina neoliberal, impulsionada com
a globalização, advinda da ascensão internet. Os defensores da doutrina
Linkedin RSS
socioeconômica neoliberal defendem a presença mínima do Estado na
economia, acreditando piamente que o mercado se autorregularia, gerando

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trocas mais justas e equilíbrio negociais. Os seguidores dessa linha combatem


a ideia do Estado de Bem-Estar social, e por consequência, a social
democracia. Acreditam também que um Estado forte acaba sendo custoso
demais, limitando ações comerciais em prejuízo da "liberdade econômica".
Assim, por exemplo, regras de proteção de consumidores contra práticas
abusivas, cláusulas abusivas, desequilíbrios negociais, publicidade e ofertas
ditas ilícitas, entre outros, podem ser vistas como entraves à máxima
performance do mercado (entenda-se, maior margem de lucro), que deveria ser
regida pelo antigo adágio da "mão invisível" do mercado, que promoveria
autocorreção de distorções, apoiada pela livre concorrência.

No Brasil, não se tem um campo aberto, do ponto de vista normativo, a uma


iniciativa privada sem limites, especificamente no âmbito da saúde
suplementar, embora o tivesse sido basicamente assim nas décadas anteriores
ao advento do marco regulatório do setor, a Lei nº 9.656/98.

Nesse período sem lei específica, quando prevalecia a autonomia da vontade


na composição do conteúdo negocial, diversos eram os problemas vivenciados
pelos consumidores. Esse campo contratual amplo, inclusive, gerou pressão de
consumidores e da classe médica por uma norma com regras mínimas que
garantissem igualdade no setor, o que acabou gerando a construção da referida
Lei 9.656/98. Então, o que se pôde observar é que a ausência do Estado na
fiscalização e regulação do setor de saúde foi muito prejudicial aos
consumidores, e falhou a doutrina liberal nesse ponto, ao advogar a que
autoregulação do mercado, promovida pela livre concorrência, seria um
mecanismo de fomento de trocas justas.

E, seguindo-se um padrão norte-americano de não intervenção na economia, ao


invés da presença estatal direta na produção e oferta de serviços, adota o
sistema de agências reguladoras, que teria a incumbência de, entre outros
temas, de fiscalizar os agentes privados que estariam a oferecer serviços
públicos concedidos ou estratégicos. No âmbito dos contratos de planos e de
seguros de saúde, foi gerada a ANS através da Lei 9.961/00.

Contudo, com vinte e dois anos de existência, a ANS, assim como as demais
"agências irmãs", surgidas quase que do mesmo parto, ou melhor, do mesmo
momento histórico, em que pese uma importante contribuição, padece de um
rol de críticas, seja por parte dos usuários, dos fornecedores e do Poder
Judiciário. Assim, não raro a ANS tem suas resoluções afastadas por se
entender que contrariam o marco legal da saúde suplementar ou o Código de
Defesa do Consumidor, entre outras leis às quais ela deve prestar
subordinação.

Na medida em que esse cenário se perpetua, o que se observa é que a ANS não
conseguiu construir para si um padrão de legitimidade externa, de
confiabilidade nas suas tomadas de decisões. Não se está dizer que a regulação
deva ser um ambiente simpático, até porque ela é produzida num cenário de
intenso conflito de interesses, representado de um lado pelas operadoras de
seguradoras de saúde e de outro, os consumidores e usuários.

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Um lado almeja alta performance de lucro, e outro, a entrega de serviços de


saúde eficientes e com qualidade com cobrança de valores possíveis. Isso faz
da harmonia nas relações de consumo, que advém do artigo 4º do CDC, uma
grande utopia. Não se tem uma harmonia, mas uma disputa declarada, com
alguns momentos de conflitos intensos, e outros de "cessar-fogo".

Pois bem, a ANS não consegue prover uma harmonia ao mercado que regula.
Não considero que isso deva ser atingido pela ANS, pois seria uma missão
solitária e hercúlea. Mas posso pensar que a ANS poderia tentar assumir um
papel de mediadora, ao invés de impor resoluções e outras normas que
produzem ônus demasiados sobre os players, especialmente sobre a parte mais
fraca, os consumidores. No afã de proteger o mercado, a ANS acaba
infringindo pesado ônus à parte contratual que Henry Ford dizia ser o elo mais
importante da produção, o cliente.

Ao fomentar o diálogo, a ANS poderia tentar aproximar melhor os setores


afetados no mercado de saúde suplementar, quais sejam, seguradoras e
operadoras, usuários e representantes da classe médica, hospitais e clínicas.
Mediação não é algo que garanta necessariamente a produção de resultados
almejados. Mas, por outro lado, soluções eficazes podem ser construídas com
concessões mútuas.

Essa não atuação aproximativa acaba levando a uma série contínua de pleitos
judiciais, e aí estamos falando de milhares, onde é debatido o rol de
procedimentos, que a ANS defende ser taxativo. O primeiro rol de
procedimentos estabelecido pela ANS foi estabelecido por Resolução do
Conselho de Saúde Suplementar (Consu) 10/98, sendo atualizado em 2001 e
dali em diante, recebendo atualizações a cada dois anos.

No processo de revisão do rol, o setor responsável reúne-se para construir uma


proposta e submete a mesma à avaliação da sociedade por meio de consulta
pública, através da internet. Por lógico, a participação do leigo que pouco ou
nada entende de medicina é muito limitada, afora o fato de que nem todos os
cidadãos têm acesso à internet, ou conseguem navegar por ela, por motivo de
idade, de doenças e desconhecimento. Por outro lado, a atuação dos
fornecedores é muito visível, até porque as incorporações de novas tecnologias
na área médica mexem nos valores do setor. Em resumo, o método utilizado,
na prática, não é igualitário, no que se pode então questionar a sua eficiência.

Seja por isto, ou por outros motivos, como a limitação da atuação do médico,
em violação ao Código de Ética Médica, por exemplo, seja por gerar
desequilíbrio proibido ao consumidor, ou por representar também um
afastamento da Lei 9.656/98, a ANS, que pretendia obter um pronunciamento
judicial unânime no STJ, sobre a taxatividade de seu rol de procedimentos,
acabou com uma resposta bem diferente.

No julgamento dos embargos de divergência no âmbito dos Recursos Especiais


nº 1.886.929 e nº1.889.704, o STJ entendeu que o referido rol tem cunho
taxativo "mitigado", ou "modulado". Inicialmente, registro que, salvo melhor
juízo, não há como algo ser taxativo e ao mesmo tempo apresentar exceções,
muito embora a expressão "rol mitigado" tenha uma sonoridade interessante,

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melhor do que "rol exemplificativo com requisitos", que é o que acabou


ocorrendo.

De qualquer forma, o STJ não aderiu à proposta da ANS de que a mesma teria
a última palavra em limites de coberturas, passando a definir que, comprovadas
certas circunstâncias em torno do paciente e do tratamento adequado, o mesmo
passa ter o direito de receber a cobertura do que realmente necessita. E, assim
sendo demonstrado, resta afastado o rol da ANS no caso concreto.

Esse tipo de postura já é conhecida, aliás, no STJ e no STF, acerca do


fornecimento de tratamentos na via do SUS. Não é equivocado exigir-se
comprovação técnica para o deferimento do tratamento pleiteado pelo paciente,
quando o rol não atende essa demanda. Mas também viola o sistema jurídico
empoderar a ANS do conhecimento técnico último, ao ponto de a mesma poder
se sobrepor ao profissional médico, desprezando as peculiaridades do paciente.
Afinal, a medicina não é uma ciência exata. Por fim, mesmo diante dessa
decisão do STJ, posterior pleito foi julgado pela mesma corte atribuindo
caráter exemplificativo ao rol, e agora o tema chama a atenção também do
STF. Cabe-me registrar, portanto, que serão muito empolgantes os próximos
capítulos da saga "rol da ANS".

00:00/00:59 conjur

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Cristiano Heineck Schmitt é advogado, doutor e mestre em Direito pela UFRGS, professor de
Direito da PUC-RS, pós-graduado pela Escola da Magistratura do RS, secretário-geral da
Comissão Especial de Defesa do Consumidor da OAB-RS, diretor do Instituto Brasilcon,
autor de livros, palestrante e professor de curso de pós-graduação lato sensu.

Revista Consultor Jurídico, 13 de julho de 2022, 8h01

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1 comentário

NOVA FÓRMULA PARA PLANOS VC DE SAÚDE


Candido Lobo (Advogado Assalariado)

14 de julho de 2022, 7h51

É grande a insegurança jurídica gerada pelo próprio Judiciário de um País como o


nosso, onde a Constituição é emendada de modo temporário, em menos de um
minuto e por uma votação à distância pelo sistema eletrônico da Câmara dos
Deputados, repita-se, Câmara dos Deputados, enquanto é contestado o do TSE!!!
Não sei mais o que dizer aos meus estrangeiros colegas, correspondentes e clientes.
Inacreditável!!!

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