Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ATIV
ST R
N
MO
L DE
RIA
TE
MA
DIREITO CONSUMIDOR
Direitos do consumidor. Disposições gerais.
Polí ca Nacional de Relações de Consumo.
Direitos básicos do consumidor.
PONTO 1
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
(Conforme Edital Mege)
DIREITO DO CONSUMIDOR
Beatriz Fonteles
1 Direitos do consumidor.
Disposições gerais.
Política Nacional de Relações de Consumo.
Direitos básicos do consumidor.
Atualizado em 10/01/2022
1. DOUTRINA (RESUMO)..............................................................................................5
2. QUESTÕES DE CONCURSOS ..................................................................................41
2.1 COMENTÁRIOS ................................................................................................45
Caros alunos,
Damos as boas-vindas ao nosso clube 2022 e à matéria de Direito do Consumidor!
Nesta primeira rodada, trataremos de pontos muito importantes, como as figuras da
relação de consumo e os Direitos do Consumidor. Apesar de a previsão legal não ser extensa, há
profunda e rica jurisprudência tratando de vários subtemas.
Foquem especialmente na definição de consumidor (fizemos uma tabela compara va
com diversos casos reconhecidos, ou não, pela jurisprudência como relação consumerista), e
nos direitos propriamente ditos do consumidor.
Bons estudos!
Beatriz Fonteles.
a) Direito fundamental – art. 5º, XXXII (“o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa
do consumidor”);
b) Princípio da a vidade econômica – art. 170, V (“defesa do consumidor”);
c) Previsão cons tucional para elaboração do CDC - ADCT, art. 48 (“o Congresso
Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Cons tuição, elaborará
código de defesa do consumidor”).
OBSERVAÇÃO
a
A proteção ao consumidor é classificada como direito fundamental de 3 geração ou
dimensão, pois decorre do princípio da fraternidade (pacificação social).
OBSERVAÇÃO
Não confundir a competência legisla va concorrente acima com a competência priva va da
União para legislar sobre propaganda comercial (art. 22, XXIX).
O STF tem reconhecido a competência dos municípios para legislarem sobre matéria de
defesa dos direitos dos consumidores, desde que o assunto seja de interesse local (CF, art. 30, I).
STF: tem precedente no sen do de que o atendimento ao público e o tempo máximo
de espera na fila de ins tuição bancária é matéria de interesse local e de proteção ao
consumidor (de competência legisla va do Município). RE 432.789/SC, Rel. Min. Eros Grau,
Primeira Turma, DJ 07/10/2005.
STJ: Considerou incons tucionais quatro leis do Estado do Rio de Janeiro que
disciplinam condições de prestação de serviço bancário dentro do espaço sico das agências
(ex.: instalação de banheiros e bebedouros), por entender se tratar de assunto de interesse local
e, portanto, de competência do Município, e não do Estado. AI no RMS 28.910/RJ, Rel. Min.
Benedito Gonçalves, Corte Especial, DJe 08/05/2012. 6
ATENÇÃO
O art. 1º do CDC estabelece que suas normas são de ordem pública e interesse social.
Significa, pois, que se tratam de normas cogentes, que devem prevalecer sobre alguns aspectos
da vontade das partes. O STJ, em diversos julgados, chancela essa natureza. Observe-se a
ementa abaixo e os fundamentos apresentados:
Eventuais contratos, cláusulas ou ajustes que prevejam que o consumidor abra mão de
algum direito (por exemplo, da garan a legal, do prazo prescricional etc.) devem ser dos como
não-escritos. Aliás, é uma das hipóteses expressamente elencadas como cláusulas abusivas (nulas
de pleno direito) as que impliquem renúncia ou disposição de direitos (conforme art. 51, I, do CDC).
A possibilidade de reconhecimento ex officio de determinados direitos consumeristas
(por exemplo, a inversão do ônus da prova, a desconsideração da personalidade jurídica, a
declaração de nulidade de cláusula abusiva) encontra uma exceção importante, criada pela
jurisprudência.
ATENÇÃO
STJ: Não admite a declaração de o cio das cláusulas abusivas em contratos bancários.
Súmula 381. Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de o cio, da
abusividade das cláusulas.
Importante ter cuidado com o fato de que a vedação prevista na súmula é limitada às
cláusulas abusivas insertas em contratos bancários. Para outros contratos, é permi da a sua 7
declaração de o cio, tal qual se extrai do teor do caput do art. 51 do CDC.
Em que pese as duras crí cas doutrinárias ao enunciado acima, o STJ con nua a aplicar a
referida súmula em julgados recentes (ex vi AgRg no REsp 1403056/RS, Rel. Min. Maria Isabel
Gallo , T4, DJe 07/03/2016).
Desse modo, para provas de concurso público, a Súmula 381 deve ser conhecida e da como
válida. Em provas discursivas, após indicar o posicionamento do STJ, inclusive com a citação da
Súmula, o candidato pode fazer uma reflexão crí ca, apontando o posicionamento da doutrina.
OBSERVAÇÃO
OBSERVAÇÃO
Diálogo das fontes é nova técnica para solução de an nomias entre fontes legisla vas,
superando os critérios tradicionais (cronológico, especial e hierárquico). Trata-se de
convivência entre normas aparentemente incompa veis na órbita jurídica, permi ndo
influências recíprocas entre elas.
Como é uma lei principiológica, o CDC ingressa no sistema jurídico fazendo um corte
horizontal, alcançando toda e qualquer relação jurídica de consumo, mesmo que regrada por
outra fonte norma va. Até porque há previsão legal no próprio CDC no sen do de que os
direitos nele previstos “não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções
internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos
expedidos pelas autoridades administra vas competentes, bem como dos que derivem dos
princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade (art. 7o, caput).
Dessa forma, pode-se dizer que o CDC e o CC, por exemplo, se completam na proteção
ao consumidor. Assim, deve-se buscar, em regra, a norma mais favorável ao consumidor
independente de qual sistema decorra.
Outros exemplos: CDC e Lei n. 9.656/1998 (planos de saúde), CDC e o Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/2003).
Espécies de diálogo das fontes:
OBSERVAÇÃO
Em aplicação clara do diálogo das fontes, o STJ vinha entendendo que o prazo prescricional
para cobrança do indébito de tarifas de água e esgoto é aquele de 10 (dez) anos previsto no
CC/2002, e não o prazo prescricional de 05 (cinco) anos previsto no CDC.
Nesse sen do, a Súmula 412 do STJ: A ação de repe ção de indébito de tarifas de água e
esgoto sujeita-se ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil.
Para haver relação consumerista, os dois primeiros elementos (de cunho subje vo)
precisam estar presentes (ou seja, necessariamente um fornecedor e um consumidor) e um dos
dois elementos obje vos (produto ou serviço).
Apesar da aparente simplicidade das definições legais, os conceitos acima são cheios
de nuances e aprofundamentos que os candidatos para concursos precisam saber, pois,
atualmente, é muito mais cobrado o que vai além da previsão legal, consistente no
aperfeiçoamento das definições pela doutrina e jurisprudência, o que será visto
detalhadamente nos tópicos a seguir.
1.2.2. CONSUMIDOR
Consumidor é:
O STJ admite a mi gação da Teoria Finalista para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses
em que a parte (pessoa sica ou jurídica), apesar de não ser des natária final do produto ou
do serviço, apresenta-se em situação de vulnerabilidade.
ATENÇÃO
Pela importância e lucidez do julgado paradigma da Teoria Finalista Aprofundada ou
Mi gada, transcreve-se a sua ementa nas partes relevantes e recomenda-se a leitura:
CONSUMIDOR. DEFINIÇÃO. ALCANCE. TEORIA FINALISTA. REGRA. MITIGAÇÃO. FINALISMO
APROFUNDADO. CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO. VULNERABILIDADE.
1. A jurisprudência do STJ se encontra consolidada no sen do de que a determinação da
qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que,
numa exegese restri va do art. 2º do CDC, considera des natário final tão somente o
des natário fá co e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa sica ou jurídica.
Aplica-se o CDC no âmbito da contratação de As normas prote vas do CDC não se aplicam ao
seguro faculta vo. seguro obrigatório (DPVAT).
15
Trata-se de obrigação imposta por lei, na qual não
há acordo de vontade entre as partes, tampouco
q u a l q u e r i n g e r ê n c i a d a s s e g u ra d o ra s
componentes do consórcio do seguro DPVAT, além
de inexis r sequer a opção de contratação ou
escolha do produto ou fornecedor pelo segurado.
(STJ, REsp 1.635.398/PR, DJe 23/10/2017).
Ins tuições financeiras NOVIDADE 2019:
Súmula 297 do STJ – O CDC é aplicável às O CDC é inaplicável ao contrato de fiança
ins tuições financeiras. bancária acessório a contrato administra vo.
Não se aplica a Súmula 297.
OBS: O beneficiário da fiança é ente da
Administração Pública, atraindo, assim, o
regime publicís co (posição de supremacia que
a lei confere à Administração Pública nos
contratos administra vos).
(STJ, Info 649, T3, REsp 1.745.415/SP, DJe
21/05/2019).
O CDC também não se aplica entre o INSS
(autarquia previdenciária) e os beneficiários.
(STJ, REsp 369.822, DJ 22/04/2003)
Relação entre cliente e casa noturna. Em geral, a prestação de serviços entre pessoas
(STJ, REsp 695.000, DJ 21/05/2007). jurídicas de porte, sem vulnerabilidade da
empresa consumidora.
(STJ, REsp 1.038.645, DJe 24/11/2010).
Contrato de transporte de mercadorias vinculado
a contrato de compra e venda de insumos (sem
constatação de vulnerabilidade do consumidor
profissional ante o fornecedor).
(STJ, REsp 1.442.674, DJe 30/03/2017, Info 600).
Além das situações expostas na tabela acima, existem outras que merecem maiores
explicações, seja pela sua complexidade seja pela evolução jurisprudencial, o que será feito em
destaque nos quadros abaixo.
ATENÇÃO
Informa vo 866 STF 2017: Extravio de bagagem. Dano material. Limitação. An nomia. Convenção
de Varsóvia. Código de Defesa do Consumidor. É aplicável o limite indenizatório estabelecido na
Convenção de Varsóvia e demais acordos internacionais subscritos pelo Brasil, em relação às 18
condenações por dano material decorrente de extravio de bagagem, em voos internacionais.
Repercussão geral. Tema 210. Fixação da tese: "Nos termos do art. 178 da Cons tuição da
República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das
transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e
Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor".
Vamos entender alguns detalhes do julgado acima do STF.
Em suma, decidiu-se uma an nomia aparente entre os seguintes diplomas:
- CDC (1990) – vige o princípio da reparação integral (art. 6o, VI);
- Convenção de Varsóvia (Decreto n. 20.704/31), alterada pela Convenção de Montreal
(Decreto n. 2.861/98) – tratam das indenizações que o transportador aéreo poderá ser
obrigado a pagar em caso de destruição, perda ou avaria de bagagens e fixam limites
(“indenização tarifada”).
Para compreender a decisão da Suprema Corte, é fundamental conhecer o teor do art. 178 da
CF/88.
Art. 178. A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquá co e terrestre,
devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados
pela União, atendido o princípio da reciprocidade.
OBSERVAÇÃO
Evolução da jurisprudência do STJ no que tange à aplicação do CDC às en dades de
previdência complementar.
Para se chegar à diferenciação exposta acima entre en dades abertas e fechadas de
previdência complementar, o STJ passou por uma modificação substancial no tempo.
Inicialmente, estava previsto na Súmula 321 que “O CDC é aplicável à relação jurídica entre a
en dade de previdência privada e seus par cipantes”.
Percebe-se que o verbete acima tratava apenas do gênero en dade de previdência privada,
sem diferenciar entre aberta e fechada. A natureza de ambas é, porém, dis nta e implica em
consequências diferentes:
a) en dades abertas: são empresas privadas cons tuídas sob a forma de sociedade anônima
e possuem disponíveis para contratação por qualquer pessoa sica ou jurídica planos de
previdência privada. É comum haver empresas desta natureza vinculadas a ins tuições
financeiras conhecidas (BrasilPrev do Banco do Brasil, Bradesco Vida e Previdência, Porto
Seguro Vida e Previdência etc.).
b) en dades fechadas: são pessoas jurídicas organizadas sob a forma de fundação ou
- Gênero: Fornecedor.
- Espécies: fabricante, montador, criador, importador, exportador, distribuidor,
comerciante etc.
21
O CDC, quando quer que toda a cadeia seja responsabilizada, usa o termo
“fornecedor” como gênero (vide arts. 8o, caput, e 18, caput). Quando, por outro lado, quer
designar algum fornecedor específico, u liza-se do termo em espécie, exemplo arts. 8o,
parágrafo único (“fabricante”), e 12 (“fabricante, produtor, construtor e importador”), 13
(“comerciante) etc.
A doutrina classifica ainda os fornecedores (gênero) em três categorias:
OBSERVAÇÃO
OBSERVAÇÃO
O STJ entende que o CDC não se aplica aos serviços advoca cios, justamente por não se
desenvolverem no mercado de consumo.
a) a previsão legal de que pessoa jurídica de direito público pode ser fornecedora (art.
3o, caput);
b) a previsão, dentre os princípios da Polí ca Nacional das Relações de Consumo, da
racionalização e melhoria dos serviços públicos (art. 4o, VII);
c) previsão, como direito básico do consumidor, da adequada e eficaz prestação dos
serviços públicos em geral (art.6o, X); e
d) o elenco de diversos deveres aos fornecedores de serviços públicos (art. 22).
STJ: entende a aplicação das normas do CDC apenas para os serviços públicos
remunerados por meio de tarifa ou preço público (e não para os serviços públicos remunerados
por taxas). Ex.: concessionárias de água e esgoto, de energia elétrica.
24
ATENÇÃO
STJ: A relação entre concessionária de serviço público e o usuário final para o fornecimento de
serviços públicos essenciais é consumerista, sendo cabível a aplicação do CDC.
Esse tópico não constava originalmente do material, até porque a eventual cobrança
em provas de concurso público para Magistratura Estadual, além de baixa, nunca foi além da
letra da lei. Todavia, houve inovação legisla va significa va com a Lei n. 14.181/2021, que
trouxe novos incisos tanto ao art. 4º, que trata dos princípios da Polí ca Nacional das Relações
de Consumo (PNRC), como ao art. 5º, que dispõe sobre os instrumentos a cargo do Poder
Público para a execução da PNRC. Dessa maneira, achamos prudente incluir esse tópico, ainda
que com breves comentários (que devem ser suficientes para as provas) aos incisos que
julgamos mais importantes.
Art. 4º A Polí ca Nacional das Relações de Consumo tem por obje vo o atendimento
das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a
proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem
como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes
princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)
(i) informacional,
(ii) técnica,
(iii) jurídica/cien fica e
(iv) fá ca ou socioeconômica
1.3.1.2. Ação governamental no sen do de proteger efe vamente o consumidor (art. 4º, II)
A ação governamental pode se dar de formas dis ntas, cuja abrangência o próprio CDC
tenta deixar claro:
A boa-fé cons tui uma regra de conduta. Esta vem a ser a exigência de um
comportamento de lealdade dos par cipantes negociais, em todas as fases do negócio. A boa-fé
obje va tem relação direta com os deveres anexos ou laterais da conduta, que são deveres
inerentes a qualquer negócio, sem a necessidade de previsão no instrumento. Dentre eles
merecem destaque o dever de cuidado, respeito, lealdade, probidade, informação,
transparência e de agir honestamente e com razoabilidade.
27
- Dever de informar o perigo e a nocividade (art. 9º do CDC) - O fornecedor de produtos e
serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de
maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem
prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto.
- Dever de prestar informações corretas, claras e precisas (art. 31 do CDC) - A oferta e
apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras,
precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas caracterís cas, qualidades,
quan dade, composição, preço, garan a, prazos de validade e origem, entre outros dados,
bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
- Proibição da publicidade abusiva ou enganosa (arts. 36 e 37 do CDC) - Referem-se à
proibição de publicidade simulada, abusiva e enganosa. Estas normas serão estudadas
mais adiante, em outra rodada.
- Vinculação do fornecedor (art. 48 do CDC) - As declarações de vontade constantes de
escritos par culares, recibos e pré-contratos rela vos às relações de consumo
vinculam o fornecedor, ensejando inclusive execução específica.
1.3.1.8. Estudo constante das modificações do mercado de consumo (art. 4º, VIII)
Com relação aos incisos IX e X, a Lei n. 14.181/2021 fez profunda alterações no CDC
para incluir diversos disposi vos a fim de tratar da educação financeira dos consumidores e
prevenir e tratar o superendividamento.
O superendividamento ou sobre-endividamento tem sido uma preocupação atual do
Direito do Consumidor em todo o mundo, decorrente da imensa facilidade de acesso ao crédito 28
nos dias de hoje.
A definição do fenômeno, trazida pela doutrina de Cláudia Lima Marques, é que se
trata da impossibilidade global do devedor pessoa sica, consumidor, leigo e de boa-fé, de pagar
todas as suas dívidas atuais e futuras de consumo.
Alguns sistemas jurídicos já nham alcançado, antes do Brasil, soluções legisla vas
para resolver a situação, como é o caso do Direito francês.
No Brasil, após anos de tramitação na Câmara dos Deputados do Projeto de Lei n.
3.515/2015 (oriundo do Projeto de Lei do Senado n. 283/2012), dispondo acerca do
superendividamento do consumidor e prevendo medidas judiciais para garan r o mínimo
existencial ao consumidor endividado, foi enfim promulgada a bem-vinda Lei n. 14.181/2021.
C u m p re d e sta ca r q u e o d i re i to co m p a ra d o p revê d u a s e s p é c i e s d e
superendividamento:
- Superendividamento a vo: ocorre quando o consumidor, voluntariamente, se
endivida, influenciado pela agressividade do mercado de consumo e estratégias de publicidade
e marke ng de empresas fornecedoras. Há outra subdivisão: i) consciente – quando, imbuído
de má-fé, contrai dívidas superiores à possibilidade de pagamento, com a intenção deliberada
de fraudar credores; ii) inconsciente – não há intuito deliberado do consumidor, mas um agir
imprudente, impulsivo, em análise da real possibilidade de gastos.
1.3.2. Os instrumentos à disposição do Poder Público para execução da Polí ca Nacional das
Relações de Consumo
O consumidor deve ser assumido como pessoa humana, tanto pela legislação vigente,
quanto pelo próprio mercado, a quem se reconhece a necessidade de proteção integral no
contexto das relações negociais consumeristas, em que imperam os princípios cons tucionais
como pressupostos necessários, não só a proteção, mas também sua promoção integral de
frente à sociedade de massa globalizada.
São consequências do referido princípio:
- a que concede o bene cio da jus ça gratuita aos que alegarem pobreza e
comprovando-a na forma da lei, então, considera-se a parte hipossuficiente;
- aquela relacionada à inversão do ônus da prova, prevista no inciso VIII do art. 6o do CDC,
mas que não se relaciona necessariamente à condição econômica dos envolvidos.
O conceito de hipossuficiência vai além do sen do literal das expressões pobre ou sem
recursos, aplicáveis nos casos de concessão dos bene cios da jus ça gratuita, no campo
processual. O conceito de hipossuficiência consumerista é mais amplo, devendo ser apreciado
pelo aplicador do direito caso a caso, no sen do de reconhecer a disparidade técnica ou
informacional, diante de uma situação de desconhecimento.
Este princípio se refere ao direito do consumidor a uma informação adequada que lhe
permita fazer escolhas bem seguras conforme os desejos e necessidades de cada um.
O direito à informação tem como desígnio promover completo esclarecimento quanto à
escolha plenamente consciente do consumidor, de maneira a equilibrar a relação de vulnerabilidade,
colocando o consumidor em posição de segurança na negociação de consumo, acerca dos dados
relevantes para que a compra do produto ou serviço ofertado seja feita de maneira consciente.
Obje va tentar equilibrar uma situação que sempre foi desigual, em que o consumidor
sempre foi ví ma das abusividades da outra parte da relação de consumo, mediante limitação
ao exercício da autonomia privada no campo contratual.
A declaração de nulidade das cláusulas abusivas é uma clara aplicação desse princípio. 31
- Revisão do contrato por onerosidade excessiva (art. 6o, V, do CDC) - É direito do
consumidor a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações
desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem
excessivamente onerosas.
- Princípio da preservação dos negócios jurídicos - Como decorrência da função social
dos contratos, deve-se, sempre que possível, preservar os contratos, assegurando
trocas úteis e justas (Enunciado 22 do CJF).
- Teoria do Adimplemento Substancial - Segundo essa teoria, nos casos das obrigações
de pagamento parcelado, quando tal pagamento for feito quase que completamente,
ou muito próximo disso, não será possível pleitear a resolução contratual com base no
inadimplemento. Nesses casos, o credor terá que se contentar em pedir o
cumprimento da parte que ficou inadimplida ou então pleitear indenização pelos
prejuízos que sofreu (STJ, REsp 1200105/AM, julgado em 19/06/2012). O
adimplemento substancial decorre dos princípios gerais contratuais, de modo a fazer
preponderar a função social do contrato e o princípio da boa-fé obje va, balizando a
aplicação do art. 475 (Enunciado 361 do CJF).
OBSERVAÇÃO
Não se aplica a teoria do adimplemento substancial para a alienação fiduciária regida pelo DL
911/69. STJ. 2ª Seção. REsp 1.622.555-MG, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 22/2/2017 (Info 599).
Súmula 367 do STJ: É lícita a cumulação das indenizações de dano esté co e dano 32
moral
Dano Moral Cole vo - A doutrina tem admi do a existência de danos morais cole vos.
Esta é modalidade de dano que a nge, ao mesmo tempo, vários direitos da personalidade, de
pessoas determinadas ou determináveis.
Dano Difuso - Trata-se de um dano social. São lesões à sociedade, no seu nível de vida,
tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral, quanto por diminuição na qualidade de vida.
Estes podem gerar repercussões materiais ou morais. Estes danos envolvem ví mas
indeterminadas ou indetermináveis.
Dano pela Perda de uma Chance - A doutrina e a jurisprudência têm também aceito o
dano pela perda de uma chance. A perda de uma chance está caracterizada quando a pessoa vê
frustrada uma expecta va, uma oportunidade futura, que, dentro da lógica razoável, ocorreria
se as coisas seguissem seu curso normal. Ressalta-se que, segundo a jurisprudência, para haver
direito de indenização essa chance deve ser séria e real. Ex.: Caso do Jogo do Milhão.
Responsabilidade Obje va - O princípio da reparação do dano integral gera, via de
regra, a responsabilidade obje va de fornecedores e prestadores como regra das relações de
consumo. Consigne-se que essa responsabilidade independentemente de culpa visa à
facilitação das demandas em prol dos consumidores, representando um aspecto material do
acesso à jus ça.
O CDC ins tuiu rol exemplifica vo, mínimo necessário à efe va proteção dos seus
o
interesses. O art. 7 do CDC, por sua vez, é cláusula de abertura do microssistema, para que algum
direito do consumidor, previsto em outro diploma legal, possa a ele se somar (diálogo das fontes).
o
O rol do art. 6 , portanto, é numerus apertus.
o
1.5.1. DIREITO À VIDA (art. 6 , I)
Visa a garan r que produtos e serviços no mercado de consumo não acarretarão riscos
à incolumidade sica do consumidor. Esse direito de proteção é fruto do princípio da confiança e 33
do dever de segurança.
o
1.5.2. DIREITO À EDUCAÇÃO E À LIBERDADE DE ESCOLHA (art. 6 , II)
Combate a discriminação injus ficada entre os consumidores (art. 39, II, IV, IX, CDC).
O fornecedor deve oferecer as mesmas condições a todos os consumidores. Apenas
admitem-se privilégios àqueles que necessitam (idosos, gestantes), respeitando-se, assim, a
aplicação concreta do princípio isonômico.
Tanto as prá cas como as cláusulas abusivas serão estudadas em momento oportuno,
em outras rodadas.
- A lesão do CC, em regra, gera a invalidade do negócio jurídico, podendo somente ser
salvo pela vontade da parte beneficiada (art. 157, §2o, CC).
- Na lesão do CDC, em regra, o contrato é man do, facultando-se ao consumidor (parte
não beneficiada) pleitear a nulidade da cláusula geradora da prestação
desproporcional ou sua modificação. 35
No direito à revisão, o desequilíbrio econômico do contrato é causado por fato novo,
superveniente à sua celebração, e que torna a prestação do consumidor excessivamente
onerosa, afetando o sinalagma funcional do contrato.
IMPORTANTE: Para a doutrina majoritária, o CDC adotou a Teoria da Base Obje va do
Negócio Jurídico (Karl Larenz), uma vez que não se exige a imprevisibilidade do fato
superveniente e dispensa-se qualquer discussão a respeito da previsibilidade do fato
econômico superveniente.
Já o CC adotou a Teoria da Imprevisão no campo da revisão contratual por onerosidade
excessiva, vez que a imprevisibilidade do fato superveniente é exigida.
o
1.5.7. DIREITO À EFETIVA PREVENÇÃO E REPARAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS E MORAIS (art. 6 , VI)
ATENÇÃO!
a) Verossimilhança da alegação
É verossímil a alegação que tem aparência de verdade, que é plausível, provável, que
não repugna à verdade. É um conceito jurídico indeterminado, compe ndo ao juiz definir seu
conteúdo na análise do caso concreto, segundo as regras ordinárias de experiência.
b) Hipossuficiência
É a incapacidade técnica ou econômica do consumidor para produzir a prova
necessária à sa sfação da sua pretensão em juízo (não sendo sinônimo de pobreza).
- o consumidor tem o ônus de provar o dano que lhe foi causado e o nexo de
causalidade com o produto (relação causa e efeito);
- compete ao fornecedor (é ônus deste) provar que o produto não é defeituoso.
ATENÇÃO!
STJ: Em demanda que trata da responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 e 14 do
CDC), a inversão do ônus da prova decorre da lei (ope legis), não se aplicando o art. 6º, VIII, do CDC.
1.5.10. DIREITO À PRESTAÇÃO ADEQUADA E EFICAZ DOS SERVIÇOS PÚBLICOS (art. 6o, X)
Aqui, trata-se de um direito do consumidor - uma das novidades trazidas pela Lei n.
14.181/2021 - com a finalidade de preservar seu mínimo existencial, como explicitado no tópico
1.3.1.10., prevendo, dentre outras medidas, a revisão e a repactuação da dívida. Registre-se,
outrossim, que há remissão aos termos de regulamentação, que ainda não existe.
1.5.13. DIREITO À INFORMAÇÃO ACERCA DOS PREÇOS DOS PRODUTOS POR UNIDADE DE
MEDIDA, TAL COMO POR QUILO, POR LITRO, POR METRO OU POR OUTRA UNIDADE,
CONFORME O CASO
Mais uma novidade oriunda da Lei n. 14.181/2021, que acrescentou o inciso XIII ao art. 6º do
CDC.
1. (TJSC – Juiz Subs tuto – 2017 - FCC) Quanto mediante a u lização de cartão e senha
aos direitos do consumidor, bem como suas pessoal.
disposições gerais, é correto. Acerca dessa situação hipoté ca, assinale a
a) Direitos básicos do consumidor possuem rol opção correta à luz da legislação aplicável ao
elucida vo e não taxa vo; se a ofensa for caso e da jurisprudência do STJ:
pra cada por mais de um autor, todos a) O juiz deverá deferir o pleito de inversão do
responderão solidariamente pela reparação ônus da prova em favor da autora, pois cabe à
dos danos previstos nas normas de consumo. ins tuição financeira demonstrar a
b) Equipara-se a consumidor a cole vidade de regularidade do saque.
pessoas, desde que determinadas ou b) Maria deverá demonstrar sua vulnerabilidade
determináveis, que haja intervindo nas e a verossimilhança do alegado.
relações de consumo.
c) O momento processual adequado para a
c) Fornecedor é toda pessoa sica ou jurídica, inversão do ônus da prova será quando a
pública ou privada, desde que personalizada, sentença for proferida.
que desenvolve a vidades de produção,
d) O fato exclusivo da ví ma não afasta a
montagem, criação, construção,
responsabilidade, pois ele sucumbe ao
transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos
princípio da reparação integral em favor do 41
consumidor.
ou prestação de serviços.
3. (TJMT – Juiz Subs tuto – 2018 – Vunesp) Nos
d) As normas consumeristas têm natureza
termos das súmulas do STJ, assinale a
prote va e de defesa dos consumidores, de
alterna va correta:
ordem disposi va e de interesse social,
implicando tratamento diferenciado a estes a) O CDC se aplica nos contratos previdenciários
por sua hipossuficiência e vulnerabilidade. celebrados com en dades fechadas.
2. (TJPR – Juiz Subs tuto – 2017 - CEBRASPE) c) É considerada abusiva a cláusula contratual de
Maria, aposentada, compareceu a uma plano de saúde que preveja algum prazo de
agência bancária para sacar seu bene cio carência para u lização dos serviços de
previdenciário. No entanto, ao consultar o a s s i stê n c i a m é d i ca n a s s i t u a çõ e s d e
extrato, verificou que o numerário fora emergência ou urgência.
sacado por terceiro. Inconformada, procurou d) O CDC se aplica aos empreendimentos
a Defensoria Pública, que ajuizou ação de habitacionais promovidos pelas sociedades
indenização, requerendo, entre outras coisas, coopera vas.
a inversão do ônus da prova em favor de e) É possível ao julgador conhecer, de o cio, da
Maria. Por sua vez, em sua resposta, a abusividade das cláusulas nos contratos
ins tuição financeira alegou fato exclusivo da bancários.
ví ma, porquanto a operação fora realizada
9. (TJPA – Juiz Subs tuto – 2019 – CESPE) A e) o Código de Defesa do Consumidor é aplicável
respeito de produtos e serviços na relação a o s e m p re e n d i m e n t o s h a b i ta c i o n a i s
jurídica de consumo, assinale a opção correta, promovidos pelas sociedades coopera vas.
de acordo com o Código de Defesa do 11. (TJSP – Juiz Subs tuto – 2021 – Vunesp)
Consumidor (CDC) e a doutrina consumerista. Assinale a alterna va correta sobre a
a) Nos casos de vício, para cômputo do prazo incidência do Código de Defesa do Consumidor
prescricional, o CDC faz dis nção entre às seguintes relações jurídicas, segundo
produtos e serviços duráveis e não duráveis. entendimento dominante e atual do Superior
Tribunal de Jus ça.
44