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A teoria da sexualidade

Prof. Maicon Pereira da Cunha

Descrição

A formulação e o reconhecimento de uma teoria sobre a sexualidade no


interior do pensamento psicanalítico e sua importância para o
desenvolvimento humano.

Propósito

A compreensão dos conceitos desenvolvidos pela Psicanálise advindos


de uma interpretação contextualizada sobre a sexualidade é de
fundamental importância na investigação dos profissionais ligados aos
saberes psicológicos a respeito do desenvolvimento humano, da
personalidade e do laço social.

Preparação

Para auxiliar nos estudos, você pode recorrer a dicionários de


Psicanálise, que contêm explicações conceituais da área dispostas de
maneira estruturada e organizada.

Objetivos
Módulo 1

Constituição psíquica infantil


Localizar a sexualidade infantil como eixo importante da constituição
psíquica.

Módulo 2

Conceito de pulsão
Identificar o conceito de pulsão como um conceito fundamental da
Psicanálise.

Módulo 3

Elementos do desenvolvimento
psicossexual
Relacionar os elementos do desenvolvimento psicossexual.

Módulo 4

Complexos de Édipo e de
castração
Relacionar os complexos de Édipo e de castração no
desenvolvimento.

Introdução
A Psicanálise apresenta uma série de provocações importantes
para uma interpretação do psiquismo a partir de um novo olhar
sobre os fenômenos da sexualidade.

O primeiro reconhecimento, nesse sentido, ocorre a partir da


identificação da existência da sexualidade na infância, algo
bastante estranho para aquela época vitoriana do século XIX. Freud
ousou realizar uma imersão no universo psicológico de uma forma
totalmente diferente das premissas com as quais a Psicologia
trabalhava naquele tempo. Se a pauta da Psicologia era atada ao
universo consciente, no estudo das faculdades psíquicas, tais
como memória, atenção, percepção, sensação, a Psicanálise opera
um conjunto de conceitos que dizem respeito ao fundamento da
organização psicológica a partir do privilégio do inconsciente. A
Psicanálise está para além da Psicologia, por isso mesmo é
chamada de uma metapsicologia; o prefixo “meta” significa “além
de”.

Se, por um lado, o inconsciente é o fundamento básico para


localizar as coordenadas fundacionais da Psicanálise, por outro,
essa localização não se faz sem entendermos a função da
sexualidade como essencial para o sujeito. No entanto, não está
falando exatamente da sexualidade de que trata a sexologia.
Portanto, se “Freud só pensa naquilo”, o que é, afinal de contas,
aquilo?

Faremos neste momento uma imersão no universo da sexualidade


não apenas como genitalidade, mas como algo que inclusive funda
o próprio sujeito. Acompanharemos mais detalhadamente o que
isso quer dizer.

1 - Constituição psíquica infantil


Ao final deste módulo, você será capaz de localizar a sexualidade
infantil como eixo importante da constituição psíquica.

A construção moderna
sobre o infantil
A sexualidade infantil é uma grande novidade incorporada por Freud na
investigação sobre o psiquismo. Até o século XIX, podemos dizer que
não existia um olhar para a sexualidade infantil. A criança não
comportava nem mesmo um espaço de visibilidade social legítimo. O
conceito do infantil é uma construção eminentemente moderna, como
vai desenvolver Phillipe Ariès, um historiador que organiza um estudo
muito completo acerca de como as noções de criança e família foram
forjadas, sobretudo na modernidade.

Para aquela época, era uma grande novidade falar da criança como um
ser com especificidades próprias.

Vamos lembrar que a criança era vista como um adulto em miniatura,


como retratava-se em pinturas renascentistas e barrocas.

A organização das ideias de infância e de família como conhecemos


hoje é datada historicamente. A família nuclear burguesa, esta que
conhecemos organizada em torno do pai, mãe e filho(s), é uma
construção moderna. A própria ideia de família se organiza em torno da
criança que ganha um estatuto de existência, conceitualmente falando.

O nascimento da infância como conceito está inserido


numa rede de articulações que envolve os cuidados da
família na relação com a Psicologia, com a Educação e
com a Medicina.

A criança, até então, é vista como uma espécie de anjinho, que não teria
sexualidade. Ou, no caso das famílias pobres, nem se tinha o
sentimento de intimidade com a criança, haja vista que provavelmente
não sobreviveria, por causa dos precários ou inexistentes cuidados
médicos. Quem sobrevivia era já um adulto. Não se tinha o sentimento
da infância.

A sexualidade, nesse contexto, seria uma prerrogativa da vida adulta, de


forma a estar articulada com os fins de reprodução da espécie. Essa é
uma cartografia intimamente relacionada à biologia.

Sendo o sexo visto como algo da ordem da procriação, a criança não


participaria desse enredo.
Em outras palavras, a visão que existia sobre as crianças antes de Freud
era relativa a um ser ingênuo e angelical que despertava pouco interesse
na sociedade.

O surgimento da infância
sexualizada
Freud organiza, nesse contexto, um ousado descentramento em relação
à infância imaculada. A Psicanálise, com seu inventor, desdobra
importantes considerações acerca do desenvolvimento psicossexual do
sujeito. Mas para entender isso, é importante frisar a distinção entre
uma sexualidade ligada a fins procriativos e uma outra dimensão da
sexualidade. Essa diferenciação é extremamente relevante.

Se organizarmos uma incursão na história da sexualidade, veremos


basicamente o quanto o sexo exerce uma importância na economia
libidinal relacionada aos corpos, aos relacionamentos, à maneira de se
conceber como pessoas. Por isso mesmo, a sexualidade é um eixo
privilegiado do exercício do poder.

A sexualidade, sobretudo na tradição ocidental, marcada pelo traço


judaico-cristão, sempre esteve às voltas com uma inspeção minuciosa
pela religião. Nessa chave de leitura, há uma articulação da sexualidade
à biologia na intenção de respaldar a noção de sexo como propósito de
procriação.

Daí a visão hegemônica de um relacionamento heterossexual bem como


a ausência da sexualidade até a vida adulta, matrimonial.

Os inícios da manifestação da vida sexual pela via genitalizada são


altamente vigiados. Há toda uma tradição que incrementa de medos e
fantasias a relação com o conhecimento do corpo não ligada aos fins
reprodutivos. A manifestação da puberdade é imantada por fantasmas.
Você já ouviu alguém dizer sobre a lenda de que a prática da
masturbação masculina provocaria o crescimento de pelos na mão?
Esse tipo de crença estava associado a essa vigilância, tendendo ao
controle do movimento dos corpos, do conhecimento sexual.

Assim, o corpo deveria ser preservado até o casamento, quando se há


uma certa “liberação oficial”, digamos, para a vivência da dimensão
sexual, circunscrita, inclusive, na relação com uma outra pessoa, para
fins de procriação.

Certamente, esse é um aspecto da sexualidade. No entanto, a


sexualidade não se restringe à dimensão genitalizada e procriativa. É
nesse campo que Freud adentra em seus Estudos sobre a histeria e cria,
posteriormente, o dispositivo psicanalítico.

A primeira teoria do trauma, advinda da teoria e da terapia da histeria,


sustentava que a neurose era produzida a partir de uma sedução sexual
real, em geral ocorrida na infância. No início dessa construção teórica, a
sedução era significada em um momento posterior, em geral na
adolescência, gerando efeitos tóxicos no psiquismo e se manifestando,
sobretudo, no corpo, por meio dos sintomas relacionados à
impossibilidade de reação ao caráter sexual da sedução. Assim, o efeito
patogênico seria cessado pela remissão sintomática por meio da ab-
reação, que seria a expurgação do afeto, a descarga de energia que
permitiria que a pessoa se livrasse de sentimentos e emoções
associados a algum evento traumático.

Atenção
Freud explicava a neurose e, especialmente, a histeria como
consequências de um evento traumático relacionado com alguma
situação de sedução, que podia ocorrer na infância, mas que somente
era significada como tal na adolescência ou depois. Os efeitos tóxicos
dessa situação de sedução no psiquismo se deviam ao fato de
considerá-la como indevida ou proibida, gerando um incômodo
significativo na pessoa que passaria a recalcar tal situação.

Lembremos que, ao falarmos recalcar, estamos dizendo que essa


situação ficaria fora do sistema consciente, mas ocasionando, ainda,
sintomas geralmente somáticos. Esses sintomas só cessariam a partir
do momento em que a paciente, com a ajuda do psicanalista,
conseguisse voltar a lembrar do evento e expurgar, ou seja, liberar os
afetos a ele associados que geravam o incômodo original.

Essa concepção do trauma não comportava a noção de sexualidade


infantil em um primeiro momento. Ficava pouco claro o registro da
afirmação de que o trauma neurótico tinha raízes numa sedução sexual
no registro infantil. A operação da significação traumática em um
momento posterior foi uma primeira maneira de ainda preservar algo da
infância. Não podemos esquecer que esse era um terreno arenoso para
Freud.
Uma boa perspectiva sobre o trauma psicológico, na relação das
diferenças entre a criança e o adulto, pode ser mais bem observada na
leitura feita por Sándor Ferenczi (1873–1933), importante psicanalista e
médico húngaro que colaborou significativamente no trabalho de Freud.

Separando a qualidade da linguagem do sexual entre a criança e o


adulto, Ferenczi pressupõe que a linguagem a que a criança está
remetida é a da ternura, enquanto o adulto está inscrito na linguagem da
paixão.

No entanto, retornando a Freud, acompanhamos o desdobramento da


característica sexual infantil sendo pautada pelo discurso psicanalítico
de maneira cada vez mais densa.

Os constantes relatos de abuso sexual promoveram uma investigação


mais atenta pelo pai da Psicanálise, no sentido de verificar a
materialidade dos relatos. Nesse aprofundamento, Freud se vê às voltas
com a constatação de que nem todo relato de uma cena de sedução
sexual ocorreu na realidade material dos fatos.

Certamente, os abusos sexuais reais existiam, como infelizmente ainda


existem, e precisamos nos atentar para a violência disso. No entanto, do
ponto de vista teórico, é importante sublinhar o caráter intrigante com o
qual Freud se debruçava em sua clínica, de que muitos relatos eram
cenas vivenciadas na fantasia.

Daí a famosa frase de Freud a seu interlocutor Fliess:


“Não acredito mais em minha neurótica”.

Fantasia e cuidados
primários da criança
Estava colocada na cena a fantasia como eixo central na organização
do psiquismo. Para compreender melhor a questão das fantasias,
exploraremos, mais adiante, o complexo de Édipo. No entanto, a fim de
contextualizar preliminarmente a questão, continuaremos a pensar junto
com Freud na curiosidade a respeito dos relatos sexuais nas histéricas.
O fato de haver sucessivos relatos de abusos faz Freud se perguntar se
toda Viena era pervertida sexualmente, abusando de suas crianças.

O que ocorre é que o abuso poderia existir até certo ponto, pois o fato de
não ter acontecido na realidade não implicava que fosse uma mentira.
Fica evidente aqui a necessidade de enunciar a caracterização de outra
dimensão da realidade, a realidade psíquica. Essa é a realidade com a
qual o psicanalista trabalha, e ela é recheada de processos psicológicos
complexos, muitos deles inconscientes, e nos quais a fantasia de
sedução exerce uma centralidade.
Realidade material e realidade psíquica são dois eixos distintos, que se
entrecruzam. Quantas realidades podem existir na realidade? Questão
complexa, hein...

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A centralidade da fantasia
de sedução
O professor Maicon Pereira da Cunha explica a centralidade da fantasia
de sedução na organização do psiquismo e na delimitação da realidade
psíquica e da realidade fatual.

Freud nunca abandona a teoria da sedução exatamente, mas o


abandono passa a ser da factualidade do caso, quer dizer, da suposição
de uma cena originária de abuso. Por outro lado, a sedução vai ser
entendida como um complicado jogo de processos de identificação, de
idealização, de amor e de relações intersubjetivas complexas.

Os primeiros cuidados maternos são fonte da instauração de uma rede


de afetos e intensidades que organizam o psiquismo. A função materna
envolve a criança em sua necessidade, o que Donald Winnicott (1896–
1971), um pediatra inglês que se tornou um grande psicanalista, chamou
de concern, ou seja, um estado de preocupação materna primária.

Aliás, cabe ressaltar que os cuidados maternos não são


necessariamente realizados pela mãe, mas por qualquer pessoa que
realize a função de maternagem. Quando falamos de função materna e
função paterna, não estamos necessariamente nos referindo às figuras
dos genitores, mas dos que cuidam.

Maternagem
Termo originalmente usado por Winnicott e depois utilizado pelos
psicólogos para falar dos bons cuidados e da proteção que mães e
cuidadores têm com os seus bebês (incluindo não somente o atendimento
às necessidades fisiológicas dos filhos, mas também todo o amor e
aconchego).

Na organização da família nuclear burguesa, havia uma separação


muito evidente entre os processos exercidos pelo homem e pela mulher.
O espaço da rua, o espaço público, das decisões macro era destinado
aos homens, enquanto o espaço privado, o cuidado com as atividades
domésticas, o cuidado com a casa e com as crianças era destinado às
mulheres. A mulher não precisa ficar restrita ao espaço doméstico,
porque, afinal, lugar de mulher é onde ela quiser!

A mulher pode ocupar os espaços que desejar, assim como


evidentemente é importante que as tarefas domésticas sejam
compartilhadas por todos que compartilhem aquele espaço, porque
todos usufruem dos benefícios de uma casa limpa e funcional. Também
todos devem participar da organização da divisão das tarefas pelo
cuidado da casa e dos filhos. Entretanto, por esse traço histórico,
falamos da maternagem como algo relativo apenas à mãe.

O importante é sublinhar que a função materna é realizada por qualquer


pessoa que se ocupe da atenção materna primária.

Não importa se trata-se de uma organização familiar tradicional, ou de


outras formas de organização da família, como as famílias
homoparentais, ou famílias unipessoais, por exemplo. O modo como a
família se organiza não é relevante, o importante é o elo afetivo que une
seus componentes.

Assim, dizemos que a função materna é essa que oferece uma forma de
comunicação inicial com o bebê, de modo que as necessidades do bebê
sejam sanadas e, nesse ínterim, a qualidade da relação com quem
exerce a função de maternagem é algo imprescindível para a
estruturação e o desenvolvimento global do bebê e, consequentemente,
daquele ser.
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1
(IF ‒ SP ‒ Psicólogo ‒ 2012) Considerando a teoria do
desenvolvimento psicossexual, assinale a alternativa correta.

Refere-se a um processo de mudanças quantitativas


na organização da vida intelectual do sujeito. Tal
A
processo de mudanças é regido pelo binômio
“estímulo-resposta”.

Refere-se ao estudo e à compreensão dos


processos de ampliação do ego e do superego e,
principalmente, à evolução da libido. Tal
B
compreensão é dividida, por Piaget, em fases que
são: sensório-motor, pré-operatório, operatório-
concreto e operatório-formal.

Propõe uma visão do processo de mudanças


emocionais que ocorre ao longo da vida infantil, ou
C
seja, uma compreensão das relações subjetivas que
a criança estabelece com o mundo e com o “outro”.

É uma teoria desenvolvida por Freud que se refere a


uma compreensão inatista (que não depende da
D experiência) do desenvolvimento emocional, pois
considera o desenvolvimento do aparelho mental a
partir das pulsões e do Id.

É uma compreensão do desenvolvimento sexual


desde o ponto de vista genital-fisiológico, em que as
E mudanças físicas e hormonais afetam o psiquismo
e podem gerar diversas patologias, caso o sujeito
não consiga viver plenamente a sua sexualidade.

Parabéns! A alternativa C está correta.


A constituição subjetiva, do ponto de vista psicanalítico, é marcada
pelas impressões que advém do campo do outro, ou seja, daqueles
que cuidam da criança em um primeiro momento. A partir da
experiência intersubjetiva é que todas as nossas marcas subjetivas
serão constituídas, a partir da nossa qualidade relacional-pulsional.

Questão 2
Qual das alternativas a seguir caracterizam a sexualidade infantil,
segundo a teoria psicanalítica?

Uma sexualidade genitalizada e procriativa


A
tradicional.

B Uma ausência de sexualidade e autoerotismo.

Uma sexualidade centrada nos genitais e na


C
masturbação.

Uma sexualidade autoerótica e sem fins de


D
reprodução.

Uma expressão da sexualidade apenas na atividade


E
onírica.

Parabéns! A alternativa D está correta.


A sexualidade infantil é marcada pelo autoerotismo e pela
masturbação. Diferentemente da sexualidade adulta, que faculta o
encontro dos corpos e, por isso, a possibilidade do encontro sexual
genital, a sexualidade infantil é polimorfa, com pulsões parciais que
não necessariamente ficam no domínio da zona genital.

2 - Conceito de pulsão
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar o conceito de
pulsão como um conceito fundamental da Psicanálise.

As pulsões e os cuidados
maternos primários
Com o desenvolvimento das primeiras marcas psíquicas do sujeito,
advindas do cuidado do outro, Freud afirma que a relação de uma
criança com quem cuida dela proporciona “uma fonte infindável de
excitação sexual e de satisfação de suas zonas erógenas.” (FREUD,
1905, p. 210). É importante que aquele que cuida da criança se atente
não apenas aos cuidados orgânicos, mas à qualidade da relação, à
forma como aquele cuidado marca o corpo. Para Freud, essa já é uma
marca de sexualização. O corpo passa a ser erogeneizado a partir dessa
relação.

Para a Psicanálise, o corpo passa a ser entendido além do modelo


mecanicista predominante no pensamento científico da época. O corpo
é erogeneizado, em outras palavras, compreende a conexão entre
aspectos físicos e psíquicos, pois o mesmo se encontra marcado tanto
pela pulsão como pela linguagem de forma inseparável.

Aqui estamos falando da pulsão, e por isso é relevante apontar a


importância desses cuidados maternos primários, pois aí a pulsão
começa a ser verificada:

O trato da criança com a pessoa que


a assiste é, para ela, uma fonte
incessante de excitação e
satisfação sexuais vindas das zonas
erógenas. Em adição, essa pessoa
cuidadora — usualmente a mãe —
contempla a criança com os
sentimentos derivados de sua
própria vida sexual: ela a acaricia,
beija, e embala, e é perfeitamente
claro que a trata como o substituto
de um objeto sexual plenamente
legítimo.

(FREUD, 1905, p. 210-211)

Portanto, um primeiro registro é de que os cuidados maternos primários


erotizam a criança à medida que se imprime uma qualidade relacional
que erotiza o corpo e, como tal, o psiquismo nascente junto com a
dimensão corporal. Falamos, em psicanálise, de um corpo que não é
apenas um conjunto de órgãos com funções vitais e com uma dimensão
anatômica e fisiológica de determinada configuração. Falamos,
sobretudo, de um corpo pulsional, um corpo que é indissociável de sua
dimensão de relação ao outro que o cuidou.

Mas estamos falando de pulsão, e até agora não a definimos.


Considerando a problemática em questão, comecemos por delinear
esse conceito importante, ou por assim dizer, fundamental, em
Psicanálise. O conceito de pulsão ganha uma materialidade dentro da
obra freudiana, de forma sistemática, a partir do texto Três ensaios
sobre a teoria da sexualidade (1905), uma das importantes obras de
Freud na qual o autor desenvolve a teoria da sexualidade e o
desenvolvimento psicossexual, embora tal conceito já se faça presente
anteriormente, sob a forma de uma excitabilidade endógena que se
impõe constantemente e se movimenta rumo à descarga.

Por pulsão, nos Três ensaios, Freud concebe como sendo:

“O representante psíquico de uma fonte endossomática de estimulação


que flui continuamente, para diferenciá-lo do ‘estímulo’, que é produzido
por excitações isoladas vindas de fora.

Pulsão, portanto, é um dos conceitos de


delimitação entre o anímico e o físico.

A hipótese mais simples e mais indicada sobre a natureza da pulsão


seria que, em si mesma, ela não possui qualidade alguma, devendo
apenas ser considerada como uma medida de exigência de trabalho
feita à vida anímica” (FREUD, 1905, p. 159)

A pulsão, como delineia Freud, se instaura na borda do aparelho


psíquico, ou aparelho anímico (de alma), por sua relação com o
corporal. A questão da ligação indissociável entre corpo e psíquico
ganha notoriedade nessa concepção, justamente porque, em outras
palavras, a pulsão é um conceito que diz respeito a uma medida de
exigência de trabalho feita do corpo ao psíquico. Por isso que a função
do apoio da pulsão sexual no instinto, como veremos adiante, é
importante. Exemplificando, comer é uma atividade necessária ao corpo,
mas comer por ansiedade já é outra coisa!
Essa formulação crítica da concepção do psíquico a partir das
imposições do corpo abre espaço para a discussão acerca do
funcionamento do aparelho anímico. A pulsão, ao contrário do instinto,
não se caracteriza pela fixidez, declarando Freud nesse texto que o
objeto é o que existe de mais variável na pulsão.

É importante distinguir a pulsão do instinto, pois os dois termos são


passíveis de confusões. Entenda as diferenças:

Pulsão Instinto
O aspecto pulsional O instinto remete-se a
remonta à ideia de uma um impulso natural para
variabilidade do objeto a obtenção de objetos
que visa à satisfação. A close que visam satisfazer as
satisfação, refere-se à necessidades de
ideia da obtenção de sobrevivência própria
prazer, e não apenas a ou da espécie.
necessidade biológica.

Na maior parte de sua obra, Freud fala de Trieb (pulsão) e não de Instinkt
(instinto). Mas vamos explicar melhor essa diferença e o conceito de
pulsão ao longo deste texto.

As características da pulsão
Essa diferença fica mais nítida ao adentrarmos no texto dos Três
ensaios. Lendo a obra de Freud, podemos compreender melhor que a
caracterização da sexualidade infantil é marcada pela variabilidade
objetal, ou seja, as pulsões parciais.

As pulsões parciais estão ligadas a zonas erógenas específicas (zonas


do corpo por meio das quais a criança sente prazer), compondo a
sexualidade infantil de caráter autoerótico. Essa composição nos
remete ao caráter perverso-polimorfo da sexualidade.

Mas o que quer dizer isso?

Para Freud, o conceito de perversão polimorfa se refere à capacidade de


obter prazer fora dos comportamentos sexuais socialmente
determinados, marcados sobretudo pelo aspecto genital. O traço
perverso-polimorfo se centra na perspectiva de desvio, justamente um
desvio em relação a um objeto fixo, este que está presente no instinto.
Por isso esse é um traço perverso. E é polimorfo, pois a disposição
sexual incide em múltiplas áreas possíveis do corpo. Para um instinto,
existe um objeto específico para sua satisfação. Na questão da pulsão,
o objeto não é natural, marcando o caráter da sexualidade pela não
fixidez, mas pela mobilidade, portanto.
Para Freud, a criança não tem seu gozo restrito ao aspecto genital, daí a
ideia de polimorfo; ao mesmo tempo, a criança não apresenta um objeto
fixo para um determinado impulso, daí a ideia de perverso. Logo, é
frequente que a criança sinta prazer de diversas formas e com diversos
objetos.

Mas é importante que entendamos que esse prazer da criança não se


enquadra, necessariamente, à lógica do prazer caraterístico da vida
sexual adulta.

Podemos exemplificar como o prazer na mucosa da boca. O beijo ou o


ato de fumar podem ser, tradicionalmente, do ponto de vista
psicanalítico, vistos como derivados do prazer infantil da sucção no ato
da amamentação.

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A pulsão: definição e
características
Neste vídeo, o professor Maicon Pereira da Cunha explicará a diferença
entre os conceitos de pulsão e de instinto, apresentando as principais
características da pulsão e a importância desse conceito para o
entendimento do traço de perversão polimorfa da teoria psicanalítica.

A variabilidade do objeto da pulsão é destrinchada a partir do primeiro


dos três ensaios, intitulado As aberrações sexuais. Nele, Freud subverte
a ideia de perversão, trazendo-a para mais perto de uma certa noção de
normalidade. Para o psicanalista, numa perspectiva psicodinâmica da
subjetividade, a linha que separa o normal do patológico é muito mais
tênue do que se possa vir a supor. E o conceito de perversão é uma
categoria importante para entender isso, pois a perversão não é apenas
uma condição ligada a uma perspectiva psicopatológica.
Na visão de Freud, a perversão é um conceito com muitos significados.
Dizemos a respeito do traço perverso que ele é a afirmação de um
desvio em relação a uma finalidade sexual genitalizada. No entanto,
existe uma série de práticas que visam apenas ao prazer. Algumas delas
são tão estranhas em relação ao comportamento sexual dito normal
que são consideradas aberrações.

Justamente tomando esses exemplos é que Freud constrói sua


teorização em torno da variabilidade do objeto da pulsão sexual. O
objeto da pulsão pode ser qualquer objeto.

Do ponto de vista da energia, dizemos que a energia da pulsão sexual,


seu motor, é a libido. Freud faz uma diferença entre a pulsão sexual, da
qual seu protótipo é o amor, e a pulsão de autoconservação, que visa à
preservação do indivíduo e da espécie. O protótipo desta é a fome e o
motor da pulsão de autoconservação é a necessidade.

O objetivo é outro elemento da pulsão. Em relação à sexualidade


genitalizada e com o olhar dentro da perspectiva biológica, o objetivo
sexual seria caracterizado pela união dos órgãos sexuais com fins
reprodutivos. No entanto, Freud pressupõe que, em não existindo o que
se poderia dizer de uma sexualidade normal, genitalizada e com fins
procriativos apenas, o objetivo da pulsão é a descarga, ou seja, a
satisfação. Freud afirma que há sempre algo de perverso no
concernente à atividade sexual, contornando-se um objeto para a
finalidade de obtenção da satisfação.

No segundo ensaio, Freud realiza sua maior polêmica para a época, que
é descrever sua teoria da sexualidade infantil. Afirmar que existe
sexualidade na infância foi algo bastante perturbador, como já
anunciamos. Mas vamos ao detalhamento do que Freud quer dizer com
isso.

Primeiro, é preciso reafirmar que a sexualidade infantil não é,


evidentemente, caracterizada, pela genitalização. No entanto, ela
comporta uma dimensão de sexualidade.

A sexualidade infantil é caracterizada pelo caráter


autoerótico, o que significa que a criança tem
satisfação consigo própria, em partes do seu corpo.

O autoerotismo designa o estrato sexual mais primitivo da vida


psicossexual, se caracteriza pela ausência de objeto sexual exterior. A
criança, nessa fase, extrai satisfação, por exemplo, ao chupar seu dedo.
Há uma satisfação que se serve do apoio advindo da pulsão de
autoconservação, ou seja, da necessidade corpórea de manutenção.

A noção de “apoio” é importante, pois um circuito do prazer se inicia por


meio da necessidade corporal satisfeita. Então, o chuchar, que pode,
inclusive, durar muito tempo, se apoia na primeira forma de satisfação
no objeto seio materno. Existe a satisfação de uma necessidade
orgânica derivada da nutrição do aleitamento materno, e apoiada nessa
inscrição da satisfação da necessidade, a pulsão sexual se inscreve
como registro de prazer. Aqui, temos o início da organização das fases
do desenvolvimento psicossexual, relativo à fase oral, mas disso nos
ocuparemos posteriormente.

Queremos apontar a importância de afirmar que há uma sexualidade no


ato de mamar o seio, no qual se inscreve um registro de prazer e o início
da atividade sexual da criança caracterizado pela oralidade, nesse
momento. É essa dissociação da pulsão sexual em relação ao instinto
que vai constituir a diferença do sexual entendido como instinto e do
sexual como pulsional.

Ou seja, o corpo humano é caracterizado pela pulsão, uma vez que é


imantado pela inscrição do prazer. Então, falamos das zonas erógenas,
que são certas regiões do corpo que são fonte de investimento do
prazer de maneira mais intensa e facilitada. Há áreas do corpo que são
mais sensíveis a propiciarem prazer, como a boca ou os genitais. Essas
áreas são mais facilmente passíveis de investimento libidinal.

Voltamos, então, aos outros elementos da pulsão. Falamos do objeto,


que é o que de mais variável existe na pulsão. Existe o objetivo, que é a
satisfação. Os outros dois elementos são a força, o motor, a energia
necessária para que a pulsão exerça seu circuito. A força da pulsão é
sempre constante. A fonte da pulsão, como vimos pela noção de
“apoio”, está sempre referida ao corpo, portanto, é sempre
endossomática, ou seja, advém do interior do corpo.

Os destinos da pulsão
No texto A pulsão e os destinos da pulsão (1915), Freud disserta sobre
seus destinos. A questão gira não apenas em torno da discussão sobre
o que é a pulsão, mas sobretudo para o desenvolvimento dos seus
destinos.

Os destinos se desenvolvem em quatro partes, conforme podemos


observar a seguir:

Recalque expand_more

O primeiro destino da pulsão é o recalque. O recalque é uma


operação psíquica que consiste numa divisão, a divisão que
opera o próprio funcionamento do aparelho psíquico, dividido
entre os sistemas consciente e inconsciente. Aquilo que é
conflitivo ao sujeito tenderá a ser recalcado.

Por exemplo, um pensamento que se julga moralmente errado,


como ter desejo por alguém casado, tenderá a ser recalcado no
inconsciente.

O retorno contra a própria pessoa expand_more

O segundo destino da pulsão é o retorno contra a própria pessoa.


Considerando que há uma relação de objeto na qual o sujeito
obtém satisfação, o eixo do narcisismo afirma que é possível ao
sujeito tomar seu eu como objeto. Isso implica numa dialética
bastante rica: as dinâmicas sadomasoquistas encontram aqui
sua economia.

Por exemplo, no masoquismo o sujeito pode obter prazer ao


fazer as vezes de objeto para o sádico. No sadismo acontece o
oposto: o prazer está no exercício do poder e na dominação. Ou
seja, o objeto da satisfação pulsional no masoquismo se
deslocou, posto que o masoquismo seria um sadismo voltado
contra a própria pessoa.

A mudança de conteúdo em seu oposto expand_more

O terceiro destino da pulsão é a mudança de conteúdo em seu


oposto. O mais comum é a ambivalência, na qual sentimentos
opostos se mesclam em relação ao mesmo objeto. Nessa
reversão em seu contrário, encontramos a transformação do
amor em ódio, por exemplo. A pulsão obtém satisfação do
mesmo objeto que já amou, no entanto, odiando-o.
Sublimação expand_more

O último destino da pulsão é a sublimação. Tendemos a pensar a


sublimação como sinônimo de criação, especialmente a
artística. Pode haver sublimação na arte, mas nem toda arte é
sublimação, e tampouco toda sublimação se converte em arte. A
sublimação é, sobretudo, a necessidade de criação de um
caminho que seja orientado pela transformação da energia
sexual em fins culturais.

Um exemplo de sublimação pode ser encontrado quando o


artista pinta um quadro.

Antes de passarmos às fases do desenvolvimento psicossexual,


retomamos os Três ensaios de Freud, somente para elencar o terceiro
deles, que diz respeito às transformações da puberdade. Aqui, fala-se da
sexualidade em sua caracterização já genitalizada, devido à
possibilidade do exercício sexual já desenvolvido. A pulsão, que em sua
fase infantil é caracterizada pela parcialidade, devido ao seu caráter
autoerótico, a partir da puberdade pode ser determinada pela primazia
dos genitais.
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

(MB ‒ 2014 ‒ CSM ‒ Primeiro Tenente ‒ Psicologia). Freud (1905),


em Três ensaios sobre a teoria da sexualidade, postula um
importante conceito da Psicanálise como sendo "O representante
psíquico de uma fonte endossomática de estimulação que flui
continuamente" e "um dos conceitos da delimitação entre o anímico
e o físico". Qual é a denominação desse conceito?

A Latência
B Libido

C Pulsão

D Zona erógena

E Disposição perverso-polimorfa

Parabéns! A alternativa C está correta.


Conceito fundamental da Psicanálise, a pulsão se delineia como
uma medida de exigência de trabalho feita do somático, ou seja, do
corpo ao psíquico. Trabalhado primeiramente no texto Três ensaios
sobre a teoria da sexualidade, de 1905, esse conceito será
sistematizado em 1915, no texto A pulsão e os destinos da pulsão.

Questão 2

(Concurso Público ‒ Psicologia Clínica ‒ UERJ ‒ 2015). No segundo


dos Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905), em relação
ao chuchar (contato de sucção com os lábios, do qual está excluído
qualquer propósito de nutrição), que Freud toma como uma
manifestação na qual se pode estudar os traços essenciais da
atividade sexual infantil, considera-se que

o sexual se confunde com o genital e a satisfação


A
da pulsão é autoerótica.

o sexual não se confunde com o genital e a


B
satisfação da pulsão é autoerótica.

o sexual se confunde com o genital e a satisfação


C
da pulsão não é autoerótica.

o sexual não se confunde com o genital e a


D
satisfação da pulsão não é autoerótica.
E o genital se confunde com o sexual e a satisfação
da pulsão é autoerótica.

Parabéns! A alternativa B está correta.


A característica da sexualidade infantil é o autoerotismo,
diferentemente da sexualidade da vida adulta, marcada
notadamente pela possibilidade da vivência da sexualidade em sua
manifestação genitalizada. O autoerotismo comporta a dimensão
do prazer com partes do próprio corpo.

3 - Elementos do desenvolvimento
psicossexual
Ao final deste módulo, você será capaz de relacionar os elementos do
desenvolvimento psicossexual.

Desenvolvimento
psicossexual
Freud realiza, durante sua pesquisa, um importante mapeamento acerca
do desenvolvimento psicossexual do sujeito a partir da sexualidade
infantil. Para a Psicanálise, o desenvolvimento humano e a
personalidade não se encerram apenas na observação dos aspectos
orgânicos ou cognitivos. A experiência psicanalítica ressalta a
importância do aspecto emocional nesse sentido. Freud entendia que o
sujeito se desenvolve de forma integrada com seus aspectos físico e
psíquico, cognitivo e emocional. Nessa leitura, mente e corpo andam
juntos. E como é realizado esse desenvolvimento? É isso que veremos
neste módulo.
O desenvolvimento humano atrelado à sexualidade preconizado pela
Psicanálise está de acordo com a Organização Mundial da Saúde
(OMS), quando diz que:

A sexualidade forma parte integral da


personalidade de cada um. É uma
necessidade básica e um aspecto do ser
humano que não pode ser separado dos
outros aspectos da vida. Sexualidade não é
sinônimo de coito e não se limita à presença
ou não do orgasmo. Sexualidade é muito
mais do que isso, é a energia que motiva a
encontrar o amor, o contato e a intimidade e
se expressa na forma de sentir, na forma de
as pessoas tocarem e serem tocadas. A
sexualidade influencia pensamentos,
sentimentos, ações e interações e tanto a
saúde física como a mental. Se a saúde é um
direito humano fundamental, a saúde sexual
também deveria ser considerada como um
direito humano básico.

(OMS, 1975, apud EGYPTO, 2003, p. 15-16)

Assim, é importante observar o desenvolvimento psicossexual do


sujeito, e essa observação é feita por Freud a partir do infantil. A criança
obtém prazer no seu cotidiano, e esse prazer, seja na brincadeira com as
outras crianças, com seus pais, enfim, com seu meio, seja com seu
próprio corpo, cria marcas que serão constitutivas de sua organização
psicológica.

Com a ajuda da interlocução com W. Fliess (cartas 52 e 75), desde 1896,


Freud empenha-se em estabelecer os períodos do desenvolvimento
individual, os quais estariam relacionados a zonas erógenas
determinadas. Por isso, emprega desde sempre o termo “fase”, para
com ele designar as etapas da evolução da libido, isto é, da energia
sexual.
A noção de fase é importante, pois permite entendermos de forma
ampla alguns elementos e acontecimentos daquele período do
desenvolvimento. Uma determinada fase está ligada à centralidade de
alguma zona erógena. A partir da noção de zona erógena e da
suposição de que algumas partes do corpo são mais suscetíveis à
erogeneização, Freud desenvolveu seu conceito de “organização” da
libido, implicando certo modo de relação do indivíduo com seu mundo.

Importante afirmar que Freud não pensa o desenvolvimento de forma


exatamente linear e progressiva. Isso quer dizer que pode haver
regressões.

Exemplo
Uma criança já passou por algumas fases do desenvolvimento, de
forma que ela já conseguiu adquirir um controle muscular e
esfincteriano e, portanto, ela já não faz xixi na cama. Após o nascimento
de uma irmã ou irmão, ela pode se sentir insegura com relação ao amor
dos pais por ela e reage à ameaça que a criança mais nova lhe causa.
Com isso, ela pode rechaçar aquele bebê e voltar a fazer xixi na cama.
Quer dizer, o aspecto emocional é importante para entender essa trama.

Antes de prosseguirmos, vejamos o que temos até aqui:

Há sexualidade na infância, mas essa sexualidade não é


caracterizada pelo traço da genitalidade, esta que é a sexualidade
que se presencia na vida adulta. Entende-se sexualidade como
uma energia de vida.

A sexualidade infantil remonta à ideia de marcas ligadas ao outro,


denotando o seu caráter intersubjetivo.

O corpo não é meramente um corpo orgânico, mas um corpo


pulsional.

A pulsão é um conceito que se instaura entre o corpo e o psíquico,


ou anímico.

video_library
As fases de evolução e
organização da libido
O professor Maicon Pereira da Cunha explicará por que, para Freud, o
desenvolvimento psicossexual pode ser dividido em fases, apresentará
sua relação com as zonas erógenas, bem como as cinco etapas de
desenvolvimento.
As fases do desenvolvimento
psicossexual
Conheça as fases do desenvolvimento psicossexual:

psychology
Fase oral
psychology
Fase anal-sádica
psychology
Fase fálica
psychology
Período de latência
psychology
Fase genital
A fase oral
É a primeira fase da evolução sexual pré-genital, corresponde aos
primeiros momentos de vida até 2 anos de idade, aproximadamente, e
refere-se ao momento em que o prazer ainda está ligado à ingestão de
alimentos e à excitação da mucosa dos lábios e da cavidade bucal. É
também relacionada ao caráter canibalístico, devido à centralidade da
oralidade, na qual o conhecimento do mundo se dá pela boca. O objetivo
sexual consiste na incorporação do objeto, o que funcionará como
protótipo para identificações futuras, como a significação comer-ser-
comido que caracteriza a relação de amor com a mãe, por exemplo.

O canibalismo é um termo utilizado em Psicanálise por referência ao


canibalismo praticado por povos, em geral, primitivos. A qualificação do
canibalismo se dá por relações de objeto e fantasias que estão em
correlação com a atividade oral. O termo exprime de modo figurado
múltiplas dimensões da incorporação oral: amor, destruição,
conservação no interior de si mesmo e apropriação das qualidades do
objeto. O caráter canibalístico se refere ao extrato primitivo, mas pode
ser observado socialmente, por exemplo, em rituais religiosos. O ato de
comungar no rito católico diz respeito a incorporar oralmente a figura de
Jesus Cristo.

No caso da organização oral, a fonte é a zona oral, o objeto é o seio e o


objetivo é a incorporação do objeto. É importante assinalar que a fase
oral não é caracterizada apenas pelo predomínio de uma zona de corpo,
mas também por um modo de relação de objeto: a incorporação.

Entende-se com isso que o alimento, enquanto objeto de uma


necessidade orgânica, física, se distingue, como objeto do instinto,
daquilo que constituirá o objeto da pulsão, isto é, o seio materno para o
bebê. No desmame, quando esse objeto é abandonado, ou seja, quando
a satisfação se desliga da necessidade de nutrir-se, tanto o objeto
quanto o objetivo ganham autonomia com respeito à nutrição, constitui-
se o protótipo da sexualidade oral para Freud — o chupar o dedo — e o
início do autoerotismo.

A fase anal-sádica
A fase anal-sádica é a segunda fase pré-genital da sexualidade infantil,
situada entre os 2 e os 4 anos, aproximadamente. Essa fase é
caracterizada por uma organização da libido sob o primado da zona
anal e por um modo de relação de objeto que Freud denomina “ativo” e
“passivo”. É uma fase marcada pelo controle dos esfíncteres.

Freud salienta o valor simbólico dessa fase, sobretudo ligado às fezes.


Tal é o caso da significação de que se reveste a atividade de dar e
receber ligada à expulsão e à retenção das fezes. É na fase anal que se
constitui a polaridade atividade-passividade que Freud faz corresponder
à polaridade sadismo-masoquismo.

A dimensão da ordem começa a surgir nessa fase, de forma a separar e


organizar o limpo do sujo. Incentiva-se a criança a utilizar o “troninho”
para defecar. Em geral, há um certo encanto da criança com suas fezes;
ela fica observando suas fezes no troninho ou na privada. Nesse
momento, simbolicamente, ela se encanta com o fato de seus
excrementos serem uma produção de si, de seu corpo, e não é raro a
criança “presentear” seus pais e cuidadores com sua produção. É a
primeira oferta da criança devolvendo algo ao mundo.

A fase fálica
Marcará o momento posterior às fases oral e anal, portanto, entre os 3–
5 anos. É nela que a criança reconhece apenas um órgão genital: o
masculino. Para Freud, essa fase apresentará a oposição entre os sexos,
por meio da distinção fálico-castrado, portanto, caracterizada pela
castração.

A libido é de natureza masculina, tanto na mulher como no homem,


devido à centralidade do falo. O falo é o equivalente simbólico do pênis,
símbolo de poder nessa teorização. A inveja do pênis, nessa leitura, é
caracterização do feminino, marcado pela castração.

Nessa fase, Freud identificou reações de crianças a seus pais como


ameaça potencial à satisfação de suas necessidades. Dessa forma,
para o menino que deseja estar próximo de sua mãe, o pai se torna
como que um rival. Ao mesmo tempo, o menino ainda quer o amor e a
afeição de seu pai. Surge, portanto, a ideia de ambivalência, ou seja, a
criança terá que lidar com o fato de amor e ódio estarem muito
próximos, sobretudo na fantasia. A criança está na posição de querer e
temer ambos os pais.

Período de latência
O período de latência no desenvolvimento da criança não é
caracterizado como uma fase do desenvolvimento psicossexual
exatamente, mas sim uma fase na qual o desenvolvimento fica como
que suspenso.

A palavra latência expressa exatamente um período durante o qual algo


se elabora, antes de assumir existência efetiva. Na Medicina, em geral,
latência diz respeito ao intervalo entre o começo de um estímulo e o
início de uma reação associada a esse estímulo; tempo de reação.
No desenvolvimento psicossexual, ocorre entre 5–6 anos até a
puberdade. Nesse período, já houve a superação do complexo de Édipo.
O superego, a instância crítica do aparelho psíquico, resta como herdeira
do complexo edipiano. É a parte responsável pela porção moral do
psiquismo e representa os valores da sociedade.

No período da latência, a pulsão sexual é desviada para outras


finalidades, tais como a construção de aspirações estéticas e morais e a
aquisição de conhecimento. Os impulsos da pulsão sexual são
desviados para atividades intelectuais e outras destinações, como
amizades, estudos ou esportes.

A fase genital (puberdade e vida


adulta)
A fase genital se caracteriza pela viabilidade da vida sexual genitalizada.
Marca a vida adulta, e há uma volta à energia sexual para os órgãos
genitais e, portanto, em direção às relações amorosas. Os conflitos
internos típicos das fases anteriores atingem aqui uma relativa
estabilidade conduzindo a pessoa a uma estrutura do ego que lhe
permite enfrentar os desafios da idade adulta. Nesse momento,
meninos e meninas estão conscientes de suas identidades sexuais
distintas e começam a buscar formas de satisfazer suas necessidades
eróticas e interpessoais.

Segundo Freud, a fase genital começa a partir do desenvolvimento da


puberdade. Não há uma idade precisamente, até porque isso varia de
pessoa para pessoa e contingências variadas, mas podemos afirmar
que por volta dos 11 ou 12 anos mudanças corporais, hormonais e
psicológicas são sensivelmente notadas.

A fase genital é uma fase que marca o fim da vida etária infantil e marca
o início da vida adulta. A atenção da organização da energia libidinal se
concentra nos órgãos genitais.
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1

(UFPR/PRHAE ‒ Processo Seletivo ‒ Hospital de Clínicas – 2009 –


Psicólogo) Na obra clássica Três ensaios sobre a teoria da
sexualidade, Freud propõe fases de desenvolvimento da
organização sexual na infância que permeariam a estruturação
psíquica da criança.

Sobre essas fases, assinale a alternativa correta:

As fases descritas são caracterizadas pelo


A
autoerotismo.

A fase oral, ou organização sexual pré-genital


B canibal, encontra-se ligada à ingestão de alimentos
e fundamenta-se na incorporação do objeto.

A fase anal apresenta uma organização na qual dois


C
objetos idênticos e parciais seriam buscados.

A fase de maturidade genital caracteriza-se pelo


D reconhecimento do genital masculino, para onde
convergem todos os impulsos sexuais.

A fase fálica ocorre durante a adolescência, uma vez


E
que os objetos encontram-se hipererotizados.

Parabéns! A alternativa B está correta.


A primeira fase do desenvolvimento psicossexual é a fase oral,
marcada pelo conhecimento do mundo pela incorporação objetal.
Como a centralidade ocorre na boca, essa fase também é
conhecida como organização sexual pré-genital canibal.

Questão 2

Fase do desenvolvimento psicossexual marcada pelo controle dos


esfíncteres:
A Fase canibalística

B Fase genital

C Fase oral

D Fase anal

E Fase de latência

Parabéns! A alternativa D está correta.


É uma fase que ocorre mais ou menos entre os 2 e 4 anos e segue a
fase oral. É marcada pelo caráter anal, no qual o controle retentivo é
uma importante aquisição do desenvolvimento, além de ter uma
troca simbólica envolvida na questão da produção das fezes.

4 - Complexos de Édipo e de castração


Ao final deste módulo, você será capaz de relacionar os complexos de
Édipo e de castração no desenvolvimento.

Origens do complexo de
Édipo
Chegamos a um ponto que diz respeito não exatamente às fases do
desenvolvimento psicossexual, mas aos eixos-chave na interpretação
sobre o processo de elaboração da subjetividade pela perspectiva da
Psicanálise. Aqui, a referência é à centralidade do complexo de Édipo e
ao seu correlato, o complexo de castração.

Para entender melhor essa centralidade, precisaremos fazer um recuo à


superação da teoria do trauma. Lembremos que Freud se deparava
naquele momento inicial da Psicanálise com os casos de histeria em
que teria havido uma sedução sexual. Essa sedução teria sido exercida
por uma figura masculina mais velha que, em geral, seria o pai. Freud
começa a se espantar que quase toda Viena seria abusadora, haja vista
que eram recorrentes os relatos de abusos.

Evidentemente que havia casos de abuso materialmente falando.


Ocorriam abusos naquela época e ainda hoje, infelizmente, e esses
casos muitas vezes são silenciados. Todavia, Freud começou a prestar
atenção na escuta de uma cena de sedução que ocorria na fantasia.
Nessa medida, isso demonstrava a importância da fantasia e da
sexualidade infantil, e essas duas dimensões ficam articuladas pela
descoberta do complexo de Édipo.

Freud faz poucas referências ao complexo de Édipo, apesar de trabalhar


em toda a sua teoria com esse elemento. O complexo de Édipo surge
pela primeira vez em uma carta a Fliess, de 15 de outubro de 1897. Mas
antes de mencionar essa carta, observaremos como Freud articula essa
ideia com o que vinha observando em sua clínica da histeria e como
alguns dos principais conceitos da Psicanálise foram surgindo.

Em 1897, Freud narra:

Os impulsos hostis contra os pais


(desejo de que eles morram)
também são um elemento
integrante das neuroses. (...) Estes
são recalcados nas ocasiões em
que é atuante a compaixão pelos
pais — nas épocas de doença ou
morte deles. (...) Parece que esse
desejo de morte, no filho, está
voltado contra o pai e, na filha,
contra a mãe.
(FREUD, 1950, p. 304-305)

Logo a seguir, na famosa Carta 69, Freud dirige a Fliess sua dúvida com
relação à teoria do trauma, dizendo não acreditar mais em sua neurótica
[teoria das neuroses]. É nesse momento que ele articula a teoria da sua
neurótica com as fantasias edipianas, afirmando serem estas o motivo
de suas descrenças nas cenas de abusos reais em todos os casos. O
importante de ser compreendido aqui é a fantasia sexual tendo
invariavelmente os pais como tema.

video_library
Os complexos edipiano e de
castração
O professor Maicon Pereira da Cunha refletirá sobre como a teoria do
trauma e a fantasia de sedução permitem que Freud articule o complexo
de Édipo e seu correlato, o complexo de castração, e derivados:
complexo de Electra, complexo de Édipo invertido.

Freud segue na estruturação dos primeiros passos na organização do


complexo de Édipo constatando em si mesmo uma série de
sentimentos ambivalentes com relação às suas figuras familiares, pais e
até um irmão. Essa constatação se dá por meio de sua produção
onírica, ou seja, por meio de um sonho seu. Aí constata o que considera
como um evento universal do início da infância, a paixão pela mãe e o
ciúme do pai, que é justamente o eixo axial da trama edipiana: “Sendo
assim, podemos entender a força avassaladora de Oedipus Rex, apesar
de todas as objeções levantadas pela razão contra a sua pressuposição
do destino; (...) Cada pessoa da plateia foi, um dia, em germe ou na
fantasia, exatamente um Édipo como esse” (FREUD, 1950, p. 316).

A trama a qual todo vivente passaria em seu processo de


desenvolvimento é concebida por Freud por meio da alegoria da
tragédia grega do Édipo Rei, na qual sentimentos ambivalentes em
relação às figuras parentais orquestrariam nossa concepção subjetiva.

A tragédia Édipo Rei trata-se de uma peça de teatro grego antigo, escrita
por Sófocles aproximadamente em 427 a.C. A história central dessa
tragédia relata a história de Édipo. Édipo é o governante de uma cidade
que está sendo dizimada por uma praga. Envia, então, Creonte, seu
cunhado, para consultar o oráculo de Delfos. A resposta que recebe é
que o homem responsável pela morte de Laio, rei anterior a Édipo, vive
entre eles e deve ser morto para findar o terror.

Um velho adivinho, Tirésias, acusa Édipo pela morte de Laio, pois existia
uma profecia na qual Édipo assassinaria seu pai para casar com sua
mãe. Nesse momento, um mensageiro revela que Édipo tem pais
adotivos. Então, ele descobre que é filho de sua esposa Jocasta e que
matou Laio, seu pai, em uma de suas viagens.

Édipo era um bebê tebano abandonado para morrer. Por piedade, um


pastor coríntio o leva para sua cidade, onde será adotado pelo rei Pólibo.
Após muitos anos consultando o oráculo de Delfos para esclarecer uma
dúvida sobre sua origem, Édipo é atingido por uma grande profecia: seu
destino é matar o pai e casar com a própria mãe.

Tentando fugir de seu destino, como ocorre em toda tragédia grega,


Édipo abandona Corinto. Em suas andanças, encontra um homem mais
velho, com quem discute em uma encruzilhada. Encolerizado, mata o
viajante. Seguindo sem rumo, chega às portas de Tebas, onde a Esfinge
lhe propõe um enigma. Se errar, morrerá. A resposta de Édipo salva a
sua vida e a da cidade. Como dupla recompensa, recebe de Creonte —
irmão da rainha e até então regente de Tebas — o título de rei e a mão de
Jocasta, viúva de Laio, o rei assassinado misteriosamente.

Em uma Conferência de 1917, intitulada O Desenvolvimento da Libido e


as Organizações Sexuais, Sigmund Freud alude:

E, agora, os senhores estarão ávidos


por ouvir o que esse terrível
Complexo de Édipo contém. Seu
nome o diz. Todos os senhores
conhecem a lenda grega do rei
Édipo, fadado pelo destino a matar
seu pai e a desposar sua mãe, que
fez todo o possível para escapar à
decisão do oráculo e puniu-se a si
próprio cegando-se, ao saber que,
apesar de tudo, havia, sem querer,
cometido ambos os crimes.
(FREUD, 1917, p. 334.)

Édipo na teoria psicanalítica do


desenvolvimento do sujeito
A partir da referência à tragédia grega do apaixonamento pela mãe de
Édipo e da rivalidade paterna, Freud formula a trama edipiana no
menino. Essa é a forma simples do Édipo. Lembrando que Freud não
trabalha com o conceito do complexo de Electra, que seria tal qual o
complexo de Édipo no menino, mas na menina. A ideia do complexo de
Electra é trabalhada por Carl Gustav Jung posteriormente.

Freud preconiza que o Édipo na menina é o inverso em relação ao


menino, o que quer dizer que há um apaixonamento da menina pelo pai
e a rivalidade com relação à mãe. A questão vai se tornando um pouco
mais complexa ao longo de outros textos, mas estamos tentando
simplificar aqui para entender a lógica estrutural do complexo de Édipo:

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Complexo de Electra Com

Em sua Conferência de 1917, Freud afirma que a conduta do menino se


origina em motivos egoísticos, e explica que esse caráter egoísta é
justamente a fonte de ligação com a mãe, na medida em que ela
satisfaz todas as necessidades da criança. É aí que o interesse
egoístico oferece um ponto de apoio ao qual a tendência erótica se
vincula, de forma que o menino pode mostrar a mais indisfarçada
curiosidade sexual para com sua mãe.

Freud fornece exemplos disso, como a insistência em dormir ao seu


lado, solicitar sua presença à noite, permanecer junto a ela quando ela
está se vestindo ou mesmo fazer tentativas reais de seduzi-la. E chama
atenção que a mãe dedica a mesma atenção à sua filhinha, sem
produzir igual resultado. Por outro lado, o pai frequentemente compete
com a mãe em proporcionar cuidados ao menino, e, no entanto, não lhe
é atribuída a mesma importância que a ela.
Acompanhando a evolução da trama edipiana por uma outra
perspectiva, verificar-se-á um apaixonamento que surge da simbiose
mãe-bebê. Essa simbiose se verá ameaçada quando outros elementos
importantes se impõem na cena. É a distinção anatômica entre os
sexos, à medida que há posteriormente a identificação da existência de
seres com o pênis e seres sem.

Essa constatação surge simbolicamente referida à fantasia de que em


um início todos os seres tinham o pênis (agora numa referência ao
phallus — falo, o equivalente simbólico do pênis), mas que alguns seres
o perderam (as mulheres).

Em 1924, no texto da Dissolução do complexo de Édipo, Freud articula o


complexo de Édipo como o fenômeno central do período sexual da
primeira infância. Ele afirma que, após esse período, se efetua sua
dissolução, e é seguido pelo período de latência. É nesse ponto que
Freud amarra o complexo de Édipo ao complexo de castração.

A observação que organiza o complexo de castração é a visão dos


órgãos genitais femininos. O menino, tendo orgulho da posse de um
pênis, tem uma visão da região genital de uma menina e não pode
deixar de convencer-se da ausência de um pênis na menina. “Com isso,
a perda de seu próprio pênis fica imaginável e a ameaça de castração
ganha seu efeito adiado.” (FREUD, 1924, p. 195).

Resumindo
O complexo de Édipo se desfaz pela ameaça de castração, posto que
uma fantasia poderosa de que há seres castrados (as meninas) e o
medo de ele próprio também ser castrado leva o menino a abandonar o
apaixonamento pela mãe. Assim, ele se identifica com a lei simbólica,
atribuída ao pai. Em outras palavras, o menino se alia ao seu pai, como
forma de lidar com o medo de ser castrado por ele.

Por outro lado, Freud sustenta que o complexo de Édipo da menina é


muito mais simples que no menino. Dado que a menina se vê como um
ser castrado, tentativas de compensação seriam orquestradas. Pode-se
dizer, simbolicamente, que ela desloca do pênis para um bebê. Seu
complexo de Édipo culmina em um desejo fantasioso de ter um filho do
pai, numa atitude restauradora pelo seu narcisismo por meio do bebê.
Os dois desejos — possuir um pênis e um filho — permanecem
fortemente investidos no inconsciente e ajudam a preparar a menina
para seu papel posterior, de mulher.
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1
(FEPESE ‒ Prefeitura Municipal de Bombinhas ‒ Psicólogo ‒ 2019)
Analise as afirmativas abaixo a respeito do complexo de Édipo:

1. É em torno dele que ocorre a estruturação psíquica do sujeito.


2. A mãe é o objeto de desejo do menino e o pai é o rival que
impede o acesso ao objeto desejado.
3. Acontece após os 14 anos de idade, na puberdade.
4. O menino escolhe o pai como modelo de identificação
comportamental para ter a mãe.

Assinale a alternativa que indica todas as afirmativas corretas.

A É correta apenas a afirmativa 1.

B É correta apenas a afirmativa 2.

C São corretas apenas as afirmativas 2 e 4.

D São corretas apenas as afirmativas 1, 2 e 4.

E São corretas as afirmativas 1, 2, 3 e 4.

Parabéns! A alternativa D está correta.


O complexo de Édipo organiza a subjetividade dentro da
perspectiva psicanalítica. Inicia-se pela simbiose com a mãe, e o pai
exerce a função de corte dessa relação, de modo que a triangulação
edipiana é o que permite a constituição neurótica. A identificação
com o pai é uma forma de permanecer com o vínculo amoroso com
a mãe, mas com uma qualidade relacional diferente em relação ao
primeiro estágio, o da simbiose.

Questão 2

Sobre o complexo de Édipo, um dos principais conceitos da teoria


psicanalítica, pode-se afirmar que

esse complexo é percebido apenas no gênero


A
masculino.

B
tal complexo envolve a relação mãe-filho, em nada
influenciando as demais relações da criança.

o complexo de Édipo masculino vai ter seu término


C concomitantemente com o término da angústia de
castração no menino.

esse complexo é um conceito trabalhado apenas na


D análise individual, não sendo possível concentrá-lo
em grupos.

tal complexo é considerado uma patologia que gera


E nas crianças que o padecem severos problemas
adaptativos e transtornos de personalidade.

Parabéns! A alternativa C está correta.


O complexo de Édipo e o seu correlato, o complexo de castração,
culminam com a organização da trama edipiana e,
consequentemente, com a síntese da constituição psíquica em seu
processo inicial. À trama edipiana segue-se o período de latência.

Considerações finais
Ao abordar a teoria da sexualidade no pensamento freudiano,
percorremos um caminho polêmico de desvios e de provocações em
relação à moral sexual vitoriana do século XIX. Ao abordar a sexualidade
infantil, Freud ousou não apenas afirmar que existe uma sexualidade na
infância, como, a partir daí, constituiu uma teorização sobre a vida
sexual dos neuróticos.

Ao contrário da vida sexual adulta, associada à genitalidade, a


sexualidade infantil é caracterizada pelo traço autoerótico, no qual o
corpo é marcado pelas impressões e marcas advindas do campo do
outro. As zonas erógenas do corpo, impressas pelas excitabilidades
pulsionais, constituem o circuito da pulsão.

Percorremos a caracterização da pulsão, bem como os seus destinos


tendo em vista realizar uma imersão no campo da vida sexual do
neurótico e na constituição da teorização da sexualidade, vistos pela
Psicanálise. O complexo de Édipo e seu correlato, o complexo de
castração, exercem importância fundamental nesses imbróglios.
headset
Podcast
O professor Maicon Pereira da Cunha apresenta exemplos do cotidiano
que ilustram as diversas fases do desenvolvimento psicossexual na
teoria de Freud e a diferença entre o traço autoerótico na infância e a
vida sexual adulta.

Referências
ARIÉS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara, 1973.

EGYPTO, A. C. Orientação sexual na escola. São Paulo: Cortez, 2003.

FERENCZI, S. Escritos psicanalíticos (1908-1933). Rio de Janeiro:


Taurus, 1988.

FREUD, S. Extratos dos documentos dirigidos a Fliess (1950 {1892-


1899}). In: ______. Publicações pré-psicanalíticas e esboços inéditos
(1886-1899). Rio de Janeiro: Imago, 2006. (Edição Standard Brasileira
das Obras Completas de Sigmund Freud, v. 1)

FREUD, S. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905). In: ______.


Um caso de histeria, Três ensaios sobre a teoria da sexualidade e outros
trabalhos (1901-1905). Rio de Janeiro: Imago, 2006. (Edição Standard
Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, v. 7)

FREUD, S. Pulsão e destinos da pulsão (1905). In: ______. Escritos sobre


a Psicologia do Inconsciente. Rio de Janeiro: Imago, 2004.

FREUD, S. Conferência introdutória XXI: O desenvolvimento da libido e


as organizações sexuais. In: ______. Conferências introdutórias sobre
psicanálise (Parte III) (1916-1917). Rio de Janeiro: Imago, 2006. (Edição
Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, v. 16)

FREUD, S. A dissolução do complexo de Édipo (1924). In: ______. O ego e


o ID e outros trabalhos (1923-1925). Rio de Janeiro: Imago, 2006.
(Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, v.
19)

GARCIA-ROZA, L. A. Freud e o Inconsciente. 21. ed. Rio de Janeiro:


Zahar, 2005.

WINNICOTT, D. Preocupação materna primária. In: ______. Textos


selecionados: da pediatria à psicanálise. Tradução de J. Russo. 2. ed.
Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982, p. 491-498.

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Para saber mais sobre os assuntos tratados neste conteúdo, leia:

A biografia Sigmund Freud na sua época e em nosso tempo, de


2016, realizada pela psicanalista e historiadora Elizabeth
Roudinesco. Sua visão histórica contempla uma perspectiva que
mapeia de maneira bem interessante as coordenadas do
pensamento psicanalítico em Freud.

A biografia de Freud, por Peter Gay: Freud, uma vida para o nosso
tempo.

A clássica primeira biografia de Freud, de Ernest Jones: Vida e


obra de Sigmund Freud.

Na internet, há ótimas fontes que contribuem para o seu estudo.


Pesquise:

O canal no YouTube do psicanalista Christian Dunker tem bons


vídeos introdutórios sobre questões interessantes da Psicanálise.

O site freudonline é uma ferramenta que contém a obra completa


disponibilizada de Sigmund Freud.

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