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2023

Literaturas São-tomense,
Cabo-verdiana e
Guineense
Docente: Doutora Doris Wieser
NÁDIA SOFIA DA CRUZ ALMEIDA
São Tomé e Príncipe (aulas:2,3,4,5)
Golfo da Guiné

Linha vulcânica dos Camarões


 Bioko (Guiné Equatorial, capital: Malabo)
 Príncipe
 S. Tomé
 Ano-Bom (Guiné Equatorial)

São Tomé e Príncipe


Duas ilhas principais,
a 140 km de distância

Distância da costa africana:


Príncipe:225 km da Guiné Equatorial
São Tomé: 250 km do Gabão
o Em Annobón fala-se uma espécie de português antigo misturado com Espanhol.

Área total:
 1030 km2 (S. Tomé: 847 km2)
 Príncipe: 114 km2) [Comparação:
Portugal:92.256 km2, Cabo
Verde: 4033 km2]

Habitantes:
 aprox.190.000, dos quais aprox.
7.300 na ilha do Príncipe
[Comparação:Coimbra:140.000
Cabo Verde: 560.000]

Capital:
 São Tomé (aprox. 60.000
habitantes)
{Comparação: Município da
Figueira da Foz)

Linha equatorial:
 Ilhéu das Rolas

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Nádia Almeida
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São Tomé:
 50 km de comprimento
 30 km de largura
 lha montanhosa
 Picos de até 2000 m

Príncipe:
 30 km de comprimento
 6 km de largura
 Picos de até 948 m

Clima:
 Quente e húmido
 Temperatura média anual: 22 a 30°C
 Chuvas em março e setembro;
 Vento/ "gravana" de maio a agosto;
 Maior calor de dezembro a fevereiro.

o Em São Tomé não existia uma comunidade antes dos colonizadores.


o Os São Tomenses consideram a existência de duas colonizações.

História -a primeira colonização


• Entre 1470 e 1471: descobrimento por João de Santarém, Pêro Escobar e João de
Paiva.
• Ilhas desabitadas (chegada anterior dos angolares?).
•1486: Começo do povoamento por portugueses (do continente e da Madeira) e alguns
espanhóis e genoveses + pessoas escravizadas da costa ocidental da África.
• 1493: -deportação de 2000 crianças luso-judaicas para serem doutrinadas no
cristianismo. Foi uma medida estratégica para retirar os judeus na península e, ao
mesmo tempo, para criar uma população branca em São Tomé. Muitas das crianças
desterradas foram mortas devido às condições climáticas.
-A capitania de São Tomé passa para Álvaro de Caminha, ocupação efetiva da
ilha.

o Deve utilizar-se o termo “pessoa escravizada” e não o termo “escravo”. Este segundo
termo faz com que se pense que “ser escravo” é toda a essência da pessoa em questão.

• Trabalho escravo nas plantações de cana-de-açúcar


• Miscigenação entre donos dos engenhos e escravas negras

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• 1500: Ilha do Príncipe passa para António Carneiro, mantendo-se pertença desta
família até 1753
• 1515: carta régia - alforria aos luso-descendentes e suas mães (escravas)
• 1528: carta régia - regulamentação da participação dos mestiços na administração
quando fossem “homens de bem e bem casados" (quem decide é o estado colonial.
Origem da assimilação)

o A ideia das famílias ricas brancas era lucrar com a produção da cana-de-açúcar e com o
tráfico de escravos.
o Ideia de superioridade dava origem a violações para a procriação afim de “branquificar” a
raça negra. Esta é a origem dos mestiços.

História - O grande pousio (séc. XVII e XVIII)


(este pousio não é voluntário, acontece por motivos económicos. Não há economia das
plantações e, por isso, há uma certa possibilidade dos mestiços se afirmarem como senhores
das terras).
• Indústria açucareira mantém-se aprox. durante um século (século XVI)
• Entra em declínio por causa do desenvolvimento da cultura açucareira no nordeste
brasileiro
• Seguem-se 200 anos de "grande pousio" (F. J. Tenreiro), séculos XVII e XVIII
• São Tomé torna-se apenas entreposto de pessoas escravizadas (a caminho das
plantações brasileiras) e porto de escala para emigrantes
• Aglutinação de elementos culturais variados (africanos, portugueses, americanos e
brasileiros) -› resultado: aristocracia de mestiços
• Revoltas pela posse das terras.

o Foi uma oportunidade dos mestiços se tornarem donos da sua própria terra.

História - a segunda colonização


• Séc. XIX: introdução de café e cacau, recuperação económica
• Declínio do tráfico de pessoas escravizadas, pela abolição da escravatura.
• Novo fluxo de colonos brancos, novo ciclo de exploração
• Expropriação dos crioulos luso-descendentes (filhos-da-terra)
• 1869: abolição da escravatura, crise laboral
• 1876: importação de mão-de-obra, contratados/condenados de Angola e
Moçambique, contratados de Cabo Verde
• Era do serviçal, abusos de poder
• Estratificação social, afastamento entre colonos e africanos (pessoas racializadas)
• Começa a formar-se a identidade histórico-cultural são-tomense: os diversos grupos
racializados aproximam-se.
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o Torna-se novamente uma sociedade hierarquizada.
o A abolição da escravidão não impediu o trabalho forçado. Os trabalhadores eram
“chamados” de contratados ou condenados. Estes últimos eram “indígenas” que não seguiam
as “leis” ou que não conseguiam pagar os seus impostos, então, eram levados a São Tomé e
Príncipe. Os contratados deixavam-se contratar com o intuito de ter condições de vida
ligeiramente melhores, esses contratados eram essencialmente cabo-verdiano o que
resulta na verificação, ainda hoje, da forte presença do crioulo cabo-verdiano na ilha.
o Formação de uniões devido à opressão. Cidadãos negros e mestiços uniam-se contra os
opressores, mesmo mantendo tradições e culturas diferentes.

História - O surgimento do nacionalismo


• 1950: 60.000 habitantes
• 43.391 "civilizados" (37.950 negros, 4.279 mestiços, 1.1152 europeus, 9
indianos e 1 oriental)
• 16.768 "não-civilizados" (16.747 negros, 21 mestiços) (Hamilton 1984: 237)
• 1953: Massacre de Batepá, cometido pelas tropas coloniais, tortura e afogamento,
aprox. 1000 mortos, data: 3 de fevereiro, hoje feriado nacional.
• 1960: fundação do Comitê pela Libertação de São Tomé e Príncipe (CLSTP), no
Gabão
• Participaram, entre outros, Miguel Trovoada, Francisco José Tenreiro (desfiliou-se),
Leonel Mário d'Alva

o Não existiu uma guerra, uma luta armada, pela independência/libertação nacional.
Existiram revoltas, mas nunca uma guerra concreta, como na Guiné-Bissau.
o “Civilizados” eram negros/mestiços aos quais eram concedidos alguns direitos.
o Após ataques como o Massacre, o povo acorda e percebe que não é possível dialogar com os
colonos de forma pacífica. Em São Tomé e Príncipe isso acontece em 1960 com a criação
da CLSTP.

História - Pós-independência
• 12 de julho de 1975: Independência
• Renomeação do partido para Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe
(MLSTP)
• Primeiro governo:
• Presidente: Manuel Pinto da Costa
• primeiro-ministro: Miguel Trovoada
• 1990: nova constituição - introdução do sistema multipartidário

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• Renomeação do partido para Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe -
Partido Social Democrata (MLSTP-PSD)
• 1994: fundação do partido Ação Democrática Independente (ADI)

o A independência de São Tomé e Príncipe (assim como nos outros países colonizados) deu-
se após o 25 de abril de 1974.
o O comité passa a ser um partido político.
o Após a independência e a criação de uma constituição, o país abre-se a um sistema
multipartidário.

Taxa de alfabetização
•1975: 80% de analfabetos
• Grandes campanhas de alfabetização no pós-independência
• 2017: 90% dos são-tomenses com mais de 15 anos sabem ler e escrever.
• 2018: A população conclui uma média de 6,3 anos de escolaridade.

o A taxa de alfabetização não significa que sabem ler ao nível europeu, significa que os
cidadãos são capazes de ler alguma coisa.

Palavras importantes
• Moradores = colonos brancos
• Filhos-da-terra = descendentes das relações entre europeus e negros escravizados
do período da cana-de-açúcar - aristocracia mestiça, governante do território durante
o "grande pousio"
• Forros = pessoas de origem africana livres, confundem-se na segunda colonização com
os filhos-da-terra
• Angolares =descendentes dos sobreviventes do suposto naufrágio, no século XV, de
um navio negreiro, no sul da ilha de S. Tomé, ou descendentes de pessoas
escravizadas fugidas (c. quilombos no Brasil), pescadores
• Tonga = pessoa natural da Ilha de S. Tomé independentemente da origem étnica
• Moncó = pessoa natural da Ilha do Príncipe
• leve-leve = expressão popular

NOTA: “O Rei Amador” - Rei dos angolares e líder de uma revolta contra o sistema
colonial em 1595.

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As 5 línguas

1. Português = língua oficial, única língua de administração, de ensino, da comunicação


social
2. Forro = crioulo da ilha de S. Tomé
3. Lunguyé = crioulo da Ilha do Príncipe.
4. Cabo-verdiano = crioulo falado pelos contratados cabo-verdianos
5. Angolar = base controversa, forte influência do kimbundo e de outras línguas africanas

• Época colonial: as línguas crioulas não foram reivindicadas como base identitária.
• A população alfabetizada costuma expressar-se em português.
• Hoje: Crioulo forro: falado por 83% dos habitantes da Ilha de S. Tomé, língua de
Força social e mobilização popular, p. ex. captação de votos em campanhas eleitorais.

Cultura
• São-tomensidade = matriz mestiça
• Socopé: "só com o pé" / "só com os pés", dança e música típicas
• Tchiloli ou Tragédia do Marquês de Mântua e do Imperador Carlos Magno (São
Tomé), representado ao ar livre, auto com música, dança e diálogos, dura mais de cinco
horas. Apropriação sincrética de uma peça de matriz europeia, envolvendo ciúme, amor,
traição e morte.
• Auto de Floripes, São Lourenço do Príncipe (Príncipe), história de cristãos e
mouros, Floripes é uma donzela moura apaixonada por um cavaleiro cristão

o Cultura mestiça, originária de várias culturas africanas e também de culturas europeias.


o Existem poucas amostras online, o que mostra a pouca acessibilidade a aparelhos
elétricos/tecnológicos e à internet.
o Só o homem tem o direito de representar.

Gastronomia
• Fruta pão
• Matabala
• Vinho de palma
•Calulu

UNEAS – União Nacional dos Escritores Santomenses.

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Obra De Manuel ferreira (no reino de Caliban ii)
 Romance de Seu Silva Costa:
«Seu Silva Costa
chegou na ilha...»

Seu Silva Costa


chegou na ilha:
calcinha no fiozinho
dois moeda de ilusão
e vontade de voltar.

Seu Silva Costa


chegou na ilha:
fez comércio di álcool
fez comércio di homem
fez comércio di terra.

Ui!
Seu Silva Costa
virou branco grande:
su calça não é fiozinho
e sus moedas não têm mais ilusão!...
(Ilha de nome santo,1942)

o O “Silva Costa” é um colonizador português que chegou à ilha. O início entre aspas
significam que alguém afirmou a outra pessoas.
o Em seguida, mostra-se a forma como chegou. O colonizador chegou pobre.
(Emigração portuguesa durante o estado novo).
o “Dois moeda“—> mímica da fala santomense.
o “E vontade de voltar” —> provavelmente alguém sem coragem, fraco.
o Enriqueceu às custas dos negros. Deu-se conta do privilégio e aproveitou-se dele.
o A linguagem é diferente, um português deturpado que não chega a ser crioulo.
Coloca-se no papel de um são tomense que verifica enriquecimento do homem
branco.
o Olhar de escárnio que desaprova o comportamento do colonizador. Uma forma do
são tomense se libertar da opressão e rir-se daquilo que acontece.
o “Romance” —> género sobretudo ibérico. O autor utiliza um género típico do branco,
com uma linguagem deturpada com a intenção de “gozar”.

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Inícios da literatura são-tomense

 Jornalismo
• 1857: primeira edição do Boletim Oficial do Governo da Província de S. Tomé e
Príncipe
• A elite de filhos-da-terra cria uma imprensa de caráter não governamental
• Revistas, jornais e boletins de associações, p.ex. O Africano, A Voz d'África, O
Negro, A Verdade, O Correio d'Africa
• Exigência de reformas dentro do sistema colonial
• Poemas dispersos, p.ex. de Francisco Stockler, António Lobo de Almada Negreiros
(pai do pintor Almada Negreiros)
• Construção de um sentimento unitário, protonacionalista

o Em meados do século XVIX há a possibilidade de imprimir textos e produzir revistas,


jornais.
o O “Boletim Oficial do Governo…” é um produto do estado do reino de Portugal, não é o local
ideal para a produção de literatura anti-colonialista.
o Nas imprensas não-governamentais o foco já não é o reino e sim o povo negro; denunciam-
se situações de abuso, mas não existe literatura de revolução e de busca pela
independência.
o Cria-se aos pouco a ideia de que os são tomenses são diferentes dos portugueses e de que
têm uma cultura diferente.

 Literatura colonial
• Roça = fazenda de café ou cacau
• O "ciclo-da-roça"
• Literatura romântico-realista noventista, visão idílica
• Perspetiva ultramarina: conflitos resolvem-se pela compaixão paternalista
• Exaltação da macro etnicidade lusitana

Exemplos do século:???

o Literatura que é mista. Identidade portuguesa e são tomense.


o As pessoas benévolas que estão no poder vão procurar algo benéfico para aqueles que
sofrem abusos, sem por em causa o colonialismo e o trabalho forçado. Resolvem os
problemas daqueles que estão em sofrimento.
o O estado novo promoveu concursos de literatura colonial sobre as colónias.

A ROÇA AGOSTINHO NETO: A roça organiza-se através da artéria principal que é


fortemente marcada pelo imponente hospital, implantado na extremidade mais elevada, bem
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como pelos terreiros e socalcos que acompanham o declive. Na era colonial era esta roça que
possuía o sistema ferroviário do arquipélago, a partir do qual se estabelecia a ligação e o
abastecimento entre as suas dependências e o porto na Roça Fernão Dias.

Inícios da literatura de caráter nacional

• A literatura são-tomense nasce em grande medida fora das ilhas, em Portugal


• STP: sistema económico rural - diferente de Luanda, Lourenço Marques ou Mindelo
(contextos urbanos favorecem a formação de movimentos culturais e literários)
• Da classe de filhos-da-terra surgiam uns poucos intelectuais e escritores, que se
formam em Portugal. Aí se cria a sua consciência como africanos e nacionalistas em
contato com africanos de outras colónias.

 A Casa dos Estudantes do Império (CEI)


• Fundada em 1944 (em Lisboa, com delegações em Coimbra e no Porto)
•Objetivos: organizar atividades culturais, desportivas e recreativas para estudantes
das colónias, integrar estes estudantes de uma forma assimilacionista.
•Transformou-se num espaço de politização anticolonial.
• Encerrada pela PIDE em 1965.
• Órgão de publicação: Mensagem
• 1948-1952: circular
• (1952-1957: interrupção, administração da casa estreitamente ligada ao
regime do Estado Novo)
•1958-1964: boletim

o A ideia era guiar os estudantes são tomenses a pensar de acordo com os ideias do estado
novo, no entanto, aconteceu o contrário. Os jovens juntaram-se e daí surgiram líderes
revolucionários anti-colonialista.

Poetas são-tomenses da CEl


• Francisco José Tenreiro
• Marcelo da Veiga
• Tomás Medeiros
• Maria Manuela Margarido
• Alda Espírito Santo
 Caetano de Costa Alegre (1864-1890)
• Negro; de uma família tradicional de
filhos-da-terra
• Chega a Lisboa aos 19 anos,
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• Desgosto pelo racismo experienciado em Lisboa, escreve com humor (fenómeno
isolado)
• Cria um incipiente espírito nacional
o Primeiro poeta são tomense com consciência negra.
o Aborda temas como o racismo de uma forma irónica e cómica.

EU E OS PASSEANTES
Passa uma inglesa,
E logo acode,
Toda surpresa:
What black my God!

Se é espanhola,
A que me viu,
Diz como rôla:
Que alto, Dios mio!

E, se é francesa:
Ô quel beauu negre!
Rindo para mim.

Se é portuguesa,
Ô Costa Alegre!
Tens um atchim!
(versos, 1916)
 Francisco José Tenreiro (1921-1963)
• Mestiço; filho de um administrador português e de mãe africana
• Passou a maior parte da sua vida em Lisboa
• Professor universitário de geografia
• Político (deputado da Assembleia Nacional)
• Escritor (poeta e contista)
• Negritudinista + neo-realista
• Intermediário entre a negritude e o luso-tropicalismo
• Tenta abrir um espaço político liberalizante durante o Estado Novo
simultaneamente contestatário e conciliatório (Hamilton 1984: 249)
• Ilha de nome santo. Novo cancioneiro (1942) - considerado obra fundacional da
literatura são-tomense
• Crioulidade são-tomense — ideia de que os são tomenses são mestiços, de que
têm uma cultura híbrida, com várias origens.
o Não tentou combater o estado de forma direta, mas sim de forma a ser um
intermediário.

Obras
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 Poema Canção do Mestiço (1942)
Mestiço!

Nasci do negro e do branco


e quem olhar para mim Ah!
é como se olhasse Mas eu não me danei ...
para um tabuleiro de xadrez: E muito calminho
a vista passando depressa arrepanhei o meu cabelo para trás
fica baralhando cor fiz saltar fumo do meu cigarro
no olho alumbrado de quem me cantei do alto
vê. a minha gargalhada livre
que encheu o branco de calor! ...
Mestiço!
Mestiço!
E tenho no peito uma alma
grande Quando amo a branca
uma alma feita de adição sou branco...
como l e l são 2. Quando amo a negra
sou negro.
Foi por isso que um dia Pois é...
o branco cheio de raiva (Ilha de nome santo,1942)
contou os dedos das mãos
fez uma tabuada e falou grosso:
— mestiço!
a tua conta está errada.
Teu lugar é ao pé do negro.

o Poema sobre a época colonial;


o Com o que se compara o mestiço?
 Tabuleiro de xadrez: conflito de identidade.
o Diz que ser mestiço é mais do que ser branco ou ser negro, visto que
tem duas heranças, duas culturas. O sujeito poético combate o racismo
e a opressão colonial através da sua afirmação.
o O branco considera que o mestiço não é “bem-comportado” por achar
que não é menos do que os brancos. Reagem com raiva, numa tentativa
de hierarquizar a sociedade em função da cor.
 A soma de “1 e 1 são 2” pelos dedos por parte do branco é uma
forma de o ridicularizar.
o O sujeito poético reage ao branco de forma irónica, com superioridade
moral.
o Francisco José Tenreiro imagina assim a identidade são tomense.

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 Poema Corpo Moreno (1967)
Se eu dissesse que o teu corpo moreno
tem o ritmo da cobra preta deslizando
mentia.
Mentia se comparasse o teu rosto fruto
ao das estátuas adormecidas das velhas civilizações de África
de olhos rasgados em sonhos de luar
e boca em segredos de amor.

Como a minha Ilha é o teu corpo mulato


tronco forte que dá
amorosamente ramos, folhas, flores e frutos e há frutos
na geografia de teu corpo.

Teu rosto de fruto


olhos oblíquos de safú
boca fresca de framboesa silvestre
és tu.

És tu minha Ilha e minha Africa


forte e desdenhosa dos que te falam à volta.
Páscoa de 1962
São Tomé
(Obra poética,1967)

o Época colonial;
o Este poema fala-nos do mesmo tema, no entanto, fá-lo de forma mais seria e
de forma mais lírica.
o Porque é que o sujeito poético “mentia” se afirmasse o que afirmou?
o Pois não é igual à restante África, tem uma tradição mestiça e não
africana.
o São uma mistura de povos africanos e europeus;
o Elogio do corpo moreno, mestiço, que possui uma estrita relação com a
natureza.
o A Ilha de São Tomé e a sua população misturam-se, conectam-se.
o FJT é o primeiro grande poeta que se propõe a criar uma identidade nacional:
uma identidade ligada à natureza, à beleza natural.
o Na última estrofe, o sujeito poético interpela a própria ilha com a intenção de
que esta se mantenha forte e fiel a si, independentemente daquilo que se diz
à sua volta.

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 Alda Espírito Santo (1926-2010)
• Mestiça
• Professora primária
• Curtas estadias em Portugal para concluir os estudos
• Presa pela PIDE por atividades políticas
• Após a Independência: ocupou vários altos cargos no governo de STP
• Ministra da Educação e Cultura, Ministra da Informação e Cultura, Presidente da
Assembleia Nacional
• Foi Secretária-Geral da União Nacional de Escritores e Artistas de São Tomé e
Principe Autora da letra do hino nacional, Independência total
o Entrou na política após a independência da ilha…

Obra
 Poema Onde Estão os Homens Caçados Neste Vento de
Loucura
o Metáforas bastante presentes na primeira estrofe, assim como a
repetição, dando a ideia de que o massacre não pára.
o Os negros/mestiços não tinham cidadania plena, então, o sujeito poético
afirma “homens que não são homens”.
o O “Zé Mulato” trai a sua parte negra. É um mestiço que participa neste
massacre do lado dos verdugos (brancos). O Sujeito Poético não consegue
compreender esse feito.
o É difícil perceber de que lado o mestiço se encontra devido à sua cor e à
suas origens, o que pode levar a um sentimento de desconfiança por parte
de negros e de brancos.
o Dor e desejo de vingança/ justiça por parte do sujeito poético ao longo da
segunda estrofe. Pelo meio, o eu lírico vai descrevendo a morte e interpela
diretamente o Zé Mulato.
o O poema é de 1958, 5 anos após o acontecimento. Escrito numa época
colonial, ou seja, numa época sem liberdade e sem dependência. Por esse
motivo, o SP termina o poema com o desejo e a esperança da liberdade.

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 O Massacre de Batepá (1953)

o Momento triste da história.

• 2018: Marcelo Rebelo de Sousa visita o Monumento em Memória dos Mártires.


• 3 de fevereiro: Marcha da Liberdade

NOTA: Manchete de notícia:” Presidente da República homenageou massacre de Batepá”, 21


de fevereiro de 2018.
“No segundo dia da Visita de Estado a São Tomé e Príncipe, o Presidente Marcelo
Rebelo de Sousa depositou uma coroa de flores, no monumento das Mártires da
Liberdade, em Fernão Dias, em homenagem às vítimas do massacre de Batepá.”

o O governo português inventa um rumor que a própria PIDE acaba por desmentir.

 Poema sòcòpé (1963) de Maria Manuela Margarida


Os verdes longos da minha ilha
são agora a sombra do ocâ,
névoa da vida,
nos dorsos dobrados sob a carga
(copra, café ou cacau - tanto faz).
Ouço os passos no ritmo
calculado do socopé,
os pés-raizes-da-terra
enquanto a voz do coro
insiste na sua queixa
(queixa ou protesto - tanto faz).
Monótona se arrasta
até explodir
na alta ânsia de liberdade.
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o Ausência de liberdade no trabalho agrícola;
o Situação de opressão nos trabalhos físicos.
o As pessoas relacionam-se com a terra/ilha de forma íntima. —> reconhecem a terra como
sua matriarca, identificam-se com ela. Porém, não gostam da sua situação e da monotonia.
o Sòcòpé é o ritmo dos pés dos trabalhadores e ao mesmo tempo o ritmo da dança.

Renascimeno negro/Back Renaissance/Harlem Renaissance

• Estados Unidos, Harlem (New York).


• Auge: 1920-30.
• Objetivo: direitos civis iguais.
• A música dos negros, jazz e gospel, ganha prestígio internacional.
• Louis Armstrong, josephine Baker, Duke Ellington, Langston Hughes.
• Revista “Firel!” (1926)- ideia de queimar as ideias velhas.
• Literatura de consciencialização negra.
• W.E.B. Du Bois- teórico mais conhecido, sociólogo e filósofo

Negrismo

• Caraíbas, sobretudo Cuba e Martinica.


• Movimento contemporâneo da Black Renaissance e influenciado por esta.
• Cuba: Alejo Carpentier- romance “Ecue-yamba-o” (1933), vodú.
• Nicolás Guillén- poesia “Motivos de son” (1930).
• Fernando Ortiz- etnólogo.
• Martinica: revista “Légitime Défense- René Menil, Étieenne Léro.

Négritude

• Movimento surgido em Paris.


• Década de 1930.
• Palavra cunhada por Aimé Césaire (de Martinca).
• Léopold Sédar Senghor (Senegal).
• Léon Damas (Guiana Francesa)
• Alioune Diop (Senegal)
• Revista “Présence Adfricaine” (Dakar e Paris, 1947).
• Frantz Fanon: Peau noire- masques blancs, 1952.
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• Apoio de Jean-Paul Sartre.
 Aspetos da negritude
 Aimé Césaire
• Identidade: orgulho na afirmação do “ser negro”.
• Fidelidade: vínculo indelével com a terra-mãe (perspetiva pan-africanista).
Tópicos
• Solidariedade: união voluntária entre os “irmãos de cor”.
típicos:
- Mãe-Negra;
- Mãe-África;  Léopold Sédar Senghor
- Mãe-Terra; • Conceito de “alma negra”: valor da emoção em detrimento da razão
- Pele negra branca/ europeia. Entendido como inerente à estrutura psíquica dos
africanos.
• O conceito de “alma negra” é desenvolvido por Sartre, no prefácio que
escreveu para uma antologia organizada por Senghor.

Pan-africanismo

• Surge depois da Conferência de Berlim (1884/85) nos Estados Unidos, na Europa e


no continente africano (sobretudo na África Ocidental).
• Objetivos: descolonização da África, união da África dividida por fronteiras
coloniais artificiais, criação de um estado africano ocidental.
• Primeiro Congresso: 1893, em Chicago.
• Marcus Garvey (Jamaica): ideologia segregacionista radical.
• W.E.B. Du Bois (EUA): organizador de cinco congressos pan-africanistas no século
XX, entre 1919 e 1945.
• 1963: fundação da Organização da Unidade Africana (OUA).
• 2002: transformação em União Africana (UA).

NOTA: foi sobretudo um movimento político.

Kwame Nkrumah (1909-1972)

• Costa do Ouro, colonia britânica.


• 1957: independência, novo nome: Gana.
• Segundo Estado africano livre (depois da Libéria, 1847).
• Lema: “Independence Now!”.
• 1957-1960: Primeiro-Ministro.
• 1960-1966: Presidente.
• Coorganizador do V Congresso Panafricanista (Manchester, 1945).

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• Uma das vozes mais populares do panafricanismo.

Coração em África (1953), de Francisco José Tenreiro

Referências:
• Willie McGee: executado nos EUA em 1951 pelo roubo de um camião.
• Nicolás Guillén: poeta do negrismo, Cuba.
• “I too am America”: poema de Langston Hughes, de 1926, Black Renaissance.
• Alioune Diop: Senegal, negritude.
• Chaka-Senghor: Leopold Sédar Senghor, Senegal, poema “Chaka” (1951) sobre
o líder Zulu.
• Joaquim Namorado: poeta português da resistência, poema “África”, do livro
“Aviso à Navegação”, de 1941.

Conceição Lima (*1961, Santana, São Tomé)

• Estudou jornalismo em Portugal.


• Trabalhou em STP na rádio, TV e imprensa.
• Em 1933, fundou o semanário “O País Hoje”.
• Licenciada no King`s College, Londres: Estudos Afro-Portugueses e Brasileiros.
• Trabalha para a BBC.
• Obra:
- “O Útero da Casa” (2004).
- “A Dolorosa Raiz do Micondó” (2006).
- “O País de Akendenguê” (2011).
- “Quando Florirem Salambás no Teto do Pico (2015).

Olinda Beja (*1946, Guadalupe, São Tomé)

• Filha de pai português e mãe santomense.


• Veio para Portugal com 3 anos de idade.
• Licenciatura em Línguas e Literaturas Modernas, Universidade do Porto.
• Curso de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa, Universidade Aberta.
• Professora do ensino secundário em Portugal, e de língua e cultura portuguesa na
Suíça.
• Volta a São Tomé e Príncipe em 1985.
• Vive hoje entre os dois países.
• O seu olhar é menos sério, e sim mais melancólico/esperançoso.
• Assume-se como escritora santomense, embora tenha feito toda a sua vida em
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Nádia Almeida
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Portugal. Porém, ao regressar em 1985, fica maravilhada com a beleza da ilha, e
isso,
inspira-a. Escreve com muita regularidade (apesar de começar a escrever tarde).
• Obra:
o 9 livros de contos (entre eles contos infantojuvenis)
o 7 livros de poesia
o 2 romances

Obra “Chá do Príncipe”


o É uma obra constituída por 22 contos, ou seja, é uma coletânea de contos
que se iniciam sempre com um provérbio em crioulo, conferindo uma certa
oralidade.
o Apresenta vários tipos de focalização e narração.
o São histórias simples e claras (como a linguagem), para além de serem
todos híbridos, por isso, não podemos definir que todos são denominados
de contos.
o Olinda Beja demonstra nos seus contos um país muito natural e humano,
mas ao mesmo tempo apresenta um cenário de pobreza e desgraça.
o Os contos funcionam como uma espécie de “conselheiros” - transmitem
valores do povo e da realização do quotidiano (possuem tom coloquial).
o Não são completamente ficcionais. Refere várias referências pessoais,
como se fosse uma biografia, conferindo uma factualidade a estes textos.
o Intertextualidade presente (tópicos comuns entre contos).
o Temáticas:
• ir e vir entre São Tomé e Portugal (própria autora passou por isso);
• pobreza;
• violência sexual por parte da colonização;
• abuso com as mulheres negras.

Contos analisados:
• “Leve, Leve”
• “Sóya, sempre sóya”
• “Rosas de porcelana”

Análise
 “Leve, Leve”:
• Uma ideia de são-tomensidade.
• Narradora muito conectada com a autora.
• Ficção mistura-se com a realidade.

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• Apresenta uma ideia positiva e negativa associada à expressão “leve, leve”.
Por um lado, é uma filosofia de vida, mas por outro lado, torna-se um
estereotipo negativo em Portugal.
• Em São Tomé não se sofre tanto do coração - referência através do
cardiologista.
• “leve, leve” é o “dicionário da vida” que transmite sabedoria e
resiliência, mas também resignação. Cria o estereótipo de que o pais não
avança, pois, os nativos não querem trabalhar devido à sua filosofia de
vida.
• Para Olinda Beja esta filosofia é positiva: “Bênção diurna”, “luz da alma”,
pretende/objetivo de criar uma imagem positiva do país.
• Como reação ao estereótipo de que o país não avança devido aos nativos, a
narradora assume uma posição de repudio e magoa, ao ver um artigo sobre
isso numa revista.
• Há um poema inserido no conto que faz parte do livro “leve, Leve”.
• Ideia de seguir em frente com ligeireza, num país marcado pelas
adversidades.
• “reinfância” aproveitam para conviver de outra forma, uma vez que se
encontram sem eletricidade.
• Para o cardiologista estar em São Tomé é libertador, um alívio da correria
que é a sua vida. Aproveita para se libertar da rotina.

 “Sóya, sempre sóya”:


• Batepá: onde a mãe tinha casa e onde ela ficava quando lá ia
(autobiográfico).
• De que maneira se constrói uma ideia de são-tomensidade (identidade
nacional são-tomense) nestes contos? Através da tradição oral,
referencias à comida, natureza, provérbios (início do conto), proximidade
familiar (contar histórias - o tio conta histórias, há aqui uma figuração de
Olinda Beja quando era criança), poligamia (hábito cultural no tio).
• O tio conta a história de um rapaz brasileiro de 26 anos que se instala na
ilha do Príncipe, onde fica a trabalhar; não se consegue casar pois nenhuma
mulher aceita que ele trate o seu cão como um irmão. Encontrou o cão na
rua, e cuidou dele como um filho, porém isso traz-lhe dor nos seus
relacionamentos.
• Epigrafe “bom coração, dá dor de coração”.
• Contar histórias é uma forma de afeto, assim como de criar laços
familiares.
• Mistura entre a ficção e a realidade.

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 “Rosas de porcelana”:
• Possuí um nº reduzido de personagens.
• Tempo do conto: início dos anos 80 onde São Tomé e Príncipe vivia numa
situação muito frágil- as razões económicas e políticas eram o foco
principal, o que levou a uma escassez de produtos e aumento da população
e das suas necessidades. A busca pela independência-conquistada em
1975-era um fator importante.
• De que maneira se constrói uma ideia de são-tomensidade (identidade
nacional são-tomense) nestes contos? A narradora opõe a pobreza
económica com a riqueza da natureza - a pobreza económica é uma
consequência da independência - através da falta de trabalho para os
recém-licenciados.
• Personagem principal: Maria Emília
• “fazer filhos em mulher alheia”: a mulher alheia é a ilha, e Portugal é visto
como um pai ausente: os são-tomenses são filhos ilegítimos de Portugal,
são um produto da colonização.
• Portugal deveria de ter a responsabilidade de dar um apoio mínimo até São
Tomé ter competências para tratar de tudo na sociedade.
• Maria Emília, professora em São Tomé. Que relação cria com a ilha, em
dois anos? Estabelece uma relação de grande proximidade com a ilha, com
os alunos, com as pessoas, com a natureza….
• Paixão pela ilha e pela natureza tropical.
• Maria Emília é a figuração de Olinda Beja – foi, também, professora.
• Episódio das rosas de porcelana: Maria Emília gosta muito dessas rosas –
ideia de encantamento/deslumbramento. Esta flor é tao importante que é
como se fosse de porcelana.

Questões:
1. De que maneira se constrói uma ideia de são-tomensidade (identidade
nacional são-tomense) nestes contos?
2. Quais são os elementos-chave e que valor lhes é atribuído?
3. Quais são os aspetos narratológicos e estilísticos mais característicos dos
contos?

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Guiné-Bissau (aulas:7,8,9,10
Área:
• 36.125 km2
• Cabo Verde: 4.033 Km2- STP: 1.030 Km2

População:
• 1,7 milhões
• Cabo Verde: 560,000- STP: 190,000

Capital:
• Bissau (aproximadamente 500,000 habitantes).

Outras cidades importantes:


• Bafatá: segunda maior cidade, aproximadamente 35,000 habitantes.
• Bolama: capital até 1931, aproximadamente 5,000 habitantes.

Divisão Política:
• 8 regiões.
• 1 setor autónomo: Bissau.

História
• Reino de kaabu, permanece até ao século XVIII.
• Reino do Mali, maior reino da África Ocidental pré-colonial, islamização no século
XI.
• 1444/46: Chegada dos portugueses ao território (Nuno Tristão e Álvaro
Fernandes).
• 1558: Fundação da Cacheu, início da colonização da costa.
• Século XIX: início da colonização do interior.
• Nome antigo: Guiné-Portuguesa.
• 1956: Fundação do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde
(PAIGC).
• 1959: Massacre de Pindjiguiti/ Pidjiguiti- repressão de uma greve no porto de
Bissau, 40-70 mortos.
• 1963: Assassinato de Amílcar Cabral a 20 de janeiro.
• 1973: declaração unilateral da independência a 24 de setembro, por Nino Vieira,
reconhecida por vários países comunistas e africanos.
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• 1974: Portugal reconhece a independência da Guiné a 10 de setembro.

Amílcar Cabral (1924-1973)


• Nasce na Guiné, em Bafatá, como filho de um professor cabo-verdiano e uma
guineense.
• Mudança para Cabo Verde, Ilha de Santiago, aos 8 anos (pela colocação do pai).
• Liceu Gil Eanes, Mindelo (S. Vicente).
• Instituto Superior de Agronomia, Lisboa.
• Atividades na CEI (Casa dos Estudantes do Império).
• 1952: regresso a Guiné como funcionário do Ministério de Ultramar.
• 1956: Fundação do PAIGC.
• 1973: assassinato em Conakri (por membros do PAIGC)

História: pós-independência
• Primeiro Presidente: Luís Cabral (irmão de Amílcar Cabral).
• Até 1980 tentativa do PAIGC de criar uma unidade entre Cabo Verde e Guiné-
Bissau.
• 1980: golpe de estado, Movimento Reajustador, líder: João Bernardo (Nino) Vieira
que se tornara o novo presidente.
• Causas do golpe: prisões e fuzilamentos em massa de guineenses que tinham
pertencido ao exército colonial português (devido à “africanização da guerra”), crise
económica.
• 1994: primeiras eleições multipartidárias.
• 1998: golpe de estado, Nuno Vieira é derrubado.
• 1998/99: guerra civil.
• 2003: golpe de estado.
• 2004: revolta.
• 2009: assassinato de Nuno Vieira e de Tagme Na Waie (chefe do Estado-Maior das
Forças Armadas).
• 2012: golpe de estado

História
• 1460: Descobrimento de Cabo Verde= ligação administrativa entre a Guiné-
Portuguesa e Cabo Verde.
• Políticas diferentes: a Guiné permanece um entreposto de comércio de
escravizados, mas a política em Cabo Verde vai permitir o surgimento de uma
burguesia de mestiços.
• Guiné: poucas estruturas de colonização, pouca penetração administrativa do
interior até aos inícios do século XX.
• Até à década de 1870: subordinado à administração de Cabo Verde.

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• Até à década de 1960: quase inexistência de guineenses formados no sentido
europeu.
• Os letrados da Guiné-Portuguesa eram sobretudo imigrados de Cabo Verde.
• A cegada em assa de cabo-verdianos era incentivada pelas autoridades coloniais.
• Os cabo-verdianos eram usados como agentes culturais da colonização, da
miscigenação cultural e biológica.

História: pós-independência
• Presidente atual: Umaro Sissoco Embaló- Partido: Movimento para Alternância
Democrática, fundado por ex-membros do PAIGC em 2018.
• Cargo anterior: primeiro-ministro, de 2016-18.
• 2022: tentativa de golpe (1 de fevereiro)
• Conclusão: grande instabilidade política.

Demografia
• Grupos culturais/ etnias: fulas, mandingas, balantas, manjacos, bijagós, entre
outras- falam línguas diferentes.
• 1920: 87,448 habitantes, entre eles 1000 europeus.
• 1949: criação do primeiro liceu em Bissau.
• 1950: apenas 1,478 negros (0,3%) são considerados “civilizados”.
• Desde fins do século XIX: cabo-verdianos em posição de pequenos
administradores, funcionários públicos e comerciantes.

Línguas
• Mais de 20 línguas da família das línguas nigero-congolesas:
- Balanta, mandinga, manjaco, mancanha, papel, fula, entre outras.
- São as línguas maternas da maioria da população.
• Kriol/ Crioulo guineense:
- Falado por aproximadamente 60% da população, língua franca.
- Devido à presença dos imigrantes cabo-verdianos, o crioulo cabo-verdiano
estabeleceu-se como língua franca na Guiné, mas desenvolveu características
distintas ao longo do tempo.
- É menos próximo do português do que o cabo-verdiano.
- Foi a língua de mobilização social durante a luta pela independência, pelo que
se tornou também língua literária (na poesia).
- Existem três dialetos principais de Kriol.
• O português, língua oficial, é falado por:
- 46,3% da população em zonas urbanas.
- 14,7% em zonas rurais (censo de 2009)
• Francês:
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- Língua oficial dos países vizinhos.
- É ensinado nas escolas.
- Falado por 10% da população em zonas urbanas.
NOTA: Bilinguismo, poliglotismo.

Regiões
• Islão: aproximadamente 50%
• Religiões africanas: aproximadamente 40%
• Cristianismo: aproximadamente 10%

Economia
• Um dos países mais pobre do mundo.
• Economia muito fraca devido à instabilidade política e ao êxodo dos portugueses
(quadros formados) depois da independência (o chamado “retorno da África).
• Infraestrutura deteriorada.
• Atividade económica sobretudo na agricultura e pesca.
• Entreposto do narcotráfico da América Latina a caminho de Europa.
• O trabalho infantil é frequente.

Educação
• Taxa de alfabetização estimada: 55% (em 2011), 59,9% (em 2019, segundo
indexmundi.com).
• No tempo colonial houve muito poucas condições para o surgimento de uma elite
intelectual africana.
• Sem movimento cultural-literário no tempo colonial, antes da luta pela
independência.

Abdulai Sila (Catió, 1958)


• Engenheiro, economista, escritor. - Não vive só da literatura!
• Frequentou o liceu em Bissau.
• Estudou Engenharia Electrotécnica na Alemanha (socialista) (Dresden), 1979-85.
• Trabalha na área das TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação)
• Estadias de investigação nos Estados Unidos.
• Presidente da Associação de Escritores da Guiné-Bissau (2013-2017).
• Co-fundador da primeira editora privada guineense, Kusimon Editora (com Teresa
Montenegro e Fafali Kouduwa).

Romances: Peças de teatro:


• “Eterna paixão” (1994) • “As orações de Mansata” (2007)
Conexões
24 • “Dois tiros e uma gargalhada”
intertextuais
(são leves e (2013) Nádia Almeida
difíceis de • “kangalutas” (2018) 2021212133
• “A última tragédia” (1995)
• “Mistida” (1997) - por exemplo
enuncia “Memória Somânticas”
antes da publicação da mesma
• “Memórias SOMânticas” (2016)

Não significa que é uma “série”

Obra-Abdulai Sila: Mistida (1997)


 Título: Mistida
• Infopédia: vontade, querença, necessidade (do verbo crioulo “misti”> querer, do
latim “mister”>necessidade)
• Moema Parente Augel (2000): mistida= uma diligência, uma ambição, um
objetivo

 Epígrafe:
“Si fere ala, fere bonde ko fere?” / “Se não há saída, uma má saída é saída?”

É difícil acreditar
numa boa saída para o
país

 Estrutura:
• 10 capítulos que podem ser lidos quase como contos.
• Unidos por um “leitmotiv” (a mistida), e personagens que reaparecem, por
exemplo, O Comandante e Mama Isabel.
• Todos os capítulos são antecedidos por um parágrafo em prosa e uma epígrafe
(poema, canção, muitas vezes em crioulo, de engajamento político), e terminam
com a afirmação que as personagens têm “uma mistida a safar”.

 Personagens:
• na maioria cidadãos socialmente marginalizados.

 Estilo:
• Linguagem simples, quotidiana.
• Emprego de palavras de origem africana:
- Tabanca (aldeia);
- Bolanha;
- Bantabá;
- Klandô;
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- mancarra;
- kambletch.

 Página 13: parágrafo de prosa poética


o Os camaleões: Quem são e o que fazem? - reflexão sobre o contexto
sociopolítico do pós-independência. Transportam negatividade (camuflar,
enganar): mudam de cor dependente da necessidade política; Enganam o povo
para tirar proveito de forma egoísta.
o “Semearam a frustração e cedo transformaram a realidade num sonho. Sonho
turbulento, de pesadelos sem fim.”
o ” E levaram a memória, quase toda a memória.” - políticos da nova geração da
independência roubaram a memória (conectada com identidade) de um povo,
da esperança durante luta pela independência , da ideia de um país mehor.
o “E quando das cinzas se resgatou a esperança…”

“queimaram a memória” “futuro melhor”


o “Um outro ser e uma outra vida.” - surge uma nova figura que faz promessas
de uma vida que devia ser vivida em plena fraternidade.
o “Será?” -recuperação da esperança e algo cíclico (“Será que desta vez tudo
vai mudar?”)

 Capítulo 1- Madjudho:
 Epígrafe: “One Love” de Bob Marley -referência cultural (vontade de contactar
com outras pessoas)
(versos do refrão não incluídos na epígrafe que podem dar uma pista para a
interpretação: “Let´s get together and feel alright”).
 Um início um bocado de realismo cru.
 Personagens:
o O seu percurso revela traumas.
o O comandante: ex-combatente da guerra pela independência (também
mencionado no capítulo 2, página 45), é contra a Unidade.
o “chamado de Matchudho e de Madjudho” - Madjudho (=escravo)/
Matchudho(=desnorteado, perdido): jovem de 17 anos, foi transportador de
armamento (p.29) (cf. Os jovens de Mortu Nega).
Não são parentes, o comandante resgata o jovem quando a tabanca (aldeia)
desse é atacada por aviões e queimada com “napalm”.

 Lugar:
 Posto de controle/ posto de sentinela dos portugueses que foi conquistado
durante a luta- “Eu é que libertei este aqui e ele foi-me confiado” (p.20).
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• O comandante diz que ficará “Até o dia em que definitivamente
regressarem o orgulho e a dignidade na nossa terra” (p.20).
• O posto de controle simboliza a luta e os sonhos associados a esta luta.
• Não abandonar o posto significa estar convencido de que os sonhos ainda
não foram atingidos.
• Lembrança da luta pela independência: “Era o orgasmo de uma
masturbação incompleta, inútil, fugaz… Mas numa alvorada sem glória nem
paixão, de sonhos estéril, para que serviam os hinos?” (p.28) - sentido da
Nação?

Relativamente às personagens:

• O Comandante:
• Operação Imunidade Total: O comandante decide manter os olhos
fechados durante o dia. Justificação: “Este mundo está cheio de
hipocrisia, não quero ver. […] E de maldade” (p.21).
• Contra a Unidade: Guiné-Bissau e Cabo-verde. Era contra a existência de
vários partidos dentro do país, tendo a vontade de criar um governo em
paz.
• A medalha: trofeu de guerra. O comandante tirou-a de um avião abatido
(um bombardeiro) que tinha lançado “napalm” sobre a tabanca de
Madjudho. Trata-se de um instrumento de cockpit, com um ponteiro,
provavelmente uma bússola ou um altímetro.
 O ponteiro: Aponta o caminho para o Norte/ uma sociedade
melhor no futuro? (Aponta um caminho melhor)

• Madjudho:
• Madjudho esconde a medalha: “[…] eu e esta medalha, quem é que tem
mais valor para ti?” (p.29).
• Ingenuidade/ falta de experiência e formação do jovem Madjudho-
decide conhecer a vida (p.24).
• Memória truncada de Madjudho: “Por mais que tentasse olhar para trás
na sua vida não conseguia ir para além daquele dia em que o Comandante o
abraçou a correr e fugiu com ele para a mata. Atrás tinha deixado a
tabanca em chamas” (p.24) - Trauma.

• O sol:
• Qual é a cor do sol de hoje? - Madjudho não consegue ver nada diferente.
• “E depois de tanto tempo ainda não és capaz de entender que este sol
está quase a cair?” (p.32).

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• “Tenta… a ver se descobres o outro sol, aquele que brilhará para nós.
Para todos nós…” (p.33).
• “A ver se abres os olhos” (p.34).
• “Daqui a nada vai nascer o nosso sol e a partir daí não haverá mais
ladrões na nossa terra” (p.35).- o Comandante quer o seu “sol”

simboliza a esperança;
também pode simbolizar quem
está no poder (há vários “sóis”)

• “- O que nos faltou todo esse tempo. / - A esperança? /- … E a fé. / -A


justiça? / -…E a solidariedade.” (p.35).

• A medalha (caminho) - sol (poder):


• “Mal tocou no chão, a medalha começou a rolar, a rolar ao longo da
estrada, aumentando progressivamente de brilho e de tamanho” (p.36) —
um novo sol.
• “Prepara-te, meu filho, que temos uma grande mistida a safar antes do
amanhecer” (p.36).
• “[…] a medalha se transformava numa enorme bola luminosa, a subir
vertiginosamente para o céu. Difundia uma claridade jamais vista sobre a
terra” (p.37).
• O comandante abre os olhos. - “…o Comandante e viu que tinha os olhos
abertos.” -já pode enfrentar a realidade, pois assiste a um “novo sol” -
mudança política

Intertextualidade:
• Ahmadou Kourouma: “Les soleils des indépendances (1968), Costa de Marfim
[Os sóis das independências] – romance.
• Na língua malinke, téle (sol) significa também dia e época.
• Neste romance, o sol é também uma metáfora pela renovação e também pela
claridade experimentada no pós-independência.
• O colonialismo seria a época da escuridão, da sombra.

 Página 39: (introdução ao capítulo II)


o “As manhãs eram sempre sombrias.” - realidade e a sombra
o “Sombrias e geladas” - campo metafórico
o “Ao calor do dia a inglória epopeia quotidiana de resgatar a crença, algures nas
profundezas da desilusão amordaçada.” – luta entre esperança/crença e a
desesperança/desilusão. É difícil de recuperar a esperança.

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o “…hostilidade da ambição; …” – ambição dos políticos de acumular poder numa
pessoa só
o “Crença na redenção?” – palavra-chave: redenção

 Capítulo 2- O Tribunal da Redenção


• Cela de prisão: 6 prisioneiros de diferentes classes sociais e idades.
• Os seus nomes correspondem a números em mandinga.
• Todos contam a sua história e são julgados pelos outros= tribunal de
redenção.
• Ato de solidariedade- alívio, esperança.

-“… o Kilin,…”- O comandante do capítulo 1? (p.45).


-“…Bissalanca,…”-lugar onde fica o posto de controle(zona do aeroporto
internacional de Bissau

-Konoton (p.47-48)
• Mudo (decidiu ser mudo, ao reconhecer a sua falha de não conseguir levar a
bom porto o seu projeto de independência) - atos simbólicos de desespero(no
1ºcapítuulo o comandante tinha fechado os olhos)), foi Comissário Político,
visionário da construção de um país independente de que o povo terá orgulho,
foi confrontado pelos seus alunos que perguntaram onde estava esse país
agora, ficou mudo (=sem resposta).

-Woro (p.50)
• Foi torturado.
• Outro prisioneiro.
• Não conseguiu distinguir as cores de um pássaro que levantou voo, um Alma-
beafada. – “ …não conseguia distinguir as cores…”
• Ouviu uma voz que anunciou o casamento do sol e da lua- o fim da escuridão.
(p.54).
• Alma-beafada (calau)- grande pássaro ao qual são atribuídas na Guiné-Bissau
qualidades de bom ou de mau presságio, dependendo da cor em que se vê
(preto ou branco).
• Acusam-no porque pensam que é um código político.
• Os prisioneiros saem da prisão com uma mistida em mente.

 Capítulo 3- Sem sombra de dúvidas (leitura de fragmentos: p.69,


71,76.k)
- Tem a característica de
perseguir uma personagem; O título do capítulo acaba por ser
- Tópico transversal a todos uma oposição ao mesmo, ou seja,
os capítulos-metáfora da acaba por ser um capítulo com
luz e de sombra. 29
diversas dúvidas.
Nádia Almeida
2021212133
• Protagonista: um guarda noturno (de um branco- patrão é branco- questão de
racismo saliente neste capítulo). Este diz que avisou ( “Ele tinha dado o
aviso.”) o patrão e que este não respeitou os diversos avisos-acontece algo:
“Um aviso tem que ser levado sempre em consideração, não é coisa para
desprezar. Tanto aviso de amigo como aviso de inimigo, tanto aviso de rico
como aviso de pobre. Aviso é sempre aviso, mesmo se for de criança. Agora
só queria ver quem iria chegar primeiro, se era o carro da polícia ou o do
hospital.”
• Início: fala de um aviso que não soube respeitar- desgraça.
• Memória-analepse: o seu primeiro dia de trabalho, o patrão branco oferece-
lhe café e este recusa dizendo que o café não o deixa dormir. Os presentes
riem-se, uma vez que ele é guarda noturno. - reflexão sobre o seu domínio da
língua portuguesa.
• Memória: patrão branco está com uma rapariga negra- o protagonista avisou
duas vezes que deveria acabar com aquilo (“-Eu avisei duas vezes ao patrão
para acabar com isto…” -insinuação). Descarrega a raiva nas plantas ( “Eu
disse a ele que estas plantas só servem para provocar desgraça” ) (p.66)
(posteriormente surge no leitor a dúvida/questão: será que mata o patrão?)
• Diagnóstico: morto de overdose (possível causa da morte segundo o médico “-
Overdose- disse serenamente um dos homens vestido de branco para o seu
companheiro”) - o protagonista reage com desespero ( “-Nãããooo…! - gritou o
guarda com toda a força.”).

 Analepse: Guerra pela independência

• “Uma daquelas aas iria muito provavelmente matar alguém. Iria rasgar
músculos, quebrar ossos e fazer brotar sangue. Muito sangue, de certeza.
Num instante, iria pôr termo a uma vida que levara muitos anos a construir.
De um momento para outro uma pessoa deixava de viver. Sem mais nem
Dimensão
biográfica
menos. Só pela acção de uma bala. Às vezes entrava o sofrimento pelo meio, é
verdade, mas nesse não vale a pena pensar. Ele está por todo o lado, em todos
os momentos presente. Antes, durante e depois de uma operação. Em que
morre e em quem mata. Talvez por isso, um militar aprende tudo sore a
guerra, estratégias, tácticas, mas nada sobre o sofrimento. É como se ele não
existisse…”

- Relata uma cena da guerra pela independência, recorrendo à


memória (memória de um soldado da guerra);
- 30 pega na arma com balas;
Faz a reflexão quando
Nádia Almeida
- Dá-se conta que não tem formação para lidar com a
2021212133
dor/sofrimento (consequência do que vivencia na guerra);
• Antigo combatente que vive perseguido por uma sombra do passado. Ao
recordar como viu muitas mortes acontecer na guerra, acaba por revelar o
seu trauma (que deixa a sensação de já não ser a mesma pessoa- “…marcou-o
para o resto da vida.”).
• Esteve sob comando do Comandante (o mesmo do cap.1).
• Mata um soldado português numa emboscada- o seu primeiro tiro.
• Sente-se perseguido.
• Consulta médicos tradicionais e espíritos (yarns, djambakuses, murus).
• Perseguido pela sua própria sombra.
• Solução para se livrar da sombra, dessa perseguição (tema transversal a
este capítulo): “Tens que matar um branco”. “Estamos a ser outra vez
escravos deles…” (p.73)
• O Comandante do 1ºcapítulo poderia ajudar, mas não pode porque é cego (“…
saiu no mesmo dia à procura do seu Comandante, aquele que chefiara a
primeira operação em que participara.”; “Não aia a pena porque ele decidira
não querer saber de nada do que se passava na terra…”; “…o Comandante
tinha ficado cego…”) (p.74). O comissário Político do 2ºcapítulo poderia ajudar,
mas não pode porque é mudo (“-…. Completamente mudo!”) (p.75). Posto isto,
não o ajudam.

• Vê o soldado tuga (nome que dão aos soldados portugueses como forma de
crítica) morto nos seus sonhos (trauma que causa pesadelos diurnos onde o
morto surge a perguntar porque tinha disparado sobre ele).
• Trauma, stress pós-traumático.
• Responde que os verdadeiros culpados são aqueles que o mandaram para esta
guerra neste terra que não lhe diz respeito.
• O soldado morto desaparece.
• Aparece outro espírito, pessoa de mil rostos, atormenta-o, recordando-lhe a
sua condição de africano, e exigindo que pague uma tal dívida.
• Personagem que não consegue encontrar paz.
• Espírito revela a sua identidade: “Somos os Bretton Woods” (p.79) - 1944,
ONU, regras para o sistema monetário internacional.
• Mata o fantasma de mil rostos.
• Visitas da mãe e da noiva do soldado morto- o stress pós-traumático continua.

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Nádia Almeida
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 Volta ao primeiro eixo temporal da narração
• Invade o velório do seu patrão, expulsa as pessoas- vê o soldado português no
caixão (em vez do patrão) -alucinação.
• Expulsa os presentes, abraça o cadáver, o morto revive.
• Assiste-se a uma junção dos dois. ( “Pela primeira vez em vários anos, viu a sua
sombra projectar-se no chão. Com um sorriso aberto nos lábios, abriu os
braços para receber o corpo que, lentamente, se erguia do solo.” )
• O soldado tuga e o protagonista, 20 anos mais jovens, saem juntos dizendo
que tinham uma mistida urgente a safar. (“Saíram de mãos dadas, sem uma
palavra de despedida. Só disseram uma coisa: tinham uma mistida urgente a
safar.”)

 Capítulo 4- Timba (Fragmentos: p.88, 91-93, 95-96)


• Porquê este título? Não se sabe. Talvez pela relação da língua deste
animal(porco-formigueiro), utilizada para comer pequenas partículas.
• Inicialmente assiste-se a uma reflexão do que é preciso para haver mudança.

• “…um homem só…” - um só líder capaz de organizar os outros.

• Aparecem duas personagens:

 Nham-Nham
• Onomatopeia: imita o som de mastigar.
• Monstro, possuído pelo poder, necessidade de ser adorado, um rei
despótico.
• Acredita nas mentiras de Amambarka que o engana.
• “A epopeia de que ele seria o único e verdadeiro protagonista iria
marcar uma nova era, a da vitória da penumbra sobre a sombra” (p.89)

Estão no poder ou em competição. Revelam uma proximidade física que insinua


a falsidade de um para com o outro, as mentiras que dizem mutuamente
(“Acariciavam-se mutuamente, começando pela cabeça…”). A certo ponto,
Amambarka mostrava-se disputo a lamber os excrementos de Nham-Nham
para ter o lugar dele (“…lamber os excrementos.”). Estabelece-se novamente
um jogo de luz (positivo ou poder de uma entidade maligna) e sombra
(negativo, onde estão as 2personagens e de onde querem sair) - “ Levantou a
vista para o céu e viu o sol libertar-se das nuvens que o encobriam, lançando
uma luz fascinante sobre a terra.”

 Amambarka

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Nádia Almeida
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• O confidente de Nham-Nham, considera-se grande e inteligente, o
único que merece o trono (p.92).
• Come excrementos, oportunista, calculista, cobiçoso, cheio de ódio.
• A palavra do mandinga, significa “coisa ruim, que não presta” (Augel
2005: 319)

Significado:
• Ambos são inspirados por pessoas reais, mas transformados em caricaturas
grotescas.
• Repete-se a menção das cores do céu (sol) e da nova era (sol).
• Representam a desilusão co a política do pós-independência.
• No romance, não são humanos; são uma espécie de demónios.
• Timba= porco-formigueiro.

 Capítulo 5- Mama Sabel


• Mama Sabel é velha; uma mulher-grande; tem um joelho inchado; vende
mancarra (amendoim) num beco. A verdade causa-lhe dor. Que verdade? O
mau estado que está o país.
• A rapariga tenta apoiá-la com dinheiro, mas Mama Sabel recusa. Diz que este
dinheiro é sujo (p.102).
• As duas estão numa situação precária.
• Velha-defende os ideais da independência, como a honestidade. Nova- adquire
uma adaptação às circunstâncias para sobreviver(pós-independência),
honestidade já não é o seu ideal. Assiste-se a um conflito entre gerações.

Análise das páginas 102-103 (Tema: honestidade, responsabilidade no pós-


independência.)

 Analepse:
• Primeiro encontro das duas. A rapariga engana os clientes. É hostil.
• A rapariga: “eu não vou voltar para a escola numa mais! Já perdi estes
anos todos e isso chega. Eu não vou ser como as minhas irmãs, não.
Perderam tanto tempo e nada. Não têm trabalho, não têm dinheiro, não
têm nada” (p.109) - Faz um balanço negativo da escola que não trás trabalho
para pessoas com formação.
• A rapariga começa a entrar no carro de um homem (torna-se,
possivelmente, trabalhadora sexual- não se sabe exatamente o que

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Nádia Almeida
2021212133
acontece entre eles), depois desparece. Mama Sabel encontra-a chorando
na casa da mãe (Caso de violência ou violação fica entre linhas). Mama
Sabel consola-a. Criam uma amizade.

 Regresso ao primeiro eixo temporal;


• A rapariga trabalha num night club, deixando sempre um candeeiro ao pé
de Mama Sabel. Um dia a luz do candeeiro apaga-se. A rapariga volta a
casa a correr, aflita.

- Representa a ligação emocional entre as duas;


- Elemento simbólico, não é realista. Quando a
luz se apaga algo acontece

• Aparece o carro daquele homem que “tinha um grande couro de estado,


para além do vício de se meter com as raparigas que vendiam mancarra nos
becos” (p.114). - Trata-se de um político que se aproveitava das jovens
desfavorecidas.
• Rapariga- tem uma mistida urgente a safar (“Mas antes, tinha uma mistida
urgente a safar.”)
(Novamente termina na dúvida)

NOTA: Tarefa (30 minutos): Caracterize o capítulo 6 do romance Mistida, de Abdulai


Sila, destacando o significado de três elementos fantásticos e/ou simbólicos e a
referência implícita do romance à época pós-colonial na Guiné-Bissau.

 Capítulo 6- Muntudu

• A protagonista sem nome está a molhar-se na chuva. (É Ndani do cap.10 e


do romance “A última tragédia” - Conta a história de um professor que é
forçado a fugir e esta mulher (namorada) tenta contactá-lo.).

• “Tinha chegado ao limite da sua canseira, por isso ela tinha que acabar.
A bem ou a mal, mas tinha que acabar nesse dia” (p.118).

 Analepse:
(p.119-123)

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Nádia Almeida
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• A protagonista volta, depois de dias em casa com febre, ao seu lugar de
trabalho: um beco onde costumava vender produtos. Mas o lugar está
cheio de lixo.
“Foram apenas alguns dias de febre que a obrigaram a ausentar-se
do beco onde passara quase uma vida inteira sentada e logo tinha
sido desalojada. Quando voltou, o lixo já tinha se apossado do seu
lugar.”
• Lixo= é o lixo que os governantes produzem, simboliza a corrupção e a
decadência.
• A protagonista é uma desalojada, injustiçada, e começa uma “guerra”
contra o lixo que cresce cada dia.

• Pede ajuda, mas ninguém reage- falta de solidariedade


• Uma voz fala a partir da lixeira- “A voz vinha do centro da lixeira.”;
o ouvem-se gargalhadas
o A protagonista tenta espetá-la com um pau.

 Regresso ao primeiro eixo temporal:


• A protagonista retira um Kambletch (pedaço de cabaça em forma de
cesto).
• Envia este Kambletch pela corrente de água com uma mensagem para o seu
homem que está longe: “Diz-lhe que temos muitas saudades dele” (p.124). /
[…] diz-lhe que tudo está a transformar-se em lixo. Tudo. As pessoas já
não têm coração. No seu lugar está agora só lixo. Tal como nas cabeças…”
(p.127).
• Comparação: a medalha (cap.1) - o Kambletch (cap.6) paralelismo;
semelhança: pequenos itens pessoais e crença no poder mágico dos
mesmos.

 Capítulo 7- Djiba Mané


• Inicia com referência ao tempo: Sol, calor, poeira, trânsito.
• Djiba Mané (protagonista) apita e faz parar o trânsito- sensação de
prazer extremo e prolongado ,melhor que o sexo.
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• Como é possível repetir esta sensação de prazer? descobre o poder.
• Muda o nome para adquirir características do poder: Mary Jo (John), tem
um lado feminino e um lado masculino.
- As amigas do night club pensam que está drogada
- “Djiba Mané é uma moça que nunca foi feliz na vida”. (P.142)
• O capítulo é sobre a falta de felicidade do povo, a dificuldade de sentir-se
feliz.
• Vive com uma amiga: Nhelem.

(páginas 143-145)
• Projeto de lei consiste em propor aceitar a corrupção, discriminar a
corrupção, criar uma lei que permite a corrupção.
(páginas 149-151)
• relação do poder com a violência-Chegam à conclusão de que andam sempre
juntas.
• Através do dinheiro que é possível comprar o povo, com gratificações
instantâneas. É através de um partido ou de uma religião que se pode enganar
o povo- solução da amiga.
• Ter poder significa ter de usar violência:
 Uma violência física;
 Uma violência simbólica;

Sila parece prever o futuro: a iminência de um golpe de Estado.

 Salto no tempo:
• Reencontro das amigas no night club, vários anos mais tarde: Djiba=
símbolo da emancipação das mulheres daquela terra […], uma mulher que
subira todos os degraus do poder (p.151). - Ela era poderosa, tinha até,
guarda-costas […] uma Alta Dignatária da Nação (p.153).
• Djiba: “Tenho uma mistida urgente a safar e preciso da vossa valiosa
contribuição” (p.154) - capítulo final.

 Capítulo 8- Yem-Yem
• Yem-Yem: torturador, polícia ao serviço de um regime ditatorial, o regime
de Nham-Nham.
• Afirma ter um problema por causa de uma palavra.
• Embebeda-se num Klandô (=bar).
• Inspira medo nas pessoas presentes que lhe deram primeiro o nome de
“Carrasco” e depois Yem-Yem (=silêncio).
• É comparado com uma “fera ferida”, um “tigre em agonia” (p.159).

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• Parece ter uma dupla personalidade: “[…] ficaram só com a dúvida de saber
se o animal era aquele que viam e que estava permanentemente a rugir, ou
o outro, o invisível, que se escondia e crescia dentro do primeiro”
(p.161).
• Reflexão sobre como se sobe na carreira política num país profundamente
corrupto. Yem-Yem aceitou o jogo desonesto e hipócrita dos favores, da
corrupção, das falsas promessas, do engano do povo (p.162-165).
• Yem-Yem chegou a ter um “couro” na política, mas um amigo seu da
infância não aceitou esse jogo.

 Analepse:
• O amigo salvou-lhe a vida na infância. Tornaram-se melhores amigos.
• “Mas depois veio a política e estragou tudo”. Estragou amizades, estragou
casamentos, estragou a confiança e agora até queria estragar a terra. Só
porque todos queriam mandar e ninguém queria deixar” (p.169).

 Regresso ao primeiro eixo temporal: Yem-Yem recorda o


passado recente.

• Nos jogos sujos da política, o amigo trai a confiança de Yem-Yem. Perante


o castigo (tortura, pena de morte) suplica: “Deih! Deih! Deih!” (p.169) =
tratamento direto, de extremo afeto (glossário da edição que reúne os
três livros). Essa é a palavra que lhe causa a grande magoa que sente.
• Desesperado, joga a garrafa de cachaça no chão- torna-se água natural,
água purificadora. A farda de Yem-Yem torna-se um bubu branco (traje
africano).
• Transformação de Yem-Yem numa personagem positiva, que inspira
confiança e pressente o início de uma nova época(?): “Uma era que iria
começar muito brevemente e que marcaria o fim da escuridão e da
violência na terra” (p.171).
• Sai do bar e é morto com uma rajada de metralhadora. - O regime
opressor de Nham-Nham.
• “Depois pediu que o enterrassem em Cumeré, ao lado de um grande amigo
de infância que seria fuzilado naquela mesma noite” (p.172)

 Capítulo 9- Marrio [mar + rio]


• Doente terminal num hospital = Madjudho, Artudho (187
• Uma mulher (a mesma do cap. 6? Ndani?) decide levá-lo à sua casa para ele
poder ter uma morte mais humana.
• Analepse:

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À beira do mar, encontra uma "sonda" (o kambletch/amuleto de
Ndani?)
• Tinha recebido uma mensagem do mar.
o Por faltarem algumas palavras da mensagem, Madjudho não consegue
cumprir com o que lhe foi pedido. Não sabe aonde deve viajar, nem de
quem deve receber a mensagem.

• Madjuho/Artudho (do cap.1) trabalha duro para comprar um bilhete de


avião e pagar o visto. No entanto, um funcionário corrupto fica com o
dinheiro sem devolver-lhe o passaporte.
• O funcionário tem um acidente e precisa de sangue. Madjudho doa-lhe
sangue em troca do visto.
• Viaja ao estrangeiro, mas é deportado, não conseguindo explicar o
propósito da sua viagem (mensagem do mar ou do rio – marrio)
• É insultado pelos funcionários da migração .
• De regresso, continua a doar sangue no hospital na esperança de
reencontrar o funcionário da embaixada .A mulher conclui que foi
contagiado no hospital (HIV?).
• A mensagem = desejo de mudar o estado em que está o país.

 Regresso ao eixo temporal principal:


• Madjudho morre; funeral no cemitério. Uma lágrima da mulher
transforma-se em mar-rio
• Os defuntos ressuscitam; dirigem-se à capital.
• “Por isso tinham descido levantar-se para corrigir a situação de uma
vez por todas”
• “Marchavam ao ritmo de uma linda melodia que anunciava o matrimónio
que iria marcar o início de uma nova era.”

 Capítulo 10
• Este capítulo amarra os cabos soltos: As diversas mistidas que as
personagens anunciaram nos distintos capítulos são realizados.
• Reaparecem não só personagens dos outros capítulos, mas também os
elementos que carregam valores simbólicos/metafóricos:
 O contraste entre escuridão e
claridade
 O casamento do sol e da lua
 O lixo

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 Crise do governo causada pela rebelião do povo: (leitura pág. 194-
99)
• Amambarka dá uma má noticia ao seu chefe Nham-Nham (rei/ditador):
a chegada dos defuntos que estão a pedir “amor e tolerância para os
vivos”
• Nham-Nham responde: “Então diz-lhes que amor é uma pura ilusão, uma
fantasia que só os deficientes mentais imaginam possuir. Do que os
vivos precisam todos os dias é de me render homenagem. Homenagem e
fidelidade, é disso que todos, vivos e mortos, precisam …”
• Amambarka: “Assim, fizera o melhor de si para produzir uma imagem
que provocava os olhos de Nham-Nham o fascínio do poder absoluto, o
delírio da veneração num reino de gente acéfala e sonolenta”
• Nham-Nham: “Pela primeira vez em vários anos, encarou a realidade do
país que dizia dele”
• “um feixe de raios com uma luz muito intensa” (pág.197), “claridade
excessiva” (pág.198)
• “Estão a roubar o lixo. […]. O lixo que me garante o poder? Diz-me a
verdade, Amambarka. […]. Podem roubar-me tudo menos o meu lixo”
(pág.198-199)
• “Havia muita gente e diversas máquinas a remover o lixo. Parecia a
maior festa que jamais fora organizada naquela terra. […]. Eram
inúmeras relíquias de uma era acabada”
• Nham-Nham é removido com o lixo  alegria de Amambarka
• Também Amambarka é removido e esmagado pelas máquinas de lixo
(não tem sangue, só uma massa viscosa incolor): “Esse recém-chegado
explicou então que o que tinham à frente não era um ser humano, mas
sim uma emanação da maldade e da escuridão que dominavam aquela
terra”

 A luta pela nova era do sol (guerra civil):


• “O sol e a lua encontravam-se lado a lado, brilhando, enchendo a
terra de luz e claridade que segundo aquele desconhecido nunca mais
iriam desaparecer”
• Aparece o Alma-beafada, mas é morto por uma rajada. Outra rajada
mata o Comandante.
• É Amambarka quem dispara, ele é o novo Chefe, Yem-Yem o seu
assistente.
• Amanbarka manda cortar as cabeças de todas as vítimas, cortam
também a língua do Comissário Político.
• Mama Sabel: “Não consigo entender… Dantes roubavam somente a
memória. Agora levam a cabeça inteira!”
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• Caos
• Multidão de crianças: “vitimas da ambição e da corrupção, do desleixo e
do desgoverno, que permitiam que se gastasse mais na repressão que
na educação”
• Marcha das crianças – vestidas de vermelho, amarelo e verde; cores da
bandeira – em direção à cidade.
• Ndani (pág. 201) quer mostrar-lhes o caminho que indicou o Kambletch
• Mbubi (pág. 211) – personagem de Eterna Paixão.
• Djiba Mané e as suas companheiras lutam pelo resgate da esperança
(pág.212)

 Nível metaficcional:
• Djidiu de caneta (pág.210) = narrador (djidiu = rapsodo africano que vai
de terra em terra declamando as façanhas de personalidades célebres)
• O narrador dirige-se ao leitor/à leitora – referencia a outras obras de
Sila (pág.214)

Imprensa
• 1879: primeira tipografia em Bolama (arquipélago de Bijagós), início da imprensa da
Guiné-Portuguesa, em mãos dos portugueses radicados no território
• 1930-31: O Comércio da Guiné, primeiro jornal editado por um guineense, Armando
António Pereira, com colaboração de Juvenal Cabral (pai de Amílcar Cabral), entre
outros
• Defende os interesses dos guineenses dentro do sistema colonial; mantém-se num
discurso luso-tropicalista e colonialista, porém reformista.

Literatura colonial
• Literatura etnográfica (p. ex. sobre as etnias bijagó, balanta, manjaco, fula,
mandinga) e ficção colonial escritas por não-guineenses
• Boletim Cultural da Guiné Portuguesa (1946-73), órgão oficial, publica amostras
traduzidas da tradição oral
• Publicação de algumas coletâneas de lendas, mitos e contos de diferentes grupos
étnicos
• Ficção: Fausto Duarte (cabo-verdiano); Fernanda de Castro (portuguesa)
• Poesia: Terêncio Anahory, cabo-verdiano (incluído na antologia org. por Mário Pinto
de Andrade, Poesia Negra de Expressão Portuguesa)

Os inícios da poesia guineense (são casos isolados)


 António Baticà Ferreira,

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• Guineense, influenciado pela tradição francesa (arcaísmo, romantismo à
Vitor Hugo), viveu no Senegal, na Suíça e na frança, escreveu também em
francês — atuação secreta contra o PAIGC (Hamilton 1984: 218).
• Sem livro publicado; poemas publicados em;
• 1963: Poetas e contistas africanos - antologia, São Paulo, org. João Alves
das Neves
• 1972: Poesia e ficção - cadernos da Sociedade de Língua Portuguesa
• 1973: Poilão - coletânea
 Vasco Cabral
• 10 poemas escritos entre 1955 e 1975, em Portugal, publicados em 1979
na revista África
• Participou nas atividades da Casa dos Estudantes do Império (CEI)
• 1981: A luta é a minha primavera

A independência e os “jovens poetas"


• Emergem dentro da militância política, motivados pelo passado recente, a luta pela
independência
• 1977: Mantenhas para quem luta, antologia de poemas - para Hamilton o início da
produção literária e editorial; geração de poetas nascida nas décadas de 1940 e
1950 que viveram a guerra como crianças
• 1978: Antologia dos jovens poetas
• 1979; os continuadores da revolução e a recordação do passado recente
• Características: Grande preocupação com a função social da poesia e com o
processo revolucionário, linguagem clara e direta, as vezes eufórica e panfletária,
poetas sem experiência, alguns poemas escritos em crioulo
• Temas: anticolonialismo, alienação cultural (devido à imposição colonial),
precariedade social, repressão política (p. ex. Pidjiguiti), consagração da vitória e da
liberdade, Mãe África (continente africano como matriz cultural), identidade negra.
• Importância: primeiras obras depois da independência num sistema literário
praticamente inexistente
• Outras antologias (surgem quando ainda não há um sistema literário) seguiram-se.

Tony Tcheka (1951, Bissau) -nome artístico de António Soares Lopes Júnior
• Jornalista e poeta
• Foi diretor da Rádio Nacional da Guiné-Bissau (RDN)
• Um dos fundadores da Associação de Escritores da Guiné-Bissau (AEGUI), 2013
(outros: Abdulai Sila, Odete Semedo, Agnelo Regalla, Atchutchi Ferreira, entre outros)

• Poesia:
- Noites de Insónia na Terra Adormecida (1996)
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- Guiné: Sabura Que Dói (2008)
- Desesperança no Chão de Medo e Dor (2015)
• Conto:
- Quando os cravos vermelhos cruzaram o Geba (2022)

Alusão ao 25 de abril

 Conto: PeKadur de Sambasabi


 Linguagem:
• uso de palavras e frases inteiras em kriol; tradução nas notas de
rodapé
 Estrutura:
• in medias res - suspense: silêncio - quem é esse Capiton? O que fez?
• dividido em 7 capítulos/secções
• narrador heterodiegético, focalização zero (narrador omnisciente), às
vezes focalização interna de Basinho, monólogo de Basinho (no final)
constantes intercalações de memórias (analepses) - saltos no tempo

Início (23-26):
Personagem principal • Basinho volta à sua tabanca de origem, Sambasabi – silêncio palavra-
chave do conto
• Basinho "matou o irmão gémeo" ao nascer (24) – culpa

 Contexto: a africanização da guerra


• começa já no século XIX
• em 1973: a recrutamento de soldados portugueses chegou ao seu
limite: 6% da força de trabalho portuguesa estava na guerra
• Vantagens:
- aumento das forças armadas;
- redução dos custos (sem deslocação de Portugal, remuneração mais
baixa);
- melhor adaptação às condições climáticas;
- mais resistentes às doenças da região (p. ex. malária);
- conhecimento das culturas e línguas locais;
- conhecimento das características das paisagens, da natureza, da
fauna;

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- papel psicológico: menos soldados portugueses mortos, melhor
aceitação da guerra em Portugal.
• Números:
- nos três espaços de guerra, um total de 170.000 militares
- dos quais 83,000 africanos = 48%
 Personagens:
• Capitão;Capiton, Basinho(conhecido por vários nomes), Bikas, Alferes
Mon di Ferro (alcunhas), João Bicanka Sory Bá;
• Omi-Garandi, o patriarca, pai de Basinho, Aladje Mam Bá;-tem mão de
ferro ao defender a tradição africana
• Sona Mawa, mãe de Basinho;
• Tia Bedja, curandeira tradicional;
• Tio Fodé Mama Só;
• Djondjon, amigo de Bissau que conhece Lisboa;
• O padre Manel, padre católico;
• Musna Na Faiõe, camarada da guerra que se muda a Lisboa.

Análise (trabalho em 5 grupos)


1.0estranho regresso à terra-sabi (26-36)
2. Caminhos e destinos separados (37-47)
 Volta à aldeia;
 Relembra os tempos de guerra;
 Mostra os motivos pelos quais os portugueses recrutavam africanos para a guerra;
 Mostra o papel da mulher e do homem na sociedade;
 A culpabilidade da morte do irmão;
 Conflito entre pai e filho
3. Rádio Libertação ouvida em Bissau (48-51) ‡ A menina dos cinco olhos (51-55)
4. O alcorão, o padre e a opção militar (55-64)
5.Uma guerra terminada a meio (64-69) + Tubulência em Lisboa, réplicas em Bissau (69-76)

««««««
Dia 20 de março

 Neste conto faz-se uma critica severa e corajosa a três instâncias:


a) os governos imperialistas de Portugal e o governo pós 25 de abril;
b) governo guineense;
c) tradição africana.

 Conto: Excisadas na Flor da Vida


 Personagens:
• Antoninho Sory Dansó

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• Trisia Cady Baldé, mãe
• António Sory Dansó, pai – título: Aladje
• Tumane Badinco, tio
• Aissa e Awa, irmãs de Antoninho
• Tumane Badincó, tio avô
• Rosa Linda, amiga portuguesa de Antoninho, em Lisboa
• Motar Só, vizinho
 Lugares:
• Tabanca de Começada: região leste do país
• Origem da família: tabanca de Campeane, sul da Guiné – fugiram de lá
por causa da guerra
• Lisboa
 Estrutura:
• Dividido em 5 partes (capítulos), o primeiro sem título
• Narrador omnisciente
• Frequentes analepses (lembranças do protagonista)
• Trabalha com vocabulário solto e frases inteiras em crioulo
(traduzidas em nota de rodapé)
 Tema central:
• A luta contra a mutilação genital feminina (MGF). É um homem que faz
a denuncia (Tony Tcheca)

• Contexto: MGF – mutilação genital feminina:

o Este ritual apresenta consequências:


- infeções, transmissão de HIV (e outras doenças) no ritual;
- diminuição do prazer sexual, dores;
- problemas menstruais, infeções frequentes;
- complicações no parto, impacto negativo na fertilidade das
mulheres;
- consequências psicológicas.

 Legislação:
• Na Guiné-Bissau o ritual é proibido desde 2011.
• A lei é bem categórica, e para quem violar os princípios
fundamentais consagrados na constituição, sob o regime jurídico
alínea g) do artigo 86º da Constituição da República da Guiné-
Bissau (CRGB), a lei nº14/2011 aprovada em 6 de julho “visa
prevenir, combater e reprimir a excisão feminina na República da
Guiné-Bissau” e, prevê no seu artigo 4º a prisão de 2 a 6 anos para

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quem praticar a excisão feminina seja com ou sem o consentimento
da vítima.
• E no artigo 5º, se a vítima for menor de idade a punição é de 3 a 9
anos de prisão. Por outro lado, os pais, encarregados de educação ou
qualquer pessoa a quem cabe a custodia da menor de idade deve
impedir a prática. O não cumprimento do que foi regulado pela lei, a
punição é de 1 a 5 anos de prisão.
• Soma-se a isto, o artigo 6º prevê: “quem com a intenção de praticar
a excisão sobre outrem lhe causar efeitos previstos nas alíneas c),
d) e e) do artigo 115º do código penal, prisão será de 2 a 8 anos de
prisão”. Ainda mais, o artigo 6º/2 se efeitos no artigo 115º
mencionado no artigo 6º/1 da lei nº14/2011 resultar a morte da
vítima, a pena será de 4 a 10 anos de prisão.
• Segundo Nader (2014) “apesar de a lei ser obrigatória e possuir
coercibilidade, não dispõe de meios para impedir a violação dos seus
preceitos” (Dju 2021, pág.7)

- Este ritual não é apenas uma prática africana. Muitas vezes, este ritual é associado
à região islâmica, mas isto é linear, ou seja, no Corão não há nenhuma referência ao
ritual.

• Análise pág. 144/47: Antoninho é um rapaz novo que entra com entusiamo
no processo de independência e na construção de um novo país.

• Análise pág. 152/53: Antoninho está em Lisboa a estudar economia. Tem


algumas dificuldades de adaptação. Passa pela experiência do racismo quando
tenta alugar um quarto. No início da sua jornada em Lisboa, mora com amigos
do pai, extremamente conservadores e adeptos da prática do fanado.
• Análise pág. 160/61: Antoninho volta à aldeia e não encontra as irmãs, tem
13/14 anos, a mãe acaba por confessar que as irmãs estão num lugar sagrado
(bosque) a preparar-se para o ritual. Antoninho dirige-se para lá, pedindo
paciência (=explicações) às fanatecas (=mulheres responsáveis pela execução
do fanado). As fanatecas reagem agressivamente à tentativa de interromper
o ritual e asseguram que ele e a família irão sofrer as consequências de tal
ato de rebeldia.
• Análise pág. 167/168: o ritual não é apenas a decisão de uma mãe ou de um
irmão, e sim a pressão de uma comunidade. Para a mãe o ato do filho é uma
vitória, pois o filho teve a coragem de questionar a tradição e tentar
proteger as irmãs, ainda que tenha sido em vão.

 Poesia:
45
Nádia Almeida
2021212133
 “Falsa valsa” - Do livro Noites de insónia na terra adormecida (1996)
“Valsa” -remete para O sujeito poético está cansado
repetição (rotina do trabalho) na mesa pelo trabalho duro e pela falta
“Falsa” - o sustento não é falho de tudo de comida
garantido gira uma falsa valsa
- Proximidade do som dá
ideia de que não há a velha plaina
escapatória o martelo A profissão dele
o cuteloj poderia ser carpinteiro
o malho
não fazem pão

• Indica que foi escrito


não há manhã
durante a luta pela
que amaine o suor
libertação.
feito gotas de cansaço
• Pode denunciar uma situação
Expressão metafórica
ocorrida na Guiné ou até
o tacho faminto –“raspa uma fina camada de
mesmo em Lisboa (poderia
madeira”
ser imigrante-com trabalho sobre-a-mesa
precário e neste sentido plaina lentamente a fome
seria a denúncia aos baixos
salários) Lisboa, 1972

 “Povo adormecido” - Do livro Noites de insónia na terra adormecida


(1996) Chuva-símbolo da vida (algo
Há chuvas necessário e normalmente é
que o meu povo não canta motivo de alegria), neste caso
• perderam a esperança, não é, pois, o povo perdeu a
Há chuvas
está resignada; alma, a esperança. Já não tem
que o meu povo não ri
• Acabou por se forças, está desanimado.
conformar, pois tem de
continuar a sua vida - Perdeu a alma
Barreira-faz com que
situação de na parede alta do macaréu
percam a força
conformismo-inércia
Fala calado O silêncio expressa a
e canta magoado resignação

Vinga-se no tambor
na palma e no caju
mas o ritmo não sai

Dobra-se sob o sikó • Referem-se aos


como o guerreiro vergado ritmos africanos
cala o sofrimento no peito • Faz um jogo
46 • Referência aos
Nádia Almeida
tambores
2021212133
O meu povo
chora no canto
canta no choro
e fala na garganta do bombolon

Grei silêncio
Já não é um lugar de
quebrado
alegria, um lugar
nas gargalhadas de Kussilintra
mágico
em quedas de água
Quedas de água
moldando pedras
esfriando corpos
esculpidos
no corpo do bissilão Tipo de árvore grande

 “Canto à Guiné” - Do livro Noites de insónia na terra adormecida


(1996)
Guiné
sou eu O povo identifica-se com a
até depois da esperança terra deve lutar por ela
mesmo que tenha morrido, o
Guiné sujeito poético vai continuar
és tu a ser guineense
camponês de Bedanda teimosamente
procurando a bianda na bolanha terra
que só encontra água na mágoa da tua
lágrima
cereais • Assonância-como
Personagens marcadas Guiné se tivessem uma
pela pobreza, estão numa és tu identidade/semel
luta pela independência criança sem tempo de ser menino hança semântica
• A água é
Guiné necessária para
és tu produzir arroz, é
mulher-bidera associada à
vendedora
mágoa, ou seja, à
47 luta pela
Nádiasobrevivência
Almeida
2021212133
em filas de insónia
Noites de insónia- noites noites di kumpra pon
em que a mulher tem de (mafé di aos)
trabalhar

Guiné
é um grito
saído de mil ais
que se acolhe n calcanhar da
terra adormecida
Mas

Guiné somos todos mesmo depois da


Sujeito poético + povo
esperança!
Bissau, 1995

• Reaparece neste poema a ideia do povo adormecido, da terra adormecida.


• Critica-se a situação.
• Poema de esperança.

 “A palavra” - Do livro Desesperança no chão de medo e dor (2015)


Entre as marcas
das mãos nascidas do chão-terra
segurando-me
pelo movimento
do meu corpo cansado
e a planta do pé Questão
da terra gretada física
Lugar do
com lanhos de dor muito
1ºcongresso PSAG-
alço o meu calcanhar presente
esperança perdida
de léguas
transponho Cassacá ontem esperança
arregaço o véu da viúva-terra vermelha
esquecida nas colinas perdidas do Boé
1973-declarada a
bagabagando nas lalas independência da Guiné
anoréticas.
Sujeito poético faz
parte do movimento À procura da palavra emigrada
Africanos da diáspora
da diáspora emigram
48
Nádia Almeida
2021212133
em desesperançadas diásporas
embarquei no sopro da brisa perdida
na virada do socalco do tempo
Hasteei a bandeira/a planei no pico do espaço
minha razão onde o poilão grande de pequenas folhas abertas
hasteia a razão
Transmite
e solta ao vento
uma sensação
a lä menor -Faz contraste com a bandeira da razão
de o sujeito
desprovida -Emoções sentimentos levados pelo vento com
poético estar
a flutuar de sentido muita facilidade
em voos ziguezagueantes.
acordei ao pisar o chão
Ligação íntima, inevitável-
abracei o seu corpo-terra abraçar a ideia da pátria
• A palavra tinha sido agarrei a palavra
perdida, tinha emigrado; e do seu figurino vertical me vesti.
• Ideia de terra adormecida (São Domingos)

• Viagem/jornada do sujeito poético pela terra “sofrida” – à procura da


palavra.

Hélder Proença (Bissau, 1956-2009)


• Escritor, professor de história
• Lutou na guerra pela independência
• Percurso político no pós-independência (no Ministério da Cultura, deputado na
Assembleia Nacional Popular e membro do Comité Central do PAIGC, ministro da
defesa)
• Coorganizador da primeira antologia poética guineense Mantenhas para quem luta
(1977)
• Livro publicado: Não posso adiar a palavra (1982), reúne poemas do tempo da luta pela
independência
• Foi assassinado a mando de um candidato à presidência em 2009

 Análise de poemas:
 “Quando te propus”
 Tema central: Esperança de construir um país melhor, ligado à
• Anáfora; luta pela independência. O “tu” poderia ser “mãe
• Indica uma proposta África”, embora não seja
Quando te propus muito preceptivo neste
a luta pela um amanhecer diferente poema OU uma mulher em
independência concreto, uma pessoa amada
49
Nádia Almeida
2021212133
a terra ainda fervia em lavas
e os homens ainda eram bestas ferozes
Ideia: os homens não estavam preparados
Não tinham a perspetiva
para a luta, ainda era necessário prepará-los
certa do que era a luta
Falta de ferramentas, políticas;
Quando te propus
falta de instrução e conhecimento
a conquista do futuro
vazias eram as mãos
Não tinham ferramentas negras como breu o silêncio da resposta
intelectuais necessárias (físicas
e armas) Quais?
Quando te propus
• Pode ser o próprio
o acumular de forças trabalho como prisão;
O POVO tinha de acordar e o sangue nómada e igual • Políticos
adquirir conhecimento coagulava em todos os cárceres
em toda a terra
e em todos os homens

Quando te propus
um amanhecer diferente, amor
a eternidade voraz das nossas dores
As dores dos condenados, ideia era igual a «Deus Pai todo poderoso criador dos céus e da
de se sentir condenado. terra»

Quando te propus
Imagens que
olhos secos, pés na terra, e convicção firme
aludem à luta. Não
surdos eram os céus e a terra
Sentem que não têm é tempo de chorar
receptivos as balas e punhais
ajuda, não há esperança, pelo passado.
as amaldiçoavam cada existência nossa
o poema pretende criá-
la
Quando te propus
abraçar a história, amor
• Expressão metafórica; tantas foram as esperanças comidas
• Algo abstrato-aceitar o
insondável a fé forjada
passado
no extenso breu de canto e morte

Foi assim que te propus


no circuito de lágrimas e fogo, Povo meu Proposta do poema
o hastear eterno do nosso sangue para a luta do país
para um amanhecer diferente!

• Quem fala? O “eu” que fala é o sujeito lírico/poético.


• Com quem fala? O “tu” é o povo guineense.
50
Nádia Almeida
2021212133
• Nos primeiros dois versos de cada estrofe, assistimos à apresentação da
proposta.

• Nos ultimos dois versos de cada estrofe, a situação em que se encontra o povo no
início da luta.

 “Nós somos”
• Tema central: Retrata a identidade guineense; A união do povo guineense.

Nós somos
Trabalham arduamente para
aqueles que dia e noite
produzir os bens mais
fazem com suas mãos
essências à vida. São eles que
produzem os bens essenciais. os alicerces da vida.
Referencia a um discurso
Nós somos de Winston Churchill em que
lágrimas, suor e sangue a ideia é a mesma deste
que desafiando mortes e séculos... poema: o chamamento para a
luta, que a luta é essencial.
fundiram esperanças e fé!

Nós somos irmãos


o florir, a madrugada
Referência à união das pessoas
e o verde selvagem dos maquis
que em noites sombrias
trazem a canção da vida.

Nós somos
dança, música e ritmo
que em anos 40
sobreviveram a tempestade da fome.

Nós somos irmãos


Alusão à cultura guineense terra, chuva e arado
que alimentam vidas
e alicerçam o homem!

Nós somos
o tam-tam da verdade
Existe para os rapazes e
em místicas noites do fanado
para as raparigas
nós somos irmãos
a certeza e o porvir!

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Nádia Almeida
2021212133
• Quem fala? O sujeito poético fala na 1ª pessoa do plural, o “nós” que é o povo.
• A quem se dirige? À própria comunidade, ao sujeito coletivo.
• Adota a mesma técnica da do poema anterior: utiliza a anáfora “nós somos”.

 “Por me querer tanto”


• Tema central: Ideia do amor pela terra, pelo país, pela áfrica
• Quem fala e a quem se dirige?
o O sujeito lírico dirige-se à própria África.
• Jogo entre o amor erótico e o amor à pátria. Por esse motivo, podemos ler o
poema de duas formas distintas: como um poema de amor e como um poema de
luta.
• Invoca regionalismos com o intuito de mostrar a ideia da luta.

Música / canção de intervenção


• Gumbé: surge na década de 1970, cantado em kriol, acompanhado com um instrumento
feito de uma cabaça, conteúdo social
• Ernesto Dabo (nascido em 1949)
• José Carlos Schwarz (1949-77): Ativismo em defesa da Independência; esteve preso
na "Colónia Penal e Agrícola da Ilha das Galinhas" (Arquipélago dos Bijagós); morreu
num acidente de avião em Cuba.
• Adriano Gomes Ferreira / Atchutchi Ferreira (Bissau, 1949):
- Compositor, músico, autor das letras e chefe da orquestra Super Mama
Djombo (desde 1974)
- Longa inatividade da orquestra
- 2008 novo CD, Ar puro
- Foi também diretor-geral da Televisão da Guiné-Bissau
- E político (governador de Bafatá e Tombali e presidente da Câmara
Municipal de Bissau).

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Nádia Almeida
2021212133
Odete Semedo (Bissau, 1959)
• Poeta, política, professora universitária
• Licenciatura em Literaturas Modernas pela Univ. Nova de Lisboa
• Vários cargos políticos relacionados com o ensino
• Ministra de Educação Nacional (1997-99)
• Ministra da Saúde (2004-5)
• Doutoramento pela Pontifícia Universidadè Católica de Minas Gerais (2010)
• Co-fundadora da Associação de Escritores da Guiné-Bissau (2013)
• Foi vice-presidente do PAIGC.

 Análise de poemas:

 “Em que língua escrever” - Do livro Entre o ser e o amar


(1996)
• Tema: divisão e interrogação do sujeito poético entre o português e o
crioulo.

Em que língua escrever Língua portuguesa


As declarações de amor?
Em que língua cantar crioulo
As histórias que ouvi contar?

Em que língua escrever


Não se pode definir
Contando os feitos das mulheres
uma resposta - apenas
E dos homens do meu chão?
dúvidas
Como falar dos velhos
Das passadas e cantigas?
Falarei em crioulo?
Revela a indecisão do sujeito.
Falarei em crioulo!
Mas que sinais deixar
Aos netos deste século?

Ou terei que falar

53
Nádia Almeida
2021212133
Nesta língua lusa
E eu sem arte nem musa Sensação de não ter o mesmo domínio
Mas assim terei palavras para deixar com a língua portuguesa como tem do
Aos herdeiros do nosso século crioulo. É mais eficaz no crioulo.
Em crioulo gritarei
A minha mensagem
Que de boca em boca
Fará a sua viagem.

Deixarei o recado
Num pergaminho
Reconhece a importância Nesta língua lusa
do português, como a
Que mal entendo
vantagem que dá para a
No caminho da vida
transmissão da história
Os netos e herdeiros
Saberão quem fomos

• O crioulo é uma língua mais associada à oralidade enquanto o português


está ligado à escrita O sujeito está indeciso entre estas duas línguas.
• Questiona em que situação deve usar cada língua.

 “Ansiedade” - Do livro Entre o ser e o amar (1996)


• O sujeito poético sente ansiedade.É o incerto futuro que lhe desperta
esse sentimento.
• Apresenta regularidade na construção das estrofes.

Paro e oiço
É a voz do lamento
É a voz do desencanto
São mágoas profundas
Olhares tristes
Vagueantes...
Gente em fuga
Ansiedade
E paro: é o incerto!

Olho e vejo
Um vazio
O presente
Emoções que
Transformando-se em rio
despertam a angústia,
o desalento e a
54
ansiedade-expressam
Nádia Almeida
aquilo que se passa à
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O novo envelhecendo-se
O decrépito
Caminhando
Para o vazio: é o estio.

Escuto e sinto
Apela aos sentidos
Vozes
Canções da noite
Uivos, gritos
Lamentos
Passos de asalmas...
É o insólito.

Paro e oiço
Vejo
E sinto
Lágrimas a deslizar
Em olhos imóveis
E tudo caminha
Fluindo...
É o porvir!

 “Saudade” - Do livro Entre o ser e o amar (1996)


• O “eu” lírico está com saudades Ai que saudades eu sinto
da infância; Dos dias de sereno
Dos versos sentidos
Considerado
Não escutados
um valor sagrado
Do cheiro a terra-mãe
E de tudo tão sagrado

Que saudades daquelas noites


Evoca uma certa Imagem frequente, relembra os
Da fogueira
religiosidade cultural da reencontros para conviverem…
Dos pastros sem eira
terra de origem.
Levando recados na história

Que saudades eu sinto


Das noites de luar
Da história do se n'há n'há
E das serpentes do grande mar

E que saudades vivi

55
Nádia Almeida
2021212133
Ao sentir Transmite a ideia de que a
Foram tão poucas infância acabou cedo. O sujeito
As histórias que ouvi não considera suficiente o que
viveu na infância

• O poema apresenta uma estrutura simétrica e mais uma vez repete o


tema transversal no primeiro verso de cada estrofe

 “O prenúncio encontrou a história” - Do livro No fundo do


canto (2003), livro que contém só versão em português.

O prenúncio pulava
• Pesa no povo;
de avôs para netos
• Que a guiné teria um futuro de pais para filhos
melhor; Quase se tornou numa passada Neste caso representa uma
• As promessas feitas no pós- de outros tempos esperança, ou seja, é um
independência e essa ilusão fetos bebé que acaba por não
que o país iria entrar numa
de histórias de outra vida nascer/uma esperança que
boa fase.
não se concretiza.
O vaticínio pairava
feito lenda
e cantigas de dito
repartindo lições de moral
Técnica corrente de Odete para filhos mal abençoados
Semedo, de repetir a ideia portadores da desgraça
central no 1ºverso de cada
estrofe O prenúncio montou
na vontade dos homens
na gana de ser
e quebrou
a espinha das gentes Perder a esperança

Encheu o sentido dos pecadores


de ganância
e de desgraça:
Época do pós-independência –
se tu podes eu também posso
surgem pessoas egoístas que só
se tu mandas porque não eu?
querem enriquecer e exercer poder

Dia vai
Entra-se na dia vem
rotina chuva sai
entra seca
Metáfora da influência
56
que vem de fora Nádia Almeida
2021212133
e vem outra chuva
a tecno e a sua logia
a demo e a sua cracia
mais casados do que nunca
Algo que exerce poder obrigaram a outros caminhos
outras gentes surgiram
... com outras ideias
com outros ideais
Alguma alegria
reajustes
aberturas
acordos
muitos dissabores
mal-estar

Cabo-verde

10 ilhas vulcânicas, 9 são habitadas, vários


ilhéus desabitados.

Ilhas de Barlavento:
• Santo Antão
• São Vicente
• Santa Luzia (desabitada)
• São Nicolau
• Sal
• Boa Vista
• Ilhéus: Branco, Raso

Ilhas de Sotavento:
• Maio
• Santiago
• Fogo
• Brava
• Ilhéus: Santa Maria, Grande Rombo, Baixo, de Cima, do Rei, Luís Carneiro, Sapado,
Areia.

Distância da costa da África Ocidental: 570 Km2


57
Nádia Almeida
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Área: 4033 Km2
(Portugal: 92 256 Km2)

Maior Ilha: Santiago


Capital: Praia (Santiago)
Outras cidades importantes: Mindelo (São Vicente), Santa Maria (Sal), Tarrafal (Santiago)

Geologia: Vulcão ativo na ilha do Fogo= ponto mais elevado, Pico do Fogo (2829m), última
erupção em 2014.

Salinas nas ilhas Sal e Maio

Santiago, Santo Antão e São Nicolau: canaviais, plantações de banana

Clima
• Zona subsaheliana
• Clima árido ou semiárido(dependente da ilha)
• Média atual entre 20 e 25 graus
• Estações: “As-águas” (agosto a outubro) e “As-secas” / “Tempo de brisas” (dezembro a
julho)
• Ilhas mais secas: São Vicente e Sal
• Ilhas mais chuvosas: Santo Antão, Santiago e Fogo
• Na estação seca: o vento harmatão traz areias do Saara= “bruma seca”

Poema de José Luiz Tavares

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Nádia Almeida
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 Parece um poema quase popular.
 A bruma seca aparece, segunda imagem, comparada com a neve.

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Nádia Almeida
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Demografia
• Aprox. 560.000 (Lisboa: aprox. 507.000)
• Descendentes de pessoas oriundas da África e da Europa
• População mestiça
• Idade média: 24 anos
• Religião: 95% cristãos
• Emigração: sobretudo para Estados Unidos, Portugal e França.
• Taxa de alfabetização: aprox. 86,8%

Ex:Pai de Chiquinho emigra para os Estados Unidos

Economia
• Agricultura: produção para o mercado interno
• Exportação limitada: café, banana e cana-de-açúcar
• Dependência do exterior

Um pouco de História
• Descobrimento: 1460, por Diogo Gomes (as ilhas estavam desabitadas)
• Colonização: começa pelas ilhas de Santiago (Ribeira Grande-1ª cidade que se constrói,
hoje em dia encontra-se quase em ruínas) e Fogo
• Sistema feudal, latifundiário, com mão-de-obra escrava
• Pouca presença portuguesa- necessidade de funcionários insulares
• Posição estratégica: Entreposto do tráfego de escravizados para o Brasil, o Caribe e o
sul dos Estados Unidos.
• Após a abolição da escravatura (1876), o arquipélago perde importância para Portugal e
entra em decadência.

A formação da sociedade crioula


• Chegada quase simultânea de europeus e africanos
• Processo de aculturação mais profundo do grupo dominante, prevalecem na sociedade
colonial.
• Porém, a cultura e a língua do grupo dominante, prevalecem na sociedade colonial.
• Deslocamento e desenraizamento do grupo dominado
• Insularidade- isolamento, aceleração da aculturação
• Negligência da Metrópole- estabilização da população

Cabo-verdianidade
• A cor da pele acaba sendo menos importante que a classe social. A cor de pele não
aparece tanto na literatura como noutros países.
• Censo de 1960: 70% mestiços, 20% negros e 10% brancos

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Nádia Almeida
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• Anos de 1930: surge a ideia de uma identidade cultural particular, autóctone e original.
(os cabo-verdianos descobrem que são africanos após a luta da independência da Guiné-
Bissau, por volta da década de 60.
• Os grandes temas desta época: a seca, a fome, as epidemias, o desemprego e a
emigração.
• A luta diária de sobreviver era mais importante do que o colonialismo.
• Dilema: como aceitar ambas as origens, a europeia e a africana?

Luta pela libertação e independência


• Década de 1950: Cabo Verde vincula-se à Guiné-Bissau
• 1956: Fundação do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde
por Amílcar Cabral.
• Luta armada na Guiné-Bissau; Cabo Verde não é palco de guerra.
• Independência: 5 de Julho de 1975.
• Primeiro presidente de Cabo Verde: Aristides Pereira
• Tentativa de unificação com Guiné-Bissau fracassada e 1980
• Desvinculação do PAIGC, criação do PAICV- Partido Africano para a independência
de Cabo Verde
• Multipartidarismo a partir de 1990- oposição: Movimento para a Democracia (MpD)
• Nova constituição em 1992
• Cabo-verde não passa por tantas turbulências políticas como acontece na Guiné-Bissau,
no pós-independência- reflete-se na literatura que acaba por abordar temas
direcionados para a natureza.

As línguas
• Língua oficial: português
• Língua nacional: crioulo/Kriolu ou língua cabo-verdiana/ Kabuverdianu
• Em cada ilha fala-se uma variedade diferente
• Está em processo de codificação/ criação de uma norma
• Cruzamento do português com línguas africanas da Costa da Guiné
• Língua materna para a grande maioria da população
• É muito usada na música, bastante na poesia, mas pouco na narrativa

Palavras cabo-verdianas conhecidas:


• Morabeza= amabilidade (característica dos cabos-verdianos; simpátia para com os
outros; aparece com frequência na literatura cabo-verdiana)
• Cretcheu= amor (crê, “querer” + txeu, “cheio”)
• Cachupa= prato nacional (milho, feijão, carne ou peixe)
• Mantenhas (presente na cultura guineense e cabo-verdiana) = cumprimentos

Música

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Nádia Almeida
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• Morna-estilo de música mais conhecido (cantada por uma pessoa, música lenta,
instrumentos acústicos, letras p.ex. de Eugénio Tavares)- Cesária Évora
• Funaná (estilo de dança e música de acordeão/ gaita + dança)- Sema Lopi
• Coladeira (ritmo mais rápido + dança, guitarra, cavaquinho, outros)- Américo Brito
• Batuque/ Batuco (tambores tocados por mulheres, às vezes com a voz de um homem
pelo meio)

Alguns dados históricos relevantes


• 1842: introdução da imprensa
• 1860: fundação do primeiro liceu nas colónias africanas na cidade da praia, ilha de
Santiago, a grande maioria dos estudantes das escolas primárias e secundárias são “de
cor”.
• 1866: fundação do Liceu-Seminário de São Nicolau (Ribeira Brava) - surgimento de
uma classe de letrados
• 1877: início da imprensa periódica não oficial

A história da literatura cabo-verdiana


• 1º Período: Iniciação- até 1925 (tudo que é escrito é impresso)
• 2º Período: Período Hesperitano (1926-1935)
• 3º período: Período claridoso/ regionalista (1936-1957) -pertence ao romance
Chiquinho
• 4º Período: Período do Suplemento Cultural (1958-1965)
• 5º Período: Período do universalismo (1966-1982)
• 6º Período: Período da consolidação- a partir de 1983
• Há mais produção literária escrita em Cabo-verde do que em Guiné-Bissau
(Laranjeira 1995)

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Nádia Almeida
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A Revista Claridade (1936-37 e 1947-60)
• Fundadores: Baltasar Lopes, Jorge Barbosa, Manuel Lopes
• Lugar: Mindelo (ilha de são Vicente)
• Objetivos implícitos: afastar-se dos cânones portugueses, expressar a voz coletiva do
povo cabo-verdiano, a sua autenticidade, intenção de renovação.
• Lema: “fincar os pés na terra” – conhecer em a realidade cabo-verdiana, contactar com
essa realidade, identificar-se com a terra
• Dilema: “querer ficar/ ter que partir” ou “ter que ficar/ querer partir” – grandetema
dos anos 30 e 60
• Tópicos: seca/chuva, terra/mar, insularidade/cosmopolitismo
• Publica poemas em crioulo- desafio à autoridade
• Também poemas em português, contos, excertos do romance Chiquinho
• Nº 2 da revista: estudo de Baltasar Lopes sobre a formação do crioulo
• Denúncia social, sem ser militante
• Influência do regionalismo do Nordeste brasileiro e (menos) do modernismo português

A revista Certeza (1944)


• Publicada no intervalo entre a primeira e a segunda fase da revista Claridade ( surge
nos dois anos que a Revista Claridade não é publicada)
• Organizadores: Nuno Miranda, José Spencer, Arnaldo França, Silvestre faria, entre
outros
• Influência mais identificável do neorrealismo português e brasileiro
• Tom mais rebelde, crescente descontentamento com o colonialismo
• A revista foi proibida depois do terceiro número
• Lema: “ficar e não partir”

Outras revistas/ publicações periódicas


• “Suplemento Cultural” de Cabo Verde: Boletim de Propaganda e Informação (1958-65),
órgão oficial do Estado.
 Aguinaldo Fonseca, Ovídio Martins, Onésimo Silveira, Yolanda Morazzo
 Grupo fixado em Lisboa, contato com a Casa dos Estudantes do Império
(CEI)
 Maior reflexão crítica, sofrei censura.
• Boletim dos Alunos do Liceu Gil Eanes (1959) - 1 número
 Corsino Fortes
• “Sèló”, folha do jornal Notícias de Cabo Verde (1962)
 Arménio Vieira, Mário Fonseca
 Anos de 1960: o regionalismo cabo-verdiano começa a ser interpretado como
um regionalismo africano (e não europeu)

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Nádia Almeida
2021212133
 Análise de poemas, pertencentes à revista Claridade (relativos à construção
da identidade cabo-verdiana):

 “Paisagem”
- poema do ano 1941
- Título: Será o tópico central, o tema, do poema? Não, o tema é
a fome.
Referência à seca, à falta
Desabafo do sujeito poético de água que prejudica e leva
Malditos
que vivência/vivenciou esta à dificuldade de produção
estes anos de seca!
realidade agrícola

Mete dó
o silêncio triste
da terra abandonada
esmagada
sob o peso
do sol penetrante!

Há quanto tempo não rodam


• Ideia de que está tudo parado; as pedras dos moinhos!
• Uma espera prolongada pela Há quanto tempo não se houve
chuva. o som monótono e madrugador
dos pilões cochinho...
-Que é desse ruído anunciador
das refeições do povo?

De dentro das casas


Referência à fome
nem fio tenuíssimo
de fumo subindo...

Pobres enxadas
que não servem mais!
esquecidas nos cantos dos quintais,
cobertas
de poeira e de estrume...

Coisa inútil as enxadas.


deixadas
sem cabos por ali
Imagem de morte- dá a ideia de
ao abandono!
que os ninhos estão abandonados
64
porque os pássaros morreram
Nádia Almeida
2021212133
As árvores estão secas o que
Árvores pasmadas transpõem uma imagem visual
sequiosas de uma paisagem amarelada
com restos ainda
dos ninhos que abrigaram,
deixam rogativas silenciosas
no deslocamento da paisagem!

E a terra seca
cheia de sol!

De dentro das casas


nem fio tenuíssimo
de fumo subindo....

Em tudo
o cenário dolorosíssimo
da estiagem
-da fome!
(Ambiente. 1941)

 “Poema do mar”
- O que significa o mar para os cabo-verdianos? Para os cabo-
verdianos, o mar é como uma espécie de 2ª pátria.
- Relação dos cabo-verdianos com o mar é de amor-ódio
- Ideia de identidade nacional é construída com base nos homens, na
experiência dos homens.

O drama do Mar,
o desassossego do Mar,
sempre
sempre
dentro de nós!
O mar está em todo o lado, pois são
Revela a força do mar O Mar! ilhas e como tal estão cercadas pelo
cercando mar, predominando a ideia de
prendendo as nossas Пhas, limitação. VÊ-se o mar em todo o lado.
desgastando as rochas das nossas Ilhas!
Deixando o esmalte do seu salitre nas faces dos pescadores,
roncando nas areias das nossas praias,
65
Nádia Almeida
2021212133
batendo a sua voz de encontro aos montes,
baloiçando os barquinhos de pau que vão por estas costas....

O Mar!
pondo rezas nos lábios,
deixando nos olhos dos que ficaram
a nostalgia resignada de países distantes
Repetição que passa a que chegam até nós nas estampas das ilustrações
imagem de que o mar nas fitas de cinema
está sempre ali e nesse ar de outros climas que trazem os passageiros
quando desembarcam para ver a pobreza da terra!

O Mar!
a esperança na carta de longe
que talvez não chegue mais!...

O Mar!
saudades dos velhos
marinheiros contando histórias de tempos pas-
[sados,
histórias da baleia que uma vez virou a canoa...
de bebedeiras, de rixas, de mulheres,
nos portos estrangeiros...
São os homens cabo-verdianos, Remete para
O Mar!
pois as mulheres são vistas uma nostalgia,
/colocados como objetos que dentro de nós todos, saudades em
estão a ser observados/olhados. no canto da Morna, quem ficou
Mulheres como objeto de no corpo das raparigas morenas,
desejo, de fruto da nas coxas ágeis das pretas,
sexualidade. no desejo da viagem que fica em sonhos de muita gente!
Palavras-Chave:
-1ª remete no sentido de ir embora Este
da convite de toda a hora
que o Mar nos faz para a evasão!
ilha. Uma luta diária pela sobrevivência.
Este desespero de querer partir
-2ªremete para um lema que virou slogan
dessa geração e que é transversal. e ter que ficar!
(Ambiente, 1941)
 “Crioulo”
- Tema: Identidade crioula, a identidade dos cabo-verdianos.
- Como é o crioulo? Como é o cabo-verdiano?
- Como se caracteriza este cabo-verdiano, este crioulo? O seguinte
poema, conclui que ele é humano, possui uma característica muito
valiosa uma vez que já sofreu muito.

66
Nádia Almeida
2021212133
Há em ti a chama que arde com inquietação
e o lume íntimo, escondido, dos restolhos,
Este “tu” que - que é o calor que tem mais duração.
aparece é o crioulo A terra onde nasceste deu-te a coragem e a resignação.
Deu-te a fome nas estiagens dolorosas.
Deu-te a dor para que nela
sofrendo, fosses mais humano.
Deu-te a provar da sua taça o agri-doce da compreensão,
e a humildade que nasce do desengano...
E deu-te esta esperança desenganada
em cada um dos dias que virão Significa que há esperança
e esta alegria guardada
para a manhã esperada Significa que a
em vão... esperança é quebrada

(Crioulo e outros poemas, 1964)

 “Encruzilhada”
- Tema: mestiçagem. Cruzamento de raças.
- Estabelece uma diferença com o poema anterior na medida em que o
anterior é repleto de afirmações das características do crioulo e o
segundo é repleto de dúvidas (O que será? O que acontecerá? Qual o
seu destino, o seu caminho
- O sistema colonial impunha uma tradição mais europeia que africana.

Que disse a Esfinge


aos homens mestiços de cara chupada?

Esta encruzilhada
de caminhos e de raças
onde vai ter?
Por que virgens paragens se prolonga?
Fome
Aonde vão nas suas andanças
os homens mestiços de cara chupada?
Sobreviver em
cabo-verde é um
67 ato heroico
Nádia Almeida
2021212133
Que significa para eles o amanhecer?

Ilhas de heroísmos e derrotas e esperanças


que a História não escreve
Não presta atenção ao
onde a hora é longa
heroísmo do quotidiano
e o dia breve...
(Crioulo e outros poemas, 1964)
É difícil estar a trabalhar no campo
nas horas do sol e no fim fica a
sensação de que não se faz nada

 “Anti-evasão”
- Faz uma intertextualidade com o poema de Manuel Bandeira.

- O sujeito poético recusa-se a acreditar no poema de Manuel


Bandeira.
- O sujeito poético declara que ninguém o tira de Cabo-Verde (sua
terra), pois é ali que encontrará uma boa oportunidade, pois por
vezes a emigração acaba em deceção.

Ao camarada poeta
João Vário
Pedirei
Suplicarei
Chorarei • É um sonho/paraíso fictício.
Não vou para Pasárgada
• Traduz-se no uso da ilusão
por parte do poeta para
negar o local onde está - é
Atirar-me-ei ao chão uma utopia.
e prenderei nas mãos convulsas
ervas e pedras de sangue

Não vou para Pasárgada

Gritarei
Berrarei
Matarei

Não vou para Pasárgada


(Caminhada, 1962)

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Nádia Almeida
2021212133
 “Toti cadabra”
- Tem um ritmo comum (cada verso tem 5 sílabas métrica) –
imitação de versos populares.
- Relato de uma realidade cabo-verdiana.

(Vida e morte severina)


«Toti Cadabra, nome exacto para um ser marginal. Estes
versos são o teu epitafio; depois deles nunca mais falarão de
ti.

No enterro de Toti
nem padre nem gente
na campa de Toti
nem flor de finado

Na campa-buraco
teu corpo mirrado
já eras da larva
Pessoa esquecida, que já bem antes da cova
estava morta antes de
Toti Cadabra É um cadáver em vida
morrer.
de vida macabra
OU
já eras cadáver
Pode ter morrido de fome e
que é mais um no meio de
bem antes da morte
Jogo de palavras
tantos
Bem antes da morte
já eras cadáver
Toti Cadabra
de vida sinistra

O grogue e a fome
são traças são bichos
já eras da larva
bem antes da cova

No enterro de Toti
69
Nádia Almeida
2021212133
nem padre nem gente
na campa de Toti
nem flor de finado.
(in Vértice, n. 334/335, 1971)

Chiquinho (1947), de Baltasar Lopes (1907-1989)

• Osvaldo Alcântara (pseudónimo, na poesia)


• *1907, Caleijão, Ribeira Brava (no máximo 2000 habitantes), ilha de São
Nicolau
• Ensino secundário no seminário de São Nicolau
• Licenciado em Direito e Filologia Românica, pela Universidade de Lisboa
• Regresso a Cabo Verde na década de 1930
• Professor do Liceu Gil Eanes, na ilha de São Vicente
• Advogado
• Um dos fundadores da revista Claridade
• A obra Chiquinho tem algumas marcas biográficas designadamente a ilha, o
seminário onde faz o ensino secundário, num momento da obra também troca
São Nicolau por São Vicente – paralelismo entre autor e personagem
• Nome muito reconhecido em Cabo Verde: aparece em notas e selos.

 Infância (primeira parte), entre 1907-1920

• Lugar: Caleijão, São Nicolau


• Romance de formação – Bildungsroman
• Retrata o processo de formação de uma personagem desde a infância até
à idade adulta. Elementos que influenciam a criação da alma crioula de
Chiquinho:
- Ausência do pai que emigra
- Tio Joca
- …
• Chiquinho – narrador em primeira pessoa / autodiegético
• “[…] a pouco e pouco ia formando a minha alma de crioulo” – a personalidade
que se forma é o crioulo. O que significa ser crioulo? Sobretudo é sinónimo de
um clima que escraviza as pessoas, mas simultaneamente, as torna mais
humanas.

Epígrafe:
O corpo é transportado de um lado
70 para outro, no entanto, o coração
continua a identificar-se com a terra.
Nádia Almeida
Ou seja, apesar do corpo sofrer
2021212133
escravidão, o coração cria uma
“corpo, qu’e nêgo, sa ta bái;
Coraçom, qu’e fôrro, sa ta fica…”

(o corpo, que é escravo, vai;


O coração, que é livre, fica)
 Espaços:
• A casa do Caleijão: casa gerida por mulheres, os homens são ausentes, apenas
existem na imaginação.
- Mamãe–velha e avô falecido

- Mamãe e papai (ausente)

- só dois filhos vivos (Nina morreu aos 3 anos) -Chiquinho, Lela, Nanduca

- Pitra Marguida – rapaz que ajuda nas hortas da família; criado que se torna
quase um filho

• Praia Branca:
- Titio Joca – irmão do pai (Chatearam-se por causa de uma herança); é uma
figura importante para Chiquinho, é quem o incentiva a estudar.

• Ribeira de Prata:
- Casamento - casamento a que Chiquinho é levado; o encontro com um
ambiente diferente do seu.

Baltasar Lopes adota estratégias de verosimilhança, de modo a apresentar a realidade de um


modo aceitável, designadamente através:
• Elementos geográficos, climáticos, sociais e culturais identificáveis
• Discurso do narrador em primeira pessoa  sugere a proximidade entre o vivido e o
narrado
• Elementos autobiográficos do autor (nasceu no Caleijão, por exemplo)
• Diálogos, discurso direto, representação mimética (a escrita do autor acompanha de
forma próxima o desenrolar da ação)
• Adequação da linguagem às falas das personagens, ao seu meio social.

 Linguagem:
• Síntese entre a língua cabo-verdiana (falada) e a língua portuguesa (falada e
escrita)
• Mistura entre o registo oral, semi-oral e escrito
• Cabo-verdianização da língua portuguesa
• Invenção de uma língua literária cabo-verdiana
71
Nádia Almeida
2021212133
 Fala familiar: entre a família de Chiquinho há personagens de condições sociais
diferentes.
• Rural: “-Pitra, tu é que fizeste filho em Zepinha?”
• Urbano: “-Também já fui assim. Sentia gagê no corpo. Passava o tempo consultando
o espelho.”
• Culto: “- terra de agricultura, vizinho. Gosto muito de plantas. Eu devia ter ficado a
cultivar terra, em vez de me meter na vida parasita do funcionalismo” – associado ao
uso de vocabulário técnico.
• Fala de Chiquinho-criança: “Quando eu era tamanhinho, figurava a América uma
ribeira muito bonita, cheia de hortas muito verdes. Na ribeira, Papai trabalhava de
agricultura”

 Criatividade linguística:
• Menimência (=infância), tamanhinho, agorinha, colhetar, porquidade, pardal jardinol,
corpo queixoso, lágrima comovida, temo como areia, etc.

 Análise:

 Capítulo 2:
• Ausência do pai que se faz presente através de cartas, mobílias, etc.
• Chiquinho cria uma ideia da América (imagina-a como Cabo Verde, mas maior)
• O pai trabalha nas fábricas
• Referencia à seca de 1915– atingiu uma grande zona
O livro foi publicado parcialmente na Revista Claridade, e publicado integralmente
em 1947, por isso, devemos ter consciência que o livro não fala dos anos 40.
• São mencionados amigos do pai de Chiquinho, logo este e os irmãos não
crescem sem referências masculinas.
• Há apenas três livros naquela casa: Gramática do Português, Código Civil
(contexto ditatorial, deviam de conhecer os seus direitos e deveres) e o
Lunário Perpétuo (ensina como tratar a terra)
 Capítulo 3:
• é apresentado um elemento importante para a criação da alma crioula.
• As histórias contadas são uma mistura de várias origens. São misturadas
pelas contadeiras de Cabo Verde, são transmitidas de boca em boca =
importância da tradição / oralidade.
• As crianças entretêm-se a ouvir, logo não é apenas o retrato da tradição.
Estas histórias criam um imaginário em Chiquinho e nos irmãos que se sentem
numa ilha onde o mal não existe.
 Capítulo 5:
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Nádia Almeida
2021212133
• Através de Chic’Ana questiona-se se é melhor partir ou ficar? Chic’Ana foi um
marinheiro, mas desistiu dessa profissão em prol da família.
• Agora trabalha as terras da família de Chiquinho e sente-se arrependido. No
entanto, não sabe se a vida de marinheiro teria sido melhor.
• Tonton Menga Menga é uma personagem misteriosa que é consultado pelos
habitantes. É uma espécie de adivinho/conselheiro/sábio.
 Capítulo 7: (pág.35 – 37)
• Recordações de Mamãe-Velha
• Começa com uma referência a uma epidemia de cólera – muitas pessoas
morreram. É um exemplo de uma situação difícil que Chiquinho viria a viver –
catástrofes cíclicas.
• Para Chiquinho tudo são histórias contadas seja histórias de escravidão ou de
Carlos Magno, são iguais.
• São referidas as pirataria/piratas.
• É neste capítulo que aparece a citação inicial.

 Capítulo 16: Chiquinho sente medo das bruxas.


 Capítulo 17: Reflexão sobre a vida do Tio Joca.
 Capítulo 23: plantação das hortas e lembranças do avô.
 Capítulo 27: Chiquinho vai para o Seminário.
 Capítulo 31: Resume as experiências vividas até este momento. Chiquinho
prepara-se para a mudança – “Eu era matéria plástica que se submetia a todas as
expressões. E todas iam-me deixando seu depósito de sabedoria e perversão.” –
a ideia que vai mudar para melhor ao mudar para S.Vicente (vai passar a ver o
mundo; ilha mais urbanizada, com capital cultural

Aprendizagens agradáveis e
dolorosas/difíceis

 S.Vicente (segunda parte)

• Chiquinho deixa o mudo da infância (pobreza, aventuras, carinho) e entra numa nova
fase da sua vida (novas amizades e uma nova visão de Cabo-verde).
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Nádia Almeida
2021212133
 Alto de Miramar- bairro de Mindelo

• Nha Cidália (parente distante) – marido Eusébio (ausente, retrato tirado na


Argentina)

• Tia Alzira – marido Amâncio (ausente, divórcio?)


• Andrèzinho (“o Erudito”, tem 20 anos-2 anos mais velho que Chiquinho, o que
mais vai influenciar Chiquinho-principalmente nas ideias políticas)

• Nuninha (17 anos, o primeiro amor de Chiquinho, casar?)


• Nené (criança)

 A-Ativismo cultural e político


 O Grémio Cultural Caboverdeano e a revista Renovação (muito em comum
com a revista Claridade; projeto mais político):

- Cap. 3, p. 124-125:
 contém informação sobre o “Grémio cultural” e a
caracterização de Andrezinho.
 insularidade e o drama da formação étnica (mestiços)
 Andrèzinho deu como um lema para o grémio cultural,
ultrapassar a limitação de cabo-verde e envolver-se no
mundo.
 Chiquinho começa a olhar pela 1ªvez para a ilha através de
fora (nasce numa ilha diferente, da que está agora, e na
qual tem uma história/vida completamente diferente,
conseguindo abstrair-se e analisar a experiência de outros
olhos”
- Cap. 8, p. 140-141:
 Ideia de encaixar o caso de cabo-verde nas especialidades
humanas.
 Cabo-verde=Universo
 Implícito um fundamento machista: o ser humano depende
de uma forma direta das suas bases económicas
 ponto de vista da revista: ver, analisar e recuperar o animo
de vive. Tem uma dimensão mais política do que literária ao
contrário da revista claridade em que a dimensão literária
é superior à política.

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Nádia Almeida
2021212133
 “…na Patagónica…” -escrever contos e poemas que apenas
se possam desenrolar em Cabo-verde (não escrever de
forma universal) – permite compreender a realidade do
país.
 A Associação Operária:
- Cap. 18, p. 186-187:
 Surge “Zeca Araújo” numa tentativa dos jovens
estudantes em se aliarem aos operários para formar
grupos/manifestações rodeada de dificuldades em
convencer os operários da sua solidariedade. Este é um
operário que alinha e apoia as ideias dos jovens, tentando
ser o intermediário entre jovens estudantes/intelectuais e
operários.
- Cap. 22, p. 197-198:
 Tentativa de criar uma federação – reflete a mentalidade
africana que não conseguem compreender as novas formas
de ver a vida.
 Não conseguem compreender este discurso intelectual, a
sua vida é muito rotineira e por isso não têm tempo para
refletir.
 Há muitas pessoas que já perderam a esperança, pois já
passaram por tentativas anteriores de mudança em que
nada mudou.
- Cap.23, p.198:
 Parafuso morre de tuberculose e juntamente com ele a
esperança da sua família, pois era visto como uma possível
fonte de sustento.
 A visita do Governador
- Cap. 12, p. 154-155:
 Chegada do governador/visita - provoca esperança nos
jovens de poderem falar com o governador sobre aquilo
que os assusta e provoca angústia. O que não acontece.
 B-Pobreza
o Declínio do Porto Grande/Prostituição:
- Cap. 13, p. 159-160:
 Fala-se da pobreza.
 João Col tentava arranjar trabalho, às vezes arranja
trabalho, mas maior parte das vezes não. Vive em
condições de pobreza.
 mocrata=prostituição; havia muita emigração de cabo-
verdianas para Dakar para trabalhar na prostituição, numa
expectativa de mudança de vida para melhor.
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Nádia Almeida
2021212133
 Doença e morte de Parafuso.
- Cap. 23, 198-200:
 Parafuso morre de tuberculose e juntamente com ele a
esperança da sua família, pois era visto como uma possível
fonte de sustento.
 Parafuso era um amigo querido e adorado pelo grupo,
apesar de ser o mais pobre do grupo.
Episódio que anuncia as outras mortes que acontecerão na 3ªparte do livro.
 C-Vida privada e emocional / namoro com Nuninha
-Cap. 6, p. 132-134
- Cap. 15, p. 165-167

 As-Águas (3ªparte) =época das chuvas(é retratada uma fase em que as chuvas não
existem)

 Casa do Caleijão
• Família
 Casa na Vila (Ribeira Brava)
• Casa de parentes
• Amizades: Sr. Euclides Varanda, José Lima
 Casa em Morro Braz (vai trabalhar como professor)
• Mora sozinho, isolamento

 A - Vida privada
• Regresso a S. Nicolau(p. 210): regressa à sua ilha, vem com mais
conhecimento, ideias novas (como a criação de uma cultura cabo-verdiana na
literatura)
• Sr. Euclides Varanda (p.226-229): Escreve poesia com carácter religioso e
influência de Alexandre Herculano, Soares de Passos e Tomaz Ribeiro – as
revistas cabo-verdianas têm como objetivo inovar, fazer diferente dos
portugueses. O poema de Euclides escreve algo não relacionado com Cabo-
Verde - conflito gerado entre Chiquinho e Euclides em que Chiquinho quer
fazer algo novo, da experiência cabo-verdiana, pois tem como objetivo criar
uma identidade cultural nacional. Mais tarde é contado que Euclides
pretende escrever um livro intitulado “Arrependimento”.
• José Lima: cabo-verdiano que emigrou para os EUA e conta o racismo de
que foi alvo nos EUA, sendo diminuído constantemente pela sua cor. Frase
de José Lima que insinua a Chiquinho que lhe pode acontecer o mesmo que a
ele (“mind yourself”) – homem bêbado- provocando desilusão a Chiquinho.

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Nádia Almeida
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• Nuninha: namorada de Chiquinho que está na ilha de S.Vicente. Pensa em
romper o namoro, havendo dificuldades na relação.

 B-Vida pública
• Chiquinho tem sonhos românticos com Nuninha e como artista, no entanto, a
única realidade que tem é de Ser professor (p. 253-257): única profissão. O
tio Joca avisa-o para pensar bem no que está a fazer, a não se habituar à
mediocridade da profissão e incentiva-o a sair da ilha para ter melhores
condições. Álcool como remédio para a concessão da pobreza, vida que
levaram Tio Joca e José Lima (tópico dominante na obra).
• Escrever um ensaio sobre S. Nicolau (p. 258-259)
• Volta à infância, aos contos que lia, mas com um olhar mais científico-possuí
mais saberes- compreender melhor a sua realidade e identidade-Grémio
cultural cabo-verdiano.
 Possui sonhos e planos de vida que ficam inacabados devido à
seca (Capítulo 13-chave)-caracteriza os cabo-verdianos.
• Telegrama para o Ministro
• Tói Mulato-marinheiro

 C-Pobreza
• Estiagem (cap. 13) – exercício tipo de exame:
- Escrever um "comentário geral" sobre um excerto: cap. 13, p.
263-271;
- Identificar os tópicos mais importantes desse excerto;
- Contextualizá-los, interpretá-los;
- Fundamentar as afirmações feitas com citações do capítulo;
- Identificar caraterísticas estilísticas/narratológicas do
excerto e relacioná-los com o conteúdo.
• Mortes sucessivas
• Rebelião/levante
• Emigração (p. 294)
 Último Capítulo: queria ir estudar numa universidade americana- “American
Dream”. Ele depois recebe uma carta do pai a convidá-lo a ir viver para os EUA.
Despedida de Chiquinho que embarca para os EUA mas n pretende ser igual aos
cabo-verdianos e limitar-se a trabalhar nas fábricas, quer estudar (quem quer
algo, consegue).

 Exercício uma editora quer (re)editar livros. cabo-verdianos e pede-vos um parecer.


Recomendam ou não o romance Chiquinho para reedição? Escrevam um pequeno texto com
argumentos convincentes.

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Nádia Almeida
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Luta pela libertação e independência
• Década de 1950: Cabo Verde vincula-se à Guiné-Bissau
• 1956: Fundação do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde
(PAIGC) por Amílcar Cabral.
• Independência: 5 de Julho de 1975
• Primeiro presidente de Cabo Verde: Aristides Pereira
• Tentativa de unificação com Guiné-Bissau fracassa em 1980
• Desvinculação do PAIGC, criação do PAICV – Partido Africano para a Independência
de Cabo Verde
• Multipartidarismo a partir de 1990 – oposição: Movimento para a Democracia (MpD)
• Nova constituição em 1992

História literária
o Anos 1960: disputa sobre a predominância dos claridosos
o Onésimo Silveiro: "Consciencialização na Literatura Cabo-Verdiana" (1963)
o Acusações: elitismo, falta de autenticidade literária e cultural, mistificação da
terra-longe, evasionismo, "Barlaventismo", fuga aos componentes africanos
o Defensores dos claridosos: veneração dos claridosos como fundadores da
literatura cabo-verdiana
o Sintoma de desorientação
o Consequência: lenta consciencialização da africanidade cabo-verdiana; porém, os
temas e estilos de escrita permanecem (neorrealismo, denúncia das condições
sociais- Pires Laranjeira, no seu livro fala mais aprofundadamente nestes temas)
o Início dos anos 1970
o Poemas revolucionários/de combate - publicados no estrangeiro, p. ex. em
Presença Cabo-Verdiana (fundada em 1973 em Lisboa). Usam a língua como
ferramenta de luta contra o colonialismo
o Poesia de combate: escassa em Cabo Verde
o Exaltação do PAIGC e de Amílcar Cabral (assassinado em 1973) -Alguns nomes
de poetas:
 Sukré d'Sal (pseudónimo de Francisco António Tomar)
 Corsino Fortes
 Timóteo Tio Tiofe (João Manuel Varela / João Vário)
 Kaoberdiano Dambará (escreve em crioulo)
 1986: Cinquentenário da revista Claridade, no Mindelo
 1986: Criação do Ministério da Cultura

Dina Salústio
• Nome artístico de Bernardina Oliveira
• *1941, Santo Antão (outra ilha Barlavento é uma geração diferente de Baltasar Lopes)
• Escritora, professora, assistente social, jornalista
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Nádia Almeida
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• Trabalhou em Cabo Verde, Angola e Portugal. • Trabalhou para o Ministério das
Relações Exteriores de Cabo Verde
• Co-fundadora da Associação dos Escritores Cabo-verdianos e da Academia Cabo-
verdiana de Letras.
• “Mornas eram as noites” de Dina Salústio, é reeditado e integra coleção de clássicos da
literatura.

 Contos
o Mornas eram as noites. Praia: Instituto caboverdiano do livro e do disco, 1994. ->
35 micro-contos / crônicas
o Filhos de Deus. Praia: Biblioteca Nacional de Cabo Verde, 2018.
 Romances
o A louca de serrano. Praia: Spleen Edições, 1998. •Filhas do vento. Praia:
Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 1999.
o Veromar. Praia: Rosa de Porcelana Editora, 2019.
 Ensaio
o Violência contra as mulheres. (estudo). Praia: ICF, 1999

 “Mornas eram as noites” de Dina Salústio, é reeditado e


integra coleção de clássicos da literatura.

- 1ªmulher a ser considerada autora de um clássico


cabo-verdiano

Padrões de Emigração Cabo Verde: perfil de género do país.


• Taxa de emigração O Governo de Cabo Verde, o Banco Africano de
historicamente elevada, Desenvolvimento (BAD) e a ONU Mulheres), 2018.
sobretudo dos homens https://www.afdb.org/fr/documents/cabo- verde-
• Consequências: perfil-de-genero-do-pais-janeiro-2018
- Baixa taxa de
crescimento populacional
- Muitas famílias chefiadas por mulheres
- Dependência das remessas dos homens emigrados
• Desde 2010, diminuição da taxa de emigração
• Razão: procura de trabalho pouco qualificado diminuiu na Europa e nos Estados Unidos

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Nádia Almeida
2021212133
• Aumento da taxa de emigração das mulheres - procura por empregadas domésticas e
cuidadoras de infância na Europa (2018, p. 13)

Famílias Chefiadas por Mulheres


• Historicamente, grande proporção de famílias chefiadas por mulheres
• Razões:
- impacto da escravatura e da colonização,
- persistência de atitudes e de cultura patriarcais,
- elevadas taxas de emigração masculina em busca de emprego no
estrangeiro.
• Famílias chefiadas por mulheres: 48% em 2015 (40% em 2000).
(2018, p. 13)

Género e pobreza
• A taxa nacional de pobreza
- 37% em 2001
- 27% em 2007
- 24,2%, em 2015
• Taxa de pobreza por género, em 2007
- 33% das famílias chefiadas por mulheres
- 21% das famílias chefiadas por homens (p. 16)
• Razões:
- Mercado de trabalho altamente segregado em função do género
- O emprego remunerado é 56% masculino e 44% feminino. (2018, p. 13)

Violência Baseada no Género (VBG)


• Lei Especial sobre Violência Baseada no Género, em vigor desde Março de 2011
• Número de queixas e ações judiciais (2018, p. 16)
• [Em Portugal: Lei 112/2009 - prevenção de violência doméstica]

Mornas eram as noites


• Liberdade adiada
• Campeão de qualquer coisa
• Foram as dores que o mataram - Para quando crianças de
Junho a Junho?
• Um ilegítimo desejo

80
Nádia Almeida
2021212133
Conto:
 “Liberdade adiada”
• A maior parte escrita na 3ªpessoa, até “Quando a encontrei” – é a voz da mulher
que encontra outras mulheres ao longo do seu caminho.
• Título: exprime a ideia do suicídio como uma libertação. Porquê? Deseja
libertar-se da sua vida dura: mãe involuntária de muitos filhos, provavelmente
não tem o marido por perto. Os filhos são vistos como uma prisão (prisão para a
rapariga de 23 anos).
• O homem é ausente.
• Ela não escolheu ter estes filhos, no entanto, perante a hipótese do suicídio
muda de opinião
• O suicídio é uma opção pois “não perdia nada.”
 “Campeão de qualquer coisa”
• Título: alude ao facto de as pessoas colocarem uma máscara para serem mais do
que aquilo que são. - É uma crítica que se estende a homens e mulheres? Sim
(final do livro)
• No entanto, não sabemos se o eu/tu são homens e mulheres, o eu pode ser uma
mulher devido à voz transversal que há nas outras crónicas, contudo, a autora
não crítica diretamente e sim implicitamente o patriarcado, como são
manipulados pelo mesmo à masculinidade.
• Campeão é alguém que cria uma personalidade, demonstrando que se alguém
mostra a sua vulnerabilidade é desprezado. - A autora critica isto. Esta forma de
estar foi-lhes ensinada “ensinaram-nos que devíamos ser heróis de qualquer
coisa”. Os homens não deviam mostrar os seus medos “não nos educaram…”
• Possivelmente o interlocutor é um homem que denuncia e se sente
desconfortável com esta visão, pois os rapazes são mais educados/influenciados
anão admitirem os medos-questão de masculinidade-daí o “tu” ser provavelmente
um homem que não quer seguir o patriarquismo que lhe foi incutido, desejando
ser honesto. (sociedade de pressão) – Acabam isolados das suas emoções.

Raewyn Connell: Masculinities (1993)


• 4 projetos de masculinidades
• Masculinidade:
- Hegemónica:
o O ideal atual de virilidade numa sociedade patriarcal
o Máxima distância da feminilidade, e da masculinidade subordinada
(homossexual).
o Objetivo: não ser mulher e não ser gay
- cúmplice:

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Nádia Almeida
2021212133
o Tira partido das vantagens relacionadas com "ser homem" numa sociedade
patriarcal.
o Apresentada por homens que não se encaixem no ideal da masculinidade
hegemônica, menos "viris".
- Marginal:
o Homens que compactuam com as normas sociais patriarcais, mas que
pertencem a grupos socialmente marginalizados ou racializados
o Condição precária, falta de capitais económicos, culturais e simbólicos
(Pierre Bourdieu)
- Subordinada:
o Homens que não participam do projeto hegemónico e das vantagens
estruturais já mencionadas
o Características frequentemente identificadas com a feminilidade segundo
o discurso heteronormativo e patriarcal
o Base da pirâmide hierárquica: feminilidade e masculinidade subordinada
(homossexual, não-binária, queer...)

Contos:
 “Foram as dores…”
• situação de homicídio onde a mulher mata o homem, por causa dos abusos
sofridos, onde ela está num ciclo vicioso e a única maneira que ela encontrou de
sair da sua relação tóxica foi essa.
• Não é uma realidade muito descontextualizada

 “Para quando crianças de junho a junho?”


• Condição das famílias
• Tema de crianças que crescem sem o pai, onde se vê um grupo de crianças a
atacam com pedras e violência um doente, o líder desse grupo de crianças tinha
crescido com a ausência do pai e está revoltado porque o pai não deu nenhum
justificação para não se importar com ele.
• Tensão entre os conceitos festa e violência
• Ausência do pai
• Situação inesperada – grupo de crianças começa a atacar um doente mental
(indefesa). Atacam-no com pedras e violência física.

• Pretendem mostrar que são superiores ao idoso.


• A mágoa do abandono do pai, também, justifica esta situação.
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Nádia Almeida
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• Gera revolta/raiva do pai que não se interessa pelo filho

• Uma criança que sente a necessidade de ser um homem desde cedo


• A narradora sente frustração perante o leque de problemas.

 “Onde está a verdade?”


• Descobre que o tio, afinal, não sabia ler nem escrever ao contrário daquilo que
achava
• Faz uma reflexão sobre o que é verdade ou não
• O que une as pessoas é o sentimento

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Nádia Almeida
2021212133

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