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Psicologia Evolucionista
e algumas contribuições
para a compreensão
do Desenvolvimento
Humano
Briseida Dogo Resende
Rachel Coelho Ripardo
Angela Donato Oliva

Introduzindo algumas questões


sobre o Desenvolvimento humano

Gerações após gerações, nas diversas sociedades huma-


nas, pais e mães tentam criar seus filhos da melhor forma
possível buscando e utilizando informações disponíveis em
seu ambiente cultural, seja em programas de televisão, livros
ou blogs, seja nas conversas e instruções passadas pelos avós,
pelos familiares ou por outros membros mais experientes. Por
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exemplo, deve-se pegar o bebê no colo quando ele chorar? Deve-


se colocá-lo para dormir junto com os pais ou em um quarto
para se habituar sozinho? As práticas de cuidado estão profun-
damente enraizadas nas crenças culturalmente enviesadas
(DeLoache & Gottlieb, 2010) e instruem o que fazer a respeito
de comportamentos compartilhados por todos os humanos. Há
enormes diferenças culturais, mas considerando a fragilida-
de do recém-nascido humano e sua dependência dos adultos,
existe sempre a necessidade da formação do vínculo com um
cuidador, como forma de garantir a sobrevivência (Hrdy, 1999).
Pode-se dizer que o bebê já “nasce sabendo” o que deve fazer
para se vincular à mãe. Mas como este saber instintivo teria
aparecido na ontogênese de cada criança? Esta pergunta nos
remete a uma discussão recorrente na psicologia do desenvol-
vimento: o que é inato e o que é adquirido.
São muitas as questões envolvendo o desenvolvimen-
to humano. Neste capítulo, discutiremos como este assunto
é abordado pela perspectiva evolucionista. Iniciaremos situan-
do o desenvolvimento dentro da etologia, o que implica discutir
a dicotomia entre inato e aprendido. Apresentaremos algumas
capacidades típicas dos bebês humanos que permitem com
que ele sobreviva, dando especial ênfase ao sistema de apego
e à história de vida. Exemplificaremos com resultados de estu-
dos empíricos, de modo a oferecer para o leitor uma visão ampla
e embasada em pesquisas sobre o desenvolvimento humano.

Inato e adquirido: Um clássico debate

Uma característica inata estaria relacionada a uma


herança biológica. Partindo-se do ponto de vista evolucionista,

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comportamentos compartilhados podem caracterizar grupos


taxonômicos. Os universais humanos seriam, portanto,
comportamentos que nos definem enquanto espécie. Um racio-
cínio que se desenrola daí é que haveria um programa genético
que controlaria a expressão do comportamento e, provavel-
mente, comandaria o curso do desenvolvimento. A etologia
clássica trabalhava com essa lógica: comportamentos inatos
e instintivos seriam herdados e característicos das espécies.
Um exemplo disso seria o que Lorenz, na primeira metade do
século XX, chamou de Estampagem (Imprinting): ele verificou
que filhotes de ganso seguiam, ao nascer, a figura que esta-
va próxima (Lorenz, 1993). Esta seria uma forma de aprender,
em um período sensível, caracterizando um comportamento
completamente estereotipado e típico da espécie. Essa ideia
influenciou o psicanalista John Bowlby na elaboração da Teoria
do Apego, que veremos mais adiante.
Em 1953, a noção de instinto preconizada pela etologia
como sendo algo inato e imutável sofreu uma dura crítica com
a publicação do artigo de Daniel Lerhman, pesquisador vincu-
lado ao estudo do desenvolvimento, em 1953. Para ele, as afir-
mações que Lorenz fazia não levavam em conta a emergência
do comportamento: dizer que algo era inato seria como dizer
que era desnecessário investigar o desenvolvimento do compor-
tamento, o que não faria sentido, já que novas estruturas só
poderiam emergir de estruturas anteriores. E, se assim fosse
feito, ficaria evidente que não era possível separar o que era
inato do que era aprendido. Lerhman usou o comportamento
de bicar exibido pelo pintinho para exemplificar: é estereotipa-
do, característico da espécie e aparece em animais que foram
isolados, está presente ao nascer e há aprimoramento mesmo
na ausência de prática. Estaria, portanto, qualificado como um

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comportamento inato de acordo com os trabalhos de Lorenz


(Lorenz, 1993). Entretanto, segundo seu relato (Lerhman,1953),
Zing-Yang Kuo demonstrou que o comportamento de bicar
é uma consequência do desenvolvimento embrionário e está
relacionado ao contexto do feto dentro do ovo. Sendo a estimu-
lação sensorial e o movimento motor normalmente essenciais
para a emergência do comportamento que antes era tido como
“inato”, ou “instintivo”, fica difícil argumentar a favor de aspec-
tos ou inatos ou adquiridos.
Na primeira metade do século XX, enquanto os etólo-
gos enfatizavam o que era instintivo e inato, os analistas do
comportamento, como Watson e Skinner, focavam seus estudos
no ambiente e nos processos de aprendizagem. Watson (1930)
defendeu que seria possível educar bebês saudáveis, selecionados
ao acaso, de modo a exercerem qualquer tipo de profissão, inde-
pendentemente de seus talentos pessoais. Com isso, deixava bem
claro que, sobretudo a criação definiria os destinos das pessoas.
Mas a ideia de que somente o treino garantia a aprendiza-
gem começou a cair por terra quando Keller Breland e Marion
Breland, que foram alunos de Skinner, resolveram se dedicar
a treinar animais para fins comerciais, utilizando os condicio-
namentos respondente e operante. Eles perceberam que não era
possível treinar qualquer animal a fazer qualquer coisa. Em 1961,
relataram esta dificuldade (Breland & Breland, 1961) e se reme-
teram ao conceito de instinto da etologia clássica, reconhecendo
a necessidade de se levar em conta as características de cada
espécie com as quais se deseja trabalhar: a história evolutiva
impunha restrições na aprendizagem. Além disso, na década
de 1960, Garcia e colegas, em famosa série de experimentos,
demonstraram que ratos só associavam respostas a estímulos
que faziam “sentido evolutivo” (por exemplo, associavam luz

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com choque, mas não com náusea), deixando claro que a herança
biológica não poderia ser ignorada no estudo da aprendizagem
(Garcia & Koelling, 1966). Na década de 1970, etólogos e analistas
do comportamento concordavam que não havia instinto comple-
tamente pronto e imutável ao nascer e a aprendizagem estaria
sempre sujeita a restrições do organismo.
Em 1992, Jerome Barkow, Leda Cosmides e John Tooby,
da Universidade de Santa Bárbara, propuseram um programa
de pesquisa que chamaram de Psicologia Evolucionista (PE)
(Barkow, Cosmides & Tooby, 1992; PE, Yamamoto, (ver Histórico
e Plano do Livro neste volume), partindo da ideia de que as
características humanas atuais seriam adaptações resultantes
da evolução da nossa espécie. Assim como na etologia clássica,
a emergência e o desenvolvimento dos comportamentos durante
a ontogênese não foram colocados em foco nas propostas iniciais
de pesquisa da PE. Porém, os indivíduos estão sempre se desen-
volvendo e, portanto, a ontogênese está sob seleção e deve ser
considerada no estudo da evolução (Lewontin, 2001). Bjorklund
e Pellegrini (2001) buscaram corrigir esta omissão, incluindo
o desenvolvimento no estudo da psicologia à luz do pensamen-
to evolucionista, ao que chamaram de Psicologia Evolucionista
do Desenvolvimento. Para isso, consideraram que o ser que se
desenvolve atua em seu meio, alterando-o, e sofrendo a influên-
cia desse meio. O bebê humano, por exemplo, já exibe, ao nascer,
diversas capacidades que vieram se desenvolvendo ao longo da
gestação, e que são essenciais para que seja estabelecido um
vínculo com o cuidador, assim como garantir a sua sobrevivên-
cia. É isso que será abordado no próximo tópico.

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Evidências empíricas sobre as capacidades dos bebês

O estudo das características iniciais dos recém-nascidos,


como destaca Spelke (2000), proporciona o surgimento de teorias
explicativas sobre o desenvolvimento humano e o funcionamen-
to mental. No entanto, o interesse em estudar bebês é relativa-
mente recente (para um histórico, ver box). As pesquisas nos
últimos anos na área do desenvolvimento humano propiciaram
novos conhecimentos sobre competências de recém-nascidos.
Observa-se uma mudança de paradigma nos estudos sobre
bebês. No início do século XX, acreditava-se, por exemplo, que
os recém-nascidos fossem desprovidos de capacidades cogni-
tivas, apresentando apenas um conjunto de comportamentos
reflexos (Oliva, 2004). Atualmente, o bebê é visto como possui-
dor de capacidades cognitivas e perceptuais que auxiliam em
sua sobrevivência e favorecem a interação com as pessoas
(Ferronato, Resende & Manoel, 2012).

Box 1. No século XVIII, o filósofo empirista John Locke alegava que


a mente ao nascer poderia ser comparada a uma lousa em branco
(tabula rasa) na qual as ideias e representações do mundo seriam
inscritas nela por intermédio único da experiência sensorial. Para
William James (1890), o bebê experienciava os estímulos sensoriais
de maneira confusa, e Wundt (1904) não considerava ser possível
estudar bebês para compreender a mente adulta. Somente Darwin
(1887/2000) colocou questões sobre como surgem capacidades de
aprender e de imitar em bebês e observou comportamentos em seu
próprio filho. Embora não tivesse chegado a resultados muito preci-
sos, era uma tentativa pioneira em uma época em que as capacida-

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des de recém-nascidos eram subestimadas. Para Piaget (1932/1970),


os bebês nasciam dotados com alguns poucos reflexos que permi-
tiam a conexão inicial entre eles e o ambiente. Ele realizou pionei-
ramente nos anos 1930 e 1940 estudos empíricos que focalizavam
capacidades cognitivas de bebês com menos de um ano. Ele consi-
derava que a mente dos recém-nascidos com menos de um mês
era indiferenciada e apresentava pouca competência para conhe-
cer o mundo. Vygotsky e Luria (1930/1996) também consideravam
que até um mês e meio o bebê não percebia a realidade conforme
o faria posteriormente no desenvolvimento. Lewis e Slater (2002)
pontuamque trabalhos sobre o desenvolvimento inicial realiza-
dos a partir dos anos 1930, não tinham como foco as competências
cognitivas. Nos estudos de John Bowlby, Harry e Margaret Harlow
desenvolvidos nas décadas 1930 e 1960 (Bowlby, 2002; Harlow, 1959),
por exemplo, havia a preocupação de se compreender as influên-
cias da primeira infância em etapas posteriores do desenvolvimen-
to emocional e social. Foi apenas no início dos anos 1960 que as
investigações focaram mais claramente sobre as capacidades de
processamento sensorial e competências cognitivas dos recém-nas-
cidos com menos de um mês de vida. A partir dos anos 1960, as
pesquisas da psicologia do desenvolvimento sobre as capacidades
cognitivas dos bebês passaram a incorporar equipamentos capazes
de registrar respostas de sucção do bebê em uma chupeta liga-
da a um sensor (Siqueland & De Lucia, 1969), frequência cardíaca,
frequência respiratória, eletroencefalograma, direção e duração
do olhar. Esses fatores permitiram aos teóricos mudarem antigas
ideias, que, por não terem meios para acessar a cognição do bebê,
não eram capazes de perceber as suas competências, tais como,
a de que recém-nascidos não enxergavam.

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Para Brazelton (1988), o bebê faz parte de um sistema de


regulação mútua no qual ele interfere no ambiente e ao mesmo
tempo é afetado por este. Somos uma espécie social desde
o nascimento, o que pode ser observado nos comportamen-
tos dos recém-nascidos que indicam predisposição para trocas
com os outros tais como, olhar para faces, imitar expressões
faciais, se acalmar quando apanhados no colo. Nessa intera-
ção, as características dos bebês deflagram atividades sociais
no adulto, que se tornam rotinas e permitem que os pequenos
aprendam a conhecer o mundo e suas regularidades.
Os bebês têm sentidos de paladar e olfato altamente
funcionais. Lipsitt (1987) descreve diversos estudos nos quais
recém-nascidos apresentam reações a odores e vozes femininas
em recém-nascidos. Eles também modificam sistematicamente
o padrão de sugar diante de água açucarada e sem açúcar. Horas
depois de nascidos, os bebês parecem capazes de fazer discri-
minações do cheiro do corpo, do leite e do líquido amniótico de
suas mães em relação ao de estranhas (Rochat, 2001). Pesquisas
demonstram que bebês também são capazes de: a) discrimi-
nar visualmente um rosto humano (Batki et al., 2000; Turati et
al., 2002), sua mãe (Bushmell & Mullin, 1989), o olhar humano
(Farroni, Johnson & Csibra, 2004; Guellai & Streri, 2011); b) e,
usar pistas visuais para resolver problemas (Farroni et al., 2004).
De Casper e Fifer (1980) em um estudo clássico mostraram que
bebês discriminam a voz da mãe de uma estranha, com poucas
horas de nascidos.
Os bebês apresentam uma habilidade melhor do que
a dos adultos para discriminar fonemas de diversas línguas. Os
recém-nascidos podem virtualmente discriminar cada contras-
te fonético usado em diferentes línguas humanas. Essa habilida-
de, contudo, começa a se perder a partir dos oito ou dez meses

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e por volta dos dois anos de idade a discriminação fonética


assemelha-se bastante à do adulto. Além disso, recém-nascidos
de quatro dias apresentam preferência por ouvir uma história
contada na língua natal do que a mesma história contada pela
mesma pessoa em outra língua (Mehler & Dupoux, 1997).
Bebês com poucos meses de vida reagem de manei-
ra semelhante a certos eventos do mundo físico. Baillargeon
e DeVos (1991) mostraram que os bebês de três meses e meio
reagiam a cenas nas quais eram apresentados eventos fisica-
mente impossíveis. Eles eram habituados a ver uma figura se
movendo de um ponto para outro. Depois eram testados em
duas condições, uma possível e outra impossível fisicamente.
Na condição de evento possível, a figura passava por trás de
um muro com uma janela e a parte superior dela ficava visível
apenas ao passar por atrás da janela. Na condição impossível
a figura desaparecia atrás do anteparo e não ficava visível quan-
do passava pela janela, só reaparecendo ao final do muro.
Wynn (1992) demonstrou que bebês de cinco meses sabem
adicionar ou subtrair uma unidade em conjuntos de até três
elementos. No estudo dela, dois bonecos foram colocados em
um palco diante do bebê. Após um tempo de habituação, um
anteparo descia e impedia que se visse o que acontecia no palco.
Em seguida, o bebê via aparecer uma mão vazia na lateral, que
entrava por trás do anteparo e saía segurando um dos bonecos.
Imediatamente após isso, o anteparo era retirado. Os resultados
mostram que o bebê olhava por mais tempo a condição em que
no palco permaneciam dois bonecos, do que quando restava
apenas um boneco no palco. O mesmo acontecia quando a mão
aparecia com um boneco na mão, entrava por trás do anteparo
e saía sem nada. Os bebês olhavam por mais tempo quando,
após a retirada do anteparo, restavam dois bonecos e não três.

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Isso só acontecia em arranjos com até três bonecos. De acordo


com Rochat (2001), os bebês são sensíveis a pistas de profundi-
dade, reagindo a objetos que estão mais próximos; eles também
discriminam formas, olhando por mais tempo quando, após
a habituação, uma nova forma é apresentada. Diante de dois
estímulos, olham mais para padrões de alto contraste. Em
termos da experiência de self, o autor diz que, desde o nasci-
mento, os bebês indicam ter um senso do próprio corpo, sendo
capazes de estabelecer correspondência entre as informações
recebidas em uma modalidade sensorial (aquilo que veem, por
exemplo) com outra (aquilo que tocam).
Meltzof e Borton (1979), já tinham indicado que bebês
transferem informações táteis para o processamento visual,
olhando por mais tempo as chupetas lisas ou com vilosidades,
dependendo de qual eles haviam chupado. Meltzoff e Moore
(1983) demonstraram que bebês com até 72 horas de vida eram
capazes de imitação neonatal de movimentos faciais: protusão
de língua, abrir a boca, projetar os lábios para frente. Estudos
com recém-nascidos indicaram que eles respondem mais
à gravação do choro de outros recém-nascidos do que ao próprio
choro (Dondi et al., 1999; Martin & Clark, 1987). Ou seja, compar-
tilham emoções, o que é um componente básico da empatia
e uma pista de que possuem um sentido de self (Decety & Jacson,
2004). Esses achados contribuíram para rebater crenças de que
recém-nascidos eram passivos e não responsivos socialmente.
Estudos de Hamlin e colegas, por sua vez, sugeriram que bebês
de seis meses eram capazes de avaliar comportamentos pró-so-
ciais, e que bebês de cinco a nove meses preferiam o boneco que
agia pró-socialmente do que o que não ajudava (Hamlin, Wynn
& Bloom, 2007; Hamlin & Wynn, 2011).

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Em síntese, o que os estudos apresentados parecem


mostrar é que os recém-nascidos são sociais desde o início.
Diferentemente do que se pensava, eles não são reativos e passi-
vos, nem seus comportamentos são simples ou desorganiza-
dos; são extremamente responsivos, e a notável plasticidade
e a grande capacidade de aprender a partir dos outros e do
ambiente, permite que se adaptem aos diferentes ambientes.
Ao mesmo tempo que são preparados para detectar estímulos
importantes para a sobrevivência (tal como a face humana),
e para agir e responder a estímulos sociais e físicos diferentes,
eles apresentam enorme capacidade de aprender a partir do
ambiente. Essas habilidades favorecem o estabelecimento de
interações sociais e formação de vínculos interpessoais, funda-
mentais para o desenvolvimento. Como imaginar esse desen-
volvimento se não houvesse um processamento emocional que
parece possibilitar essas habilidades de interação? As emoções
são fundamentais para a nossa sobrevivência e, em termos
do desenvolvimento na perspectiva evolucionista, a teoria do
apego pode explicar muito do nosso comportamento.

A Teoria do Apego

A disposição para trocas sociais no início da vida é essen-


cial para que o cuidado e a proteção do bebê sejam garantidos.
Segundo Lorenz (1971), uma forma do bebê garantir a atenção
é possuindo traços físicos de “fofura” (os kindchenschema ou
“esquemas de aspectos infantis”): cabeça relativamente grande,
olhos grandes e implantados um pouco mais abaixo na face,
região da bochecha proeminente, braços e pernas propor-
cionalmente menores do que os de um adulto. Some-se a isso

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o fato de o bebê procurar ativamente o cuidador. O bebê não


é um ser passivo, desde o nascimento ele busca pela proximi-
dade e esforça-se por mantê-la através do contato face-a-face,
choro, sorrisos e gestos descoordenados. A essa busca e manu-
tenção de proximidade o psicanalista John Bowlby chamou de
“comportamento de apego” (Bowlby, 2002).
Antes da Teoria do Apego, pensava-se que o bebê se vincu-
lava à mãe por ser ela a fonte de alimento que satisfaria o impul-
so primário da fome, bem como suas necessidades fisiológicas:
estas satisfações levariam às primeiras relações objetais, ou seja,
a um “amor interesseiro”. John Bowlby argumentou que alimen-
tação e o alimento desempenham um papel apenas secundá-
rio no processo de vinculação, mas a proximidade com a mãe
é uma meta biológica de sobrevivência (Bolwby. 2002). Para criar
sua teoria, ele utilizou como referência o processo de estampa-
gem, descrito por Lorenz nos anos 1930, assim como evidências
empíricas em estudos com outras espécies, especialmente no
trabalho de Harry Harlow com macaco rhesus (Harlow, 1959).
Harlow demonstrou que os bebês rhesus preferiam ficar mais
tempo em contato com uma mãe de pelúcia, em comparação
com uma mãe de arame, onde estava inserida uma mamadeira
com leite: eles recorriam à mãe de pelúcia quando alarmados,
preferiam olhar para ela e exploravam menos o ambiente na sua
ausência (Van der Horst, Le Roy & Van der Veer, 2008; Vicedo,
2010). Ou seja, o filhote preferia a proximidade de uma figura
aconchegante de pelúcia do que de uma figura de arame que
era somente fonte de alimento. O impacto do comportamento
materno, ou da privação dele, para o desenvolvimento saudável
ficou evidente nos estudos de Harlow: quando adultos, os sujei-
tos dos experimentos mostraram déficits comportamentais no

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modo como interagiam com outros animais e eram incapazes


de explorar o ambiente (Cole & Cole, 2004; Harlow, 1959).
Mas qual seria a pressão seletiva para o comportamento
de apego? Considerando que a função biológica de um dado
comportamento diz respeito à garantia da sobrevivência e do
sucesso diferencial na reprodução, Bowlby argumenta que
a função adaptativa do apego é garantir a segurança do filhote
em relação a predadores, o que, em termos de sobrevivência,
seria de importância equivalente ao comportamento reproduti-
vo ou parental. A antropóloga e primatóloga Sarah Hrdy (2005)
acrescenta que o principal risco à vida dos filhotes de primatas
vem dos próprios coespecíficos, por meio de abuso e infanti-
cídio. Em diversas espécies de primatas, machos adultos, que
competem por hierarquia e oportunidades reprodutivas, podem
matar o filhote para propiciar um novo ciclo reprodutivo. As
fêmeas subalternas podem roubar o filhote como uma oportu-
nidade de expressão do cuidado parental, mas não serem bem
sucedidas nesta tarefa, o que incorre também em risco para
o bebê (Hrdy, 2001). Estudos que revelam o risco de infanticídio
e abuso em bebês humanos mostram que, para a nossa espécie,
o coespecífico também representa perigo, fortalecendo a ideia
de Hrdy sobre a função adaptativa do comportamento de apego
(Alexandre, Nadanovsky, Moraes & Reichenheim, 2010; Daly &
Wilson, 1994; Simões, Mota & Loureiro, 2005/2006).
Para Bowlby, o comportamento de apego pode ser enten-
dido como um sistema comportamental que, quando ativado,
faria com que a criança procurasse e tivesse acesso ao seu cuida-
dor principal de forma a obter segurança, cuidado e proteção.
Este cuidador é chamado de “figura de apego”, e é geralmente,
mas não necessariamente, a mãe. Assim, sua descrição foca no
modo como a criança comporta-se na presença ou ausência da

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figura de apego, segundo alguns critérios, como: chorar e segui-


-la quando ela sai, saudá-la e abordá-la quando regressa, sorrir,
movimentar-se e agarrar-se a ela em caso de alarme (Bowlby,
2002). A figura de apego seria também uma base segura a partir
da qual o bebê partiria para explorar e descobrir o mundo.
Os componentes que caracterizam o apego são: busca de
proximidade, ansiedade de separação e base segura (Feeney,
1999; Hazan & Zeifman, 1999). Esses componentes se manifes-
tam de forma diferente em cada criança, dependendo de seu
padrão ou estilo de apego. Esses padrões seriam estabelecidos
no período inicial de desenvolvimento (Bowlby, 1997; 2002)
e são consequências das relações estabelecidas entre a figura
de apego e o bebê (Ainsworth, 1979), tendo como influência
o temperamento do bebê (Belsky & Rovine, 1987), a própria
história biográfica da mãe, e o contexto eco-cultural de desen-
volvimento na qual a díade está inserida (Keller, 2013; para
saber mais ver Keller, 2002, 2007).
Os padrões de apego foram descritos por Mary Ainsworth,
grande colaboradora de Bowlby, por meio de análises de
situações naturalísticas envolvendo mãe-bebê, e por meio
de uma elaborada situação experimental, conhecida como
Procedimento da Situação Estranha. Neste procedimento,
a interação mãe-bebê é observada, e o comportamento da
criança é avaliado quando entra na sala uma pessoa que ela
não conhece (o estranho), quando a mãe sai da sala e em segui-
da quando retorna. A autora menciona ter identificado oito
padrões, sendo três os principais: apego seguro, em que as crian-
ças brincam confortavelmente e reagem de maneira positiva
à presença de um estranho, desde que as mães estejam por
perto, assim como se acalmam facilmente quando a mãe retor-
na; o apego ansioso/esquivo, em que os bebês são indiferentes

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à presença ou ausência de suas mães, podem ou não chorar


quando elas saem, acalmam-se com o acalento da pessoa
estranha e ficam indiferentes quando as mães retornam;
e o apego ansioso-resistente, em que os bebês parecem ansio-
sos mesmo na presença da mãe mantendo-se próximo a elas,
ficam perturbados quando as mães saem da sala de teste
e não se acalmam quando ela retorna (Ainsworth, 1979). Mais
recentemente, Main e Solomon (1990) identificaram o apego
desorganizado, caracterizado pela manifestação de compor-
tamentos contraditórios, impulsividade, estados de transe e
perturbações em situações de estresse.
Para Bolwby (2002), haveria um estilo de apego mais
adaptativo, através do qual a criança usaria seu cuidador como
uma base segura para explorar o ambiente. Por outro lado, os
psicólogos evolucionistas do desenvolvimento não consideram
um estilo de apego específico como o mais adaptativo: um estilo
de apego inseguro pode estar adaptado ao contexto em que
a criança se desenvolveu (p. ex.: contexto de imprevisibilida-
de), e a prepararia para a vida adulta (Bjorklund & Pellegrini,
2002; Del Giudice & Belsky, 2010; ver também Capítulo 4.1 neste
livro). Alma Gottlieb (2004), por exemplo, relata que a mães da
população Beng, da Costa do Marfim, socializam seus filhos
para que fiquem minimamente apegados apenas à mãe, pois
é importante aceitem sem medo diferentes cuidadores neste
contexto social em que o cuidado aloparental é extremamente
importante. Por considerar que as diferenças culturais estão
imbricadas no desenvolvimento humano, Keller e Kärtner (2013)
afirmam que os conceitos de saúde, normalidade e bem-estar
só podem ser definidos dentro de uma perspectiva que consi-
dera o ambiente eco-cultural em que o indivíduo de insere
e as suas condições adaptativas. Keller (2007) argumenta que

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o investimento e atenção que a mãe dispende ao bebê irá variar


dependendo das circunstâncias: em extrema pobreza e estresse
ambiental, o cuidado primário com higiene e alimentação pode
constituir o principal investimento materno que uma mulher
pode oferecer. Assim, os padrões de apego e de interação da
mãe com o bebê serão adaptativos a um ambiente ecológico
e cultural em particular e as condições físicas, sociais e repro-
dutivas da mãe.

Apego adulto e História de Vida

O estilo de apego, construído na infância, possui mais de


um papel na vida adulta (“múltiplas vidas”, Del Giudice, 2009,
p.6). Ele funciona como modelo para relações interpessoais,
desde amizades e contatos profissionais, a relacionamentos
amorosos. O sistema de apego adulto é o resultado das diversas
experiências com as figuras de apego na infância e também de
novas experiências na adolescência e na vida adulta (“recalibra-
ção ontogenética”). Isto é, há espaço para modificações no estilo
de apego, mas isso depende do tipo de experiência, com maior
peso para eventos ocorridos na infância (Del Giudice, 2009).
A continuidade do estilo de apego faz parte de um siste-
ma maior, chamado “história de vida” (ou “ciclo de vida”).
Dele fazem parte características como idade na menarca,
idade da primeira relação sexual, idade ao ter o primeiro filho,
número de filhos, investimento parental, comportamento de
risco, estilo de apego, entre outras. A Teoria de História de Vida
é originária da Biologia e da Etologia, que integra esses vários
fatores e também a dimensão temporal. Os animais precisam
fazer escolhas em todas as etapas de vida, pois os recursos do

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4.2 Psicologia Evolucionista e algumas contribuições
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ambiente, como comida, água e parceiros sexuais, não costu-


mam estar disponíveis a todo o momento e de forma irrestrita
(Brumbach, Figueredo & Ellis, 2009; Del Giudice & Belsky, 2010;
Geary, 2006).
São várias as decisões a serem tomadas, por exemplo:
o organismo deve continuar se desenvolvendo (estratégia somá-
tica) ou deve se reproduzir? Deve ter poucos ou muitos filhos?
É importante ressaltar que o organismo não toma “decisões
conscientes”, essas características resultam do desenvolvimento
em certo ambiente, interno (celular, dentro do corpo) e externo.
Já discutimos dicotomia antes, mas é importante não pensar em
“genético ou ambiental”, mas sim em desenvolvimento proba-
bilístico. Estratégias não são herdadas, elas são construídas
e reavaliadas, apesar de possuírem estabilidade (Chisholm et
al., 1993; Del Giudice, 2009).
Há duas estratégias essenciais, a rápida (r) e a lenta (K).
Em ambientes com poucos e instáveis recursos (i. e.: escassez
de alimento e/ou água, condições precárias de saúde, falta de
abrigo), os organismos costumam se desenvolver mais rápido,
tendo menarca e filhos mais cedo. Um estilo de apego inseguro
é associado a essa estratégia, assim como menos investimento
parental, mais relacionamentos de curto prazo e maior conflito
marital (Belsky et al., 2007; por outro lado, para uma discussão
sobre contextos de risco e sociossexualidade, ver capítulo 3.4
neste livro, sobre relações interpessoais). Um ambiente com
poucos recursos desencadeia uma reação em cadeia: uma menor
alimentação materna se associa com um menor feto, por “espe-
rar” ao nascer menos recursos, e que tem um metabolismo mais
rápido. A menarca mais cedo, uma “escolha” pela estratégia
reprodutiva ao invés de somática, é um efeito de mudanças
hormonais que começa aos sete anos de idade, que dependem

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do sexo da criança, e que possuem efeitos duradouros nas estra-


tégias de vida. Isso é possível devido à plasticidade presente na
história de vida humana (Belsky et al., 2007; Del Giudice, 2009;
Del Giudice & Belsky, 2010). Menor responsividade e mais insta-
bilidade na infância (até os nove anos de idade), assim como
imprevisibilidade, estão associados com menor investimento
parental, e muitas vezes como consequência, um estilo de apego
inseguro, que se divide em evitativo e ansioso, como discutido
anteriormente. Essa não é uma proposição fatalista, ou seja,
“vai sempre acontecer assim”, mas sim probabilística (“há maior
chance de acontecer assim”), pois uma figura de apego mais
responsiva pode ser um fator de proteção.
Enquanto houver recursos associados ao cuidado e a
ali­­mentação, chamados fatores de proteção, uma estratégia
mais lenta é desenvolvida. Ela é caracterizada por maior
previsibilidade, maior harmonia familiar, estilo de apego seguro,
maior idade de menarca e do primeiro filho, menos filhos, mais
relacionamentos de longo prazo, e maior investimento parental
(Belsky, Steinberg & Draper, 1991).
Na “infância média” (7 a 11 anos) garotos costumam ter
estilo de apego mais inseguro-evitativo, enquanto as garotas
mostram-se mais ambivalentes (Belsky, Steinberg & Draper,
1991; Chisholm et al., 1993; Ripardo, 2011). Esta tendência se
mantém na adolescência e na vida adulta, diminuindo na meia
idade (Del Giudice, 2009). Não é possível dizer que o estilo de
apego seguro é mais saudável do que o inseguro, posto que
o estilo de apego adulto é uma resposta a características como
sexo e experiências infantis, que demandam tipos específicos
de comportamentos, necessários para a sobrevivência naquele
ambiente. Ein-Dor, Mikulincer, Doron e Shaver (2010) conside-
ram que mesmo os tipos de apego que parecem desvantajosos

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no nível individual podem apresentar vantagens quando


o nível grupal é considerado. Não há um julgamento moral sobre
“bom” ou “ruim”, mas adaptado ou não (Johow & Voland, 2014).
Na vida adulta o apego seguro está associado a relacio-
namentos de longo prazo, sendo uma estratégia “devagar”,
enquanto o estilo inseguro é comum nos relacionamentos de
curto prazo, sendo uma estratégia “rápida”. O estilo inseguro-
-evitativo também se correlaciona com promiscuidade, menor
comprometimento, e maior coerção sexual. Enquanto o esti-
lo inseguro-ambivalente se associa com dependência, imatu-
ridade, e facilidade para ceder à pressão do parceiro sexual.
É perceptível que estilos de apego diferentes se relacionam com
estilos de personalidade diferente, e isso se integra através
da história de vida (Brumbach, Figueredo & Ellis, 2009; Del
Giudice, 2009).
Há mais uma etapa de desenvolvimento que se utiliza do
estilo de apego e esta é a senescência (Resende, 2011). À medi-
da que o organismo envelhece, os comportamentos mudam,
resultado de aprendizagem e também de um contexto diferente.
O sistema de apego começa a ser ativado quando há perdas,
e no meio da vida adulta costuma-se perder as figuras de apego
infantil. O processo de luto depende do estilo de apego, sendo
que o estilo de apego inseguro está associado a mais problemas
emocionais, depressão e, em muitos casos, com adoecimento
e morte (Bogin, 2006).
A senescência está associada à infertilidade no caso das
fêmeas. De acordo com Hyrd (2001), os seres humanos foram
capazes de ter uma infância estendida por contarem com
o apoio de alocuidadores (cuidadores que não são os pais). Esses
podiam ser irmãos mais velhos, primos, tios e, especialmente,
avós. O papel da avó parece ter sido mais importante devido

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à certeza de compartilhamento genético (ver capítulo neste


mesmo livro) e também por ter capacidade física e experiência
para cuidar dos netos e alimentá-los, sem precisar se reprodu-
zir e amamentar, duas atividades que precisam de alta carga
energética (Bogin, 2006; Del Giudice, 2009).

Conclusões

O desenvolvimento humano é essencialmente um


processo interativo, no qual aspectos biológicos e culturais
constituem um amálgama no qual não se pode distinguir um
do outro. É possível ver que cada etapa do desenvolvimento
depende dos resultados da anterior, sendo mantido um fio
condutor que, em cada período específico, infância, adolescên-
cia, fase adulta, meia-idade e velhice, possibilita comportamen-
tos que podem ser entendidos como tentativas de se adaptar
aos diferentes contextos, por intermédio da plasticidade. Desde
cedo podem ser observadas em bebês capacidades que sugerem
um entendimento tanto do mundo físico quanto do mundo
social, e que os aspectos emocionais estão sempre presentes,
garantindo que o desenvolvimento se adapte às diversidades
culturais e ambientais.
Há diversos estudos que indicam competências dos
bebês, e isso coloca uma questão para refletirmos em que
medida a dimensão ontogenética do desenvolvimento deixa
um legado que pode ser incorporado pelo plano da filogênese.
Isso remete a um tema, a epigênese.
Finalmente, cumpre destacar que a importância de estu-
dar o desenvolvimento reside no fato de que ajuda a compreen-
der um pouco o que somos, buscando identificar e entender

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as etapas pela qual passamos, não porque se constituam em


quebras nesse processo, mas porque se parte da ideia de que
desenvolver-se é um eterno e contínuo transformar-se.

Questões para discussão

1. Qual foi a crítica recebida pela etologia sobre a ideia de


instinto que inicialmente defendia?

2. Como as capacidades cognitivas de recém-nascidos


contribuem para o debate natureza e cultura?

3. Qual é a importância do padrão de apego para entender


o desenvolvimento?

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