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PROTEÇÃO AO DENUNCIANTE E

TRATAMENTO DE DENÚNCIAS EM OUVIDORIA


O curso Proteção ao Denunciante e Tratamento de Denúncias em Ouvidoria foi desenvolvido
pela Ouvidoria-Geral da União, em parceria com a Escola Nacional de Administração Pública,
para integrar trilha de aprendizagem de Certificação em Ouvidoria no âmbito do Programa de
Formação Continuada em Ouvidoria (PROFOCO), com o intuito de introduzir os principais temas
de debate que envolvem os mecanismos de proteção a denunciantes no Poder Executivo federal
e o papel fundamental desempenhado pelas ouvidorias nesse contexto.

O conteúdo deste curso foi estruturado em 4 módulos, que buscarão apresentar o processo de
construção do atual sistema de proteção a denunciantes no Brasil, bem como os aspectos
práticos para o tratamento de denúncias:

Módulo 1: Quem é o denunciante e por que devemos protegê-lo?

Módulo 2: A construção do sistema de proteção ao denunciante no Brasil

Módulo 3: Recebimento de denúncias e proteção à identidade

Módulo 4: Análise prévia e habilitação de denúncias

Para mais informações sobre a Certificação em Ouvidoria, acesse: gov.br/ouvidorias

Desejamos a todos um ótimo curso!


SUMÁRIO MÓDULO 1 – OUVIDORIAS PÚBLICAS E DENÚNCIAS
BOAS-VINDAS............................... ................................................................................................. 3
MÓDULO I: Quem é o denunciante e por que devemos protegê-lo?........................................... 4
1. O papel da ouvidoria pública no tratamento da denúncia ............................................... 5
2. Quem é o denunciante? .................................................................................................... 6
3. O sistema de incentivo e proteção a denunciantes ........................................................ 12
4. Canais de denúncias e programas de integridade .......................................................... 16
MÓDULO II: A construção do sistema de proteção ao denunciante no Brasil........................... 19
1. A criação do sistema de proteção ao denunciante no brasil .......................................... 20
2. Criando a primeira linha de defesa do denunciante: a proteção à identidade .............. 20
3. Criando a segunda e a terceira linhas de defesa do denunciante e estabelecendo os
mecanismos de incentivo à denúncia ................................................................................. 27
MÓDULO III: O recebimento de denúncias e a proteção ao denunciante.................................. 33
1. O papel da ouvidoria ....................................................................................................... 34
2. Recebendo uma denúncia ............................................................................................... 36
3. Denúncias de retaliação .................................................................................................. 41
4. Características básicas das denúncias ............................................................................. 42
5. Revisão do módulo ....................................................................................................... 46
MÓDULO IV: A análise prévia ...................................................................................................... 48
1. Análise prévia .................................................................................................................. 49
2. Órgãos e unidades apuratórias ....................................................................................... 61
3. Revisão do Módulo .......................................................................................................... 64
Referências bibliográficas ........................................................................................................... 67
BOAS-VINDAS
Sejam bem-vindos ao curso Proteção ao Denunciante e Tratamento de Denúncias em Ouvidoria.

Este curso, composto por quatro módulos, é parte do Programa de Formação Continuada em
Ouvidoria, promovido pela Ouvidoria-Geral da União, e compõe a trilha de aprendizagem de
Certificação em Ouvidoria Pública.

Este é um curso destinado a pessoas em qualquer nível de conhecimento.

Abarcamos desde noções mais básicas e simples, para os iniciantes no mundo das ouvidorias ou
da proteção a denunciantes, a discussões novas ou mais aprofundadas, destinadas a quem
deseja provocar mudanças e inovações nos serviços em que atue.

Esperamos que aproveite o curso e, caso deseje, entre em contato com a equipe da Ouvidoria-
Geral da União para aprofundarmos nossas discussões por meio dos grupos de trabalhos e
projetos conjuntos realizados pela Rede Nacional de Ouvidorias
(https://www.gov.br/ouvidorias/pt-br/ouvidorias/rede-de-ouvidorias)
MÓDULO I: Quem é o denunciante e
por que devemos protegê-lo?
Olá, neste módulo aprenderemos conceitos importantes que nos auxiliarão a compreender o
conceito de denunciante e distingui-lo de outros conceitos a ele muitas vezes relacionados. Além
disso, entendermos como funciona a estrutura básica de um sistema de incentivo e proteção ao
denunciante, bem como o papel fundamental da denúncia para as políticas de integridade.

Bora começar?
1. O papel da ouvidoria pública no
tratamento da denúncia
As ouvidorias públicas são instâncias de participação e controle social, essenciais à democracia,
responsáveis por interagir com os usuários dos serviços públicos, com o objetivo de aprimorar a
gestão pública e melhorar os serviços oferecidos.

As ouvidorias possuem três funções principais:

(a) A primeira função da ouvidoria, principalmente prevista nos artigos art. 13 e 14 da


Lei nº 13.460/2017, é acolher e receber as manifestações de usuários de serviços
públicos, tais como reclamações, sugestões, solicitações e elogios, além de receber
as denúncias relacionadas a eventuais irregularidades cometidas por agentes
públicos, e, muitas vezes, ser também responsável pelos pedidos de acesso à
informação e requerimentos relacionados à proteção de dados pessoais.
(b) A segunda função da ouvidoria é a de promover a melhoria da gestão pública. Ao
servir como canal de contato direto entre a Administração Pública e as pessoas que
buscam garantir direitos junto ao Estado, a ouvidoria ocupa uma posição estratégica
na administração pública. Esta posição lhe permite detectar falhas na prestação de
serviços e na execução de políticas públicas, apoiando o processo de desenho e
redesenho de serviços e melhoria da gestão. Para exercer esta função, a ouvidoria
deve processar as informações obtidas por meio das manifestações recebidas e das
pesquisas de satisfação realizadas com a finalidade de avaliar os serviços públicos
prestados, inclusive sobre o cumprimento dos compromissos e dos padrões de
qualidade de atendimento da Carta de Serviços ao Usuário, de que trata o art. 7º da
Lei nº 13.460/2017, dentre outras competências previstas no art. 14, II, e 15 desta
Lei; e
(c) A terceira função da ouvidoria diz respeito ao seu papel como canal de recebimento
de denúncias sobre irregularidades cometidas por agentes públicos, que podem ser
realizadas tanto por usuários de serviços públicos, como por agentes públicos. Ao
receber uma denúncia, a ouvidoria adota os procedimentos necessários para
garantir a segurança do denunciante, e realiza uma análise prévia, a fim de avaliar
se ela contém os requisitos mínimos de autoria, materialidade dos fatos e presença
de indícios necessários para ser encaminhada às áreas de apuração. Esta função é
fundamental para a implementação de uma política de integridade pública. Cabe à
ouvidoria, portanto, oferecer um ambiente seguro e promover a confiança da
sociedade e dos agentes públicos em seu órgão ou instituição para o recebimento
de denúncias.

Caso tenha interesse em se aprofundar mais na primeira e na segunda funções, recomendamos


fazer o curso “Serviços Públicos e Defesa dos Usuários”.

Este curso se dedica a apresentar detalhadamente a terceira função da ouvidoria – de


recebimento e tratamento das denúncias sob a perspectiva dos direitos denunciantes.
2. Quem é o denunciante?
Em nosso dia a dia é muito comum ouvirmos que o denunciante é figura central para o combate
à corrupção e que, por isso, ele precisa ser protegido pela Administração. No entanto, muitas
vezes enfrentamos dificuldades em identificá-lo. Ora, se o denunciante, pelo simples fato de ser
um denunciante, passa a ter direitos perante a Administração, nossa capacidade de identificá-
lo como tal está diretamente relacionada à nossa capacidade de garantir-lhe esses direitos.

O sujeito de direitos do nosso curso é o denunciante. Mas, afinal, quem é que pode ser
considerado denunciante?

Para começarmos a nossa conversa, é importante que alguns conceitos estejam bem claros, e
que alguns termos, muitas vezes confundidos entre si, sejam corretamente distinguidos.

2.1. Denunciante, Reportante e Informante


O termo denunciante faz parte do vocabulário da língua portuguesa desde os seus primórdios:
oriundo do latim denuntiare, que levou a variantes em espanhol e em alemão, o termo
expressava o ato de levar uma informação relevante a uma autoridade: -de (de baixo para cima)
-nuntius (mensageiro).

Ao longo do tempo, as dinâmicas e tensões entre sociedade e autoridades públicas levou a que
em alguns países o termo ganhasse uma conotação pejorativa, que, no português brasileiro, foi
absorvido por expressões bastante conhecidas tais como dedo-duro, X-9 ou cagueta. Tais
expressões revelam um dos grandes desafios que a administração pública enfrenta abordar o
tema de denúncia: o desestímulo que muitas vezes preconceitos e práticas culturais acabam
provocando junto àquelas pessoas que poderiam contatar as autoridades a fim de relatar
irregularidades de que tenham conhecimento.

Denunciar é o ato de levar uma informação acerca de ilícito ou irregularidade a autoridade


competente para apurar o fato e adotar as providências necessárias para fazê-lo cessar e
eventualmente reparar os danos dele oriundos. O denunciante, portanto, é o indivíduo que, por
razões específicas de seu contexto social, tem acesso a informações que o Estado não possui, e
que a ele as reporta.

Por mais lícita que seja a ação de denunciar, sobre ela repousa uma série de estigmas, muitas
vezes relacionados à ideia de quebra de confiança aos seus pares – que lhe confiaram a
informação. Como resultado, não raro, denunciantes acabam por sofrer retaliações das mais
diversas formas: desde o descrédito junto a pessoas a seu entorno até situações mais graves
que podem repercutir na sua integridade física.

Em função disso, parte da literatura especializada no tema passou a utilizar o termo


“informante”, que por sua vez foi criado como uma tentativa de tradução da expressão da língua
inglesa “whistleblower”, ou seja, aquele que assopra o apito: whistle (apito) + blower
(assoprador). Utiliza-se internacionalmente esta expressão para fazer referência àqueles que
denunciam um ato ilícito ou irregular, por analogia com os antigos policiais ingleses que
assopravam o apito para advertir a presença de um possível infrator da lei. Da mesma forma,
“reportante” também surge mais recentemente na doutrina nacional como uma tentativa de
tradução da expressão inglesa.

Como os debates acadêmicos muitas vezes buscam definir tanto informante como reportante
com conjunto extenso de qualificadoras (tipo de ilícito, qualidade da denúncia, forma de
colaboração com a autoridade investigadora, dentre outros), e como em nosso curso trataremos
dos direitos que a Lei assegura a quem oferece a denúncia, utilizamos o termo mais garantista
e abrangente “denunciante”, o qual podemos definir, de acordo com o marco normativo
brasileiro atual, como:

Pessoa física ou jurídica que relata às autoridades competentes informações sobre crimes
contra a administração pública, ilícitos administrativos ou quaisquer ações ou omissões lesivas
ao interesse público.

É importante ressaltar que essa definição não abarca alguns casos muitas vezes identificados
como whistleblowing, visto que este último conceito compreende também a ação de levar tais
crimes ou ilícitos ao conhecimento público, não necessariamente a autoridades públicas. Por
essa razão, por exemplo, o conceito de denunciante que a lei nos traz no Brasil não abrangeria
casos como o famoso Edward Snowden, analista de dados que divulgou à imprensa detalhes das
ações de vigilância realizados pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos. No Brasil,
tal caso seria discutido não nos termos de direitos de denunciantes, mas sim nos termos do
direito de liberdade de expressão.

2.2. Diferenças Entre o Denunciante, o Colaborador,


a Testemunha e a Vítima
O denunciante é a pessoa física ou jurídica que relata às autoridades competentes informações
sobre crimes contra a administração pública, ilícitos administrativos ou quaisquer ações ou
omissões lesivas ao interesse público. O denunciante, portanto, é a pessoa que soa o alerta a
fim de que a Administração tome providências; assim, geralmente, ele não integra o processo
de apuração decorrente da denúncia. Há, no entanto, exceções:

a. Quando este denunciante é o próprio lesado pelo fato narrado, ele será caracterizado
também como a vítima, podendo integrar o processo de apuração nessa condição;

b. Quando o denunciante é uma pessoa estranha ao feito, ou seja, que dele não tenha
participado quer como um dos autores, quer como vítima, e é chamado pela autoridade
que conduz o processo a fim de que possa prestar informações e, desse modo, produzir
provas, ele será considerado também como uma testemunha. A testemunha, portanto,
é um sujeito que contribui com a apuração por informações que detém seja por ter
presenciado o fato, por ter alguma informação sobre ele, ou por ter sido citada ou
indicada por outra testemunha. Ela é um sujeito “estranho” aos agentes de apuração da
denúncia, não é o acusado, nem é a vítima, tampouco poderá ser membro da comissão
de apuração e da autoridade instauradora/julgadora; e

c. Quando o denunciante é coautor de infração penal praticada e voluntariamente


colabora com a investigação em processo criminal, trazendo informações relevantes,
ele poderá ser considerado, também, como colaborador, sendo, portanto, parte no
processo, caso preenchidos os requisitos da Lei nº 12.850/2013, que cria o instrumento
da colaboração premiada.

2.3. Tipos de manifestações: como reconhecer uma


denúncia
Para compreender bem o que é uma denúncia e por que a ouvidoria deve proteger o
denunciante, você precisa conhecer e identificar os tipos diferentes de manifestações de que
trata a Lei nº 13.460/2017.

A Emenda Constitucional nº 19 alterou a Constituição Federal para dispor sobre as formas de


participação dos usuários na Administração Pública, elencando dentre tais formas a
possibilidade de formular reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral (art.
37, § 3º, I) e denúncias contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função
na administração pública (art. 37, § 3º, III).

A Lei nº 13.460/2017 definiu as manifestações dos usuários como reclamações, denúncias,


sugestões, elogios e demais pronunciamentos que tenham como objeto a prestação de serviços
públicos e a conduta de agentes públicos na prestação e fiscalização de tais serviços. O Decreto
nº 10.153/2019, considerou como denúncia, também, o relato de informações sobre crimes
contra a administração pública, ilícitos administrativos ou quaisquer ações ou omissões lesivas
ao interesse público a que se refere a Lei nº 13.608/2018.

O Decreto nº 9.492/2018, que regulamenta a Lei nº 13.460/2017 para a Administração Pública


federal, conceitua cinco tipos de manifestação: reclamação, denúncia, elogio, sugestão e
solicitação de providências.

Vamos detalhar cada um dos Tipos de Manifestações de Ouvidoria e exemplos para facilitar a
sua compreensão:

➢ Reclamação:

Demonstração de insatisfação relativa à prestação de serviço público e à conduta de agentes


públicos na prestação e na fiscalização desse serviço, como a falta de respeito durante um
atendimento. Nesta categoria se enquadram também as críticas e as opiniões desfavoráveis à
administração pública, a seus processos, suas atividades, sistemas ou a algum de seus agentes.

Exemplo de reclamação:

Estou tentando acessar o site do Ministério XYZ e não consigo, pois a página que preciso não
abre. Quero dar entrada no meu pedido XX, já tem uma semana que estou tentando e não
funciona.

➢ Elogio:
Demonstração de reconhecimento ou satisfação sobre o serviço oferecido ou atendimento
recebido.

Exemplo de elogio:

Olá, gostaria de parabenizar o órgão XX pelos resultados das pesquisas científicas divulgados
recentemente na revista ABCD. É mais tecnologia de ponta sendo desenvolvida no nosso país.
Tive a oportunidade de conhecer alguns pessoalmente no evento realizado em São Paulo, e
estendo meus cumprimentos a todos os envolvidos.

➢ Sugestão:

Apresentação de ideia ou formulação de proposta de aprimoramento de políticas e serviços


prestados pela Administração Pública.

Exemplo de sugestão:

As videoconferências e gravações são muito comuns no governo e na iniciativa privada. Nesse


raciocínio e com ênfase na transparência, não tenho percebido videoconferências ou vídeos de
reuniões de processos licitatórios realizados pela União, sobretudo daquelas com valores
relevantes (posso estar errado). Assim, com base nos elementos citados acima, proponho a esse
órgão que adote medidas com vistas a possibilitar a implementação de teleconferência pública
de reuniões de habilitação e julgamento de licitação, sobretudo daquelas que apresentam
valores relevantes, ampliando o acesso aos cidadãos e incrementando o controle social.

➢ Solicitação de providências:

Pedido para adoção de providências por parte da Administração. A solicitação refere-se a um


requerimento de atendimento ou serviço que ainda não tenha sido desenhado de forma
padronizada. Pode ser utilizada inclusive para comunicar problemas, como no caso em que o
usuário comunica a falta de um medicamento e requer a solução do problema.

Exemplo de solicitação de providências:

Gostaria de saber como faço para solicitar verbas federais para entidades. Sou assistente social
e trabalho em uma entidade no município XX.

A casa de entidades chama-se XXX, abriga e acolhe pessoas de todo município e de cidades
vizinhas que vêm realizar consultas, exames e cirurgias, e não tem condições de custear suas
despesas, nem possuem familiares no município.

➢ Denúncia:

Ato que informa a prática de irregularidade ou de ilícito cuja solução dependa da atuação dos
órgãos apuratórios competentes. A denúncia envolve infrações disciplinares, crimes, prática de
atos de corrupção, má utilização de recursos públicos ou improbidade administrativa que
venham ferir a ética e a legislação, bem como as violações de direitos, mesmo que ocorridas em
âmbito privado. A investigação e repressão a esses atos ilícitos dependem da atuação dos órgãos
de apuração, a exemplo das auditorias, corregedorias, comissões de ética, controladorias,
tribunais de contas, órgãos policiais e Ministério Público. As peculiaridades deste tipo de
manifestação serão apresentadas nos módulos seguintes deste curso.

Veja esse exemplo de denúncia:

Venho por meio desta denunciar o que está acontecendo a respeito do convênio firmado entre
o Governo Federal e a prefeitura do município de XX.

Ele tinha e tem como objetivo a readequação da estrada que dá acesso à região X, o que não
aconteceu em sua totalidade, pois a obra está inacabada. Não aguentamos mais ver o dinheiro
público indo pelo ralo, há partes da estrada que nem foi tocada (areia). Encaminho as fotos que
tirei das irregularidades apontadas.

Observa-se, que os repasses foram feitos conforme o portal da transparência comprova:

Número do Convênio SIAFI: XX

Situação: Em Execução

Nº Original: XX/XXXX

Objeto do Convênio: Adequação de estradas vicinais no município X

Valor Convênio: XXXXXXXX

Valor Liberado*: XXXXXXX

2.4. Comunicação de Irregularidade


As comunicações de irregularidade, descritas no art. 23, § 2º, do Decreto federal nº 9.492/2018,
são informações de origem anônima que comunicam irregularidade com indícios mínimos de
relevância, autoria e materialidade.

Como a Lei nº 13.460/2017 considera como manifestação apenas aquela que contenha a
identificação de seu autor, não englobando nesse conceito, portanto, a denúncia anônima, as
comunicações de irregularidade recebem tratamento que se distingue daquele dado às
denúncias pelo fato de não serem passíveis de acompanhamento pelo seu autor, justamente
porque ele optou por não se identificar. As comunicações de irregularidade servem para auxiliar
a detecção e a correção de irregularidades. Nesse sentido, havendo razoabilidade mínima no
conteúdo narrado e documentos de comprovação ou informações que possibilitem a análise e
a apuração dos fatos, as comunicações devem ser recebidas e, após análise prévia pela
ouvidoria, enviadas ao órgão ou entidade competente para sua apuração.

É importante ressaltar que a jurisprudência dos tribunais superiores é unânime ao considerar


que a denúncia anônima não é meio hábil para sustentar, por si, a instauração de um
procedimento de responsabilização. Veja bem: tais decisões não vedam a investigação e a coleta
de provas relacionados a fatos narrados em tais denúncias – apenas vedam que estas sejam as
únicas informações que embasem o procedimento. Por isso mesmo, em um cenário ainda de
falta de confiança nas instituições, e dado o risco muitas vezes existente para os denunciantes,
a comunicação de irregularidade é, muitas vezes, a única forma pela qual as autoridades
competentes conseguem ter acesso às informações necessárias para tomar medidas destinadas
à apuração dos fatos relacionados a crimes e irregularidades de toda sorte.
Exemplo de comunicação de irregularidade:

Quero denunciar que o servidor XXXXX está cobrando uma “taxa extra” para emitir a certidão
para a minha empresa. Ele diz que é para ajudar a acelerar o processo, mas sei que se eu não
passar o valor que ele quer minha certidão não vai sair nunca. Conversei com outros empresários
que estão em situação igual a minha e ele está fazendo a mesma coisa com todos. A gente já
paga tanto imposto e pra ter um serviço público ainda temos que ficar pagando por fora. É só
chamar todos os que pediram a certidão que eles vão confirmar. Não posso me identificar pois
com certeza ele vai me retaliar e aí que nunca vou ter a certidão.

Veja abaixo as principais diferenças entre denúncia e comunicação de irregularidade:

DENÚNCIA COMUNICAÇÃO DE IRREGULARIDADE


Possui a identificação do autor Não possui a identificação do autor
É uma manifestação de ouvidoria, nos termos Não é uma manifestação de ouvidoria, nos
da Lei nº 13.460/2017 termos da Lei nº 13.460/2017, sendo tratada
como informação coletada
O autor pode acompanhar a sua tramitação O autor não pode acompanhar a sua
na ouvidoria, tendo acesso à resposta tramitação na ouvidoria, nem ter acesso à
conclusiva. resposta conclusiva.
Pode, por si só, dar início a um procedimento Não pode, por si só, dar início a um
de apuração. procedimento de apuração.

2.5. Representação
A “representação”, ou “representação funcional” ocorre quando o agente público relata uma
irregularidade no exercício de uma competência ou de um dever funcional. Uma autoridade
pública que dá ciência a outra autoridade com competência para instauração de procedimento
apuratório está, portanto, apresentando uma representação.

No caso dos servidores públicos, o dever de representação é comumente previsto nos seus
estatutos. No caso dos servidores públicos federais, a representação acerca de irregularidades
é um dever funcional, tratado do art. 116, VI, XII e parágrafo único da Lei nº 8.112/90.
Disposições semelhantes são frequentemente encontradas nos Estatutos de Servidores de
Estados e Municípios.
Se no primeiro tipo de representação o seu recebimento costuma atender às normas
protocolares de comunicação entre autoridades, no segundo caso (o caso dos servidores),
algumas circunstâncias necessitam ser observadas, visto que o dever funcional de representação
diz respeito ao uso do canal hierárquico para a comunicação de irregularidade. Ou seja, em vez
do uso do canal de ouvidoria, o servidor deveria comunicar ao seu superior hierárquico a
ilegalidade ou irregularidade de que tenha tido conhecimento.

Essa obrigação, tal como prevista na Lei, causava algumas situações bastante complicadas. Veja-
se, por exemplo, o caso de o superior hierárquico estar, ele mesmo, envolvido na irregularidade
ou ilegalidade objeto da representação. Como deveria proceder o servidor em tais
circunstâncias?

Tendo isso em vista, a Lei de Acesso à Informação (LAI), alterou esse dispositivo da Lei nº
8.112/90 a fim de que, alternativamente, o servidor pudesse comunicar a irregularidade a
autoridade com competência para apuração do fato.
2.6. Notícia Crime
Muitas vezes o termo denúncia abrange o conceito de notícia crime, ou notitia criminis. A notícia
crime é a forma por meio da qual a autoridade policial toma conhecimento de um fato
criminoso. Ela costuma ser classificada em “notícia crime de cognição imediata”, quando o
conhecimento sobre o fato criminoso vem em decorrência das atividades policiais rotineiras, e
em “notícia crime de cognição mediata”, quando a informação sobre o fato criminoso chega à
autoridade policial por meio de um boletim de ocorrência ou por meio de uma denúncia. A
denúncia, desse modo, é a forma como qualquer pessoa pode realizar o que prevê o §3º do art.
5º do Código de Processo Penal:

§ 3o Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que
caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta,
verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito.

Acontece que o nosso conceito de denúncia é apenas parcialmente coincidente com o conceito
de notícia crime. Isso porque ele apenas envolve os crimes contra a administração pública, não
abarcando outros tipos penais que não se enquadram nessa categoria, como crimes contra a
vida, meio ambiente e saúde pública, por exemplo.

Nesses últimos casos, o recebimento e apuração de tais crimes está diretamente relacionado à
prestação de serviço relacionado a segurança pública. Se você já estudou o curso “Serviços
Públicos e Defesa dos Usuários”, deverá recordar que parte da doutrina do Direito
Administrativo não considera a segurança pública como um serviço público, visto que ela não
seria “ampliativa de direitos dos usuários”. No entanto, como vimos naquele curso, o conceito
de serviço público da Lei nº 13.460/2017, é considerado amplíssimo, abarcando também o
serviço de segurança pública.

Bom, caso você esteja se perguntando: - Afinal de contas, para que essa distinção é relevante?
A resposta é simples: enquanto as notícias crime relacionadas aos crimes contra a administração
pública podem e devem ser recebidas nas ouvidorias, o recebimento das demais notícias crime
compõem parte dos serviços prestados pelos órgãos de segurança pública, devendo ser
encaminhados diretamente a eles ou recebidos por canais específicos estabelecidos no desenho
desses serviços.

Lembre-se: ouvidorias, a princípio, não são prestadoras de serviços; elas são, sim, instâncias de
pós serviço.

3. O sistema de incentivo e proteção a


denunciantes
O denunciante é sujeito essencial para a garantia da transparência, para a promoção da
integridade, para o combate à corrupção e para melhoria da gestão pública.
Segundo relatório da Organização para Desenvolvimento Econômico (OCDE) “Comprometendo-
se com a proteção efetiva de denunciantes”, publicado em 2016,

a proteção do denunciante consiste na última linha de defesa para a garantia do interesse


público, [...] contribuindo para um ambiente de confiança e tolerância e melhorando a
capacidade de resposta dos países às ações que atentam ao interesse público.

De fato, para muitos autores, a prática de denunciar está associada à existência de estruturas
institucionais e à percepção de existência de canais que promovem justiça organizacional
(Trevino, 2001).1 Alguns desses estudos afirmam que a decisão de denunciar é realizada com
base em uma análise custo-benefício, e que portanto a criação de estruturas institucionais que
diminuam os custos de retaliações, ameaças e danos aumenta a frequência e possibilidade de
denunciar (Alleyne, 2017).2 Lewis et al (2007)3 afirmam que a existência de um sistema de
proteção a informantes que seja claramente visível pode aliviar a pressão sentida por
informantes e incentivá-los a utilizar esse sistema. Nesse mesmo sentido são as conclusões de
Lee et al (2013).4 Lewis (2007) também demonstrou, ainda, que a existência de leis e regulações
nacionais possuem um papel decisivo na promoção de denúncias.

Assim, as medidas administrativas de proteção ao denunciante são contrapartidas necessárias


frente às campanhas de incentivo que o Estado realiza para que as pessoas realizem denúncias
e outras manifestações. Agências estatais incentivam a realização de manifestações fazem uso
das informações que lhes são encaminhadas por meio de manifestações, pois essas
manifestações podem ser traduzidas em informações que subsidiam processos de melhoria de
políticas públicas.

Esse sistema em que os cidadãos participam como cogestores do processo de elaboração,


implementação e avaliação de políticas públicas se baseia na proteção da confiança, isto é, no
pressuposto de que a colaboração com o Estado deve ser protegida e acolhida.

Mas, afinal, no que consiste um sistema de proteção a denunciantes?

Um sistema de proteção a denunciante costuma ser composto por dois pilares principais:
incentivo e proteção.

3.1. Incentivo ao denunciante


Como visto, o ato de denunciar envolve a avaliação de uma série de riscos por parte do
denunciante, os quais muitas vezes são colocados em uma relação de custo-benefício. Ora, do

1
Treviño, L.K. and Weaver, G.R. (2001) Organizational Justice and Ethics Program “Follow-Through”:
Influences on Employees’ Harmful and Helpful Behavior. Busi-ness Ethics Quarterly, 11, 651-671.
https://doi.org/10.2307/3857765
2
Alleyne, P., Charles-Soverall, W., Broome, T. and Pierce, A. (2017) Perceptions, Predictors and
Consequences of Whistleblowing among Accounting Employees in Barbados. Meditari Accountancy
Research, 25, MEDAR-09-2016-0080. https://doi.org/10.1108/MEDAR-09-2016-0080
3
Lewis, D. (2007) A Survey of Whistleblowing/Confidential Reporting Procedures Used by Persons
Disclosure Act 1998. Communications Law, 12, 124-130.
4
Lee, G. and Fargher, N. (2013) Companies’ Use of Whistle-Blowing to Detect Fraud: An Examination of
Corporate Whistle-Blowing Policies. Journal of Business Ethics, 114, 283-295.
https://doi.org/10.1007/s10551-012-1348-9
lado do benefício, restaria ao autor da denúncia a satisfação de vê-la adequadamente apurada,
com a aplicação da sanção aos denunciados e a reparação dos danos por eles causados. Em
muitos casos, também, quando o denunciante é vítima direta ou indireta do ato objeto da
denúncia, esta reparação pode, inclusive, repercutir positivamente e diretamente sobre a sua
vida. Veja-se, por exemplo, o caso em que uma empresa perde uma licitação e denuncia a
existência de fraude à licitação; ou quando um ato de assédio moral é identificado graças à ação
da pessoa assediada, e o assediador é adequadamente responsabilizado e punido.

Já do lado do custo, o denunciante terá muito provavelmente o tempo dispendido em


denunciar, o esforço de produzir uma narrativa para explicar a denúncia e eventualmente
coletar evidências e, ainda, o risco de sofrer eventual retaliação. Esta percepção de risco varia
muito de acordo com a pessoa que realiza a denúncia e o contexto em que ela se insere. Quanto
maior a confiança do denunciante na instituição para a qual realiza a denúncia, menor tende a
ser a percepção de risco; de outro lado, muitas vezes quanto maior a percepção de gravidade
do fato, ou quanto maior o poder do agente denunciado, maior tende a ser a percepção do risco
envolvendo o ato de denunciar.

Para muitas pessoas, essa relação de custo-benefício pode parecer desequilibrada, trazendo
mais custos reais e menos expectativas de benefícios. Diante desse cenário, poucas pessoas
estariam encorajadas a denunciar. Denunciar seria um mau negócio.

Assim, quando tratamos de incentivo à denúncia costumamos partir de dois estímulos muito
importantes:

1. Geração de cultura institucional ética e íntegra, de modo a aumentar a confiança nos


instrumentos de proteção contra retaliação e de responsabilização de agentes que
cometam atos irregulares ou ilícitos, por meio de ações de comunicação e transparência
dos processos.
2. Adoção de mecanismos de recompensa para o denunciante que relatar informação útil
a detecção e apuração de atos de irregulares ou ilícitos. Tais recompensas podem
ocorrer de formas diversas, como por exemplo a solicitação de proteções preventivas,
mas normalmente são fixadas em valores pecuniários proporcionais aos valores
recuperados aos cofres públicos por meio do processo de responsabilização.

3.2. Proteção ao denunciante


A existência de mecanismos adequados para a proteção a denunciantes constitui importante
fator para melhorar a relação de custo-benefício do ato de fazer a denúncia. Isso porque eles
têm o papel de mitigar os riscos de retaliação e, em estes se materializando, reparar os danos
sofridos pelo denunciante.

Os mecanismos de proteção a denunciantes se organizam em três linhas de defesa que se


sucedem: assim, quando uma falha, a outra entra em operação. No modelo brasileiro, a primeira
linha tem natureza preventiva, ao passo que a segunda e a terceira possuem, de forma geral,
natureza reativa. Vejamos quais são elas:
3.2.1. Primeira linha de defesa: Proteção da identidade do
denunciante
A primeira linha de defesa, que precisa abranger toda e qualquer pessoa que realiza uma
denúncia à Administração Pública, é a proteção da identidade do denunciante.

Aqui, o critério para considerar o indivíduo como denunciante se relaciona diretamente é


objetivo, isso é, não se olha para o objeto da denúncia, ou a qualidade das informações
prestadas, mas sim para o ato do sujeito que voluntariamente oferece a informação à
Administração Pública. A proteção à identidade deve ser garantida a toda e qualquer pessoa que
realize uma denúncia pelos meios adequados.

Para que isso seja possível, o sistema de proteção deve considerar a existência de canais de
recebimento de denúncias centralizados, a fim de evitar que a identidade do denunciante se
torne informação compartilhada por pessoas que não atuem nem no canal de recebimento nem
na unidade com competência para a apuração do fato relatado. No Brasil, no âmbito do Poder
Executivo federal, o canal de recebimento de denúncias é centralizado nas Ouvidorias Públicas
por força dos Decretos nos. 9.492/18 e 10.153/19.

Outro importante pressuposto para uma efetiva proteção da identidade do denunciante é a


existência de regras claras e transparentes de compartilhamento dos dados entre ouvidorias
distintas e destes com as unidades com competência apuratória, além, é claro, de instrumentos
de gestão de informação e de processos que tenham os controles adequados para a realização
dessas operações.

3.2.2. Segunda linha de defesa: proteção contra retaliações


Quando a identidade de um denunciante se torna pública ou quando ela é acessada por pessoa
diretamente interessada no fato denunciado, o denunciante poderá estar sujeito a ato de
retaliação; isso é, ato destinado a prejudicá-lo, quer profissionalmente, economicamente, em
sua vida privada ou, em casos mais graves, atentando contra a sua integridade física. A legislação
brasileira, ao enumerar exemplificativamente os tipos de ações de retaliação, cita:

a) demissão arbitrária;
b) alteração injustificada de funções ou atribuições;
c) imposição de sanções, de prejuízos remuneratórios ou materiais de qualquer espécie;
d) retirada de benefícios, diretos ou indiretos;
e) negativa de fornecimento de referências profissionais positivas.

Em tais circunstâncias, é imprescindível que o denunciante possa contar com o apoio


institucional necessário para fazer cessar o ato de retaliação.

De modo geral, para além da criação de uma cultura de integridade institucional, poucas são as
medidas preventivas que podem ser adotadas no caso concreto para evitar eventual retaliação
sem que, ao fazê-lo, a própria identidade do denunciante seja revelada. Digamos que você avise
à chefia do denunciante que ela não poderá alterar as suas funções ou removê-lo de ofício por
dado período. Na prática, ao fazê-lo estaríamos indicando a um possível retaliador que ele
estaria impedido de realizar ações de retaliação sobre determinado indivíduo, expondo, assim,
a identidade do denunciante.
Por isso, essa linha de defesa tem característica reativa, sendo ideal que o órgão ou entidade
responsável por receber a denúncia de retaliação e apurá-la seja distinto daquele onde a
retaliação ocorre, visto que, de modo geral, a retaliação só poderia ocorrer se o órgão houvesse
falhado na manutenção da primeira linha de defesa.

3.2.3. Terceira linha de defesa: Reparação por danos decorrentes


de retaliações
A terceira linha de defesa deve considerar a possibilidade de reparação rápida dos danos
decorrentes de eventual retaliação. Muitas vezes, essa reparação pode ocorrer ainda no
processo apuratório da denúncia de retaliação, quando, por exemplo, a autoridade responsável
pela apuração determinar que algum ato que causaria dano ao denunciante seja tornado sem
efeito antes da conclusão do processo. Em outras situações, quando a reparação tiver natureza
pecuniária, ela decorrerá da responsabilização do agente responsável pela retaliação.

4. Canais de denúncias e programas de


integridade
Nos últimos anos surgiram diversas normas que obrigam instituições a criar canais para receber
denúncias. A criação desses canais é parte importante dos programas de integridade, que têm
a finalidade de promover a criação de métodos capazes de prevenir atos de corrupção, dando
mais segurança aos dirigentes de empresas, fornecedores, empregados, reguladores e políticos.

Mas, afinal, o que é integridade? E por que ela é tão importante? Integridade pública deve ser
entendida como o conjunto de arranjos institucionais que visam a fazer com que a
Administração Pública não se desvie de seu objetivo principal: entregar os resultados esperados
pela população de forma adequada, imparcial e eficiente.

No Brasil, órgãos e entidades públicas têm trabalhado na construção e aperfeiçoamento de


políticas e mecanismos de integridade. Nesse processo, estão fortalecendo estruturas que já
eram utilizadas na prevenção e combate à corrupção, como ouvidorias, comissões de ética,
auditorias internas e corregedorias. Também estão atuando no gerenciamento dos riscos para
a integridade relacionados a suas atividades e no fortalecimento da cultura de integridade na
organização.

No âmbito do Poder Executivo Federal, a Controladoria-Geral da União (CGU) é o órgão central


de integridade, responsável por coordenar e disciplinar as atividades relacionadas à promoção
da integridade pública. A CGU atua em diversas frentes para cumprir essa competência, fazendo
a interlocução com os órgãos, promovendo capacitações, publicando material informativo e
normativos referentes ao assunto.

Um importante marco nessa área é a edição do Decreto nº 9.203/2017, que institui a Política de
Governança da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
O Decreto estabelece mecanismos de liderança, estratégia e controle para avaliar, direcionar e
monitorar a gestão, com vistas à condução de políticas públicas e a melhor prestação de serviços
à sociedade. O normativo também elenca diretrizes para aumentar a eficiência do setor público,
baseado em princípios como capacidade de resposta; integridade; confiabilidade; melhoria
regulatória; prestação de contas e responsabilidade; e transparência.

O Decreto dispõe que a CGU deve estabelecer os procedimentos necessários à estruturação, à


execução e ao monitoramento dos programas de integridade dos órgãos e das entidades da
Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.

O resultado almejado com a Política de Governança é aumentar a qualidade da gestão pública


e a excelência na prestação de serviços. Nesse sentido, a CGU também é responsável pela
condução de ações estratégicas que reduzam insucessos e desvios no âmbito do Poder Executivo
Federal, a fim de garantir uma execução ordenada, ética, econômica, eficiente e eficaz.

Uma das principais atuações da CGU é o monitoramento, junto à alta administração dos órgãos
e entidades, de medidas de criação, manutenção e aprimoramento dos sistemas de gestão de
riscos e integridade.

Em janeiro de 2019, a CGU publicou a Portaria nº 57/2019 (alterando a Portaria nº 1.089/2018),


para regulamentar o Decreto nº 9.203/2017 e estabelecer procedimentos para estruturação,
execução e monitoramento de programas de integridade em órgãos e entidades do Governo
Federal (ministérios, autarquias e fundações públicas).  

A regulamentação definiu diretrizes, etapas e prazos para que os órgãos federais criassem os
próprios programas, com mecanismos para prevenir, detectar, remediar e punir fraudes e atos
de corrupção. Os planos de integridade são obrigatórios e devem ser apresentados por todos os
órgãos alcançados pelos normativos.
Uma das principais diretrizes da Portaria CGU nº 57/2019. é a criação de unidades ou atribuição
às unidades já existentes das competências correspondentes tratamento de denúncias,
observado, no mínimo, o disposto no Decreto nº 9.492, de 5 de setembro de 2018, na Lei nº
13.460 de 26 de junho de 2017.

Já no caso de denúncias envolvendo empresas privadas, devemos lembrar o Programa de


Integridade presente na Lei no 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção ou Lei da
Empresa Limpa. Esta lei determina que, na aplicação de sanções às empresas envolvidas em atos
ilícitos, devem ser levados em consideração diversos aspectos, entre eles a existência de
mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de
irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa
jurídica.

De forma semelhante ao setor privado, a Lei nº 13.303/2016, que dispõe sobre o estatuto
jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, também
trouxe importantes avanços sobre a relação entre canais de denúncia e as políticas de
integridade. Segundo essa lei, as empresas estatais devem adotar regras de estruturas e práticas
de gestão de riscos e controle interno específicos, entre elas a instituição de canais para receber
denúncias.

Art. 9o A empresa pública e a sociedade de economia mista adotarão regras de estruturas e


práticas de gestão de riscos e controle interno que abranjam:

I - ação dos administradores e empregados, por meio da implementação cotidiana de práticas


de controle interno;

II - área responsável pela verificação de cumprimento de obrigações e de gestão de riscos;

III - auditoria interna e Comitê de Auditoria Estatutário.

§ 1o Deverá ser elaborado e divulgado Código de Conduta e Integridade, que disponha sobre:

[...]

III - canal de denúncias que possibilite o recebimento de denúncias internas e externas relativas
ao descumprimento do Código de Conduta e Integridade e das demais normas internas de ética
e obrigacionais;

IV - mecanismos de proteção que impeçam qualquer espécie de retaliação a pessoa que utilize
o canal de denúncias;

Existem ainda instituições públicas e privadas de alguns setores que são obrigadas pela
legislação a criar ouvidorias e a receber denúncias. É o caso das instituições financeiras,
seguradoras e planos de saúde.

Em 2021, por meio do Decreto nº 10.756/2021, criou-se o Sistema de Integridade Pública do


Poder Executivo federal, estabelecendo a CGU como seu órgão central. O sistema é responsável
por coordenar e articular as atividades relacionadas à integridade pública no Executivo federal,
além de estabelecer padrões para as medidas de integridade adotadas pelos órgãos e entidades
da administração pública.
MÓDULO II: A construção do sistema
de proteção ao denunciante no Brasil
No módulo anterior, exploramos conceitos fundamentais sobre a figura do denunciante, e vimos
como se articulam os pilares e linhas de defesa de um sistema de proteção ao denunciante.

O Brasil avançou substancialmente ao longo dos últimos anos no processo de melhoria desse
sistema: mas esse foi um processo progressivo, com muitos atores e desdobramentos.

Nesse módulo, vamos ver como esse tema foi tratado no Brasil na última década, e, assim,
compreender como se formou o arcabouço jurídico para a proteção do denunciante em nosso
país.
1. A criação do sistema de proteção ao
denunciante no brasil
A criação do sistema de proteção ao denunciante no Brasil ainda é um trabalho incremental e
em construção. Veremos que o início desse processo se deu com a percepção de que seria
necessário construir a primeira linha de defesa dos denunciantes, criando condições para a
proteção de sua identidade. Apenas quando consolidada essa primeira etapa, criaram-se
condições jurídicas para que as demais linhas de defesa, e inclusive os mecanismos de incentivo,
passassem a ser desenvolvidos.

A história da construção das proteções e reparações estabelecidas pelo arcabouço legal no Brasil
começa há cerca de dez anos, com a publicação da Lei 12.527/2011, a Lei de Acesso à
Informação.

Antes de iniciarmos a contar essa história, no entanto, é importante recordarmos as distinções


entre conceitos que aprendemos ao início desse curso, principalmente aquela que distingue
denunciante de testemunha e vítima. Isso porque o regime de proteção às testemunhas no
Brasil já se inicia em 1999, com a promulgação da Lei nº 9.807/1999, que estabelece normas
para a organização e manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e testemunhas
ameaçadas. Na prática, portanto, somente o denunciante que fosse também testemunha ou
vítima poderia contar com algum sistema protetivo. Como se percebe, somente após
transcorrida mais de uma década dessa iniciativa, o ordenamento jurídico brasileiro começou a
contar com conjunto de normas que foram, aos poucos, moldando a proteção ao denunciante
no Brasil.

2. Criando a primeira linha de defesa do


denunciante: a proteção à identidade
2.1. Direitos de Personalidade e a Lei de Acesso à
informação - Lei nº 12.527/2011
Nos primeiros anos de vigência da Lei de Acesso à Informação, a Controladoria-Geral da União,
órgão responsável pela revisão das decisões adotadas pelas autoridades máximas de órgãos e
entidades do Poder Executivo federal, viu-se diante de um impasse no caso concreto: um
denunciado solicitava a informação acerca da identidade do denunciante, alegando tratar-se de
informação necessária a tutela judicial de direito fundamental. No caso concreto, o denunciado
pretendia usar a LAI para descobrir a identidade do denunciante e, assim, supostamente solicitar
reparação por danos morais na justiça.

À época, ainda se debatia os efeitos de decisão de 2003 do Supremo Tribunal Federal no


Mandado de Segurança 24.405-4/ DF, em que o impetrante questionara a constitucionalidade
do art. 55, §1º da Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União (Lei nº 8.443/92), que assim
dispunha:

Art. 55. No resguardo dos direitos e garantias individuais, o Tribunal dará tratamento sigiloso às
denúncias formuladas, até decisão definitiva sobre a matéria.

§ 1° Ao decidir, caberá ao Tribunal manter ou não o sigilo quanto ao objeto e à autoria da


denúncia

Na ocasião, o Tribunal considerou que esse sigilo violaria o direito à honra e à imagem do
denunciado, bem como seu direito de resposta e de reparação por danos morais decorrentes
dessa violação (art. 5º, V e X da Constituição). Como resultado deste julgamento, o Senado
Federal suspendeu a eficácia do §1º do art. 55 da Lei Orgânica do TCU, por meio da Resolução
nº 16/2006, não permitindo ao Tribunal manter em sigilo a identidade de seus denunciantes.

Em 2009, decisão do STF, no entanto, já reconhecia a validade de denúncias anônimas como


base para a realização de investigações, como vimos ao tratar de comunicações de
irregularidade, e, em 2011, as informações relacionadas aos direitos de personalidade (inciso X
do art. 5º da Constituição) acumuladas em órgãos e entidades da Administração Pública,
ganhariam uma regulamentação geral por meio da Lei de Acesso à Informação, que em seu art.
31 dispunha:

Art. 31. O tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com
respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e
garantias individuais.

§ 1º As informações pessoais, a que se refere este artigo, relativas à intimidade, vida privada,
honra e imagem:

I - terão seu acesso restrito, independentemente de classificação de sigilo e pelo prazo máximo
de 100 (cem) anos a contar da sua data de produção, a agentes públicos legalmente autorizados
e à pessoa a que elas se referirem; e

II - poderão ter autorizada sua divulgação ou acesso por terceiros diante de previsão legal ou
consentimento expresso da pessoa a que elas se referirem.

§ 2º Aquele que obtiver acesso às informações de que trata este artigo será responsabilizado
por seu uso indevido.

§ 3º O consentimento referido no inciso II do § 1º não será exigido quando as informações forem


necessárias:

I - à prevenção e diagnóstico médico, quando a pessoa estiver física ou legalmente incapaz, e


para utilização única e exclusivamente para o tratamento médico;

II - à realização de estatísticas e pesquisas científicas de evidente interesse público ou geral,


previstos em lei, sendo vedada a identificação da pessoa a que as informações se referirem;

III - ao cumprimento de ordem judicial;

IV - à defesa de direitos humanos; ou

V - à proteção do interesse público e geral preponderante.


Dessa forma, a nova norma permitiria resguardar a informação pessoal do denunciante, ao
mesmo tempo que permitiria que esta fosse acessada mediante ordem judicial, no âmbito de
processo formalmente instituído.

Os direitos de personalidade são tutelados no ordenamento jurídico em diversos campos:


constitucional, penal e civil, sendo estudado em diferentes prismas. Os direitos de
personalidade, quando analisados sob aspecto do relacionamento com o Estado, no Direito
Público, enquadram-se na categoria de direitos fundamentais da pessoa natural, e no âmbito
internacional, de Direitos Humanos. Na perspectiva do Direito Civil e do Direito Constitucional,
fundamentam-se sobretudo no artigo 1º da Constituição Federal de 1988, na proteção à
dignidade da pessoa humana e no artigo 5, X, asseguram o direito a indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação.

Trata-se, portanto, dos bens mais elevados da pessoa humana. Por isso é que o ordenamento
jurídico não pode consentir que deles se prive o próprio titular. São direitos inatos (originários),
extrapatrimoniais, intransmissíveis, imprescritíveis, impenhoráveis, necessários e extensíveis a
todos os homens.

E é por se tratar de valores tão essenciais ao homem que § 1º do art. 31 da Lei de Acesso à
Informação garantiu que as informações pessoais sob custódia da administração pública
devessem ser protegidas, com acesso restrito e independentemente de classificação de sigilo,
pelo prazo máximo de 100 (cem) anos a contar da sua data de produção, a agentes públicos
legalmente autorizados e à pessoa a que elas se referirem.

Foi com base em tal dispositivo que aquele primeiro pedido de acesso à informação relacionado
a dados de denunciantes foi decidido, sendo indeferido. Após alguns outros casos com mesma
natureza, em 2014 a Ouvidoria-Geral da União e a Corregedoria-Geral da União, ambos órgãos
pertencentes à estrutura da Controladoria-Geral da União, editaram a Instrução Normativa nº
1, de 2014, que estabelecia a proteção à identidade dos denunciantes sempre que estes assim
a solicitassem. Tal Instrução Normativa vigoraria até 2021, quando todo um conjunto de novas
normas viriam a robustecer ainda mais a proteção à identidade do denunciante.

SAIBA MAIS
A proteção da LAI aos agentes públicos que denunciam

O Estatuto do Servidor Público Federal, a Lei nº 8.112/1990, sofreu importantes alterações


com a partir da vigência da Lei de Acesso à Informação, que trouxeram maior segurança
jurídica ao servidor público que necessitasse reportar irregularidade ou crime que tivesse
ciência.
Até então, o dever de reportar previsto na Lei restringia-se à autoridade a ele
hierarquicamente superior, a qual, em muitas circunstâncias, poderia estar envolvida no fato.
Tentativas de relatar tais fatos a órgãos externos ou unidades apuratórias poderiam ser
enquadradas como violação dos deveres de lealdade relacionados a “guardar sigilo sobre
assunto da repartição” (art. 116, VIII), ou mesmo enquadrados como crime de improbidade
administrativa (conforme redação original do art. 11, III da Lei nº 8.429/1992). Dessa forma,
a própria legislação criava condições propícias para práticas de retaliação no âmbito do
serviço público.
Com o advento da Lei de Acesso à Informação, não apenas o dever de relatar a irregularidade
passou a prever a possibilidade de o relato ser realizado para outra que não a chefia imediata,
mas também passou conter dispositivo que expressamente proibia a responsabilização do
servidor por agir de tal forma:
Art. 126-A. Nenhum servidor poderá ser responsabilizado civil, penal ou administrativamente
por dar ciência à autoridade superior ou, quando houver suspeita de envolvimento desta, a
outra autoridade competente para apuração de informação concernente à prática de crimes
ou improbidade de que tenha conhecimento, ainda que em decorrência do exercício de cargo,
emprego ou função pública.
Essa foi a primeira medida protetiva contra retaliações a aparecer no ordenamento jurídico
brasileiro destinada a servidores que apresentavam denúncias.

2.2. A Lei de Defesa dos Usuários de Serviços


Públicos e o reconhecimento da identidade dos
manifestantes como informação protegida
Em 2017, a Lei nº 13.460, a Lei de Defesa dos Usuários de Serviços Públicos, avançou na
construção de um ambiente mais propício à participação social, regulamentando pela primeira
vez nacionalmente a atividade de ouvidoria pública e os direitos básicos do usuário desses
serviços. Esta lei abrangente estabelece as tipologias de manifestações, inclusive a denúncia,
como visto neste curso, e estabelece às ouvidorias públicas o papel de proteção das informações
pessoais do manifestante, com base na Lei de Acesso à Informação:

Art. 6º São direitos básicos do usuário:

I - participação no acompanhamento da prestação e na avaliação dos serviços;

(...)

IV - proteção de suas informações pessoais, nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de


2011;

(...)

“Art. 10. A manifestação será dirigida à ouvidoria do órgão ou entidade responsável e conterá a
identificação do requerente.

(...) § 7º A identificação do requerente é informação pessoal protegida com restrição de acesso


nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.

A Lei deu, assim, maior robustez ao entendimento já expresso na IN CRG/OGU nº 1/2014,


permitindo uma interpretação segundo a qual o direito à preservação da identidade do
denunciante prescindiria de solicitação expressa de sigilo por parte dele. A construção do
entendimento de que a identidade do denunciante seria uma informação que afetava o
exercício dos direitos de personalidade, caso tornada pública, deixava de ser apenas fruto de
uma interpretação direta da LAI, visto que, agora, o §7º do art. 10 da Lei nº 13.460, de 2017,
passava a dizê-lo expressamente. Assim, o fundamento normativo para a proteção à identidade
do denunciante no Brasil resultou da interpretação conjunta de dispositivos encontrados em
dois microssistemas jurídicos: o de acesso à informação (Lei nº 12.527, de 2011) e o de defesa
dos usuários de serviços públicos (Lei nº 13.460, de 2017).
Tal interpretação seria consagrada em dois instrumentos: a Resolução nº 3/2019 da Rede
Nacional de Ouvidorias, que aprovou a norma modelo de proteção a denunciantes, e o Decreto
nº 10.153/ 2019, que regulamentou a matéria no âmbito do Poder Executivo federal.

Porém, antes de nos aprofundarmos nesses dois instrumentos, vejamos as contribuições para o
tema trazidas pela criação do Sistema de Ouvidorias do Poder Executivo federal (SISOUV), ainda
em 2018.

2.3. O Sistema de Ouvidorias do Poder Executivo


federal: governança e segurança jurídica para os
denunciantes
O Decreto nº 9.492/2018 regulamentou a Lei nº 13.460/2017 e foi o resultado de extensos
debates que remontam a período muito anterior à Lei, os quais buscavam criar um arranjo
institucional que garantisse maior segurança jurídica aos manifestantes por meio de um sistema
de ouvidorias que respondesse a um órgão central. Após uma década de debates e com a
necessidade de regulamentação da Lei nº 13.460/2017, as condições estavam postas para que
esse modelo de governança das atividades de ouvidoria fosse instituído no âmbito do Poder
Executivo federal.

Além de criar novos controles sobre a atividade de ouvidoria pública, este decreto avançou ao
definir os conceitos de denúncia e de comunicação de irregularidade, reconhecendo sua
importância para as atividades de apuração, desde que atendessem indícios mínimos de
relevância, autoria e materialidade.

Art. 3º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:

II - denúncia - ato que indica a prática de irregularidade ou de ilícito cuja solução dependa da
atuação dos órgãos apuratórios competentes;

(...)

Art. 23. As unidades que compõem o Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo federal poderão
coletar informações junto aos usuários de serviços públicos com a finalidade de avaliar a
prestação desses serviços e de auxiliar na detecção e na correção de irregularidades.

§ 1º As informações a que se refere o caput, quando não contiverem a identificação do usuário,


não configurarão manifestações nos termos do disposto neste Decreto e não obrigarão resposta
conclusiva.

§ 2º As informações que constituírem comunicações de irregularidade, ainda que de origem


anônima, serão enviadas ao órgão ou à entidade da administração pública federal competente
para a sua apuração, observada a existência de indícios mínimos de relevância, autoria e
materialidade.

Notem que este decreto também avançou ao estabelecer mecanismos de proteção da


identidade e dos elementos de identificação dos manifestantes, inclusive dos denunciantes,
relembrando as responsabilidades do agente público por este dever de proteção a identidade
doo usuário do serviço público.
Art. 24. As unidades que compõem o Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo federal
assegurarão a proteção da identidade e dos elementos que permitam a identificação do usuário
de serviços públicos ou do autor da manifestação, nos termos do disposto no art. 31 da Lei nº
12.527, de 18 de novembro de 2011.

Parágrafo único. A inobservância ao disposto no caput sujeitará o agente público às penalidades


legais pelo seu uso indevido.

2.4. A padronização dos controles sobre o


compartilhamento de elementos de identificação
dos denunciantes
Em setembro de 2019, a Rede Nacional de Ouvidorias aprovou, por meio de sua Assembleia-
Geral, a Resolução nº 3/2019, que publicou uma norma modelo sobre medidas gerais de
salvaguarda à identidade de denunciantes. Normas modelo, por si só, não possuem força
vinculante, mas se apresentam como diretrizes para que as autoridades competentes adotem
dispositivos semelhantes no âmbito de suas jurisdições. As normas-modelo aprovadas pela
Assembleia-Geral da Rede Nacional de Ouvidoria, portanto, têm a função de apoiar o processo
de padronização dos procedimentos realizados pelas ouvidorias públicas em âmbito nacional.

A norma modelo propõe uma interpretação conjunta da Lei nº 12.527/2011 (LAI), Lei nº
13460/2017 (Lei de Defesa dos Usuários de Serviços Públicos) e da Lei nº 13.608/2018. Esta
última Lei, que dispôs sobre o recebimento de denúncia por meio de disque denúncias, havia
trazido dispositivos gerais acerca do tema, determinando que “o informante que se identificar
terá assegurado, pelo órgão que receber a denúncia, o sigilo dos seus dados”.

O primeiro aspecto relevante da resolução nº 3/2019 foi estabelecer a centralização dos meios
de recebimento de denúncia como premissa para a adoção de medidas de salvaguarda à
identidade dos denunciantes:

Art. 3º A denúncia deverá ser dirigida à ouvidoria do órgão ou entidade responsável.

Além disso, essa foi a primeira norma que versou sobre o trâmite e o encaminhamento entre
distintas unidades e órgãos sob a perspectiva da tutela da confiança, enfrentando um problema
bastante comum na prática das unidades de ouvidoria: o tratamento de denúncias cuja
apuração não esteja sob a competência do órgão recebedor.

Se antes o simples fato de a denúncia não ser de competência do órgão recebedor já o


autorizava a reencaminhar para o órgão competente, agora, sob a perspectiva da tutela da
confiança do denunciante, o órgão recebedor deveria consultá-lo sobre tal envio sempre que
esse implicasse o envio dos elementos de identificação do denunciante. Veja bem: digamos que
você seja servidor em uma Universidade Federal e, não confiando no órgão de ouvidoria ou de
apuração do seu órgão, realize a denúncia diretamente ao Ministério da Educação, acreditando
que aquele ministério possuísse um poder de supervisão que lhe permitisse conduzir tal
processo de apuração. Se, antes, uma vez verificada a ausência de competência do órgão para
apurar o fato, este poderia simplesmente reencaminhar o teor completo da denúncia à
Universidade, agora, ele teria de lhe solicitar o consentimento expresso para fazê-lo.
Caso não obtivesse o seu consentimento, a unidade de ouvidoria deveria realizar a
pseudonomização da denúncia antes de enviá-la. Aliás, o procedimento de pseudonimização
também passou a ser previsto para o envio da denúncia ao órgão de apuração (compreendendo
que muitas vezes a identidade do denunciante é uma informação totalmente irrelevante ao
longo do processo apuratório).

Mas, afinal, o que é pseudonimização? Este termo é trazido da Lei nº 13.709/2018, a Lei Geral
de Proteção de Dados (LGPD), para definir “o tratamento por meio do qual um dado perde a
possibilidade de associação, direta ou indireta, a um indivíduo, senão pelo uso de informação
adicional mantida separadamente pelo controlador em ambiente controlado e seguro.”

Ao pseudonimizar a denúncia, a ouvidoria retiraria de seu conteúdo todos os elementos de


identificação do denunciante, mantendo a versão original na base de dados da unidade de
ouvidoria que recebera originalmente a denúncia.

Note que esta norma avança também em orientar como os sistemas de tratamento da denúncia
deverão proteger os dados da identidade do denunciante, sob tutela da ouvidoria a que o
denunciante confiou seus dados:

§2º Os sistemas informatizados que façam o tratamento de denúncias com elementos de


identificação do denunciante deverão possuir controle de acesso e permitir a identificação
precisa de todos os agentes públicos que as acessem e protocolos de internet (endereço IP),
com as respectivas datas e horários de acesso.

No âmbito federal, a proteção à identidade do denunciante foi regulamentada por meio do


Decreto nº 10.153/2019, internalizando o disposto na Resolução nº 3/2019, da Rede Nacional
de Ouvidorias

Este Decreto inovou em seu artigo 6º, quando estabeleceu que, no âmbito do Poder Executivo
federal, o denunciante terá seus elementos de identificação preservados desde o recebimento
da denúncia, nos termos do disposto no § 7º do art. 10 da Lei nº 13.460, de 2017, com restrição
de acesso mantida pela unidade de ouvidoria responsável pelo tratamento da denúncia pelo
prazo de cem anos.

Diante dessa normativa, estabeleceu-se proteção máxima temporal, nos termos do disposto no
inciso I do § 1º do art. 31 da Lei nº 12.527, de 2011, ou seja, os elementos de identificação do
denunciante deveriam ser resguardados por 100 anos a contar da apresentação da denúncia.

Em 2021, esse Decreto foi regulamentado por meio da Portaria CGU nº 581/2021. A partir de
então, procedimentos de compartilhamento de informações tornaram-se ainda mais claros e
detalhados:

Art. 32. O compartilhamento dos elementos de identificação do denunciante entre órgãos ou


entidades distintas poderá ser realizado sob as seguintes hipóteses:

I - mediante consentimento do titular, nos casos em que haja a necessidade de tratamento da


denúncia por unidade de ouvidoria distinta da que recebeu a manifestação;

II - para cumprimento de ordem judicial; ou

III - mediante requerimento de órgãos de apuração, quando indispensável à análise dos fatos
relatados na denúncia.
Art. 33. Na hipótese prevista no inciso I do art. 32 desta Portaria, a unidade do SisOuv que
receber a denúncia deverá solicitar o consentimento do denunciante para o compartilhamento
de seus elementos de identificação, o qual terá o prazo de vinte dias para se manifestar.

§ 1º A ausência de manifestação do denunciante será considerada negativa de consentimento,


para todos os efeitos.

§ 2º O disposto no caput não impede que a unidade de ouvidoria promova o encaminhamento


de denúncia pseudonimizada a outra unidade, desde o momento de seu recebimento, quando
os elementos de identidade do denunciante não se revelarem essenciais para a caracterização
do fato relatado.

Esta portaria avança, também, em apresentar meios de pseudonimização antes não


especificados na legislação nacional, vejam:

Art. 35. § 2º Constituem meios de pseudonimização a serem adotados, dentre outros:

I - produção de extrato;

II - produção de versão tarjada; e

III - redução a termo de gravação ou relato descritivo de imagem.

§ 3º As denúncias que demandarem trabalho desproporcional para a sua pseudonimização


poderão ser encaminhadas às áreas de apuração sem seus anexos, com indicação de que os
documentos estão sob a guarda da ouvidoria e que se encontram disponíveis mediante
solicitação formal da área de apuração, nos termos do Decreto nº 10.153, de 2019.

É importante lembrar que, embora essa normativa traga esses avanços procedimentais, ela tem
abrangência restrita às Ouvidorias do Poder Executivo federal, o que não impede que ela venha
inspirar normatizações em outros entes e Poderes da federação.

Apesar de o Decreto nº 10.153, de 2019, e as normas procedimentais dele derivadas avançarem


substancialmente sobre o tema da proteção da identidade de denunciantes no âmbito federal
e sobre o compartilhamento de seus dados entre unidades de ouvidoria, uma parcela muito
importante de um sistema protetivo verdadeiramente eficiente somente viria a ser criado por
Lei em 2019: as medidas de proteção contra retaliação.

3. Criando a segunda e a terceira linhas


de defesa do denunciante e
estabelecendo os mecanismos de
incentivo à denúncia
Em 2016, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA), fórum
que congrega diversos órgãos e entidades públicos que atuam na prevenção e no combate à
corrupção, estabeleceu como um de seus objetivos a criação de Projeto de Lei que versasse
sobre a proteção e a recompensa a informantes. Esta ação, coordenada pela Associação dos
Juízes Federais do Brasil, e da qual participaram órgãos como a Controladoria-Geral da União e
Ministério da Justiça, produziu Projeto de Lei que posteriormente seria incorporado em pacote
que ficou conhecido como “10 Medidas Contra a Corrupção”.

Nele, além da proteção à identidade, eram detalhadas medidas de proteção, incentivo e


recompensa a denunciantes de crimes de corrupção. Apesar de não ter avançado no Congresso,
aspectos básicos da proposta retornariam ao legislativo no âmbito de um pacote de medidas
proposto pelo Poder Executivo federal em 2019, que ficou conhecido como “Pacote Anticrime”,
o qual viria a se converter na Lei nº 13.964/2019, a qual alterou a Lei nº 13.608, de 2018. Tais
alterações construíram o sistema de proteção a denunciantes sob quatro pilares:

1. Proteção à identidade;

2. Garantia contra prática de retaliação;

3. Mecanismos para reparação de danos oriundos de retaliação; e

3. Mecanismos de incentivo.

Assim, a Lei nº 13.608/2018 passou a contar com um importante e enxuto conjunto de


dispositivos que permitiriam terminar esse processo de construção:

Art. 4º-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e suas autarquias e fundações,
empresas públicas e sociedades de economia mista manterão unidade de ouvidoria ou
correição, para assegurar a qualquer pessoa o direito de relatar informações sobre crimes contra
a administração pública, ilícitos administrativos ou quaisquer ações ou omissões lesivas ao
interesse público.

Parágrafo único. Considerado razoável o relato pela unidade de ouvidoria ou correição e


procedido o encaminhamento para apuração, ao informante serão asseguradas proteção
integral contra retaliações e isenção de responsabilização civil ou penal em relação ao relato,
exceto se o informante tiver apresentado, de modo consciente, informações ou provas falsas.

Art. 4º-B. O informante terá direito à preservação de sua identidade, a qual apenas será revelada
em caso de relevante interesse público ou interesse concreto para a apuração dos fatos.

Parágrafo único. A revelação da identidade somente será efetivada mediante comunicação


prévia ao informante e com sua concordância formal.

Art. 4º-C. Além das medidas de proteção previstas na Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999, será
assegurada ao informante proteção contra ações ou omissões praticadas em retaliação ao
exercício do direito de relatar, tais como demissão arbitrária, alteração injustificada de funções
ou atribuições, imposição de sanções, de prejuízos remuneratórios ou materiais de qualquer
espécie, retirada de benefícios, diretos ou indiretos, ou negativa de fornecimento de referências
profissionais positivas.

§ 1º A prática de ações ou omissões de retaliação ao informante configurará falta disciplinar


grave e sujeitará o agente à demissão a bem do serviço público.

§ 2º O informante será ressarcido em dobro por eventuais danos materiais causados por ações
ou omissões praticadas em retaliação, sem prejuízo de danos morais.
§ 3º Quando as informações disponibilizadas resultarem em recuperação de produto de crime
contra a administração pública, poderá ser fixada recompensa em favor do informante em até
5% (cinco por cento) do valor recuperado.

3.1. Estruturando a proteção contra retaliação no


Poder Executivo federal
A regulamentação dos novos dispositivos da Lei nº 13.608/2018 no âmbito do Poder Executivo
federal enfrentou alguns desafios. O primeiro deles foi o risco de descentralização do canal de
recebimento de denúncias, visto que a Lei trazia tanto unidade de ouvidoria quanto unidade de
correição como instituições aptas a recebê-las.

Esse primeiro ponto foi superado, ainda em 2019, por meio de Portaria da CGU, órgão central
dos sistemas de ouvidoria e de correição do Poder Executivo federal, que reafirmou a
competência exclusiva das unidades de ouvidoria para o recebimento de tais manifestações. O
Decreto nº 10.153/2019, alterado em 2021 para regulamentar a Lei nº 13.608/2018, também
reforçou essa competência.

O segundo ponto dizia respeito a definir o que seria a denúncia considerada “razoável”, nos
termos do parágrafo único do art. 4º-A. Definir claramente esse conceito era fundamental, pois
somente a partir dele as garantias contra retaliação passariam a ser um direito do denunciante.
Isso quer dizer que, se por um lado bastaria realizar a denúncia para ter a sua identidade
preservada, por outro, as garantias contra retaliação somente poderiam existir depois que
alguma autoridade declarasse a denúncia razoável.

Assim, passou a ser considerada razoável, para os fins de concessão de proteções contra
retaliações, a denúncia que tenha sido habilitada pela unidade de ouvidoria, uma vez verificados
os requisitos mínimos de autoria, materialidade e relevância que amparem a sua apuração.

Note que, a partir desse momento, a habilitação, um dos resultados possíveis da análise prévia
da denúncia realizada pela unidade de ouvidoria, passa a ser pré-requisito para que o
denunciante possa usufruir de todos os direitos previstos em Lei.

No módulo I, ao tratarmos dos sistemas de proteção a denunciantes, lembramos que a segunda


e a terceira linhas de defesa têm natureza reativa; ou seja, uma vez existente o direito do
denunciante, os mecanismos de defesa desse direito somente podem ser acionados em caso de
violação do direito. Como vimos, medidas preventivas, que impeçam a prática de retaliação,
podem ser realizadas no âmbito geral em políticas voltadas à ética e à integridade nas
instituições, mas a defesa dos direitos dos denunciantes no caso da prática de retaliação tende
a ocorrer quando a retaliação é percebida.

Mas qual seria a condição para que uma pessoa realizasse prática de retaliação contra um
denunciante?

Ora, a resposta mais simples é: para praticar um ato de retaliação contra um denunciante, a
pessoa que pratica o ato precisa saber quem é o denunciante – e, para que isso ocorra é
necessário que a identidade desse denunciante tenha sido a ela comunicada. Isso nos ajuda a
compreender porque, em um sistema protetivo no qual apenas ouvidoria e unidade de apuração
poderiam ter acesso a essa informação, torna-se difícil à vítima de retaliação realizar denúncia
no mesmo órgão em que sua identidade foi vazada.

Assim, o Decreto nº 10.153/2019, passou a prever que o recebimento e a apuração de denúncias


de retaliação seriam de competência exclusiva da Controladoria-Geral da União, na condição de
órgão central dos sistemas de ouvidoria, correição e controle interno:

Art. 10. Compete à Controladoria-Geral da União:

[...]

III - receber e apurar as denúncias relativas às práticas de retaliação contra denunciantes


praticadas por agentes públicos dos órgãos e entidades a que se refere o art. 2º desde Decreto,
bem como instaurar e julgar os processos para responsabilização administrativa resultantes de
tais apurações; e

IV - adotar ou determinar, de ofício, as medidas de proteção a que se refere o caput do art. 4º-
C da Lei nº 13.608, de 2018, podendo suspender atos administrativos praticados em retaliação
ao direito de relatar ou editar atos administrativos visando a proteção do denunciante

E se a ouvidoria do órgão acabar recebendo a denúncia de retaliação? Como deve proceder?


Ora, nesse caso, a Portaria nº 581/2021 estabelece que a denúncia deverá ser encaminhada
imediatamente ao órgão central.

Veja também que o Decreto atribuiu à CGU a competência para determinar medidas de
proteção ao denunciante de que trata o art. 4º-C da Lei nº 13.608/2018, relacionados às
garantias laborais e processuais, e ainda estendendo as medidas previstas no art. 7º da Lei nº
9.807/1999 aos denunciantes:

I - segurança na residência, incluindo o controle de telecomunicações;

II - escolta e segurança nos deslocamentos da residência, inclusive para fins de trabalho ou para
a prestação de depoimentos;

III - transferência de residência ou acomodação provisória em local compatível com a proteção;

IV - preservação da identidade, imagem e dados pessoais;

V - ajuda financeira mensal para prover as despesas necessárias à subsistência individual ou


familiar, no caso de a pessoa protegida estar impossibilitada de desenvolver trabalho regular ou
de inexistência de qualquer fonte de renda;

VI - suspensão temporária das atividades funcionais, sem prejuízo dos respectivos vencimentos
ou vantagens, quando servidor público ou militar;

VII - apoio e assistência social, médica e psicológica;

VIII - sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida;

Finalmente, também é bom lembrar que a regulamentação trouxe os requisitos da denúncia de


retaliação, que incluem a indicação da denúncia original que teria dado motivo ao ato de
retaliação, bem como a necessidade prévia de habilitação de tal denúncia.
SAIBA MAIS
Retaliação e empresas estatais

Em relação à proteção diante das represálias em empresas estatais, para além da proteção à
identidade do denunciante, soma-se à essa construção normativa a Lei n. 13.303/2016, que
dispõe sobre o estatuto jurídico das empresas estatais, e que determina a criação de
mecanismo de proteção ao denunciante.
Art. 9º A empresa pública e a sociedade de economia mista adotarão regras de estruturas e
práticas de gestão de riscos e controle interno que abranjam:
§ 1º Deverá ser elaborado e divulgado Código de Conduta e Integridade, que disponha sobre:
IV - Mecanismos de proteção que impeçam qualquer espécie de retaliação a pessoa que
utilize o canal de denúncias.
SAIBA AINDA MAIS
A proteção aos denunciantes nas convenções internacionais

Não é de hoje que os organismos internacionais vêm abordando o papel fundamental


dos denunciantes no combate à corrupção.

A Convenção Interamericana contra a Corrupção foi o primeiro pacto internacional a


reconhecer a corrupção como um fenômeno transnacional, buscando tipificar o delito
e criar um ambiente mais adequado à sua prevenção e sanção. Ponto fundamental que
conecta ambas as perspectivas é a existência de canais seguros de denúncia. De acordo
com o artigo III dessa Convenção, convêm aos Estados Partes considerar a
aplicabilidade de medidas, em seus próprios sistemas institucionais destinadas a criar,
manter e fortalecer “sistemas para proteger funcionários públicos e cidadãos
particulares que denunciarem de boa-fé atos de corrupção, inclusive a proteção de sua
identidade, sem prejuízo da Constituição do Estado e dos princípios fundamentais de
seu ordenamento jurídico interno.”
Assinada em 29 de março de 1996, a Convenção foi internalizada pelo Brasil por meio
do Decreto nº 4.410/2002.
Em 2003, o papel crucial dos denunciantes e a necessidade de protegê-los foram
reconhecidos como parte do direito internacional quando a Organização das Nações
Unidas (ONU) adotou a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção. Esta
Convenção foi assinada por 140 nações e formalmente ratificada, aceita, aprovada ou
aderida por 188 nações. O Brasil a ratificou em 15 de junho de 2005 e a internalizou
por meio do Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006.
De forma muito semelhante à Convenção Interamericana, o Artigo 33 da Convenção da
ONU afirma que “cada Estado Parte considerará a possibilidade de incorporar em seu
ordenamento jurídico interno medidas apropriadas para proporcionar proteção contra
todo trato injusto às pessoas que denunciem ante as autoridades competentes, de boa-
fé e com motivos razoáveis, quaisquer feitos relacionados com os delitos qualificados
de acordo com a presente Convenção.”
Outras organizações internacionais também têm exercido influência em promover uma
maior adoção internacional de leis de proteção ao denunciante e de promoção de
melhores práticas sobre o tema, incluindo o Grupo dos Vinte (G20), que publicou
Planos de Ação Anticorrupção do G20, sendo o mais recente de 2019-2021, e a União
Europeia, que publicou uma diretiva em abril de 2019.
As legislações internacionais e nacionais buscam dar atenção à mensagem informada
e eventuais indícios existentes nesta informação, e proteger o mensageiro, de modo
então a proteger primeiramente a sua identidade. No caso de esta proteção à
identidade não ter sido bem-sucedida, buscam defendê-lo de quaisquer retaliações
decorrentes do ato de denunciar. Embora muitos países tenham aprovado leis de
denúncias nos últimos anos, apenas alguns deles incluíram programas de recompensas
para denúncias.
MÓDULO III: O recebimento de
denúncias e a proteção ao denunciante
Até aqui, aprendemos os conceitos mais relevantes para compreender o sistema de proteção a
denunciantes desenvolvido no Brasil, bem como o papel crucial desempenhado pelas ouvidorias
nesse sistema. Aprendemos, também, sobre a história, os processos de normatização e a
construção desse sistema.

Agora, iniciaremos a nossa parte prática. Veremos como, no processo de tratamento de


denúncias, podemos tirar o melhor proveito das informações trazidas pelos denunciantes e, ao
mesmo tempo, protegê-los e atuar de forma responsável para a garantia de seus direitos.

Agora é mãos à obra!


1. O papel da ouvidoria
No tratamento de denúncias e demais manifestações de ouvidoria, o agente público deve
lembrar que o papel da ouvidoria é atuar como instância de mediação entre o cidadão e a
Administração Pública.

Nesse sentido, quando estiver diante de uma manifestação de ouvidoria, o agente público
deverá promover uma análise empática da questão trazida pelo cidadão, com o objetivo de
entender e melhor traduzir a questão, para então tratá-la ou encaminhá-la, quando necessário,
para a unidade administrativa ou instituição externa competente.

Como vimos, a centralização do canal de recebimento de denúncias na unidade de ouvidoria é


peça fundamental para garantir a segurança sobre as informações do denunciante, bem como
a segregação de funções entre órgão de recebimento e de apuração de denúncias necessária à
garantia de higidez dos processos de controle e responsabilização.

O tratamento de uma denúncia, no âmbito da ouvidoria, compreende uma série de etapas,


assim descritas pela Portaria CGU nº 581/2021:

Recebimento

Registro no sistema

Triagem

Pseudonimização

Encaminhamento para unidade competente

Análise prévia

Habilitação ou arquivamento

Trâmite para a unidade de apuração

Resposta Conclusiva

Resposta Resolutiva

Essa lista de ações busca sintetizar todo o processo de tratamento de denúncias, apesar de
algumas fases nem sempre ocorrerem – como é o caso do encaminhamento da denúncia a outro
órgão (procedimento comum quando a ouvidoria não é competente para tratar da matéria), e
da pseudonimização da denúncia, etapa que somente ocorre quando o denunciante não
consente com o envio de seus dados pessoais ao órgão competente ou quando, uma vez
habilitada, a denúncia é enviada à unidade de apuração.

Passaremos por cada uma dessas fases, mas algumas observações são sempre importantes:

O trabalho a ser desempenhado pela equipe da ouvidoria não deve ser confundido com o das
áreas de apuração. Cabe à ouvidoria, por ocasião da análise prévia, coletar a maior quantidade
possível de elementos de convicção para, primeiramente, formar juízo quanto à aptidão da
denúncia para apuração. Desta forma, na hipótese de a denúncia ser considerada apta, ela será
habilitada e encaminhada para unidade de apuração com maiores elementos de materialidade.

A análise prévia traz benefícios tanto para o cidadão quanto para a Administração Pública. Para
o cidadão evita-se que sejam criadas expectativas irreais em razão de uma denúncia
apresentada sem elementos mínimos que permitam sua apuração, na medida em que o cidadão
será informado pela ouvidoria que a denúncia carece de elementos para ser apurada,
incentivando-o que encaminhe informações complementares ou mais claras.
Consequentemente, há uma redução da quantidade de denúncias encaminhadas para as áreas
de apuração, que não precisarão empregar recursos e força de trabalho desnecessariamente.

Por fim, lembre-se: tratamento de denúncia consiste em um processo. Nesse sentido, é


importante que a unidade de ouvidoria realize o mapeamento do processo de tratamento,
documente-o e o formalize de modo a dar maior transparência e segurança jurídica ao
deunciante. Além disso, o mapeamento do processo deverá prever o levantamento dos riscos a
ele associados, os quais necessitarão ser permanentemente gerenciados pela unidade.

SAIBA MAIS
Denúncias e mediação

Ao dispor sobre as competências das ouvidorias públicas, a Lei nº 13.460/2017 estabeleceu


que a elas caberia, dentre outras coisas, “promover a adoção de mediação e conciliação
entre o usuário e o órgão ou a entidade pública, sem prejuízo de outros órgãos
competentes”.
O processo de mediação ou de conciliação constitui na aplicação de conjunto de
metodologias que buscam a resolução pacífica de um conflito, criando condições para um
diálogo produtivo entre as partes, e, em muitos casos, é altamente recomendável no
âmbito das ações levadas a cabo pelas ouvidorias.
Contudo, há casos em que tais procedimentos não devem ser realizados, sendo, inclusive,
vedados.
Tal é o caso do processo de tratamento de denúncias.
Em primeiro lugar, seria impensável que a ouvidoria desse ciência da existência de uma
denúncia ao próprio denunciado – esse papel compete exclusivamente à unidade de
apuração, no âmbito do processo de responsabilização, com a instauração do contraditório.
Qualquer iniciativa da ouvidoria no sentido de coletar junto ao denunciado informações
acerca da denúncia mostra-se extremamente prejudicial ao processo apuratório (que
muitas vezes pode ser antecedido de uma investigação preliminar) e arriscado para a
manutenção das garantias e proteções aos denunciantes.
Em segundo lugar, uma mediação no âmbito das ouvidorias pressupõe que o objeto do
conflito tenha natureza transacional, ou seja, que o objeto seja passível de negociação: que
seja possível às partes transigir acerca do tema.
Ora, no caso de denúncias, estas deverão versar sobre irregularidades ou ilegalidades,
dizendo respeito, portanto, a descumprimento de dever legal o reguamentar. Trata-se,
portanto, de objeto que implica a responsabilização do agente público.
Tendo isso em conta, a Portaria CGU nº 581/2021, ao dispor sobre o tema “Resolução
Pacífica de Conflitos”, explicitou:

Art. 48. As unidades do SisOuv poderão utilizar meios de resolução pacífica de conflitos, em
especial para a solução de controvérsias nos quais seja importante a direta e voluntária
ação de ambas as partes divergentes.
Parágrafo único. Os meios de resolução pacífica de conflitos não serão elegíveis quando:
I - as partes no conflito não tenham consentido com o uso da metodologia de resolução
pacífica de conflitos;
II - o objeto do conflito seja um direito indisponível;
III - a resolução implicar a transigência sobre:
a) aplicação de ato normativo; ou
b) conduta passível de responsabilização de agente público; e
IV - quando decorrente de denúncia.

2. Recebendo uma denúncia


Atualmente, muitas de nossas organizações já dispõem de meios eletrônicos para recebimento
de denúncias: plataformas que permitem o recebimento e o tratamento dessa espécie de
manifestação, garantindo a segurança das informações do denunciante.

No entanto, não raro, denúncias ainda são recebidas por outros meios, quer por canais que não
estão vinculados diretamente à ouvidoria, quer por meio telefônico ou físico.

Em todos esses casos, uma vez recebida a denúncia na unidade de ouvidoria, ela deverá inseri-
la no sistema de gestão das suas manifestações, antes mesmo de realizar qualquer juízo de valor
sobre ela. A partir desse momento, toda a operação de tratamento deverá ocorrer em meio
digital.

Mas afinal, quais os requisitos mais adequados para sistemas que recebam e tratem denúncias?

Os sistemas utilizados já devem prever o encaminhamento das denúncias para as unidades de


apuração sem a identificação do denunciante, bem como a possibilidade de pseudonimizar
informações, caso necessário. Tanto na ouvidoria como na unidade de apuração, o acesso ao
sistema eletrônico deverá ser restringido somente aos servidores que tenham necessidade de
conhecer o teor da denúncia com o objetivo de promover a devida análise prévia ou apuração.
Importante que este sistema eletrônicoregistre todos os acessos realizados junto à denúncia,
visando inclusive à responsabilização funcional do servidor que der causa a vazamentos de
elementos de identificação do denunciante.

SAIBA MAIS
Trâmite de documentos físicos

Os padrões de segurança adotados para trâmite de denúncias em documento físico, sempre


quando inexistente sistema adequado para tal finalidade, são elaborados de acordo com o
que dispõe o Decreto nº 7845/2012, ao referir-se ao trâmite de informação classificada em
grau de sigilo reservado. Assim, a denúncia deve ser preservada em um envelope lacrado a
ser entregue ao chefe da unidade de apuração competente, com o devido registro do
recebimento. A denúncia deverá ser encaminhada sem a identificação do denunciante, a qual
deverá ser tarjada, juntamente com qualquer informação no corpo da manifestação a qual
possa identificar o signatário. Nada impede que a denúncia realizada em modo físico seja
convertida pela ouvidoria em modo eletrônico, visando inclusive a uma maior segurança no
trâmite interno.

Apesar do aumento considerável das interações entre ouvidorias e manifestantes ocorrer em


grande parte devido ao aumento do uso de meios digitais de comunicação, como os sistemas
eletrônicos de recebimento de manifestações, ainda há casos em que o recebimento da
denúncia poderá ocorrer no âmbito de um atendimento presencial.

Nessa circunstância, é importante que a unidade conte com espaço físico para atendimento ao
denunciante, que garanta a discrição necessária para a manutenção do sigilo sobre a sua
identidade.

Ao tratar do atendimento presencial, a Portaria CGU nº 581/2021, enumera algumas


importantes diretrizes a serem seguidas por todas as unidades do Sistema de Ouvidorias do
Poder Executivo federal. São elas:

1. Atendimento personalizado e acessível, com foco no indivíduo;


2. Resiliência no trato de situações não previstas;
3. Respeito às capacidades cognitivas e físicas do usuário; e
4. Respeito às regras de pontualidade, cordialidade, discrição, polidez e sigilo quando for
dar tratamento a assuntos com restrição de acesso.

Além disso, a norma também nos traz importantes orientações sobre como realizar a coleta de
manifestações realizadas verbalmente, bem como transcrevê-las:

Art. 13. [...]

§ 1º Na transcrição de manifestações a que se refere o inciso II do caput, as unidades observarão


as seguintes diretrizes:

I - registro completo, fidedigno e integral da manifestação; e

II - desmembramento adequado da demanda, efetuando registros distintos para manifestações


com tipologias, assuntos ou órgãos e entidades destinatários distintos.

§ 2º No ato de registro da manifestação, cabe à unidade de ouvidoria informar ao manifestante


o número de protocolo e informações para acesso e acompanhamento dos procedimentos
relacionados ao tratamento de sua manifestação.

2.1. Encaminhando uma denúncia para outro órgão


No dia a dia de uma unidade de ouvidoria, não é raro recebermos manifestações que não digam
respeito às competências do órgão a que a unidade está vinculada. Nesses casos, via de regra, o
que se orienta é que a unidade não recuse o recebimento, e, tendo ciência de qual órgão detém
competência para resolver a questão, a ele a encaminhe o quanto antes.

No caso das denúncias, no entanto, essa regra é um pouco diferente.


No módulo II, falamos muito sobre a importância de tutelarmos a confiança do denunciante.

A tutela da confiança do denunciante é uma preocupação que deve se iniciar desde o


recebimento da denúncia.

Ao realizar uma denúncia, o denunciante crê que a está endereçando ao órgão correto, e, ao
mesmo tempo, expressa a sua confiança em que aquele órgão pode resolver o problema
relatado. Um servidor de uma universidade pública, por exemplo, descrente de que consiga
fazer com que as unidades da própria universidade venham a apurar determinado fato, pode
acreditar que, realizando a denúncia ao Ministério da Educação ou à CGU, essa denúncia seja
efetivamente apurada.

Nesse caso, o que podemos falar sobre as relações de confiança do denunciante em relação à
Universidade? Ora, se ele preferiu realizar a denúncia em outro órgão, provavelmente ele não
confia no órgão em que o fato ocorreu.

Contudo, caso recebida essa manifestação no MEC ou na CGU, o procedimento natural seria
realizar o encaminhamento da denúncia diretamente à Universidade. Ou seja, esse
procedimento padrão, no caso, poderia resultar em que indivíduos ou instituições para as quais
o denunciante não enviaria a denúncia tomassem dela conhecimento, bem como soubessem de
sua identidade. O resultado imediato desse procedimento seria a quebra da relação de
confiança do denunciante no órgão para o qual ele originalmente encaminhou a sua denúncia.

Para evitar que isso ocorra, o primeiro passo para a realização do encaminhamento de uma
denúncia entre unidades de ouvidoria é a comunicação com o denunciante. Vejamos as etapas
desse procedimento:

Recebe a denúncia

Identifica a unidade competente

Informa o denunciante e solicita o seu consentimento para envio de seus


elementos de identificação à unidade competente

Não obteve consentimento: realiza a pseudonimização

Encaminha à unidade competente

Ao informar ao denunciante acerca da ausência de competência do órgão a que a unidade esteja


vinculada para realizar a apuração da denúncia, a unidade de ouvidoria deverá solicitar o seu
consentimento a fim de que possa enviar ao órgão competente a denúncia acompanhada de
seus elementos de identificação.

Tal consentimento necessita ser expresso, ou seja, a ausência de manifestação do denunciante


deve sempre ser interpretada como negativa de consentimento.

O prazo para que o denunciante expresse o seu consentimento é de vinte dias a contar do envio,
pela ouvidoria, da solicitação de consentimento.

Caso o denunciante não consinta ou não se manifeste nesse prazo, a ouvidoria deverá realizar
o procedimento de pseudonimização, isto é, o procedimento mediante o qual ela deverá
analisar a denúncia e seus anexos e produzir uma versão da denúncia sem qualquer elemento
de identificação do denunciante, a qual poderá ser encaminhada ao órgão competente.

Mas, afinal, o que são elementos de identificação? Segundo a Portaria CGU nº 581/2021,
elementos de identificação são quaisquer dados, em qualquer formato, que permitam a
identificação de uma pessoa natural, e se classificam em:

A. Dados cadastrais: informações identificadoras perante os cadastros de órgãos públicos.


B. Atributos genéticos: características hereditárias da pessoa natural, obtidas pela análise
de ácidos nucleicos ou por outras análises científicas.
C. Atributos biométricos: características biológicas e comportamentais mensuráveis da
pessoa natural que podem ser coletadas para reconhecimento automatizado.
D. Atributos biográficos: são os dados de pessoa natural relativos aos fatos da sua vida, tais
como nome civil ou social, data de nascimento, filiação, naturalidade, nacionalidade,
sexo, estado civil, grupo familiar, endereço e vínculos empregatícios.

Assim, referências em primeira pessoa na narrativa da denúncia, dados pessoais e cadastrais,


por exemplo, deverão ser removidos pela unidade de ouvidoria antes do envio da denúncia à
unidade competente.

Isso significa que a denúncia a ser enviada é uma denúncia anônima? A resposta é não.
Pseudonomização é diferente de anonimização. Se, nesse último caso, torna-se impossível, por
meios razoáveis, re-identificar a denúncia, no primeiro caso os dados cadastrais do denunciante
seguem no sistema, mas apenas a ouvidoria original terá acesso a eles.

A Portaria CGU nº 581/2021 nos informa as cautelas mínimas que a unidade deve adotar ao
realizar o procedimento de pseudonimização:

I - em registros fotográficos ou fonográficos, verificar a existência de dados biométricos tais


como voz do denunciante ou imagem sua, ou que permitam identificá-lo; e

II - na descrição do fato e no texto de documentos anexos, verificar a existência de narrativas


em primeira pessoa que associem o denunciante a indivíduos, locais, tempos ou fatos
específicos.

Há, entretanto, outras cautelas que podem ser adotadas também, como por exemplo a
verificação, nos dados dos arquivos eventualmente anexados, se neles constaria autoria do seu
elaborador.

Além disso, a Portaria enumera alguns meios de pseudonimização que podem ser adotados, tais
como:
A. Produção de extrato: produção de um novo documento, que não consigne elementos
de identificação do denunciante;
B. Produção de versão tarjada: produção de cópia do documento original com aposição de
tarjamento sobre os elementos de identificação. Ao utilizar desse método, é importante
que a unidade de ouvidoria se certifique de que o tarjamento sobre a cópia do
documento original não seja reversível, isto é, que, de posse do documento tarjado, não
seja possível descobrir o conteúdo da infromação tarjada; e
C. Redução a termo de gravação ou relato descritivo de imagem: trata-se da transcrição
de arquivo de áudio ou de imagem. Áudios ou imagens podem constituir em atributo
biográfico (voz ou imagem de pessoa) do próprio denunciante, o que levaria a sua
identificação, razão pela qual em muitas circunstâncias é recomendável o uso desse
método de pseudonimização.

2.2. Tramitando denúncia para unidade de


apuração
Se antes falamos sobre encaminhamento entre órgãos, agora falamos em trâmite entre
unidades. Qual a diferença? Quando falamos em encaminhamento, estamos falando do
compartilhamento de uma informação entre órgãos ou entidades distintos, como é o caso do
encaminhamento de uma denúncia do MEC a uma Universidade Federal, por exemplo. De forma
diferente, o trâmite é um tratamento que ocorre dentro do órgão, entre distintas unidades.

No caso da denúncia, o trâmite ocorrerá sempre da unidade de ouvidoria para a unidade de


apuração. Se usarmos o nosso exemplo, o trâmite consistiria no envio da denúncia da unidade
de ouvidoria do MEC para a corregedoria, auditoria interna ou comissão de ética do próprio
MEC.

No caso de trâmites internos, há de se analisar de outra forma aquele raciocínio que


desenvolvemos para explicarmos o modo como devemos solicitar o consentimento do
denunciante antes do encaminhamento da denúncia. Aqui não falamos de órgãos distintos, e,
imagina-se, o denunciante, ao denunciar ao órgão, tem a expectativa de que ele apure a
denúncia.

Isso significa que não há a necessidade de preservar a identidade do denunciante no trâmite de


uma denúncia? A resposta é não; a tutela da confiança, aqui, se traduz em uma série de medidas
destinadas a garantir que somente aquelas pessoas que tenham verdadeira necessidade de
conhecer a identidade do denunciante tenham acesso a essa informação.

Assim, o procedimento padrão de trâmite entre unidade de ouvidoria e unidades de apuração é


a pseudonimização. Aqui não falamos em solicitação nem nada do tipo, apenas e tão somente
a pseudonimização antes do trâmite à área de apuração.

Muitas vezes a identidade do denunciante é dispensável para as finalidades da investigação,


razão pela qual não existe necessidade de conhecer da área de apuração acerca desta
informação. Todavia, sabemos que essa não é uma realidade em 100% dos casos. Quando o
denunciante é, por exemplo, uma vítima da ação ou omissão relatada, muitas vezes conhecer
de sua identidade é essencial para a unidade de apuração.
Em tais casos, a unidade de apuração deverá solicitar à unidade de ouvidoria, de modo
justificado, o trâmite dos elementos de identificação do denunciante, circunstância em que o
trâmite desses elementos se torna possível.

Veja abaixo a diferença entre encaminhamento e trâmite no caso de denúncias:

Tipo de tratamento Destinatário Envio de elementos de identificação do


denunciante
Encaminhamento Outro órgão Mediante consentimento do denunciante.
Trâmite Unidade de Mediante solicitação fundamentada da unidade de
Apuração apuração.

3. Denúncias de retaliação
A partir da regulamentação da Lei nº 13.608/2018, as denúncias relacionadas a atos de
retaliação contra denunciantes passaram a ter um rito próprio, que necessita ser observado por
todas as unidades que integram o Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo Federal (SISOUV).

A retaliação consiste no ato de buscar causar dano a determinada pessoa ou grupo de pessoas
tendo como motivação suposto dano causado por referida pessoa ou grupo de pessoas a si
próprio. Isso significa que o ato de retaliar está diretamente vinculado a uma causa, e no caso
específico, essa causa necessita ser a apresentação de uma denúncia.

Em geral, o agente da retaliação tende a ser o próprio denunciado; todavia, não raro esse ato
pode ser executado por terceiro que guarde eventual vínculo com ele. Vínculos tais como
hierárquicos, familiares, sociais ou até mesmo forjados em função do próprio ato denunciado
podem caracterizar uma retaliação ao denunciante executada por terceiro interessado.

Em todas essas circunstâncias, para que o denunciante sofra a retaliação, é necessário que o
agente retaliador saiba quem ele é; ou seja, é necessário que elementos de identificação do
denunciante cheguem ao conhecimento desse agente. É claro que isso pode ocorrer de várias
formas, inclusive por culpa do próprio denunciante, o qual muitas vezes acaba expondo indevida
ou inadvertidamente o fato de que realizou a denúncia.

No entanto, se não considerarmos essa hipótese, as únicas possibilidades restantes seriam


relacionadas a falhas nos controles e proteções à sua identidade – os quais, seguido o rito
estabelecido no Decreto, poderiam ocorrer:

a. Em unidade distinta da ouvidoria, que tenha recebido a denúncia indevidamente;


b. Na unidade de ouvidoria;
c. Na unidade de apuração.

Em vista disso, a competência para o recebimento e tratamento de denúncias de retaliação


passa a ser do órgão central dos sistemas de ouvidoria e correição: a CGU.

Dessa forma, recebida a denúncia de retaliação por qualquer unidade de ouvidoria, ela deverá
encaminhá-la diretamente à CGU, a fim de que o órgão dê o correto tratamento à demanda.

O Decreto nº 10.153/2021 estabelece um critério específico relacionado às denúncias de


retaliação.
Esse critério diz respeito à pre-existência de uma denúncia que tenha sido considerada
habilitada após o procedimento de análise prévia. Isso decorre do fato de que as garantias
contra retaliação passam a valer somente quando a denúncia oferecida é considerada habilitada
pela unidade de ouvidoria. Desse modo, não há que se falar em proteção contra retaliação em
face de uma denúncia que tenha sido arquivada na unidade de ouvidoria, sem o envio à unidade
de apuração.

Assim, a denúncia de retaliação deverá:

A. indicar a denúncia original que tenha ensejado ato comissivo ou omissivo de retaliação,
por meio de número de protocolo válido gerado pelo sistema de uso obrigatório no
Poder Executivo Federal (Fala.BR);
B. Na hipótese de o órgão não utilizar o sistema, deverá indicar o conteúdo da denúncia
original e o comprovante de envio à unidade de ouvidoria competente.

Cabe à Ouvidoria-Geral da União a verificação do requisito de habilitação da denúncia original.

4. Características básicas das denúncias


Uma denúncia pode ser apresentada por vários motivos. De forma geral, as denúncias abordam
descumprimento de procedimentos, problemas de gestão de pessoas, desvio de
comportamento ético, ocorrência de fraudes e violação de normas legais e regulamentares. Em
outras palavras, qualquer ato ilícito pode ser objeto de denúncia. Nesta seção, todos os
exemplos que utilizaremos serão baseados em denúncias recebidas pela CGU, as quais tiveram
os nomes dos envolvidos e locais dos fatos alterados a fim de descaracterizá-las.

As denúncias podem conter diversas características que podem se apresentar em separado ou


em conjunto:

4.1. Quanto à autoria do fato


O ideal é que denúncias apresentem autoria. Todavia, por vezes o denunciante tem
conhecimento do fato irregular, mas não tem ciência de quem o realizou ou permitiu que
ocorresse. Por conseguinte, a denúncia vem relatando o fato sem afirmar quem é o responsável.
A ausência de autoria não impede que a denúncia seja aceita, tendo em vista que a realização
de uma investigação preliminar (ou até mesmo uma análise prévia na ouvidoria) pode identificar
a autoria.

Exemplo de denúncia com autoria:

“Gostaria de informar irregularidades (vide anexos): uma Servidora Federal, do Instituto Federal
de XX, chamada "ROSA XXX", com sérissimos problemas de saúde, foi induzida pelo diretor geral
do Campus XX - OSWALDO XXXX, pelo diretor de ensino TADEU XXXX, e outros interessados -
MARCOS XXXX, seu ex-chefe, a pedir exoneração. O fato é que a mesma estava sendo assediada
moralmente por seu ex-chefe MARCOS. Ela reclamou, denunciou, pediu respeito e, sem êxito, por
isso, começou a ter depressão e outros problemas de saúde. Reclamou a ambos os diretores, que
preferiram não por a mão no problema. E tudo isso ela tem documentado em papel/e-mail.
Assim, começou a faltar do serviço e sem atestado, mas tentou se restabelecer. Dessa forma,
qdo a mesmo começou a se defender do assédio, ambos os diretores e chefe, abriram processo
administrativo disciplinar para assustá-la, pois a mesma tava em estágio probatório. Fizeram de
tudo com ela, trancaram-na em sala fechada e torturam ela dizendo que se o processo seguisse,
ela poderia ser exonerada a bem do serv. público e não mais ser servidora pública em nenhum
lugar. Acabaram com nossa colega, e mais, ao fazer isso tudo, ainda obrigaram ela a pedir
exoneração e, a presidente da comissão de sindicância do processo administrativo - FRANCISCA
XXXX, também responsável e a mando dos mesmos senhores e do sr TIBÉRIO, professor lotado
na reitoria, aceitou pedido de exoneração, contrariando a lei, que proíbe pedido de demissão
durante processo admin. disciplinar, até sua conclusão. A FRANCISCA só aceitou, pq a ROSA XXXX
pediu apurar suas denúncias de assédio e isso envolveria gente grande, e para isso não acontecer
e tudo ser arquivado, resolveram dar cabo da ROSA, q agora está muito ruim de saúde e, sem o
emprego federal. E outra coisa, a FRANCISCA foi eleita recentemte p/ representar os servidores
administrativos na XXXXX, uma Comissão, e nunca poderia fazer isso com uma colega. Falem c
a ROSA. CGU, pedimos justiça, pois no IFXX, tem muita coisa errada mesmo.”

Exemplo de denúncia sem autoria:

“Boa tarde, gostaria de fazer uma denuncia de um Servidor Público Federal, ele trabalha no setor
de recursos humanos, e faz o cadastro para ter acesso ao contracheque, mas nunca se encontra
no lugar do trabalho, saí cedo para o almoço e só volta às 3 da tarde. Mas outra pessoa fez o
cadastro pra mim. Mas como fica esse funcionário? Porque ganha bem e não trabalha”.

4.2. Quanto à materialidade


A percepção da gravidade do fato pelo denunciante muitas vezes não corresponde à realidade
fática do órgão. Em algumas situações o cidadão entende que um fato é grave e merece uma
apuração e aplicação de penalidade, entretanto, muitas vezes um simples esclarecimento
administrativo elucida a questão, não caracterizando uma irregularidade.

Por outro lado, a denúncia pode relatar fatos gravosos, com a existência de detalhes específicos,
o que caracteriza sua materialidade.

As denúncias com materialidade se caracterizam como denúncias que apresentam os requisitos


para apuração, ou seja, são passíveis de serem apuradas.

Exemplo de denúncia com materialidade:

“O Governo Federal, através do Min. das Cidades, disponibilizou por empréstimo recursos do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2) no valor de R$ 250 milhões ao município de
XXXXXX (MG) para combater as consequências das frequentes enchentes que vêm assolando a
cidade nos últimos anos, trazendo graves danos à população. Segundo informações, o
pagamento deste empréstimo concedido ao município de XXXXX pelo Governo Federal foi
assumido pelo Estado de Minas Gerais, que ainda acrescentou uma contrapartida de R$ 50
milhões, resultando numa verba total a ser disponibilizada em R$ 300 milhões. Para realizar os
estudos necessários para alocar estes recursos foram contratadas empresas públicas e privadas:
DEPARTAMENTO DE OBRAS PUBLICAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS (DEOP-MG), YYYYYYY e
ZZZZZZ. Na segunda audiência pública, realizada no dia 10.03.11, em XXXXX, declarações feitas
por uma técnica da YYYYYYY deram conta que o valor pago pela Administração Pública de
XXXXXX pelo pré-projeto tinha chegado a R$ 7,5 milhões. Conforme foi apontado, também pelo
representante do Ministério Público na primeira audiência pública, houve inclusive o uso de
‘control C e control V’, recurso no computador do recorta e cola, de um EIA realizado no Rio A e
Rio B, tendo indícios de que o elaborador do EIA do Sistema do Rio XXX apenas trocou os nomes
dos rios (para C e D) no texto. Ou seja, o EIA caríssimo foi feito sem estudos ambientais
adequados. É evidente a falta informações à população, obrigatória por lei, por parte dos órgãos
públicos. Neste sentido peço a ajuda da CGU, na fiscalização do uso do dinheiro público (250
milhões de reais do Governo Federal) e determinação de que a Administração Pública de XXXXXX
pratique o mínimo de transparência exigida por lei. Agradeço desde já a atenção.”

Exemplo de denúncia sem materialidade:

“Diversos servidores não comparecem para trabalhar por longo período ou apenas passam
alguns minutos durante o dia e muitos funcionários terceirizados faltam constantemente e não
cumprem horário, tudo com consentimento do superintendente. Seguraram a implantação do
ponto por muitos meses e quando funcionar será apenas para os servidores e os terceirizados,
principalmente os administrados, não serão controlados, ficando largados e liberados para
continuarem faltando e sem compromisso de horário.”

“licitações duvidosas”

4.3. Quanto à compreensão


Como qualquer manifestação de ouvidoria, a denúncia pode se apresentar de forma clara,
concisa e com padrões de escrita que auxiliam a sua boa compreensão. Todavia, em alguns
casos, o denunciante não consegue se expressar adequadamente, o que impede a compreensão
dos termos da denúncia e inviabiliza a análise prévia na ouvidoria.

Exemplo de denúncia compreensível:

“A Superintendência Federal do xxxxx (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento),


lançou uma aviso de licitação superfaturado. Pregão eletrônico numero xx/20xx- uasg xxxxxx. O
pregão visava a contratação de recepcionista, com um salário 2 vezes maior que o piso da
categoria. O edital estipulava um valor mínimo a ser pago as recepcionstas (valor duas vezes
maior que o piso da categoria), vale salientar que o valor de 1800 reias é duas vezes maior que
o pago por todos os órgaos pesquisados. O edital dizia que as empresas so poderiam oferecer
lances a partir de 1800 reias. Totalmente ilegal.”

Exemplo de denúncia incompreensível:

“Fui ao Bacen em 25/09/201X e retirei a resposta de um SISBACEN nº XXXXXXX o qual é indigno


de licitude de fatos e lógica. Diz que tem que ser aberto ouvidoria e não processo interno ou
externo. O advogado da ação trabalhista é demitido a bem do serviço público e ameaça parte
para compra de imóveis. O auditor Antonio XXXXXX roubou chave da casa de Gisele e a estupro
alérm de roubar processos no judiciário como parte interessada. A gerente atinga da agência
XXXXX, Marcia XXXXXXX roubou e copiou chaves da casa de Gisele para invasão de domicílio.
Gisele se encontra sequestrada e em carcere privado em domicílio. Foi estuprada na unidade de
trabalho e no departamento de recursos humanos durante falso PRO por Vera XXXXXX e Ricardo
Funcionária presidenciavel não consegue atuar como devido a humilhação e ligação deameaça
a outros com difamação, calúnia e injuria de Gisele por Cristina XXXXXX e companhia. Geraldo
XXXXXX e Francisco XXXXXX fingem ser médicos do trabalho e entregam pareces de interdição e
internação de empregada aposentada por invalidez a sequestradores”.

4.4. Quanto ao objeto


Denúncias podem apresentar uma multiplicidade de assuntos. Em geral, a maioria das denúncias
possui objeto passível de ser apurado por unidades de apuração específicas como auditoria,
correição ou ética.

Exemplo de denúncia a ser apurada pela auditoria/fiscalização:

“Desvio ds recurso do IGD M Bolsa Familia pela Secretaria da Assitencia Social e primeira dama
Maria XXXXXXX foram vários entre 2013 e 2016, por último um saque no mês de novembro de
2016 um saque de 42 mil sem que houvese despesas que justificases pra esse pereiodo, roubo
ants de sair da administração, contabilizados todos esses anos com notas fria adquiridas em
XXXXXX e com foncedor local, XXXXXXX, od projetos pra gastos feitos pela funcionaria Ana
XXXXXX e as falsas pretações de contas pela Assistente Socail Juliana XXXXXX. essa é a segun vez
que faço essa denuncia! Houve desvios no outros benficios, serviços fantamas e notas frias em
todos!”

Exemplo de denúncia a ser apurada pela Corregedoria:

“Alguma providência precisa ser tomada na Superintendência de Tecnologia da Informação no


que tange a pessoa do gestor XXXXXX. O comportamento deste cidadão perante as mulheres é
simplesmente deplorável. Sempre fazendo comentários indiscretos, solicitando reuniões a porta
fechadas sempre com mulheres, forçando cumprimentos de forma mais próxima, sendo
indiscreto nos comentários. É muito desrespeito numa Superintendência que já possui tanto
trabalho a ser feito ainda termos, nós mulheres, que passar por um constrangimento deste e
uma conduta imprópria caracterizada por investidas insistentes a cada mulher da STI. Alguma
providência precisa ser tomada em relação a esse senhor desqualificado e assediador de
mulheres na Superintendência de Tecnologia da Informação e provavelmente deve manter o
mesmo comportamento com outras mulheres da instituição.”

Exemplo de denúncia a ser apurada pela Comissão de Ética:

“Quero denunciar o servidor xxxx, lotado na yyyyy, que fica toda hora pedindo dinheiro
emprestado para os colegas. Pior, ele não paga os empréstimos. E ainda por cima temos que
ficar atendendo um monte de ligações de pessoas cobrando dívidas dele. Chegou ao ponto dele
ter desligado o telefone para não receber mais ligações, pode? Esta situação está atrapalhando
o bom andamento do serviço. Peço providências”.

4.5. Quanto à competência


Por desconhecimento do cidadão, algumas vezes denúncias são encaminhadas para órgão que
não tem competência para apurar os fatos. Neste caso, a ouvidoria poderá fazer o
encaminhamento para o órgão competente, como visto nesse módulo.

Exemplo de denúncia com existência de competência da CGU para apuração1:


“Tenho informações de que uma mulher de nome FERNANDA XXXXXXXX, residente em São
Bernardo do Campo, SP, à Rua XXXXX nº YYY, bairro XXXXXXX, CEP XXXXX-200, ela recebe o bolsa
família, porém, ela trabalha, o pai dela é autônomo (pedreiro), a mãe dela, dona Solange,
trabalha em indústria há muitos anos (é registrada), o pai do filho dela paga pensão ao filho,
enfim, ela tem uma rede de proteção que não justifica receber o benefício. Ela nasceu em
12/06/19XX.

Ela tem um filho que se chama XXXXXX, de 6 anos de idade. Ela mora com o pai e a mãe que
possui casa própria (sem escritura). Vejam o facebook dela em -
https://www.facebook.com/profile.php?id=XXXXXXXXX”

Exemplo de denúncia com ausência de competência da CGU para apuração:

“estava parado num ponto proximo ao cemiterio do picanço quando veio um veiculo da placa
nwa59XX veio e colidio com meu carro e saiu como se nao tivese acontcido nada mas fiquei com
um grande prejuiso e o carro se esvadiu do local quando cheguei ja estava com o prejuízo”

5. Revisão do módulo
• O trabalho a ser desempenhado pela equipe da ouvidoria não deve ser confundido com
o das áreas de apuração. Cabe à ouvidoria, por ocasião da análise prévia, coletar a
maior quantidade possível de elementos de convicção para, primeiramente, formar
juízo quanto à aptidão da denúncia para apuração. Desta forma, na hipótese de a
denúncia ser considerada habilitada, esta será encaminhada para unidade de apuração
com maiores elementos de materialidade.
• No âmbito do Poder Executivo federal, a CGU é competente para acompanhar o
tratamento e a apuração de denúncias envolvendo agente público no exercício de
cargos comissionados do Grupo Direção e Assessoramento Superiores – DAS a partir do
nível 4 ou equivalente, e por isso as ouvidorias devem informar à Ouvidoria-Geral da
União (OGU) quando receberem denúncias contra esses agentes.
• O assédio moral consiste na prática de comportamentos humilhantes, constrangedores,
torturantes, vexatórios, os quais podem ser evidenciados por meio de palavras, gestos
ou atitudes reiteradas e por um lapso temporal demorado, que causam uma degradação
deliberadas das condições de trabalho. A prática de assédio moral mais comum é do
superior hierárquico em desfavor do subordinado (assédio vertical). Entretanto, o
assédio moral também pode envolver um colega de serviço (assédio horizontal) ou um
subordinado em relação ao chefe (assédio ascendente).
• A conduta de assédio sexual se caracteriza como crime, tipificado no Código Penal como
“constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual,
prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência
inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Conforme a posição doutrinária
majoritária, para que haja a configuração da conduta de assédio sexual
necessariamente deve existir uma relação laboral entre quem assedia e quem é
assediado. O denunciado deve ser superior hierárquico do agente que sofre o assédio
sexual, consequentemente, detendo a capacidade de influenciar e decidir acerca da vida
profissional do subordinado, tendo em vista o cargo ou função que ocupa. Situações não
enquadradas em uma relação de subordinação hierárquica não se caracterizam como
assédio sexual.
• As denúncias podem apresentar diversas características as quais podem se apresentar
em separado ou em conjunto: quanto à autoria do fato - o ideal é que denúncias
apresentem autoria. Todavia, por vezes o denunciante tem conhecimento do fato
irregular, mas não tem ciência de quem realizou ou permitiu a impropriedade. Por
conseguinte, a denúncia vem relatando o fato sem afirmar quem é o responsável. A
ausência de autoria não impede que a denúncia seja aceita, tendo em vista que a
realização de uma investigação preliminar, ou até mesmo uma análise prévia na
ouvidoria pode identificar a autoria; quanto à materialidade - a percepção da gravidade
do fato pelo denunciante muitas vezes não corresponde à realidade fática do órgão. Em
algumas situações o cidadão entende que uma situação é grave e merece uma apuração
e aplicação de penalidade, entretanto, muitas vezes um simples esclarecimento
administrativo elucida a questão, não caracterizando uma irregularidade. Por outro
lado, a denúncia pode relatar fatos gravosos, com a existência de detalhes específicos
dos fatos, o que caracteriza a materialidade dos fatos; quanto à compreensão - como
qualquer manifestação de ouvidoria, a denúncia deve se apresentar de forma clara,
concisa e com boa ortografia. Todavia, em alguns casos, o cidadão não consegue se
expressar adequadamente, mesmo tendo bom domínio sobre a língua escrita, o que
impede a compreensão dos termos da denúncia, inviabilizando a análise prévia na
ouvidoria. Em outros casos, mesmo com domínio precário, consegue-se entender os
termos da denúncia; quanto ao objeto - denúncias apresentam multifários assuntos.
Em geral, a maioria das denúncias possuem objeto passível de ser apurado por
unidades de apuração específicas de auditoria ou de correição ou de ética; quanto à
competência - por desconhecimento do cidadão, algumas vezes denúncias são
encaminhadas para órgão que não tem competência para apurar os fatos. Neste caso,
a ouvidoria poderá fazer o encaminhamento para o órgão competente. No Poder
Executivo Federal, por meio da plataforma Fala.BR, é possível encaminhar
automaticamente a manifestação para o órgão que detém a competência de
MÓDULO IV: A análise prévia
Chegamos aqui em nosso quarto e último módulo, no qual veremos fundamentos para a
realização de uma boa análise prévia da denúncia. Lembre-se: esse é um dos procedimentos
mais críticos do processo de tratamento de denúncias no âmbito das ouvidorias públicas, visto
que, de um lado, ele permite que a denúncia seja tramitada à unidade de apuração a fim de que
os fatos sejam investigados e os responsáveis, caso confirmado o fato, sejam responsabilizados,
de outro lado, é com a habilitação da denúncia pela unidade de ouvidoria que os direitos contra
retaliação ao denunciante previstos na Lei nº 13.608/2018 passam a surtir efeito.
1. Análise prévia
Como você já sabe, cabe à ouvidoria promover a análise prévia da denúncia, verificando se há
elementos suficientes para dar início à apuração dos fatos narrados.

Entretanto, antes do início da análise prévia, é necessário realizar uma avaliação sobre a correta
classificação da manifestação quanto à sua tipologia. A denúncia recebida corresponde, de fato,
a uma denúncia? A correta classificação da manifestação aumenta a eficiência e a celeridade no
tratamento e resposta ao cidadão.

Não raro, manifestantes tendem a confundir denúncia com reclamação. Isso porque o termo
denúncia é carregado com um sentido de gravidade maior, e, a depender da percepção do
manifestante, determinados problemas de gestão, que não estariam diretamente relacionados
ao cometimento de ilícitos ou irregularidades, poderiam ser assim designados. Nesse caso, a
primeira ação da unidade de ouvidoria deve ser indagar: o fato narrado apresenta-se como um
problema de gestão ou apresenta-se como uma ilegalidade ou irregularidade?

Caso se trate de um problema de gestão, a ouvidoria deverá reclassificar a manifestação,


procedimento disponível na Plataforma Fala.BR.

Podemos identificar uma classificação indevida de manifestação no seguinte exemplo: cidadão


denuncia ao Ministério da Saúde a falta de medicamento em Posto de Saúde. Apesar de ser um
grave problema, na realidade, não se trata de ato ilícito e sim de falha na prestação de serviço
público.

O encaminhamento dessa denúncia à Auditoria, por exemplo, não ajudaria diretamente, pois o
processo de apuração das causas da falta de medicamento poderia demorar meses ou anos;
seria mais útil para o planejamento das ações de auditoria, como uma informação gerencial
sobre o volume de manifestações sobre o assunto. Por isso, a manifestação do usuário deveria
ser reclassificada como uma reclamação e enviada imediatamente à área capaz de solucionar o
suprimento de medicamentos, dando-se a devida ciência ao cidadão acerca das providências
que serão adotadas.

Após verificar que a manifestação está corretamente classificada como denúncia, passa-se à
análise prévia.

Como regra, não devem ser admitidas denúncias vazias, superficiais ou confusas. Nesses casos
caberá à equipe da ouvidoria entrar em contato com o denunciante, solicitando esclarecimentos
ou informações adicionais que sejam necessárias.

As denúncias vazias e superficiais são aquelas que não oferecem elementos que apontem para
irregularidades que possam servir de fundamento para a apuração realizada pela área
competente. Nesse caso, a denúncia não se apresentará habilitada para ser apurada.

A análise prévia tem como objetivo avaliar a existência de requisitos que amparem a recepção
da denúncia no órgão.

Esses requisitos podem se apresentar em conjunto ou separados. Veja, por exemplo, o caso de
uma denúncia que descreve fraude em licitação em determinado órgão, mas que não aponta o
responsável pela fraude: nesse caso, somente o aprofundamento da questão, por meio de um
trabalho de auditoria, poderia delimitar a autoria do fato.
Podemos ainda tomar um outro exemplo, em que a denúncia relata que chefe assediaria
moralmente subordinado, mas sem juntar nenhum elemento probatório. Nesse caso, temos a
autoria dos fatos, mas a ouvidoria, por meio de pesquisa em sistemas, não teria como obter
indícios de que o assédio realmente ocorreu. A irregularidade só poderá ser comprovada com o
aprofundamento da questão por meio de investigação correcional.

Lembramos ainda que os fatos denunciados devem ser considerados como supostas
irregularidades, tendo em vista que no momento da análise prévia não há como se afirmar a
ocorrência do fato relatado, o que somente será possível ser confirmado após a completa
apuração pela unidade de apuração.

1.1. Requisitos para Habilitação da denúncia


A denúncia recebida será conhecida caso contenha elementos mínimos descritivos da
irregularidade ou indícios que permitam à administração pública chegar a tais elementos. Os
principais requisitos a serem verificados numa análise prévia de ouvidoria são:

I- referir-se a matéria de competência da instituição da qual a ouvidoria faz parte;

II- ser redigida com suficiente clareza, de maneira inteligível;

III- conter informações sobre:

a) o fato;

b) a autoria do fato;

c) as circunstâncias;

d) os valores envolvidos;

IV – se for denúncia sobre conduta, esta deve se referir a servidor público.

Para tanto, pesquisas deverão ser realizadas junto aos sistemas internos do órgão, aos quais
recomendamos que a ouvidoria tenha acesso, bem como às fontes de consulta externas
pertinentes, para identificar indícios de veracidade da questão denunciada. Dada a diversidade
de assuntos denunciados, as pesquisas também se apresentam diversas e dinâmicas. Lista-se
abaixo um rol exemplificativo, de pesquisas que podem ser realizadas:

• Se o fato denunciado tem relação com o órgão que recebeu a denúncia;

• Se a pessoa denunciada realmente é agente público;

• Se a pessoa denunciada realmente ocupa o cargo público que é citado na denúncia;

• Se a pessoa denunciada trabalha no órgão onde ocorreu o suposto fato irregular;

• Se existem outras denúncias sobre o fato/agente;

• Se o contrato citado na denúncia existe;

• Se o processo administrativo citado na denúncia existe;

• Se o certame licitatório denunciado existe;


• Se o objeto do contrato denunciado já foi cumprido;

• Se o pagamento do contrato denunciado já foi realizado.

Após a realização da análise prévia, na hipótese de requisitos de habilitação da denúncia


estarem presentes, esta será encaminhada à unidade responsável pela apuração, seja a
auditoria, corregedoria, comissão de ética, outra unidade administrativa ou ainda ao Ministério
Público ou Tribunal de Contas. Conforme já explicitado, é importante que os sistemas
eletrônicos de análise e encaminhamento da denúncia sejam de acesso restrito, de forma que
somente tenham acesso ao conteúdo da denúncia aqueles que possuam necessidade de
conhecê-la.

Após o encaminhamento da denúncia à unidade de apuração ou após o seu arquivamento,


deverá ser fornecida resposta ao cidadão informando qual o tratamento dado à denúncia.

Essa resposta deverá ser formulada numa linguagem simples, também denominada linguagem
cidadã, como aprendemos no curso “Serviços Públicos e Defesa dos Usuários”.

Por fim, ressalta-se a necessidade de que a ouvidoria possua instrumentos de classificação de


denúncias que apresentem caráter de urgência, tais como atentados à vida, à integridade física,
cometimentos de crimes e similares. Tendo em vista denúncias desse tipo apresentarem dano
iminente e irreparável, não é plausível que estas sejam analisadas no mesmo tempo daquelas
que não apresentam caráter de urgência. Faz-se necessário que a análise e o encaminhamento
destas sejam priorizadas na ouvidoria.

1.2. Fontes de consulta


Diversos sistemas estão disponíveis na internet, a maioria com acesso livre, auxiliando, em
muito, na procura de elementos mínimos de autoria e materialidade para subsidiar a análise
prévia da denúncia. Além desses, os sistemas internos dos órgãos também devem ser utilizados
para comprovar indícios de veracidade. Podemos destacar as seguintes fontes de consulta:

• Página do Tesouro Nacional: informações sobre transferências a Estados e Municípios.


Acesso ao Serviço Auxiliar de Informações para Transferências Voluntárias (CAUC), que averigua,
diariamente, requisitos fiscais necessários à efetivação de uma transferência voluntária de
recursos federais;

• Portal da Transparência: mostra dados detalhados e sistematizados sobre a execução


orçamentária e financeira do governo federal, com possibilidade de pesquisar informações por
dia e pela fase de despesa (empenho, liquidação ou pagamento). A atualização dos dados é
diária e contempla despesas, receitas, convênios, sanções aplicadas a pessoas jurídicas e
informações sobre servidores e imóveis funcionais, além de consultas temáticas, como o Bolsa
Família, diárias e Cartão de Pagamento do Governo Federal;

• Plataforma +Brasil: utilizado para administrar as transferências voluntárias de recursos


da União nos convênios firmados com Estados, Municípios, Distrito Federal e também com as
entidades privadas sem fins lucrativos;

• Sistema de acompanhamento de obras (SIURB): é o sistema da Caixa Econômica Federal


que permite o acompanhamento físico-financeiro de contratos de repasse formalizados com
aquela instituição. O controle pode ser feito também visualmente, pois o sistema traz fotografias
digitalizadas das obras e serviços contratados em seus diversos estágios de desenvolvimento;

• Sistema Integrado de Monitoramento de Convênios da Funasa (SISMOC): permite


acessar informações sobre os convênios ou termos de compromisso firmados pela FUNASA com
os municípios;

• Portal do FNDE: permite o acompanhamento das liberações de recursos destinados à


educação básica;

• Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle – SIMEC: permite o


acompanhamento de obras do FNDE;

• Sistemas DATAPREV: concessões de benefícios previdenciários e vínculos empregatícios;

• Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI): consiste no


principal instrumento utilizado para registro, acompanhamento e controle da execução
orçamentária, financeira e patrimonial do Governo Federal;
• Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (SIAPE): sistema de controle
de dados cadastrais, pessoais, funcionais e de processamento da folha de pagamento de
servidores ativos e inativos, pensionistas e aposentados do Governo Federal;

• Portal de Compras (COMPRASNET): reúne grande número de informações voltadas para


licitações. Também é meio de acesso ao SIASG - Sistema Integrado de Administração de Serviços
Gerais;

• CNESWEB: cadastro de todos os profissionais de saúde e estabelecimentos de saúde


públicos, conveniados e privados, que realizam qualquer tipo de serviço de Atenção à Saúde no
território nacional;

• Página do Fundo Nacional de Saúde: permite consultar transferências de recursos nas


modalidades de convênio, fundo a fundo, contrato de repasse e termo de execução
descentralizada;

• Página do Fundo Nacional de Assistência Social: permite consultar repasses no âmbito


do Sistema Único de Assistência Social;

• SIGA BRASIL: Sistema de Informações Orçamentárias do Senado Federal que reúne


diversas bases de dados (SIAFI, SIOP, SELOR, etc.). Este Sistema é disponibilizado no site do
Senado Federal;

• Páginas dos Tribunais de Contas Estaduais;

• Páginas de Transparência Municipais.

Veja, a seguir, alguns parâmetros de pesquisa relevantes, de acordo com o tema:

a) Servidores

Principais informações a pesquisar:

• Nome;

• Matrícula SIAPE;

• Lotação;

• Cargo;

• Existência de registros no CGU-PAD (MACROS).

Situações mais frequentes:

• Exercício de gerência em empresa privada;

• Descumprimento de regime de dedicação exclusiva;

• Descumprimento de regime de dedicação integral;

• Descumprimento de jornada de trabalho;

• Acumulação ilegal de cargos.


*Observação: Relatos envolvendo a conduta de agentes terceirizados devem ser tratados no
âmbito da gestão do contrato destes profissionais.

Principais fontes de consulta:

• SIAPE;

• MACROS;

• Portal CNIS;

• Página da Receita Federal - consulta a partir do CNPJ


(https://www.receita.fazenda.gov.br/pessoajuridica/cnpj/cnpjreva/cnpjreva_solicitacao2.asp):
emite o comprovante de inscrição e situação cadastral de pessoa jurídica. Abaixo do documento
exibido, há um botão para consulta ao Quadro de Sócios e Administradores (QSA);

• CnesWeb;

• Portal da Transparência: a consulta à Relação de Vínculos por nome ou CPF exibe o vínculo
atual com o governo federal e os anteriores:
http://www.portaltransparencia.gov.br/servidores/consulta?ordenarPor=nome&direcao=asc

b) Licitações e Contratos

Principais informações a pesquisar:

• Número da licitação;

• Valor;

• Datas (ex.: do edital de licitação; de vigência do contrato);

• Fonte de recursos;

• Vencedores (pesquisa no MACROS);

• Identificação do contrato resultante.Principais fontes de consulta:

• Portal da Transparência;

• MACROS;

• Comprasnet;

• Portais de transparência estaduais (fonte de recursos);

• Portais de transparência municipais (fonte de recursos);

• SIAFI.

c) Convênios

Principais informações a pesquisar:

• Número do convênio;
• Valor;

• Datas;

• Fonte de recursos;

• Percentual de execução;

• Convenente e conveniado;

• Identificação do convênio resultante;

• Situação do convênio;

• Trabalhos de auditoria realizados (Macros);

• Relatórios publicados na página da CGU.

Principais fontes de consulta:

• SICONV;

• SIURB;

• Portal da Transparência;

• SISMOC – FUNASA;

• Página do Tesouro Nacional (CAUC);

• Portal + Brasil – Painel de Transferências Abertas, Painel Obras:


http://transferenciasabertas.planejamento.gov.br/.

d) Educação

Principais informações a pesquisar:

• Fonte do recurso;

• Número da obra;

• Número do termo de compromisso;

• Percentual de execução do projeto;

• Andamento da licitação relacionada;

• Contratação de serviço de transporte escolar;

• Nota fiscal de pagamento de serviços de transporte escolar;

• Licitação para aquisição de gêneros alimentícios.

Situações mais frequentes:

• Merenda escolar;

• Transporte escolar;
• 40 % Fundeb (ações de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino – MDE);

• Reforma de escolas;

• Construção de creches (Proinfância);

• Salário educação – QSE (TCE).

Principais fontes de consulta:

• Portal da Transparência;

• Consulta Liberações FNDE -


https://www.fnde.gov.br/pls/simad/internet_fnde.liberacoes_01_pc;

• Módulo de obras do SIMEC 2.0;

• Sisweb Tesouro (Identificar se houve complementação da União ao Fundeb);

• Portais de transparência estaduais (fonte de recursos);

• Portais de transparência municipais (fonte de recursos);

*Observação: Atualização das normas do PNAE: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-


informacao/institu-cional/legislacao/item/13511-resolução-nº-6,-de-08-de-maio-de-2020

e) Saúde e Saneamento

Principais informações a pesquisar:

• Fonte de recurso;

• Pagamento de parcela referente à transferência de recursos (datas, valores, saldo em conta);

• Situação da obra.

Situações mais frequentes:

• Reforma/construção de UBS;

• UPA;

• Equipes do Programa Saúde de Família;

• Distribuição de medicamentos;

• Terceirização da saúde pública;

• SAMU;

• Sistemas de abastecimento de água;

• Sistemas de saneamento;

• Transporte de pacientes.

Principais fontes de consulta:

• Portal da Transparência;
• Portais de transparência estaduais (fonte de recursos);

• Portais de transparência municipais (fonte de recursos);

• CnesWeb, onde é possível consultar o estabelecimento e o profissional de saúde;

• Página do Fundo Nacional de Saúde (imagem abaixo);

• Sistema Integrado de Monitoramento de Convênios da FUNASA – SISMOC. Na página do Fundo


Nacional de Saúde, o menu contém a opção Consulta de Pagamento Detalhada:

1.3. Hipóteses de encerramento de denúncias


A Portaria CGU nº 581/2021 prevê que a denúncia poderá ser encerrada em duas hipóteses:

• os fatos relatados forem de competência de órgão ou entidade não pertencente ao


Poder Executivo federal; ou (art. 15, § 3º, I); ou
• excepcionalmente, em circunstâncias necessárias à proteção integral ao denunciante,
devidamente justificadas no histórico da manifestação e comunicadas ao manifestante.
(art. 15, § 3º, II);

Estamos aqui diante de dois casos em que não ocorre nem encaminhamento nem habilitação, e
que difere das hipóteses em que a análise prévia não permitiria que a denúncia fosse habilitada.

Em ambos os casos, trata-se de encerramento de denúncia por ausência de competência do


órgão recebedor, sem o subsequente envio a eventual órgão competente.

No primeiro caso, a unidade competente não faz parte do Ente e do Poder da unidade
recebedora. Nesse cenário, o encaminhamento da denúncia provavelmente não poderia ser
realizado por meio da Plataforma Fala.BR, gerando situação de perda de rastreabilidade da
informação e eventual risco ao denunciante. Nesse caso, o ideal é informar ao denunciante
acerca do órgão competente para tratar a denúncia a fim de que ele mesmo a realize.
No segundo caso, tratamos de circunstância excepcional, quando verificada a ausência de
competência do órgão recebedor e risco real ao denunciante no órgão competente.

1.4. Recebi uma denúncia contra uma autoridade, e


agora?
No âmbito do Poder Executivo federal, denúncias que versem sobre autoridades precisam ser
comunicadas ao órgão central do sistema, no caso, a CGU. Veja bem: não se trata de encaminhar
a denúncia à CGU, mas sim de dar-lhe ciência, a fim de que o processo de tratamento e eventual
apuração possa ocorrer naturalmente junto ao órgão original. Essa regra vale para denúncias
contra qualquer agente público no exercício de cargos comissionados do Grupo Direção e
Assessoramento Superiores – DAS a partir do nível 4 ou equivalente, nos termos da Portaria CGU
nº 581/2021:

Art. 20. As unidades do SisOuv informarão ao órgão central, por meio de marcação em campo
específico na Plataforma Fala.BR, a existência de denúncia de ato praticado por agente público
no exercício de cargos comissionados do Grupo Direção e Assessoramento Superiores - DAS a
partir do nível 4 ou equivalente.

Parágrafo único. O envio da informação a que se refere o caput não desonera o órgão ou
entidade da adoção das medidas pertinentes de análise prévia e apuração dos fatos relatados.

Devemos sempre lembrar que essa informação não enseja juízo de valor, ou seja, o fato de a
ouvidoria informar à CGU a existência da denúncia não influencia a apuração no próprio órgão
onde ocorreu o fato, e nem significa que o ouvidor ou o responsável pela análise esteja
declarando que os fatos narrados realmente ocorreram, ou que o denunciado tenha
responsabilidade. O papel da ouvidoria é informar acerca de quaisquer denúncias contra esses
agentes, e o papel da CGU é acompanhar ou proceder diretamente, caso julgue necessário, à
correta apuração dos fatos.

Notadamente em relação às autoridades ocupantes de cargos nas empresas públicas e


sociedades de economia mista, faz-se pertinente fazer a correlação destes cargos com aqueles
expressos no Art. 20 da Portaria CGU nº 581/2021, para estabelecer quais denúncias desses
órgãos da administração indireta devem ser encaminhadas para a CGU.

A Orientação Normativa nº 11/2013, da Secretaria de Gestão Pública do Ministério do


Planejamento, a qual estabeleceu procedimentos quanto aos critérios para correlação dos
cargos comissionados do Grupo-Direcão e Assessoramento Superiores – DAS e Funções
Gratificadas – FGs do Poder Executivo Federal com os cargos e funções integrantes da
Administração Federal direta e indireta dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, vem
disciplinar esta correlação, conforme Anexo IV da supracitada orientação normativa:

CARGOS DO PODER CARGOS DAS EMPRESA PÚBLICAS E DAS SOCIEDADES DE


EXECUTIVO FEDERAL ECONOMIA MISTA FEDERAIS E DOS ÓRGÃOS OU ENTIDADES
DOS ESTADOS, DOS MUNICPÍOS E DO DISTRITO FEDERAL
Secretário-Executivo Autoridade máxima da empresa pública federal, estadual ou
municipal, sociedade de economia mista federal, estadual ou
municipal, ou autoridade máxima subordinada ao Secretário
Estadual, Municipal ou Distrital do órgão ou entidade
cessionário
DAS 6 2º
DAS 5 3º
DAS 4 4º
DAS 3 5º
DAS 2 6º
DAS 1 7º
FG 1 8º
FG 2 9º
FG 3 10º

Em relação às denúncias contra autoridades realizadas junto às ouvidorias estaduais, distritais e


municipais, cabe a elaboração de normativos que definam procedimentos específicos de
atuação. Nos estados e municípios que possuem controladorias-gerais, entendemos pertinente
que estas denúncias sejam objeto de ciência e possível apuração desses órgãos. Ressalte-se que
os tribunais de contas estaduais e municipais também se apresentam como órgãos pertinentes
de apuração.

1.5. Assédio Moral


O assédio moral se caracteriza pela prática de comportamentos humilhantes, constrangedores,
torturantes, vexatórios, os quais podem ser evidenciados por meio de palavras, gestos ou
atitudes reiteradas e por um lapso temporal demorado, que causam uma degradação deliberada
das condições de trabalho. A prática de assédio moral mais comum é aquela realizada pelo
superior hierárquico em desfavor do subordinado (assédio vertical).

Entretanto, o assédio moral também pode envolver um colega de serviço (assédio horizontal)
ou um subordinado em relação ao chefe (assédio ascendente).

Em regra, a prática de assédio moral apresenta um viés discriminatório e perseguidor, com o


objetivo de eliminar a pessoa do local de trabalho, causando distúrbios emocionais, físicos,
psicológicos e ruína da autoestima.

Situações de assédio moral mais recorrentes:

• Dar instruções confusas e imprecisas;


• bloquear o andamento do trabalho alheio;
• atribuir erros imaginários;
• ignorar a presença de funcionário na frente de outros;
• pedir trabalhos urgentes sem necessidade;
• pedir a execução de tarefas sem interesse;
• fazer críticas em público;
• sobrecarregar o funcionário de trabalho;
• não cumprimentar e não dirigir a palavra ao empregado;
• impor horários injustificados;
• fazer circular boatos maldosos e calúnias sobre a pessoa;
• insinuar que o funcionário tem problemas mentais ou familiares;
• transferir o empregado de setor ou de horário, para isolá-lo;
• não lhe atribuir tarefas;
• agredir preferencialmente quando está a sós com o assediado.

Resta claro que a prática de assédio moral é nociva para qualquer ambiente de trabalho,
inclusive para Administração Pública, causando prejuízos humanos e financeiros, como a perda
de eficiência e produtividade de servidores, aumento de pedidos de licenças médicas, dentre
outras consequências.

As ouvidorias são instrumento importante para o combate ao assédio moral, na medida em que
se apresentam como o primeiro canal de contato com o denunciante ou com o próprio
assediado.

Recebida a denúncia, a ouvidoria deverá realizar a análise prévia para verificar indícios de
veracidade. As seguintes pesquisas podem ser realizadas: i) o local de lotação do
denunciante/assediado; ii) a relação de hierarquia entre o agente denunciado e o servidor
assediado; iii) a relação profissional entre as pessoas citadas na denúncia.

Sendo a denúncia considerada apta para apuração, a ouvidoria deverá avaliar qual unidade
técnica de apuração será a mais adequada. Nesse ponto, a avaliação da ouvidoria
prioritariamente levará em consideração o teor da denúncia. Denúncias com conteúdo mais
gravoso deverão ser direcionadas para a corregedoria do órgão ou similar, diferentemente das
denúncias que apresentarem conteúdo voltado ao descumprimento de valores éticos. Estas se
apresentam mais adequadas para a apuração da Comissão de Ética.

Por fim, é importante ressalvar que o assédio moral não pode ser confundido com o poder-dever
que os superiores hierárquicos possuem para organizar, gerenciar, coordenar e controlar os
serviços de seus subordinados, inclusive promovendo as correções necessárias, visando ao bom
cumprimento da atividade pública.

1.6. Assédio sexual


A conduta de assédio sexual se caracteriza como crime, tipificado no Código Penal,
especificamente no Art. 216-A, nos seguintes termos:

Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimentosexual, prevalecendo-se


o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de
emprego, cargo oufunção.

Pena – detenção, de 01 (um) a 2 (dois) anos.

Pela leitura do dispositivo, verificamos elementos essenciais para qualificar uma denúncia como
conduta de assédio sexual, quais sejam: i) a existência de constrangimento; ii) o objetivo de
alcançar alguma vantagem ou favorecimento de cunho sexual; e iii) a utilização da condição de
chefe/autoridade para obter o favorecimento ou vantagem sexual.

Nesse ponto, faz-se importante especificar o conceito de “constranger”. Segundo dicionários da


Língua Portuguesa, pode significar: tolher liberdade, dominar, subjugar, sujeitar, forçar, coagir,
compelir, deixar alguém embaraçado, envergonhar, importunar, incomodar, dentre outros
significados.
Conforme a posição doutrinária majoritária, para que haja a configuração da conduta de assédio
sexual, necessariamente deve existir uma relação laboral entre quem assedia e quem é
assediado. O denunciado deve ser superior hierárquico do agente que sofre o assédio sexual,
consequentemente, detendo a capacidade de influenciar e decidir acerca da vida profissional do
subordinado, tendo em vista o cargo ou função que ocupa. Situações não enquadradas em uma
relação de subordinação hierárquica não se caracterizam como assédio sexual.

Em síntese, ocorre o assédio sexual quando o superior constrange o seu subordinado, dentro ou
fora do órgão, no âmbito de uma relação laboral e sem voluntário consentimento da vítima a
realizar algum favor de cunho sexual. Ressalta-se que a tentativa de assédio já configura o
cometimento da irregularidade.

Recebida a manifestação, o papel da ouvidoria nas denúncias de assédio sexual será realizar a
análise prévia para verificar a existência de elementos que possam amparar o prosseguimento
da denúncia. As seguintes pesquisas podem ser realizadas: i) o local de lotação do
denunciante/assediado à época dos fatos; ii) se existia relação de hierarquia entre o agente
denunciado e o servidor assediado à época dos fatos; iii) a relação profissional entre as pessoas
citadas na denúncia.

Caso o denunciante relate que possui comprovação documental do assédio sexual, a ouvidoria
deverá pedir cópia dos documentos para ser anexada à denúncia inicial. A obtenção de
documentos que venham a robustecer a denúncia facilitará e acelerará o trabalho da unidade
de apuração.

Dada a gravidade da conduta de assédio sexual, que inclusive se caracteriza como crime, após a
realização da análise prévia pela ouvidoria, sendo ela considerada apta para ser apurada, a
unidade de apuração competente para proceder a investigação é a corregedoria ou a unidade
do órgão responsável pela condução de procedimentos disciplinares.

Denúncias de constrangimento de cunho sexual entre agentes públicos que não tenham relação
de subordinação também deverão ser tratadas pela ouvidoria, mas não como assédio sexual e
sim como possível descumprimento de normas regulamentares que regem as relações de
trabalho destes, bem como os códigos de ética do órgão.

2. Órgãos e unidades apuratórias


O artigo 3º, inciso II, do Decreto federal nº 9.492/2018, informa que denúncia consiste em “ato
que indica a prática de irregularidade ou de ilícito cuja solução dependa da atuação dos órgãos
apuratórios competentes”.

O órgão ou unidade apuratória à qual a denúncia será encaminhada depende da natureza do


seu objeto. Alguns assuntos são melhor analisados pela unidade de auditoria, como a execução
de obras e serviços, aquisições e licitações, por exemplo, enquanto outros que digam respeito
diretamente à conduta do agente deverão ser encaminhados para a unidade de correição. É o
que ocorre nos casos de assédio moral e sexual, acumulação ilícita de cargos, descumprimento
de regime de trabalho, e outras condutas que possam ser enquadradas como faltas disciplinares.
Condutas de menor potencial ofensivo, poderão ser encaminhadas à Comissão de Ética do
órgão.
Listaremos as principais e mais comuns unidades de apuração, ressalvando que em alguns
órgãos e entidades a nomenclatura poderá ser expressa de forma diversa:

2.1. Unidades de Apuração


Auditoria Interna: Conforme previsto na Instrução Normativa CGU nº 03/2017, a atividade de
auditoria interna governamental consiste em uma atividade independente e objetiva de
avaliação e de consultoria, desenhada para adicionar valor e melhorar as operações de uma
organização. Deve buscar auxiliar as organizações públicas a realizarem seus objetivos, a partir
da aplicação de uma abordagem sistemática e disciplinada para avaliar e melhorar a eficácia dos
processos de governança, de gerenciamento de riscos e de controles internos.

Corregedoria: atua nas atividades relacionadas à prevenção e apuração de irregularidades


praticadas por servidores públicos, por meio instauração e condução de procedimentos
correcionais, tais como investigações preliminares, sindicâncias investigativas, sindicâncias
punitivas, sindicâncias patrimoniais, Processos Administrativos Disciplinares e Termos
Circunstanciados Administrativos.

Comissão de Ética: comissão encarregada de orientar e aconselhar sobre a ética profissional do


servidor, no tratamento com as pessoas e com o patrimônio público, competindo-lhe conhecer
concretamente de imputação ou de procedimento susceptível de censura. Visa à apuração de
infração ética imputada a agente público ou setor específico de ente estatal. Desempenha
funções consultiva, educativa, investigativa, punitiva, representativa e administrativa.

2.2. Órgãos de Apuração


Ministério Público: O Ministério Público brasileiro é composto pelos Ministérios Públicos nos
estados e pelo Ministério Público da União, que, por sua vez, possui quatro ramos: o Ministério
Público Federal (MPF), o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Ministério Público Militar
(MPM) e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).

O MPU e o MPF são chefiados pelo Procurador-geral da República e a sede administrativa do


MPF é a Procuradoria-Geral da República. De acordo com a Constituição Federal, cabe ao
Ministério Público a defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis; a defesa da ordem
jurídica e a defesa do regime democrático.

Além disso, o Ministério Público tem autonomia na estrutura do Estado: não pode ser extinto
ou ter atribuições repassadas a outra instituição. Os membros (procuradores e promotores)
possuem as chamadas autonomia institucional e independência funcional, ou seja, têm
liberdade para atuar segundo suas convicções, com base na lei. Os Ministérios Públicos nos
estados atuam na Justiça estadual.

Tribunais de Contas: Os Tribunais de Contas são órgãos auxiliares do Poder Legislativo. Eles
existem em âmbito federal, estadual e em alguns municípios. Possuem como função essencial
realizar a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos entes
federativos, da Administração Pública direta e indireta. As empresas públicas e sociedades de
economia mista também estão sujeitas à fiscalização dos Tribunais de Contas.
A competência fiscalizadora dos Tribunais de Contas se refere à realização de auditorias e
inspeções em entidades e órgãos da Administração Pública. Os Tribunais de Contas fiscalizam
também procedimentos licitatórios, podendo expedir medidas cautelares para evitar futura
lesão ao erário e garantir o cumprimento de suas decisões.

Os Tribunais de Contas possuem ainda competência judicante que é a de realizar o julgamento


das contas anuais dos administradores e demais responsáveis pelo erário na Administração
Pública. A competência sancionatória dos Tribunais de Contas se refere a aplicação de sanções
por ilegalidades de contas e despesas.

No âmbito federal tem-se o TCU (Tribunal de Contas da União), vinculado ao Congresso


Nacional. Ele é responsável por fiscalizar o uso de verbas federais dos poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário e do Ministério Público.

Na esfera estadual há 26 Tribunais de Contas Estaduais, para cada um dos Estados, e um Tribunal
de Contas do Distrito Federal, que analisam as contas das unidades da Federação.

Acerca das contas municipais, 22 Tribunais de Contas Estaduais, além das contas estaduais, são
também responsáveis pela análise das contas dos municípios. Em três Estados — Pará, Goiás e
Bahia —, além do Tribunal de Contas do Estado, existem Tribunais de Contas de Municípios, os
quais detém a competência para analisar exclusivamente as contas das cidades das respectivas
unidades da Federação. Dois municípios contam com um tribunal de Contas Municipal próprio:
São Paulo e Rio de Janeiro. A Constituição Federal proíbe a criação de novos tribunais de contas
municipais, mas autorizou a continuidade desses, que já existiam antes de 1988.

SAIBA MAIS
O sistema de registro de denúncias utilizado pelo Sistema de Ouvidorias do Poder Executivo
federal
O Código de Defesa do Usuário de Serviços Públicos estabelece que é dever dos agentes
públicos e prestadores de serviços públicos a aplicação de soluções tecnológicas que visem a
simplificar processos e procedimentos de atendimento ao usuário e a propiciar melhores
condições para o compartilhamento das informações (Lei nº 13.460/2017, art. 5º, XIII).
No âmbito do Poder Executivo federal, o Decreto nº 9.492/2018, que regulamenta a Lei nº
13.460/2017 e institui o Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo federal, estabelece o uso
obrigatório da Plataforma Integrada de Ouvidoria e Acesso à informação Fala.BR pelos órgãos
e entidades da Administração Pública Federal.
A plataforma funciona totalmente online – acessível em https://falabr.cgu.gov.br – e a sua
utilização não depende de instalação. Basta o usuário acessar o sistema em seu navegador,
colocar seu login e senha e começar a utilizar. A gestão das bases de dados, o cadastro dos
administradores, a manutenção do sistema e o desenvolvimento de novas funcionalidades
são atribuições da CGU. A plataforma possui uma versão de treinamento, permite o
encaminhamento de manifestações de uma ouvidoria para a outra, trâmite das
manifestações entre unidades internas do órgão, bem como a geração de relatórios
gerenciais.
Além disso, a Instrução Normativa OGU nº 7/2019 estabelece que os órgãos e as entidades
dos Estados, Municípios, do Distrito Federal e dos demais Poderes poderão utilizar o e-Ouv
(incorporado à Plataforma Integrada de Ouvidoria e Acesso à Informação - Fala.BR) mediante
adesão à Rede Nacional de Ouvidorias, a qual é voluntária e garantirá à instituição aderente
o uso gratuito do Sistema Informatizado para tratamento de manifestações, bem como a
promoção de ações de capacitação para agentes públicos em matéria de ouvidoria e
simplificação de serviços.

3. Revisão do módulo
• Como você já sabe, cabe à ouvidoria promover a análise prévia da denúncia, verificando
se há elementos suficientes para dar início à apuração dos fatos narrados. Entretanto,
antes do início da análise prévia da manifestação, é necessário fazer uma avaliação se
esta corresponde realmente a uma denúncia, pois o tipo de manifestação está
relacionado diretamente ao tratamento a ser dado à mesma no órgão. A correta
classificação da manifestação produz eficiência e celeridade no tratamento e resposta
ao cidadão.
• A análise prévia tem como objetivo avaliar a existência de requisitos que amparem a
recepção da denúncia no órgão. Estes requisitos podem se apresentar em conjunto ou
separados. Por exemplo, denúncia que descreve fraude em licitação que estaria
ocorrendo no órgão, mas que não aponta o responsável pela fraude. Neste caso,
somente o aprofundamento da questão, por meio de um trabalho de auditoria, poderá
delimitar a autoria da impropriedade.
• Lembramos ainda que os fatos denunciados devem ser considerados como supostas
irregularidades, tendo em vista que no momento da análise prévia, haja vista não ser
um procedimento administrativo aprofundado e definitivo, não tem como se afirmar a
ocorrência da impropriedade, o que somente será possível ser confirmado após a
completa apuração dos fatos pela unidade de apuração.
• A denúncia recebida será conhecida caso contenha elementos mínimos descritivos da
irregularidade ou indícios que permitam à administração pública chegar a tais
elementos. Os principais requisitos a serem verificados numa análise prévia de ouvidoria
são: I- referir-se a matéria de competência da instituição da qual a ouvidoria faz parte;
II- ser redigida com suficiente clareza, de maneira inteligível; III- conter informações
sobre: o fato, a autoria do fato, as circunstâncias, os valores envolvidos; e IV – se for
denúncia sobre conduta, esta deve se referir a servidor público.
• Após a realização da análise prévia, na hipótese de requisitos de conhecimento da
denúncia estarem presentes, esta será encaminhada à unidade responsável pela
apuração, seja a auditoria, corregedoria, comissão de ética, outra unidade
administrativa ou ainda ao Ministério Público ou Tribunal de Contas. Conforme já
explicitado, reveste-se de importância que os sistemas eletrônicos de análise e
encaminhamento da denúncia sejam de acesso restrito, ou seja, somente terão acesso
ao conteúdo da denúncia aqueles que tenham necessidade de conhecê-la.
• Após o encaminhamento da denúncia à unidade de apuração ou após o arquivamento,
deverá ser fornecida resposta ao cidadão informando qual o tratamento dado à
denúncia. Esta resposta deverá ser formulada numa linguagem cidadã, que seja
compreensível para o cidadão comum. Deste modo, termos técnicos deverão ser
substituídos por expressões comuns. Caso necessário, além da resposta por escrito,
recomendamos entrar em contato com o denunciante para esclarecer o tratamento
dado à denúncia.
• Diversos sistemas estão disponíveis na internet, a maioria com acesso livre, auxiliando,
em muito, na procura de elementos mínimos de autoria e materialidade para subsidiar
a análise prévia da denúncia. Além destes, os sistemas internos dos órgãos também
devem ser utilizados para comprovar indícios de veracidade. Podemos destacar as
seguintes fontes: Página do Tesouro Nacional; Portal da Transparência; Plataforma
+Brasil; Sistema de acompanhamento de obras – SIURB; Portal de Compras –
COMPRASNET; Páginas dos tribunais de contas estaduais; Páginas de transparência
municipais, dentre outros.
• A Portaria CGU nº 581/2021, aplicável às unidades de ouvidoria do Poder Executivo
federal, prevê que a denúncia poderá ser encerrada quando: os fatos relatados forem
de competência de órgão ou entidade não pertencente ao Poder Executivo federal;
excepcionalmente, em circunstâncias necessárias à proteção integral ao denunciante,
devidamente justificadas no histórico da manifestação e comunicadas ao manifestante;
ou seu autor descumprir os deveres de expor os fatos conforme a verdade; proceder
com lealdade, urbanidade e boa-fé; não agir de modo temerário; ou prestar as
informações que lhe forem solicitadas para o esclarecimento dos fatos.
• O art. 3º, inciso II do Decreto federal nº 9.492/2018, assevera que denúncia consiste em
“Ato que indica a prática de irregularidade ou de ilícito cuja solução dependa da atuação
dos órgãos apuratórios competentes”. O órgão apuratório ao qual a denúncia será
encaminhada depende da natureza do seu objeto. Alguns assuntos são melhor
analisados pela área de auditoria, como a execução de obras e serviços, aquisições e
licitações, por exemplo, enquanto outros que digam respeito diretamente à conduta do
agente deverão ser encaminhados para a área de correição. É o que ocorre nos casos de
assédio moral e sexual, acumulação ilícita de cargos, descumprimento de regime de
trabalho, e outras condutas que possam ser enquadradas como faltas disciplinares.
Condutas de menor potencial, poderão ser encaminhadas à Comissão de Ética do órgão.
• No âmbito do Poder Executivo federal, o Decreto nº 9.492/2018, que regulamenta a Lei
nº 13.460/2017 e institui o Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo federal, estabelece
o uso obrigatório do Sistema Informatizado e-Ouv pelos órgãos e entidades da
Administração Pública Federal. Órgãos e as entidades dos Estados, Municípios, do
Distrito Federal e dos demais Poderes também poderão utilizar gratuitamente o e-Ouv
mediante adesão à Rede Nacional de Ouvidorias. Em 2019 o e-Ouv foi integrado à
Plataforma Fala.BR, que traz uma interface única para o registro de manifestações de
ouvidoria, como denúncias, e pedidos de acesso à informação.
• A plataforma funciona totalmente online – acessível em https://falabr.cgu.gov.br – e a
sua utilização não depende de instalação. Basta o usuário acessar o sistema em seu
navegador, colocar seu login e senha e começar a utilizar. A gestão das bases de dados,
o cadastro dos administradores, a manutenção do sistema e o desenvolvimento de
novas funcionalidades são atribuições da CGU. A plataforma possui uma versão de
treinamento, permite o encaminhamento de manifestações de uma ouvidoria para a
outra, bem como a geração de relatórios gerenciais.
Referências bibliográficas
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dispõe sobre a oferta dos serviços públicos digitais, no âmbito dos órgãos e das entidades da
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prestado aos usuários dos serviços públicos, ratifica a dispensa do reconhecimento de firma e
da autenticação em documentos produzidos no País e institui a Carta de Serviços ao Usuário.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2017/decreto/D9094.htm.

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junho de 2017, que dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos
serviços públicos da administração pública federal, e institui o Sistema de Ouvidoria do Poder
Executivo federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
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inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3o do art. 37 e no § 2o do art. 216 da Constituição Federal;
altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei no 11.111, de 5 de maio de 2005,
e dispositivos da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. Disponível em:
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