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O
desenvolvimento do psiquismo no ser humano é central na Psicologia. Cornoi
pudemos nos tornar o que somos hoje? De onde surgem as capacidades hu-:
manas que apresentamos? São naturais? São históricas? Essas perguntas po-
dem ser consideradas como norteadoras de uma Psicologia que no início do século XX/o
na recém-criada União Soviética, sob a influência do pensamento marxista, surge para'
tornar-se uma alternativa na Psicologia atual.
,ª
llli VISÃO DE FENÔMENO PSICOLÓGICO OU O OBJETO
DA PSICOLOGIA
A Psicologia Sócio- Histórica toma como base a Psicologia de Vygotsky e tem como
meta a superação de algumas certezas que a Psicologia produziu desde Wundt. Vamos
começar a apresentação dessa Psicologia Sócio-Histórica a partir dessas questões.
O fenômeno psicológico, objeto de estudo da Psicologia, refere-se à experiência pes- ~.
soal dos sujeitos. Mas essa definição nunca foi simples nem consensual. Muitas maneiras
de fazer referência a esse fenômeno foram surgindo com as diversas teorias, e para a con-
cepção sócio-histórica, em todas as suas formas, a Psicologia caracterizou o fenômeno ~
como algo abstrato e natural no ser humano. .~
Para Vygotsky (~-
-1934), o fenômeno psico- Explicand~ melhor: as v~r~asPSicol~~ias,na opini~o.da ~sicologia sócio-histórica, fi-"J
lógic'o é simultaneamente
subjetivo e cultural
zeram do fenomeno psicológico algo existente nos sujeitos independentemente de suas .. ;t
vivências. A experiência psicológica estava dada como uma característica do ser huma-I
.'rl
no, que sonharia, pensaria, sentiria, desejaria, seria consciente ou não disso, simplesmen-;i
te porque sua condição de animal de determinada espécie o permitiria. O fenômeno psi-
cológico já estaria dado, portanto, em cada ser humano, não importando seu surgimentc
ou construção, mas sim seu desenvolvimento.
A Psicologia Sócio-Histórica, em sua origem, no pensamento de Vygotsky,questionou L
essa certeza e quis pensar esse fenômeno como uma experiência pessoal que se constituq
no coletivo e na cultura. Para os sócio-históricos, a subjetividade não está dada como'}
:,,1.
A EVOLUÇÃO DA CIÊNCIA PSICOLÓCICA :;3
::~um a priori, mas é uma conquista humana a partir de sua atividade e sua intervenção
, transformadora sobre o mundo. Estamos agora falando de cada um de nós, mas estamos
, também falando de nossos antepassados humanos. Se há uma estrutura psíquica, se há
: conteúdos psíquicos, é porque foram construídos ao longo dos milhões de anos de de-
. senvolvimento da humanidade.
Estudar e compreender o fenômeno psicológico exige que o pensemos como um pro- Estudar e
cesso e busquemos sua história, ou seja, o aparecimento das formas de subjetivação que compreender o
fenômeno psicológico
, apresentamos hoje ao longo do tempo histórico. exige que o pensemos
A Psicologia Sócio- Histórica estuda o ser humano e seu mundo psíquico como cons- como um processo
e busquemos sua
. truções históricas e sociais da humanidade. O mundo psíquico que temos hoje não
história.
, ,1;, foi e nem será sempre assim, pois sua caracterização está diretamente ligada ao mundo
,: \,l material e às formas de vida que temos hoje em certas sociedades rnodernas.
'i~' Assim, o fenômeno psicológico não pertence a uma natureza humana. Ao contrário,
..;i\i~ele é pensado como algo que os humanos constituíram como possibilidade devido à
,.)~:rorma
1 -i?; .
como nos inserimos e atuamos no mundo. Para a teoria, foi o trabalho - atividade
.'.~,:\;instrumental de transformação do mundo para obter sobrevivência - o responsável por
); [essas transformações. E não só o trabalho como uso de instrumentos para a transforma-
',,:.ção,mas o fato de se dar em um coletivo de humanos. Instrumentos, trabalho, coletivo
,
,~'de humanos ...eis aí a origem de tudo.
."\,
. '?'Utilizávamos uma vara para alcançar maçãs nas árvores, se ela estivesse ali, ao nosso
'~.··lado.
Mas o aparecimento da ferramenta é mais que isso, é a possibilidade de buscar, de
'i:
,
construir o objeto que nos permitisse alcançar as frutas.
.
;r Imagine os primeiros humanos encontrando ossos de esqueletos que permitiam seu
.~
.,..uso para alcançar algo, para partir algo, enfim para um uso não planejado por n0SSOS
) esquemas genéticos. Agora pense na/espaçonave que leva os humanos à Lua, como o
s máximo do desenvolvimento de nossas ferramentas. É disso que estamos falando. Um
-: dia os humanos utilizaram um osso ou uma vara para fazer algo que não estava previsto e
,! nesse momento abriram o caminho para as espaço naves, ou seja, para a criação de novos
-.instrumentos de produção da vida e da sobrevivência. Agora, coloque nessa cena outros
s 'humanos. Muitos estão ali, em bando, e vão coletivamente apresentar novas possibilida-
'-, des de estar no mundo. Estava criado para um coletivo o instrumento ou ferramenta.
)
Dê uma olhada a sua volta e veja quantas ferramentas os humanos já inventaram:
canetas, lápis, cadernos, lousas, gizes, mesas, cadeiras, piso, prédios, plantas ornamen-
tais, roupas, mochilas, alimentos preparados ...Aliás, você achou algo que não tenha sido
s : criado pelo ser humano? E ainda cabe destacar que, como uma das ferramentas mais
importantes, os humanos criaram a linguagem para se comunicar, facilitando muito a
vida coletiva.
Essas mudanças são fundamentais para os sócio-históricos, pois elas permitiram o
surgimento do ser humano que conhecemos hoje. Primeiro, a ferramenta permitiu o
descolamento do imediatismo, e isso vai permitir uma conquista fundamental - o ser
I u humano criou o tempo, como distância entre uma coisa e outra. Nós nos acostumamos
li com tudo isso e deixamos de perceber que é preciso sair do lugar do imediato para con-
o quistar a possibilidade de pensar as coisas em uma linha de tempo. Os animais que não
74 I PSICOLOGIAS
saíram desse estágio não conseguem, como nós, deixar para depois alguma coisa. Nó
podemos adiar a realização de uma tarefa e podemos pensar em alcançar algo cumprin
do etapas. Por isso, conquistamos também a possibilidade de planejar.
São essas conquistas que nos permitem saltar de um Iugar de animais para um luga
de humanos. Criamos o conjunto de possibilidades que chamamos de humanidad .
Vejamos.
Fomos então inventando .coisas, instrumentos que se pareciam com nossas mão
com nossos braços, com nossos corpos e fomos com isso aumentando nossas possí' ,
bilidades de intervenção no mundo. Depois criamos coisas que supriam pedaços do;
corpo que não possuíamos, como asas, e criamos o avião ou a asa delta e voamos/;o
Fomos e estamos ainda em um processo de invenção do humano, criando a cada di~:;-
novas possibilidades para ele. :'~~
Ó: ·.a
Como pensamos, Tudo isso se faz acompanhar de formas de subjetivação. Como pensamos, comQ:~
sentimos, desejamos,
sentimos, como desejamos, como significamos as experiências qiíevamos vivendo? Aql.ll~
e significamos as
experiências que falamos de mundo psicológico e estamos afirmando que, para a Psicologia Sócio- Histó'~
vamos vivendo? rica, o mundo psicológico é esse mundo de registros e possibilidades que acompanhaml
e possibilitam as intervenções do ser humano no mundo. Se o mundo muda, é porque ó't;'
humano mudou, e ao mudar o mundo o humano se transforma. Um movimento incesJ" ",.~
sante de transformação.
O mundo psicológico nunca foi o mesmo, e o que sabemos hoje sobre ele não servin\}
o mundo psicológico
amanhã para saber do mundo psicológico dos futuros humanos. E o que sabemos sobrê',
nunca foi o mesmo, e os humanos ocidentais pode não servir para saber sobre os humanos orientais ou sobre'
o que sabemos hoje outros grupos que não estejam vivendo a mesma realidade social que nós. Indígenas, pot;~
sobre ele não servirá
exemplo, não devem sentir as coisas da mesma forma que nós. Há tribos que festejam~'
amanhã para saber do
mundo psicológico a morte. Há culturas que têm outras necessidades, se vestem diferentemente, comem .
dos futuros humanos. vivem de modo distinto do nosso. Para os sócio-históricos, essas pessoas também tê
um mundo psicológico diferente do nosso.
Então, começamos aqui com uma conclusão bastante importante: a Psicologia quç
temos e estamos aqui querendo que você aprenda não serve para compreender qualque
humano. É uma Psicologia ocidental moderna. O fenômeno psicológico que ela estuda.
e dá visibilidade é o fenômeno psicológico dos humanos do século XXI da chamada'
sociedade ocidental.
'. . ..tes dela, as mulheres tinham um lugar na sociedade e eram obrigadas a alimentar sua pro-
i- \w ~1;':lesem substituição. O movimento feminista não poderia ter surgido entre nós não fosse a
:~ . ~hinvenção da mamadeira, que permitiu que a mulher dividisse a tarefa da alimentação da
tr ~.:~~~.,prole com o marido ou outras pessoas. Claro que antes disso criamos a ama de leite, mas
e. tI -~~<eraoutra mulher. A mamadeira é a superação dessas dificuldades e uma invenção que
1:'';;~~:abriunovas possibilidades para a mulher e para a relação dela com seus filhos.
',15" J:.
s,',! l Gostaríamos aqui também de brincar um poucQ com nossas certezas. Nossa socie-
.'.
i-::': ~~"dade tem se pensado como machista. Ou seja, uma sociedade que valoriza e coloca os
o .,,~)~
. ·.~:;homens como seu centro e como portadores do poder nas relações sociais. Sem dúvida,
f< .....
s. ~;;'foram eles que guerrearam e caçaram, conquistando esse lugar de poder que possuem.
ia :~.:. :i~Isso fez nossa sociedade ocidental girar em torno do masculino. Valorizamos obeliscos,
.~~~""~<que podem. s~r torr:ados como. formas fálicas qu~ indicam poder. Em ~ossa sociedade, as
lo,:t"~fi~ftarefas femininas sao desvalonzadas e trabalho e uma palavra que nao se emprega para
ui lt,'~Js tarefas fe_mininas ,re.aliz~d~s .em c~sa. A. val~rização do masc~l~no. pode ,ter. levado, na
)_:~~ ';~l~~éompreensao dos sócio-históricos, a teonzaçao que pensa a dinâmica psiquica da mu-
.n;'~: ':~~lher com inveja do pênis (do fálus), Complexo de castração é um fenômeno feminino.
o ;.;: ',;:'7'). Agora pensemos uma sociedade feminista. Será que nossa dinâmica psíquica seria
.,' ·,1'
s- '~~,.. ~: caracterizada pelos mesmos complexos e desejos? Não sofreriam os homens de um
':<', ~<complexo de "vazio abdominal" quando se dessem conta de que não possuem útero,
como as poderosas mulheres? Ou um "corte de seus seios'; quando se percebessem di-
.erentes das poderosas mulheres? Não ocupariam os formatos de seios ou do útero, o
re ','. '{'lugar dos obeliscos? Brincadeiras à parte, estamos trabalhando uma ideia importante:
s~
)r " ·,w..
_:~iaforma de compreender, sentir e agir dos humanos tem a ver com as formas sociais . É da condição humana
TI .t~ :~:~f~queadotam para viver! criar-se a si próprio,
libertando-se dos
e. :~.. ~!; Condição humana não é natureza humana. Condição humana é exatamente a pos-
limites impostos pelo
m .'~ ;Y~sibilidade de os humanos criarem a si próprios, libertando-se dos limites impostos pelo biológico de seus
';,;,"f!'i-biológico de seus corpos. corpos.
':c.~ ,~;;';:
le
I I fi'. I ti
76 I PSICOLOGIAS
Agora veja que o humano está posto na cultura, ou seja, todos os avanços e possibíl
dades de atividades e capacidades humanas estão postos nos objetos da cultura, inclusí
um dos mais importantes - a linguagem. Muito bem, é então dessa forma, entran
em contato com os objetos que foram criados e que carregam humanidade, que quamf
nascemos candidatos à humanidade vamos nos humanizando. Nós nos apropriamQ,
dessas capacidades que foram conquistadas porque manuseamos esses objetos e incot
poramos as capacidades que ali foram postas como capacidades nossas. E fazemos íSS9:
com uma grande facilidade porque temos conosco os outros, adultos, que podem n9l'
ensinar o que fazer e como fazer para aprendermos. .
>".•. .
A cultura carrega A cultura carrega possibilidades psíquicas, de subjetividade, que vamos reconstruínf
possibilidades do em nós. E esse movimento não é algo repetitivo, porque cada um fará essa tarefa e s~.;
psíquicas, de
subjetividade, que
tornará um humano "igual'; com as mesmas capacidades, mas "diferente" porque cad~
vamos reconstruindo
em nós.
um fará a seu modo, em situações diferentes e com pessoas distintas. Cada um "se cón§~
truirá" tornando-se um humano singular: ..,~_._
Notem que todo esse processo se faz mediado pela linguagem (também uma criaçã~~:
J'
humana). Ela é fundamental para a construção de nossas formas de pensar e de senti~!
Nosso mundo interior é formado de imagens, sensações, mas ele toma forma nas pala;'
vras. Assim, quando aprendemos uma língua, estamos aprendendo a pensar e a sentir.t~
d~
''il,
,t:
SUJEITO E MUNDO: ÂMBITOS DE :t,\'fk
Para a Psicologia Sócio- Histórica, sujeito e mundo são, assim, âmbitos distintos, m~~l.
criados no mesmo processo. Ao interferir de modo transformador sobre o mundo matêi~
rial, o ser humano estará se constituindo e construindo o mundo que tem à sua vOlta'1c'
Sujeito e mundo não são âmbitos antagônicos, como pensam algumas teorias. SUi'l
jeito e mundo se completam e se referem um ao outro. Ao conhecer um ritual de um.
grupo social, poderemos conhecer muito de sua forma de subjetivação. Ao conhece,
as ideias e os projetos de um ser humano, poderemos saber sobre sua sociedade e su
formas de vida. A Psicologia é uma ciência do mundo subjetivo, mas isso não quer diZe,
que o material de seu trabalho esteja apenas "dentro" dos sujeitos. Um psicólogo qu
pensa assim tem. no mundo cultural e social muitos elementos para saber da dinâmicc( ~
dos sujeitos que ali vivem. >,
Podemos então falar de subjetividade individual e subjetividade social, pois os fenô~j
menos sociais estão, de forma simultânea, dentro e fora dos indivíduos, isto é, estão n~
subjetividade individual e na subjetividade social.
A subjetividade deve ser compreendida como
"um sistema integrador do interno e do externo, tanto em sua dimensão social, como in-
dividual, que por sua gênese é também social ... A subjetividade não é interna nem externa:
ela supõe outra representação teórica na qual o interno e o externo deixam de ser dimensões
exc/udentes e se convertem em dimensões constitutivas de uma nova qualidade do ser: o
subjetivo. Como dimensões da subjetividade ambos (o interno e o externo) se integram e
desintegram de múltiplas formas no curso de seu desenvolvimento, no processo dentro do
qual o que era interno pode converter-se em externo e uice-vetsa",
GONzALEZ-REY. Fernando L Categoria "personalidad": su sígníflcacíón para La Psicolojía social. ln: Psicologia Revista
- revista da Faculdade de Psicologia da PUC-SP. nA, maio 1997, p. 37-53.
A EVOLUÇÃO DA CIÊNCIA
.
PSICO ÓGICA' I . .-
ia ~;~ próprios, vai se constituindo, ou seja, vai construindo sentido para as experiências que
)~,~' . vivenda. Esse espaço pessoal dos sentidos que atribuímos ao mundo se configura como
, .' subjetividade individual.
A subjetividade social é exatamente a aresta subjetiva da constituição da socieda-
t1'grr!!cd.e. Refere-se
"ao sistema integral de configurações subjetivas (grupais ou individuais). que se articu-
lam nos distintos níveis da vida social ...".
Op. cito
j
~
1
~
i!:
:!~.';i'?,.r' Em termos de história, é importante localizar- ~
,.;~:í~~osas bases dessa Psicologia na União Soviética,
) .1 i.'nos anos de revolução. Embalada pela Revolução
; ';:~,ae1917 na Rússia, que instituiu a União das Repú-
J , }iblicas Soviéticas, pode-se compreender a impor-
'·fH,.1(,
:~M1tância
de um conhecimento que valoriza a relação
a c~;~osujeito com o mundo onde vive e suas formas
3, rde produção de riqueza e sobrevivência.
~.
;C">'~
.> j~>:
~~~':~
~, ;,
:,:
78 I PSICOLOGIAS
Um período A Rev?lução precisava de pensamentos que garantissem a ideia de qu~ se teria lt~
revolucionário é
sempre um período
novo homem, se houvesse um novo mundo. Essas ideias permitiam a consolidação e a ~~I'::
fértil para novas pansão da Revolução. Um período revolucionário é sempre um período fértil para nOVã~ ..
concepções. concepções, e isso se deu no início do século XX com a colaboração de Yygotsky, Leon~ ~é
tieve Luria, que trabalhavam juntos e puderam fazer avançar o pensamento em Psicolo~~
gia, superando as visões mais conservadoras e naturalizantes no campo dessa ciência. -;
Superar visões positivistas e' estudar o ser humano como uma construção histórica'ê
social da própria humanidade: Os princípios básicos da teoria criada por esses autor~ ..
podem ser resumidos em: ~
• A compreensão das funções superiores do homem não pode ser alcançada pela ps~'
cologia animal, pois os animais não têm vida social e culturaL'
• As funções superiores do homem não podem ser vistas apenas como resultado dá
maturação de um organismo que já possui, em potencial, tais capacidades. ::~
-'. ,a
• A linguagem e o pensamento humano têm origem social. A'cultura faz parte do d~,
senvolvimento humano e deve ser integrada ao estudo e à explicação das funç6~1
. "'l~
superiores. i~
• A consciência e o comportamento são aspectos integrados de uma unidade, não p~~:-
dendo ser isolados pela Psicologia. . - ~
~
J
NOÇÕES BÁSICAS DA PSICOLOGIA ~
Sócio-HISTÓRICA J-f;
'4
}~
Por meio da atividade, o ser humano produz o necessário para satisfazer essas necessiJ
dades. A atividade de cada indivíduo, ou seja, sua ação particular é determinada e definid,~
"
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I·'l';:
' As CATEGORIAS DE ANÁLISE DA
PSICOLOGIA SÓCIO- HISTÓRICA
A Psicologia Sócio-Histórica utiliza-se então de algumas categorias de análise q
correspondem a essa forma de 'ver o processo e o movimento humanos: atividade, con
ciência, identidade, afetividade, linguagem, sentido e significado.
A atividade apresenta-se então como uma categoria do psiquismo na medida e
que é a partir dela que os humanos se põem no mundo e criam a relação fundamenta
que permitirá todo o processo de transformação do mundo e de si mesmos. Conhec
como os sujeitos se inserem no mundo, que relações sociais vivem a partir dessa inse]
ção, como produzem sua sobrevivência, como se comportam e atuam permite começ
a pensar a subjetividade. -~-
A consciência se desenvolve no cérebro humano como capacidade superior. S
I, ' material está na vida vivida e nas formas de vida instituídas pelo grupo social. A co
j" ,..--..
I .; \
ciência pode ser considerada um reflexo ativamente modificado da realidade objeti
;;
A consciência não se refere nesta teoria a apenas uma atividade cognitiva. Na cohs~'!
ciência-se mesclam conhecimentos, sentimentos, imagens, palavras que representam %(
formá como o.sujeito
.
vive, sente e pensa o mundo. É o mundo dos registros das vivênciá§!; .~
Ciampa analisa então a reposição da identidade como mesmice de mim. Isso aconte-
e quando o sujeito se fixa em uma forma de apresentação de si, impedindo que o novo
he traga mudanças possíveis. O sujeito quer, ou é pressionado a, manter-se da forma
como se apresentou um dia, repondo sua identidade. Aqui há também um movimento,
mas é um movimento conservador de uma identidade uma vez posta e que passa a ser
reposta, dando a impressão de que não há movimento.
Por fim, Ciampa toma a existência concreta como uma unidade da multiplicidade. As variadas vivências
que temos, os vários
As variadas vivéncias que temos, os vários momentos e muitas e diversas pessoas que momentos e muitas e
:l1os cercam e conosco se relacionam, além das várias atividades que desenvolvemos, diversas pessoas que
tornam nossa identidade algo múltiplo. Somos uma unidade da diversidade, da multipli- nos cercam e conosco
se relacionam, além
cidade. E quando nos manifestamos em um lugar, em relações e atividades específicas,
das várias atividades
~xpressamos parte dessa totalidade. Não confundir com expressar um pedaço de nós. que desenvolvemos,
ão expressamos uma totalidade parcial, como representação de nós, e deixamos de tornam nossa
xpressar outras possibilidades que também nos pertencem como possibilidades, mas -identldade algo
múfilplo.
ue naquele momento não têm necessidade de ser expressas. Aqui queremos apenas dar
uma ideia do movimento que ocorre com os sujeitos, um movimento de transformação
em que se perca a identificação com tudo isso que reconhecemos ser parte de nós, por
'sso identidade; por isso metamorfose.
A linguagem é um instrumento importante para nossa expressão e para formar nos-
sa consciência.
AGUIAR, Wanda M. J. Consciência e atividade: categorias fundamentais da Psicologia Sócio-Histórica. In: BOCK, A.
M.B. (Org.) Psicologia Sócio-Histórica - uma perspectiva crítica em Psicologia. São Paulo: Cortez, p. 103.
As relações sociais têm enorme importância para a teoria. Os vínculos que se cons-
tituem vão permitir determinadas' experiências. Em nossas vivências somos afetados
> •.••.•'rlt" afetividade) de alguma forma e fazemos então nossos registros emocionados. O
mundo psicológico como um mundo de símbolos, imagens, sensações e emoções vai se
orgaruzando em nós e permitindo a formação da consciência. A linguagem, com suas
:ia é um dos/mais importantes veículos de transporte do campo objetivo para o
ao campo da subjetividade e vice-versa.
ão Para finalizar, vamos falar um pouco dos sentidos. Vygotsky foi quem usou o termo
as suas primeiras obras.
Vygotsky escreveu:
"(....) o sentido
de uma palavra é a soma de todos os fatos psicológicos que ela desperta
em nossa consciência. Assim. o sentido é sempre uma formação dinâmica, fluida. comple-
xa. que tem várias zonas de estabilidade variada. O significado é apenas uma dessas zonas
do sentido que a palavra adquire no contexto de algum discurso e. ademais, uma zona mais
estável. uniforme e exata. Como se sabe, em contextos diferentes a palavra muda facilmente
de sentido. O significado. ao contrário. é um ponto imóvel e imutável que permanece estável
em todas as mudanças de sentido da palavra em diferentes contextos (...)".
o sentido é algo individual, mas que tem sua formação no encontro do sujeito sin
gular com uma experiência social concreta. Nessas situações sociais, o sujeito atua, vi
vencia relações, estabelece vínculos, convive com significados, experimenta emoções'
produz sentidos.
Sentido é uma unidade constitutiva da subjetividade. E continuaGonzález- Rey:
'A categoria de sentido favorece uma representação da subjetividade que permite enren-
der a psique não como uma resposta, nem como um reflexo do objetivo, e sim como uma
produção de um sujeito que se organiza unicamente em suas condições de vida social, mas
que não é um efeito linear de nenhuma dessas· condições. Os processos de produção de
sentido expressam a capacidade da psique humana para produzir expressões Singulares em
situações aparentemente semelhantes".
GONZÁLEZ-REY, Fernando L o social na Psicologia e a Psicologia Social- a emergência do sujeito. Petrópolis: Vozes, 2004.
Seres humanos atuam Nossa intenção aqui não é aprofundar essas categorias, mas demonstrar que a Psico,
sobre o mundo logia Sócio-Histórica tem um conjunto teórico que é compatível com seus pressuposto
transformando-o
e, ao fazerem isso,
epistemológicos. Seres humanos atuam sobre o mundo transformando-o e, ao fazere ,.~ l
se modificam a si isso, se modifican: a si mesmos. Atividade, consciência, identidade, linguagem, significá~'r
mesmos. dos e sentidos são algumas das categorias as quais pesquisadores, professores e profissio-'. i
nais que trabalham a partir dessa perspectiva utilizam-para fazer sua leitura da realidade
e dar visibilidade à dimensão psicológica, subjetiva que a realidade possui.
n~:f -:"Em segundo lugar, entende-se que a Psicologia Sócio- Histórica apresenta pressu- A maior parte das
:PQstosúteis a esse campo. A maior parte das construções políticas da vida pública construções políticas
da vida pública
~>~sconsidera a presença de sujeitos que são, na maioria das vezes, vistos e concebi-
desconsidera a
~~snas políticas como meros usuários. Poucos são os esforços de compreensão da presença de sujeitos
élação que os sujeitos sociais mantêm com um serviço, por exemplo, o serviço de que.são, na maioria
'fansporte ou de saúde, das vezes, vistos
e concebidos nas
.~Quando se constroem as políticas, buscam-se eficiência, qualidade, mas não se políticas como meros
,'ensa quem é o sujeito que vai utilizá-Ias e como ele precisa ou qual sentido ele atri- usuários.
'~i àquele serviço. Muitas vezes as políticas ignoram, por exemplo, que temos uma
·.~i~ :opulação ainda com muitos analfabetos, e todos os avisos são feitos em linguagem
: .:~ . scrita. Muitas vezes as políticas menosprezam a estética popular e consideram des-
~,!~ .'
i~\l,!; "' •.•. }:cessário embelezar o local onde o serviço será prestado. Note a diferença entre um
'~;~~1i~~nsultório ou hospital particular e uma unidade básica de saúde. Além disso, por
o_,~l.~~!~ão considerarem os sujeitos, as políticas não os tomam como parte das decisões
os ~~ ·'~r:~' raramente chamam esses sujeitos que utilizarão os serviços para opinar e ajudar
m o:i t~::;'~ decidir aspectos importantes da política. A Psicologia Sócio-Histórica, ao desna-
a_;~~l}f:tjlralizar os sujeitos e pensá-los como sujeitos singulares e ativos na construção de
0- . ;ff~:$eu mundo, não pode deixar de contribuir produzindo saberes que permitam novas
Ie ','~:~}elações entre o Estado e a população em geral.
';~'i,;~'E.. A
Psicologia Sócio-Histórica nesses trabalhos ainda se põe com um diferencial
~~>::.grande em relação a outras perspectivas que naturalizam o mundo psicológico e dei-
.~;'i"'i;Xamde lado a relaçáo do sujeito com seu mundo social - ela pede que o profissional
t ;~;.:~~posicione. Aqui o psicólogo não deve estar pensando como um sujeito neutro, mas
:;,,', como alguém que s~'compromete com a construção' de condições dignas de vida. Psi-
.:'.:.i,:::cologia e política não se separam. A política é parte integrante do fazer dos profissio-
1O ' .: nais. Por isso a Psicologia Sócio-Histórica tem como um de seus debates importantes
tis
, . ',:> o compromisso social que a Psicologia deve manter com a sociedade em que se insere
)uy .; ",e para a qual produz.
ta
'e "A psicologia Sócio-Histórica. por sua vez. propõe. fundamentada no método que alia
conhecimento, prática e posicionamento, que se busque as condições para a realização do
n- indiuíduo como sujeito histórico. portanto reconhecendo-se seu vínculo com a coletividade
u- . . e seu compromisso com a transformação social."
ia GONÇALVES. M. G. M. A contribuição da Psicologia Sócio-Histórica para a elaboração de políticas públicas.
a- In: BOCK. A.M.B. (Org.), Psicologia Sócio-Histórica - uma perspectiva crítica em Psicologia. São Paulo: Cortez, 2003.
io
10
Voltando ao começo para terminar, vale a pena frisar um aspecto da Psicologia Sócio-
o
. Histórica: as concepções presentes na Psicologia sobre o fenômeno psicológico são natu-
; ralizantes, ou seja, tomam o fenômeno como abstrato, universal e natural.
_ 84 PSICOLOGIAS
"Essa concepção (...) teve como resultado uma psicologia, de costas para a realidade
social. Não se tem nenhuma necessidade de fazer referência ao cotidiano vivido pelas pes-
soas, à cultura e aos valores sociais, às formas de produção da sobrevivência e às relações
sociais para compreender o mundo psíquico. O fenômeno psicológico é visto como univer- .
sal (...). Nossas concepções sobre a subjetividade deveriam unir o mundo objetivo com o.
mundo subjetivo, a fim de compreendê-los como construções históricas a partir da atuação
transformadora do homem sobre o mundo."
BOCI<. A.M.B. (Org.). Psicologia Sócio-Histórica - uma perspectiva critica em Psicologia. São Paulo: Cortez, 2003, p.22.
/ '
4 Para a Psicologia Sócio- Histórica, não existe natureza humana, existe a condi-
ção humana.
7 . Importância da linguagem.
• Consciência;
• Identidade;
l...
• O papel da linguagem; 1
,1
.' As relações sociais;
<I Significados e sentidos pessoais.
-----------_ .
.. .;,.
,~ . ~, '.: ~ ,~ , ,'. ~ ~,,: '.". ' ,
A EVOLUÇÃO DA CIÊNCIA PSiCOLÓGiCA
J
~
I
)8<;
.•••••••••
Texto complementar
BOCK, Ana M. B. A Psicologia Sócio-Histórica: uma perspectiva crítica em Psicologia.ln: BOCK, A. M. B.; GONÇALVES,M. G. M. e
FURTADO,O. (Orgs.). Psicologia Sócio-Histórica: uma perspectiva crítica em Psicologia. São Paulo: Cortez, 2007.