Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Gaston Bachelard
Discurso preliminar
Quando se trata de experiências sugeridas ou construídas pela razão, a ordem é uma verdade,
e a desordem, um erro. A ordem abstrata é, portanto, uma ordem provada, que não fica
sujeita às críticas bergsonianas da ordem achada
sobre qualquer questão, sobre qualquer fenôme- DISCURSO PRELIMINAR no, é preciso passar
primeiro da imagem para a forma geométrica e, depois, da forma geométrica para a forma
abstrata, ou seja, seguir a via psicológica normal do pensamento científico. (você olha e vê
uma imagem, depois você avalia a forma, as medidas, o real o que é aquilo. Depois vc vai para
o abstrato e pensa sobre aquele objeto)
Como a experiência comum não é construída, não poderá ser, achamos nós, efetivamente
verificada
Capitilo 1
Quando o espírito se apresenta à cultura científica, nunca é jovem. Aliás, é bem velho, porque
tem a idade de seus preconceitos.
Em primeiro lugar, é preciso saber formular problemas. E, digam o que disserem, na vida
científica os problemas não se formulam de modo espontâneo
A pergunta abstrata e franca se desgasta: a resposta concreta fica. A partir daí, a atividade
espiritual se inverte e se bloqueia
De modo visível, pode-se reconhecer que a idéia científica muito usual fica carregada de um
concreto psicológico pesado demais, que ela reúne inúmeras analogias, imagens, metáforas, e
perde aos poucos seu vetor de abstração, sua afiada ponta abstrata
2–
O historiador da ciência deve tomar as idéias como se fossem fatos. O epistemólogo deve
tomar os fatos como se fossem idéias, inserindo-as num sistema de pensamento
Logo, toda cultura científica deve começar, como será longamente explicado, por uma catarse
intelectual e afetiva. Resta, então, a tarefa mais difícil: colocar a cultura científica em estado de
mobilização permanente, substituir o saber fechado e estático por um conhecimento aberto e
dinâmico, dialetizar todas as variáveis experimentais, oferecer enfim à razão razões para
evoluir.
É aliás notável que, de modo geral, os obstáculos à cultura científica se apresentem sempre
aos pares. A tal ponto, que se pode falar de uma lei psicológica da bipolaridade dos erros.
Será visto como o falso rigor bloqueia o pensamento, como um primeiro sistema matemático
pode impedir a compreensão de um novo sistema.
No fundo, o cientista sente-se cada vez menos atraído por essas alegrias totalitárias. Ficou
claro que ele se especializa cada vez mais. O filósofo, especialista de generalidades, propôs-se
a fazer as sínteses. Mas, de fato, é a partir de uma especialidade que o cientista quer e busca a
síntese
o objeto não pode ser designado como um "objetivo" imediato; em outros termos, a marcha
para o objeto não é inicialmente objetiva.
Ah! não há dúvida de que sabemos o que vamos perder! De pronto, todo um universo fica
descolorido, nossa refeição perde o cheiro, nossa energia psíquica natural fica cortada,
revirada, desconhecida, desanimada.
O instrumento de medida acaba sempre sendo uma teoria, e é preciso compreender que o
microscópio é um prolongamento mais do espírito que do olho.1
devemos começar as lições de objetividade por uma verdadeira confissão de nossas falhas
intelectuais.
Em outros termos, para que a ciência objetiva seja plenamente educadora, é preciso que seu
ensino seja socialmente ativo.
o. Por isso, toda filosofia que limite a cultura ao Realismo ou ao Nominalismo representa os
mais terríveis obstáculos para a evolução do pensamento científico.
Balzac dizia que os solteirões substituem os sentimentos por hábitos. Da mesma forma, os
professores substituem as descobertas por aulas
. Mas, como afirma com nobre calma Edouard Le Roy, para que esse êxito geral do
pensamento científico seja possível, é preciso querer. É preciso uma vontade social poderosa
para evitar o poligenismo, do qual Le Roy não descarta a possibilidade. Ele teme uma ruptura
entre as almas liberadas e as almas oberadas.7 Essa vontade de espírito, tão nítida entre
algumas almas elevadas, não é um valor social.
Na obra da ciência só se pode amar o que se destrói, pode-se continuar o passado negando-o,
pode-se venerar o mestre contradizendo.-o. Aí, sim, a Escola prossegue ao longo da vida.