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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO

DISCIPLINA DE PESQUISA EM COMUNICAÇÃO


PROFª. DRª. MARIA HELENA WEBER.

Síntese e formulação de questões sobre

A FORMAÇÃO DO ESPÍRITO CIENTÍFICO:


contribuição para uma psicanálise do conhecimento
de

GASTON BACHELARD

por
Lucas Rodrigues Piovesan

Maio de 2022.

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Como exercício de reflexão acadêmica, este trabalho vai empreender uma síntese
das principais questões apontadas por Gaston Bachelad, em seu célebre livro sobre
filosofia da Ciência, “A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise
do conhecimento”. Procuramos sumarizar os dez obstáculos epistemológicos que
Bachelard aponta como empecilhos para o desenvolvimento científico, e convertê-los em
problematizações para o campo da Comunicação, com especial atenção para a temática
de nosso projeto de pesquisa: a linguagem publicitária radiofônica.
Neste livro, Gaston Bachelad faz uma dura crítica a existência de concepções
estabelecidas na comunidade acadêmica, no final dos anos 1930, que entende como pré-
científicas, e que atualmente poderíamos traduzir pelo termo corrente de
pseudocientíficas. São concepções que se pretendem, e vendem-se como, detentoras de
princípios de cientificidade, mas, na verdade, esbarram e um, ou mais, dos dez
obstáculos epistemológicos que o autor elenca como barreiras impeditivas para o avanço
da ciência. Bachelard propõe uma autoanálise da atuação de pesquisadores e cientistas,
ou, utilizando suas palavras, uma psicanálise do conhecimento, a fim de identificar,
analisar e desenvolver métodos que possam combater esses obstáculos.
Para iniciar esse processo, o autor define três períodos históricos identificados com
o desenvolvimento do pensamento científico. O primeiro, denominado período pré-
científico, vai desde a antiguidade até o século XVIII. O segundo, período científico, do
final do século XVIII até início do século XX. E, por fim, a partir de 1905 (ano em que a
Teoria da Relatividade de Einstein derruba conceitos tidos como fixos), o início da era do
novo espírito científico.
Além desta periodização, Bachelard também estabelece três estados de
desenvolvimento do espírito científico. O estado concreto, caracterizado pela satisfação
com as primeiras imagens, ou primeiras análises, dos fenômenos estudados, fortemente
associadas à observações diretas e conclusões baseadas em senso comum. O estado
concreto-abstrato, quando começa a realizar abstrações que dão conta, de um modo
primordial, a alguma teorização, mesmo que ainda fortemente associadas com uma
intuição sensível. E o estado abstrato quando o cientista consegue reunir e trabalhar com
informações desligadas da experiência imediata, e da intuição do espaço real, para
conseguir formular teorizações que vão além do senso comum e das impressões
pessoais.

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Bachelard lembra que os três estados do espírito científico não estão
necessariamente atrelados aos perídios históricos propostos, principalmente no sentido
de que a entrada na era do novo espirito científico não significa a instantânea superação
dos estados concreto e concreto-abstrato. E que essa transição depende muito mais de
uma vigilância autoimposta pelo cientista, principalmente no sentido questionamentos,
indagações e inquietações que fazem muito mais ao desenvolvimento da Ciência do que
acomodação e convicção.
Dando continuidade, Bachelar procura delinear o que é um obstáculo
epistemológico. Tentando resumir de forma muito geral, o autor propõe que eles seriam
formas de pensamento que dificultariam o acesso ao conhecimento real e ao
reconhecimento e a proposição de novos conceitos científicos. Eles estariam ligados à
opinião, experiências pessoais e não sistemáticas, e dificuldade psicológicas que não
permitem uma aproximação correta ao conhecimento.

O que é obstáculo epistemológico?

Gaston Bachelard cunhou em sua obra A formação do espírito científico (1938) a ideia
do obstáculo epistemológico, que deve ser visto como uma derivação limitante de um
sistema de conceitos sobre o desenvolvimento do pensamento, o que impede um modo
de pensamento pré-científico de conceber a abordagem científica. Em palavras mais
simples, a ideia de obstáculo epistemológico, identifica e expressa elementos
psicológicos que dificultam a aprendizagem de novos conceitos para a ciência,
e está presente em pessoas sujeitas a enfrentar novas realidades, uma vez que não têm
referências diretas por experiências anteriores sobre o que estamos tentando descobrir.
Em outras palavras, poderíamos dizer que o obstáculo epistemológico é um conjunto
de dificuldades psicológicas que não permitem acesso correto ao conhecimento
objetivo. Bachelard encontra elementos que dificultam o conhecimento adequado e real,
que não permitem a própria evolução do espírito, para que ele possa passar de um
estado pré-científico, influenciado pelos sentidos e feedback imediato, a um método
científico com base no status científico.
As pessoas que desejam atingir um grau de enriquecimento epistemológico, o chamado:
espírito científico, devem pôr de lado experiência e hábitos de pensamento que sempre
foram utilizados, típicos de todo o espírito pré-científico. Bachelard identifica esses

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obstáculos epistemológicos como barreiras para a formação de um espírito
científico.

Obstáculos epistemológicos não estão se referindo a elementos ou fatores externos


que podem estar envolvidos no processo de desenvolvimento do conhecimento científico
de pessoas. Obstáculos epistemológicos encontram-se na dificuldade de captar o
acontecimento ou fenômeno devido às condições psicológicas que impedem o
desenvolvimento do espírito científico.

Gaston Bachelard em seu trabalho identifica 10 obstáculos epistemológicos

1) Superar a primeira experiência: Ela é a experiência que é composta das


informações percebidas e está no espírito, geralmente adquirida nos primeiros anos da
vida intelectual das pessoas que, em seguida, envolvidas no desenvolvimento da ciência,
e não sujeitas à algumas críticas, leva a pessoa a ficar imersa neste mar de ignorância
tomando estes conhecimentos primários como verdadeiros e rejeitando as novidades que
vão contra eles. O espírito científico deve ser reformado constantemente.

2) O obstáculo generalista envolve tomar as características ou particularidades de


conhecimento da substância como realidade e verdade, que não tem discussão. Você não
pode explicar, ele é tomado como uma causa fundamental e inegável. Ao aceitar o
obstáculo realista, não há problema científico, o obstáculo torna-se um gerador de
verdade.
3) O obstáculo Verbal: Localizado em hábitos orais de pessoas usados em uma
base diária, tornando este obstáculo um dos mais difíceis e com maior poder explicativo.

4) Obstáculo unitário e pragmático: O conceito de unidade para simplificar


o estudo de qualquer realidade, para explicar tudo de forma satisfatória. As partes são
explicadas e sua unificação explica toda a realidade. O conceito de unidade em conjunto
com o utilitário se torna perigoso porque dá imediatamente explicação para o que é de
algum modo útil.

5) Obstáculo substancialista: Esta coligação é feita da substância e as suas


qualidades. Bachelard distingue uma realidade oculta do substancialismo que é
algo fechado, coberto pelo material, que deve abrir para expor seu conteúdo. E há

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substancialismo da íntima qualidade, profundo, que é fechado não superficialmente.
Devemos cavar fundo para encontrá-lo.
6) Obstáculo Realista: A mente está deslumbrada com a presença do real. Ela
ainda considerou que não deve ser estudado ou ensinado. Toma impressões pessoais
sobre o pesquisador. O argumento realista tem mais peso contra o que não é.
7) Obstáculo animista: Os seres humanos prestam mais atenção e maior
valorização do conceito do que pode levar para a vida. O espírito do pesquisador prioriza
a vida, este valor sempre acompanhou o homem em qualquer fase do seu
desenvolvimento intelectual.
8) Obstáculo e o mito da digestão: Qualquer evento ou fenômeno que tem a ver
com o estômago passa a ter maior valor explicativo.
9) Obstáculo da libido é interpretado a partir da perspectiva do poder e a vontade
de dominar os outros seres humanos por parte do pesquisador e que não pode ajudar,
mas refletir sobre suas experiências ou ensaios dá uma explicação coerente para um
fenômeno ou um fato. Outra referência deste obstáculo é a referência constante a
pensamentos sexuais que estão presentes em todos os espíritos científicos na formação
integral para enfrentar novos fatos ou fenômenos.
10) O último obstáculo epistemológico: o conhecimento quantitativo é aquele que
se considera livre de erro, saltando do quantitativo ao objetivo, através de todo este
conhecimento tem maior validade.
Obstáculos epistemológicos mencionados brevemente são fatores que dificultam
a passagem do espírito pré-científico para o espírito verdadeiramente científico, e
superando obstáculos epistemológicos é como o espírito pode evoluir para criar ciência,
na qual emana e surgem novos conhecimentos e existentes realidades que, por
vezes, não percebemos que estão ali.

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