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Índice
1. Psicopatologia................................................................................................................................ 7
Consciência ......................................................................................................................................... 7
Atenção ..............................................................................................................................................11
Orientação .........................................................................................................................................11
Memória .............................................................................................................................................12
Percepção ..........................................................................................................................................18
Discurso e linguagem ....................................................................................................................26
Pensamento ......................................................................................................................................28
Vivência do Eu ..................................................................................................................................41
Humor, Emoção e Afetos ..............................................................................................................43
Alterações da emoção e expressão afetiva.............................................................................47
Ansiedade..........................................................................................................................................48
Vontade e impulsividade ..............................................................................................................49
Motricidade .......................................................................................................................................51
Alteração da vida instintiva ..........................................................................................................54
Alterações do insight .....................................................................................................................56
2. Intervenção biológica – Psicofarmacologia .........................................................................62
Farmacocinética ...............................................................................................................................64
1) Antipsicóticos ..........................................................................................................................65
2) Antidepressivos ......................................................................................................................66
3) Estabilizadores de humor.....................................................................................................68
4) Ansiolíticos e Hipnoindutores .............................................................................................69
5) Psicoestimulantes ..................................................................................................................71
6) Tratamentos físicos................................................................................................................71
3. Intervenção psicossocial ...........................................................................................................72
Definição de Psicoterapia .............................................................................................................72
Diferença entre Psicoterapia e Amigos ....................................................................................72
Empatia ..............................................................................................................................................73
Caraterísticas para um terapeuta ...............................................................................................73
Fatores da Psicoterapia .................................................................................................................74

2
Tipos de Psicoterapia.....................................................................................................................75
1. Counselling e Psicoterapia de suporte ............................................................................75
2. Psicoterapia psicodinâmica .................................................................................................76
3. Psicoterapia cognitivo-comportamental .........................................................................77
4. Psicoterapia interpessoal .....................................................................................................77
5. Psicoterapia de casal/familiar .............................................................................................78
6. Psicoterapia de grupo ...........................................................................................................78
4. Perturbações esquizofrénicas e psicóticas .........................................................................80
Perturbação Delirante ....................................................................................................................80
Esquizofrenia ....................................................................................................................................86
Perturbação Delirante vs Esquizofrenia ...................................................................................94
5. Perturbações Bipolares .............................................................................................................95
Episódios Maníacos ........................................................................................................................95
Episódios Hipomaníacos ...............................................................................................................98
Episódios depressivos ...................................................................................................................99
Estado misto .................................................................................................................................. 100
Sintomas catatónicos .................................................................................................................. 100
Perturbação Bipolar de Ciclos Rápidos ................................................................................. 101
Tipos de PAB (I e II) ..................................................................................................................... 101
Epidemiologia ................................................................................................................................ 101
Comorbilidades associadas....................................................................................................... 102
Suicídio ............................................................................................................................................ 102
Fisiopatologia ................................................................................................................................ 103
Diagnóstico diferencial ............................................................................................................... 105
Tratamento ..................................................................................................................................... 105
6. Perturbações de Ansiedade e PTSD ................................................................................. 111
Ataque de Pânico ......................................................................................................................... 113
Perturbação de pânico................................................................................................................ 115
Perturbação de ansiedade generalizada............................................................................... 118
Perturbações de Stress pós-traumático ............................................................................... 120
7. Perturbações Depressivas .................................................................................................... 126
Epidemiologia ................................................................................................................................ 126
Etiologia........................................................................................................................................... 127

3
Fatores de risco............................................................................................................................. 132
Clínica............................................................................................................................................... 132
Depressõs sazonais ..................................................................................................................... 134
Estado misto .................................................................................................................................. 135
Episódios ......................................................................................................................................... 135
Apresentação ................................................................................................................................ 135
Prognóstico .................................................................................................................................... 135
Diagnóstico diferencial ............................................................................................................... 136
Tratamento agudo ....................................................................................................................... 137
Efeitos adversos ........................................................................................................................... 139
8. Perturbações fóbicas, obsessivo-compulsiva ................................................................. 141
Definição/Ideias Obsessivas / Compulsões / POC ............................................................. 141
Modelo da POC ............................................................................................................................. 143
Prevalência ..................................................................................................................................... 144
Evolução/Prognóstico ................................................................................................................. 144
Causalidade.................................................................................................................................... 144
Personalidade Pré-Mórbida ...................................................................................................... 145
Diagnóstico Diferencial .............................................................................................................. 145
Terapêutica .................................................................................................................................... 145
FOBIA SIMPLES / ESPECÍFICA................................................................................................ 148
Perturbação Dismórfica Corporal ............................................................................................ 149
Perturbação de Acumulação .................................................................................................... 149
Tricotilomanía e Perturbação de Escoriação........................................................................ 149
9. Perturbações do comportamento alimentar .................................................................... 150
Pica ................................................................................................................................................... 151
Perturbações de Ruminação..................................................................................................... 151
Perturbação de Evitamento / Restrição de Ingestão Alimentar ..................................... 152
Anorexia Nervosa......................................................................................................................... 154
Bulimia Nervosa............................................................................................................................ 158
6. Perturbação de Ingestão Compulsiva ............................................................................... 162
Perturbação de comportamento alimentar sem outras especificações ...................... 162
Anorexia Nervosa VS. Bulimia Nervosa ................................................................................ 163
10. Perturbações orgânicas: demência e delirium ............................................................ 166

4
Perturbação Neurocognitiva Major/Demência .................................................................... 166
Perturbação neurocognitiva minor ......................................................................................... 167
DOENÇA DE ALZHEIMER......................................................................................................... 168
DEMÊNCIAS FRONTO-TEMPORAIS .................................................................................... 176
DELIRIUM ....................................................................................................................................... 180
11. Perturbações de alcoolismo e toxicodependência .................................................... 183
CRITÉRIOS DE DEPENDÊNCIA DE UMA SUBSTÂNCIA ............................................... 184
ALTERAÇÕES METABOLISMO .............................................................................................. 185
SEVERIDADE/EFEITO DO CONSUMO ................................................................................. 185
DOENTES COM MAIOR MORBILIDADE .............................................................................. 185
ÁLCOOL .......................................................................................................................................... 185
TOXICODEPENDÊNCIA............................................................................................................. 190
12. Suicídio e auto-mutilação.................................................................................................. 197
Nomenclatura ................................................................................................................................ 197
Definições ....................................................................................................................................... 198
Epidemiologia ................................................................................................................................ 199
Etiologia........................................................................................................................................... 200
Modelo Limiar ................................................................................................................................ 202
Fatores de risco............................................................................................................................. 202
Fatores protetores........................................................................................................................ 203
Adolescência.................................................................................................................................. 204
Idoso ................................................................................................................................................. 204
Obstáculos à intervenção .......................................................................................................... 205
Avaliação do risco ........................................................................................................................ 205
1º contacto ..................................................................................................................................... 206
Avaliação do doente suicida ..................................................................................................... 207
Critérios para internamento ...................................................................................................... 208
Quem faz avaliação de suicídio e quem é submetido? ..................................................... 208
Modelos de intervenção ............................................................................................................. 209
13. Perturbações da Personalidade ...................................................................................... 210
Personalidade saudável ............................................................................................................. 210
Determinantes da Personalidade ............................................................................................ 210
Perturbação de Personalidade – Critérios ............................................................................ 211

5
Epidemiologia ................................................................................................................................ 211
Perturbação da Personalidade ................................................................................................. 212
Cluster A ......................................................................................................................................... 213
Cluster B ......................................................................................................................................... 214
Cluster C ......................................................................................................................................... 215
Perturbação de Personalidade vs Outra doença mental ................................................. 217
Traços de personalidade vs Perturbação da Personalidade........................................... 217
Abordagem das Perturbações de Personalidade .............................................................. 217
Abordagem terapêutica na Perturbação Borderline ......................................................... 217
Conclusão ....................................................................................................................................... 218

6
1. Psicopatologia
O conceito de psicopatologia significa patologia da alma (Psiché (alma) + patologia
(doença)).

O conhecimento da psicopatologia é fulcral no sentido que permite pegar em vários


sinais/sintomas e tentar aproximar um síndrome para, utilizando o DSM-V, chegarmos
a um diagnóstico, indicando a terapêutica mais apropriada para a situação.

O conceito de psicopatologia possui duas variantes:

1) Psicopatologia explicativa, que tenta estabelecer explicação com base em


informações teóricas;
2) Psicopatologia descritiva, que tenta aferir o que o médico consegue observar do
doente (objetivo, denominado de sinais) e o que o doente nos diz sentir
(subjetivo, denominado de sintomas).

A principal diferença entre a semiologia médica e semiologia psiquiátrica é que na


semiologia médica há um polo lesional específico de onde “partem” os sinais/sintomas,
enquanto que na semiologia psiquiátrica não há um polo lesional concreto.

Na aula teórica foi dito que as principais alterações psicopatológicas que tínhamos
de saber seriam as da percepção, pensamento e memória.

Consciência
A consciência traduz o estado no qual o doente está ciente de si próprio e em
relação ao meio que o rodeia.

A Inconsciência é a ausência da experiência subjetiva de consciência, que pode


acontecer no contexto de:

- Doenças cerebrais;

- Durante o sono;

- Patologias orgânicas;

- Patologias mentais.

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A consciência pode ter 2 tipos de alteração:

➔ Alterações quantitativas

Só falamos de quadros de diminuição da consciência, uma vez que o seu aumento


não existe.

Os quadros de diminuição da consciência normalmente estão associados a patologia


orgânica, pelo que necessitam de investigação médica.

1) Obnubilação: o doente está acordado, com ou se agitação, havendo diminuição


da capacidade de atenção e concentração;
2) Sonolência: o doente está acordado mas, se não existirem estímulos externos,
adormece. Há lentificação psicomotora, com diminuição dos reflexos e do tónus
musculares;
3) Torpor: o doente desperta com estímulos fortes/intensos;
4) Coma: normalmente o doente está totalmente inconsciente e não desperta com
estímulos intensos nem dolorosos.

➔ Alterações qualitativas

Podemos encontrar 3 situações diferentes:

1) Estado oniróide (confuso-onírico)

Carateriza-se por ser um estado em que o doente parece estar a viver num sonho,
normalmente associado a uma patologia orgânica mas pode ser num episódio
dissociativo.

É caraterizado por:

1) Aumento do limiar para captação de todas as experiências sensoriais;


2) Desorientação temporo-espacial mas não autopsíquica;
3) Alucinações visuais (microzoópsias, liliputianas ou gullverianas);
4) Ilusões (incapacidade de distinguir entre a imagem mental e a imagem real);
5) Variação circadiana com agravamento à noite;
6) Delirium ocupacional: o doente julga estar a realizar uma tarefa da sua rotina
diária.

Ainda podemos incluir, dentro deste estado oniróide, duas questões:

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- Delirium/Estado confusional agudo: temos diminuição abrupta da consciência do
doente, podendo ter agravamento noturno. Normalmente tem por base uma patologia
médica pelo que o tratamento é emergente. Pode estar relacionado com infecções.

- Delirium tremens: associada à abstinência do álcool (desde o 1º ao 7º dia), onde


temos alterações psiquiátricas (alucinações visuais (microzoópsias – pequenos animais
e insetos) e/ou liliputianas (pequenas pessoas)) e sintomas físicos como taquicardia,
hipertensão, hipersudorese, palpitações, tremor pela abstinência do álcool que é
depressor do SNC.

QUAL O DIAGNÓSTICO?

Delirium (estado confusional agudo).

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QUAL O DIAGNÓSTICO?

Delirium tremens (no contexto de abstinência alcoólica).

2) Estreitamento

Vamos ter a focalização/polarização da consciência para um número reduzido de


ideias ou atitudes.

Uma situação em particular é o estado crepuscular, onde o doente tem início e fim
abruptos, com uma explosão de violência num doente com comportamentos,
habitualmente, normais!

3) Expansão

Doente sente que está mais alerta, está mais atento, com maior capacidade de
orientação e de memória em relação ao “habitual” para este.

Alterações da Consciência
Alterações quantitativas Alterações qualitativas
Diminuição da consciência Estado oniróide (confuso-onírico)
Obnubilação - Delirium/Estado confusional agudo

Sonolência - Delirium tremens

Turpor Estreitamento
Coma - Estado crepuscular

Expansão

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Atenção
A atenção define-se como a orientação da atividade psíquica para um
determinado evento ou objeto.

Pode ser:

1) Ativa/voluntária: o doente consegue direcionar a sua atenção, de forma


voluntária, para aquilo que lhe interessa;
2) Passiva/involuntária: despertada pelo interesse momentâneo num evento
transitório, este não controla.

A atenção pode estar:

1) Aumentada → Hiperprosexia;
2) Diminuída → Hipoprosexia e distractibilidade (este último é a instabilidade e
mobilidade acentuada da atenção voluntária).
3) Estreitada → pode haver estreitamento da atenção e o doente apenas toma
atenção em relação a algo muito específico da sua consciência.

Atenção
Hiperprosexia
Hipoprosexia/Distractibilidade
Estreitamento da atenção

Orientação
A orientação é a capacidade de se identificar e de se situar no tempo, espaço,
em relação a si próprio e no geral.

1) Desorientação temporal

É aquela que é mais rapidamente e frequentemente afetada.

Ligeira → desorientação em termos de horas do dia;

Moderada → desorientação em termos de dias, meses, anos;

Severa → desorientação em termos de estação do ano.

2) Desorientação espacial

Doente não sabe onde está nem onde vive.

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3) Desorientação auto-psíquica

Doente não sabe o seu nome, a sua idade, onde nasceu, o seu estado civil, a sua
profissão.

É referente ao conhecimento da pessoa em si, da sua biografia.

4) Desorientação alopsíquica

Doente não tem informação sobre o que o rodeia, não reconhece as pessoas.

Inclui a desorientação no tempo e no espaço.

A desorientação no tempo e no espaço tem, na maioria das vezes, uma causa orgânica.

Memória
A memória permite apreender, reter, evocar e reconhecer uma informação.

Esta memória pode-se dividir em:

1) Memória sensorial: duração de segundos;


2) Memória primária, curto prazo ou de trabalho: duração de segundos a minutos;
3) Memória secundária ou longo prazo: de minutos a décadas.

Depois podemos ter, também:

1) Memória semântica: referente a verdades universais, sem noção de tempo nem


espaço. “O mundo é redondo”;
2) Memória episódica, biográfica ou história: tem noção de tempo e espaço. “Esta
tarde comi uma sandes de queijo”.
3) Memória explícita/declarativa: o doente sabe que está a utilizar informação da
memória para produzir ou realizar algo de forma voluntária;
4) Memória implícita/procedimental: o doente armazenou aquela memória de forma
involuntária e, quando a aplica, não tem noção do recurso à memória (andar de
bicicleta).

A formação de uma memória tem várias etapas:

- Apreensão: capacidade de adquirir uma nova memória;

- Retenção: capacidade de armazenar uma nova memória. Passa de memória


sensorial/imediata, para primária/curto prazo e, depois, para memória
secundária/longo prazo.

- Evocação: capacidade de tornar consciente uma informação armazenada;

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- Reconhecimento: capacidade de se sentir familiarizado com uma memória
formada.

Nas demências há manutenção da memória remota mas há perda da memória mais


recente.

As alterações da memória podem-se dividir em:

➔ Alterações quantitativas
Podemos ter um aumento (hipermnésia) ou diminuição (amnésia).

Hipermnésia

Carateriza-se por uma capacidade mnésica muito superior em relação ao normal,


com extrema facilidade em recordar (abrange, principalmente, a evocação).

Acontece em situações como:

1) Consumo de estimulantes do SNC (anfetaminas);


2) Estados febris;
3) Ideias obsessivas;
4) Perturbação de stress pós-traumático;
5) Personalidade histriónica;
6) Aura epiléptica.

Ecmnésia = doente relembra de forma muito intensa algo que julgava estar
esquecido;

Eidolia = uma ecmnésia tão intensa que parece uma alucinação.

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Amnésia

Incapacidade ou dificuldade em apreender, reter ou evocar uma memória


(dificuldade na apreensão, reteção e evocação).

Estas podem ser:

1) Anterógradas: doente não consegue evocar uma memória depois de um


certo evento Acontece nos traumatismos CE e blackout alcoólico;
2) Retrógrada: doente não consegue evocar uma memória antes de um certo
acontecimento;
3) Lacunar: doente não consegue evocar memórias entre 2 períodos do tempo;
4) Remota: doente não consegue evocar memórias do passado.

As amnésias ainda se podem dividir em amnésias orgânicas e amnésias


psicogénicas.

Amnésias orgânicas: pouco seletivas em relação ao conteúdo das amnésias.


Podem ocorrer nas várias etapas da formação da memória:

- Apreensão: associada a traumatismos cranianos, “Blackouts” alcoólicos ou


delirium;

- Retenção: associada a demências;

- Evocação: associada a amnésia diencefálica (no síndrome de korsakoff, o


doente não tem insight e faz confabulações) e amnésia hipocampal (em afeções do lobo
temporal pós encefalites, o doente tem insight e não faz confabulações).

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Amnésias psicogénicas: a informação mnésica perdida não é aleatória mas sim
mais selecionada, tem diferentes valores emocionais/afetivos para o doente.
Normalmente estão relacionados com a fase de evocação e de reconhecimento (+
tardios).

- Amnésia dissociativa: há uma dissociação entre uma ausência mnésica total e


uma perfeita capacidade de tomar conta de si próprio e de manutenção da
personalidade do mesmo. (na amnésia orgânica se houver amnésia total temos perda
da capacidade de tomar conta de si próprio).

- Catatímica: as perdas mnésicas dependem da carga afetiva atual do doente. O


doente não se lembra de determinado evento “porque lhe dá jeito”.

Amnésia orgânica Amnésia psicogénica


Acontecem perdas de memória sem critérios, As perdas de memória têm diferentes níveis
gerais afetivos/emocionais para o doente
Afetam a fase de apreensão, retenção, evocação Afetam a fase de evocação e reconhecimento
Amnésia dissociativa
Catatímica

QUAL O DIAGNÓSTICO?
Demência (Doença de Alzheimer?)

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➔ Alterações qualitativa

As alterações são denominadas paramnésias, onde não temos ganho nem perda de
memórias mas sim a alteração/distorção das mesmas.

Temos alterações ao nível da evocação e ao nível do reconhecimento (como nas


amnésias psicogénicas).

- ALTERAÇÕES DA EVOCAÇÃO -

- Falsificação retrospetiva: distorção não intencional de uma memória de acordo com o


estado afetivo (deprimido ou maníaco) ou funcional (personalidade) do doente. É
diferente da amnésia catatímica porque aqui o doente não tem amnésia mas sim
distorção de uma memória;

- Delírio retrospetivo: o doente alega que o conteúdo das ideias delirantes é anterior ao
diagnóstico da doença. Ex: doente tem uma ideia delirante em como tem poderes
especiais mas diz que estes começaram na infância.

- Recordação delirante: tipo de delírio primário. Podemos ter uma recordação delirante
do tipo percepção delirante (“sei que sou da família real porque quando era pequeno
comia com colheres com coroas desenhadas”) e recordação delirante do tipo ocorrência
delirante (“sei que sou da família real porque quando era pequeno o rei saudou-me”).

- Confabulações: doente vai preencher lacunas da memória com descrições detalhadas


e falsas de determinados eventos/acontecimentos. Muitas vezes são eventos que não
têm nexo/enquadramento na história, o doente é confrontado com isto e parece não ter
consequência nem deixa o doente desconfortável. São plásticas e sugestionáveis, ou
seja, mudam de acordo com sugestões ou outras situações. Acontece nas amnésias
orgânicas diencefálicas como Síndrome de Korsakoff.

- Síndrome das memórias falsas: o doente, durante uma psicoterapia, vai, a sugestão do
terapeuta, dizer que teve abusos sexuais e físicos ao longo da vida quando, na verdade,
não teve.

- Criptomnésia (memória oculta): o doente vai ter a percepção de que uma lembrança
recente é algo novo (e não recordado) e vai contar isto como se fosse a 1ª vez que
alguém diz. Ex: num grupo de amigos, o amigo A conta a história X. O doente vai,
passado uns minutos, contar a história X como se esta fosse nova e nunca contada.

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- ALTERAÇÕES DO RECONHECIMENTO –

Podem ser delirantes ou não delirantes:

➔ Não delirantes
- Déjà-vu : sensação de que a experiência que o doente está a sentir, já sentiu
outra vez quando, na realidade, é a primeira vez;
- Jamais-vu : doente tem a sensação de que, apesar de não ser a primeira vez
naquela experiência, para ele parece-lhe que é a 1ª.

Pode acontecer tanto em quadros de cansaço como em casos de patologia cerebral


vascular e de psicoses tóxicas.

➔ Delirante:

- Identificação errónea positiva: o doente acha que os desconhecidos são pessoas


conhecidas, quando não são. Relacionado com o Delírio de Fregoli onde acha que as
pessoas desconhecidas são pessoas conhecidas que estão disfarçadas.

- Identificação errónea negativa: o doente não reconhece as pessoas que,


normalmente, iria reconhecer. Relacionado com o Delírio de Capgras onde o doente acha
que as pessoas que conhece foram substituídas por sósias e, por isso, não são as
mesmas.

- Síndrome de intermetamorfose: doente sente que as pessoas que conhece


trocaram física e psicologicamente umas com as outras.

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Alterações da memória
Quantitativas Qualitativas
Hipermnésia Amnésia Paramnésias
Amnésia Amnésia Evocação Reconhecimento
orgânica psicogénica
Apreensão Amnésia Falsificação Não-Delirante Delirante
Traumatismo dissociativa retrospetiva
CE, Delirium,
Blackout
alcoólico
Retenção Catatímica Delírio Déjà-vu Identificação errónea
Demência retrospetivo positiva
Evocação Recordação Jamais-vu Identificação errónea
Amnésia delirante negativa
diencefálica
Amnésia
hipocampal
Confabulação Síndrome de
intermetamorfoses
Síndrome de
memórias
falsas
Criptomnésia

Percepção
A percepção é um fenómeno que necessita de 3 intervenientes:

As alterações da percepção podem ser de 2 tipos:

1) Distorção sensorial – de um objeto real tem-se uma percepção alterada;


2) Falsa percepção – criação de uma percepção “de novo” que pode, ou não, ter um
estímulo externo.

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➔ Distorções sensoriais
Como vimos, nestas temos um objeto real com uma percepção distorcida.

Alterações quantitativas
- Hiperestesia

As percepções são vividas de forma mais intensa (quer auditivas quer visuais).

As hiperestesias auditivas verificam-se pela redução do limiar a partir do qual o


estímulo é incomodativo (e não pelo aumento da acuidade auditiva).

- Hipostesia

A intensidade das percepções está diminuída, uma vez que o limiar de captação
destas percepções está aumentado. Ou seja, o doente tem maior dificuldade a “adquirir”
percepções. Acontece no Delirium (onde temos o aumento do limiar das percepções).

Alterações qualitativas

- Alteração da cor

O doente pode ter a percepção aumentada de determinadas cores (xantopsia –


amarelo, cloropsia – verde, eritropsia – vermelho).

- Alteração da dimensão (dismegalopsia)

Percepção da dimensão aumentada – megalopsia ou macropsia;

Percepção da dimensão diminuída – micropsia.

- Ateração da forma (dismorfopsia)

- Separação da percepção

Quando temos informações sensoriais conjuntas e o organismo vai denotar como


separadas. Ou seja, o doente vê e ouve televisão mas sente que são 2 estímulos
diferentes para ele.

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Distorções sensoriais
Alterações quantitativas Alterações qualitativas
Hiperestesia Alteração da cor Alteração da dimensão
Hipostesia Alteração da forma Separação da percepção

➔ Falsas percepções

Temos uma percepção “de novo” que pode, ou não, ter um estímulo externo.

As falsas percepções podem-se dividir em:

ILUSÃO

Quando temos uma fusão entre a percepção que temos de um objeto real e uma
imagem mental, resultando numa percepção “de novo”.

Estão relacionadas com diminuição da acuidade perceptiva, emoções intensas


ou do cenário, pelo que normalmente se extinguem com o aumento da atenção.

Podem acontecer em pessoas com ou sem patologia psiquiátrica.

Podem estar relacionados com:

➔ Pareidolia: criação de formas imaginárias a partir de eventos com forma mal


definida (olhar para as nuvens e ter a percepção de um rosto);
➔ Imagem eidética: quando ficamos a observar, durante muito tempo, uma imagem
sobre um fundo escuro e, quando o fundo é removido, conseguimos ter a
visualização desta imagem pormenorizada;
➔ Ilusão de preenchimento: quando, de forma automática, preenchemos uma
lacuna num evento sensorial (a ler um livro, se faltar uma letra a uma palavra nós
nem notamos);
➔ Ilusão de afeto: alteração de uma percepção em função do estado de humor (um
doente maníaco pode ler “precisa-se de emprego em pessoa fluente” onde diz
“precisa-se de emprego para pessoa inteligente”).

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ALUCINAÇÃO

É uma falsa percepção que, ao contrário da ilusão, não se desenvolve a partir da


transformação de uma percepção real mas que acontece simultaneamente a percepções
reais.

Tem objetividade, corporalidade e é identificada no espaço externo do doente


(diferente da pseudoalucinação que é mais subjetivo, não tem corporalidade e é
identificada no espaço interno do doente).

As alucinações são divididas em função do seu tipo sensorial:

➔ Alucinações Auditivas

Podem ser:

1) Elementares – gritos, murmúrios, estampidos;


2) Parcialmente organizadas – música;
3) Completamente organizada – acústico-verbal (vozes, palavras).

Para classificarmos as alucinações acústico-verbais, temos de pensar em:

1) Qualidade (claras ou vagas);


2) Conteúdo (Imperativo (dá ordens) ou Interpelativo (comenta atitudes));
3) Impacto (amigáveis ou agressivas);
4) Direção (na 2ª pessoa (tu) ou 3ª pessoa (ele)).
- QCID –

Nota que as alucinações acústico-verbais na 3ª pessoa e que comentam o que este


faz (interpelativas) são típicas da Esquizofrenia (sintomas de 1ª ordem de Schneider).

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➔ Alucinações Visuais

Podem ser:

1) Elementares – fosfenos e fotopsias (clarões, chamas, sombras);


2) Parcialmente organizadas – padrões, figuras geométricas;
3) Completamente organizadas – pessoas, animais, objetos.

São mais frequentes em patologias orgânicas (traumatismos cranianos, delirium,


demências) e intoxicações por alucinogéneos do que psicoses funcionais (não
orgânicas), sendo que, muitas vezes, podem estar relacionadas com alucinações
liliputianas (pessoas minúsculas) ou alucinações gulliverianas (gigantes), bem como
animais (zoopsias).

➔ Alucinações Táteis/sensibilidade superficial

Podem ser de 2 tipos principais:

1) Ativas: os doentes sentem que estão a tocar em objetos que não existem;
2) Passivas: os doentes sentem que estão a ser tocados por objetos ou pessoas. Dentro
destas podemos destacar as formicações em que o doente sente que tem insetos a
rastejar na pele ou imediatamente abaixo dela (cocaine bugs).

Incluem-se aqui as alucinações sexuais (toques sexuais, reações forçadas,


violação…) que ocorrem na esquizofrenia ou nas demências.

➔ Alucinações cenestésicas ou da sensibilidade profunda

Podem ser:

1) Alucinações viscerais – sente que os seus órgãos estão a andar dentro de si ou que
tem animais no seu interior;
2) Parasitoses alucinatórias – sente que tem o corpo infetado com parasitas no seu
interior.

➔ Alucinações olfativas

O doente sente cheiro a gás, cheiro a borracha queimada ou que ele próprio emite
mau cheiro. Acontece principalmente em epilepsia e quadros orgânicos.

22
➔ Alucinações gustativas

O doente tem alteração da perceção de sabor da comida, podendo até ter sitiofobia
(achar que o sabor da comida está diferente porque o envenenaram). Acontece na
esquizofrenia e quadros orgânicos. Devemos fazer distinção do delírio secundário onde
o doente esquizofrénico se sente fisicamente alterado e, por isso, acha que foi
envenenado.

➔ Alucinações motoras ou cinestésicas (pensar em cinética do movimento)

O doente sente que está a realizar movimento voluntário, que está a ser submetido
a movimento passivo, que se está a movimentar de forma lenta ou rápida, etc.

Pode ser:

1) Elementar: movimentos indeterminados;


2) Complexa: sente que está a levitar, que tem um braço a subir, que se está a
afundar.

Outras caraterísticas importantes a abordar:

1) Alucinações hipnagógicas: ocorrem ao adormecer;


2) Alucinações hipnopômpicas: ocorrem ao acordar.

Estas 2 podem acontecer de forma natural, sendo normalmente alucinações


auditivas. Podem acontecer em narcolepsia ou em abuso de tóxicos.

3) Alucinações funcionais: a alucinação é desencadeada por um estímulo dentro


da mesma área sensorial, ou seja, o doente tem alucinações acústico-verbais
depois de ouvir os pássaros a cantar, ou seja, tem um desencadeante (ouvir as
vozes dos pássaros);
4) Alucinação reflexa: a alucinação é desencadeada por um estímulo de outra área
sensorial, ou seja, o doente tem alucinações acústico-verbais depois de ver o
arco íris. O desencadeante (ver o arco íris) é de uma modalidade sensorial
diferente da alucinação (acústico-verbal).
5) Alucinações múltiplas: o doente tem uma alucinação “completa” em termos de
modalidades sensoriais: ouve uma voz (alucinação acústico-verbal) que
consegue ver (alucinação visual) e que lhe toca (alucinação da sensibilidade
superficial).
6) Alucinação extracâmpica: o doente tem alucinações com estímulos que estão
fora do seu campo sensorial, ou seja, alucina com pessoas no Brasil enquanto
está em Lisboa.
7) Alucinose : em doentes consumidores crónicos de álcool têm alucinação auditiva
sem perda de consciência, sem ideias delirantes predominantes, com insight
(crítica).

23
Alucinações
Sensibilidade Sensibilidade
Auditivas Visuais Olfativa Gustativa Cinestésica
superficial profunda
Elementares Elementares Ativa Alucinações Elementar
viscerais
Parcialmente Parcialmente Passiva Parasitose Complexa
organizadas organizadas alucinatória
Completamente Completamente
organizadas organizadas

PSEUDOALUCINAÇÃO

Distingue-se das alucinações porque as pseudoalucinações carecem de


objetividade sensorial, ou seja, não têm objetividade nem corporalidade, reconhecem-
se como vindo do espaço interior, estão suscetíveis à vontade do doente e este,
normalmente, tem insight. Não persistem muito tempo e são modificados pela vontade.

Muitas vezes podem anteceder, em termos de quadro evolutivo, as próprias


alucinações ou podem surgir simultaneamente com estas. Pode acontecer em episódios
depressivos ou personalidades histriónicas, sendo que normalmente são
pseudoalucinações de caráter fantástico, assustadoras, integradas no contexto
sociocultural do doente).

As alucinações do luto são consideradas pseudoalucinações.

24
QUAL O DIAGNÓSTICO?

Esquizofrenia descompensada (pela baixa adesão à terapêutica?)

QUAL O DIAGNÓSTICO?

Pseudoalucinação (em personalidade histriónica?)

Alterações da percepção
Distorção sensorial Falsas percepções
Quantitativa Qualidade Ilusões Alucinações Pseudoalucinações
Hiperestesia Cor - Pareidolia Visuais
Hipostesia Forma - Imagem eidética Auditivas
Tamanho - Ilusão de Táteis/sensibilidade
preenchimento superficial
Separação da - Ilusão de afeto Cenestésica/sensibilidade
percepção profunda
Olfativa
Gustativa
Cinestésica/Movimento

25
Discurso e linguagem
As alterações de discurso e linguagem podem ser:

1) Orgânicas: Disartria, Dislexia, Afasia, Parafasia;


2) Funcionais: da articulação, da atividade verbal, do débito/ritmo, iterativas,
semânticas e sintáticas.

ORGÂNICA

1) Disartria

Afeção da produção das palavras numa componente motora, chamada linguagem


arrastada, empastada ou fala embriagada.

Acontece, na maioria das vezes, por parésia dos músculos da face/palato mole.

2) Dislexia

Problemas na descodificação (compreensão) das palavras.

3) Afasia

Alteração de uma ou mais componentes da linguagem (nomeação, compreensão,


repetição, fluência).

➔ Afasia de compreensão/Wernicke: o problema do doente vai ser ao nível da


compreensão, nomeação e repetição, estando apenas a fluência preservada. Há
agrafia e alexia;
➔ Afasia de fluência/Broca: o problema está na fluência, nomeação e repetição mas
está mantida a compreensão, não havendo agrafia nem alexia.

4) Parafasia

Utilização de uma palavra errada ou distorcida.

Ibro = Livro ; Cameila = Cadeira.

26
FUNCIONAIS (AARISS)

➔ Alterações da articulação
Gaguez

➔ Alterações da atividade
1) Hipoatividade
- Linguagem quantitativamente diminuída
- Mutismo: ausência de discurso de forma voluntária, com manutenção
da consciência e da capacidade de fonação. Pode ser seletiva ou eletiva.
- Mutacismo: mutismo deliberado no contexto da mania, na simulação ou
no doente delirante.

2) Hiperatividade
- Prolixidade: doente fala muito sobre cada tópico mas dentro da
normalidade;
- Verborreia: doente fala demasiado sobre cada tópico, com muita pressão e
agitação, sendo difícil manter uma conversa com estes doentes.

➔ Alteração do Ritmo
- Fluxo lentificado ou bradifemia: discurso lentificado, com longas pausas e com
dificuldade a iniciar o discurso;
- Fluxo acelerado ou taquifemia: discurso acelerado, sem pausas e com
articulação rápida das várias palavras;
- Aprosodia: discurso sem qualquer entoação afetiva/emocional.

➔ Alterações iterativas
- Logoclonia: o doente repete a última sílaba da palavra que o próprio
pronunciou. Ex: direito, eito, eito, eito.
- Ecolália: o doente repete de forma imediata e automática palavras ou sons ditas
pelo interlocutor.

➔ Alterações semânticas
- Neologismo: doente cria uma nova palavra;
- Paralogismo: doente atribui um significado diferente a uma palavra que já
conhece;
- Discurso pobre: diminuição da utilização de recursos linguísticos e da riqueza
gramatical;
- Pedolalia: discurso infantilizado;
- Coprolalia: discurso no qual existem interjeições involuntárias de palavras
obscenas ou ruídos intensos.

27
➔ Alterações sintáticas
- Agramatismo: a frase fica construída sem interjeições ou complementos, de
forma quase telegráfica. Ex: Eu quero ir casa tomar banho (eu quero ir a casa
para tomar banho).

Alterações do discurso e da linguagem

Orgânica Funcional

Disartria
Perturbação
Perturbação Alterações Alterações Alterações
da Perturbação da atividade
do ritmo iterativas semânticas sintáticas
articulação
Dislexia Gaguez Hipoatividade Hiperatividade Bradifemia Logoclonia Neologismos Agramatismo

Afasia Linguagem Prolixidade Taquifemia Ecolalia Paralogismos


quantificada
diminuída

Parafasia Mutismo Verborreia Aprasodia Discurso


pobre
Mutacismo Pedolalia

Coprolalia

Pensamento
As alterações do pensamento podem ser de 4 categorias:

1) Alterações do Curso
Dentro das alterações do curso, podemos ter:
1) Alterações do ritmo do pensamento;
2) Alterações da continuidade do pensamento.

28
ALTERAÇÕES DO RITMO DO PENSAMENTO

1) Taquipsiquismo

Aumento da velocidade de fluxo do pensamento. Pode estar associado a verborreia


ou não, bem como a fuga de ideias. Classicamente associam-se a hipomania ou mania.

2) Bradipsiquismo

Diminuição da velocidade de fluxo de pensamento. Há quem faça diferenciação


entre bradipsiquismo (em que, uma pessoa externa, consegue ver o doente a ter um
pensamento mais lento) e pensamento inibido (o próprio doente tem a experiência
subjetiva de demorar mais tempo a pensar num assunto, a conseguir tomar decisões).
Estados depressivos.

3) Fuga de Ideias ou pensamento ideofugitivo

Pensamento no qual vamos ter uma sequência de ideias, com certa relação causal
(verbal ou sonora) em que não regressamos ao pensamento inicial. O pensamento muda
constantemente de objetivo. Ocorre sempre na presença de pensamento acelerado.

Ex: Na semana passada fui a Paris… Gosto muito


do chafariz que há na minha terra… Tenho comichão
no nariz há umas semanas.

4) Pensamento circunstanciado
O doente tem pouca capacidade de síntese e
de manter o pensamento inicial, se bem que
acaba por regressar a este. Mas, no caminho,
perde-se em detalhes irrelevantes e dispersa em
temas paralelos. Perturbação da personalidade.

29
QUAL O DIAGNÓSTICO?

Episódio maníaco (em perturbação afetiva bipolar tipo I por não adesão à terapêutica?)

ALTERAÇÃO DA CONTINUIDADE DO PENSAMENTO

1) Bloqueio de pensamento
O doente tem um bloqueio súbito e total da continuidade e progressão do
pensamento, ao ponto que interrompe bruscamente a sua fala e discurso.
Quando consegue retomar o discurso, fá-lo com outra ideia e demonstra-se
envergonhado por não ter noção da ideia prévia. Típico da esquizofrenia.

2) Perseveração ideativa
O doente fica “preso” numa ideia e não consegue passar de uma ideia para a
seguinte, ou seja, fica a repetir (para além do normal) a mesma ideia. Torna-se
incapaz de se adaptar a outras questões que sejam colocadas, repete
voluntariamente sempre a mesma questão. Não muda o tópico da conversa.

3) Perseveração verbal
O doente fica “preso” numa palavra/frase do discurso e não consegue adaptar-
se a novas questões que sejam colocadas. Por exemplo, no decorrer de uma
entrevista clínica, o médico pergunta quantos filhos o doente tem e este
responde “tenho 2 filhos”. Depois, prossegue na entrevista e pergunta se faz
alguma medicação e o doente não consegue alterar a resposta e diz “tenho 2
filhos”. Ou seja, responde uma informação do discurso que, no momento atual,
já não é relevante e se torna desadequado.

30
Alterações do curso do pensamento
Ritmo Continuidade
Taquipsiquismo Bloqueio de pensamento
Bradipsiquismo Perseveração ideativa
Fuga de ideias Perseveração verbal
Pensamento circunstanciado
Pensamento inibido

2) Alterações da Forma

São alterações da organização e processo associativo do pensamento, que


podem acontecer na esquizofrenia ou noutras patologias orgânicas cerebrais, bem como
na depressão e episódios maníacos.

➔ Pensamento concreto

O doente perde a capacidade abstrata, de ironia e de duplo sentido, pelo que só


capta a componente concreta de palavras e frases.

Podemos testar ao pedir para o doente explicar um provérbio português. Por


exemplo, perante o provérbio “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”, uma
pessoa normal interpreta como a persistência leva ao caminho desejado, enquanto um
doente sem pensamento abstrato vai dizer que a água, ao bater muitas vezes na pedra
pode acabar por parti-la.

Podemos testar a questão da conceptualização em termos de 2 palavras e perceber


se o doente reconhece uma classe comum (maça e pêra, o doente deverá dizer que são
peças de fruta) ou (relógio e régua, são instrumentos de medição). Muitas vezes os
doentes dizem o que há de diferente em vez de o que há de igual.

➔ Pensamento assindético

Vão-se unir na mesma frase dois pensamentos que estão mais ou menos associados
entre si mas que, na sequência, não faz sentido.

“Estou em casa e o agente é secreto”.

➔ Sobreinclusão

Surge na dificuldade de perceber os limites de um conceito e acaba por integrar num


conceito ideias pertencentes a outros conceitos.

Doente confunde sala com cadeira da sala.

31
➔ Descarrilamento

O doente vai ter um discurso em que as ideias, ditas de forma sequencial, não têm
qualquer tipo de relação e o doente não consegue atingir o pensamento principal. Perde-
se no pensamento subsidiário sem relação com o primeiro.

“Vou apanhar o autocarro, vou para casa dos meus pais, o presidente da república
controla-me as ideias, as câmaras estão na minha sala”.

➔ Fusão

O discurso do doente vai ser uma salganhada em que há interposição de várias


ideias que não têm relação entre elas.

“Eu sei que os marcianos me andam a perseguir desde daquele dia na praia. Os
superpoderes que eu tenho, desde pequeno, a minha mãe não sabe. Quando voltar à
praia os marcianos vão-me querer ir buscar. A minha mãe nunca chegou a negar os
superpoderes que eu tenho” (intercala-se a ideia A e ideia B que o doente têm, sem que
estas tenham relação entre as mesmas, havendo um discurso sem sentido).

Tanto na fuga de ideias como no descarrilamento há afastamento do pensamento


principal.

➔ Suspensão

O doente interrompe, de forma súbita, a sua sequência de pensamento.

“Hoje almocei peixe grelhado que foi pescado pelo meu marido e acompanhei com…
Amanhã de manhã tenho de apanhar o autocarro para o trabalho.”

Acaba por ser semelhante ao bloqueio de pensamento.

➔ Pensamento desagregado

Grau de miscelânea de pensamento onde temos uma junção de descarrilamento e


fusão.

Alteração da forma do pensamento


Pensamento Pensamento Sobreinclusão Descarrilamento Fusão Suspensão Pensamento
concreto assindético desagregado

32
QUAL O DIAGNÓSTICO?

Esquizofrenia residual

3) Alterações da posse do pensamento

➔ Ideias obsessivas

São pensamentos, ideias, imagens, dúvidas ou medos que surgem de forma


recorrente e persistente, opondo-se aos valores morais do doente e àquilo que este
acredita (egodistónicas).

O doente tenta resistir a estas ideias mas, a partir de certo ponto, estas ideias
tornam-se ansiogénicas para o mesmo, causam sofrimento!

No entanto, o doente mantém insight (crítica) em relação a estas.

Os temas das ideias obsessivas podem ser:

Contaminação Religião Filosóficas Doença Simetria


Neste contexto podem surgir as compulsões, que são atos motores ou mentais
irresistíveis que o doente executa como forma de aliviar a carga ansiogénica provocada
pelas obsessões, apesar de, a longo prazo, acabar por aumentar, efetivamente, a
ansiedade.

33
➔ Alienação do pensamento

O doente sente que os seus pensamentos são controlados e regidos por uma
entidade extrínseca ao doente. Frequente na esquizofrenia.

1) Imposição de pensamentos

Doente afirma que os seus pensamentos foram introduzidos na sua cabeça, que não
são dele e que alguém os colocou lá;

2) Roubo de pensamento

Doente sente que alguém roubou os seus pensamentos e se apoderou dos mesmos;

3) Difusão de pensamento

Doente pensa que o seu pensamento pode ser:

- Lido por outras pessoas → Leitura de pensamento

- Ouve os pensamentos em voz alta → Sonorização do pensamento

- Partilhado com outras pessoas → Pensamento compartilhado.

4) Alterações do conteúdo

Em função da gravidade e intensidade destas ideias, podemos dividir em ideias


sobrevalorizadas e Delírio (ideia delirante).

➔ Ideia sobrevalorizada

Ideia errónea com superestimação afetiva, ou seja, o doente centra a vida e atitudes
dele em função de uma ideia que:

1) É egossintónica, ou seja, é concordante com as caraterísticas, valores e crenças


do doente;
2) O doente não tem auto-crítica em relação ao caráter aberrante destas ideias;
3) É, na maioria das vezes, uma ideia redutível e que o doente não tem convicção
plena de forma tão exuberante quanto a ideia delirante.

Temos uma ideia com grande carga afetiva para o doente que é compreensível no
contexto da doença (ideia de ter excesso de peso na anorexia nervosa ou de estar
doente na hipocondria).

Tem menos intensidade que a ideia delirante.

34
➔ Ideia delirante

Crença falsa, impossível e não lógica que assume determinadas caraterísticas:

1) É egossintónica, ou seja, é concordante com as crenças, valores e ideias do


doente;
2) O doente não tem auto-crítica em relação à ideia delirante, considera-a plausível
e válida;
3) É irredutível perante convicção da sociedade ou mesmo argumentação lógica;
4) O doente tem convicção plena desta ideia;
5) É de conteúdo impossível ou distante da realidade socio-cultural (este último é
mais controverso porque pode haver ideias delirantes próximas da realidade).
Normalmente diz-se que é incompreensível para a realidade do doente.

As ideias delirantes podem ser classificadas em ideias delirantes primárias ou ideias


delirantes secundárias.

1) DELÍRIO PRIMÁRIO

Surge sem causa aparente, sem relação com outras alterações psiquiátricas. Perante
um objeto real, surge um novo significado e uma percepção verdadeira. Típicos da fase
inicial da esquizofrenia (em fase aguda).

Existem algumas vivências delirantes primárias:

- Humor delirante: o doente tem o pressentimento que algo está errado mas não
sabe o que é, causando alguma angústia no doente. Pode ocorrer com
despersonalização (“eu estou diferente”), desrealização (“o mundo está diferente”) ou
perplexidade.

- Percepção delirante: o doente atribui um novo significado, anormal e


normalmente autorreferenciado, a um objeto normalmente percebido. Ou seja, não é
uma questão de alteração da percepção mas sim da atribuição do significado sobre o
mesmo, pelo que que temos um objeto real com uma percepção verdadeira mas um
significado novo.

“Descobri que era da máfia porque tinha uma nódoa na camisa”. A nódoa é um
componente/objeto real, a atribuição de significado a esta (sujou-se a comer ou algo do
género) é que está alterado.

35
- Ocorrência delirante: sem termos qualquer tipo de percepção envolvida, o
doente simplesmente, de forma súbita, surge com uma ideia delirante, decidida.

“Agora que sei que os aviões são russos sei que estou a ser perseguido pelo
governo”.

- Recordação delirante, no qual existe uma ideia delirante com base num
conteúdo anterior à ideia delirante. Pode ser de 2 tipos:

1) Recordação delirante do tipo percepção delirante: o doente, com base numa


percepção da sua infância, desenvolve uma ideia delirante. A percepção final está ligada,
por um lado, à percepção do objeto real e, por outro, a um novo significado.

“Sei que sou da família real porque quando era pequeno comia com talheres que
tinham uma coroa desenhada”.

2) Recordação delirante do tipo ocorrência delirante: o doente tem uma ideia


delirante com base numa recordação que tem, sem haver uma percepção
específica. Não há estrutura de dupla vertente.

“Sei que sou da família real porque quando era pequeno o rei saudou-me”.

- HPOR -

2) DELÍRIO SECUNDÁRIO

Surge no contexto de outras patologias psiquiátricas existentes, pelo que estão


envolvidas num contexto de comorbilidade do doente. Por exemplo ideias delirantes no
contexto de uma perturbação de humor (mania ou depressão) ou na esquizofrenia
crónica.

Alteração do pensamento
Curso Forma Posse Conteúdo
Ritmo Continuidade Pensamento Ideias Alienação do Ideias Ideias
concreto obsessivas pensamento sobrevalorizadas delirantes
Taquipsiquismo Bloqueio de Pensamento - Imposição - Delírio
pensamento assindético do primário
pensamento
Bradipsiquismo Perseveração Sobreinclusão - Roubo do - Delírio
ideativa pensamento secundário
Fuga de ideias Perseveração Fusão - Difusão do
verbal pensamento
Circunstanciado Descarrilamento
Pensamento Suspensão
inibido
Pensamento
desagregado

36
QUAL O DIAGNÓSTICO?

1º surto psicótico

Quais as temáticas do delírio?

1) Delírio persecutório/paranóide

O doente sente-se ameaçado, perseguido, controlado, tem medo que as pessoas à


sua voltem estejam a persegui-lo.

É o tipo de delírio mais frequente, acontece na esquizofrenia e pertubação delirante.

2) Autorreferência

Doente que, quando passa na rua, sente que as pessoas estão a olhar para ele, a
comentar ou falar sobre ele. Está convencido que acontecimentos fortuitos lhe dizem
respeito. Acontece na esquizofrenia.

3) Delírio de grandeza

Há um exagero da pessoa do doente, ou seja, da sua personalidade, capacidades ou


aspeto. Julga ter algum tipo de poder especial, de ser familiar de alguém conhecido, ter
um grande cargo na sociedade ou ser alguém de renome. Frequente na esquizofrenia
ou mania delirante.

37
4) Delírio místico/religioso

O doente sente que é uma entidade religiosa ou o salvador da nação (messias). Vai
para além do normal da religião, está relacionado com religião e espiritualidade.

5) Delírio somático ou hipocondríaco

Doente tem alterações no funcionamento orgânico que atribui a uma doença


incurável que julga ter.

Pode ter somatização de alguns sintomas físicos com origem psiquiátrica, sem causa
orgânica associada.

Associado a esquizofrenia ou depressão grave.

6) Delírio de infestação

Doente sente que está a ser infestada por bichos, insetos ou semelhantes. Pode
ocorrer em paralelo com alterações da percepção da sensibilidade superficial/táteis
(formicação) ou da sensibilidade profunda/cenestésicas.

Ocorre na esquizofrenia, delirium tremens e intoxicação com cocaína.

7) Delírio niilista

Tipo de delírio onde o doente nega tudo, ou seja, nega a sua existência, a sua mente,
a existência de pessoas à sua volta e o mundo que o rodeia.

Doente pode afirmar já ter morrido inclusive.

Delírio de Cotard é a negação da exisência da pessoa num todo.

8) Delírio de negação de órgãos

Pode acontecer o doente negar que tem órgãos no seu interior ou mesmo que as
suas veias estão secas e que não tem sangue a circular.

9) Delírio de culpa

O doente sente que cometeu alguma ação que é imperdoável e que, por isso, deverá
ser punida.

38
10) Delírio de ruína

O doente acha que a sua vida está arruinada, que não tem dinheiro, que vai ficar sem
profissão, que a sua família vai passar forme e que tudo corre mal no mundo.

11) Delírios passionais

Podem ser de 2 tipos: delírio de ciúme ou erotomania.

- Delírio de ciúme: o doente sente que o seu companheiro o está a trair ou ser infiel.

- Erotomania: o doente sente que determinada pessoa está completamente


apaixonada por si e que vai largar tudo o que tem para ir ter com o doente.

12) Identificação Delirante

- Síndrome de Capgras: identificação errónea negativa, ou seja, o doente deveria


conhecer alguém (por exemplo, o seu irmão) mas diz que a pessoa que vê não é o
seu irmão mas sim alguém que se mascarou do seu irmão;

- Síndrome de Fregoli: identificação errónea positiva, ou seja, o doente não conhece


alguém mas acha que essa pessoa lhe é conhecida, como se o padeiro fosse o seu
irmão mascarado de padeiro.

- Síndrome de intermetamorfose: as pessoas mudaram física e psicologicamente e


fazem-se passar umas pelas outras.

- Síndrome dos duplos subjetivos: alguém desconhecido transformou-se


fisicamente no próprio doente.

Temáticas do delírio
Delírio Delírio de Delírio Delírio Delírio Delírio de
persecutório autorreferência grandeza religioso hipocondríaco infestação
Delírio niilista Delírio de negação Delírio de Delírio de Delírio passional Identificação
de órgãos culpa ruína delirante

Na depressão podemos ter:

1) Delírio de ruína;
2) Delírio de culpa;
3) Delírio niilista;
4) Delírio somático/hipocondríaco.

39
Outras caraterísticas importantes em relação ao grau de organização dos
delírios:

1) Pode ser sistematizado ou não:

- Sistematizado: o doente tem uma única ideia delirante, a partir da qual elabora toda
uma história super orientada, lógica e que parece bem interligada. O doente esforça-se
por arranjar argumentos que façam sentido para explicar a sua ideia delirante e
associados.

- Não sistematizado: o doente tem várias ideias delirantes que não têm relação entre
elas. Quando questionado não arranja justificação nem argumentos para as ideias
delirantes, responde algo como “porque sim, porque toda a gente sabe que é assim”.

2) Podem ter um ou mais temas:

- Simples/Monotemático

- Complexo/Politemático

Este delírio pode ser partilhado com outras pessoas – compartilhados.

Além disso, o envolvimento emocional que um doente tem com o delírio refere-
se ao dinamismo do delírio. (Quanto maior o dinamismo do delírio maior o compromisso
afetivo).

Um delírio diz-se encapsulado quando tem uma afeção específica da vida da


pessoa mas não afeta outras áreas do seu funcionamento (nomeadamente um delírio
persecutório sobre os colegas do trabalho, só tem influência no tópico do trabalho, não
tem relação com a família ou amigos).

QUAL O DIAGNÓSTICO?

Perturbação delirante.

40
Confabulação é diferente de ideia delirante porque o 1º é plástico, sujeito a
sugestibilidade e influência externa enquanto o 2º não tem nada disso, é irredutível e o
doente tem convicção plena da sua veracidade.

Alterações do pensamento
Curso Forma Posse Conteúdo
Ritmo Continuidade Pensamento Ideias Ideias sobrevalorizadas
concreto obsessivas
Taquipsiquismo Bloqueio de Pensamento Alienação do Ideias delirantes
pensamento assindético Pensamento
Bradipsiquismo Perseveração Sobreinclusão - Imposição Delírio Dellírio niilista
de ideias do persecutório
pensamento
Fuga de ideias Perseveração Descarrilado - Roubo do Delírio de Delírio de
verbal pensamento autorreferência negação de
órgãos
Circunstanciado Fusão - Difusão do Delírio de Delírio de
pensamento grandeza culpa
Pensamento Suspensão Delírio Delírio de
inibido místico/religioso ruína
Pensamento Delírio Delírio
desagregado hipocondríaco passional
Delírio de Identificação
infestação delirante

Vivência do Eu
Existem várias alterações que podem ocorrer em relação à vivência do Eu,
nomeadamente:

ALTERAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DA EXISTÊNCIA E ATIVIDADE DO EU

A consciência da existência e atividade do eu é um conceito que traduz uma


sensação íntima de que todas as ações psíquicas do indivíduo são realizadas por este e
porque este necessita das mesmas.

41
➔ Despersonalização

O doente não se sente ele próprio, sente-se estranho em relação a ele e ao que o
rodeia.

“Não me sinto como dantes, sinto que não sou eu que estou aqui”.

Há uma ausência de identificação nas atitudes (mentais e comportamentais) por este


elaboradas. Sente que o mundo onde está não é real.

Esta sensação causa sofrimento e ansiedade no doente.

➔ Perda de ressonância emocional

ALTERAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DA UNIDADE DO EU

Sensação, em qualquer momento, em que a pessoa sabe que é UMA só pessoa.

➔ Autoscopia: o doente vê-se e reconhece-se a si próprio.


➔ Duplicação: o doente sente que vive simultaneamente dentro e fora do seu
corpo.
➔ Múltipla personalidade: o doente sente que existe mais do que uma
personalidade dentro de si.

ALTERAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DA IDENTIDADE E CONTINUIDADE DO EU

Sensação de que o doente é sempre a MESMA pessoa.

➔ Alteração completa da identidade: o doente sente que já não é a mesma pessoa,


de todo, que mudou completamente;
➔ Sensação de perda de continuidade: o doente sente que, a partir de certo ponto,
mudou a maneira de ser.

ALTERAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DOS LIMITES DO EU

Sensação de que o doente consegue, em qualquer momento, distinguir entre o


que é seu (Eu, self) e o mundo no seu exterior.

➔ Alienação dos pensamentos


➔ Alienação dos sentimentos/ações motoras: sente que os seus sentimentos e
ações motoras que realiza são externos a este e que são controlados por outros.
➔ Apropriação: sente em si próprio acções/sentimentos que acontecem em
entidades externas (vê alguém a ser pontapeado e sente os pontapés nele
próprio).

42
➔ Transitivismo: vai ser o oposto da apropriação, o doente vai projetar no exterior
o que se passa nele (doente grita e diz que foi o mundo exterior que gritou);
➔ Estado extático: doente sente-se em união com o universo.

Alterações da consciência da vivência do eu


Da existência e unidade Da unidade do Eu Da identidade e continuidade Dos limites do Eu
do Eu do Eu
Despersonalização Autoscopia Alteração completa da Alienação dos
identidade pensamentos, sentimentos
e ações
Perda de ressonância Duplicação Sensação de perda de Apropriação
emocional continuidade
Múltipla personalidade Transitivismo
Estado extático

Humor, Emoção e Afetos


É necessário distinguir 4 conceitos importantes:

Ainda podemos falar em temperamento, que basicamente funciona como traços


presentes na personalidade da pessoa que podem ser:

1) Temperamento hipertímico: pessoa com muita energia e otimista;


2) Temperamento distímico: pessoa com pouca energia e negativo;
3) Temperamento ciclotímico: pessoa que varia entre os 2 temperamentos;
4) Temperamento irritável: pessoa impaciente, com baixo nível de tolerância;
5) Temperamento ansioso: pessoa com grande afeção por parte do mundo externo.

Não obstante, as alterações do humor podem ser quantitativas ou qualitativas.

43
ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS DO HUMOR

Um estado eutímico é um estado onde não


predomina nenhum tipo de emoção, é a “linha basal”.

Podemos ter alterações hipertímicas (acima de


eutímico) ou alterações hipotímicas (abaixo de eutímico).

➔ Alterações hipertímicas

Estas podem ser fisiológicas ou patológicas.

Fisiológica temos a alegria, enquanto existem outras, em grau crescente de


intensidade, que já são patológicas: euforia, expansão, exaltação, extâse. Estas são
patológicas porque são desproporcionais em relação ao evento que as
desencadeou, podem decorrer com alterações da motricidade ou alterações do
pensamento, bem como associadas a delírios de grandeza.

A euforia e expansão acontecem tanto na hipomania como na mania, enquanto


a exaltação acontece principalmente na mania e o êxtase está relacionado com o
consumo de substâncias.

As alterações de motricidade podem ser:

1) Dos movimentos voluntários, nomeadamente dos movimentos expressivos (em


casos mais leves);
2) Agitação psicomotora (em casos mais graves).

As alterações do pensamento pode ser:

1) Alterações do curso do pensamento, nomeadamente do ritmo como


taquipsiquismo e fuga de ideias;
2) Alterações do conteúdo do pensamento, nomeadamente ideias sobrevalorizadas
e ideias delirantes (delírios de grandeza e de autorreferência).

44
QUAL O DIAGNÓSTICO?
Episódio maníaco

➔ Alterações hipotímicas

Estas podem ser fisiológicas ou patológicas.

Fisiológica temos a tristeza normal, sendo adequada ao


estímulo que a criou, em termos de intensidade e duração. O
humor depressivo já é patológico, onde o doente tem uma
resposta desproporcional ao evento (em termos de duração e
intensidade), sendo que muitas vezes que acompanha de
anedonia, alteração da energia vital (sono, libido, energia vital),
isto se no contexto do doente depressivo. Temos uma tristeza
patológica sem desencadeante (“estou triste e não sei bem porquê, simplesmente
estou”).

Nota que o humor depressivo é caraterístico de peturbações depressivas mas


podemos ter uma depressão sem ter humor depressivo (depressio sine depressione)
(10% dos casos), onde temos a substituição por sintomas somáticos.

Podemos ter uma tríade cognitiva conhecida:

- Visão negativa de si própria;

- Visão negativa das suas interações com o ambiente;

- Visão negativa do seu futuro.

O humor depressivo, se estiver associado a sintomas somáticos é definido como


tristeza vitalizada (“Esta tristeza vem de dentro do meu corpo… Sinto uma dor no peito
que me impede de respirar, uma pressão que comprime a cabeça e não me deixa
pensar”).

45
Podemos ter ideias delirantes de culpa, ruína, niilista e hipocondríaco.

Nos casos mais graves, o humor depressivo pode-se fazer acompanhar de ideação
suicida e de sintomas psicóticos catatímicos.
Alterações quantitativas do humor
Hipertímicas Hipotímicas
Alegria Tristeza
Euforia Humor depressivo
Expansão
Exaltação
Êxtase

QUAL O DIAGNÓSTICO?
Episódio depressivo major

46
ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DO HUMOR

Aqui não temos alterações em termos de aumento ou diminuição do humor, mas


sim em termos qualitativos, dois conceitos importantes: humor disfórico e humor
irritável, que são de difícil distinção.

Humor disfórico: é o chamado “mal-humorado”. Caraterizado por termos um


predomínio de agressividade, irritabilidade e ansiedade. (DAIA). Relaciona-se com o
episódio misto da PAB.

Humo irritável: pessoa com baixa tolerância, que se torna agressiva e hostil. Muito
reativo.

É bastante típico de perturbações bipolares, depressões ou esquizofrenias bem


como quadros de ansiedade.

Num episódio de humor podemos ter presença simultânea de mais de uma alteração
do humor, ou seja, podemos ter um humor eufórico e irritável.

Alterações do humor
Quantitativas Qualitativa
Hipertímicas Hipotímicas Humor disfórico
Euforia Tristeza Humor irritável
Expansão Humor depressivo
Exaltação
Êxtase

Alterações da emoção e expressão afetiva

Alteração Significado
Anedonia Incapacidade de experienciar prazer, principalmente nas atividades que antes eram
prazerosas para o doente. Típico da depressão.
Anestesia Incapacidade de experienciar prazer ou qualquer outro tipo de sentimentos. “Não consigo
afetiva sentir nada”. Caraterístico da depressão e do estado de choque emocional.
Dissociação Há uma dissociação entre a severidade da situação e a expressão por parte da pessoa, ou
afetiva seja, este não consegue expressar os sentimentos que seriam expectáveis para aquela
situação.
Embotamento Há uma redução da expressão de emoção. Presente na esquizofrenia. Diferente da anestesia
afetivo afetiva porque na anestesia a pessoa não sente e aqui a pessoa não expressa.
Labilidade Mudança rápida e súbita no estado emocional, normalmente sem contextualização externa
emocional ou justificação. (Instabilidade emocional). Independente de fatores externos. Ocorre na PAB.
Ambivalência Sentimentos positivos e negativos sobre o mesmo objeto. “Adoro o meu avô, é a coisa mais
afetiva querida que tenho. Mas às vezes detesto-o e apetece-me matá-lo”.

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Incontinência Incapacidade de controlar a expressão afetiva, de a dominar, pelo que há exteriorização desta
afetiva de forma autónoma.
Rigidez afetiva Perda na capacidade de modulação dos afetos.
Apatia Perda de interesse.
Paratimia Incongruência entre o episódio e a expressão emocional. “Doente fala da morte de um familiar
enquanto se ri disto”. É diferente da dissociação afetiva porque aí há uma ausência de
resposta numa situação que era expectável isso acontecer.
Neotimia Experimentação de um estado emocional completamente novo.
Puerilidade Alteração do humor com aspetos infantis. Ri e chora por motivos banais.
Moria Forma de alegria muito pueril, ingénua, sem noção da realidade.
Desmoralização Consciência de ser incapaz de corresponder a um problema ou ficar para lá das expectativas.

Ansiedade
Pela dificuldade de definição deste tema, é feito em separado.

Ansiedade está mais relacionada com a componente psíquica, enquanto


angústia está mais relacionada com a componente somática.

A ansiedade pode ser entendida como:

- Ansiedade-estado: definido como uma situação aguda onde há o


aparecimento de sintomas ansiosos;

- Ansiedade-traço: tendência da pessoa para se relacionar dando uma grande


importância ao peso do meio externo (semelhante ao temperamento ansioso).

A ansiedade pode ser vista como uma percepção de insegurança/ameaça ao


organismo e uma resposta biológica de preparação (se possível, adaptativa) a essa
ameaça. A resposta define-se em 3 componentes:

1) Eixo fisiológico: onde temos a somatização da ansiedade com opressão


torácica, dispneia, taquicardia, palpitações, náuseas, dor abdominal;
2) Eixo cognitivo: pensamentos, ideias e imagens que surgem no decurso da
ansiedade, normalmente sobre o evento atual ou a progressão deste no
futuro;
3) Eixo comportamental: resposta às cognições ansiosas. Muitas vezes é
evitante.

- FCC -

48
FOBIA

É um tipo “especial” de medo onde vamos ter 4 caraterísticas fundamentais:

1) Desproporcional em relação ao evento que a cria;


2) É irracional e inexplicável;
3) Está fora do controlo voluntário;
4) O doente assume um comportamento de evitamento.

A exposição à situação que está na base da fobia leva à instalação de um quadro de


ansiedade que, por vezes, pode culminar mesmo numa crise de pânico.

As fobias podem ter um caráter interno ou externo:

- Fobias externas: fobia específica (a algum evento em particular), agarofobia (medo


de estar num espaço aberto, acontece alguma coisa e a pessoa não tem como sair), fobia
social e fobia de animais;

- Fobias internas: nosofobia (fobia de ter doenças) ou fobias obsessivas.

CRISE DE PÂNICO

Situação aguda, normalmente atinge o pico em menos de 10’, onde temos o


predomínio de ansiedade em 2 parâmetros:

1) Ansiedade somática (taquicardia, sudorese, palpitações, náuseas e vómitos,


cefaleias);
2) Ansiedade psíquica ou cognitiva (medo de morrer, medo de perder o controlo e
medo de enlouquecer).

Se acontecer sem um fator desencadeante identificável então consideramos uma


perturbação de pânico.

Vontade e impulsividade
Em relação à vontade, podemos ter alterações quantitativas e qualitativas.

ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS DA VONTADE

➔ Hiperbulia: aumento da persistência e eficácia das ações, rendimentos e


propósitos. Acontece na mania aguda ou hipomania;
➔ Hipobulia: diminuição da persistência e eficácia das ações, rendimentos e
propósitos. Episódios depressivos;
➔ Abolia: ausência de vontade/iniciativa. Podemos ter o desejo de fazer algo mas
não há energia ou iniciativa para o fazer (abolia de execução).

49
ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DA VONTADE

➔ Indecisão: quando temos 2 vontades opostas e o doente não opta por nenhuma
delas;
➔ Sugestibilidade: supressão mais ou menos completa da liberdade volitiva;
➔ Obediência automática: o doente acarreta simplesmente uma ordem;
➔ Ataxia volitiva: o doente acaba por executar um ato diferente do que queria.

Os atos impulsivos são definidos como ações realizadas de forma súbita sem
aferição das suas possíveis consequências, sem deliberação prévia.

- Impulso agressivo-destrutivo: incapacidade de controlo em relação a um fator


desencadeante, com uma reação extremamente desproporcional em relação ao mesmo;

- Frangofilia: impulso para destruir todos os objetos à volta do indivíduo;

- Automutilação: escoriações sobre a mucosa e a pele, auto-inflingidas;

- Piromania: impulso para atiçar incêndios;

- Tricotilomania: impulso para arrancar cabelos;

- Dipsomania: impulso para beber grandes quantidades de álcool em curtos


períodos de tempo, até ficar inconsciente;

- Ingestão alimentar compulsiva: impulso para ingerir grandes quantidades de


alimento em curto período de tempo;

- Cleptomania: impulso para roubar que é precedido de grande ansiedade, só


recuperando quando é realizado o roubo;

- Jogo patológico: impulso para jogar videojogos ou jogos online de forma


incessante;

- Compras compulsivas: impulso ligado a compras, de forma descontrolada e não


programada, ou seja, pode nem ser material necessário.

- Comportamentos sexuais compulsivo: existe tendência para realizar atividades


sexuais, muitas vezes de risco.

- Dromomania: impulso em que o doente deixa a sua rotina habitual e viaja longas
distâncias, assumindo diferentes identidades e ocupações.

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Alterações da vontade e impulso
Alterações da vontade Altearações do impulso
Quantitativas Qualitativas Impulso agressivo- Dipsomania
destrutivo
Hiperbulia Indecisão Frangofilia Ingestão alimentar
compulsiva
Hipobulia Sugestibilidade Automutilação Cleptomania
Abolia Obediência automática Piromania Compras compulsivas
Ataxia volitiva Tricotilomania Comportamentos sexuais
compulsivos

Motricidade
Dividimos em 4 categorias:

1) Alterações dos movimentos espontâneos (a sua observação não depende da


intervenção do observador);
2) Movimentos anormais induzidos (a sua observação depende da intervenção do
observador);
3) Alteração dos movimentos posturais;
4) Efeitos extra-piramidais decorrentes da medicação.

➔ Alteração dos movimentos voluntários

Os movimentos voluntários podem sofrer alterações quantitativas e qualitativas.

Em termos Quantitativos, podem estar: aumentados (Hiperatividade) ou diminuídos


(hipoatividade).

ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS

Podemos ter uma hiperatividade:

- Aumento dos movimentos expressivos, nomeadamente os movimentos


espontâneos que se realizam com a face, membros superiores e tronco. Aumentados na
ansiedade e na personalidade histriónica.

- Aumento dos movimentos direccionados, onde o doente realiza movimentos de


forma voluntária. Dividem-se em inquietação motora (onde o doente faz mais
movimentos do que os que são necessários) e agitação psicomotora (aumento de toda
a ação motora em função de uma agitação psiquiátrica como taquipsiquismo).

Podemos ter uma hipoatividade:

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- Diminuição dos movimentos expressivos: principalmente por
uma hipoatividade da face com mímica facial praticamente ausente,
podendo encontrar o sinal de Veraguth e o sinal do Omega (prega
que se forma nas pálpebras superiores, de cima para trás e prega
com forma de ómega sobre o sulco nasociliar, respetivamente).

Nos doentes esquizofrénicos podemos ter uma expressão


apática mas um olhar vivo, pelo que o doente parece estar a olhar o
mundo através de uma máscara.

- Redução dos movimentos direccionados, como lentificação psicomotora (onde


temos bradipsiquismo e uma lentidão na execução dos movimentos) ou mesmo inibição
psicomotora (agravamento da lentificação psicomotora). O bloqueio é o equivalente a
um bloqueio de pensamento mas para atividade motora, ou seja, de forma súbita há
interrupção da atividade motora que impede a realização de determinada ação, sendo
que corresponde à colocação de uma vara nos raios de uma roda em andamento. O
esturpor é caraterizado pelo congelamento de todas as ações motoras do doente
(mímica, gestos, linguagem). O esturpor pode ser catatónico (esquizofrenia) ou
melancólico (depressão grave).

- LIBE -

ALTERAÇÕES QUALITATIVAS

➔ Paracinésias
Dentro deste temos 2 conceitos diferentes: maneirismos e estereotipias.

Maneirismos são movimentos direccionados e adaptativos (com finalidade) que


são realizados de forma estranhamente repetitiva, podendo surgir em pessoas com ou
sem doença mental (Apertar a mão, mexer no cabelo, uso pouco habitual de
expressões).

Estereotipias são movimentos não direccionados e não adaptativos (sem


finalidade) que não têm relação com a ação da pessoa (estalar os dedos, balancear o
corpo).

Tiques são semelhantes a estereotipias mas os tiques é que não têm mesmo
finalidade nenhuma, enquanto as estereotipias podem ter algum grau de intenção na
sua realização.

52
Alteração dos movimentos voluntários
Quantitativos Qualitativas
Hiperatividade Hipoatividade Paracinésias
Aumento dos movimentos Diminuição dos movimentos expressivos - Maneirismos
expressivos - Sinal de Veraguth
- Sinal de Omega
Aumento dos movimentos Diminuição dos movimentos direccionados - Estereotipias
direccionados - Lentificação psicomotora
- Inquietação motora - Inibição psicomotora
- Agitação psicomotora - Bloqueio psicomotor
- Esturpor

➔ Movimentos anormais induzidos

Obediência automática, onde o doente realiza uma ação sem qualquer tipo de
avaliação prévia;

Ecopraxia, o doente imita ações simples que visualiza (como estalar os dedos);

Ecolalia: o doente repete em eco parte ou a totalidade do que lhe foi dito;

Perseveração: o doente vai repetir uma ação depois desta ter sido concluída. (Peço
ao doente para colocar a língua de fora e ele coloca. Depois peço para abrir os olhos e
este volta a colocar a língua para fora).

Ambitendência: o doente vai realizar uma ação com finalidade (dar um aperto de
mão) mas tem uma interrupção deste movimento, ficando a realizá-lo repetidamente até
executar a função que tinha pensado.

➔ Alterações dos movimentos posturais

Postura maneirista, pouco natural;

Postura estereotipada, pouco natural mantida rigidamente;

Perseveração da postura ou catalepsia: manutenção de uma postura rígida durante


longos períodos de tempo.

➔ Efeitos extra-piramidais secundários a fármacos

Relacionado, principalmente, com anti-psicóticos.

Pseudoparkinsonismo: rigidez muscular, tremor e acinésia;

Acatisia: agitação, o doente sente-se “incapaz de estar quieto”;

53
Distonia aguda: espasmos musculares, temporários ou permanentes, que fazem
com que o doente assuma uma posição fora do normal;

Discinésia: associada à utilização crónica destes fármacos, carateriza-se pela


realização de movimentos coreicos-atetóticos da face e membros superiores.

Alterações da motricidade

Alteração dos Alteração da Efeitos extra-


Alterações dos movimentos voluntários movimentos postura piramidais
anormais
Quantitativas Qualitativa Obediência Postura Parkinsonismo
automática maneirista
Hiperatividade Hipoatividade Paracinésias Ecolalia Postura Acatisia
estereotipada
Aumento dos Diminuição dos Maneirismos Ecopraxia Perseveração Distonia aguda
movimentos movimentos da postura
expressivos expressivos
- Sinal de Veraguth
- Sinal de Omega
Aumento dos Diminuição dos Estereotipias Perseveração Discinésia
movimentos movimentos
direcionados direccionados
- Inquietação -Lentificação
psicomotora psicomotora
- Agitação - Inibição psicomotora
psicomotora - Bloqueio

Ambitendência

Alteração da vida instintiva


São incluídos aqui 3 componentes:

- Sono

- Alteração do comportamento alimentar

- Alteração do comportamento sexual

➔ Alterações do sono

Podemos dividir em dissónias e parassónias.

DISSÓNIAS

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São alterações em relação à quantidade, qualidade ou horário do sono.

- Insónia, onde temos de destacar:

1) Insónia inicial: dificuldade a adormecer (ansiedade);

2) Insónia intermédia: doente acorda durante a noite e tem dificuldade a retomar o


sono;

3) Insónia terminal: doente acorda de madrugada e não retoma o sono (depressão).

- Hipersónia, o doente dorme mais horas que o habitual e pode-se sentir com sono
durante o dia;

- Cataplexia, episódios breves onde o doente perde, subitamente, o tónus muscular.


Pode acontecer em situações de emoção intensa.

PARASSÓNIAS

Perturbação do comportamento que ocorre durante o sono.

- Pesadelos: sonhos com carga afetiva negativa, normalmente ocorrem na fase REM
do sono;

- Terrores noturnos: o doente acorda várias vezes durante a noite com sensação de
medo e ativação simpática, sendo frequente em crianças. Acontecem no sono não-
REM;

- Sonambulismo: despertar e deambular durante a noite, no sono não-REM, têm um


certo padrão familiar;

- Bruxismo: ranger os dentes durante a noite, associada a estados de ansiedade.

➔ Alterações do comportamento alimentar

Podem acontecer de forma primária nas perturbações do comportamento alimentar


propriamente ditas (Anorexia nervosa e bulimia nervosa) ou secundárias a outras
patologias psiquiátricas ou orgânicas:

- Anorexia: diminuição do apetite que, normalmente, se associa a perda de peso.


Caraterístico das depressões;

- Hiperfagia: aumento do apetite, pode ocorrer nas fases maníacas da perturbação


bipolar;

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- Ingestão alimentar compulsiva, ingestão alimentar em grande quantidade e
reduzido tempo, podendo estar associado a bulimia nervosa se for uma situação prévia
a um fenómeno purgativo (vómito, laxantes).

➔ Alterações do comportamento sexual

Podem acontecer de forma primária nas perturbações do padrão sexual ou


secundária a outras patologias psiquiátricas, orgânicas ou medicação:

- Aumento da libido

- Diminuição da libido

Alterações da vida instintiva


Alterações do Alterações do
Alterações do sono
comportamento alimentar comportamento sexual
Dissónias Parassónias Anorexia Aumento da libido
Insónia Pesadelos Hiperfagia Diminuição da libido
Hipersónia Terrores noturnos Ingestão alimentar
compulsiva
Cataplexia Sonambulismo
Bruxismo

Alterações do insight
É um espectro em que definimos 3 critérios principais:

1) Conhecimento da doença, o doente sabe qual é a doença, o que é e como se


origina;
2) Compreensão dos efeitos da doença, nas suas capacidades futuras;
3) Atitude perante a doença, como o doente reage depois de conhecer a doença,
visível, por exemplo, em termos de cumprimento da terapêutica.

Vamos caraterizar como insight presente, parcial ou ausente.

É dos fatores mais importantes para a adesão à terapêutica!

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2. Intervenção biológica – Psicofarmacologia
Em neurofarmacologia nem sempre se verifica uma relação linear entre o mecanismo
de acção de um fármaco e o efeito obtido no doente.

A maioria dos tratamentos em Psiquiatria são feitos em combinação.

Algumas classes farmacológicas importantes:

Em Portugal:

- 22% das pessoas têm Perturbações Psiquiátricas;

- 16,5% das pessoas têm episódios de ansiedade.

É importante conhecer a Psicofarmacologia porque há um número cada vez maior


de doentes psiquiátricos em Portugal, bem como um número cada vez maior de
psicofármacos com diferentes mecanismos de acção e diferentes efeitos terapêuticos.

Segundo a DGS, todos os médicos deverão saber:

Enquanto médicos devemos ter a capacidade crítica de:

Devemos conhecer a história psicofarmacológica dos nossos doentes porque temos


de saber se os tratamentos prévios foram eficazes, se existiu tolerância, dependência ou
síndrome de abstinência dos mesmos.

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Temos de saber organizar um esquema terapêutico para as situações mais comuns:

1) Crise de pânico;
2) Perturbação de ansiedade generalizada;
3) Perturbação depressiva;
4) Agitação psicomotora no quadro de Esquizofrenia.

Temos de estar alertas para todo o dinamismo da informação sobre


psicofarmacologia, que varia constantemente, nomeadamente em termos de reações
adversas bem como de indicações terapêuticas.

Como fazer um projeto terapêutico eficiente?

1) Conhecer os problemas físicos que um doente apresenta;


2) Conhecer as comorbilidades psiquiátricas do doente (nomeadamente história
prévia de toxicodependência porque me vão “proibir” de utilizar fármacos como
BZD);
3) ECDs (para conhecer o perfil de segurança do fármaco porque podem ter
complicações como prolongar o intervalo QT);
4) Acesso a informação atualizada;
5) Projeto terapêutico individual;
6) Psicoeducação dos utentes.

Em Psiquiatria, existem poucos preditores de resposta, sendo que o melhor preditor


é a história “farmacológica” do doente, ou seja, conhecer os fármacos que o doente já
tomou e quais tiveram um resultado positivo neste.

Ex: se um doente teve um episódio depressivo major tratado com um SSRI (como
Fluoxetina) então deverá começar pela aplicação desse mesmo fármaco num novo
episódio do doente.

Exemplo: Numa Perturbação de Ansiedade (episódio agudo), pode ser utilizado uma
BZD como ansiolítico mas, a médio/longo prazo, pelo risco de dependência e síndrome
de abstinência deverá ser preferida outra classe como inibidores seletivos da recaptação
de serotonina.

Em termos de dose, devemos começar com doses baixas e ir subindo até atingir um
valor terapêutico desejado.

O tempo entre a administração de um fármaco e a observação do efeito deste vai


variar de indivíduo para indivíduo, a esmagadora maioria apresenta resposta ao fim de
2/3 semanas de utilização do fármaco.

Alguns fármacos podem ter efeito muito rápido, como:

1) Benzodiazepinas (não devem ser utilizadas mais do que 3 meses pelo risco de
dependência);
2) Anti-psicóticos.

63
Na maior parte das vezes os tratamentos são bastante prolongados no tempo
(cuidado com as BZD que se devem utilizar, no máximo, durante 3 meses!).

Devemos ter noção de que os idosos e as crianças são grupos especiais.

Farmacocinética
Esta divide-se em: Absorção, Distribuição, Metabolização, Excreção (ADME).

1) Absorção

Principalmente oral, sendo que os fármacos são, na sua grande maioria, lipofílicos,
ou seja, com grande facilidade de transporte para dentro das células e tecidos.

O tempo de semivida (t1/2) varia muito de fármaco para fármaco, onde podemos ter
BZD de curta ação (Diazepam, Lorazepam) ou anti-psicóticos de longa acção (que
duram até semanas, como os antipsicóticos de longa duração que se administram com
injeção IM).

2) Distribuição

Como são fármacos lipofílicos vão passar rapidamente para os tecidos e células, pelo
que a sua concentração no sangue é baixa. Assim, para atingir a concentração do
fármaco no sangue, precisamos de muita água para “diluir” o pouco fármaco existente
em corrente sanguínea, pelo que o Volume de distribuição (VD) é grande.

Isto vai originar um efeito de impregnação (fármacos ficam armazenados no tecido


adiposo e, depois, acabam por ser libertados ao nível da corrente sanguínea).

3) Metabolismo

O metabolismo é, predominantemente, hepático, sendo que podem surgir interações


enzimáticas a este nível.

4) Eliminação

A excreção destes fármacos vai ser predominantemente renal.

O controlo dos níveis plasmáticos de determinados fármacos é importante nos casos


de:

1) Carbonato de Lítio;
2) Carbamazepina;
3) Valproato de sódio.

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1) Antipsicóticos
Estes fármacos, chamados também de neurolépticos, têm um grande poder
sedativo. Os antipsicóticos de 2ª geração podem ter um efeito de estabilização de
humor.

Principais utilizações
Esquizofrenia Profilaxia da recorrência de PAB
Esquizofrenia (manutenção) Depressão Bipolar
P. Esquizoafetiva Mania

Mecanismo de ação:

Varia consoante os anti-psicóticos típicos e atípicos:

1) Antipsicótico típico/1ª geração = bloqueio de M1, H1, Alfa1, D2;


2) Antipsicótico atípico/2ª geração = bloqueio de D2 e 5-HT2A.

Para o bloqueio de D2 é preciso ter bloqueio de 60 a 70% de todos os recetores


para ter efeito clínico.

Há uma relação entre o bloqueio da Dopamina e a diminuição do sintomas


esquizofrénicos, por diminuição da atividade da via mesolímbica.

Efeitos adversos:

Anti- Anti-
Bloqueio de D2 Anticolinérgicos
adrenérgicos histamínico
Via nigro-estriada Via túbero- Via Hipotensão Obstipação Aumento do
infundibular mesolímbica ortostática peso
Acatisia Hiperprolactinémia Melhora Inibição da Xerostomia Sedação
sintomas ejaculação
psicóticos
Discinésia Xeroftalmia
(oro-mandibulares)
Retenção urinária
Glaucoma
- Impregnação de anti-psicóticos nos tecidos → síndrome parkinsónica;

- Prolongamento do intervalo QT.

ATENÇÃO: Síndrome Maligno dos Neurolépticos é definido por Febre, Sintomas extra-
piramidais e desequilíbrio vegetativo → urgência na alteração da medicação. A
Clozapina pode dar agranulocitose, o que obriga a uma vigilância semanal nas primeiras
18 semanas, depois quinzenal e, após um ano, passa a ser mensal.

Os antipsicóticos de 2ª geração podem aumentar o risco de tromboembolismo e


acidentes vasculares cerebrais nos idosos.

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Antipsicóticos de longa duração: (RAFPH)

- Risperidona;

- Aripiprazol;

- Flupentixol;

- Paliperidona;

- Haloperidol.

Nota que a Clozapina só se utiliza quando a situação é refratária a, pelo menos,


2 Antipsicóticos.

Os antipsicóticos de 2ª G podem estimular o aparecimento de Síndrome Metabólica:

- PA > 130/85mmHg;

- Glicémia > 100mg/dL;

- HDL <40 nos homens e <50 nas mulheres:

- Triglicéridos > 150mg/dL;

- Perímetro Abdominal > 100cm nos homens e >90cm nas mulheres.

2) Antidepressivos
Estes são fármacos com grande aplicabilidade:

Aplicação dos antidepressivos


Depressão Perturbação de ansiedade Perturbação de stress pós- Bulímia Neuropatia
generalizada traumático periférica
Perturbação de Perturbação de ansiedade Perturbação obsessivo- Abstinência da
pânico social compulsiva nicotina (Buproniona)

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São fármacos já utilizados há muito tempo, pelo que se conhece bem o perfil de
segurança e os efeitos adversos a longo prazo, são fármacos seguros.

Podem-se dividir em 4 classes principais:

Alguns fármacos importantes:

Clomipramina → tratamento da POC;

Antidepressivos tricíclicos → úteis no tratamento da depressão grave, são os


mais úteis mas não os mais seguros porque têm vários efeitos adversos (anti-
colinérgicos, anti-histamínicos, quinidina-like (arritmias)). A Clomipramina →
tratamento da POC;

Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (SSRI) → episódios de


depressão:

- Fazem-se em dose única;

- São melhor tolerados;

- Quanto maior a depressão, melhores serão os resultados atingidos.

Podem ser utilizados em patologias ansiosas (PAG, PASocial, PTSD, POC,


Perturbação de Pânico).

Muitas vezes cursam com náuseas.

Inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina → Venlafaxina,


Duloxetina. Semelhantes ao SSRI’s mas temos de ter cuidado com doentes com HTA
instável!

Em crianças, o que fazer?

1) Fluoxetina → Depressão;
2) Sertralina → POC;
3) Clomipramina → POC.

INIBIDORES DA MAO

Podem ser reversíveis ou irreversíveis, bem como seletivos ou não seletivos.

MAO-A → degrada NE, E e Serotonina;

MAO-B → degrada Dopamina.

67
Inibidores da MAO
Não seletivos MAO-A MAO-B
Fenelzina Reversível Irreversível Irreversíveis
Moclobemida Iproclozide Selegilina
Rasagilina

Os inibidores da MAO irreversíveis têm vários problemas, daí já não serem


comercializados em Portugal, principalmente pelas questões cardíacas e de TA. É
necessário ter cuidado com a dieta (tiramina).

Atualmente, os inibidores da MAO são fármacos pouco utilizados, de tal forma


que os bloqueadores irreversíveis foram abandonados do mercado português (pelos
efeitos cardíacos), mantendo apenas alguns reversíveis como a Moclobemida
(síndromes depressivas).

Estes antidepressivos são bastante seguros excetuando algumas situações de


sedação, alteração da atividade cognitiva e memória, aumento de peso, disfunção sexual
e efeitos extra-piramidais.

3) Estabilizadores de humor
Podemos falar de vários fármacos:

- Carbonato de Lítio

• É o mais utilizado;
• Vai diminuir o AMPcíclico;
• Vai ser filtrado e reabsorvido ao nível do rim (cuidado com os níveis de
Na+);
• Os níveis séricos devem variar entre 0,7 a 1,2 mmol/L → janela
terapêutica estreita

68
• Efeitos adversos: sede, , diabetes insipidus (grande poliúria), tremor
(níveis plasmáticos superiores), anorexia, náuseas e vómitos.
• Pode haver necessidade de diálise em situações de intoxicação.

- Carbamazepina

• Alternativa ao Carbonato de Lítio;


• A sua [sérica] também deve ser calculada;
• Vai bloquear os canais de Ca2+.

- Lamotrigina

• Vai bloquear os canais de Na+ (reduz a atividade excitatória do


glutamato);
• Utilizado nas grávidas;
• Utilizado na Doença Bipolar para diminuir a recorrência da depressão;
• Pode dar reações tóxicas como epidermólise tóxica.

- Valproato de sódio

• Comum na PAB, nomeadamente no tratamento de estados mistos.


• Reduz a transformação de GABA;
• Necessita da análise da [sérica] → cuidado com toxicidade hepática.

- Antipsicóticos de 2ª geração

4) Ansiolíticos e Hipnoindutores
As Benzodiazepinas são os fármacos para melhor tratar a ansiedade e insónia
enquanto sintoma, ou seja, apenas em fase aguda!

Mecanismo de ação: de forma geral, vão bloquear os canais de Cl- → potenciam a


transmissão GABAérgica.

Têm efeito anti-epilético e relaxante muscular → Clonazepam, Diazepam.

Podemos dividir as BZD em função da:

1) Potência do fármaco;
2) Semivida do fármaco.

! PROBLEMA ! = Dependência, que é tanto maior quanto:

1) Maior for a potência da BZD;


2) Menor for o seu tempo de semi-vida.

Nunca esquecer: antagonista das Benzodiazepinas → Flumazenil.

69
As Benzodiazepinas têm uma biotransformação hepática, onde são convertidas a
um metabolito ativo, o oxazepam. Este é conjugado numa substância hidrossolúvel de
forma a ser excretado pela urina. (! Lorazepam ! → não tem metabolito ativo).

Cuidado com os doentes com Insuficiência:

1) Hepática → menor metabolização, maior efeito;


2) Renal → menor excreção;
3) Respiratória → depressão respiratória.

Não devemos utilizar a BZD de forma isolada nas situações de: (PDA)

Psicose: podem piorar os sintomas delirantes;

Depressão: pode tornar crónico;

Alcoolismo: pode aumentar a dependência.

Que fármacos se fazem na ansiedade?


Benzodiazepinas Buspirona (agonista Pregabalina Anti- Anti- Propanolol
serotoninérgico depressivos psicóticos (diminui os sintomas
5-HT1A, no núcleo da rafe) periféricos)
Com guidelines Off-label

Xanax → Aprazolam

Vallium → Diazepam.

70
5) Psicoestimulantes
Cafeína, Cocaína, Anfetaminas.

Não se utilizam normalmente de forma intencional na psiquiatria, exceto:

1) Metilfenidato → bloqueia a recaptação de noradrenalina (NET) e dopamina


(DAT): hiperatividade (Ritalina);
2) Modafinil → bloqueia a recaptação de dopamina (DAT) e bloqueia a transmissão
GABAérgica → Narcolepsia.

6) Tratamentos físicos

Eletroconvulsivoterapia (ECT) Fototerapia Psicocirurgia


- Utilizada em: Útil em depressões sazonais nos Egas Moniz com leucotomia frontal
. Depressão major grave países nórdicos, melhoram a (irreversível):
. Mania grave e prolongada hipersónia e a hiperfagia. - Depressão major crónica;
. Catatonia - POC.
É necessário consentimento escrito
- É útil nos doentes com estupor; do doente e parecer de 2
- É indolor e com baixo risco (~ à psiquiatras diferentes nomeados.
anestesia geral).

Estupor = recusa de alimentos, de líquidos, ideação suicida.

71
3. Intervenção psicossocial
A Psicoterapia tem por base a modificação de um sintoma físico de origem mental,
ou seja, consegue atuar numa causa mental e, desta forma, diminuir os sintomas físicos
que dela dependem.

É diferente da Psicofarmacologia porque a Psicoterapia não tem intervenção


farmacológica nem química associada.

Jean Martin Charcot → primeira pessoa a demonstrar a utilidade da Psicoterapia no


final do século XIX → utilizou a Hipnose de forma a alterar os comportamentos de um
doente com sintomas histéricos.

Definição de Psicoterapia
Consiste no estabelecimento de uma relação interpessoal que tenha como
objetivo alterar comportamentos, pensamentos, sentimentos e atitudes (CPSA)
disfuncionais na pessoa que procura ajuda.

Implica sempre a participação de 2 pessoas:

1) A pessoa que procura ajuda;


2) A pessoa, qualificada e treinada, que realiza a psicoterapia.

É um tipo de terapia que depende bastante não só do psicoterapeuta como da


aliança terapêutica que é estabelecida, sendo esta fulcral para a eficácia da mesma.

Existem mais de 400 psicoterapias e estas podem ser tanto focadas no passado
como no presente.

É importante reforçar que, embora a Psicoterapia careça de terapêuticas


farmacológicas não exclui as mesmas, pelo que até é benéfico a interação entre
Psicoterapia e Psicofarmacologia.

Diferença entre Psicoterapia e Amigos


Efetivamente uma conversa entre amigos assenta nalguns pressupostos de
psicoterapia. No entanto, a psicoterapia transcende esta questão, vai para além da
relação estabelecida entre amigos.

De facto, um dos objetivos da psicoterapia é que o psicoterapeuta tenha


capacidade de avaliar a forma como o doente pensa, se comporta, age ou sente e, desta
forma, tentar direcionar/orientar o mesmo.

É importante que o psicoterapeuta seja externo ao doente e não esteja, de forma


alguma, envolvido com ele ou nos seus problemas, de forma a garantir uma maior
separação entre os 2 e, assim, maiores graus de libertação por parte do doente.

72
Um psicoterapeuta consegue fazer uma avaliação externa da nossa pessoa que,
para nós, é muito difícil. É a base da psicoterapia, termos alguém que não nós a pensar
sobre nós próprios, sobre os nossos comportamentos, pensamentos, sentimentos e
atitudes.

É fulcral a instalação de um local confortável, de respeito e de tolerância, onde


não pode haver espaço para julgamento, o doente tem de se sentir confortável a expor-
se por mais disparatado que possa ser e por mais díspar que possa ser em relação ao
próprio terapeuta.

Amigo → atinge caraterísticas gerais da psicoterapia;

Profissional → atinge caraterísticas específicas da psicoterapia.

Empatia
Definida por Carl Rogers, é uma capacidade difícil mas fulcral para o
psicoterapeuta. Prende-se com a colocação do próprio sobre os problemas do doente,
assimilar a sua dor, perceber não só o problema que este tem, o sofrimento que o
problema lhe causa e, consequentemente, as repercussões que tem para a sua vida (em
termos funcionais).

Não confundir com simpatia!

Quanto maior for a empatia que temos com o doente, maior será a confiança e,
desta forma, melhor a aliança terapêutica com ele.

Por vezes é difícil criar empatia com alguém mais velho ou de quem não
gostamos em particular → podemos sempre pensar nele quando era mais novo.

Praecox feeling – não ser possível empatizar com o doente, sentimento de


estranheza. Vamos achar que é demonstrativo. Acontece na esquizofrenia mas não na
doença bipolar.

Caraterísticas para um terapeuta


Carl Rogers definiu 4 caraterísticas fundamentais para um psicoterapeuta:
(EACN)

1) Empatia;
2) Aceitação incondicional (aceitar tudo o que o doente pensa, diz, sente ou faz,
independentemente do nosso juízo de valor pessoal sobre isso mesmo);
3) Congruência (entre a linguagem verbal e não verbal, sendo que a linguagem
verbal corresponde a 2/3 daquilo que queremos transmitir);
4) Não diretividade (não devemos dar diretrizes sobre o que o doente deve ou não
fazer mas poderemos dar conselhos ou orientações, serão sempre apenas
sugestões).

73
Fatores da Psicoterapia
Estes podem ser gerais ou específicos:

Fatores Gerais (REEIA PUSA) Fatores Específicos


Relação terapêutica Fatores do doente – 40% (motivação, competências cognitivas e
comportamentais prévias)
Escuta empática Fatores comuns – 30% (relação, independentemente da orientação do
terapeuta)
Expressão de emoções Efeito de placebo/esperança/expectativa – 15%
Incentivar e motivar Fatores específicos da psicoterapia utilizada – 15%
Apoiar a mudança
Psicoeducação
Uso racional
Sugestão
Análise de objetivos

O modelo específico das psicoterapias conta apenas com 15% da mudança no


doente, é mais importante o modelo geral e transversal das mesmas e a relação que se
estabelece com o doente (85%).

Caraterísticas de um bom terapeuta Caraterísticas do doente


Capacidade de manter relações longas e intensas Más condições sociais (fator negativo)
Tolerar sentimentos negativos no doente ou no próprio Idade (fator negativo)
“Ter sido doente” Grau disfunção prévio (fator negativo)
Insight Perturbação de personalidade (fator negativo)
Empatia Experiências precoces traumáticas (fator negativo)
Terapeuta pode ser alvo de psicoterapia durante a Motivação, otimismo (fator positivo)
própria psicoterapia

Se tivermos um doente que tenha:

- Impulsividade

- Socialização Psicoterapia mais direta


- Atribuição externa

Se tivermos um doente que tenha:

- Baixa impulsividade

- Indecisão Psicoterapia mais compreensiva

- Introspeção

74
As psicoterapias possuem e beneficiam de efeito placebo! Este efeito é
semelhante ao efeito dos fatores comuns das psicoterapias.

As patologias de ansiedade são as mais suscetíveis ao efeito de placebo do que


as patologias psicóticas como a esquizofrenia ou POC onde temos sintomas mais
marcados, estas beneficiam muito mais da terapêutica farmacológica.

Tipos de Psicoterapia
Existem > 400 tipos de psicoterapia mas aqui destacam-se os mais utilizados na
rotina psiquiátrica:

1) Counselling e psicoterapia de suporte;


2) Psicoterapia psicodinâmica;
3) Psicoterapia cognitivo-comportamental;
4) Psicoterapia interpessoal;
5) Psicoterapia existencial-humanística;
6) Psicoterapia de casal/familiar;
7) Psicoterapia de grupo.

1. Counselling e Psicoterapia de suporte


Baseada nos fatores comuns das psicoterapias e em Carl Rogers, temos 2 tipos:

- Counselling

Atua mais em crise, ou seja, na situação aguda, focada na resolução de problemas.

Normalmente fazem-se 4 a 6 sessões, de forma a alterar comportamentos e


emoções.

75
- Psicoterapia de suporte

Feita de forma mais prolongada.

Normalmente atua nas competências do próprio, é uma espécie de auto-ajuda.

2. Psicoterapia psicodinâmica
Está muito dependente da relação criada entre o doente e o psicoterapeuta. Atua
nos problemas do passado, ou seja, situações nas quais o doente foi violado, raptado,
isolado, vítima de bullying, relações interpessoais que não correram bem…

Duração:

- Terapia focal – 6 a 9 meses;

- Psicanálise – Meses a anos.

Procura fatores inconscientes → transforma-os em fatores conscientes.

Psicoterapia vai tentar quebrar os mecanismos de defesa do doente, nos quais este
tenta afastar o tópico “tabu” ou atribuir as culpas a pessoas externas ao mesmo.

Existem fenómenos de transferência e contra-transferência:

1) Transferência: falsa união entre uma situação passada e uma situação atual. O
doente tece sentimentos em relação ao terapeuta;
2) Contratransferência: resposta à transferência feita pelo doente, o médico tece
sentimentos em relação ao doente.

Exemplo: Doente tem medo se sentir abandonado e refere isto ao terapeuta “tenho
medo de que me abandone quando for de férias. (transferência). Nisto o doente falta na
última consulta porque não quer sentir abandonado (contra-transferência).

INDICAÇÕES: (podem não ter necessariamente doença mental)

- Doente com dificuldade em manter relações íntimas;

- Doente com problemas crónicos emocionais e interpessoais;

CONTRA-INDICAÇÕES:

- Psicose;

- Depressão grave;

- POC.

É muito utilizada por Freud, Jung e Adler.

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3. Psicoterapia cognitivo-comportamental
Como o próprio nome indica, o objetivo é alterar:

- Cognições: mudar pensamentos automáticos por parte do doente e as suas


crenças irracionais (“ninguém gosta de mim porque não sou gostável”);

- Comportamental: alterar comportamentos do doente que se mantêm disfuncionais


na vida deste e que funcionam como soluções/defesas (“evitamento”).

Implica uma interação muito ativa entre o psicoterapeuta e o doente.

Existem manuais que dão apoio à psicoterapia de forma a tentar uniformizar e


standarizar as técnicas adotadas.

Há uma auto-monitorização por parte do doente (“já penso menos isto ou já faço
menos isto”).

INDICAÇÕES: (PPBPP)

- Perturbação de Ansiedade;

- Perturbação Depressiva;

- Bulimia;

- Psicose;

- Perturbação de personalidade.

4. Psicoterapia interpessoal
É útil em situações de perturbações depressivas.

Reconhece o modelo médico – depressão enquanto uma doença.

O objetivo é estabelecer uma conexão entre o início da perturbação depressiva e


eventos interpessoais no passado, nomeadamente 4 categorias:

- Luto;

- Disputa;
4 áreas possíveis de início de depressão
- Transição de papel;

- Diminuição interpessoal.

É realizado entre 12 a 16 semanas e também recorre a manuais de uniformização. Pode


ser realizada com medicação.

Adaptada a pessoas com HIV, população adolescente ou geriátrica.

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5. Psicoterapia de casal/familiar
Tenta perceber se é o indivíduo que está doente de forma individual (ou seja, se o
problema do casal ou família surge na consequência do doente) ou se o doente saudável
está inserido num contexto de casal/familiar problemático que tem repercussões neste.

Questionamento circular – sabemos que a comunicação origina comunicação de


volta e podemos pôr alguém a pensar sobre outro – Ex: perguntar a uma mulher como
é que o marido se comporta com o seu filho.

Causalidade circular da comunicação.

Vamos tentar perceber o funcionamento familiar, podendo recorrer à elaboração de


genogramas, relações e padrões de interação.

6. Psicoterapia de grupo
O objetivo aqui é o indivíduo beneficiar da interação de grupo, ou seja, há uma
marcação por parte do coordenador de grupo, cada indivíduo expõe a título pessoal a
sua experiência, sentimentos, emoções e evolução e o indivíduo beneficia das partilhas
dos outros como forma de se sentir integrado, de pensar “ele melhorou, eu vou
melhorar” ou perceber que há pessoas em posições piores do que a dele.

Varia consoante os grupos mas tem regras definidas transversalmente – cada um


fala na sua vez.

Na psicoterapia de grupo podem ser estimulados outros tipos de psicoterapia como


psicoterapia cognitivo-comportamental, interpessoal, psicodinâmica… Além disso os
grupos podem ser abertos ou fechados.

“Modelagem” – pessoa serve de modelo porque já passou pela situação X e agora


mostra aos outros como o fez e onde chegou.

Há alguns ideais como a confidencialidade, respeito, assiduidade e pontualidade,


falar de si próprio, não comparar nem julgar, “não salvar”, respeitar os silêncios.

A coesão que se estabelece entre o grupo é o equivalente à relação interpessoal que


se cria como terapeuta.

Por vezes é difícil evitar a diretividade mas, nas terapias de grupo, estas até podem
ser benéficas e funcionarem como uma plataforma para o grupo evoluir.

Pode haver uma dissonância entre a autoestima (o que a pessoa acha que é) e o que
o grupo acha que a pessoa é.

78
As Psicoterapias apresentam melhorias:

1) Independentemente do tipo de doente;


2) Independentemente do tipo de psicoterapia utilizado.

Ao fim de 21 sessões → 50% dos doentes melhoraram;

Ao fim de 50 sessões → 75% dos doentes melhoraram.

Conclui-se que quanto mais psicoterapia melhores são os resultados esperados.

Tanto as psicoterapias cognitivo comportamentais como as psicoterapias


interpessoais estão nas guidelines uma vez que, num estudo feito, ao fim de 3 semanas
a psicoterapia cognitivo-comportamental, a psicoterapia interpessoal e a Imipramina
tinham resultados muito semelhantes em termos de melhorias e funcionamento global
do doente.

Os primeiros manuais de psicoterapia surgiram na depressão. Serviam não só para


homogeneizar como para permitir a confrontação de resultados obtidos.

79
4. Perturbações esquizofrénicas e psicóticas
Conrad descreveu a esquizofrenia como contendo 4 fases:

1) Trema, onde há instalação de humor delirante (“estranheza do mundo em seu


redor”);
2) Apofania, onde há instalação de percepção e ocorrência delirante;
3) Anastrophé, onde o indivíduo acha que ocupa a posição central no mundo e tudo
gira em seu redor;
4) Apocalipse, onde há fragmentação do eu pela desorganização do pensamento.

Esquizofrenia resistente = esquizofrenia refratária à Clozapina.

Nesta aula é feita uma distinção entre Perturbação Delirante e Esquizofrenia.

Perturbação Delirante
É definida como:

1) Presença de uma ou mais ideias delirantes do tipo não bizarro (ou seja, ideia que
não tem alteração do controlo da mente ou do corpo, uma coisa que,
efetivamente, pudesse acontecer);
2) Ideia delirante persistente (segundo o DSM-V deverá ser > 1 mês, enquanto no
ICD-10 > 3 meses);
3) Sem consumo de substância psicoativa ou quadro orgânico que possa justificar
isto.

Ideia não bizarra vs Ideia bizarra

A ideia bizarra é uma ideia que sai parte do imaginário, não se enquadra na
realidade social e cultural comum. Nomeadamente, se eu tiver uma ideia delirante em
que tenho unicórnios no jardim nos dias em que chove porque vêm dentro das gotas da
chuva é completamente absurdo porque não existem unicórnios. No entanto, se eu tiver
uma ideia delirante em como tenho cavalos no jardim todas as noites não é assim tão
bizarro quanto isso porque, efetivamente, poderia ser real.

80
Epidemiologia

A Perturbação Delirante surge:

- 0,03% das pessoas ao longo de toda a vida;

- 1 a 4% dos internamentos na Psiquiatria;

- Entre os 35 a 45 anos, principalmente em mulheres.

Critérios Diagnósticos

O fulcral é a existência de ideias delirantes (uma ou mais) e a ausência de outra


sintomatologia psicótica (apenas as alucinações poderão ocorrer mas, se ocorrerem, não
podem ser predominantes no quadro e terão de estar relacionadas com o tipo de ideia
delirante).

As ideias delirantes, na Perturbação Delirante, normalmente são bem


organizados e sistematizados, bem como encapsulados. Ou seja, são ideias bem
elaboradas e bem “trabalhadas”, que quase parecem lógicas. O facto de serem
encapsuladas indica que estão presentes apenas numa vertente da vida pessoal do
doente e que, numa entrevista clínica, poderão passar despercebidos, a não ser que o
médico atinja o “core” do tema da ideia delirante.

81
Devemos sempre especificar o subtipo de Perturbação Delirante em função do
delírio existente (se é que existe).

Adicionalmente, referir se é ou não bizarro.

A dificuldade em atingir a ideia delirante vai atrasar o diagnóstico e comprometer


o prognóstico destes doentes.

Ideias delirantes

Normalmente vamos ter um delírio monotemático nesta Perturbação Delirante.

São ideias com 3 caraterísticas principais:

1) Irredutíveis à argumentação lógica e opinião social comum;


2) Convicção plena (sensação de certeza subjetiva);
3) Impossibilidade (normalmente são ideias bizarras).

As ideias delirantes/delírios podem ser dos mais variados temas:

1) Delírio persecutório → é o mais frequente.

Ideia de que alguém nos está a seguir e que estamos a ser vigiados, controlados,
ameaçados e que nos poderão querer fazer mal.

“Estou em casa e sinto que podem estar a ver-me pela janela para me matar”.

2) Delírio de autorreferência

Ideia de que tudo no mundo gira à volta dessa pessoa, coisas sem relação com a
mesma são direccionados para ele.

“Estou a passar na rua e todas as pessoas estão a falar mal de mim”.

3) Delírio de grandeza

O doente julga ter uma influência, conhecimento, dinheiro ou poder na sociedade


maior do que aquele que, efetivamente, apresenta.

“Sou o rei Portugal”.

82
4) Delírio místico/religioso

O doente julga ter algum tipo de poder/dom imaginário ou, por outro lado, uma
conexão religiosa e espiritual. Pode, efetivamente, considerar ser o “Messias redentor”
– Delírio messiânico.

“Tenho um dom que me permite sentir se as pessoas são boas ou más”.

5) Delírio somático/hipocondríaco

Há uma somatização de problemas físicos que não existem e uma preocupação


excessiva do doente em considerar que está, efetivamente, doente. Acha que tem uma
doença incurável.

Pode-se confundir com perturbação somatoforme.

“Tenho uma neoplasia do cólon, tenho a certeza”.

6) Delírio de infestação

O indivíduo considera que tudo à sua volta está infestado e que poderá ser alvo
disso mesmo. Preocupação excessiva com germes e infecções e “bichos” que podem
estar a colonizar o seu organismo.

Há relação com alucinações táteis ou cenestésicas.

“Tenho bichos dentro de mim”.

7) Delírio niilista

O indivíduo julga que está morto, que não existe e que tudo à sua volta se está a
destruir. Nega a sua existência e a da realidade.

“Eu não existo, sou uma ilusão”.

8) Delírio de negação de órgãos

O indivíduo nega a existência de determinado órgão, que não tem órgãos ou que
as veias estão secas.

“Sei que já não tenho intestino nem barriga, tiraram-me”.

83
9) Delírio de culpa

O indivíduo acredita que tem culpa irredutível nalguma acção que realizou e que,
por isso, deverá ser punido.

“Eu mereço isto porque atropelei um gatinho”.

10) Delírio de ruína

O indivíduo considera que o seu mundo está uma desgraça, que não tem
ninguém que goste dele, ninguém com quem viver, que não tem dinheiro para alimentar
a sua família.

“A minha vida está uma miséria, nem dinheiro tenho para alimentar a minha
família”.

11) Ideia delirante passional

Pode ser de ciúme ou erotomania:

- De ciúme: há uma sensação de que o cônjugue está a ser infiel na relação;

“Eu sei que o meu marido me está a trair, eu sei!”

- Erotomania: sensação de que alguém (normalmente entidade famosa) irá deixar tudo
para se juntar com aquela pessoa.

“O Brad Pitt vai largar a mulher para vir casar comigo, vem de avião na 2ª feira”.

12) Identificação delirante

Há uma identificação errónea das pessoas à sua volta:

- Identificação errónea positiva (S.Fregoli)

Considera que conhece alguém que, efetivamente, não conhece.

“Eu sei que o padeiro da minha rua é o meu tio que está disfarçado de padeiro”.

- Identificação errónea negativa (S. Capgras)

Não reconhece alguém que, efetivamente, conhece.

“Esta pessoa não é o meu irmão. É muito parecido mas é um sósia, alguém a passar-se
de meu irmão”.

84
- Síndrome de intermetamorfose

Ideia de que as pessoas trocaram de corpo e identidade umas com as outras.

- Síndrome dos duplos subjetivos

O doente acredita que alguém se transformou fisicamente nele próprio.

Repercussões funcionais

A Perturbação Delirante tem uma implicação na vida do indivíduo que é mais


limitada que a Esquizofrenia, ou seja, apesar de existir alguma limitação cognitiva e
deterioração do “eu”, esta é limitada e permite que o doente mantenha uma vida ativa,
trabalhe e conviva com as outras pessoas. É limitante mas não exclusiva.

Personalidade Prévia

Pode acontecer, em alguns indivíduos, a existência de traços de personalidade


pré-mórbidos (que já existem antes da doença) que podem aumentar o risco de
desenvolver Perturbação delirante, como a Personalidade paranoide, que se carateriza
por desconfiança, ciúme, incapacidade de estabelecer relações próximas.

Podem, também, apresentar(IRAQ)

- Irritabilidade;

- Risco de Homicídio;

- Agressividade;

- Querelância.

Diagnóstico Diferencial

A Perturbação Delirante faz diagnóstico diferencial com:

1) Esquizofrenia;
2) Psicose induzida por drogas/substâncias;
3) Perturbação Obsessivo-Compulsiva;
4) Perturbação de Humor;
5) Perturbação Somatoforme.

85
Esquizofrenia
Pela heterogeneidade de aspetos genéticos e fenotípicos, a esquizofrenia acaba
por se tratar de uma síndrome e não de uma doença propriamente dita.

Em termos históricos, temos que:

• Philippe Pinel → médico frânces que, no século XVIII, atribuiu uma componente
mais humanística à Psiquiatria – “Pai da Psiquiatria”, de tal forma que começou
a ver os doentes como pessoas e não apenas como doentes. Começou a escrever
um vocabulário psicopatológico.
• Bleuler (Blóiler)→ médico suíço → introduziu o conceito de Esquizofrenia como
“Mente cindida”, ou seja, “mente dividida/separada/fragmentada”.

A esquizofrenia era uma patologia tão grande antigamente que foi uma das 3
forças epidemiológicas que moveu a formação de hospitais (por isso foram a Lepra,
a Tuberculose e a Esquizofrenia).

Critérios Diagnósticos

86
Epidemiologia

A Esquizofrenia surge em:

1) Homens entre os 15 e 25 anos;


2) Mulheres entre os 25 a 30 anos ou pós-menopausa (pelo efeito protetor dos
estrogénios);
3) Mais frequentemente em homens (1,4 : 1 ).
4) Em 0,7% das pessoas ao longo da sua vida (mais prevalente que a pert.
Delirante).
5) Os homens têm mais sintomas negativos e as mulheres têm mais sintomas
positivos.
6) Associado a morfotipo leptossómico.

Etiopatologia

Existem 4 modelos que pretendem explicar a base biológica da Esquizofrenia

➔ Modelo Genético

Existem fatores de risco que podem ser genéticos ou ambientais:

Fatores genéticos (50 a 70%) Fatores ambientais


Gémeos monozigóticos Migrações
Ambos os pais portadores Complicações no parto
Consumo de canábis e haxixe

O consumo de substâncias tem 2 efeitos:

1) Induz psicose tóxica (com duração de, aproximadamente, 48 a 72h);


2) Antecipa o desenvolvimento de psicoses que iriam surgir mais tardiamente.

Existe, efetivamente, uma teoria que relacionava a infecção com Influenza na


grávida e o desenvolvimento de esquizofrenia na criança, no entanto a teoria acabou por
ser não ser aceite.

87
➔ Modelo de neurodesenvolvimento

Estas alterações durante o neurodesenvolvimento não são captadas diretamente


pelos métodos de imagem mas podem ser deduzidas por alterações como:

1) Atrofia cortical;
Sinais extremamente inespecíficos!
2) Dilatação ventricular.

Ao longo do desenvolvimento, vão


aumentado o nº de sinapses inibitórias pré-
frontais e diminuíndo o nº de sinapses
excitatórias pré-frontais, pelo que o córtex
pré-frontal fica, progressivamente, mais
inibido.

➔ Modelo de neurotransmissão

Verifica-se que há uma alteração da neurotransmissão Dopaminérgica nos doentes


com Esquizofrenia, tanto que a terapêutica a aplicar é, predominantemente, anti-
psicóticos (com função anti-D2).

Há 4 vias principais dopaminérgicas importantes:

1) Via meso-límbica: responsável pelos sintomas


positivos (+) da Esquizofrenia;
2) Via meso-cortical: responsável pelos sintomas
negativos (-) da Esquizofrenia;
3) Via nigro-estriada: responsável pelo aparecimento
de sintomas extra-piramidais;
4) Via tubero-infundibular: responsável pelo
aparecimento da hiperprolactinemia.

Nota: os sintomas extra-piramidais são tremor, distonias e parkinsonismo.

88
➔ Modelo da inflamação

Sintomas da Esquizofrenia

Os sintomas da Esquizofrenia podem ser tanto sintomas positivos como


negativos, ou seja:

- Sintomas positivos: algo que o doente não tinha e passou a ter, algo que está
“a mais”;

- Sintomas negativos: algo que o doente tinha e que perdeu, ou seja, que está a
“menos”. Podem ser a primeira alteração que um doente demonstra.

SINTOMAS POSITIVOS SINTOMAS NEGATIVOS


Agitação psicomotora Anedonia
Alucinações Apatia
Alteração do pensamento Abolia
Alteração do comportamento Embotamento afetivo
Delírios Isolamento social
Pobreza do conteúdo do pensamento
Os delírios primários surgem na esquizofrenia aguda e os delírios secundários
normalmente surgem na esquizofrenia crónica.

Os sintomas positivos normalmente ocorrem durante a fase aguda da doença,


ou seja, durante os surtos psicóticos, sendo que os sintomas negativos normalmente se
associa aos períodos intercríticos (prodrómicos ou residuais) da doença, se bem que
podem aparecer concomitantemente com os sintomas positivos.

A esquizofrenia cursa, muitas vezes, com alterações das funções cognitivas:

1) Diminuição da atenção/concentração;
2) Dificuldades na memória declarativa e de trabalho;
3) Dificuldades na aprendizagem de novos gestos;
4) Deterioração das capacidades intelectuais.

Ou seja, muitas vezes é reconhecida como uma demência precoce porque,


efetivamente, pode ter sinais semelhantes a uma demência mas acontecia em idades

89
jovens. É de notar que, muitas vezes na esquizofrenia há alteração do padrão de sono,
tal como acontece com as demências.

Poderá haver algum tipo de sobreposição fisiopatológica em termos de


mecanismos?

Adicionalmente, fica a ressalva de que os doentes esquizofrénicos têm um maior


risco de suicídio do que as pessoas sem patologia, sendo que este risco é maior quando
os doentes saem de um episódio psicótico.

Muitas vezes, no leito dos sintomas positivos, sintomas negativos, deterioração


cognitiva e sintomas afetivos o doente poderá desencadear um episódio depressivo
major, o que pode motivar a medicação com anti-depressivos nestes mesmos doentes.

Sintomas prodrómicos – podem anteceder uma fase ativa;

Sintomas residuais – podem seguir-se a uma fase ativa.

Subtipos

Nota que o DSM-V não individualiza os tipos de Esquizofrenia, apenas considera


se possui ou não catatonia associado.

Por outro lado, podemos indicar se o doente:

1) Está num primeiro surto psicótico (fase ativa, remissão parcial ou remissão total);
2) Está inserido no contexto de múltiplos episódios (em fase ativa, remissão parcial
ou remissão total).
3) Contínuo.

Diagnóstico diferencial

O diagnóstico diferencial prende-se, na maior parte das vezes, com o intervalo de


tempo dos sintomas:

1) Perturbação Psicótica Breve – >1 dia mas menos que 1 mês;


2) Perturbação Esquizofreniforme - > 1 mês mas menos que 6 meses;
3) Esquizofrenia - > 6 meses com, pelo menos, 1 mês de fase ativa.

(Nota que, na Perturbação Esquizofreniforme não há o critério de haver afeção das


atividades de vida diária e de perturbar o funcionamento do doente).

Por outro lado, a diferença diagnóstica pode estar na existência ou não de episódios
de humor e na preponderância destes para o quadro clínico:

4) Perturbação Esquizoafetiva – existem sintomas de humor (maníaco,


hipomaníaco ou depressivo) concomitantes com os episódios psicóticos e, além
disso, existem episódios psicóticos durante, pelo menos, 2 semanas sem que

90
haja, concomitantemente, sintomas de humor. No entanto, no quadro geral há
um predomínio dos sintomas de humor e não dos sintomas psicóticos.

Ainda é necessário questionar a existência de consumos de substâncias ou outra


patologia médica que possa estar na base dos sintomas psicóticos, uma vez que estes
podem ser uma consequência fisiológica ou dos consumos ou da doença médica de
base.

Terapêutica

O objetivo da terapêutica é duplo:

1) Diminuir os sintomas do doente;


2) Diminuir a recorrência dos episódios ativos da doença.

Temos de avaliar o risco de heteroagressividade e de suicídio do doente.

A melhor terapêutica passa pela administração de antipsicóticos


(nomeadamente os de 2ª geração!).

A parte mais difícil de tratar na Esquizofrenia são os sintomas negativos.

Já vimos que podemos dividir os antipsicóticos em:

ANTIPSITÓCITOS DE 1ª GERAÇÃO/TÍPICOS ANTIPSICÓTICOS DE 2ª GERAÇÃO/ATÍPICOS


Bloqueio dos recetores M1, H1, Alfa1, D2 Bloqueio dos recetores D2 e 5-HT2A
Cloropromazina Clozapina
Haloperidol Olanzapina
Risperidona
Muitos efeitos adversos Poucos efeitos adversos
Com efeitos extra-piramidais Sem efeitos extra-piramidais
Pouco seletivos Muito seletivos

Cloropromazina: a primeira vez que foi utilizada foi como um anti-emético numa
cirurgia, só depois é que foi utilizada em contexto psiquiátrico.

91
O problema da utilização de anti-psicóticos (de 1ª geração) é que, por ser pouco
seletivo, vão cortar a Dopamina nas 4 vias dopaminérgicas principais, o que vai:

1) Diminuir os sintomas positivos da Esquizofrenia; Desejado


2) Aumentar os sintomas negativos da Esquizofrenia;
3) Aparecimento de sintomas extra-piramidais; Indesejado
4) Hiperprolactinémia.

Assim, os antipsicóticos de 2ª geração vieram resolver (em parte) isto porque


vão fazer um bloqueio serotoninérgico (5-HT2A), o que permite uma desinibição dos
neurónios dopaminérgicos (que antes estariam sobre a inibição dos neurónios
serotoninérgicos), havendo maior libertação de dopamina.

Isto vai permitir:

1) Manter dopamina na via meso-cortical de forma a diminuir os sintomas


negativos da esquizofrenia;
2) Manter dopamina na via nigro-estriada de forma a diminuir os sintomas
extra-piramidais.

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Nota que há algumas situações como esquizofrenias refratárias em que alguns
opióides (como a heroína e a metadona) poderão ser utilizados pela sua função anti-
psicótica (nomeadamente a metadona).

Anti-psicóticos de longa duração

Existem vários anti-psicóticos de longa ação que vão tentar manter uma
[plasmática] de antipsicótico minimalmente estável, de forma a:

1) Permitir a medicação do doente quando este tem pouco insight e o risco de não
cumprir a medicação é alto;
2) Impedir a recaída dos sintomas quando uma não adesão à terapêutica.

Quais são? (RAFPH)

- Risperidona, Aripiprazol, Flupentixol, Paliperidona, Haloperidol.

A via de administração é Intra-muscular (IM) e dura, normalmente, 2 a 4


semanas. Alguns atípicos já permitem fazer a administração trimestral.

Em relação aos efeitos adversos, estes variam:

Anti-psicóticos de 1ª geração Anti-psicótico de 2ª geração Ambos


1) Hiperprolactinémia Agrava síndrome metabólico Xerostomia
- Galactorreia Hipersalivação Xeroftalmia
- Amenorreia Convulsões Sedação
2) Sintomas extra-piramidais Agranulocitose (Clozapina) Aumento de Peso
- Tremor Hiperpirexia
- Distonia (agudo) Alteação vegetativa
- Parkinsonismo (subagudo)
- DIscinésias (tardio).

Não se verifica alteração das disfunções cognitivas em termos de antipsicóticos


de 1ª G ou 2ª G.

Evolução

Cerca de 5% dos doentes esquizofrénicos suicidam-se, enquanto 20% têm


tentativas de suicídio, não apenas no contexto de alucinações AV (que dizem para se
matar) mas também na fase intercrítica onde há instalação de episódio depressivo major
pelo reconhecimento da patologia.

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Perturbação Delirante vs Esquizofrenia
Perturbação Delirante Esquizofrenia
Idade e sexo Entre os 35 e 45 anos, mulheres Entre os 15 e 25 anos (homens) e
entre 25 e 30 anos (mulheres)
Personalidade prévia Paranóide Esquizóide
Evolução Tipo desenvolvimento (doente vai Tipo processo (há um aparecimento
agravado gradualmente os sintomas) tipo surto, incompreensível).
Deterioração do eu Pouco notório Muito notório
Sistematização do delírio Muito sistematizado Pouco sistematizado
Tema do delírio Passional, persecutório, grandeza Persecutório, auto-referência
Prevalência Pouco frequente Muito frequente

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5. Perturbações Bipolares
Em psiquiatria, a Perturbação Afetiva Bipolar pertence às Psicoses funcionais.
Separa-se da perturbação depressiva unipolar ou depressão major, bem como de
Psicoses (como a Esquizofrenia).

As psicoses funcionais dividem-se em esquizofrenia e afetiva.

- Esquizofrenia: há deterioração cognitiva e “do eu”. Sintomas psicóticos


incongruentes com o humor;

- Afetiva: não há deterioração cognitiva nem “do eu”. Sintomas psicóticos


congruentes com o humor.

A Perturbação Afetiva Bipolar tem 2 pólos:

1) Pólo depressivo;
2) Pólo maníaco.

Antes denominava-se Doença Maníaco-Depressiva, onde se favoreciam a


ciclicidade dos episódios, ou seja, um episódio maníaco dava lugar a um episódio
depressivo, depois episódio maníaco, sempre assim. Atualmente favorece-se a Doença
Bipolar uma vez que existem dois pólos bem identificados e não um ciclo.

Assim, temos de conhecer tanto os episódios maníacos/hipomaníacos como os


episódios depressivos.

Episódios Maníacos

Para definirmos um episódio maníaco, temos de ter:

1) Elação do humor;
2) Aumento da energia;
3) Disfunção da atividade laboral/funcional do indivíduo;
4) Ausência de consumo de substâncias ou patologias orgânicas.

95
Nota que é preciso a manutenção do quadro pelo menos durante 1 semana,
enquanto no episódio depressivo major são 2 semanas.

➔ Elação do humor

Tem uma elação do humor (humor para cima), não se adequando às circunstâncias
do indivíduo.

Podemos ter duas situações:

1) Humor eufórico: onde temos um humor hipertímico (euforia, expansão,


exaltação, êxtase). Há uma jovialidade (ausência de culpas e de problemas) bem
como uma excitação descontrolada;
2) Humor disfórico: onde temos um humor irritado, uma raiva sem objetivo, irritado
em relação a tudo.

NOTA: literatura americana e europeia variam na definição do humor disfórico.


Americanos – humor negativo, inclusive depressivo. Europeus – raiva sem objetivo.

➔ Aumento da energia

O indivíduo sente que tem mais energia e tem menor necessidade de dormir (este
tópico é muito importante!). Dorme menos horas e sente-se bem (2/3h chegam para se
sentir com energia, nega cansaço).

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(Nota: Um fenómeno é uma experiência que não acontece nos indivíduos
normais, enquanto um sintoma tem um indíce pra um diagnóstico.)

Síndrome é um conjunto de sintomas que acontecem juntos uns com os outros


e parecem ter relação uns com os outros. Se provarmos numa categoria biológica, é uma
perturbação. Se provarmos em várias categorias biológicas, é uma doença.

→ Alteração do aspeto e comportamento

• Doente veste-se de forma mais exuberante;


• Tem um comportamento mais desinibido e expansivo;
• Ocupa “mais espaço” na sala, chama a atenção;
• Hipoprosexia;
• Aumenta a distractibilidade;
• Sente-se grandioso, com auto-estima, confiante de si mesmo (pode mesmo ter
ideia delirante de grandeza);
• Pode ter maus hábitos de higiene porque perde alguns dos hábitos mais fáceis
como lavar os dentes, lavar a roupa (Sugerem gravidade);
• Doentes vão acumular muito cansaço uma vez que esta agitação vai impeli-los a
realizar imensas ações. Podem ter exaustão física.

➔ Alteração da vida instintiva


1) Aumenta o apetite – hiperfagia – mas pode ter diminuição do peso porque, ao
ter muita energia, realiza muitas atividades e acaba por perder peso;
2) Diminui a necessidade de dormir;
3) Aumenta a libido.

→ Discurso e pensamento

• Taquifemia (discurso acelerado);


• Verborreia;
• Taquipsiquismo (pensamento acelerado, se tiver eufórico não é incomodativo
mas é se tiver disfórico);
• Fuga de ideias (pensamento muito rápido que muda de direção frequentemente
mas tem um pequeno fio condutor entre as ideias, estando estas conectadas,
muitas vezes, de forma fonológica); → diferente da esquizofrenia;
• Ideias delirantes persecutórias, de grandeza ou místico.

97
→ Percepção

• Alucinações auditivas do tipo acústivo-verbais na 3ª pessoa (falam do doente);


• Alucinações visuais são raras (normalmente sugerem patologia orgânica);
• Hiperestesia (tudo mais intenso, cores e sons mais intensos).´
• Em 10 a 20% dos doentes verifica-se os critérios de 1ª ordem de Kurt Schneider.

➔ Insight
• Doente vive de acordo com o que acredita, não tem insight da sua doença, muitas
vezes mesmo após vários anos de tratamento continuam sem ter insight.

O critério C do episódio maníaco vai fazer a diferença entre mania e hipomania.

Nota que há uma discordância entre 2 manuais:

DSM V - considera que um episódio maníaco pode ser induzido por anti-depressivos
se se mantiver para lá do tratamento.

ICD-11 dá enfâse à variedade dos delírios (persecutório e de grandeza) e à


negligência da higiene e alimentação.

Episódios Hipomaníacos
Os episódios hipomaníacos podem anteceder os episódios maníacos ou
simplesmente ter menor “intensidade” que os episódios maníacos. Nota que podemos
ter episódios hipomaníacos que nunca cheguem a desenvolver para episódios maníacos
e fiquem por isso mesmo, hipomaníacos.

A principal diferença dos 2 tipos prende-se com o tempo (episódio hipomaníaco


pode ter a duração de 4 dias consecutivos apenas), a existência de sintomas psicóticos
(apenas na mania) e as repercussões funcionais:

1) Episódio maníaco: o episódio tem repercussões tão grandes no doente que este
não consegue ser “funcional” na sociedade, há deterioração da capacidade
cognitiva e de concentração do mesmo;
2) Episódio hipomaníaco: o episódio tem repercussões muito menores no doente,
este consegue manter-se funcional na sociedade onde está integrado, manter
um emprego e uma família etc.

Hipomania pode ter um Bright side e Dark side.

• Bright side – aumento da sociabilidade, consigo fazer mais coisas, mais energia,
menos necessidade de dormir;
• Dark side – distrabilidade, incapacidade de realizar planos e tarefas necessários,
planos não existenciais.

Nota: Na hipomania não existem sintomas psicóticos, estes só existem nas manias!

98
Episódios depressivos
Os episódios depressivos que ocorrem na Perturbação Afetiva Bipolar
classificam-se exatamente da mesma forma da depressão numa depressão major.

No entanto, podem ter caraterísticas particulares como vegetativas reversas:

Episódio depressivo major Episódio depressivo major na PAB


Sono Insónia Hipersónia
Apetite Anorexia Hiperfagia
Libido Diminuido Aumento
Sentimento de “mar alto”, vive
Sentimentos Sentimento de vazio
intensamente os sintomas negativos

Podem ter paralisia tipo chumbo (sentir grande peso nas pernas/braços).

99
Estado misto
É um período dentro de uma doença, no qual co-existem sintomas depressivos
e sintomas maníacos.

Doentes estão muito acelerados e faladores mas podem ter pensamentos


depressivos. Grande risco de suicídio.

Antes um estado misto era uma transição entre um estado depressivo e um


estado maníaco. Agora já não é assim: um estado misto é muito mais complexo que um
episódio misto.

Nestes doentes só usamos anti depressivos depois de tratar a mania.

Sintomas catatónicos
Antes associavam-se apenas à Esquizofrenia, agora podem-se associar a:

1) Catatonia (doença onde temos sintomas catatónicos);


2) Perturbação Afetiva Bipolar (fase aguda) → + frequente que na Esquizofrenia;
3) Esquizofrenia.

O esturpor maníaco – expressão facial é sorridente mas estão imóveis e mudos.

100
Perturbação Bipolar de Ciclos Rápidos
A transição entre episódios maníacos e depressivos varia de forma muito rápida
(entre horas a dias), com um ritmo + rápido do que o normal.

São muito graves com grande risco de suicídio.

A perturbação de ciclos rápidos normalmente é iatrogénico, acontece


secundariamente à toma de fármacos.

É difícil de tratar mas trata-se primeiro a mania! A mania pode agir sobre a sua
tristeza, pelo que tratamos a sua mania em primeiro lugar para ele não se matar. Depois
quando estiver em sintoma depressivo logo tratamos a depressão.

1º Trata-se a mania → impedir que se suicide;

2º Trata-se a depressão.

Tipos de PAB (I e II)


A Perturbação Afetiva Bipolar tipo I (PAB I) é caraterizada pela existência de,
pelo menos um episódio maníaco. Nota que apenas na mania podem existir sintomas
psicóticos.

A Perturbação Afetiva Bipolar tipo II (PAB II) é caraterizada pela ausência de


episódios maníacos, existindo apenas hipomaníacos.

Quem tem PAB II não evolui para PAB I no sentido em que são doenças
diferentes com cargas genéticas diferentes.

Epidemiologia

101
Doença psiquiátrica grave acontece entre os 20 e os 30 anos.

Quanto mais cedo, pior e se começar com um episódio depressivo pior ainda.

Quanto mais tempo temos a doença não tratada, pior. Causa bastante burden
nos doentes, principalmente nos jovens.

O atraso no diagnóstico é, em média, 5 anos!

Associado ao morfotipo pícnico.

Na PAB II os doentes têm uma ciclação rápida (≥4 episódios por ano) e os
doentes podem ter episódios depressivos major recorrentes que duram mais tempo.
Teoricamente estes doentes têm risco de suicídio aumentado.

Comorbilidades associadas
Podem ser médicas ou psiquiátricas:

Comorbilidades Psiquiátricas Comorbilidades Médicas


Perturbação de Ansiedade Generalizada Agrava a síndrome metabólica
Perturbação de Défice de Atenção e É agravado pelo hipotiroidismo (paradoxal!)
Hiperatividade
Perturbação de Personalidade (principalmente do Se tivemos episódio maníaco > 40 anos → pensar
cluster B com Personalidade Borderline) numa patologia de base ou toma de fármaco.
Perturbação por consumo de substância

Se tiverem Comorbilidades têm pior prognóstico → principal causa de morte


prematura, seguido de suicídio.

Suicídio
Doença bipolar tem a maior percentagem de suicídio nas doenças afetivas (20x
maior que a restante população em geral).

Sexo feminino, idade de início da doença precoce, polaridade


Fatores de risco para tentar suicídio depressiva, ansiedade, perturbação de personalidade e perturbação
por consumo de substância.
Fator de risco para consumar suicídio Sexo masculino, HF de suicídio.

102
Fisiopatologia
Há uma tríade de fatores:

Alterações nos circuitos


neuronais existentes

Fatores genéticos: existe uma hereditariedade de 85%! Consiste num modelo


multifatorial e não num único gene. A história familiar de PAB é o fator de risco mais
importante (aumenta o risco em 10x).

Fatores ambientais:

1) Infecção de vírus de gripe na mãe;


2) Uso de tabaco na mãe;
3) Parto por cesariana;
4) Problemas na infância.
5) Utilização de substâncias (canábis) → início + precoce e percurso + grave.

Triggers: fatores que podem desencadear o aparecimento de um episódio:

- Fármacos;

- Doenças médicas;

- Mudanças de estação do ano.

103
Assim, os anti-depressivos são um trigger para a doença bipolar porque
achávamos que tínhamos um doente unipolar depressivo, ao tomar o anti-depressivo
vai originar um episódio hipomaníaco que, sem o anti-depressivo, não ocorreria. Os
corticoides também!

O PAB II entra nas urgências com um episódio depressivo, é tratado com um


estabilizador de humor + antidepressivo e se evoluir para mania, era PAB I, se evoluir
para hipomania é PAB II.

Se tivermos um episódio maníaco > 40 anos de idade devemos pensar numa


patologia de base do doente como Esclerose Múltipla, AVC, LES, Doença endócrina ou,
então, toma de um fármaco como AD, CE → isto porque a doença psiquiátrica surge
entre os 20 e 30 anos!

Outras hipóteses…

1) Alterações em neurotransmissores, não há nenhuma disfunção de


neurotransmissores que, isoladamente, consegue suportar as alterações da
PAB;
2) Estudos em sistema hipotálamo-hipófise, não se concluiu nada;
3) Estudos da microbiota do tubo GI, poderiam conduzir a processos imuno-
inflamatórios, por alteração do eixo cérebro-tubo GI.

Neuroprogressão = deterioração cognitiva decorrente da PAB + reorganização da


atividade e circuitos cerebrais, de forma concomitante. Podem ser micro ou macro.

104
Diagnóstico diferencial

Esta tem episódios semelhantes a mania/hipomania/depressivos major mas


sem nunca chegar a cumprir os critérios tem termos de temporalidade (mania-
Perturbação Ciclotímica
1sem, hipomania-4d, depress-2sem). Os sintomas têm de se mantar > 2 anos
e não podem estar todos ausentes > do que 2 meses.
Perturbação Bipolar induzida
por substância/medicamentos
Perturbação Depressiva Major Existência de episódios maníacos ou hipomaníacos.
Perturbações de Ansiedade
generalizada, Perturbação de
pânico
Perturbação de Personalidade
tipo Borderline

Tratamento
O tratamento é muito complexo, pelo que vamos dividir em:

1) Farmacoterapia
➔ Episódio maníaco
➔ Episódio depressivo
➔ Manutenção

2) Outras terapias

1) Farmacoterapia

1.1 Fase maníaca

Nesta fase o que queremos é acalmar os doentes, pelo que normalmente se pode
utilizar um estabilizador de humor e/ou um anti-psicótico de 2ª geração (pelo efeito
sinérgico).

Iniciamos a medicação rapidamente e, ao fim de 2 semanas, pode ser necessário


fazer a reavaliação desta medicação.

Que fármacos se costumam fazer?

- Carbonato de lítio;

- Carbamazepina;

- Valproato de sódio.

105
Nota que a Carbamazepina é um fármaco indutor do CYP450 hepático, o que
nos diz que algum fármaco que seja metabolizado por este complexo terá a sua
metabolização acelerada → é o caso de alguns anti-psicóticos (Olanzapina), pelo que
teremos de dar uma dose maior do que a desejada inicialmente.

Por outro lado, o Valproato de Sódio é um inibidor do CYP450 hepático.

Muitas vezes nas crianças faz-se um anti-psicótico de 2G: Risperidona.

A maior parte dos estabilizadores de humor são “anti-maníacos”, ou seja,


estabilizam de cima para baixo. No entanto, a Lamotrigina é ao contrário, estabiliza de
baixo para cima, pelo que só está aprovada no tratamento de manutenção em doentes
com polaridade dominante depressiva.

A Lamotrigina não está aprovada no tratamento de episódios nem maníacos nem


depressivos.

1.2. Fase depressiva

O tratamento de episódio depressivo é muito difícil de tratar na PAB.


Normalmente os doentes são mais sensíveis e menos tolerantes ao tratamentos
farmacológicos.

A maior parte dos fármacos existentes são direccionados à mania e não à


depressão. Os anti-depressivos têm o risco de converter o episódio depressivo em
episódio maníaco, daí serem dados com estabilizador de humor.

1º estabilizador de humor

2º antidepressivo (sempre depois do EH para impedir a conversão).

Dada a dificuldade de medicar um episódio depressivo, os doentes passam a


maior parte do tempo em fase depressiva e não em fase maníaca.

Que fármacos podemos usar?

- Quetiapina (é o único fármaco aprovado para os episódios depressivos);

- Quetiapina + Carbonato de Lítio;

- Quetiapina + Divalproato.

Muitas vezes temos de pensar se o anti-psicótico que vamos utilizar tem efeito
sedativo suficiente ou se será necessário adicionar uma BZD para que o doente possa
dormir, como é o caso do Aripiprazol.

106
Temos de ter cuidado porque um estabilizador de humor + anti psicótico pode
levar a um ganho ponderal! O ganho ponderal precoce não prediz o ganho ponderal a
longo prazo.

A Lamotrigina não é eficaz no tratamento do episódio depressivo porque tem


uma titulação muito lenta.

1.3. Fase de manutenção

As fases de manutenção são tratadas consoante a fase predominante na doença


do indivíduo e não consoante o último episódio.

Se o doente tiver um predomínio dos episódios maníacos: antipsicótico de 2G;

Se o doente tiver um predomínio dos episódios depressivos: Lamotrigina.

A polaridade do doente é um forte fator preditivo com implicações terapêuticas.

Podemos utilizar:

- Carbonato de Lítio;

- Lamotrigina;

- Quetiapina (isolada, com Carbonato de Lítio ou com Divalproato).

Não se faz VPA em fase de manutenção!

Outros fármacos a utilizar: AINE’s, Acetilcisteína, Omega 3, pioglitazona.

Americanos: não fazer antidepressivos nos doentes com PAB.

Europeus: é um risco utilizar antidepressivos mas deverão fazê-lo.

107
2. Outros tratamentos

- Psicoterapia cognitivo-comportamental: útil em episódios maníacos;

- Eletroconvulsoterapia: útil tanto em episódios maníacos como episódios


depressivos;

- Estimulação magnética transcraniana : útil nos episódios depressivos


refratários.

- Manutenção do ritmo circadiano: estimular os doentes a bebet 1,5L de água


por dia, a acordar e deitar sempre à mesma hora, a apanhar os transportes à mesma
hora, a ver o nascer e pôr do sol… O facto de alguns doentes destes terem traços
obsessivos pode ajudá-los na melhoria dos sintomas.

A PAB dá alterações cognitivas pode ser primária (ao neurodesenvolvimento) ou


secundária (presença de comorbilidades ou efeitos adversos dos fármacos).

Alterações do sono e alterações da cognição podem ser sintomas residuais de


quadro depressivos. Ou seja, os doentes podem ter um quadro depressivo e
apresentarem apenas alterações do sono ou da cognição.

Quem está demente não sabe que tem falta de memória.

Um pseudo-demente sabe e está sempre a queixar-se que tem falta de memória.

Tratamento de doente com PAB


Fase maníaca Fase depressiva Fase de manutenção
Carbonato de Lítio Quetiapina Carbonato de Lítio
Carbamazepina Quetiapina + Carbonato de Lítio Lamotrigina

VPA Quetiapina + Divalproato Quetiapina

108
Podem ter ideias delirantes, sobrevalorizadas, obsessivas.

As ideias delirantes têm conteúdo de culpa, ruína.

Ideia sobrevalorizada é uma ideia que ocupa um grande espaço na cabeça da


pessoa, a pessoa não consegue funcionar.

Ideia delirante pode ser do ponto de vista objetivo, cultural ou individual. Objetivo
se o doente atirou um livro pela parede (não obedece às leis da física), culturalmente (se
o doente apareceu nú na aula e acha que é razoável estar assim). Individual é o que dá
o caráter delirante. A ideia delirante é o facto de termos uma associação ilógica entre 2
assuntos, como “a minha mulher está-me a trair porque deixou as molas azuis viradas
para cima).

“Algo demonstrativa” → doente sofre menos do que o que está a mostrar que
sofre.

109
Isolamento social vs Pouco suporte familiar:

Isolamento social: não querem estar com os outros.

Pouco suporte familiar: é querer estar com os outros mas ninguém os quer.

Na HC, devemos escrever 3 coisas:

1) Desconhece-se terapêutica psiquiátrica e a sua influência sobre a sintomatologia


clínica;
2) Admite-se que o episódio da doença atual, pela sua gravidade sintomática,
possa contaminar e suprimir a memória de vivências passadas não declaradas;
3) Para validar hipótese deveria existir recurso a informação adicional de terceiros
para se apurar a existência de sintomas não verificados como: listar sintomas
não observados mas que permitiram validar a hipótese.

Doente depressivo unipolar → sensação de restrição no espaço (resiste ao


movimento, como se estivesse engripado) e que o tempo colapsou (futuro e passado
num só).

Doente depressivo bipolar → sensação de movimento do corpo de forma


descontrolada, tem vitalidade desesperada, não obedece ao próprio (como se estivesse
a dançar).

110
6. Perturbações de Ansiedade e PTSD

A ansiedade é um sentimento presente em todos os indivíduos, desde muito cedo,


em qualquer idade, acompanha todo o processo de desenvolvimento.

Lei de Yerkes-Dodson: Temos que saber distinguir a ansiedade normal da


ansiedade patológica. Existe uma relação entre a ansiedade e
o nosso nível de desempenho (performance):

- Fase inicial → Ansiedade potencia a performance →


Eustresse;

- Fase final → Ansiedade prejudica a performance →


Distresse.

Medo → resposta emocional a um perigo detetável e iminente;

Ansiedade → antecipação de uma ameaça futura.

Ansiedade normal Ansiedade patológica


Caraterísticas Gerais . .
1) Intensidade Pouco intenso Moderado a intenso
2) Frequência Pouco frequente Frequente/Muito freq
3) Duração Curta duração Longa duração
Gravidade da situação subjetiva / Reação adequada, normalmente Reação inadequada, normalmente
resposta ansiosa gerada por estímulos externos gerada por estímulos internos
Sofrimento subjetivo e tipo de Transitório e limitado, associado Marcado e frequente, associado a
sintomas a sintomas psíquicos sintomas físicos
Liberdade e funcionamento Sem alterações na deterioração Pode haver deterioração ou
cognitivo ou organização cognitiva e desorganização cognitiva e
performance diminuição da performance.

111
Síndrome ansiosa

Síndrome que reúne um conjunto de sintomas de várias categorias:

SINTOMAS AUTONÓMICOS

Sintomas Tensão Perturbações


Hiperventilação
psíquicos muscular do sono
Sintomas
Sintomas Sintomas
Sintomas CV Génito-
GI respiratórios
Urinários

Dor
Taquipneia Palpitações Polaquiúria Ansiedade Tremores Tonturas Insónia inicial
abdominal

Diarreia/ Dispneia Pré- Parestesias nas Terror


Dismenorreia Agitação interior Cefaleias
Obstipação Inspiratória cordialgia extremidades nocturno

Sensação do
Aperto coração a Dificuldade de Sono
Meteorismo Amenorreia Mialgias Dispneia
torácico parar de concentração intermitente
bater

Disfunção Hipersensibilida
Disfagia
erétil de ao ruído

Irritabilidade

Em relação às perturbações da ansiedade importa saber:

1) Patologia psiquiátrica mais prevalente 16,5% da população.


2) Possui marcada morbilidade e perturbação funcional no quotidiano:
3) Possui marcado recurso aos cuidados de saúde;
4) Tem uma baixa mortalidade;
5) Há relação entre perturbações de ansiedade crónica e aumento da mortalidade
cardiovascular;
6) Existem tratamentos que, na sua maioria, são efetivos

112
Dentro das Patologias Ansiosas e de Stress/Trauma, destacamos:

Nesta aula vamos abordar 4 principais:

1) Ataque de pânico;
2) Perturbação de pânico;
3) Perturbação de Ansiedade Generalizada;
4) Perturbação de Stress Pós-Traumático.

Ataque de Pânico
Sensação de intenso medo e desconforto, com uma instalação súbita e
imprevisível, que atinge o pico em minutos mas resolve-se em menos de 1h, no qual
predominam sintomas somáticos como palpitações, sudorese, tremor, dispneia, pré-
cordialgia, náuseas e vómitos.

Muitas vezes é descrito como:

1) Sensação de morte iminente;


2) Pior experiência que uma pessoa já viveu.

Podem ainda sentir:

1) Despersonalização (perda da sensação de quem se é)


2) Desrealização (perda da noção do ambiente que o rodeia).

Um ataque de pânico isolado não é, necessariamente, uma patologia, as pessoas


podem ter ataques de pânico pontuais na vida.

Os ataques de pânico podem tanto acontecer em pessoas calmas como pessoas


mais ansiosas. O 1º ataque de pânico costuma acontecer sem qualquer estímulo
desencadeante, ser totalmente inesperado. No entanto, os subsequentes podem estar
dentro de um clima mais previsível e a pessoa sentir que “vai ter um ataque de pânico”.

113
Em que contextos pode surgir o ataque de pânico?

Os ataques de pânico podem ter um caráter “especificador”, ou seja, pode ser


parte de outra doença e devemos indicar se teve ou não ataques de pânico.

Exemplo: PSPT com ataques de pânico ou DPOC com ataques de pânico.

114
Perturbação de pânico
A perturbação é caraterizada pela ocorrência de vários episódios de ataques de
pânico inesperados, ou seja, uma pessoa que tem ataques de pânico de forma
recorrente. É uma situação muito aguda.

Pode também ser definida como:

Diagnóstico Diferencial

1) Agorafobia (medo de ficar desamparado em qql situação);


2) Perturbação de ansiedade fóbica (aqui temos um objeto, um estimulador e
“culpado” do ataque de pânico);
3) Perturbação de ansiedade generalizada;
4) Perturbação depressiva;
5) Perturbação orgânica aguda.

➔ Agorafobia: medo de ser colocado numa situação da qual não consiga sair
facilmente ou ter ajuda caso necessário, como andar de transportes públicos,
estar no meio de uma fila/multidão, num espaço aberto, numa loja fechada ou
ficar fora de casa sozinho.

Investigação de um doente com perturbação de pânico

É necessário fazer uma análise da história clínica do doente, onde se destaca:

1) Exame Objetivo;
2) Análises Laboratoriais (hemograma com plaquetas, ionograma, cálcio, glicémia,
função hepática, função tiroideia, função renal, urina tipo II;
3) ECD (ECG);
4) Procura de toxicofílicos.

115
Nota que à investigação profunda de exames complementares para o diagnóstico
de Perturbação do pânico pode, efetivamente, fazer alguma sensação de reforço desta
patologia. Ainda assim, é importante perceber e despistar outras patologias
potencialmente graves.

É preciso despistar a possibilidade de algumas patologias orgânicas como:

EAM Embolia Pulmonar Hipertiroidismo Hipotiroidismo


Síndrome de
Hipoglicémia Intoxicação aguda
Abstinência

Epidemiologia

- Acontece em 2,7% da população mundial;

- Predomina nas mulheres (2 mulheres : 1 homem);

- Acontecem principalmente em jovens adolescentes, no contexto de consumos


(de álcool ou outros toxicofílicos) ou então em patologia mental (ansiedade ou
depressão).

Na adolescência é muito raro encontrarmos perturbações da ansiedade puras,


sem outras perturbações associadas, normalmente tem outras Comorbilidades.

Etiologia

Provavelmente é de causa multifactorial, mas destacam-se:

1) Fatores genéticos → um indivíduo que tenha um familiar de 1º grau com


perturbação de pânico tem um risco aumentado em 5x de ter;
2) Reação autonómica exacerbada;
3) Aprendizagem social.

Vias neuronais da fuga e medo → alteradas!

- Envolvem a amígdala, hipocampo, hipotálamo, núcleos do tronco cerebral,


substância cinzenta periaquedutal.

116
Tratamento:

Pode ser farmacológico ou não:

➔ Farmacológico

1) Inibidores seletivos da recaptação da serotonina com citalopram ou sertralina.


2) Inibidores não seletivos da recaptação (serotonina e NE) – venlafaxina.
3) Benzodiazepinas (alprazolam) → utilizados numa primeira fase para controlar
os sintomas mas, ao fim de 1 mês, já há controlo destes sintomas, serão
retirados.

O tratamento farmacológico deverá demorar aproximadamente 1 ano. A resposta


farmacológica é, normalmente, muito boa.

➔ Não-Farmacológico

1) Psicoterapia cognitivo-comportamental.

Na melhoria dos sintomas → farmacológico = Psicoterapia;


Na resposta mais duradoura → Psicoterapia;
Na terapêutica mais curta → Psicoterapia.

Normalmente não há necessidade de associar os 2, são eficazes cada um por si,


apesar de a sua combinação poder ser sinérgica.

Prognóstico

30% → Remissão Completa;

30% → Remissão Parcial;

50% → Recaída ao fim de 12 meses depois de terminar a terapêutica.

117
Perturbação de ansiedade generalizada
É uma perturbação sub-aguda, enquanto a perturbação de pânico é uma
perturbação muito aguda.

Definição: ansiedade e preocupação excessivas (apreensão expectante) sobre


uma série de acontecimentos ou atividades (> metade dos dias durante > 6 meses).

A pessoa tem que ter dificuldade a controlar a sua preocupação, têm de causar
sofrimento e ter repercussões funcionais.

Diagnóstico diferencial

1) Outras perturbações de ansiedade


2) Perturbação depressiva
3) Esquizofrenia
4) Demência
5) Perturbações pelo uso de substâncias
6) Doença somática (hipertiroidismo, feocromocitoma, hipoglicémia).

118
Epidemiologia:

- 4,4% da população mundial:

- Mais frequente nas mulheres (2 mulheres : 1 homem);

- Acontece no contexto de baixo rendimento social, desemprego, divórcio ou


separação.

Etiologia

- Fatores genéticos (pessoas com maior pré-disposição);

- Fatores ambientais (problemas na infância).

As pessoas com PAG vão utilizar a ansiedade como forma de um coping (+), ou
seja, não descansam até conseguirem pensar em todas as alternativas para um
determinado problema ou todos os imprevistos que podem ocorrer numa situação.

Comorbilidades

É frequente com as perturbações depressivas e outras perturbações de ansiedade.

Terapêutica

➔ Situações Leves
- Relação Médico-Doente benéfica;
- Auto-ajuda;
- Psicoeducação.

➔ Situações Moderadas/Graves
- Farmacoterapia:
1) Curta duração:
-Benzodiazepinas
- Buspirona (menos efeito que a BZD mas menor dependência);
2) Longa duração:
- Inibidores da recaptação de serotonina (fluoxetina, sertralina);
- Inibidores da recaptação de serotonina/NE (Venlafaxina);
- Agonista GABAérgico (Pregabalina);

- Psicoterapia cognitivo-comportamental;

- Técnicas de relaxamento (se já tiver sido realizado previamente);

- Aconselhamento não diretivo.

119
Prognóstico

25% → Remissão Completa;

75% → Patologia crónica.

Perturbações de Stress pós-traumático


Correspondem a uma reação intensa, prolongada e, por vezes, retardada a um
evento stressor intenso.

Estes doentes apresentam uma tríade:

1) Evitar recordações;
2) Hiper reactividade autonómica;
3) Voltar a experienciar aspetos do evento stressor.

Sintomas do doente

Sintomas intrusivos Evitamento Alterações da ativação e da reatividade


Dificuldade em relembrar
Lembranças intrusivas Ansiedade persistente
voluntariamente o acontecimento
Sensação de estar desligado ou
Sonhos perturbadores recorrentes Irritabilidade
estranheza
Reações dissociativas (Flashback) Incapacidade em sentir as emoções Insónia
Dificuldade de concentração
Diminuição do interesse nas atividades

Reação dissociativa – a pessoa não tem uma consciência atualizada em relação


ao acontecimento mas vive o acontecimento passado como se estivesse a ocorrer no
momento.

Diagnóstico diferencial

1) Exacerbação das outras perturbações da ansiedade ou de humor:


2) Perturbação aguda de stress;
3) Perturbações de ajustamento;
4) Perturbação do humor;
5) Alteração persistente da personalidade.

120
121
Epidemiologia

- Acontece em 8% da população mundial:

- Acontece em mais homens (11:5), relacionável com a guerra colonial.

Exemplos de stressores extremos

1) Assaltos
2) Catástrofes naturais (inundações e tremores de terra;
3) Calamidades provocadas pelos homens (incêndios e acidentes de transportes)
4) Guerra
5) Violações

Os eventos stressores com maior probabilidade de originar PTSD são os que


ocorrem na esfera interpessoal:

1) Violações → nos casos dos homens;


2) Assaltos → nos casos das mulheres.

O quadro clínico pode acontecer pela pessoa ser o agente principal (quem vivencia)
os eventos stressores ou por ser testemunha dos mesmos. Além disso pode ser pelos
acontecimentos terem ocorrido a familiares próximos.

122
Etiologia

Fatores Genéticos → nem todas as pessoas mais próximas do evento stressor são as
que têm patologia mais exacerbada, tem de haver uma vulnerabilidade pessoal;

Alteração do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal;

Alteração do eixo do medo/fuga.

Comorbidades

1) Depressão
2) Perturbações de ansiedade
3) Uso de álcool ou outras substâncias

Prevenção

1) Psicoterapia de exposição prolongada


2) Psicoteragia cognitivo-comportamental focada no trauma.

Estas intervenções devem ser feitas apenas com as pessoas desejadas e não com
toda a gente que quer.

Tratamento

1) Psicoterapia cognitivo-comportamental;
2) Psicoterapia de exposição narrativa;
3) Dessensibilização e reprocessamento por meio dos movimentos oculares;
4) Fármacos: inibidores da recaptação de serotonina ou inibidores da recaptação
de serotonina e NE.

Muitas vezes temos de estar atentos para a possível existência de uma perturbação
depressiva ou de uso de álcool/substâncias e tratar este problema também.

Prognóstico

- 1/3 → remissão completa;

- 40% → Patologia crónica.

123
Perturbação de Ansiedade Perturbação de Stress Pós-
Perturbação de Pânico
Generalizada Traumático

Descrição dos Presença de ataques de pânico Apreensão expectante durante Presença de um evento stressor na
critérios recorrentes onde, durante >1 >1/2 dos dias em >6 meses, vida da pessoa que é revivido de
mês, o doente tem receio de ter havendo sintomas somáticos forma persistente, prolongada e, por
novos ataques de pânico e dos de ansiedade. A ansiedade é vezes, retardada, estando associada
efeitos que este pode ter ou difícil de controlar e surge com a evitamento, hiperreatividade
altera a sua vida em função repercussões na vida da autonómica e revivência do
disso. pessoa. episódio.
Epidemiologia - 2,7% de toda a população - 4,4% de toda a população - 8% de toda a população
- 2 mulheres : 1 homem - 2 mulheres : 1 homem - 11 homens : 5 mulheres
Etiologia - Genética (5x mais risco de um - Genética (personalidade); - Genética (diferente doença para a
familiar ter); - Ambiental (problemas na mesma exposição);
- Resposta autonómica infância). - Eixo hipotálamo-hipófise-
exacerbada; suprarrenal;
- Aprendizagem social; - Eixo do medo/fuga
- Eixo do medo/fuga.
Diagnóstico - Agorafobia; - Outras perturbações - Exacerbação de perturbação de
Diferencial - Perturbação de Ansiedade ansiosas; ansiedade ou humor;
fóbica; - Perturbação Depressiva; - Perturbação aguda de stress;
- Perturbação de Ansiedade - Esquizofrenia; - Perturbação de ajustamento;
Generalizada; - Demência; - Perturbação de humor;
- Perturbação Depressiva; - Perturbação induzida por - Perturbação de personalidade.
- Perturbação orgânica aguda. substâncias;
- Perturbação induzida por
situação médica.
Tratamento 1) Farmacológico 1) Leve 1) Prevenção
- SSRI - Relação médico-doente; - Psicoterapia cognitivo
- Inibidor não seletivo da - Auto-ajuda; comportamental focada no trauma
recaptação de serotonina e NE - Psicoeducação. - Psicoterapia de exposição
- BZD 2) Moderada/grave prolongada
- Farmacológico
2) Psicoterapia cognitivo- Agudo: 2) Moderada/Grave
comportamental BZD ou Buspirona; - Psicoterapia cognitivo-
Crónico: comportamental
. SSRI - Psicoterapia de exposição
. Inibidor não seletivo da narrativa
recaptação de serotonina e NE - Dessensibilização e
. Pregabalina reprocessamento pelos movimentos
- Psicoterapia CC oculares
- Tratamento de relaxamento - Farmacológico com SSRI e INSRS
- Aconselhamento não diretivo

Prognóstico 30% com remissão total 25% com remissão total 1/3 com remissão total
30% com remissão pacial 75% com patologia crónica 40% com patologia crónica
50% com recaída até 12 meses
após o fim da medicação

124
Temos o caso de uma doente, Maria, 35 anos, que começou há 15 dias com sintomas
de ansiedade, agitação interior, preocupação, etc. Isto foi no contexto do incêndio de
Pedrógão. Calamidade natural poderá originar uma PTSD?

A doente tem sintomas ansiosos aos 32 anos e ao 34 anos. Nestas situações não foi à
médica. Pouco intensos, durante 1 mês. O dos 32 anos correspondeu a problemas no
trabalho e com o marido, enquanto aos 34 anos está relacionado com a mudança no
trabalho. Uma vez que eram situações normais estes seriam fisiológicos e não
patológicos, a reação é adequada ao estímulo, que é um estímulo externo.

Aos 12 anos também houve um incêndio em casa dos avós que originou sintomas
ansiosos na pessoa.

No quadro da doente não encontramos alterações de evitamento nem de


hiperreatividade autonómica ou sintomas intrusivos, pelo que é um quadro mais próprio
de ansiedade do que de perturbação de stress pós traumático.

Temos que tentar definir se será uma situação normal ou uma situação patológica, que
repercussões teve funcionalmente na vida da pessoa.

Fernanda, 48 anos, casada, gestora de serviços.

Descrição típica de perturbação de stress pós-traumático. É peculiar porque não é


normal uma doente com SII ir à consulta da dor, enviada pela gastroenterologia.
Inicialmente era controlada mas depois deixou de controlar (era por Tramadol, um
opióide).

Devíamos tentar ver se existia algum fator stressante na vida da pessoa.

Nesta situação temos um quadro marcante que, efetivamente, poderá estar na base
disto, uma vez que a doente disse que “sabia que não era a culpada mas, objetivamente,
se o seu carro não tivesse lá a senhora não teria morrido”.

Aos 22 anos teve um episódio de acidente de carro com o marido na noite de núpcias.
Além disso, aos 24 anos sofreu de pré-eclampsia no parto e foi aqui o diagnóstico de
SII. Neste seguimento verifica-se que o diagnóstico de uma patologia física (SII) no
contexto de uma patologia psiquiátrica. Poderão ser consequência uma da outra?

125
7. Perturbações Depressivas
Dentro do quadro das Perturbações Depressivas temos:

Existe algo em comum em todas as perturbações depressiva acima enunciadas:

Epidemiologia
- 8% das pessoas em Portugal possuem Perturbação Depressiva;

- Há maior probabilidade de afetar mulheres do que homens;

- A prevalência de Perturbação Depressiva está a aumentar, bem como de Perturbação


de Ansiedade;

- A idade média para o primeiro episódio depressivo índex é aos 27 anos;

- Apenas 37% das pessoas com episódio depressivo major foram diagnosticadas no 1º
ano do aparecimento dos sintomas, as restantes apresentam um time gap de 4 anos
entre o início dos sintomas e o diagnóstico.

- Os países mais desenvolvidos têm mais depressão e os estratos sociais mais baixos,
dentro de um mesmo país, são a população mais afetada;

- A depressão é o principal contribuinte para os anos ajustados de vida vividos com


incapacidade (DALYs).

- A depressão aumenta o risco de ocorrência e a gravidade de:

1) Doenças CV;
2) Diabetes Mellitus;
3) 15x o risco de suicídio.

126
Etiologia

1. Fatores genéticos

Contribuem em cerca de 37% para a Depressão major unipolar.

Não existe um único gene, a transmissão é poligénica, sendo que cada gene
individualmente tem pouco efeito. No entanto, existe uma interação entre gene-
ambiente.

As formas genéticas de depressão:

1) Têm um início mais precoce;


2) São mais graves;
3) Têm um caráter mais recorrente.

Genética → influencia a personalidade → desenvolve traços que tornam a pessoa


mais vulnerável ao impacto emocional da adversidade e o risco de exposição a
acontecimentos de vida negativos.

1) Falta de suporte social


2) Impulsividade
3) Necessidade excessiva de aprovação Predispõem à depressão
4) Neuroticismo (tendência para experienciar emoções
negativas como ansiedade, depressão, raiva)

2. Modelo biológico

Há 5 propostas:

127
2.1. Deficiência monoaminérgica

Sobretudo com a serotonina, noradrenalina e dopamina.

Serotonina

Verifica-se que uma depleção oral em triptofano num indivíduo que tinha
depressão e era tratado com SSRI (inibidor seletivo da recaptação de serotonina, como
fluoxetina, sertralina) vai levar a uma recaída dos sintomas depressivos → demonstra
que a serotonina (que é sintetizada com triptofano) tem relevância nos sintomas
depressivos.

O recetor 5-HT1A regula a função serotoninérgica e está diminuída nos indivíduos


com depressão.

Dopamina

Demonstra que a sua ausência leva à depressão e que a sua presença atenua os
sintomas depressivos.

Ausência de Dopamina → Depressão Presença de Dopamina → Depressão


Na doença de Parkinson temos diminuição da A administração de Bupropiona impede a recaptação de
transmissão Dopaminérgica e temos grande prevalência NE e Dopamina, pelo que aumenta a disponibilidade de
de Depressão. Dopamina na fenda sináptica e melhora os sintomas.
A utilização de Reserpina impede a colocação de A administração de Pramipexole, um agonista
Dopamina e NE nas vesículas sinápticas, pelo que dopaminérgico, vai melhorar os sintomas depressivos.
diminui a transmissão dopaminérgica e, desta forma,
aumenta os sintomas depressivos.

Norepinefrina (NE)

Na NE, vemos que a sua libertação ocorre maioritariamente no Locus Coeruleus.

Os recetores alfa 2, pré-sináticos, vão regular a libertação de NE para a fenda


sinática.

Acontece que nos doentes com depressão estes recetores estão híper-
sensibilizados, pelo que uma pequena porção de NE vai impedir a libertação de NE por

128
parte do neurónio pré-sinático, pelo que se conclui que a diminuição da libertação de NE
é um problema nos doentes com Depressão.

2.2. Eixo hipotálamo-hipófise-Supra-renal

Cerca de 50% dos doentes com depressão tem este eixo


hiperativo.

1) Temos o aumento da CRH por parte do hipotálamo


que, pelo LCR, vai estimular a hipófise;
2) A hipófise não responde a este aumento e liberta pouca ACTH;
3) A supra-renal consegue, ainda assim, libertar demasiado cortisol para o
sangue.

Há uma libertação de cortisol exacerbada para o sangue, independentemente do


ritmo circadiano.

Aquando da administração de uma substância externa não há feedback


negativo, há uma resistência a isto, pelo que temos um TSD positivo → há libertação de
cortisol independentemente da dexametasona, pelo que se demonstra a hiperatividade
deste eixo.

Há uma certa associação (2/3) entre o desenvolvimento de depressão e a


exposição a eventos stressores, sendo que pessoas com personalidades
tendencialmente mais depressiva já se colocam a eles próprios em situações mais
arriscadas.

Fenómeno de Kindling:

Numa fase inicial da doença → episódio traumático/drástico → episódio


depressivo major.

Numa fase mais avançada da doença → episódio depressivo major não necessita
da ocorrência de um episódio traumático/drástico.

O que isto quer dizer é que, com a


progressão da doença, a ocorrência de um
episódio depressivo major acaba por deixar
uma cicatriz que facilita a ocorrência de
novos episódios depressivos sem ser
necessária a ocorrência de episódios
trágicos.

129
2.3. Inflamação

A inflamação pode estar relacionada com a instalação da depressão.

Na depressão temos:

1) Aumento da atividade do SNS;


2) Aumento da resposta inflamatória.

É importante que este mecanismo inflamatório aconteça junto do SNC e não do


SNP, se bem que uma inflamação periférica pode contribuir para uma inflamação a nível
central.

Esta inflamação vai ter repercussões tanto nos macrófagos como na microglia.

130
2.4. Neuroimagem

1) Hiperdensidade da substância branca;

2) Atrofia cortical do lobo pré-frontal (alteração do controlo emocional);

3) Diminuição do funcionamento e volume do hipocampo, das dendrites e da


neurogénese (explica as amnésias, principalmente da memória a curto prazo);

4) Aumento da atividade da amígdala com alteração do controlo emocional.

2.5. Alterações do sono

- Insónia terminal;

- Dificuldade em manter a continuidade do sono;

- Diminui a latência do sono REM;

- Entra em sono REM mais cedo.

3. Modelo psicológico

1) Cognitivo-comportamental

Tentar perceber os pensamentos automáticos e os comportamentos de defesa


que o doente realiza, ou seja, procurar um modelo dentro da pessoa do doente;

131
2) Interpessoal

Tenta perceber as relações interpessoais que a pessoa estabelece e a forma


como isso influencia o doente. Procura modelo nas relações com o doente.

3) Psicodinâmica

Mistura um pouco a cognitivo-comportamental e a interpessoal porque vai pegar


nas relações pessoais precoces e fazer uma atualização das mesmas.

4) Personalidade

Já vimos que há traços de personalidade que estão mais dispostos a desenvolver


perturbação depressiva, como:

- Impulsividade;
- Neuroticismo;
- Sociotropia.

A pessoa estabelece relações precoces, com as


quais existe um determinado padrão na relação. No
entanto, perante um acontecimento de vida crítico poderá
haver necessidade de reatualizar estes padrões
relacionais, que podem levar a distorções cognitivas. Se a
pessoa não tiver um bom sistema de suporte nem de
comunicação poderá desenvolver uma depressão.

Fatores de risco

Clínica
Temos 2 sintomas predominantes na Perturbação Depressiva Major:

1) Alteração do humor → humor deprimido ou humor disfórico;


2) Anedonia ou incapacidade de obter prazer.

Pelo menos um destes tem de estar presente durante mais de 2 semanas.


Adicionalmente, é preciso juntarmos mais 5 sintomas.

Nota que a perturbação depressiva pode ter sintomas psicóticos e estes podem ser:
132
1) Congruentes com o humor
a. Ideias delirantes do tipo niilista, de negação de órgão, ruína, culpa,
somático;
b. Alucinações.
2) Incongruentes com o humor
a. Ideias delirantes do tipo persecutório ou de grandeza;
b. Alterações do limite do Eu.
➔ Caraterísticas atípicas
Reatividade do humor
Aumento do apetite/peso
Hipersónia
Leaden paralysis (sensação dos membros pesados)
Sensibilidade à rejeição interpessoal
Critérios de diagnóstico

133
Temos que ter em atenção que, por vezes, o doente não se “queixa” do humor
depressivo, temos de estar atentos aos sintomas somáticos da depressão como:

- Alterações do sono;

- Cefaleias;

- Dores no corpo (lombalgias, dores abdominais, cervicais, precordiais);

- Alterações GI;

- Cansaço/fadiga.

As alterações do peso/apetite podem ser a primeira queixa do doente e, por


vezes, são pouco congruentes, ou seja, supostamente há diminuição do peso e do
apetite mas nem sempre é assim:

1) Depressão mais leve mas crónica – ganho de peso;


2) Depressão grave – perda de peso.

A insónia é tipicamente intermédia ou terminal.

A fadiga, junto com as alterações do apetite/peso podem ser a primeira queixa


do doente. Surgem sem que haja esforço físico e mesmo para as tarefas de vida diárias.

A capacidade diminuída de pensar pode ser percecionada de forma diferente


consoante as idades:

- Crianças: diminuição súbita do rendimento escolar pode ser por dificuldade de


concentração;

- Adulto: incapacidade de realizar o seu trabalho se este depender de


capacidades executivas muito exigentes;

- Idoso: pode ter alterações de memória que, numa fase inicial, se confundem
com uma demência.

Temos de ter em atenção que, por vezes, a existência de patologias médicas


associadas pode dificultar o diagnóstico de perturbação depressiva major, já que a
própria patologia pode estar na base de sintomas somáticos depressivos (perda/ganho
de peso, alterações do apetite, alterações do sono).

Depressõs sazonais
Ocorrem no Outono/Inverno;

Têm uma relação com a exposição solar.

Sintomas paradoxais → aumento do apetite (hiperfagia) e aumento do sono


(hipersónia), Astenia vespertina.

134
Estado misto
Temos caraterísticas mistas nos quais se misturam sintomas depressivos com
sintomas hipo/maníacos, como um autoestima elevada, aumento da energia, diminuição
da necessidade de dormir, envolvimento excessivo em atividades, fuga de ideias, humor
expansivo, mais comunicativo.

Episódios
1) Episódio único: ocorreu um único episódio na vida da pessoa – 40%;
2) Episódios recorrentes: ocorreram pelo menos 2 episódios na vida da pessoa –
60%.
3) Crónico:
a. Perturbação Depressiva Crónica: > 2 anos;
b. Perturbação Depressiva Resistente: >2 anos com terapêutica ineficaz.
4) Depressão dupla: Episódio depressivo major + Distímia.

Apresentação

Prognóstico
O prognóstico é agravado em:

1) Remissão incompleta ou quando permanecem alterações do sono ou


sintomas somáticos depois do término da medicação;
2) Em função do nº de episódios;
3) Se tiver início precoce;
4) Se tiver pouco suporte social;
5) Se tiver comorbilidades com doenças somáticas, tóxicos ou perturbações da
personalidade.

135
Diagnóstico diferencial
1) Perturbações de ansiedade – a ordem de aparecimento dos sintomas é muito
importante (perceber o que aparece primeiro, o pânico que acaba por originar uma
depressão pelo facto da pessoa ter de mudar o seu estilo de vida para evitar o pânico
ou uma pessoa com sintomas depressivos que apresenta pontualmente crises de
pânico). Torna-se mais difícil distinguir os 2 se existirem sintomas fóbicos, obsessivos e
dissociativos.

2) Esquizofrenia – pensar na ordem de aparecimento de sintomas, uma vez que


a depressão pode acontecer como pródromo da esquizofrenia. Torna mais difícil
distinguir em casos de depressão psicótica ou na perturbação esquizo-afetiva.

3) Demência – torna-se mais difícil avaliar principalmente nas idades mais


avançadas onde já existe uma alteração cognitiva de base. O mais fácil é fazer uma
prova terapêutica e ver se, com o tratamento da depressão, o doente melhora dos
sintomas cognitivos (se sim, serão decorrentes da depressão), caso contrário serão de
base associada a uma demência.

4) Doenças somáticas - nomeadamente se forem neurológicas (Doença de


Parkinson, AVC, Demência, Neoplasia cerebral, Epilepsia temporal, Esclerose múltipla,
Enxaqueca) ou infeciosas (infecção bacteriana ou viral).

5) Doenças endócrinas – hipotiroidismo é a mais importante, pelo que devemos


tentar dosear a TSH. (Se estiver alto, será um hipotiroidismo primário, se tiver baixo será
um hipotiroidismo secundário). Diabetes mellitus, doenças da paratiroide ou da supra-
renal, défices vitamínicos.

6) Doenças inflamatórias – LED (Lúpus eritematoso discoide), Artrite


Reumatóide, S. Sjogren, DII.

7) Neoplasias – como neoplasias, EAM, porfiria (défice na síntese do heme),


Doença renal.

Temos explosões de raiva recorrentes e graves que acontecem


Perturbação Disruptiva da
pelo menos 3x/semana durante 12 meses.
Desregulação do Humor

Perturbação Depressiva Persistente Manutenção dos sintomas depressivos não durante 2


(resulta da junção da perturbação depressiva semanas mas durante 2 anos, nos quais a ausência dos
major crónica e distúrbio distímico) mesmos não poderia ser > 2 meses seguidos.
Sintomas aparecem na semana que antecede a menstruação
Perturbação Disfórica Pré-Menstrual e desaparecem na semana que se segue à mesma. Tem de
ocorrer na maioria dos ciclos menstruais no ano anterior.

136
Tratamento agudo
O que queremos no tratamento agudo:

1) Redução dos sintomas (pelo menos 50%);

Assim, temos de:

1) Avaliar a gravidade e o risco de suicídio;


2) Equacionar possíveis causas;
3) Avaliar recursos sociais do doente;
4) Avaliar repercussão nos outros;

O tratamento deverá ser psicológico e, se


necessário, será farmacológico, devendo sempre
assentar numa integração de família, doente e técnicos.

Podemos ver que existem 3 períodos do tratamento:

1) Fase aguda → remissão dos sintomas;


2) Fase de continuação → continuação da remissão e evitar recaída;
3) Fase de manutenção → evitar as recorrências.

Várias classes de fármacos:

137
1) Inibidores da MAO (inibidores da enzima que degrada as monoaminas).

Temos a MAO-A e MAO-B.

➔ MAO-A: NE, E e serotonina


➔ MAO-B: dopamina

Inibidores não seletivos e Seletivos para MAO- Seletivos para MAO-B Seletivos para MAO-A e
irreversíveis A e irreversíveis e irreversíveis reversíveis (RIMA)
Iproniazida Clorgilina Selegilina Moclobemida
Isocarboxazida

2) Inibidores da recaptação
NE + DA → Bupropiona
NE → seletivos (NRI) ou inibidores da recaptação de serotonina e NE (SNRI -
venlafaxina);
5-HT → inibidores seletivo da recaptação de serotoninia (fluoxetina, sertralina).

3) Fármacos que atuam nos recetores


Trazodona – se for baixa dose é antagonista serotoninérgico, se for alta dose é
agonista serotoninérgico.
Mirtazapina- é um antagonista de recetor H1, alfa2 e 5-HT2C, 2c e 3.
Agomelatina é agonista dos recetores de melatonina e antagonista dos recetores
5-HT2C.

Depressão Ligeira/Subclínica Depressão Major


- Exercício físico (5x por semana, 30’) - Antidepressivos
- Medidas Gerais - Medidas Gerais
- Apoio psicológico de baixa intensidade - Apoio psicológico de alta intensidade
- Controlar a Ansiedade - Antipsicóticos (se depressão psicótica)
- Antidepressivos* - ECT se risco de suicídio muito alto

*. = se episódio depressivo não for o primeiro, se tiver > 2 anos, se o doente tiver
comorbilidades somáticas.

Depressão psicótica → responde melhor a antipsicóticos + ADT;

Depressão atípica → responde melhor a IMAOs.

Devemos, antes de começar a terapêutica, ter a certeza que não cumpre critérios
para PAB (ou seja, nunca existiram episódios maníacos ou hipomaníacos), porque
caímos no risco de ter um doente com PAB II que reverte para estado hipomaníco.

138
O tratamento, para ser considerado ineficaz, tem de ser realizado em dose
adequada durante, pelo menos, 6 semanas (isto a ter em conta que existe um período
de latência entre a aplicação do fármaco e o início da melhoria de sintomas que chega
às 3 semanas).

Além da terapêutica farmacológica, faz-se Psicoterapia:

Psicoterapia cognitivo- Psicoterapia Interpessoal Psicoterapia psicodinâmica Breve


comportamental
Psicoterapia estruturada Estruturada semanal (inicial, Estruturada semanal
intermédia, final)
12 a 16 semanas 12 a 16 semanas 16 a 24 semanas
Detetar e reduzir pensamentos Problemas interpessoais (luto, Padrões relacionais
automáticos transições)
Evitar comportamento “seguro” Aumentam o funcionamento social Relacionar padrões atuais com
(evitação) relações passadas.

Efeitos adversos

Antidepressivos tricíclicos Inibidores seletivos de Inibidores não seletivos da


SEH recaptação de serotonina recaptação de NE/Dopamina
SCIA
Sedação Sintomas GI (+++) Hipersudorese
Efeito anti-colinérgico Cefaleias Hipertensão
Hipotensão ortostática Insónia
Ansiedade

Muitas vezes associa-se um SSRI com uma benzodiazepinas, por causa dos
efeitos de ansiedade, principalmente numa situação inicial.

1º fármaco : SSRI / Mirtazapina.

139
Nota que:

1) Se for um episódio inaugural → tratamento farmacológico > 6 meses;


2) Se for um episódio recorrente → tratamento farmacológico > 2 anos.

Há terapêuticas de acção mista, ou seja, farmacoterapia e psicoterapia.

Aumentar o peso: ADTs, Mirtazapina, Paroxetina.

Diminuir o peso: Fluoxetina e Bupropiona.

HTA Síndrome de Secreção Prolongamento do QT


Inapropriada de ADH
Antidepressivos tricíclicos fazem bloqueio alfa Antidepressivos tricíclicos Antidepressivos
adrenérgico, pelo que dão hipotensão ortostática. quinidina-like
SSRIs não têm influência na HTA. Mirtazapina Citalopram
SNRI vão levar a alterações da TA, principalmente a SSRIs
Venlafaxina, sendo que a Duloxetina tem efeito menos
grave.
Mirtazapina tem um elevado risco de HTA. Vão dar hiponatrémia

Grávidas Idosos
Podem Não podem Não podem
SSRIs (1º Sertralina, 2º Fluoxetina) Paroxetina ADTs pelos efeitos anti-
ADTs (ainda assim têm riscos!) (têm muitos riscos!) colinérgicos
SSRIs → podem ser benéficos por terem capacidades antiagregantes.

140
8. Perturbações fóbicas, obsessivo-compulsiva

A Perturbação Obsessivo-Compulsiva é uma perturbação na qual vamos ter


obsessões e/ou compulsões.

Definição/Ideias Obsessivas / Compulsões / POC

Nota que, pela heterogeneidade de apresentação, é preciso especificar sempre:

1) Insight do doente – total, parcial ou ausente – relacionado com o prognóstico;


2) Se o doente tem tiques – isto faz-se quando o doente tem uma história atual ou
passada de Perturbação de Tique.

141
É preciso destacarmos a definição de 2 conceitos major:

Após a definição do DSM-V, é importante destacar que, nas ideias obsessivas:

1) O doente tenta ir contra estas ideias, são diferentes da sua personalidade, são
egodistónicas, são contra a vontade do doente, vêm de fora do doente;
2) Causam ansiedade porque as ideias são muito diferentes das suas crenças e
valores pessoais;
3) Exemplo: pessoa muito religiosa tem pensamentos blasfémicos.

É diferente das ideias delirantes que são egossintónicas, ou seja, vão de acordo com
o querer e vontade do doente, são “de dentro do doente”, este está em harmonia com
as mesmas, não há resistência, pelo que não criam ansiedade.

Outra diferença é que as ideias obsessivas normalmente acompanham-se de insight,


ou seja, o doente mantém auto-crítica em relação ao caráter patológico deste problema,
enquanto nas ideias delirantes não se mantém esta autocrítica.

Podemos confundir as imagens obsessivas com pseudoalucinações visuais.

Agora a compulsão é visto como uma forma de aliviar a obsessão:


1) Tentam diminuir a carga de ansiedade das ideias obsessivas mas, na maioria
das vezes, não são eficazes neste processo;
2) Não são adequados em relação à realidade, são fora do normal.

Exemplo: verificar se a fechadura ficou trancada várias vezes, lavar persistentemente


as mãos, recitar orações.

As perturbações obsessivas-compulsivas excedem os limites da normalidade em


termos de período de instalação ou adequação.

142
Alguns exemplos de obsessões/compulsões típicos:

OBSESSÕES COMPULSÕES
Contaminação Limpeza
Simetria Repetição, padrão, organização
Agressiva, sexual, espiritual Compulsão relacionada
Ferimentos (a si ou aos outros) Verificação relacionadas
Doenças Desinfecção
Filosóficas Astro vai embater na terra

Modelo da POC

1) Uma pessoa tem uma obsessão que reconhece como patológica;


2) Passa por um processo de avaliação onde existe uma validação interna por parte
do indivíduo (“não, esta ideia é descabida, não faz sentido ou esta ideia não faz
sentido mas não consigo parar de pensar nela”);
3) Caso não consiga “resolver” esta ideia, então passa para a
neutralização/compulsão com medidas que tentam aligeirar a obsessão que este
doente sente, ou seja, vamos tentar executar alguma tarefa que vá de encontro
à ideia obsessiva que tenho de forma a “acalmá-la”.
4) A compulsão torna-se ineficaz na resolução da ideia obsessiva, pelo que há um
retorno à mesma.

No entanto, a compulsão vai, no fundo, acabar por agravar a obsessão e por a


potenciar, pelo que andamos num ciclo vicioso.

➔ Estado de humor

Este processo e a resistência dos doentes com POC vai ser dependente do estado
de ânimo/humor: um doente com depressão vai resistir menos às
obsessões/compulsões e vai ser mais afetado por estas. O mesmo acontece quando o
doente está mais cansado, perde “forças” para resistir às obsessões, havendo
agravamento da patologia.

143
Prevalência
Apenas 2 a 3% da população (há estudos que dizem estar a aumentar);

Início dos sintomas entre os 20 e 22 anos de idade;

Cerca de 50% dos doentes podem não ter compulsões, apenas obsessões;

50 a 70% dos casos está relacionado com um evento stressor (morte de um familiar,
rotura afetiva)

Evolução/Prognóstico
20-30% melhora bastante os sintomas
40-50% melhora ligeiramente os sintomas
20-40% mantém/agrava os sintomas.

É difícil fazer a avaliação da repercussão funcional nos doentes pelo seu cargo
diferenciado na sociedade, ou seja, é mais fácil perceber o sofrimento subjetivo do que
as repercussões funcionais.

Estes doentes são, normalmente, pessoas muito diferenciadas, com cargos e


trabalhos “destacados” na sociedade. Assim, este prognóstico prende-se mais com o
sofrimento subjetivo do doente e não tanto com a incapacidade funcional/social do
doente porque esta última está mantida. O doente sofre mas mantém-se
funcional/social.

Ideação suicida → 50% dos doentes com POC;

Tentativa suicida → 25% dos doentes com POC.

Causalidade
Biológico Neuroimagem Genético Comportamental
Desregulação da Alterações: Difícil perceber o que é genético Pode haver
transmissão - Córtex órbito- e o que foi aprendido ao longo aprendizagem de
serotoninérgica (tanto frontal; da vida. comportamentos POC
que parte da terapêutica - Núcleo caudado; Monozigóticos >> Dizigóticos com familiares atingidos
se faz com SSRI)! - Tálamo Aumento do risco em 35% se pela doença.
familiar de 1º grau atingido

Se tiver familiar que tem POC pode, então, haver uma aprendizagem destes
comportamentos e, aí, torna-se difícil perceber se será, ou não, genético.

144
Personalidade Pré-Mórbida
Poderemos ter, também:

Personalidade pré-mórbida: personalidade do doente pode aumentar o risco de


desenvolver POC:

➔ Perfeccionista;
➔ Necessidade de controlo permanente;
➔ Necessidade de realização de listas;
➔ Rigor com horas e rotinas.

No entanto, a maior parte dos doentes com POC não tem personalidade pré-
mórbida.

Diagnóstico Diferencial
- Perturbação de Ansiedade;

- Perturbação Depressiva Major;

- Perturbações do Comportamento Alimentar;

- Perturbação de Tiques.

Terapêutica
É das doenças psiquiátricas mais difíceis de tratar.

145
1) Psicofarmacologia
1ª linha: SSRI
→ Paroxetina (cuidado porque pode aumentar o peso!),
→ Fluvoxamina (inibidor da recaptação de serotonina e agonista do recetor
sigma 1 (recetor opióide));

2ª linha: Antidepressivo tricíclico

→ clomipramina.

Os antidepressivos devem-se fazer em doses maiores do que as doses feitas


num episódio depressivo.

Se nada disto funcionar, podemos juntar um antipsicótico atípico de baixa dose:

→ Risperidona.

2) Psicoterapêutico
Terapia cognitivo-comportamental.

1º passo: Psicoeducação:
- Explicação de que apenas 2% das pessoas não consegue controlar;
- Retirar a culpa;
- Pensar no “camelo”;
- Introduzir o conceito de compulsões e a necessidade de as controlar;

2º Simular situações onde esteja expressa a ideia obsessiva para treinar o


controlo sobre as compulsões;
3º Ensinar estratégias de Coping;
4º Estimular o bloqueio de pensamento;
5º Dessensibilização.

Devemos afirmar que em cerca de 99% das pessoas podem existir pensamentos
intrusivos que sejam desagradáveis para o doente mas que apenas 2% deles não os
conseguem expulsar da cabeça/mente. O objetivo do tratamento não é expulsar as
ideias obsessivas mas sim fazer com que o doente mude a atitude perante estas ideias
obsessivas, promover a avaliação (naquele esquema de obsessão, avaliação e
neutralização) e afastar aquela ideia.

Para reduzir a culpabilidade das ideias obsessivas nos doentes devemos explicar
que o conteúdo é sempre desagradável e vai contra aquilo que os doentes acreditam e
naquilo que é mais importante para eles.

Explicar, também, que as ideias são involuntárias.

146
➔ Utilizar o pensamento do camelo: pedir para pensar num camelo durante 2
minutos. Depois, digo para parar de pensar no camelo. A pessoa vai dizer que
não consegue, que é involuntário. Nós temos de compreender e, efetivamente,
demonstrar que seria voluntário este pensamento.

Explicar o papel das compulsões na diminuição da ansiedade causada pelas


obsessões. Isto apenas numa situação inicial, porque a médio prazo a ansiedade vai
aumentar. Devemos explicar o porquê de controlar as compulsões, ou seja, numa fase
inicial vai haver um aumento da ansiedade que o doente deverá resistir (com
ferramentas que nós enquanto médicos vamos ensinar para lidar com a ansiedade,
estratégias de coping) para que, a longo prazo, a ansiedade vá diminuindo aos poucos.

2º passo: o doente deverá expor-se a situações ansiogénicas que estimulem a obsessão


para tentar controlar a compulsão. (quase uma terapia de choque).

3º passo: paragem do pensamento, devemos ensinar os doentes a fazer isto para

impedir a obsessão.

4º passo: distração (atividades físicas ou prazerosas);

5º passo: terapia paradoxal (se obrigarmos a pensar nas obsessões elas desaparecem);

6º passo: Dessensibilização (gravar a obsessão e ouvi-la repetidamente).

147
FOBIA SIMPLES / ESPECÍFICA
Medo/ansiedade marcados em relação a um objeto ou situação específicos, pelo
DSM-V.

Prevalência é mais alta nas mulheres 14.45-15.7% (15%) do que nos homens 6.7-
7-75% (7%).

Ambiental Tempestade, água, alturas


Sangue/infecções/ferimentos Ver sangue, procedimentos cirúrgicos, injecções
Situacional Espaços fechados, elevador, aviões

O que se pensa que acontece é o condicionamento clássico.

Há uma associação entre um estímulo aversivo (ser mordido) com um estímulo


neutro (ver um cão).

Assim, a pessoa começa a ter uma atitude de evitamento (foge de cães) para não
ser mordida.

O medo começa a ser reforçado pelo evitamento.

TRATAMENTO
Psicofarmacológico Psicoterapia
1º BZD em fase aguda Terapia de exposição
2º SSRI mais tardiamente Psicoterapia cognitivo-comportamental

O tratamento é a exposição repetida, fazendo uma exposição gradual e progressiva,


de forma a mostrar-mos que a probabilidade de perigo numa situação é reduzida, até
que a pessoa perde o “medo” dessa mesma situação.

Ex: Fobia a cães. 1º mostra-se um cão de peluche. 2º mostra-se um cão dócil. 3º


pede-se para dar festas a um cão dócil. 4º pede-se para passear entre cães.

Temos de ensinar estratégias para lidar com a ansiedade presente nestes primeiros
encontros com o objeto/situação de fobia.

148
Perturbação Dismórfica Corporal
O indivíduo tem uma preocupação excessiva em relação a uma ou mais
componentes do próprio corpo que não considera perfeitos (são falhas) e que, pelos
outros, ou não são percebidas ou são consideradas irrelevantes. Neste seguimento, o
doente tem comportamentos repetitivos e atos mentais em função da preocupação da
aparência.

Perturbação de Acumulação
Indivíduos que acumulam muitos bens, independentemente do valor real ou
emocional, pela ansiedade de separação dos mesmos.

Tricotilomanía e Perturbação de Escoriação


Tricotilomania – doente que puxa o cabelo;

Perturbação de Escoriação – doente que puxa a pele.

Estes doentes não têm uma ideia obsessiva corporal por detrás destas
perturbações mas podem ter um quadro de ansiedade ou de tédio que motiva a
realização destes comportamentos.

Pode ser baseado em duas questões:

1) Focada no comportamento (com tensão anterior e alívio subsequente);


2) Comportamento automático (realizado quase sem pensar).

149
9. Perturbações do comportamento alimentar
No DSM-V houve uma alteração em relação às perturbações do
comportamento alimentar.

Outra situação que motivou a alteração dos critérios do DSM-V foi o número
exagerado de doentes que caia na definição de perturbações do comportamento
alimentar sem outras especificações, principalmente nos países onde a saúde é muito
manipulada pelos seguros.

Dividimos as perturbações de comportamento alimentar em:

Vamos ver melhor a Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa e Perturbação de


Ingestão Compulsiva porque são as mais prevalentes.

150
Pica
Ocorre com frequência em grávidas, são os “desejos das grávidas”,
nomeadamente por substâncias não alimentares, como terra, barro, ferro.

Critérios de diagnóstico:

Patologias associadas

1) Debilidade mental;
2) Perturbações do espetro autista;
3) Esquizofrenia.

Epidemiologia

- Igual nos dois sexos (homens = mulheres);

- Começa na infância (> 2 anos) ou na adolescência

Complicações físicas

- Desnutrição: não muito frequente porque não há evitamento da ingestão


alimentar;

- Obstrução intestinal (por ingerir patologias como pregos, pedaços de vidro etc).

Perturbações de Ruminação
Critérios de diagnóstico

151
Patologias associadas

- Debilidade Mental;

- Perturbação de Ansiedade Generalizada.

Epidemiologia

Não se conhece bem, acredita-se que possa ser:

- Iguais entre os 2 sexos;

- Em qualquer faixa etária.

Complicação física: Desnutrição.

Perturbação de Evitamento / Restrição de Ingestão Alimentar


Grave porque pode levar à morte.

Critérios de diagnóstico:

Faz diagnóstico diferencial com a anorexia:

152
Epidemiologia

- Não se conhece bem a prevalência entre os sexos (deverá ser igual nos 2);

- Não se conhece bem a faixa etária (deverá ser desde novo como na PICA).

Complicações físicas: desnutrição grave ou morte.

Outras
Definição Critérios Epidemiologia Complicações
patologias
Pica A. Ingestão persistente de substâncias não Debilidade Igual entre sexos Desnutrição
alimentares e não nutritivas (> 1 mês); Mental Inicia na infância, (raro)
B. Compromete o desenvolvimento; Perturbação > 2 anos Oclusão
C. Não associado a rituais de cultura ou do espetro do Grávidas! intestinal
socialmente aceites; autismo
D. Se ocorrer no contexto de outra Esquizofrenia
patologia psiquiátrica então deverá ser
evidente o suficiente para ser
diagnosticado

Perturbação de A. Regurgitação repetida (>1 mês), onde o Debilidade Não se sabe a Desnutrição
Ruminação conteúdo pode ser re-mastigado, re- Mental prevalência entre
engolido ou cuspido; Perturbação os sexos.
B. Não se associa a outra patologia física; da Ansiedade Pode acontecer
C. Não se associa a outra PCA; Generalizada em qualquer
D. Se ocorrer outra perturbação mental, idade
então deverá ser evidente o suficiente
para ser diagnosticado.

Perturbação de A. Perda de interesse pela alimentação. Não se sabe a Desnutrição


Evitamento ou - Perda de peso diferença entre grave
de Restrição de - Desnutrição homens e Morte
ingestão - Suplementos alimentares ou mulheres.
alimentar alimentação entérica Começa na
- alteração do funcionamento infância e pode
psicoccosial prolongar para o
B. Não é explicada por falta de alimentos ou adulto.
restrição cultural;
C. Não ocorre com outra perturbação de
comportamento alimentar.
D. Não tem relação com patologia física ou
psiquiátrica.

153
Anorexia Nervosa
Os principais critérios são (3)

Nota que nestes doentes não há anorexia (perda de apetite) mas sim restrição
da ingestão alimentar, os doentes passam fome.

Na questão da perversão da própria imagem corporal e do seu peso o doente


pode achar-se globalmente gordo ou gordo em regiões específicas do seu corpo. Por
outro lado, pode achar-se magro mas querer continuar a perder peso.

Os doentes sentem que:

1) Perder peso → episódio fantástico, demonstração de auto-controlo e


superação;
2) Ganhar peso → episódio terrível, demonstração de perda de controlo e
fracasso.

Temos de indicar os subtipos que existem:

Além disso, podemos falar em remissão:

154
Especificar a severidade da doença:

1) IMC > 17kg/m2 → Leve;


2) 16 < IMC < 16,99 kg/m2 → Moderada;
3) 15 < IMC < 15,99 kg/m2 → Grave;
4) IMC < 15 kg/m2 → Extrema.

Nas crianças o que se faz é ver se a criança tem um peso < ao percentil 5 para a
idade e sexo.

Perturbações associadas

1) Sintomatologia depressiva (desde perturbação distímica até perturbação depressiva


major);
2) Traços obsessivos-compulsivos da personalidade → eventual POC.
(mais frequente no tipo restritivo).

Estes traços obsessivos são importantes porque permitem que o doente resista
e lute contra o instinto da fome.

Estes doentes podem ter mesmo perturbação obsessivo-compulsiva sendo que


esta obsessão tem de ser em termos de ideias obsessivas que extravasam o tema das
ideias de conteúdo alimentar (como ideias obsessivas de contaminação).

Epidemiologia

- 10 mulheres : 1 homem;

- Pico aos 14 anos e aos 16 anos;

- Estigma da doença no homem → atrasa o diagnóstico → pior prognóstico.

- Prevalência mundial : 1% nas mulheres entre 14 e 40 anos;

- Incidência está mantida nos últimos anos.

- Doença antiga e que ocorre no mundo inteiro.

Etiologia

- Predominantemente genética e pouco ambiental (porque está no mundo


inteiro).

155
Evolução

A anorexia nervosa inicia-se, quase sempre, com uma dieta, que se instala e
persiste no tempo.

É frequentemente difícil os doentes procurarem ajuda médica, a ajuda médica


tem oposição por parte do doente (é estimulada por outras pessoas, como pela família).

Assim, os doentes têm dificuldade em cooperar com os médicos na 1ª consulta.

O diagnóstico é, atualmente, feito muito rapidamente porque:

1) As alterações físicas são notórias (é facilmente identificado);


2) Os médicos estão mais cientes desta realidade e diagnosticam com > facilidade.

A anorexia nervosa tem evoluções muito diferentes:

Não há definição em termos de tempo, mas para termos uma cronicidade implica
já termos tentado fazer algum tratamento. Se o doente aparecer lá com sintomas há 3
anos não é crónica porque ainda não se tentou fazer o tratamento.

Padrões familiares

- Perturbação de comportamento familiar;

- Perturbação de humor (unipolar ou bipolar).

Complicações físicas:

- São, principalmente, consequência da desnutrição:

Paragem de crescimento

Amenorreia

Pele seca, queda de cabelo, lanugo (penugem do recém nascido)

Intolerância ao frio

Falência cardíaca

Morte eventual

156
Osteoporose → importante porque mesmo com a recuperação do peso podemos
não conseguir resolver este problema. A osteoporose não tem um tratamento eficaz,
pelo que o doente deverá ter o menor tempo possível em anorexia.

Se for uma anorexia do tipo purgativo, as complicações são semelhantes às da


bulimia nervosa.

Complicações psicológicas

Se a anorexia nervosa estiver muito desenvolvida, podem surgir alterações de:

1) Atenção: Hipoprosexia;
2) Humor: humor depressivo, irritabilidade;
3) Vontade: Abolia;
4) Vida instintiva: insónias, diminuição da líbido.

Tratamento

Na maioria dos casos é em ambulatório, o internamento é apenas em condições


específicas, apesar de ser mais frequente do que na bulimia.

Os principais objetivos são:

O tratamento pode ser farmacológico ou psicoterapêutico (ou ambos):

1) Farmacológico – não há, até à atualidade, nenhum fármaco.

O que podemos fazer:

a) Medicar com Fluoxetina (SSRI);


b) Tratar as comorbilidades, se existirem:
i. Depressão – SSRI;
ii. POC – SSRI ou ADT em dose maior do que para a depressão.
c) Medicar com antipsicótico de 2ª Geração (para acalmar o doente e levá-lo a
gastar menos energia e, desta forma, impedir o consumo calórico).

157
2) Psicoterapia
A. Terapia cognitivo comportamental individual ou de grupo;
B. Psicoterapia de orientação clínica
i. é utilizada com alguma frequência.
ii. Esta psicoterapia não pode ser ortodoxa, as doentes têm de ser
pesadas e monitorizadas, muitas vezes tem de ser utilizada uma
terapia cognitivo comportamental;
C. Terapia familiar
i. é a mais eficaz em doentes com menos de 18 anos!
ii. Mas pode-se fazer com idade superior.

Na consulta o que se faz é uma mistura das várias terapias, nomeadamente cognitivo
comportamental, de orientação clínica e familiar e é desta “mistura” que resulta a melhor
terapêutica para os doentes.

3) Internamento

É raro mas mais frequente do que na Bulimia Nervosa, se cumprirem os critérios:

A. IMC < 13 → não é um critério absoluto.


B. Sem melhoria com tratamento ambulatório;
C. Conflitos familiares graves.

O objetivo do tratamento será sempre aumentar o peso (até 2Kg/semana), sendo


que ficam submetidos a um plano onde:

1) Não podem receber visitas nem comida do exterior;


2) Psicoterapia 2x / semana;
3) Terapia familiar 1x/semana.

Bulimia Nervosa
Critérios de diagnóstico

158
Critério A → Episódio de compulsão alimentar;

Critério B → Episódio de mecanismos compensatórios inapropriados;

Critério C → temporalidade;

Critério D → autoavaliação negativa;

Critério E → exclusão de anorexia nervosa.

Nota que uma diferença entre a anorexia nervosa e a bulimia nervosa é que, na
Bulimia, não há necessidade de ter baixo peso como acontece na anorexia, é uma das
principais diferenças!

Temos 2 subtipos:

- Purgativo : vómito, laxante, enemas, diuréticos

- Não purgativo : exercício físico, jejum

Em termos de remissão:

Além disso, conseguimos medir a severidade:

1) Leve: 1 a 3 episódios por semana;


2) Moderada: 4 a 7 episódios por semana;
3) Severa: 8 a 13 episódios por semana;
4) Extrema: > 14 episódios por semana.

Patologias associadas

- Perturbação depressiva;

- Perturbação da personalidade (cerca de ½ a 1/3 dos doentes com Bulimia)

- Consumo de outras substâncias (cerca de 1/3 dos doentes com Bulimia);

Estas perturbações são mais frequentes no tipo purgativo.

159
Epidemiologia

- 10 mulheres : 1 homem;

- Pico de idade > 18 anos;

- População mundial entre 1 a 3% das mulheres entre 14 a 40 anos;

- Incidência está a aumentar;

- Mais prevalente nos países industrializados;

- Doença mais recente.

Etiologia

- Fatores ambientais > fatores genéticos (porque tem diferentes incidências no mundo).

Evolução

Como na anorexia, também se iniciam após uma dieta.

O diagnóstico é mais tardio porque é mais fácil esconder a patologia, ou seja, ao


contrário da anorexia, não há tantas repercussões físicas que denunciem a patologia,
podem passar muito tempo até ser encontrado pela família/amigos.

Padrão familiar

- Perturbação de Comportamento Alimentar;

- Perturbação de Humor;

- Abuso/Consumo de substâncias;

- Obesidade.

160
Bulimia multi-impulsiva (CATS C RM)

Muito grave, onde temos, para além do comportamento bulímico:

- Automutilação e tentativa suicida;

- Consumo de tóxicos;

- Roubos;

- Múltiplos parceiros.

Complicações físicas

São, principalmente, consequência dos vómitos:

. Perda de esmalte dentário;

. Ingurgitamento das glândulas salivares

. Sinal de Russel (lesões nos nós dos dedos por vómitos repetidos);

. Irregularidades menstruais

. Esofagite / sintomas de refluxo

Perturbações hidro-eletrolíticas (hipocaliemias graves)

. Arritmias cardíacas (pelas hipocaliemias)

Como se devem aos vómitos, são mais frequentes em doentes com tipo
purgativo.

Tratamento

Como o da anorexia, é um tratamento predominantemente ambulatório.

O tratamento pode ser farmacológico ou psicoterapêutico.

1. Farmacológico:

a) Medicar com Fluoxetina (em doses superiores à utilizada na depressão), vai


reduzir as crises de voracidade alimentar e as manobras compensatórias de ingestão
alimentar compulsiva.

b) Medicar com Topiramato.

161
2. Psicoterapêutico
a) Psicoterapia cognitivo-comportamental individual / grupo;
b) Psicoterapia de orientação clínica;
c) Psicoterapia familiar;
d) Auto-ajuda;
e) Aconselhamento nutricional.

A melhor terapêutica é a junção do tratamento farmacológico com a psicoterapia


cognitivo comportamental (efeito sinérgico).

3. Internamento

Mais raro ainda do que na Anorexia, deve ser feito quando temos:

- Ideação suicida ou tentativa de suicídio;

- Episódios bulímicos frequentes e sem melhoria no ambulatório;

- Conflitos familiares graves.

6. Perturbação de Ingestão Compulsiva


É frequente, é a entrada da obesidade nas PCA. Semelhante à Bulimia Nervosa
mas sem comportamentos alimentares compensatórios. Muitas vezes cursa com
obesidade.

Caraterísticas diagnósticas:

A. Episódios recorrentes de ingestão alimentar compulsiva;


B. Acompanhada de sentimentos de perda de controlo, de culpa, de nojo e de
vergonha;
C. Provocam sofrimento e ocorrem, pelo menos, 1 vez por semana durante 3
meses.

➔ Tratamento: semelhante ao da Bulimia Nervosa.

Perturbação de comportamento alimentar sem outras especificações


Quando não preenchem critérios completos para uma perturbação de
comportamento alimentar específica.

162
Anorexia Nervosa VS. Bulimia Nervosa
ANOREXIA NERVOSA BULIMINA NERVOSA

A. Restrição da ingestão alimentar com perda de A. Episódios de ingestão alimentar compulsiva


peso; (grande ingestão + falta de controlo);
B. Medo intenso de ganhar peso ou engordar; B. Existência de mecanismos compensatórios
C. Perversão da imagem corporal e do próprio inapropriados;
CRITÉRIOS peso. C. Ocorrência de 1x por semana durante 3 meses;
D. Autoavaliação impossível pela alteração da
percepção do corpo;
E. Não acontecem exclusivamente durante
episódios de anorexia.
- Restritivo (exercício físico, jejum, restrição - Purgativo (vómitos, diuréticos, enemas, laxantes);
SUBTIPOS alimentar); - Não purgativo (exercício físico, jejum, restrição
- Purgativo (vómitos, diuréticos, enemas, laxantes) alimentar).
IMC > 17kg/m2 – Leve Episódios compensatórios inapropriados:
16<IMC<17 kg/m2 – Moderado 1 a 3 – Leve;
GRAUS DE
15 < IMC < 16 kg/m2- Grave 4 a 7 – Moderado;
SEVERIDADE
IMC < 15 kg/m2 – Extremo 8 a 13 – Grave;
>14 – Severo.
- 1% nas mulheres entre 14 a 40 anos - 1 a 3% nas mulheres entre 14 a 40 anos
- 10 mulheres : 1 homem - 10 mulheres : 1 homem
EPIDEMIOLOGIA
- 2 picos: aos 14 e aos 16 anos - Pico > 18 anos
- Prevalência estável - Prevalência a aumentar
Fatores genéticos > fatores ambientais Fatores ambientais > fatores genéticos
ETIOLOGIA

- Sintomatologia Depressiva (desde distímica até - Perturbação Depressiva


COMORBILIDADES perturbação depressiva major) - Perturbação de consumo de substância
- POC - Perturbação de Personalidade
- Perturbação de Comportamento Alimentar - Perturbação de Comportamento Alimentar
PADRÃO - Perturbação de Humor - Perturbação de Humor
FAMILIAR - Perturbação de Consumo
- Obesidade
Paragem de crescimento, cabelo e unhas Ingurgitamento das glândulas salivares, perda de
MANIFESTAÇÕES quebradiças, pele seca, lanugo, falência cardíaca, esmalte, sinal de russel, alterações
CLÍNICAS morte, OSTEOPOROSE hidroeletrolíticas, alterações cardíacas

1ª linha – Fluoxetina 1ª linha – Fluoxetina


2ª linha – Tratar comorbilidades (Depressão ou 2ª linha – Topiramato
POC) - Psicoterapia CC individual ou de grupo
3ª linha – Risperidona (acalmar e diminuir perda de - Psicoterapia de orientação clínica
TRATAMENTO
energia) - Terapia familiar
- Psicoterapia CC individual ou de grupo - Auto-ajuda
- Psicoterapia de orientação clínica - Aconselhamento nutricional
- Terapia familiar
Raro mas mais frequente que na Bulimia. Raro.
INTERNAMENTO IMC <13, problemas familiares graves, tratamento Tentativa de suicídio, problemas familiares graves,
em ambulatório insuficiente tratamento em ambulatório insuficiente

163
CASO CLÍNICO DA AULA

Mulher de 39 anos que começou com a doença aos 12 anos. Aos 12 anos tinha
um peso normal/baixo, começou com dieta restritiva às gorduras, depois aos
doces/hidratos de carbono em geral, depois restringiu aos alimentos saudáveis.
Restringiu a 1 ou 2 maças e legumes (por dia).

Começou a ser seguida pelos 13 anos. Fez um programa de tratamento, onde


teve melhoria do quadro clínico pelos 15/16 anos. Essa melhoria clínica fez que com que
tivesse um IMC de 18, 18,5kg/m2. (18 ainda não é normal!). Aos 22 anos dela, o irmão
morreu de Leucemia. A seguir a isto o quadro instala-se novamente, com exercício físico
intenso e alimentação restrita (anorexia tipo restritivo). Como não vomitava nem usava
laxantes, não era purgativo. Transferiu-se com os pais para Castelo Branco, acordava
muito cedo para ir dar voltas à Quinta. Começou a acordar às 4h da manhã sem tomar
o pequeno almoço, andava umas 3h e só depois voltava para almoçar.

Na sequência disto começou com dores na coluna, fez densitometria e


ressonância e percebeu que tinha osteoporose gravíssima e a coluna estava em risco de
poder seccionar a medula. Durante o percurso da patologia a doente perdeu 10 cm de
altura. A proposta era ir para os EUA para ser operada. No período em EUA perdeu mais
uns 6/7kg. Assim, quando regressou foi internada de urgência no Hospital de Castelo
Branco. Assim, acabou por ser transferida para o HSM, nos seus 25/26 anos. Entrou
com apenas 20kg para 1m48. Chegou ainda a perder peso até 19,5kg. Muitas vezes foi
encontrada na WC à noite a fazer exercício físico, ela não recorda (falhas de memória)
neste período. Foi tendo um internamento intermitente entre ir melhorando e ir piorando.

Alguns dos internamentos eram a pedidos próprios, desta vez acabou por ficar
com 41kg (apesar de ter entrado em 38kg).

A doente tinha ficado sem menstruação (desde os 16) e voltou a ter menstruação
lá pelos 25/26 anos.

A terapia cognitivo comportamental assenta na doença, é muito útil no


comportamento da pessoa e nas ideias deste, enquanto a psicodinâmica é que assenta
nos problemas do passado. Trata, assim, a parte das cognições e do comportamento.

Por exemplo uma ideia que podemos trabalhar é a ideia de que, se fizer dieta X,
vai aumentar 0,5kg por semana. Assim, o doente tem medo de aumentar 0,5kg por
semana todas as semanas da vida e é uma ideia errada.

Para tratar uma anorexia é alterar o comportamento, neste caso trata-se


comendo, o doente não vai melhorar apenas por mudar a mentalidade, o doente tem
que, efetivamente, comer.

Apesar de ser pouco lógico, se um doente tiver a 20kg do peso ideal o doente
vai ter maior dificuldade em aumentar o peso do que se o doente tiver a 2kg do peso

164
ideal do doente, porque o doente com 20kg a menos está mais doente do que o doente
com 2kg a menos, pelo que o primeiro será mais difícil de tratar.

A terapia familiar é a terapia que, de forma isolada, trata melhor a Anorexia. A


terapia familiar passa muito por capacitar os pais e, neste caso em particular, a morte do
irmão, tentaram “tratar” essa questão também.

Podemos fazer SSRI’s e antipsicóticos de 2ª geração.

CASO CLÍNICO 2 DA AULA

Homem de 22 anos que iniciou a doença pelos 20 anos. Fez o 12º ano mas não
continuou os estudos. Aos 20 anos desejou ser modelo. Começou com uma
preocupação crescente em ser magro, em ser modelo. Começou a fazer dieta e a treinar
no ginásio.

Fez um período restritivo, no qual perdeu algum peso. Por outro lado tinha
episódios de voracidade alimentar com ingestão compulsiva de alimentos num curto
período de tempo. Normalmente são ingeridos de modo descabido (abrupto e sôfrego),
fá-lo sozinho porque o doente tem vergonha de mostrar isto a outras pessoas. Durante
estas crises a pessoa fica como abstraída/alheada do mundo à volta.

Na sequência disto o doente sentia uma enorme culpa, ia-se deitar e acabava por
adormecer. NO dia seguinte ficava 1 dia inteiro no ginásio. Durante estes períodos mal
comia. Os episódios tornaram-se, cada vez, mais frequentes.

Pedimos várias análises em termos de ferro, vitamina B12 mas, principalmente,


potássio e eletrólitos para ver se teria alterações.

Poderia ter uma Bulimia Nervosa do tipo não purgativo (o doente não vomitava
nem utilizava laxantes nem enemas). É mais frequente acontecer, principalmente, em
mulheres e não em homens.

165
10. Perturbações orgânicas: demência e delirium

Demências são caraterizadas pelo aparecimento “de novo” de alterações cognitivas


numa pessoa que não as tinha antes (o que exclui a debilidade mental).

Perturbação Neurocognitiva Major/Demência

O DSM-V utiliza o termo Perturbação Neurocognitiva Major, de onde se destacam


os seguintes critérios:

A demência corresponde a um quadro sindromático onde existe uma disfunção


cognitiva, que pode ter inúmeras causas:

Doença de Alzheimer Demência Vascular Demência mista Hipóxia decorrente de Hematoma subdural
(alzheimer e vascular) hipoperfusão crónico
Demência fronto- Degenerescência Demência da Doença Demência dos Corpos Doença de Huntington
temporal córtico basal de Parkinson de Lewy
A Demência de Alzheimer é a mais frequente, sendo a Demência vascular a 2ª.

Algumas das demências são reversíveis, são estas que temos de procurar!

166
A instalação da demência é uma questão progressiva, ou seja, é uma coisa que
vai acontecendo aos poucos na vida do doente, lentamente, pelo que a função cognitiva
vai deteriorando aos poucos até atingir o estado de demência.

Doente normal → Doente com disfunção cognitiva ligeira → Demência

Perturbação neurocognitiva minor


Quando temos alterações cognitivas mas não as suficientes para considerarmos
demência. Esta é conhecida como Perturbação Neurocognitiva Minor, de onde se
destacam os critérios:

Assim, a principal alteração vai ser em relação ao efeito que a disfunção cognitiva
tem na vida diária:

Percebemos que a diferença entre os 2 é, então, clínica!

As causas de disfunção cognitiva ligeira são as mesmas de demência. Ou seja, a


Doença de Alzheimer pode-se traduzir numa perturbação neurocognitiva minor ou
major.

167
DOENÇA DE ALZHEIMER
O diagnóstico definitivo da DA é histológico, onde podemos encontrar:

1) Placas Senis

Fragmentação das dendrites dos neurónios na substância cinzenta, juntamente com


microglia e astrócitos.

As placas mais antigas podem ter a deposição de beta-amilóide.

As placas senis coram com vermelho do Congo.

Começam por se acumular ao nível do hipocampo, progredindo para o lobo temporal,


depois lobo frontal, normalmente poupando o lobo occipital.

2) Novelos

Resultam de proteínas anormalmente fosforiladas, junto do corpo celular do


neurónio. Resultam da proliferação intracitoplasmática de filamentos torcidos.

Normalmente encontram-se nas células piramidais do hipocampo e córtex cerebral,


coram com HE. Pensa-se que estas tranças possam traduzir a morte neuronal.

Na Doença de Alzheimer, a principal causa de demência, começa por volta dos 65


anos, de forma insidiosa e progressiva, com demência cortical tipo temporal.

A proteína amiloide beta é sintetizada sobre a forma de um percursor de maiores


dimensões, o APP (proteína percursora de amiloide). O APP é uma proteína
transmembranar, que pode ser clivada por várias enzimas: beta secretase, alfa secretase
e gama secretase.

Beta secretase + gama secretase → Proteína Beta Amilóide;

Alfa secretase → Proteínas não amiloidogénicas.

168
Os fragmentos clivados pela alfa secretase não possuem uma função bem
definida, mas acredita-se que possam estar relacionados com:

1) Funções tróficas sobre neurónios em cultura;


2) Regulação da sinaptogénese;
3) Homeostase do Ca intra-neuronal;
4) Proteção dos neurónios do hipocampo dos defeitos tóxicos do glutamato e do
beta amilóide.

Os fragmentos beta amiloides vão-se agregar e acabar por originar as placas senis
(vários aspetos fisicoquímicos).

“Ao impedirmos a agregação destes fragmentos poderemos ter melhorias no


quadro da demência. “

A principal queixa é a perda de memória (início insidioso, progressivo), sendo que o


impacto que isto tem no doente e a valorização deste é importante:

Na Doença de Alzheimer temos morte dos neurónios colinérgicos e


degenerescência do núcleo basal de Meynert.

169
Diagnóstico de Perturbação Neurocognitiva Minor por Doença de Alzheimer

Temos de ter os critérios de disfunção cognitiva e a estes excluir importantes causas


que não Doença de Alzheimer (DA):

1) Presença de disfunção cognitiva, em relação ao passado do doente, verificada


pelo próprio, pessoa informada ou médico ou, ainda, quantificada sobre a forma
de testes neuropsiquiátricos ou outros;
2) Não pode haver afeção da vida diária do doente;
3) Não pode haver delírio;
4) Excluir causas como demência vascular, traumática, iatrogénica;
5) Mostrar uma disfunção cognitiva longitudinal no tempo;
6) Reportar história consistente com fatores genéticos para DA, se possível.

Doenças genéticas

Testes genéticos, devemos pedir ou não?

Não há testes genéticos que nos digam se o doente tem a doença ou não.

Há genes que, quando mutados, podem aumentar o risco de desenvolver (como


o gene APOE) mas, novamente, não há mutações genéticas mendelianas que nos digam
que o doente A, B ou C vai ter DA.

Alelo épsilon 4 da APOE confere maior risco de desenvolver DA.

Existem mutações (embora que


raras) nos genes da proteína percursora de
amiloide (APP) que pode, efetivamente,
estar relacionada com o aparecimento da
DA. Ou seja, nestes casos, a mutação
neste gene vai conferir DA. São doenças
raras e começam numa idade precoce. Mas
é pouco provável que se encontra na
prática clínica corrente.

Abordagem ao doente com disfunção cognitiva ligeira

1º Fazer o diagnóstico diferencial entre o envelhecimento normal e as demências;

2º Devemos excluir causas tratáveis (análises laboratoriais!);

3º Estabelecer um padrão compatível com DA;

Isto consegue-se através da HC, do EO, do pedido de análises laboratoriais e


métodos de imagem.

170
Objetivação do defeito

Há várias etapas para quantificar o defeito:

1º Passo:

2º Passo:

Avaliação neuropsicológica formal, sendo que aqui podem existir dúvidas em


relação ao diagnóstico (será apenas 1, 1,5 ou 2 desvios padrão em relação à média?).

A avaliação neuropsicológica consiste em fazer vários testes, cada um a incidir


numa área cerebral específica.

3º Passo:

Os testes de memória são os mais apropriados para avaliar um doente com


defeito cognitivo ligeiro em DA, uma vez que as perdas de memória são o principal
sintoma destes doentes.

4º Passo:

Vitamina B12, Ácido Fólico, VDLR, T3/T4 e, provavelmente, HIV, isto porque
estas causas são corrigíveis e podem disfarçar uma demência.

Imagiologia

Devemos, ainda assim, fazer exclusão de patologias cerebrais por meio de:

-TC ;

- RM.

171
Exemplos:

Atrofias cerebrais assimétricas


AVC isquémico da região talâmica Demência vascular (típico nas demências fronto-
temporais)
Meningioma Hidrocefalia de pressão normal

As alterações em imagem típicas de doença de alzheimer são as atrofias


bilaterais e simétricas do hipocampo.

Biomarcadores

O diagnóstico definitivo da doença de Alzheimer é dada pela análise anatomo-


patológica com as placas senies e os novelos neurofibrilares.

Assim, como não seria suportável andarmos a fazer biópsias a torto e a direito
nos doentes, uma vez que não oferecemos cura a estes, arranjamos biomarcadores que
nos permitem aferir a instalação da doença, anos antes do início da manifestação de
sintomas.

Podemos ter:

Biomarcadores de deposição Biomarcadores de lesão Alterações bioquímicas


de proteína beta amiloide neuronal associadas
Diminuição da Proteína Beta- Volume do hipocampo Citocinas inflamatórias
Amilóide 42 no LCR
PET-PI para visualizar os PET-FDG para ver o Isoprostanos para marcar o
depósitos de amilóide hipometabolismo do hipocampo stress oxidativo.

Fatores de risco vs Fatores protetores

Fatores de risco Fatores protetores


Genéticos Elevada escolaridade e situação socioeconomica
Vasculares Profissão de cargo alto
Estilo de vida (tabaco e álcool) Atividade física
Dieta (saturada e com homocisteína) Dieta mediterrânica
Depressão Vitaminas anti-oxidantes C e D
Associação positiva na meia idade mas negativa na vida
adulta (HTA, IMC, colesterol sérico)

172
Reflexos primitivos

Há uma altura da demência em que podemos ter o aparecimento de reflexos


primitivos, nomeadamente:

- Reflexo de preensão: ao passar o dedo na palma da mão do doente, este aperta o


nosso dedo e fica a prendê-lo;

- Reflexo palmomentoniano: ao estimularmos a eminência tenar com o nosso dedo o


doente tem uma contração leve dos músculos do mento;

- Reflexo snout: ao tocar no epicanto da boca o doente inclina a boca para esse lado;

- Reflexo dos pontos cardeais: ao tocar na cara do doente este vai virar a cara para esse
lado como se fosse para procurar a mama que vai dar de mamar;

- Reflexo glabelar: mantém o reflexo da glabela após sucessivos estímulos.

- Reflexo de sucção: ao tocar com o dedo nos lábios do doente este finge que vai fazer
sucção.

Terapêutica

O foco do tratamento deverá ser consistir em impedir que a doença avance, ou seja,
que esta evolua para demência.

1) Antioxidantes (vitamina E);


2) Pridana Forte;
3) Gingko Biloba (não faz diferença em relação ao placebo);
4) AINEs;
5) Citicolina;
6) Anti-demenciais;
7) Decorar poemas;
8) Levantar pesos;
9) Correr.

Não há tratamentos farmacológicos eficazes para prevenir ou retardar o


desenvolvimento da demência.

O tratamento da depressão é benéfico porque os doentes com depressão têm pior


curva de sobrevida.

As pessoas que têm mais atividades cognitivas de prazer (palavras cruzadas,


sudoku, discussões em grupo, tocar instrumento musical) vão ter menor risco de
disfunção cognitiva (e não doença de alzheimer).

173
Em termos de tratamento não-farmacológico sabemos que:

1) Estimulação cognitiva em grupo pode ter resultados positivos em doentes com


Alzheimer;
2) Reabilitação cognitiva: virada para resolver problemas individuais, pode ter
resultados positivos em doentes com DA.
3) Treino cognitivo com auxílio de um computador, longe do dia-a-dia tem
resultados intermédios;
4) O exercício físico pode diminuir o risco de desenvolvimento de DA.

O Donepezilo não tem qualquer melhoria da função cognitiva nem altera a


progressão para a Doença de Alzheimer (inibidores da AchE).

➔ Concluímos que não há tratamento farmacológico que seja benéfico em evitar a


progressão de uma disfunção cognitiva ligeira para Doença de Alzheimer.

Tratamento farmacológico da Doença de Alzheimer

A progressão para doença de Alzheimer não se consegue evitar mas a Doença


de Alzheimer, esta pode-se “tratar” ou melhorar um pouco os seus sintomas.

INIBIDORES DA AchE

Estes inibidores da AchE são extremamente lipofílicos, pelo que vão ser
absorvidos pela pele /(transcutânea).

Verifica-se que os doentes que são tratados com inibidores da AchE e que
tenham demência por DA vão, efetivamente, melhorar a sua capacidade cognitiva.

Isto não vai atrasar a progressão da doença, simplesmente vai melhorar os


sintomas momentaneamente, uma vez que continuam a acontecer mortes de neurónios
acetilcolinérgicos.

174
Efeitos adversos:

São efeitos parassimpaticomiméticos:

-Náuseas, vómitos, diarreia, anoreixia,

- Aumento da incidência de úlceras (pela estimulação das células parietais pela Ach),

-Diminuição da frequência cardíaca.

➔ PODEM SER CONTRA-INDICADOS EM DOENTES COM BRADIAARITMIAS.

GLUTAMATO E MEMANTINA

Outra intervenção farmacológica recorre ao glutamato e aos seus recetores de


NMDA, pelo que podemos utilizar a Memantina.

Transmissão glutaminérgica → recetores de NMDA → neuroplasticidade,


aprendizagem e formação de memória.

Na DA vamos ter uma localização das proteínas beta-amilóide sobre os


neurónios piramidais glutaminérgicos → excitotoxicidade pelos recetores NMDA.

O que precisamos de corrigir? As sinapses glutaminérgicas!

O fármaco que vamos utilizar que atua nos recetores NMDA dos neurónios
glutaminérgicos é a Memantina, que tem um mecanismo de ação complexo:

Situação normal: a transmissão Glutaminérgica pelos recetores NMDA vai


assegurar a Neuroplasticidade;

Numa Excitotoxicidade: há uma grande instabilidade do potencial de membrana


que vai impedir que um estímulo alcance o limiar necessário para desencadear um
potencial de ação e, desta forma, há perda da transmissão de informação.

Na DA: há uma diminuição da transmissão Glutaminérgica pela grande


instabilidade do potencial de membrana.

175
Com a utilização de Memantina: esta é um antagonista do recetor de NMDA dos
neurónios glutaminérgicos, pelo que vai diminuir a instabilidade do potencial de
membrana e, desta forma, permitir que um estímulo atinja o limiar do potencial de ação
e haja transmissão da informação de um neurónio para o outro.

Nota que a memantina só bloqueia os


recetores de NMDA onde as transmissões
estão a ser prejudicadas pela grande
instabilidade de membrana, sendo que mantém
as sinapses que estão regularizadas, pelo que
não há bloqueio total da
aprendizagem/formação de memórias.

De uma forma geral, a Memantina vai


estabilizar as transmissões glutaminérgicas.

➔ Efeitos da Memantina:
1) Geralmente bem tolerada
2) Cefaleias
3) Convulsões

DEMÊNCIAS FRONTO-TEMPORAIS
Conjunto de demências que resultam de uma atrofia do lobo frontal.

As demências fronto-temporais são diferentes das degenerescência lobar


fronto-temporal, uma vez que existe uma pequena diferença em termos do processo
patológico que leva a esta alteração.

Estas demências fronto-temporais, ao contrário da demência de alzheimer, não se


caraterizam por uma perda de memória mas sim por alterações da linguagem e do
comportamento.

176
Depois, a partir daqui o que se faz é avaliar a expressão de outro tipo de
proteínas, permitindo subdividir estas degenerescências.

Critérios para a demência fronto-temporal do tipo comportamental

Esta alteração das funções cognitivas pode ser visível em “trail making test parte
A” onde devemos unir os números (sequenciação e planeamento).

O “trail making test parte B” devemos fazer uma união sequencial de números e
letras (1-A-2-B-3-C…).

O teste de Stroop, a pessoa tem de dizer as cores e não as palavras que estão
escritas.

Todas as demências, para além dos sintomas cognitivos, podem ter sintomas
comportamentais e psiquiátricos, apesar de serem mais típicos na demência fronto-
temporal.

Os sintomas cognitivos, nas demências, tendem a agravar com o tempo,


enquanto os sintomas psiquiátricos e comportamentais podem ter uma evolução mais
aleatória e variável.

Os estudos longitudinais indicam que, uma vez que aconteça um sintoma num
doente, é provável que este persista e que possa recorrer no doente.

177
As terapias para os sintomas comportamentais/psiquiátricos são mais eficazes
do que as terapias para os sintomas cognitivos.

Impacto sobre os cuidadores

A presença de sintomas psiquiátricos e comportamentais nos doentes vai:

- Aumentar os níveis de stress sobre os cuidadodes;

- Aumentar as perturbações psiquiátricas (como Apatia, Agitação, Ansiedade);

- Diminuir o tempo até à institucionalização.

Clusters

1) Humor: ansiedade e depressão; (HAD)


2) Psicose: delírios, alucinações, agitação, irritabilidade; (PDAAI)
3) Comportamento: desinibição e euforia. (CDE)

Como orientar estes doentes?

1) Identificar os sintomas a tratar e avaliar a sua gravidade (risco e impacto para


terceiros ou cuidadores);
2) Excluir outras causas orgânicas ou efeitos adversos da medicação (fazer
sempre exame físico, ECD, procurar sinais de infeção, dor, alterações).
3) Iniciar a terapêutica.

Tratamento

Este será farmacológico e não farmacológico.

1) Tratamento não farmacológico:

Psicoeducação dos cuidadores respeitante ao manejo dos sintomas


comportamentais e psiquiátricos do doente;

Técnicas de modificação comportamental centradas no comportamento dos


cuidadores e doente;

Estimulação cognitiva.

2) Tratamento farmacológico:
Só devemos começar se:
a. Não existir patologia orgânica ou efeito adverso de fármaco que justifique a
doença;
b. Insucesso das terapêuticas não farmacológicas
c. O sintoma é suficientemente grave.

178
Se começarmos a terapêutica farmacológica, devemos fazer:

➔ Inibidor da AchE (Donepezilo, Galantamina, Rivastigmina);


➔ Memantina

Porque estes vão diminuir os sintomas psiquiátricos e comportamentais da


demência.

No contexto destas demências podem surgir psicoses (em estádios moderados


a graves)

- Predominam os delírios (ocupacionais e de roubo) em relação às alucinações;

- Predominam as alucinações visuais em relação às auditivas.

Se isto acontecer → Antipsicótico como Aripiprazol (mas doses mais baixas que
num indivíduo normal com psicose).

Os antipsicóticos devem-se fazer na menor dose possível, esperar 2 dias pelo


efeito. Assim que os sintomas desaparecerem, fazer a remoção destes fármacos.

A Demência dos Corpos de Lewy vai ter um percurso e evolução semelhante à


Doença de Alzheimer, se bem que os corpos de Lewy se depositam principalmente no
Sistema Límbico e vão dar sintomas extra-piramidais.

Tratamento farmacológico
Inibidores da Memantina Antipsicóticos Antidepressivos Benzodiazepinas Carbamazepina/VPA Naltrexona
AchE (trazodona)

Podemos utilizar Benzodiazepinas mas são menos aconselhados pela


sonolência e risco de queda. Se utilizarmos deve ser as de curta duração (Oxazepam ou
Lorazepam).

Pode-se utilizar Antidepressivos e carbamazepina ou VPA.

A depressão nos doentes com demência é perigosa uma vez que a utilização de
alguns antidepressivos pode ter efeitos anti-colinérgicos e agravar o quadro destas
demências.

Nota que nos idosos o tratamento deverá ter uma duração maior e existe uma
maior latência no tratamento (demora fazer mais tempo a fazer efeito). Os preferenciais
são os SSRIs.

179
DELIRIUM
Aqui o que está alterado é a Consciência e não as funções cognitivas como nas
demências.

Demência → alteração das funções cognitivas (NÃO DÃO SONOLÊNCIA!)

Delirium → alteração da consciência (mais primordial).

A partir da alteração da consciência poderemos ter, de facto, alterações das


funções cognitivas. A causa da perturbação da consciência é, quase sempre, uma
perturbação orgânica.

As perturbações da consciência normalmente cursam com:

1) Início súbito;
2) Evolução rápida;
3) Flutuações ao longo do dia;
4) Melhoria rápida quando identificada e eliminada a causa.

O Delirium pode ter:

Alterações psiquiátricas Alterações neurológicas


Comportamento Tremor
Humor Asterixis
Percepção Nistagmo
Incoordenação motora
Incontinência urinária

Epidemiologia

É uma patologia bastante comum:

- 10-15% dos doentes cirúrgicos;

- 15 a 25% dos doentes médicos gerais;

- 30% dos doentes internados nas UCI;

- 30 a 40% dos doentes em recuperação de fratura da anca;

- 90% dos doentes pós-cardiotomia.

Fatores de risco

Idade (crianças e idosos) Doença cerebral prévia História anterior de delirium Lesão sensorial
Diabetes Neoplasias Dependência de álcool Malnutrição

180
Etiologia

Podem ser intra cranianas e extra cranianas mas serão todas, na sua maioria,
somáticas.

Causas intra-cranianas Causas extra-cranianas


Traumatismo cerebral Substâncias (fármacos, drogas) (intoxicação ou abstinência)
Lesões vasculares Doenças endócrinas
Infecções (meningites, encefalites) Défices de vitaminas
Neoplasias Infecções sistémicas
Epilepsia e estados críticos Alteração hidroeletrolíticas (hiponatrémias)

As substâncias que causam delirium podem tanto ser por intoxicação aguda
como por abstinência → Fármacos, Drogas, venenos.

Os principais fármacos que causam Delirium são:

Fármacos
Anti- Anti- Drogas Venenos
Anti-colinérgicos Outros
epiléticos hipertensores
ADT Fenitoína Digitálicos Cinetidina PCP Metais Pesados
Anti-parkinsónicos Clonidina Ranitidina Opióides Monóxido de carbono
Antipsicóticos 1ªG Dissulfiram Álcool
Insulina
Esteróides
Salicilatos

No delirium podemos ter estado de alerta, alteração da orientação, da linguagem,


da percepção (com alucinações visuais).

Podem surgir delírios no contexto do delirium.

Normalmente agravam ao final do dia.

Tratamento

Passa por tratar a causa física subjacente.

Se tivermos um indivíduo muito agitado podemos administrar um antipsicótico


mas sem atividade anticolinérgica → haloperidol (antagonista D2).

Se tivermos uma intoxicação com PCP então temos um tratamento mais


específico.

181
Memória semântica pode ficar igual ao aumentar com a idade, ao contrário das
restantes.

Atividades de vida diária dividem-se em básicas/instrumentais e complexas.

Vitamina B1 não se doseia

Defeito cognitivo do HIV melhora bastante com o tratamento.

Normalmente quando há sintomas já existe atrofia hipocampal.

Avaliação neuropsicológica é mais específica de cada função.

Trail making test B = funções executivas e capacidade de inibição. → Lobo


frontal.

A progressão de defeito cognitivo ligeiro para demência, por ano, é de cerca de


10 a 15%.

PET-PI liga-se, principalmente, no lobo frontal mas não nos restantes lobos, não
se sabe bem porquê mas não quer dizer que haja maior deposição de beta amiloide no
lobo frontal.

Tratamento não farmacológico pode impedir a progressão para demência (?).

182
11. Perturbações de alcoolismo e
toxicodependência

É uma perturbação frequente em termos de urgência bem como na consulta.

Droga = é uma substância psicoativa que atravessa a BHE e tem efeito no SNC.
Provoca alterações do comportamento e das emoções. Pode ter uma gradação de
relevância para o sujeito: abuso, dependência e, no seguimento desta dependência, uma
privação (síndrome de abstinência).

São substâncias de abuso que atuam todas num grupo de estruturas denominadas
sistema de recompensa cerebral que, ao serem ativadas, provocam sensações de bem-
estar, euforia, tranquilidade, que as pessoas pretendem repetir: Levam a efeitos de
reforço positivo.

São, fundamentalmente:

1) Hipotálamo;
2) Hipocampo;
3) Amígdala.

Sistema de recompensa cerebral

Temos 2 vias principais:

- Via meso-límbica: começa na Área Ventral


Tegmental (AVT) no mesencéfalo e dirige-se para o
núcleo accumbens. Quando há consumo de drogas,
aumenta a libertação de Dopamina da AVT para o
núcleo Accumbens;

- Via meso-cortical: começa na Área Ventral


Tegmental (AVT) no mesencéfalo e dirige-se para o
córtex cerebral (frontal), aumentando a [Dopamina]
neste local quando há consumo de drogas.

183
Algumas drogas são mais “viciantes” do que
outras consoante tenham maior estimulação da AVT do
que outras.

Por outro lado, a cocaína vai impedir a recaptação


de dopamina pelo neurónio pré-sinático, enquanto as
anfetaminas vão impedir a recaptação de dopamina pelo
neurónio pré-sinático bem como estimular a libertação de
doses ainda maiores de dopamina por esse mesmo
neurónio, o que aumenta ainda mais a [Dopamina] na
fenda sinática, razão pelo qual as anfetaminas são mais
viciantes que a cocaína.

Uma questão que torna as drogas problemáticas


é que há aumento da libertação de dopamina aquando do
consumo inicial, o que vai causar dependência mas também há diminuição da
serotonina, o que vai levar a um estado de “insaciedade” que obriga a pessoa a consumir
mais até conseguir atingir a satisfação pretendida.

ICD10 → europeu, utilizada em diagnóstico nos relatórios;

DSM-V → americano, permite uma uniformização de diagnósticos na clínica através da


utilização das guidelines.

CRITÉRIOS DE DEPENDÊNCIA DE UMA SUBSTÂNCIA


Mnemónica: TAC ET DM

1) Tolerância: necessidade de aumentar a dose da droga para obter o mesmo


efeito;
2) Abstinência: decorrente dos sintomas que aparecem aquando da privação da
droga;
3) Consumo de > dose ou por + tempo que o desejado inicialmente (pessoa não
consegue controlar a dose nem os efeitos obtidos);
4) Esforços infrutíferos para interromper ou controlar o consumo
5) Tempo aumentado de vida para obter a substância ou para recuperar dos seus
efeitos (pessoa vive centrada neste problema, trabalha mais ou obtém mais
dinheiro para poder manter os consumos aplicados);
6) Diminuição das atividades sociais, familiares, laboratoriais (devido ao
consumo, podendo ter repercussões nestas);
7) Manutenção do consumo apesar de todos os problemas e circunstâncias
negativas.

184
Atualmente, quando se apanha uma pessoa com álcool no sangue numa operação
STOP, uma das indicações que o juiz deve dar é a orientação para uma consulta de
psiquiatria. As pessoas vêm à consulta um pouco contrariadas mas não conseguem
parar os consumos, apesar de terem ficado sem carta ou terem tido acidentes. Ou seja,
apesar dos malefícios para a vida da pessoa causados pelo consumo, esta não abdica
deles, perfazendo o 7º critério.

ALTERAÇÕES METABOLISMO
O metabolismo do álcool ou outras substâncias varia de pessoa para pessoa por
questões:

1) Genéticas
2) Idade
3) Género

SEVERIDADE/EFEITO DO CONSUMO
A severidade dos sintomas do consumo de álcool ou outras substâncias
dependem de:

1) Metabolismo;
2) Uso simultâneo de outras substâncias psicoativas.

DOENTES COM MAIOR MORBILIDADE


Estes doentes apresentam com maior morbilidade psíquica e física

1) Perturbação de personalidade anti-social;


2) Esquizofrenia
3) Perturbação Bipolar
4) Perturbação de Ansiedade (nomeadamente pânico, quando há consumo de
substâncias estimulantes);
5) Perturbações Afetivas

ÁLCOOL
Podemos encontrar vários quadros clínicos diferentes:

1) Exposição pré-natal (consumo de álcool da mãe durante a gravidez);


2) Intoxicação aguda, (que pode ser ligeira, moderada, grave/COMA);
3) Abuso, Dependência;
4) Privação, (que pode ser ligeira, moderada, grave/Delirium Tremens);
5) Wernicke-Korsakoff (causado pela défice de vitamina B1).

185
➔ Exposição pré-natal

Não há consenso em termos de dose de álcool que possa ser nociva para o feto.

Assim, o que se faz é promover a abstinência completa da ingestão de álcool durante


a gravidez. É uma causa importante na Europa de atraso/défice mental nas crianças.

Pode provocar um síndrome fetal alcoólico, que tem uma ação tipo espectro ou seja,
depende do consumo que a grávida tenha feito em termos de álcool.

➔ Intoxicação aguda

Se vier ter com os médicos deverá ser por alteração dos comportamentos, como
agitação psicomotora, se for agressivo, se tiver queda/traumatismo.

Temos de fazer 3 coisas:

a) Avaliação amnéstica;
b) Doseamento de substâncias no sangue e/ou urina;
c) Despiste de traumatismo crânio-encefálico ou outra condição médica.

Assim, nestes doentes temos de fazer uma avaliação anamnéstica e tentar perceber
as circunstâncias do doente.

Podemos fazer o doseamento (sérico ou urinário, dependendo da substância) de


outras substâncias de abuso, nomeadamente para perceber se o doente poderá ter
tentado cometer suicídio com ingestão de álcool e outras substâncias

Despiste de Traumatismo crânio-encefálico ou outros quadros físicos decorrentes


de quedas, traumatismos, agressão, entre outros. É pertinente porque, por vezes, o
doente está agitado, confuso e não sabemos se é do quadro em si ou de uma
queda/traumatismo, pelo que temos de ter noção disso.

O coma pode acontecer quando a [álcool]>3g/dL e a morte quando [álcool] > 4g/dL.

186
➔ Síndrome de Abstinência

Pode ser ligeira, moderada ou grave.

O álcool funciona como depressor do SNC, pelo que:

A) Consumo crónico → desenvolvem-se mecanismos hiperexcitatórios


compensatórios → aumenta a transmissão noradrenérgica;
B) Abstinência → os mecanismos hiperexcitatórios não têm contrabalanço
inibitório do álcool → sintomas “híper”adrenérgicos.

Tremor começa nas extremidades e migra para a parte proximal dos membros.

Náuseas e vómitos matinais (pelo início da abstinência logo pela manhã)

As alterações do sono acontecem em todos os doentes com alcoolismo, não só


na dependência (que referem frequentemente insónias) mas, também, na
privação/abstinência.

No Delirium Tremens podemos ter:

Alucinações (3-12h).

Convulsões (12-72h) em 10% dos


alcoólicos internados;

Delirium Tremens (3-4 dias) em 5% dos


alcoólicos internados;

187
➔ Síndome de Wernicke-Korsakoff

É um défice de tiamina (vitamina B1), pode ser dividida em 2 fases:

1) Fase aguda:
Encefalopatia de Wernicke (confunde-se, por vezes, com o delirium tremens),
porque o doente está:
- Quadro confusional, apatia
- Alterações oculomotoras (paralisia, nistagmo) → pode ser mais tardio
- Marcha atáxica

2) Fase crónica:
Síndrome de Korsakoff (quadro crónico, irreversível), onde predomina:
- Amnésia retrógrada crónica (sem crítica);
- Confabulação (vai preencher as lacunas mnésicas com diferentes informações
de dia para dia, mas é diferente da amnésia catatímica porque aqui o doente não
vai alterar a informação em função do estado de humor, simplesmente vai dizer
coisas diferentes em dias diferentes porque não se lembra do que disse antes)
- Apatia, abolia;
O quadro evolui para uma demência alcoólica.

Num doente alcoólico faz-se a administração de 100 mg ou mais de tiamina por


dia. O síndrome de korsakoff é irreversível mesmo depois da administração de tiamina.

Encefalopatia de Wernicke Síndrome de Korsakoff


Agudo e reversível com tiamina Crónico e irreversível, pode levar a demência alcoólica
Quadro confusional agudo, apatia Amnésia retrógrada crónica
Alterações dos músculos extra-oculares Confabulações
Marcha atáxica Apatia, Abolia

TERAPÊUTICA

Na síndrome de abstinência moderada, podem ter todos os sintomas de ativação


simpática, bem como tremor, o que temos de fazer é substituir o álcool (depressor do
SNC) por medicação.

Os doentes alcoólicos que vêm à consulta raramente é para tratarem o problema da


dependência mas sim por referenciação de outras especialidades a que recorreram pelos
efeitos adversos do consumo (Hepatologia/Gastroenterologia).

188
É farmacológica e não farmacológica:

• FARMACOLÓGICA

Entérica - Oral (2 a 3L de água/dia)


Parentérica – soro ou dextrose
Hidratação
! = IC ou IR pela sobrecarga hídrica
! = diabéticos pela dextrose, fazendo nos restantes pela hipoglicémia
Tiamina > 100mg/dia
- Diazepam (20 a 40mg/dia) → até sedar o doente
BZD
- Oxazepam/Lorazepam se I.H. por ter t1/2 menor
Beta bloqueante Propanolol ou Atenolol para diminuir sintomas simpáticos periféricos
VPA Para impedir a ocorrência de convulsões.
Haloperidol ou Tiapride, no final do dia quando o quadro poderia agravar, para
sedar e acalmar o doente.
Antipsicótico
! = doentes com antecedentes ou risco de convulsões, porque os Anti-psicóticos
baixam o limiar convulsivante.

• NÃO FARMACOLÓGICA

Psicoterapia de grupo.

A % de abandono dos tratamentos é muito alta:

- 28 a 80% dos doentes abandonaram o tratamento durante o 1º mês;

- 50% de recaídas durante os primeiros meses de tratamento em ambulatório;

- 30 a 40% de abstinência um ano após o tratamento.

O que fazemos para a desabituação do doente?

- Dissulfiram (tem efeito aversivo, porque o dissulfiram é antagonista da enzima


aldeído desidrogenase, pelo que promove a acumulação de acetaldeído no organismo,
que é tóxico, pelo que dá sensações desagradáveis ao doente como hipotensão,
cefaleias náuseas, vómitos,. Tem algumas regras de administração!).

- Fármacos anti-craving: Acamprosato (GABAérgico), Naltrexona (antagonista


opióide), Nalmefeno (antagonista parcial dos recetores opióides).

189
Consumo pontual/não regular de álcool → é metabolizado pelo CYP2E1

Consumo crónico de álcool → ativação de vias microssomias.

A ativação das vias microssomias, vias enzimáticas novas, vão interferir na


metabolização de alguns fármacos, podendo aumentar a sua toxicidade
(tuberculostáticos e anti-fúngicos) ou diminuir a sua eficácia (consoante o álcool diminua
ou aumente a atividade catalítica das enzimas metabolizadoras).

O álcool pode ter um efeito

1) Sedativo
2) Amnésico
3) Atáxico.

TOXICODEPENDÊNCIA
Apesar das substâncias serem diferentes e os mecanismos específicos de cada
uma serem, igualmente, diferentes, vão acabar por atuar na mesma região (hipocampo,
hipotálamo, amígdala).

O eixo comportamental é ligeiramente diferente porque o álcool é algo que está


presente na rotina, no dia a dia das pessoas, pelo que o indivíduo alcoólico tem
dificuldade em ver-se dessa maneira porque vê outras pessoas a fazê-lo de forma
normal.

Na toxicodependência é diferente porque o consumo é feito de forma menos


socialmente aceite, a dependência evolui e há alguma clivagem dessas pessoas.

190
Substâncias:

Depressores do SNC Cannabis Opióides (heroína)


Estimulantes do SNC Cocaína Anfetaminas
Alucinogénios Mescalina LSD
Mnemónica: COCA ML

OPIÓIDES (HEROÍNA)

É um depressor do SNC, são agonistas dos recetores opióides.

Podemos dividir em 3 quadros clínicos principais:

- Consumo e dependência

- Overdose → emergência médica

- Síndrome de abstinência

Epidemiologia

- O consumo de drogas aumentou muito depois do 25 de abril;

- É maior nos homens do que nas mulheres.

Overdose → emergência médica

Carateriza-se por:

1) Pupilas mióticas (cabeça de alfinete);


2) Alteração do estado de consciência grave com extrema sedação, depressão do
centro respiratório, coma.

TERAPÊUTICA: administração de Naloxona (IMM ou intra-nasal).

Há países onde os familiares de um doente toxicodependente com heroína são


instruídos a saber lidar com naloxona e fazerem eles a administração intranasal caso
seja necessário.

Estes quadros de overdose podem acontecer quando temos uma pessoa que
deixou os consumos de heroína (estava em abstinência), retoma os consumos mas
retoma nas doses que fazia na fase final dos consumos, quando ainda tinha tolerância,
pelo que as mesmas doses agora têm um efeito muito maior, desencadeando uma
overdose.

Naloxona – 2 Os → Opióides – 2 Os ! Não confundir com Naltrexona para


terapêutica de abstinência.

191
Síndrome de privação

Pode ter vários sintomas:

Artralgias Mialgias Febre Tremor


Sudação Profusa Ansiedade Agitação Insónia

O doente vai enfrentar várias etapas no tratamento:

A terapêutica depende muito dos doentes:

- Doente com mais dor : analgésicos;

- Doente mais ansioso : BZD

Terapêutica de substituição Terapêutica com Terapêutica com agonistas alfa2


antagonistas adrenérgico
Metadona (critérios de inclusão) Naltrexona Clonidina
Buprenorfina (é o que se usa +)

192
1) Terapêutica de substituição

Critérios de inclusão para Metadona

História de dependência > 1 ano;

Evidência fisiológica de dependência (sintomas de privação, é difícil de perceber).

Exceções: não se introduzem grávidas nem os doentes internados, a não ser que
já estejam em programas de metadona e sejam internados por quadros infeciosos,
quadros psíquicos. Estes doentes, se internados, continuam a fazer a dose que estava a
ser administrada de metadona. Não se dá nos dependentes saídos da prisão.

Metadona começa-se com doses de 20-30mg/dia e vamos aumentando,


gradualmente, 10mg/dia até atingirmos uma dose que elimine os sintomas de privação
e de craving (cerca de 80 a 120mg/dia).

Buprenorfina → é o mais utilizado

É um agonista parcial dos recetores de opióides, com grande afinidade para os


recetores.

Não suprime a função cerebral, a overdose não é fatal pelo que torna seguro
utilizar em ambulatório (doses 4-12 mg/dia).

Indicação: doentes com história mais curta de dependência e indivíduos ativos.

2) Terapêutica antagonista

Naltrexona

Vai ocupar os recetores opióides, pelo que impede os efeitos de euforia e


sedação da heroína, se bem que já se utiliza pouco.

Devemos começar 10 dias depois de terminar os consumos com o objetivo de


não criar sintomas de privação iatrogénicos.

3) Terapêutica de controlo sintomático

Clonidina

É contraindicada em ambulatório, pelos efeitos simpaticolíticos que possui (ao


ser um agonista alfa2 vai diminuir a libertação de NE pelo neurónio pré-sinático).

Vai suprimir os sintomas noradrenérgicos de privação porque impede a ação dos


mecanismos hiperexcitatórios, pelo que atenua esta atividade e, assim, não há sintomas
como taquicardia, sudorese profusa, tremor.

Efeitos frequentes são a hipotensão e sedação (pela depressão do SNSimpático).

Utiliza-se em 0,2mg a 1,2mg/dia.

193
Os doentes são difíceis de tratar, porque tem de haver uma integração entre
terapêuticas farmacológicas e não farmacológicas (abordagem psicossocial, entrevista
motivacional (E.M.))

Muitas vezes a terapêutica também é mais difícil de tratar pela comorbilidade


que não é diagnosticada.

Os quadros de dependências (nomeadamente o do álcool) são diagnosticados


tardiamente porque o que predominam são as comorbilidades (como depressão ou
queixa física que leva a consulta de Gastro ou Hepatologia). Os casos de álcool são
subdiagnosticados.

Muitas vezes há dificuldade em tratar quadros de ansiedade e depressão e


percebe-se, no fim, que é pela utilização concomitante de álcool.

Patologia Dual = coexistência de um diagnóstico psiquiátrico e o abuso de uma


substância (dependência).

- ENTREVISTA MOTIVACIONAL –

Os doentes são difíceis na 1ª entrevista e são de difícil acompanhamento,


apresentam mecanismos resistentes à mudança, como mecanismos de defesa de
negação (negam a dependência).

Assim, existem 2 objetivos:

1) Ultrapassar os mecanismos de defesa dos doentes, nomeadamente a


ambivalência e resistência;
2) Mobilizar para a mudança do comportamento.

Baseia-se na aplicação de 4 princípios básicos: (EE, DD, LR, AAE)

1) Expressar empatia (não ser crítico em relação ao doente);


2) Desenvolver discrepância (procurar a ambivalência entre o doente estar
motivado para a mudança por estar na consulta mas querer manter os
consumos sem ter as desvantagens deles)
3) Lidar com a resistência
4) Apoiar a auto-eficácia (capacidade que a pessoa tem de fazer a sua vida e
controlar a sua vida, motivar para que a pessoa consiga largar o consumo)

194
Ter a noção que tanto o álcool como as outras drogas são situações crónicas,
que têm tendência para a recorrência, pelo que temos de fazer prevenção das
recaídas:

1) Terapia de grupo (há um efeito de comunhão e de espelho)


2) Grupos de auto-ajuda
3) Terapia de orientação cognitivo-comportamental
4) Terapia familiar
5) Terapia do casal

As repercussões orgânicas vão ocorrer ao nível dos órgãos alvo do álcool: fígado, SNC…
Isto pode facilitar o diagnóstico uma vez que, por vezes, se torna difícil o diagnóstico de
alcoolismo e, caso consigamos definir lesão dos órgãos alvo, poderá facilitar o
diagnóstico de dependência de álcool.

Numa consulta pós-consumo de um alcoólico pode haver um grande mecanismo de


resistência e defesa (via negação) por parte do doente, pelo que temos de tentar quebrar
este ciclo e, acima de tudo, motivar o doente para a mudança de comportamento.

O doente que vomita sangue (hematemese) vai afligir o doente → é algo que vai inibir o
doente e vai preocupá-lo. Perguntar ao doente se já viu sangue ou não e se sabe porque
é que isso acontece. “Eu acredito que nunca vai mais beber mas é uma doença para a
recaída. Mesmo que não beba mais tem de ficar orientado na consulta do álcool caso
tenha uma recaída.”. Assim, temos de redirecionar o doente para consulta de
álcool/hepatologia. Temos de dizer ao doente que percebemos que é uma doença com
uma grande recaída e que sabemos que o doente pode estar a tentar mas avisar que
temos noção que é uma doença com grande recaída. Temos de tirar culpa em cima do
doente.

“Acho que o álcool está a ter grande influência no seu estado de saúde, eu acho que
devia ter uma consulta de acompanhamento em consulta de álcool ou hepatologia. Julgo
ser o melhor para ti mas o doente é livre de decidir.”.

As pessoas que são medicadas com ansiolíticos misturam os ansiolíticos com o álcool.
Bem como o canábis que raramente é consumido de forma isolada mas sim com o álcool.

Como o Delirium Tremens tem amnésia retrógrada sem crítica temos de perguntar se
se lembra ou não! Provavaelmete não se vai lembrar.

Na urgência o que vamos encontrar são as síndromes de privação em estado grave.

Temos de ter cuidado que estes doentes alcoólicos podem ter depressão do sistema
imunitário, podem ter estase de secreções com pneumonias de estase por
microorganismos nosocomiais.

Doentes podem ter aspiração de vómito com pneumonia de aspiração.

195
A agitação psicomotora resulta, muitas vezes, da interação entre álcool e outras
substâncias psicoativas.

Muitas vezes podemos ter uma interação de confrontação, ou seja, podemos dizer ao
doente “beba, beba um copo de vinho ou outro” e o doente diz “então mas o doutor não
tinha dito para não beber?” e isto serve como provocação para o doente, para testarmos
a parte psicológica do doente, que é mais difícil de tratar que a parte física.

A cocaína muitas vezes está associada ao consumo de álcool porque a cocaína é


estimulante do SNC e o álcool é depressor do mesmo.

196
12. Suicídio e auto-mutilação
O suicídio é um fenómeno muito complexo, é multifactorial, extravasa a componente
puramente psiquiátrica. Requer, para a sua compreensão, uma vertente:

Para o técnico é preciso lidar com duas vertentes:

Nomenclatura
Há uma grande controvérsia em relação à nomenclatura aplicada, o que vai ter
repercussões em:

1) Dados epidemiológicos e comparação entre estudos;


2) Compreensão do fenómeno;
3) Consequências ao nível da prevenção.

Há um consenso em 4 conceitos básicos: (MRIL)

197
A letalidade é muito avaliada em função do método, uma vez que é diferente um
enforcamento, uma defenestração (saltar de uma janela), uma arma de fogo, ou utilizar
intoxicações medicamentosas.

A letalidade pode ser dividida em:

1) Objetiva – aquilo que o médico avalia;


2) Subjetivo – aquilo que o doente acha, que em mais de 50% das vezes o
doente não tem noção da letalidade da substância que está a utilizar, o que
é mais perigoso ainda em suicídio impulsivo.

A intencionalidade → mais controversa → parte do relato da pessoa.

Definições
Em 2017 criou-se um programa nacional pela DGS que nos vai definir:

Comportamento Comportamento com um resultado não fatal, em que o indivíduo voluntariamente fez
auto-lesivo um dos seguintes:
- Iniciou comportamento, com intenção de causar lesão sobre o próprio;
- Tomou fármacos em doses superiores às farmacologicamente conhecidas;
-Tomou uma droga ilícita ou substância psicoativa com propósito declaradamente
autoagressivo;
- Ingeriu uma substância ou objeto não ingerível.
Há sempre intencionalidade de se autoagredir.
Ideação Suicida Pensamentos ou cognições sobre acabar com a própria vida, que podem ser vistos
como percursores de comportamentos auto-lesivos ou atos suicidas. Podem
apresentar-se sobre desejos e/ou plano para cometer suicídio, sem que haja
necessariamente passagem ao ato.
Tentativa de Ato levado a cabo por um indivíduo e que visa a sua morte, em que é possível
suicídio perceber que é realizado com intencionalidade suicida mas que, por diversas razões,
geralmente alheias ao indivíduo, resulta frustrado.
Suicídio consumado Morte provocada por um indivíduo no seguimento de um ato que tinha o intuito de
provocar fim à vida.
Há uma certa progressão de :

198
Epidemiologia
No Mundo:

- Ano 2020 → nº de suicídios suba para 1,5 milhões.

Comportamentos auto-lesivos
Na adolescência são um problema de saúde pública no Mundo.
Ato suicidas

- Taxa de mortalidade

Nº anual de suicídios > Nº de vítimas de acidentes de viação.

→ Em Portugal:

Taxa de suicídios por 100.000 habitantes foi de:

Nos adolescentes15-24 anos portugueses:

199
Os comportamentos auto-lesivos são mais prevalentes que os atos suicidas:

A presença de comportamentos auto-lesivos representa o maior fator de risco para


tentativa de suicídio e pode ser identificado em 40% dos suicídios consumados.

Em Portugal o Alentejo continua a ser o local com a taxa de suicídio mais alta.

Últimos dados da DGS:

- 1º lugar: Hungria, Irelanda;

- 11º lugar: Portugal e Alemanha.

Portugal continua a ter dados subestimados, ou seja, mais baixo do que realmente
existe/acontece → melhorar as certidões de óbito.

O estigma do suicídio como um ato de fraqueza e de manipulação diminui a


recorrência aos sistemas de apoio/saúde numa fase em que ainda são reversíveis
(comportamentos auto-lesivos, ideação suicida ou tentativa de suicídio).

Etiologia

200
Teorias psicossociais

Durkeim Freud Beck Daniel Sampaio


Teoria social Teoria Psicodinâmica Teoria cognitiva Teoria sistémica
O suicídio depende da relação que a pessoa O suicídio resulta na O suicídio ocorre de Dá enfoque na relação
estabelece com a sociedade. interiorização de um erros cognitivos, familiar.
impulso agressivo crenças erróneas e
inicialmente dirigido a um pensamento
objeto amado. dicotómico.
Egoísmo – falência de integração A pessoa vira para si a sua Dá importância aos atos
Altruísmo – excesso de integração própria frustração e zanga suicidas ou de CAL nos
Fatalista – excessiva … de sociedade e ataca-se a si para não jovens como medida de
Anómico – falha da organização social. fazer a outros. metacomunicação.

1) Fatores biológicos

Há vários estudos que realçam as alterações da neurotransmissão,


nomeadamente:

Atualmente há um estudo muito grande do sistema opióide endógeno, a relação


deste sistema com os comportamentos auto-lesivos nos jovens.

2) Estudos genéticos
- História Familiar → há um risco maior em parentes próximos de um indivíduo
com estes comportamentos;
- Irmãos Monozigóticos >> Irmãos Dizigóticos

Fatores hereditários → peso variável de 21 a 55%.

Um fator de risco importantíssimo é a presença de HF de suicídio num indivíduo


que comete atos suicidas.

De forma geral, a etiologia é uma questão multifatorial que temos de ter em linha
de conta vários aspetos e a sua interação entre eles.

201
Modelo Limiar
Temos uma interação muito marcada entre vários tipos de fatores:

1) Fatores de risco a longo prazo;


2) Fatores de risco a curto prazo;
3) Fatores protetores;
4) Fatores precipitantes.

Tudo isto vai culminar num limiar para a ocorrência de comportamentos auto-lesivos
ou atos suicidas.

Fatores de risco
São estes fatores que nos podem ajudar na nossa intervenção, sabemos onde
podemos agir, o que podemos modificar para alterar o curso da doença.

Permitem estabelecer o grau de risco e grau de repetição.

202
Sociodemográficos Familiares Psiquiátricos Individuais
Idade Perdas financeiras Existência prévia de: Impulsividade
> risco: - CAL
-adolescentes e jovens - TS
adultos
-idosos
Género Perdas reais Doenças mentais Hostilidade e
Mulheres- > risco de CAL e TS Perda de alguém (principalmente Perturbação agressividade
Homens- > risco para para Borderline)
suicídio consumado
Trabalhadores rurais e História adversa na Abuso ou dependência de Baixa auto-estima
profissionais de saúde infância álcool
Minorias étnicas Abuso físico/sexual Dependência e desamparo
Orientação sexual Bullying Perfeccionismo e rigidez
Isolamento social Mobing (bullying dos Desesperança
adultos na atividade
profissional)
Contágio social Doenças físicas
- Pelos Media (neurológico, oncológico,
- Na escola, família DPOC, SIDA)
Barreiras ao acesso de Facilidade de acesso a
cuidados de saúde meios letais
(como fármacos)
Estigma Estrutura familiar
disfuncional
Doença mental ou HF de
suicídio

Modificáveis

90% das pessoas que morrem de suicídio tinham uma perturbação mental,
sendo que a perturbação depressiva é o principal fator de risco:

- 15 a 20% das pessoas com perturbação depressiva suicidam-se! (porque têm o risco
aumentado em 15x).

Fatores protetores
São quase opostos aos fatores de risco:

1) Ausência de doença mental;


2) Capacidade de resolução de problemas;
3) Suporte social e familiar;
4) Facilidade de acesso aos serviços de saúde;
5) Cuidados clínicos efetivos;
6) Relação terapêutica positiva.

203
Adolescência
Na adolescência temos um período de grandes alterações:

1) Internas;
2) Dinamismo com as alterações externas.

As 3 áreas mais mutáveis para os adolescentes:

Na adolescência pode haver a noção de que existe um fracasso no desenvolvimento


numa vertente individual, familiar ou social, há uma visão negativa de si próprio.

ASPETOS FAMILIARES ASPETOS PSICOSSOCIAIS


Famílias muito rígidas, pouco adaptadas Má integração com os pares
Com expectativas irrealistas Bullying
Depressão ou alcoolismo na família Dificuldades escolares
Divórcio não é, per si, um fator de risco mas sim a forma como este foi feito e a
estabilidade familiar que se segue a isto.

Um adolescente, quando chega ao SO, tem muito medo de falar com o médico
porque tem medo de ficar dependente, ou seja, o adolescente subvaloriza a situação e
pode tornar-se agressivo ou hostil. Tem muita dificuldade em aderir à farmacoterapia.
O nosso papel é tentar descodificar o comportamento do adolescente.

“Está aflito, está agressivo, eu percebo, passou por um momento muito difícil”.

Idoso
Os idosos têm maior probabilidade de cometer suicídio do que qualquer outra
faixa etária.

Quais os fatores de risco?

➔ Sexo masculino;
➔ Perdas cumulativas (viuvez, reforma, perda de autonomia);
➔ 30% tem alcoolismo;
➔ 60 a 80% tem depressão;
➔ Solidão (60% do idosos em Portugal vivem sós).

204
Obstáculos à intervenção
1) Mitos

“Questionar as ideias suicidas aumenta o risco de suicídio” – Falso!

Isto porque uma pessoa que tem ideações suicidas está num profundo sofrimento
e, ao poder ter oportunidade para falar, vai diminuir a sua ansiedade, pelo que diminuirá
a vontade de cometer suicídio.

“As pessoas que ameaçam suicidar-se não se matam” – Falso!

Cerca de 70% das pessoas que se suicidaram tinham feito comunicação prévia.

“Pessoas que fazem CAL ou TS querem chamar a atenção” – Falso!

Há um pedido de ajuda, um apelo, uma comunicação. Isto porque a pessoa está em


profundo sofrimento e precisa de ajuda.

“Quem se suicida está determinado a fazê-lo” – Falso!

Há uma profunda ambivalência na pessoa.

“Se alguém está decidido a matar-se então não há nada que possamos fazer”- Falso!

Muitas vezes são doentes que têm uma perturbação mental (90% dos casos) pelo
que podemos tentar ajudar/tratar essa questão e impedir o suicídio.

“Quando o indivíduo mostra sinais de melhoria está fora de perigo” – Falso!

Após a alta do internamento ou após o ambulatório temos de fazer uma


monitorização durante, no mínimo, 6 meses, pela grande flutuação do doente em termos
de humor/comportamento.

Avaliação do risco
Uma vez que o suicídio é multifactorial, temos de fazer o balanço entre:

1) Fatores de risco (a longo ou curto prazo);


2) Fatores protetores;
3) Fatores precipitantes.

Temos de perceber quais estão presentes/ausentes e quais podemos modificar.

DEVEMOS SEMPRE PERGUNTAR AO DOENTE O QUE SE PASSOU E SE EXISTE


OU NÃO IDEAÇÃO/TENTATIVA SUICIDA.

205
A melhor forma de avaliarmos o risco é na entrevista clínica.

1) Caraterizar o quadro clínico;


2) Avaliar o risco de evolução/progressão do quadro;
3) Atuar como a primeira intervenção no suicídio através do estabelecimento da
relação terapêutica.

É importante criarmos um ambiente mais íntimo com o doente, que pode ser feito ao
puxarmos uma cortina no SO ou termos o gabinete arrumado, de forma a transmitir, não
verbalmente, uma maior proximidade com o doente.

Em relação à confidencialidade, devemos:

1) Guardar segredo em relação aos fatores que levaram aos CAL ou ato suicida;
2) Manifestar a existência de ideação suicida perante a rede de suporte do nosso
doente para que possam estar a par da situação e atuar se necessário.

1º contacto
O QUE FAZER O QUE NÃO FAZER
Escuta empática e abordar com tato mas clareza Cuidado com as contra-atitudes e desconforto do
ténico – não devemos dar moralidades nem culpabilizar
Reconhecer o sofrimento do doente “está muito aflito, Evitar julgamentos, banalizações, críticas ou
vejo que está num sofrimento intenso” superproteção.
Dar esperança “esta situação deve ser mesmo difícil Não usar frases feitas “melhores coisas virão”, “a vida
para si mas vamos tentar superar isto, eu vou ajudá-lo” é feita de altos e baixos”

Fator de risco → por si só não é responsável;

Fator precipitante → não é causa → não há suicídio por causa da “namorada” ou “avô”.

É apenas um trigger, temos de perceber o que havia naquela pessoa de


vulnerabilidade.

A avaliação do doente deve-se fazer sempre em 3 níveis:

206
Avaliação do doente suicida
1) Avaliar a vida do doente nos últimos 6 meses e, em pormenor, nas últimas 48h,
perceber a atmosfera do doente;
2) Avaliar a gravidade;
3) Ver o quadro psicopatológico que existe;
4) Problemas pessoais da pessoa;
5) Há tentativas prévias ou não;
6) História familiar da pessoa;
7) Doenças somáticas;
8) Avaliação da capacidade de resolução de problemas internos ao longo da vida;
9) Sistema relacional.

➔ Atmosfera do episódio

“Porquê? Porquê agora? O que se passa?”

Saber se:

1) Tinha um plano;
2) Fez tudo para não ser descoberto;
3) Deixou mensagens/aviso;
4) Motivação e intenção do doente;
5) Reação ao estar vivo;
a. “Não acredito que fiz isto, a minha família está em sofrimento profundo”;
b. “Até nisto eu falhei, nem isto consegui” → severidade muito maior.
6) Letalidade dos métodos;
7) Explicação do gesto;
a. Procurar a forma como o doente ia fazer permite perceber se foi algo
pensado e antecipado ou impulsivo “do momento”;
8) Fatores precipitantes;
9) Fatores predisponentes.

Fatores risco/protetores
Risco “Suicibilidade”
Fatores de risco Fatores protetores
Acesso a meios letais Ausência de fatores TS com alta letalidade ou ideação
Elevado Perturbação mental protetores suicida permanente.
Tentativa prévia “não quero ajuda”
Depressão moderada Escasso suporte familiar e Ideação suicida com plano mas sem
Tentativas prévias de baixa social intenção de passagem para o ato ou
Moderado
letalidade CAL
CAL frequentes “Ambivalência na ajuda”
Sem tentativas prévias Fortes fatores protetores Ideação suicida sem plano, sem CAL
Sem perturbação mental ou AS.
Baixo
Aliança terapêutica.
“Aceita ajuda”

207
Critérios para internamento
Há alguns critérios que obrigam o internamento:

Perturbação mental Comportamento auto Tentativa de suicídio


Sexo masculino
grave lesivo anterior anterior
Impulsividade, Ideação suicida Ausência de suporte
Risco elevado com HF
agitação mantida familiar

Mas o internamento também tem riscos, nomeadamente para jovens, já que:

1) Há afastamento em relação ao seu contexto habitual;


2) Estigmatização.

Quem faz avaliação de suicídio e quem é submetido?


Qualquer médico deverá saber avaliar o risco de suicídio – Psiquiatra, MGF ou
médico em especialidade médica e/ou cirúrgica.

Devemos avaliar os doentes:

1) Numa primeira consulta ou internamento;


2) No serviço de urgência;
3) Doentes que admitem ideação suicida;
4) Na presença de ato suicida ou comportamento auto-lesivo;
5) Familiares e amigos após TS ou CAL.

208
Modelos de intervenção

Individual Familiar
Intervenção em crise Abordagem familiar
Psicoterapia Breve/resolução de problemas Terapia familiar sistémica
Psicoterapia Psicodinâmica
Psicoterapia CC
Psicoterapia Interpessoal
Psicofarmacoterapia
Internamento tempo completo
Hospital de Dia

Atuar em Crise:

1) Restrição de acesso aos meios letais;


2) Impedir isolamento da pessoa;
3) Tratar ansiedade e/ou depressão;
4) Tentar marcar consulta rápida;
5) Contrato de não suicídio.

A família não deverá deixar em “tabu” a ideação suicida ou o comportamento


auto-lesivo, deve-se falar das coisas!

A intervenção familiar deve-se fazer em qualquer situação: urgência,


ambulatório, internamento etc.

Ter cuidado porque a ocorrência de um episódio de CAL ou TS pode ter efeito


de contágio numa família.

209
13. Perturbações da Personalidade

Temos 3 conceitos diferentes para definir:

Assim, o conceito de personalidade surge como o mais geral, lato e composto dos
3 conceitos.

Personalidade saudável
Um indivíduo é considerado como tendo uma personalidade saudável quando:

1. Se consegue reconhecer a si próprio como um indivíduo singular, reconhece a sua


identidade;
2. É capaz de manter relações íntimas;
3. Tolera a existência de afetos na sua vida, experencia-os;
4. É capaz de regular os afetos e emoções sentidas;
5. É capaz de regular o seu comportamento em função dos valores morais;
6. Vive de acordo com a realidade que o rodeia;
7. É capaz de responder ao stress e eventos adversos.

Determinantes da Personalidade
São eventos/caraterísticas que podem influenciar a personalidade de um
indivíduo, nomeadamente:

210
Perturbação de Personalidade – Critérios

Critério A → definição de perturbação de personalidade.

Critério B → inflexível e visível.

Critério C → causar sofrimento ou diminuição da função.

Critério D → estável e longa duração.

Critério E → não pode ser melhor explicado por outra patologia psiquiátrica.

Critério F → não pode ser explicado pelo consumo de substâncias ou condição médica.

Epidemiologia
- Cerca de 10% a 20% da população tem perturbação da personalidade.

- Cerca de 50% dos doentes psiquiátricos tem perturbação da personalidade.

Para cada tipo de perturbação de personalidade a prevalência varia entre 0,2 a 2%.

- Os mais comuns:

➔ Personalidade depressiva;
➔ Personalidade evitante.

- Os que são mais frequentemente vistos na consulta → personalidade borderline.

211
Perturbação da Personalidade
É um padrão persistente de experiências e comportamentos intrínsecos que se
afastam acentuadamente da cultura do indivíduo, é penetrante e inflexível, tem início na
adolescência ou no início da vida adulta, é estável ao longo do tempo e causa sofrimento
ou alteração do funcionamento.

Perturbações da personalidade
Cluster A Cluster B Cluster C
Paranóide Desconfiadas Anti-Sociais Desagradáveis Evitante Inibido
Esquizóide Socialmente Borderline Instáveis Dependente Submisso
indiferentes
Esquizotípica Excêntricas Histriónicas Necessidade de Obsessivo- Perfeccionista
atenção Compulsiva
Narcisistas Centradas no
próprio
Excêntricas e bizarras Ansiosos ou temerosos
Dramáticas, Emocionais e
Irregulares

Não especificado:

- Passivo-agressivo → negativista;

- Depressivo→ pessimista.

Nota que o DSM-V e o ICD-10 diferem na classificação da Personalidade Anti-


Social (no qual o DSM-V requer a existência de uma Perturbação de Conduta prévia),
enquanto que na Perturbação Borderline o DSM-V implica a existência de sintomas
cognitivos.

No ICD-10 não existe a perturbação de personalidade narcísica.

Atualmente aplica-se uma divisão em termos de categorias definidas por vários


critérios, sendo que o futuro será fazer uma divisão dimensional.

212
Cluster A

Cluster A
Paranóide Esquizóide Esquizotípica
- Pessoas sempre desconfiadas - Distanciamento das relações - Pessoa com comportamentos
afetivas excêntricos
- Sensíveis, ficam muito - Dificuldade de expressar - Discurso estranho, vago, metafórico ou
sensíveis a comentários emoções demasiado elaborado
- Ciumentos - Preferem atividades solitárias - Pode ter ilusões corporais ou mesmo
ideias delirantes
- Rancoroso - Pouco interativos e sociais - Excessiva ansiedade social

A perturbação de personalidade paranóide pode anteceder os doentes com


Perturbação Delirante. A crença central é que “sou vulnerável”, “As intenções dos
outros são de me magoar, me prejudicar”. São doentes que se sentem muito vulneráveis
e, nesse sentido, criam uma armação de proteção contra os outros, ficando agressivos.
Os doentes acham que toda a gente os quer maltratar, magoar e e prejudicar, daí serem
tão revoltados com a vida.

A perturbação de personalidade esquizóide pode anteceder os doentes com


Esquizofrenia. A crença central é que “Estou bem sozinho”. Têm medo que outras
pessoas se possam colocar na sua vida e influenciar a sua felicidade. Podem achar que
uma doença é uma invasão à sua pessoa, pelo que demoram a aderir a uma terapêutica.

A perturbação Esquizotípica tem a crença central de que “sou diferente, sou


defeituoso”, tentam marcar as pessoas à sua volta pela sua diferença.

213
Cluster B

- Doente que não sabe viver em sociedade


- Há um completo desrespeito e violação dos direitos dos outros
Anti-Social - Mente com facilidade
- Envolve-se em lutas e situações de agressividade
- Mais frequente em homens.
- Pessoas muito reativas e instáveis do ponto de vista emocional
- Impulsividade e CAL ou TS
Borderline
CLUSTER B

- Picos de ansiedade sem relação ou precedente


- Esforços para evitar o abandono
- Pessoas que precisam de muita atenção e afeto, auto-dramatização
- Podem ter comportamentos sexuais intrusivos
Histriónica
- Podem procurar elogios e aprovações
- Aceita facilmente sugestões
- Personalidade muito cheia de si e dos seus triunfos, consideram-se especiais
- Necessidade de mostrar aos outros as suas conquistas (exibicionismo)
Narcisista
- Não olha aos outros para atingir os seus fins
- É grandioso e só pode ser admirado por outras pessoas de igual “nível”

A perturbação anti-social podem agredir fisicamente as pessoas. São pessoas


com a crença “estou acima da lei”.

A perturbação Borderline é uma personalidade com “buracos”, onde o doente


não tem uma personalidade estável. Tentam evitar o abandono de forma frenética.
Existe um sentimento de vazio crónico enorme por detrás destas pessoas. A crença
central é de “Sou indesejável”, “sou vulnerável e fraco”. A relação com o médico é
oscilante, varia entre a necessidade de aprovação e extrema dependência e a
superficialidade e fuga ao contacto.

A perturbação histriónica relaciona-se com um sentimento muito íntimo de


insuficiência, procurando alimentar-se da atenção que recebem de outros. Necessitam
de ser atrativos fisicamente para captarem atenção por se sentirem pobres
interiormente. São as pessoas que riem muito alto numa festa para que todos reparem
nele. A crença central é “Não sou atraente”, “Não se preocupam com os meus
problemas”. Na relação com o médico tenta criar uma sedução, quer ser amado/a.

214
A perturbação narcisista prende-se num indivíduo que, por detrás desta
necessidade de superioridade constante, tem núcleos muito frágeis, são pessoas que
não se sentem perfeitas mas que tentam ser muito grandiosos numa determinada área
para tapar as falhas internas. São o tipo de doente que considera que nós, enquanto
médicos, somos muito novos e não temos capacidade para perceber a complexidade da
doença deste indivíduo narcisista. A crença central é de “Tenho o direito de ser amado
porque sou superior aos demais”.

Cluster C

215
Cluster C
Evitante Dependente Obsessivo-Compulsivo
- Consideram que são inferiores às - Precisa de apoio permanente - Demasiado apegado a
outras pessoas de outras pessoas organização, listas e processos
- Evitam a crítica dos outros sobre o - Dificuldade a lidar com - Incapacidade de deixar um
próprio decisões trabalho que não feito perfeitamente
- Evitam situações de exposição social - Não consegue manter uma - Excessivamente dedicado ao
opinião sólida trabalho
- Preocupa-se com críticas e rejeição - Falta de iniciativa e auto- - Não gosta de delegar tarefas
social estima

A perturbação Evitante têm medo de ser envergonhados em público, restringem


os relacionamentos íntimos. A crença central é algo como “sou indesejável”, “não sou
suficientemente bom”.

A perturbação dependente são pessoas que precisam de constante confirmação


dos outros em relação àquilo que fazem e decisões que tomam. Têm uma obediência
aos outros pouco razoável. Por detrás disto está um medo de desamparo enorme. A
crença central é de “sou fraco, não tenho remédio”.

A perturbação obsessivo-compulsiva carateriza-se por termos pessoas


extremamente inflexíveis, muito perfeccionistas, superconsciencioso, não se conseguem
desfazer de objetos sem valor. Têm um grande medo de perda de controlo. Por parte do
médico precisam de sentir confiantes em relação a este e em relação às informações que
são dadas por este, querem ter os pormenores e efeitos adversos todos muito bem
controlados. A crença central é de que “Sou desorganizado, não tenho nada sob
controlo”.

216
Perturbação de Personalidade vs Outra doença mental
Muitas vezes torna-se difícil perceber se as caraterísticas que são específicas de
uma perturbação de personalidade são fruto ou não da perturbação mental.

Assim, para diagnosticarmos uma perturbação da personalidade, devemos ter


em atenção se:

1. As caraterísticas em questão apareceram no final da adolescência/início da


vida adulta;
2. Se se mantém a longo prazo dentro do funcionamento habitual do indivíduo;
3. Se não ocorrem em exclusivo no contexto de episódios de perturbação
mental.

Traços de personalidade vs Perturbação da Personalidade


Ter em atenção que traços de personalidade são situações “subclínicas” de
perturbações de personalidade, ou seja, não existem ainda alterações do funcionamento
ou sofrimento associado a estes traços de personalidade diagnosticados, não são
inflexíveis o suficiente.

Abordagem das Perturbações de Personalidade


Temos 3 formas de atuação:

A psicoterapia recorre-se da psicodinâminca, cognitivo-comportamental… e é


útil principalmente nas perturbações de personalidade do cluster B (anti-social,
Borderline, histriónico, narcisita) e do cluster C (Evitante, dependente, obsessivo-
compulsivo).

A socioterapia utiliza-se principalmente no cluster A (paranóide, esquizóide,


esquizotípico) e cluster B. É o hospital de dia.

A farmacoterapia utiliza-se principalmente no cluster A, nomeadamente se


existirem comorbilidades como esquizofrenia, Perturbação Delirante.

Abordagem terapêutica na Perturbação Borderline


Existem 4 formas que podem ser utilizadas:

- Terapia dialética-comportamental;

- Terapia baseada na mentalização;

217
- Psicoterapia focada na transferência;

- Abordagem psiquiátrica em geral.

O ideal é ter uma abordagem múltipla nestes indivíduos.

Conclusão
- Um doente com perturbação de personalidade é um doente que recorre muito
frequentemente aos cuidados de saúde;

- São doentes “difíceis” porque “despertam sentimentos difíceis” no médico, não aderem
à terapêutica, são muito exigentes na relação com o médico e são difíceis de tratar.
Normalmente conseguem determinar reações negativas nos médicos;

- Muitas vezes os doentes têm comorbilidades psiquiátricas que deverão ser tratadas
(cerca de 50% dos doentes psiquiátricos têm estas perturbações de personalidade);

- Todos os médicos devem reconhecer uma perturbação de personalidade;

- Devemos compreender a crença central de cada uma das personalidades para termos
uma relação positiva nesse sentido;

- Devemos oferecer apoio e estratégias de coping a estes doentes para tentar controlar
as reações perante um evento de trigger que possa ocorrer;

218
Vídeo 1

- Paranóide / Suspeito, desconfiado.

Sentem a doença como uma ameaça.

Vídeo 2

- Histriónico , estas pessoas precisam de se alimentar das ideias das outras pessoas
para se sentirem bem consigo próprias e para alimentar a fraqueza da sua
personalidade;

Sentem a doença como um castigo.

Não podemos evitar os comportamentos sedutores das pessoas nem as suas interações
mais ousadas, temos de tentar ter uma reação neutra em relação a isto.

Vídeo 3

- Obsessivo-compulsivo

Chega a um ponto que o médico tem de passar à frente porque se não ficam na consulta
a resolver todas as dúvidas do doente. É preciso tentar conseguir marcar a próxima
consulta

Vídeo 4

- Narcisista

Perante um doente que diz que leu um artigo e que já sabe algumas coisas o médico
deve responder que podem partilhar um artigo e que podem discutir os 2 esse mesmo
artigo, para uma melhor compreensão dos 2.

Muitas vezes são doentes que estão sempre a tocar e a focar nas nossas fraquezas para
ver se nos afetam nesse sentido.

O médico vai ter que entrar numa via de “vamos ser parceiros e levar isto ao melhor
local” e não “vamos competir sobre quem sabe mais”.

Na perturbação Borderline quando o doente entra num desses buracos depressivos


começam com comportamentos perigosos para o próprio doente, começam a exagerar
no álcool, nas compras, no sexo sem proteção, são impulsivos e têm comportamentos
muito precipitados e pouco ponderados e pensados, procuram freneticamente uma
solução para os problemas sem grande moderação.

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