Você está na página 1de 4

HIDRATAÇÃO VENOSA DE MANUTENÇÃO NA PEDIATRIA

MEDICINA UFPR – DISCIPLINA DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS


PROF.A MARIANA DIGIOVANNI

HIDRATAÇÃO VENOSA DE MANUTENÇÃO EM PEDIATRIA

1. INTRODUÇÃO
Não existe solução padrão na terapia hídrica de manutenção para todos os tipos de pacientes em
enfermaria ou UTIP, deve ser tratado com medicação e prescrito de forma criteriosa.
A terapia hídrica pode ser dividida em quatro fases:
Fase de ressuscitação: quando os fluídos endovenosos (EV) são necessários para restaurar a
perfusão tecidual adequada, prevenindo ou minimizando danos nos órgãos alvos;
Fase de titulação: ponto em que os fluídos EV são passados da fase de ressuscitação para
manutenção;
Fase de manutenção: etapa em que os fluídos EV são prescritos para atingir equilíbrio hídrico entre
as necessidades e perdas;
Fase de convalescença: período em que a administração de fluídos é interrompida e o paciente
retorna à regulação de líquidos de forma intrínseca.

2. TIPO DE SOLUÇÃO
Iniciar empiricamente com solução isotônica (Quadro 1).

3. OFERTA HÍDRICA DE MANUTENÇÃO


Iniciar empiricamente de 100 a 60 mL/Kcal/dia.
Calcular a hidratação de manutenção com base nas quilocalorias (Kcal) (Quadro 2)

4. OFERTA DE ELÉTROLITOS E GLICOSE

Oferta de Potássio (K)


Empírico inicial: 2 mEq/kcal/dia
Deve ser ajustado conforme valor sérico e funcionamento renal.
Oferta máxima de 12 mEq/Kcal/dia.
Concentração máxima em acesso periférico: idealmente 40 mEq/L, podendo chegar a 60 mEq/L.
Concentração máxima em acesso central: idealmente 80 mEq/L, podendo chegar a 120 mEq/L.
Ampola – Kcl 19,1%: 2,5 mEq/mL.
Ex.: 2 mEq/Kcal/dia – Peso 10 Kg (= 10 Kcal)
Oferta (2) x Kcal (10) = 10 mEq/dia
Oferta diária (10) / Concentração ampola (2,5) = 4 mL/dia
HIDRATAÇÃO VENOSA DE MANUTENÇÃO NA PEDIATRIA
MEDICINA UFPR – DISCIPLINA DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS
PROF.A MARIANA DIGIOVANNI

Oferta de Cálcio
Empírico inicial: 0,5 a 2 mEq/kcal/dia.
Deve ser ajustado conforme valor sérico.
Ampola – Gluconato de Cálcio 10%: 0,5 mEq/mL.
Ex.: 0,5 mEq/Kcal/dia – Peso 10 Kg (= 10 Kcal)
Oferta (0,5) x Kcal (10) = 5 mEq/dia
Oferta diária (5) / Concentração ampola (0,5) = 10 mL/dia

Oferta de Glicose (TIG ou %)


Empírico inicial: 2,5 a 3 mg/Kcal/min
Deve ser ajustado conforme valor sérico e funcionamento dos rins.
Concentração máxima em acesso periférico: 12,5% = 12,5 g / 100 mL.
Concentração máxima em acesso central: 25% = 25 g / 100 mL.
Ampola – Glicose 50% = 50 g / 100 mL
Ex.: 3 mg/kcal/min – Peso 10 Kg (= 10 Kcal)
(Oferta (3) x Kcal (10) x horas (24) x minutos (60)) = 43,2 g
1000
Oferta diária (43,2g) / Concentração ampola (50g/100ml) =
43,2 g ----------- x mL
50 g -------------- 100 mL
x = 86,4 mL

Oferta de Magnésio (Mg)


Deve ser iniciado com valor sérico menor que 1,5: 0,5 a 2 mEq/kcal/dia.
Ampola – Sulfato de Mg 10%: 0,8 mEq/mL.
Sulfato de Mg 50%: 4 mEq/mL.
Ex.: 0,5 mEq/Kcal/dia – Peso 10 Kg (= 10 Kcal)
Oferta (0,5) x Kcal (10) = 5 mEq/dia
Oferta diária (5) / Concentração ampola 10% (0,8) = 6,2 mL/dia

Oferta de fósforo (P) ***NÃO PODE correr com Ca, incompatibilidade.


Deve ser iniciado com valor sérico menor que 1: 0,5 a 2 mEq/kcal/dia.
Ampola – Fosfato de potássio 2 mEq/mL de potássio e 1 mEq/mL de fósforo: 1 mEq/mL.
Glicerofosfato de sódio: 2 mEq/mL
Ex.: 0,5 mEq/Kcal/dia – Peso 10 Kg (= 10 Kcal)
Oferta (0,5) x Kcal (10) = 5 mEq/dia
Oferta diária (5) / Concentração ampola Fosfato de K (1) = 5 mL / dia (Nesta solução está
recebendo 0,5 mEq/Kcal/dia de fósforo e 1 mEq/Kcal/dia de potássio).

5. PLANOS DE HIDRATAÇÃO DE MANUTENÇÃO PRONTOS


Utilizar plano de hidratação pronto apenas quando não precisar aumentar o aporte de glicose e
eletrólitos. Se for necessária uma oferta maior nestas situações individualizar.

Oferta 60 mL/Kcal/dia – K 2 – Ca 0,5 – TIG 3,47


SF 0,9% ................... 500 mL
Glicose 50% ............. 70 mL
KCl 19,1% ................. 5,5 mL
Gluca 10% ................ 7 mL
Correr EV contínuo a 60 x kcal mL/h
24h

Oferta 100 mL/Kcal/dia – K 2 – Ca 0,5 – TIG 3,47


SF 0,9% ................... 500 mL
Glicose 50% ............. 50 mL
KCl 19,1% ................. 4 mL
Gluca 10% ................ 5 mL
Correr EV contínuo a 100 x kcal mL/h
24h
HIDRATAÇÃO VENOSA DE MANUTENÇÃO NA PEDIATRIA
MEDICINA UFPR – DISCIPLINA DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS
PROF.A MARIANA DIGIOVANNI

6.5 OBSERVAÇÕES
1. Individualizar o plano de hidratação de manutenção sempre que precisar de um aporte maior de
glicose, potássio ou cálcio.
2. Individualizar o plano de hidratação de manutenção sempre que precisar de oferta hídrica
diferente do calculado pronto para 100 ou 60 mL/Kcal/dia.
3. Prescrever como CONTÍNUO.
4. Planilha do Excel fornece oferta, inclusive, individualizada. Lembrar que os valores são para
oferta de 24 horas, se for fazer de 12/12h por exemplo deve ser dividido o volume dos
componentes por 2.
5. Lembrar de prescrever os componentes na prescrição para que não haja dificuldade de liberação
pela farmácia.
6. Não existe oferta hídrica de manutenção ideal para todos os tipos de pacientes, no entanto sabe-
se que os pacientes que apresentam risco de secreção inapropriada de hormônio anti-diurético
(SIHAD) (maioria dos pacientes internados tanto na UTIP e enfermaria pediátrica tem risco de
SIAHD) é recomendado restrição de 50 a 80% da oferta tradicional recomendada.

Necessário controle dos dados para ajuste individualizado da oferta hídrica de manutenção,
como: peso, diurese, balanço hídrico (BH), sobrecarga de fluido acumulado (SFA) e diário (SF),
dados vitais e sinais de depleção do espaço extracelular (DEEC) (Quadro 3).
SFA = (Fluído entrada – Fluído saída) x 100
Peso admissão
***BH em mL, utilizar peso em g.
***SFA > 5% já apresentam desfechos como tempo de internação, mortalidade e tempo de VM piores.
HIDRATAÇÃO VENOSA DE MANUTENÇÃO NA PEDIATRIA
MEDICINA UFPR – DISCIPLINA DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS
PROF.A MARIANA DIGIOVANNI

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS NA PREPARAÇÃO DO PROTOCOLO


ALMEIDA, H. I. et al. The effect of NaCl 0.9% and NaCl 0.45% on sodium, chloride, and acid-base balance in a PICU population. Jornal de Pediatria,
Rio de Janeiro, v. 91, n. 5, p. 499-505, 2015.
ALOBAIDI R. et al. Associations Between Fluid Balance and Outcomes in Critically Ill Children: A Protocol for a Systematic Review and Meta-analysis.
JAMA Pediatrics, v. 172, n. 3, p. 257-268, mar. 2018.
ARIKAN A. A. et al. Fluid overload is associated with impaired oxygenation and morbidity in critically ill children. Pediatric Critical Care Medicine, v.
13, n. 3, p. 253-258, 2012.
BRIASSOULIS G.; VENKATARAMAN S.; THOMPSON, A. E. Energy expenditure in critically ill children. Critical Care Medicine, v. 28, n. 4, p. 1166–
1172, 2000.
CHEN J. et al. Association of fluid accumulation with clinical outcomes in critically ill children with severe sepsis. Journal Plos One, v. 11, n. 7, p.
e0160093, jul. 2016.
CHOONG K.; BOHN D. Maintenance parenteral fluids in the critically ill child. Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro, v. 83, n. 2, p. 3-10, 2007.
CHOONG K.; MCNAB S. IV fluid choices in children: have we found the solution? Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro, v. 91, p. 407-409, 2015.
CORTES D. O.; BONOR A. R.; VINCENT J. L. Isotonic crystalloid solutions: a structured review of the literature. British Journal of Anaesthesia, v.
112, n. 6, p. 968–981, 2014.
DÍAZ F. et al. Implementation of preemptive fluid strategy as a bundle to prevent fluid overload in children with acute respiratory distress syndrome and
sepsis. BMC Pediatrics, v. 18, p. 207, 2018.
DIGIOVANNI M. et al. Complicações relacionadas ao uso de soluções hipotônicas e isotônicas. Revista Médica do Paraná, Curitiba, v.1, jan./jun.
2019.
FELD L. G. et al. Clinical practice guideline: maintenance intravenous fluids in children. Pediatrics. v. 142, n. 6, p. e20183083, 2018.
GOLDSTEIN S. J. et al. Outcome in children receiving continuous venovenous hemofiltration. Pediatrics, v. 107, n. 6, p. 1309-1312, jun. 2001.
GRANADO R. C. D.; MEHTA R. L. Fluid overload in the ICU: evaluation and management. BMC Nephrology, v. 17, p. 109, 2016.
HAREN F. V.; ZACHAROWSKI K. What's new in volume therapy in the intensive care unit? Best Practice & Research Clinical Anaesthesiology, v.
28, p. 275-283, 2014.
HOLLIDAY M.A., WILLIAM E. S. The maintenance need for water in parenteral fluid therapy. Pediatrics, 1957; 19:823-832.
SUTAWAN I. B. R.; WATI D. K.; SUPARYATHA I. B. G. Association of fluid overload with mortality in pediatric intensive care unit. Critical Care Shock,
v. 19, n. 1, p. 8-13, 2016.
INGELSE S. A. et al. Early fluid overload prolongs mechanical ventilation in children with viral-lower respiratory tract disease. Pediatric Critical Care
Medicine, 2017.
KETHARANATHAN N. et al. Fluid overload in a south african pediatric intensive care unit. Journal of Tropical Pediatrics, v. 60, n. 6, p. 428-433,
2014. 8
LI Y. et al. Early fluid overload is associated with acute kidney injury and PICU mortality in critically ill children. European Journal of Pediatrics, v. 175,
p. 39-48, 2016.
LOPES C. L. S.; PIVA J. P. Manejo do excesso de volume hídrico em pacientes submetidos à ventilação mecânica. In: Associação de Medicina
Intensiva Brasileira, Sociedade Brasileira de Pediatria; PIVA J. P.; CARVALHO W. B.; organizadores. PROTIPED Programa de Atualização em
Terapia Intensiva Pediátrica: Ciclo 9. Porto Alegre: Artmed Panamericana, v. 1, p. 63-81, 2017.
LOPES C. L. S.; PIVA J. P. Sobrecarga hídrica em crianças submetidas à ventilação mecânica. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, v. 29, n. 3, p.
346-353, 2017.
MALBRAIN M. L. N. G. et al. Fluid overload, de-resuscitation, and outcomes in critically ill or injured patients: a systematic review with suggestions for
clinical practice. Anaesthesiology Intensive Therapy, v. 46, n. 5, p. 361–380, 2014.
MCNAB S. et al. 140 mmol/L of sodium versus 77 mmol/L of sodium in maintenance intravenous fluid therapy for children in hospital (PIMS): a
randomised controlled double-blind trial. Lancet, v. 385, p. 1190-1197, 2015.
MCNAB S. Intravenous maintenance fluid therapy in children. Journal of Paediatrics and Child Health, v. 52, p. 137-140, 2016.
MORITZ M. L.; AYUS J. C. Maintenance intravenous fluids in acutely ill patients. New England Journal Medicine, v. 373, p. 1350-1360, 2015.
NICE GUIDELINE. Intravenous fluid therapy in children and Young people in hospital. National Institute for Health and Care Excellence (UK),
London, dez. 2015. Disponível em <https://www.nice.org.uk/guidance/ng29>. Acesso em: 30 fevereiro 2019.
RAINA R. et al. Fluid overload in critically ill children. Frontiers Pediatrics, v. 6, p. 306, 2018.
SAMADDAR S. et al. Association of fluid overload with mortality in critically-ill mechanically ventilated children. Indian Pediatrics, v. 55, p. 957-963,
2018.
SINITSKY L. et al. Fluid overload at 48 hours is associated with respiratory morbidity but not mortality in a general PICU: retrospective cohort study.
Pediatric Critical Care Medicine, v. 16, n. 3, p. 205-209, 2015.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Guia Prático de Atualização: Diarréia aguda: diagnóstico e tratamento. São Paulo, n.1, mar, 2017.
Disponível em: <https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/2017/03/Guia-Pratico-Diarreia-Aguda.pdf>. Acesso em: 22 de junho de 2019.
VINCENT J. L.; PINSKY M. R. We should avoid the term “fluid overload”. Critical Care, v. 22, p. 214, 2018.
VINCENT J. L. Fluid management in the critically ill. Kidney International, mar. 04, 2019. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.kint.2018.11.047>.
Acesso em: 15 de abril de 2019.
WALD E. L. et al. Fluid management: pharmacologic and renal replacement therapies. Pediatric Critical Care Medicine, v. 17, p. 257-265, 2016.

Você também pode gostar