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A INGLATERRA E O ABSOLUTISMO.

O DESENVOLVIMENTO DA ECONOMIA
MERCANTIL INGLESA
     Durante a época feudal, a população da Inglaterra vivia em maior parte no campo, em
comunidades locais que produziam lãs e víveres para o próprio consumo. As terras eram
cultivadas visando o sustento familiar e passavam de pais para filhos. Os camponeses
exploravam seus lotes dispersos em faixas pelas propriedades senhoriais, num sistema
denominado "campos abertos: Eles utilizavam também as terras comuns" dos domínios
para a pastagem do gado, a caça ou a obtenção madeira.
     Gradualmente a partir do século XV, as aldeias começaram a modificar. Os gêneros
agrícolas e as lãs nelas produzidos passaram ser vendidos em regiões mais afastadas,
iniciando-se a formação de u: mercado nacional. A facilidade na obtenção da 19 favoreceu
o desenvolvimento da indústria têxtil que se espalhou pelas aldeias através sistema
doméstico de produção, fugindo às restrições impostas pelas corporações de ofício nas
cidades.
     À medida que o comércio da lã aumentava, os proprietários c terras iniciaram o
cercamento de seus campos abertos (num processo denominado "enclousure" surgido no
século XVI e que se estendeu até século XIX), expulsando os camponeses de seus lotes e
acabando com os direitos tradicionais de utilização das "terras comuns" dos domínios Os
enclousures tinham por objetivo favorecer a criação intensiva d carneiros para o
fornecimento de lã em bruto e contou sempre com o apoio do Parlamento.
     As regiões do sul e do leste da Inglaterra especializaram-se na produção de lã e de
alimentos, cujos preços estavam em ascensão. A., terras se valorizaram, transformando-se
numa mercadoria como outra qualquer podendo ser compradas, vendidas ou arrendadas, a
critério de seu proprietário, 0 uso da moeda (Aumentado com a chegada do ouro e da prata
da América) generalizou-se, substituindo o pagamento em espécie ou em trabalho entre
camponeses e proprietários.
     No século XVI, a Inglaterra tornou-se também um grande centro de extração de carvão e
de produção de ferro, estanho, vidro, sabões e construção naval. Além da indústria têxtil,
espalhada por burgos e aldeias do interior, surgiram empresas que utilizavam métodos
novos para a extração do sal, o fabrico do papel, o refino do açúcar e a fundição do ferro e
do cobre, A exploração das minas de carvão foi melhorada 1 com a utilização de bombas
que permitiam o trabalho a grande profundidade.
     Os lucros obtidos na produção e na exportação de mercadorias passaram - a ser
investidos na compra de terras, ainda a principal riqueza e fonte de poder, por
comerciantes, manufatureiros, traficantes e homens de negócios em geral. Surgiram assim
os "agricultores capitalistas", um novo grupo de proprietários rurais, que investia seus
ganhos na exploração comercial da terra.
     0 desenvolvimento da economia mercantil dividiu os proprietários de terras e de
riquezas em dois grupos antagônicos. De um lado, a alta nobreza formada pela antiga
aristocracia dos "pares" do reino, que vivia das rendas fixas da terra e dos favores da corte e
interessava-se em manter as práticas e os costumes feudais. De outro lado, consolidava-se a
burguesia urbana e a "gentry" formada pela pequena burguesia independente e pelos novos
agricultores capitalistas; esse grupo era partidário do cercamento dos campos e da liberdade
de produção e de comercio.
     A população rural também foi afetada pelo crescimento econômico. Havia os
camponeses "yeomen" (pequenos e médios proprietários de terras) a os camponeses
arrendatários que não eram donos dos lotes que cultivavam. A maioria dos yeomen que
possuía propriedades de tamanho médio e produzia para o mercado, progrediu. Já os
pequenos proprietários e os arrendatários com o início do cercamento dos campos,
perderam suas terras e transformaram-se em assalariados ou desocupados.
     Com a expulsão dos camponeses das terras cercadas, as revoltas tornaram-se freqüentes
na Cornualha, no Devonshire e em Norfolk. 0 governo inglês tentou interferir, defendendo
para os camponeses as 'Ire servas de terras de uso comum", para a pastagem do gado, mas
não obteve êxito, visto que a iniciativa ia contra os interesses da gentry e dos camponeses
proprietários (os yeomen), beneficiados pelos cercamentos que possuíam representantes no
Parlamento.
     0 desenvolvimento econômico e a generalização do uso da moeda trouxeram lucros para
a burguesia urbana, a gentry e parte da yeo manry, grupos sociais que se dedicavam ao
comércio e à produção, enquanto que a alta nobreza e grande parte dos camponeses viam
seus rendimentos diminuírem ou perderem seu valor.

 
ABSOLUTISMO E MERCANTILISMO
     Henrique VII (1485/1509) foi o iniciador da centralização política na Inglaterra,
submetendo os nobres e subordinando as administrações locais ao seu controle. A
centralização prosseguiu no reinado de Henrique VIII (1509/1547), facilitada pela criação,
em 1534, da Igreja Anglicana, chefiada pelo monarca e separada da Igreja Católica
Romana, após uma crise com o papa Clemente VII. As terras e as propriedades da Igreja
Católica foram confiscadas pelo Estado e vendidas para a nobreza e para a burguesia.
     Mesmo com o poder político fortalecido, os monarcas ingleses da dinastia Tudor -
Henrique VII, Henrique VIII, Eduardo VI, Maria Tudor e Elisabeth 1 (1558/1603) -
mantiveram um relacionamento razoável com o Parlamento, garantindo no país as tradições
e as aparências de um governo representativo.
     0 reinado de Elisabeth I foi um, período de grande crescimento econômico e
correspondeu ao apogeu do absolutismo na Inglaterra.Seu governo praticou intensa
intervenção na economia, através de medidas mercantilistas de favorecimento à%
agricultura, às manufaturas, ao comércio e à navegação', Em 1581, um mercantilista inglês
recomendava à rainha "acabar com a importação das mercadorias fabricadas no estrangeiro,
e que poderiam sê-lo entre nós, restringindo a exportação de nossas lãs, peles e outros
produtos no estado bruto, chamando artesãos de fora sob o controle das cidades, fabricando
mercadorias suscetíveis de serem exportadas... (Citado por DEYON, Pierre, 0
Mercantilismo. SP, 1973. Perspectiva, p.(17)
     Elisabeth I proibiu a exportação de li em bruto e a importação de fios e de tecidos;
distribuiu prêmios a que m fabricasse bons navios e concedeu monopólios temporários
àqueles que introduzissem 'novas atividades no país, Os trabalhadores das manufaturas
inglesas eram recrutados entre os camponeses expulsos do campo, transformados em
desempregados e mendigos. Criaram-se leis que previam castigos e penas de morte aos que
se recusassem a trabalhar. Surgiram as "Workhouses", onde os internos eram submetidos a
uma longa jornada de trabalho, sob rígida disciplina.
     Apesar de a rainha Elisabeth ter praticado intervenções militares nos Países-Baixos e na
França, a inferioridade dos exércitos ingleses impediu qualquer ocupação territorial no
continente europeu. 0 feito militar de maior vulto de seu reinado foi à anexação da Irlanda
conseguida em uma guerra iniciada em 1595 e que durou nove anos. Por ser uma ilha, a
Inglaterra não se sentia ameaçada de invasão, fato que desmilitarizou precocemente a sua
nobreza. Por isso, não havia no e país um exército profissional permanente, semelhante aos
existentes na Espanha e na França, as duas principais potências européias do século. XVI.
Devido à presença, do Parlamento, a Coroa inglesa também não tinha autonomia financeira
nem uma burocracia forte, como a França.
     A grande realização do Estado absolutista inglês foi a modernização de sua marinha,
iniciada por Henrique VIII, que quadruplicou o número de embarcações. A partir de 1579,
os galeões da frota real passaram a ser equipados com canhões de longo alcance, fato que
lhes permitia 'acertar os navios inimigos a uma grande distancia. Além de servirem ao
comércio, os navios passaram a servir também à guerra, favorecendo a expansão marítima
inglesa. Em 1588, os ingleses enfrentaram e venceram a "Invencível Armada" de Filipe II,
aplicando um sério golpe no prestígio da Espanha, considerada então o mais poderoso país
europeu. A partir daí, intensificaram-se as viagens de navegadores e de corsários à
América, com o objetivo de saquear as embarcações espanholas carregadas de ouro e de
empreender contrabando com as Antilhas.

 
EXPANSÃO MARÍTIMA E COLONIZAÇÃO
     Com o crescimento do comércio e da navegação, foram fundadas as companhias
inglesas de comércio, que reuniam capitais de acionistas e recebiam monopólios do Estado
para a exploração de determinado produto ou de uma zona comercial, Foi o caso da
Companhia da Turquia, da Companhia de Moscóvia, da Companhia da África, da
Companhia das Índias Orientais (1600) e da Companhia da Virgínia (fundada em 1606 para
a exploração da América Inglesa).
     A ocupação efetiva de territórios da América do Norte pelos ingleses ocorreu a partir de
1607, quando foi fundada Jamestown, capital da Virgínia, no governo de Jaime I. A ação
colonizadora foi facilitada pela existência de grande número de pessoas expulsas do campo
pelos "enclousures" que se encaminhou para a América onde havia facilidade na obtenção
de terras.
     No decorrer do século XVII, o fluxo migratório contou com famílias burguesas e nobres
que abandonaram a Inglaterra devido às perseguições religiosas ou políticas: eram os
puritanos, os presbiterianos, os quakers, os católicos, etc. Até 1776, data de sua
independência, existiam 13 colônias inglesas na América, fundadas por particulares por
companhias de comércio ou pertencentes à Coroa.
     Das colônias americanas chegavam a metrópole o tabaco, o índigo e o arroz (cultivados
nas "plantations" escravistas do sul) e a batata, o milho, o centeio, a Levada e as peles de
animais raros (produzidos nas colônias do centro e do norte), sendo proibido o intercâmbio
direto com outros países, Entretanto, essas proibições não eram muito respeitadas e logo se
desenvolveram ativas trocas entre as colônias do norte (região denominada Nova
Inglaterra), as Antilhas e a África. Esse comércio triangular fortaleceu a burguesia colonial
e trouxe-lhe grandes lucros.
     As cidades inglesas de Líverpool e
Bristol destacaram-se como portos
ligados ao tráfico de escravos para a
América, devido à necessidade crescente
de mão-de-obra nas plantações e nas
minas das colônias inglesas, portuguesas
e espanholas. 0 escambo de negros na
África era feito com mercadorias como
têxteis e utensílios de ferro. Estima - se
que, durante os 300 anos do tráfico de
escravos, 15 milhões de negros foram
introduzidos na América, sendo o Brasil
o principal comprador, ocasionando a
maior migração forçada de um
continente para outro que o mundo
conheceu. Os lucros acumulados pela
Inglaterra com essa atividade levaram muitos historiadores a considerarem-na uma das
causas favoráveis ao início da revolução industrial inglesa, em meados do século XVIII.
     0 progresso econômico verificado nos séculos XVI e XVII enriqueceu a burguesia e os
proprietários rurais que produziam para o mercado. Porém, entrou em choque com o
sistema político vigente, baseado em leis e instituições ainda predominante feudais devido à
influência da nobreza conservadora, fortemente representada na Câmara dos Lords.   As
mudanças vieram com a Revolução Inglesa de 1640/1660, da qual saírem vitoriosas as
classes progressistas, que passaram a dominar o Parlamento inglês, favorecendo o livre
desenvolvimento das forças capitalistas.
Autores: Olga Maria A. Fonseca Coulon e Fábio Costa Pedro
Apostila: Dos Estados Nacionais à Primeira Guerra Mundial, 1995, CP1-UFMG
 

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