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Da Revolução à Constituição
Uma das coisas que ambos os lados concordavam era que a constituição
representava uma vitória do ‘governo’, da ‘autoridade’ e do ‘poder’ sobre a ‘liberdade’. Os
homens de 1776 tinham usado paradigmas whigs (liberais ingleseses em oposição aos tories
conservadores), segundo os quais os poderes sempre abusivos dos soberanos extinguia a
chama da liberdade, o mesmo se deu 1787, com defensores de ambos os lados.
Os Artigos da Confederação e a politica americana tinham duas características
dominantes: o poder estava na periferia, nos diversos Estados separados e nestes o poder fica
concentrado nos legislativos populares, em detrimento com qualquer separação de poderes. A
América sob os artigos não passou de uma frouxa aliança de Estados soberanos e
independentes. O Art. II declarava que “cada Estado conserva sua soberania, liberdade e
independência.”.
Os fundadores conheciam a teoria republicana e concordavam que a liberdade só
florescia em Estados pequenos; a monarquia, despotismo, os patronos do governo enérgico,
invasivo e poderosos eram produtos de Estados de tamanho maior, Supunha-se que a
liberdade e a busca da felicidade da declaração da independência seriam mais bem protegidos
por governos estaduais pequenos e locais.
Muitos americanos acreditavam que a confederação só existiria durante a guerra,
o Congresso Continental foi a única instituição central, com funções integradoras criada pelos
Artigos. Consistia em uma única câmara, pois nenhuma câmara aristocrática seria tolerada pel
espírito de 1776. No Congresso cada Estado tinha um voto e entre 2 e 7 deputados com
mandatos de 1 ano. Além da ausência de um executivo, durante os Artigos não havia judiciário
central, só existia o legislativo e quase sem poderes. As medidas legislativas deviam ser
aprovadas por 9 das 13 delegações e para alterar os artigos era preciso unanimidade.
Durante os Artigos, quando existia executivo, esse era limitado nos Estados,
existindo nesses, em contraposição aos Artigos a figura do senado, a segunda câmara de
aristocratas naturais para rever ações precipitadas do povo. Na “politica da liberdade” havia
dominância absoluta dos legislativos estaduais não só sobre o executivo, mas também sobre o
judiciário, subserviente ao legislativo, com decisões e prazos de mandatos controlados pelos
legislativos, bem como salários, emolumentos e com frequência assumiam as funções judiciais
tradicionais, como arbitrar sobre heranças, dividas e até casamentos e divórcios. Praticamente
todas as noções tradicionais de separação de poderes foram abandonadas nos Estados. O
pressuposto dominante era que um governo livre é aquele em que o legislativo do povo
governa. O único controle sobre o legislativo era o povo.
A ‘politica da liberdade’ sob os Artigos se expressava num igualitarismo agressivo.
70 a 90% dos homens adultos se tornaram elegíveis e isso mudou o perfil dos eleitos para
legislativos estaduais, com aumento de agricultores pequenos e médio e de homens de
recursos modestos em geral. Sob os artigos foram aprovadas leis redistributivas, que
enraiveceram os críticos, sendo que homens novos nos poderosos legislativos estaduais
ameaçavam interesses adquiridos e direitos privados. Muitos viam os legislativos estaduais
como tiranos que agiam sob o disfarce da liberdade. Concentração de poder e conclusão de
que ‘173 déspotas seriam sem duvidas tão opressores quanto um(...) não foi por despotismo
eletivo que lutamos.’. Os programas específicos eram ameaçadores do direito de propriedade.
O início do processo que culminou na Filadelfia foi uma disputa comercial entre
Virgnínia e Maryland sobre o embarque de carga no rio Potomac, a contenda foi resolvida na
casa de Washington em 1784, mas continuava a afetar outros estados vizinhos. Madison
convenceu o legislativo da Virgínia, seu estado, a convocar todos os demais para dar poderes
ao Congresso para tratar de comércio. O encontro foi fracassado, só 5 estados e 12 delegados
compareceram, mas a importância está no fato de entre os delegados estarem Madison e
Hamilton, entusiastas centralistas que propuseram nova convocação conjunta dos 5 estados
para todos os treze em maio próximo, na Filadelfia para considerar a situação dos Estados
Unidos e elaborar dispositivos para tornar a Constituição do Governo Federal adequada às
exigências da União.
Madison organizou a Convenção, chegou dias antes, escreveu ensaios sobre
formas de governo e criticas ao modelo dos artigos e ideia de reversão total de 1776.
“Deixemos que o governo nacional seja armado com uma autoridade positiva e completa em
todos os casos em que medidas uniformes são necessárias. Deixemos que tenha poder de veto
em todos os casos, não importa quais sejam, sobre os atos legislativos dos Estados, como o rei
da Grã-Bretanha teve até hoje. Deixemos que essa supremacia nacional estenda-se também ao
poder judiciário”.
Foram nomeados 74 delegados, 55 compareceram, 60% tinham frequentado a
universidade, 9 princeton, 4 Yale e 3 harvard. Com 34 advogados, seguidos de comerciantes e
fazendeiros. Delegados mais importantes eram Goerge Washington, herói nacional e Benjamin
Franklin, americano mais conhecido no resto do mundo, que contava com 81 anos na época.
Sobre os procedimentos vale mencionar que nenhum registro oficial de quem
votou pró ou contra foi feito; foi permitida a mudança de voto a qualquer momento,
favorecendo a conciliação; não circulou qualquer relatório das deliberações até o
encerramento, favorecendo a mudança de votos e evitando pressões externas. A votação era
por delegação e um ponto para entrar em pauta precisava de 7 votos. Com as deliberações
secretas o conhecimento posterior decorre das anotações de Madison.
CONSTITUIÇÃO
No cerne das discussões entre os dois lados estava a disputa entre um modelo
denominado republicano pelos federalistas e um modelo de democracia participativa pelos
antifederalistas. Em Madison era possível distinguir republicas pela existência de cargos e
representantes, em contraposição às democracias onde o povo governa diretamente.
Republica tinha conotação negativa e Madison conseguiu a façanha de incorporar o conceito
geralmente de forma de governo mais democrática em contraposição ao status quo e
monarquia, geralmente relacionada com pequenas unidades geográficas. A façanha foi
apropriar-se da palavra com conotações políticas para uma forma de governo que embora
baseada na aprovação popular, envolvia grave redução da participação popular. Seus críticos
poderiam chamar de nova ordem aristocrática ou monárquica, como o fizeram, mas para
Madison aquilo era república, em contraste com a democracia direta praticada com excesso
sob os artigos. República representa um sistema de filtragens.
O governo misto afirmava que a forma mais desejável de governo era não o
equilibro das funções mais sim o equilíbrio das forças sociais pois a mistura de todas as forças
não permitiria governos extremistas, propiciando moderação e sensatez. O pai dessa doutrina
era Aristóteles.
Eles tinham uma teoria política abstrata que definia tirania e liberdade se os
poderes estivessem ou não concentrados nas mãos de uma pessoa e uma teoria social
concreta que vincula um governo moderado e não extremista a um sistema que continha uma
mistura e equilíbrio de grupos sociais. Montesquieu já havia misturado as teorias no sec. XVIII.
Parte dos federalista entendia que após 1776 se havia abandonado demais a
tradição britânica, o que despertou em alguns círculos o desejo de restaurar um governo mais
equilibrado e misturado contra a supremacia legislativa dos artigo. Devolver ao judiciário não
só separação e independência, mas também controle potencial sobre as forças sociais que
controlavam os legislativos estaduais, como um freio sobre suas medidas injustas e insensataz.