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Semana de Arte Moderna

Realizada nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no


Teatro Municipal de São Paulo.

Representantes da música, da
literatura e artes plásticas expu-
seram seus trabalhos à apreci-
ação pública.

A Semana de Arte Moderna re-


presenta tudo o que se fez ime-
diatamente antes e nos 10 anos seguintes a fevereiro de
1922 e supõe, acima de tudo, rupturas e polêmicas.
Fases do modernismo brasileiro...

– Fase inicial: negação e destruição dos cânones anteriores.


Vai da exposição de Anita Malfatti, em dezembro de 1917, à
“festa” da semana de 1922;

– Fase de experimentação ou “fase heroica”: de 1922 a


1930;

– Fase de maturação ou estabilização: de 1930 a 1945.

“A gente se revolta, diz muito desaforo, abre caminho e se


liberta. Está livre. E agora? Ora essa! Retoma o caminho des-
cendente da vida”. (Mário de Andrade)
1. Os antecedentes da Semana de Arte Moderna

“Havia a reunião das terças, à noite, na rua Lopes Chave


[casa de Mário de Andrade]. Primeira em data, essa reunião
semanal continha exclusivamente artistas e precedeu mesmo
a Semana de Arte Moderna. Sob o ponto de vista intelectual
foi o mais útil dos salões, si é que se podia chamar salão
àquilo” (Mário de Andrade, 1942).

“Na garçonnière da Praça da República começou o


Modernismo. Arrastei para lá Mário de Andrade. Ali
estiveram Di Cavalcanti, Menotti del Picchia, Ribeiro
Couto [...]. Pode-se dizer que, depois da pobreza de
minha garçonnière na Praça da República, foi a casa de
Paulo Prado o centro ativo onde se elaborou o Moder-
nismo” (Oswald de Andrade, 1954).
A exposição de Anita Malfatti em dezembro de 1917

Características:

Arte expressionista e cubista

– a deformação do real;
– uso da figura como pretexto para a expressão;
– negação da arte acadêmica, clássica.
Crítica de Monteiro Lobato a Anita Malfatti...

“Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem normal-
mente as coisas [...]. A outra espécie é formada pelos que veem anor-
malmente a natureza e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a
sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos
da cultura excessiva. [...] Embora eles se deem como novos, precursores
de uma arte a vir, nada é mais velho do que a arte anormal ou terato-
lógica: nasceu com a paranoia e com a mistificação. [...] Essas consi-
derações são provocadas pela exposição da senhora Malfatti onde se
notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no
sentido das extravagâncias de Picasso e companhia”.
A descoberta de Victor Brecheret

Arte renovadora: esculturas monumentais, em cujas figuras de


músculos fortes e tensos, os críticos enxergavam a energia ner-
vosa do século XX.

O corpo humano ganhava novos contornos e formas, o que cor-


respondia à alteração que a figura humana adquirira nas artes re-
presentativas modernas.

“Foi sua arte magnífica que abriu os


nossos cérebros, [...] criando entre
nós uma arte forte, liberta, espontâ-
nea” (Menotti del Picchia).

(Monumento às bandeiras)
O triunfo das vanguardas

Movimentos inovadores que surgiram nas primeiras décadas do século


XX e que contribuíram decisivamente para a constituição da chamada
modernidade artística.

– Manifesto futurista, de Marinetti, publicado em Paris, em 1909;

– Cubofuturismo, manifesto russo, publicado em Moscou, em 1912;

– Expressionismo, manifesto alemão, de 1910 a 1920;

– Cubismo, de Apollinaire, manifesto francês, de 1913;

– Dadaísmo, liderado por Tristan Tzara, movimento suíço, de 1916;

– Surrealismo, liderado por André Breton, na França, entre 1922 e 1923.


Resumindo os principais acontecimentos que
antecederam à Semana de Arte Moderna...

1) reuniões semanais em lugares específicos para


discutir o estado da arte brasileira e as tendências
modernas;

2) a exposição de Anita Malfatti;

3) a escultura de Victor Brecheret;

4) as vanguardas do começo do século XX.


2. A Semana de Arte Moderna

– 1922: metáfora da independência cultural cem anos depois da indepen-


dência política.

– Teatro Municipal de São Paulo: “manifestação espetacular que aba-


lasse, pelo vulto e violência, o povo brasileiro” (Menotti).

– Presença da burguesia ilustrada: Paulo Prado (latifundiário e comer-


ciante de café), José Freitas Valle (deputado e empresário), Washington
Luís (presidente do estado), Blaise Cendrars (poeta suíço).

– Companheiros do RJ: Ribeiro Couto, Manuel Bandeira, Villa-Lobos,


Ronald de Carvalho, Sérgio Buarque de Holanda.

– Objetivo da Semana: destruir as velhas formas artísticas na literatura,


na música e nas artes plásticas; apresentar e firmar os princípios da cha-
mada arte moderna.
Teatro Municipal – Semana de Arte Moderna - PROGRAMAÇÃO

Programa do Primeiro Festival, segunda-feira, 13 de fevereiro

1ª parte:

Conferência de Graça Aranha: A emoção estética na arte moderna.

Música de câmera: Villa-Lobos

1. Sonata II de violoncelo e piano – (1916)

2. Trio Segundo: violino, violoncelo e piano – (1916)

2ª parte:

Conferência de Ronald de Carvalho: A pintura e a escultura moderna no Brasil.

3. Solos de pianos: Ernani Braga

4. Otteto – Três danças africanas


Programa do Segundo Festival, quarta-feira, 15 de fevereiro

1ª parte:

1. Palestra de Menotti del Picchia – ilustrada com poesias e trechos de prosa por
Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Plínio Salgado, Sérgio Milliet, Ribeiro Couto
e outros e dança pela senhorinha Yvonne Daumerie.

2. Solos de piano: Giomar Novaes

INTERVALO

Palestra de Mário de Andrade no saguão do Teatro

2ª parte:

1. Renato Almeida – Perennis poesia

2. Canto e piano – Frederico Nascimento Filho e Lucília Villa-Lobos

3. Quarteto Terceiro (cordas 1916)


Programa do Terceiro Festival, sexta-feira, 17 de fevereiro

1ª parte:

1. Trio Terceiro – violino, violoncelo e piano (1918)

2. Canto e piano: Mario Emma e Lucília Villa-Lobos


Historietas de Ronald de Carvalho (1920)

3. Sonata Segunda – violino e piano – (1914)

2ª parte:

Villa-Lobos:

4. Solos de piano: Ernani Braga

5. Quarteto Simbólico – (Impressões da vida mundana) – flauta, saxofônico, celesta


e harpa ou piano.
Balanço...
“O público, dividido em grupos, posicionava-se estrategicamente pa-
ra acirrar as vaias, desejadas, por sua vez, pelos artistas. Menotti con-
fessa ter ele e seus companheiros se decepcionado com a falta de reação
violenta na primeira noite. Aliás, por bom tempo comentou-se que os pró-
prios modernistas se encarregaram de organizar as vaias. Mas, segundo a
confiável fonte que é Mário da Silva Brito, parece não terem chegado a
tanto – embora nenhum escrúpulo os impedisse de ‘borrar às presas mais
algumas telas’ e misturá-las às verdadeiras, como ‘protesto contra o melo-
so e já decrépito academismo [...] dos novos ricos’, isto se confiarmos na
memória de Menotti, visto que ninguém mais menciona o fato”.

“Os modernistas da Semana estavam iniciando uma revolução profunda


que iria inclusive se radicalizar, sob o aspecto ideológico, nos anos
seguintes”.

(REZENDE, Neide. A semana de arte moderna. São Paulo: Ática, 1933. p. 42-43).
Os sapos

(Manuel Bandeira, 1922)

Enfunando os papos, Vai por cinquenta anos Lá, fugido ao mundo,


Saem da penumbra, Que lhes dei a norma: Sem glória, sem fé,
Aos pulos, os sapos. Reduzi sem danos No perau profundo
A luz os deslumbra. A formas a forma. E solitário, é

Em ronco que aterra, Clame a saparia Que soluças tu,


Berra o sapo-boi: Em críticas céticas: Transido de frio,
- "Meu pai foi à guerra!" Não há mais poesias, Sapo-cururu
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!". Mas há artes poéticas... Da beira do rio...

O sapo-tanoeiro, Urra o sapo-boi:


Parnasiano aguado, - “Meu pai foi rei!” – “Foi!”
Diz: - "Meu cancioneiro - “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.
É bem martelado.
Brada em um assomo
Vede como primo O sapo-tanoeiro:
Em comer os hiatos! - A grande arte é como
Que arte! E nunca rimo Lavor de joalheiro.
Os termos cognatos.
[...]
O meu verso é bom
Frumento sem joio. Longe dessa gritaria,
Faço rimas com Lá onde mais densa
Consoantes de apoio. A noite infinita
Veste a sombra imensa;
3. As propostas e as realizações da Semana

– o Municipal foi uma mostra heterogênea e matricial da melhor arte que


daí por diante se faria no país, mesmo não apresentando soluções esté-
ticas radicais;

– A Semana significou o fim da arte dominante: o academicismo plástico,


o romantismo musical e o parnasianismo literário;

– A desintegração do passado artístico, da linguagem tradicional;

– A atualização intelectual com as vanguardas europeias;

– O direito permanente de pesquisa e criação estética;

– A estabilização de uma consciência criadora nacional, preocupada em


expressar o país;
– Busca da expressão nacional:

a) 1924: luta por um abrasileiramento temático  sonha-se com a delimitação


de uma cultura brasileira, de uma alma “verde-amarela”;

b) nacionalismo que assume uma perspectiva crítica (e não ufanista), um tom


anárquico e desabusado;

c) celebração do primitivismo  questiona-se a origem do Brasil, estudam-se


as civilizações aborígenes e o folclore brasileiro, seus aspectos míticos e lendá-
rios da cultura popular, enfim, busca-se descobrir a essência do país.

Abaporu (“O comedor de gente”), de Tarsila do


Amaral. A partir dele, Oswald criou o movimento
da Antropofagia.
Na literatura brasileira, há dois momentos decisivos que mudam os
rumos e vitalizam toda a inteligência: o Romantismo, no século XIX
(1836-1870) e o ainda chamado Modernismo, no presente século (1922-
1945). Ambos representam fases culminantes de particularismo literário
na dialética do local e do cosmopolita; ambos se inspiram, não obstante,
no exemplo europeu. Mas, enquanto o primeiro procura superar a
influência portuguesa e afirmar contra ela a peculiaridade literária do
Brasil, o segundo já desconhece Portugal, pura e simplesmente: o
diálogo perdera o mordente e não ia além da conversa de salão. Um fato
capital se torna deste modo claro na história da nossa cultura; a velha
mãe pátria deixara de existir para nós como termo a ser enfrentado e
superado. O particularismo se afirma agora contra todo academismo,
inclusive o de casa, que se consolidara no primeiro quartel do século XX,
quando chegaram ao máximo o amaciamento do diálogo e a
consequente atenuação da rebeldia.

(CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. 2006. p. 118-119)


Na nossa cultura, há uma ambiguidade fundamental: a de sermos um
povo latino, de herança cultural europeia, mas etnicamente mestiço,
situado no trópico, influenciado por culturas primitivas, ameríndias e
africanas. Esta ambiguidade deu sempre às afirmações particularistas
um tom de constrangimento, que geralmente se resolvia pela idealização.
Assim, o índio era europeizado nas virtudes e costumes [...]; a
mestiçagem era ignorada; a paisagem, amaneirada. [...]
O Modernismo rompe com este estado de coisas. As nossas
deficiências, supostas ou reais, são reinterpretadas como superioridades.
[...] O mulato e o negro são definitivamente incorporados como temas de
estudo, inspiração, exemplo. O primitivismo é agora fonte de beleza e
não mais empecilho à elaboração da cultura. Isso, na literatura, na
pintura, na música, nas ciências do homem.

(CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. 2006. p. 126-127.)


4. Características na prosa e na poesia

– Liberdade de expressão

– Incorporação do cotidiano

– Linguagem coloquial

– Inovações técnicas: verso livre, enumeração caótica,


fluxo de consciência, colagem e montagem cinematográfica,
liberdade no uso dos sinais de pontuação.

– Paródia
“Vício na fala”, de Oswald de Andrade

Para dizerem milho dizem mio


Para melhor dizem mio
Para pior pio
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados

“Pronominais”, de Oswald de Andrade

Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do bom aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.
“Poética”, de Manuel Bandeira

Estou farto do lirismo comedido


Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
[protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor.

Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o


[cunho vernáculo de um vocábulo.

Abaixo os puristas.
“Uma canção”, de Mario Quintana

Minha terra não tem palmeiras...


E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.

Minha terra tem relógios,


Cada qual com sua hora
Nos mais diversos instantes...
Mas onde o instante de agora?

Mas onde a palavra "onde"?


Terra ingrata, ingrato filho,
Sob os céus da minha terra
Eu canto a Canção do Exílio!
“Infância”, de Carlos Drummond de Andrade

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.


Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu


a ninar nos longes da senzala -- e nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.
5. Revistas do modernismo

Documentos importantes para o conhecimento das propostas e conflitos de pers-


pectivas são os diversos manifestos e revistas publicados durante a década de 20
a 30.

Klaxon (maio 1922-jan. 1923): publicada em São Paulo e teve a


contribuição de Menotti del Picchia, Mário e Oswald de Andrade,
Manuel Bandeira. Busca do atual, culto ao progresso, aproveita-
mento do cinema na arte.

Estética (set. 1924-mar. 1925): publicada no Rio de Janeiro e


contou com a colaboração de Aníbal Machado, Mário de
Andrade, Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade. A
revista exorta o papel político da mocidade, na modernização,
nacionalização e universalização do Brasil.
A Revista (jul. 1925-jan. 1926): publicada em Minas Gerais
e teve como diretores Martins de Almeida e Carlos Drummond
de Andrade. Avalia o modernismo fora do eixo Rio-São Paulo.

Verde (set. 1927-maio 1929): publicada em Minas Gerais e teve


como colaboradores Guilhermino César, Ascânio Lopes e
Francisco Inácio Peixoto. Serviu de elo entre o pau-brasil e a
antropofagia e divulgou as revistas argentinas Proa e Martin
Fierro.
Festa (ago. 1927-jan. 1929; 1934-1935): publicada no Rio de Janeiro e
representa a corrente espiritualista. Caracteriza-se pelo projeto de
revalorizar o lastro simbolista, que o modernismo em geral abandonara.
Participam desta revista Tasso da Silveira, Andrade Muricy, Cecília
Meireles, dentre outros.

Terra Roxa e Outras Terras (jan.-set. 1926): publicada


em São Paulo e contou com colaborações de Sérgio
Milliet, Mário de Andrade, Alcântara Machado, Manuel
Bandeira, Sérgio Buarque de Holanda e Luís da Câmara
Cascudo. Enfoque no “brasileirismo”.
6. Os movimentos primitivistas
Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1926)

– junção do moderno e do arcaico brasileiro;


– ironia contra o bacharelismo;
– luta por uma nova linguagem;
– descoberta do popular

Manifesto antropófago (1928)

– questiona a estrutura política, econômica e cultural brasileira;


– questiona a sociedade patriarcal e seus repressivos padrões de conduta;
– questiona a imitação não digerida das influências da metrópole;
– questiona o indianismo na sua feição ufanista e romântica.

Verde-Amarelo (1924) e Anta (1928)

– movimentos que se opuseram ao primitivismo destruidor e debochador de


Oswald, reforçando o sentimento de brasilidade, o nacionalismo conservador e
uma visão direitista no plano social.
Manifesto Antropófago
(Publicado por Oswald de Andrade na Revista de Antropofagia, São Paulo, em 1º
de maio de 1928.)

1. Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente.


Filosoficamente.

2. Tupy, or not tupy, that is the question.

3. Mas nunca admitimos o nascimento da lógica entre nós.

4. Nunca fomos catequizados. Fizemos foi carnaval.

5. A fixação do progresso por meio de catálogos e aparelhos de catálogos


e aparelhos de televisão. Só a maquinaria e os transfusores de sangue.
6. O pater famílias e a criação da Moral da Cegonha: Ignorância real das
coisas + falta de imaginação + sentimento de autoridade ante a pró-
curiosa.

7. Antes de os portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha


descoberto a felicidade.

8. A nossa independência ainda não foi proclamada. Frase típica de D.


João VI: -- Meu filho, põe essa coroa na tua cabeça, antes que algum
aventureiro o faça!
Ainda sobre a Semana de Arte Moderna, assista ao
documentário em

< https://www.youtube.com/watch?v=GRKio1yJeXA >


Vanguardas
Ruptura – choque – abertura
Cubismo
Pintura: Pablo Picasso (1905)
Literatura: Guillaume Apollinaire (1913)

“É como se Picasso tivesse andado cento e oitenta graus ao redor de seu


modelo e tivesse sintetizado suas sucessivas impressões numa única
imagem”.
Principais características na literatura:

– Fragmentação e decomposição de um objeto sob diferentes


ângulos;
– Simultaneidade;
– Sobreposição de diferentes planos;
– Ilogismo;
– Não aceitação de uma interpretação única e linear do texto
literário;
– Desconstrução da sintaxe, versos descontinuados.

O propósito da arte cubista era promover a decomposição, a


fragmentação e a geometrização das formas. Os artistas
apostaram na simultaneidade de visualizações permitidas a
partir da análise de um objeto, isto é, ele poderia ser visto sob
vários ângulos, embora sua totalidade pudesse ser inteiramente
preservada.
“Poema de sete faces”, de Carlos Drummond de Andrade

Quando nasci, um anjo torto Meu Deus, por que me abandonaste


desses que vivem na sombra se sabias que eu não era Deus
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. se sabias que eu era fraco.

As casas espiam os homens Mundo mundo vasto mundo,


que correm atrás de mulheres. se eu me chamasse Raimundo
A tarde talvez fosse azul, seria uma rima, não seria uma solução.
não houvesse tantos desejos. Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Eu não devia te dizer
Para que tanta perna, meu Deus,
mas essa lua
pergunta meu coração.
mas esse conhaque
Porém meus olhos
botam a gente comovido como o diabo.
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode


é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do
bigode,
Futurismo
Literatura: Filippo Marinetti
Principais princípios do futurismo:

– Celebração da técnica e da velocidade: exaltação da imagem de um novo


mundo;
– Valorização do desenvolvimento industrial e tecnológico;
– Desvalorização da tradição e do moralismo;
– Desprezo pelo passado: ruptura e destruição do passado;
– A valorização, na arte, do imprevisto e da revolta;
– Elogio do “caráter higiênico das guerras”.

Principais características na literatura:

1. É preciso destruir a sintaxe, dispondo os substantivos ao acaso, como nascem.


2. Deve-se usar o verbo no infinitivo, para que se adapte elasticamente ao
substantivo e não o submeta ao eu do escritor que observa ou imagina.
3. Deve-se abolir o adjetivo para que o substantivo desnudo conserve a sua cor
essencial.
4. Deve-se abolir o advérbio, velha fivela que une as palavras umas às outras.
5. Abolir também a pontuação.

– Uso de onomatopeias (palavras com sonoridade que imitam ruídos, vozes, sons
de objetos) nas poesias;
– Poesias com uso de frases fragmentadas para transmitir a ideia de velocidade.
“O amor – poesia futurista”, de Oswald de Andrade

A Dona Branca Clara

Tome-se duas dúzias de beijocas


Acrescente-se uma dose de manteiga do Desejo
Adicione-se três gramas de polvilho de Ciúme
Deite-se quatro colheres de açúcar da Melancolia
Coloque-se dois ovos
Agite-se com o braço da Fatalidade
E dê de duas em duas horas marcadas
No relógio de um ponteiro só!
“Metalúrgica”, de Oswald de Andrade

1300° à sombra dos telheiros retos


12000 cavalos invisíveis pensando
40 000 toneladas de níquel amarelo
Para sair do nível das águas esponjosas
E uma estrada de ferro nascendo do solo
Os fornos entroncados
Dão o gusa e a escória
A refinação planta barras
E lá em baixo os operários
Forjam as primeiras lascas de aço
Expressionismo
Pintura: Van Gogh, Munch
Literatura: Kasimir Edschmid

O grito, de Edvar Munch


A mãe morta e a criança, de Edvar Munch
– Visão trágica do ser humano: abordava questões mais
dramáticas dos sentimentos humanos, como medo, solidão,
ciúme, miséria, prostituição, etc.
Por vezes, eram retratadas situações acerca da vida, da morte e
do mundo espiritual.
– As obras refletiam estados emocionais e mentais dos artistas
que, através de sua arte, externavam um enfoque pessimista da
realidade que viviam.
– Deformação da realidade do mundo: tendo em conta que a
subjetividade é uma das principais características do
expressionismo, os artistas dessa vanguarda sentiam-se livres
para apresentar a realidade conforme sua própria percepção.
– O expressionismo tem suas origens vinculadas à Primeira e à
Segunda Guerras Mundiais, à Revolução Russa, às tentativas de
instauração de uma república socialista na Alemanha.
– Os expressionistas pregam um humanismo algumas vezes
ingênuo, algumas vezes mesclado de utopia, em que combatem a
violência e a hipocrisia burguesa.
– Os principais temas foram: 1) a derrocada do mundo burguês e
capitalista; 2) a denúncia desse universo de crise; 3) a sensação
de impotência em face de “um tempo sem alma”; 4) visões
apocalípticas e negativistas; 5) a deformação grotesca do mundo.

Principais características na literatura:

– Análise minuciosa do subconsciente;


– Uso de metáforas exageradas e/ou grotescas;
– Linguagem direta, com frases curtas;
– Estilo associativo.
“Crepúsculo do inverno”, de Georg Trakl

Zeus escuros de metal


Nas vermelhas revoadas
passam gralhas esfaimadas
sobre um parque fantasmal
Rompe um raio glacial
ante pragas infernais
giram gralhas vesperais;
sete pousam no total.
Na carniça desigual,
bicos ceifam em segredo.
Casas mudas metem medo;
brilha a sala teatral.
Ponte, igrejas, hospital
hórridos na luz exangue.
Linhos grávidos de sangue
incham velas no canal.
Dadaísmo
Literatura: Tristan Tzara
Pegue um jornal
Pegue a tesoura.
Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu
poema.
Recorte o artigo.
Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse
artigo e meta-as num saco.
Agite suavemente.
Tire em seguida cada pedaço um após o outro.
Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco.
O poema se parecerá com você.
E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade
graciosa, ainda que incompreendido do público.

(Tristan Tzara)
Principais características :

– Espírito de protesto;
– Espontaneidade, improvisação e irreverência artística;
– Anarquismo e niilismo;
– Busca do caos e da desordem;
– Teor ilógico e irracional;
– Caráter irônico, radical, destrutivo, agressivo e pessimista;
– Aversão à guerra e aos valores burgueses;
– Rejeição ao nacionalismo e ao materialismo;
– Crítica ao consumismo e ao capitalismo.
– Rompimento com os modelos tradicionais e clássicos;
– Faz uso do nonsense, ou seja, da falta de sentido da linguagem, as
palavras são dispostas conforme surgem no pensamento, a fim de
ridicularizar o tradicionalismo.
– Desordem nas palavras, incoerência,
“Ode ao burguês”, de Mário de Andrade

Eu insulto o burguês! O burguês-níquel,


o burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco! [...]

“Poema dadaísta”, de Regina Xavier

Mundo garra ave serpente


Máquinas sabedoria ponte
Potes crença mercúrio
Ventos imensidão lendas
Solitário metódico delírio
Dança ciranda
Ilusão.
Zero dólar (1978-1984), de Cildo Meireles
Surrealismo
Pintura: Salvador Dali, Louis Aragon, René Magritte.
Literatura: André Breton (1924)
Principais características:

– Tem a ver com o descobrimento do inconsciente por Sigmund Freud;


– Expressão do pensamento de maneira espontânea e automática,
pregando a revolta contra tudo aquilo que reprimia a liberdade;
– Ausência da lógica, resgate das emoções, exaltação da liberdade de
criação e do impulso humano, adoção de uma realidade superior;
– Valorização do inconsciente, da fantasia, dos sonhos, da loucura;
– As palavras deveriam ser escritas conforme viessem ao pensamento
sem seguir nenhuma estrutura coerente (automatismo literário);
– Escrita automática;
– Valorização das formas ilógicas e não-racionais do conhecimento,
permitindo ao artista uma liberação total;
– Estabelecimento de uma arte “mágica”, insólita, que surpreenda
continuamente;
– Criação de atmosferas de irrealidade e de delírio;
– Junção inesperada de objetos incongruentes;
– Elaboração de imagens extravagantes.
“Aproximação do terror”, de Murilo Mendes

Dos braços do poeta


Pende a ópera do mundo
(Tempo, cirurgião do mundo): --

O abismo bate palmas,


A noite aponta o revólver.
Ouço a multidão, o coro do universo,
O trote das estrelas

Já nos subúrbios da caneta:


As rosas perderam a fala.
Entrega-se a morte a domicílio.
Dos braços...
Pende a ópera do mundo.
“O espelho de um momento”, de Paul Éluard

Dissipa o dia,
Mostra aos homens as imagens desligadas da aparência,
Retira aos homens a possibilidade de se distraírem
É duro como a pedra,
A pedra informe,
A pedra do movimento e da vista,
E o seu brilho é tal que todas as armaduras, todas
as máscaras se tornam falsas.
O que a mão tomou desdenha tomar
a forma da mão,
O que foi compreendido já não existe,
A ave confundiu-se com o vento,
O céu com a sua verdade,
O homem com a sua realidade.
Questões do ENEM
01. (2010) O modernismo brasileiro teve forte influência das vanguardas europeias. A
partir da Semana de Arte Moderna, esses conceitos passaram a fazer parte da arte
brasileira definitivamente. Tomando como referência o quadro O mamoeiro, identifica-se
que, nas artes plásticas, a

(a) imagem passa a valer mais que as formas vanguardistas.


(b) forma estética ganha linhas retas e valoriza o cotidiano.
(c) natureza passa a ser admirada como um espaço utópico.
(d) imagem privilegia uma ação moderna e industrializada.
(e) forma apresenta contornos e detalhes humanos.
Texto I

02. (2015) Considerando a intencionali-


dade do artista, mencionada no Texto II,
e a ruptura da arte no século XX com o
parâmetro acadêmico, a obra apresen-
tada trata do(a)

(a) exaltação da figura masculina.


(b) descrição precisa e idealizada da
forma.
(c) arranjo simétrico e proporcional dos
elementos.
(d) representação do padrão do belo
(FREUD, L. Francis Wyndham. Óleo sobre tela, 64 x 52 contemporâneo.
cm. Coleção pessoal, 1993)
(e) fidelidade à forma realista isenta do
ideal de perfeição.
Texto II
Lucian Freud é, como ele próprio gosta de
relembrar às pessoas, um biólogo. Mais
propriamente, tem querido registrar
verdades muito específicas sobre como é
tomar posse deste determinado corpo
nesta situação particular, neste específico
espaço de tempo.
(SMEE, S. Freud. Köln: Taschen, 2010.)
03. (2015) O Surrealismo configurou-se
como uma das vanguardas artísticas
europeias do início do século XX. René
Magritte, pintor belga, apresenta elementos
dessa vanguarda em suas produções. Um
traço do Surrealismo presente nessa pintura
é o(a)

(a) justaposição de elementos díspares,


observada na imagem do homem no
espelho.
(b) crítica ao passadismo, exposta na dupla
imagem do homem olhando sempre para
frente.
(c) construção de perspectiva, apresentada
na sobreposição de planos visuais.
(d) processo de automatismo, indicado na
repetição da imagem do homem.
(e) procedimento de colagem, identificado no
reflexo do livro no espelho.

(MAGRITTE, R. A reprodução proibida. Óleo


sobre tela, 81,3 x 65 cm. Museum Boijmans
Van Buningen, Holanda,1937).
(VALENTIM, Rubem. Emblema 78. Acrílico sobre tela. 73 x 100 cm. 1978)

04. (2017) A obra de Rubem Valentim apresenta emblemas que, baseando-se em signos
de religiões afro-brasileiras, se transformam em produção artística. A obra Emblema 78
relaciona-se com o Modernismo em virtude da

(a) simplificação de formas da paisagem brasileira.


(b) valorização de símbolos do processo de urbanização.
(c) fusão de elementos da cultura brasileira com a arte europeia.
(d) alusão aos símbolos cívicos presentes na bandeira nacional.
(e) composição simétrica de elementos relativos à miscigenação racial.
(MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA. Oswald de
Andrade: o culpado de tudo. 27 set. 2011 a 29 jan.
2012. São Paulo: Prol Gráfica, 2012.)

05. (2013) O poema de Oswald de Andrade remonta à ideia de que a brasilidade está
relacionada ao futebol. Quanto à questão da identidade nacional, as anotações em torno
dos versos constituem

(a) forma clássica da construção poética brasileira.


(b) rejeição à ideia do Brasil como o país do futebol.
(c) intervenções de um leitor estrangeiro no exercício de leitura poética.
(d) direcionamentos possíveis para uma leitura crítica de dados histórico-culturais.
(e) lembretes de palavras tipicamente brasileiras substitutivas das originais.
06. (2012) Cara ao Modernismo, a questão da identidade nacional é recorrente na prosa e na poesia de vários
autores. Nessa perspectiva, leia o poema abaixo, de Mário de Andrade, intitulado “O trovador”, e, a partir dele,
responda à questão proposta.

01. Sentimentos em mim do asperamente


02. dos homens das primeiras eras...
03. As primaveras do sarcasmo
04. intermitentemente no meu coração arlequinal...
05. Intermitentemente...
06. Outras vezes é um doente, um frio
07. na minha alma doente como um longo som redondo...
08. Cantabona! Cantabona!
09. Dlorom...
10. Sou um tupi tangendo um alaúde!

Vocabulário: “asperamente” (v. 01) = de forma áspera; “arlequinal” (v. 04) = palhaço, farsante, divertido;
“cantabona” (v. 08) = remete ao som da batida dos tambores indígenas; “dlorom” (v. 09) = harpejo das cordas
do alaúde europeu; “alaúde” (v. 10) = instrumento musical.

Nesse poema, a questão da identidade nacional é

(a) abordada subliminarmente, por meio de expressões como “coração arlequinal” (v. 04) que, evocando o
carnaval, remete à brasilidade.
(b) verificada já no título, que remete aos repentistas nordestinos, estudados por Mário de Andrade em suas
viagens e pesquisas folclóricas.
(c) lamentada pelo eu lírico, tanto no uso de expressões como “Sentimentos em mim do asperamente” (v. 01),
“frio” (v. 06), “alma doente” (v. 07), como pelo som triste do alaúde “Dlorom” (v. 09).
(d) problematizada na oposição tupi (selvagem) x alaúde (civilizado, v. 10), apontando a síntese
nacional que seria proposta no Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade.
(e) exaltado pelo eu lírico, que evoca os “sentimentos dos homens das primeiras eras” para mostrar o
orgulho brasileiro por suas raízes indígenas.
“O farrista”
01. Quando o almirante Cabral
02. Pôs as patas no Brasil
03. O anjo da guarda dos índios
04. Estava passeando em Paris.
05. Quando ele voltou de viagem
06. O holandês já está aqui.
07. O anjo respira alegre:
08. “Não faz mal, isto é boa gente,
09. Vou arejar outra vez.” 07. (2017) A obra de Murilo Mendes situa-
10. O anjo transpôs a barra, se na fase inicial do Modernismo, cujas
11. Diz adeus a Pernambuco, propostas estéticas transparecem, no
12. Faz barulho, vuco-vuco, poema, por um eu lírico que
13. Tal e qual o zepelim
14. Mas deu um vento no anjo, (a) configura um ideal de nacionalidade
15. Ele perdeu a memória... pela integração regional.
16. E não voltou nunca mais. (b) repercute as manifestações do
sincretismo religioso.
(MENDES, Murilo. História do Brasil. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1992.) (c) descreve a gênese da formação do
povo brasileiro.
Vocabulário: “almirante” (v. 01) = comandante do (d) promove inovações no repertório
mar; “vuco-vuco” (v. 12) = confusão, suruba; linguístico.
“zepelim” (v. 13) = balão dirigível de forma (e) remonta ao colonialismo assente sob
alongada.
um viés iconoclasta.
Gabarito

01 – B
02 – E
03 – A
04 – C
05 – D
06 – D
07 – E

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