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Carcinoma de Pelve Renal e Ureter

1. Epidemiologia
 Carcinomas Uroteliais do Trato Urinário Superior (CTUS) são raros
 Correspondem a 5% das neoplasias uroteliais e 5 a 7% dos tumores renais. Incidem mais em
homens, brancos, e entre a sexta e sétima década de vida.
 Sua maior incidência ocorre em países da região dos Bálcãs (40% dos tumores renais)

2. Etiologia e Fatores de Risco


 As causas dos CTUS aparentam ser as mesmas dos tumores uroteliais de bexiga:
Tabagismo, analgésicos (principalmente fenacetina), agentes químicos industriais (derivados
de indústrias de borracha e de têxteis), consumo exagerado de café, nefropatia dos bálcãs,
ciclofosfamida, fatores hereditários, como algumas síndromes familiares (ex. Lynch II), infecção
urinária crônica associada a cálculos vesicais e obstrução (relacionadas a adenocarcinomas e
carcinomas de células escamosas também no trato alto)

3. Localização e Distribuição
 Os tumores de ureter são ainda mais raros que os de pelve renal, e ocorrem principalmente
em ureter distal (70%), seguido de médio (25%) e proximal (5%).
 O envolvimento bilateral (sincrônico ou metacrônico) ocorre em 1,6 a 6% dos casos
esporádicos.
 Cerca de 15 a 75% dos pacientes com CTUS, desenvolverão em até 5 anos câncer de bexiga
(disseminação descendente dos carcinogênios, maior tempo de exposição e contato destes
com a bexiga, e alto número de células uroteliais na bexiga, sujeitas a maior probabilidade de
mutações cancerígenas)

4. Patologia
 Carcinomas uroteliais representam 90% dos CTUS. Classificados conforme graduação
histológica em tumores de baixo e alto graus.
 Os carcinomas de células escamosas compreendem cerca de 10%, e aproximadamente 1%
corresponde aos adenocarcinomas.
 Sarcomas e linfomas são raros.
 Cerca de 50% dos tumores de pelve renal, ao diagnóstico, estão comprometendo lâmina
própria (T1) ou músculo (T2); para os de ureter estes valores são maiores (vide explicação a
seguir)
 Assim como os tumores de bexiga, 55 a 75% dos de ureter são de baixo grau e baixo
estadiamento

5. Prognóstico
 Os principais fatores prognósticos são: grau da lesão e estadiamento patológico.
 CTUS está associado com prognóstico ruim (pior para ureter em relação a pelve renal).
 Até 19% dos pacientes ao diagnóstico apresentam-se com doença metastática.
 A fina camada muscular da pelve renal e ureter, permitem penetração e invasão precoce,
comparado com a camada muscular mais espessa da bexiga.
 O parênquima renal apresenta-se como uma barreira à disseminação tumoral dos tumores de
pelve renal, enquanto a pequena quantidade de tecido periureteral, permite que os tumores
de ureter avancem mais rapidamente, conferindo-lhes pior prognóstico.
 A presença de carcinoma in situ está associada a pior prognóstico e maior chance de
progressão para doença invasiva.
6. Diagnóstico

6.1 Quadro Clínico


 Hematúria macroscópica ocorre em 56 a 98% dos pacientes.
 Dor lombar em 30%, e raramente massa palpável.
 Cerca de 15% são assintomáticos ao diagnóstico, sendo diagnosticados incidentalmente
através de exames de imagem.
 Sintomas sistêmicos podem incluir anorexia, perda de peso e dor óssea, e estão associados
geralmente a doença avançada

6.2 Exames de imagem

 A melhor forma de estimar o estadiamento tumoral dos CTUS é realizar a associação de


exames de imagem, visualização da aparência do tumor e o grau tumoral (biópsia).

TC/RNM:
 Para a finalidade de estadiamento, a Urotomografia computadorizada (TC) com reconstrução
tridimensional e a Ressonância nuclear magnética (RNM), são os métodos mais úteis.
 Avaliam trato urinário superior, lesões parenquimatosas renais associadas, determinam a
extensão da invasão, a associação com lesão fora do sistema coletor, a presença de
linfonodomegalias e metástases a distância.
 O aspecto de falha de enchimento é o achado típico sugestivo de CTUS, e ocorrem em 50 a
75% dos casos.

 Obrigatório avaliar o rim contralateral, não somente devido a possibilidade de bilateralidade,


mas também para determinar sua funcionalidade.

Cistoscopia/Ureteroscopia:
 Lesões não calcificadas e radiopacas requerem investigação adicional, com pielografia
ascendente (PA) ou ureteroscopia, com ou sem biópsia e citologia.
 Com o uso combinado da ureteroscopia, a urografia excretora (UGE) e a PA melhoram a
acurácia diagnóstica de 75%, para aproximadamente 90%.
 Ureteroscopia diagnóstica (com ou sem biópsia) tem emergido como conduta de eleição para
avaliação de lesões suspeitas de CTUS (a preocupação de que a biópsia possa ser
responsável por focos de disseminação desse tumores não tem respaldo na literatura)
 Identificada a lesão, faz-se biópsia com auxílio de um basket extrator de cálculos urinários ou
uma pinça de biópsia específica. Realizadas sob visão direta, essas biópsias concordam
entre 90 a 92% com o grau histológico da peça cirúrgica final após nefroureterectomia.
 Cistoscopia é mandatória para excluir lesão vesical

Nefroscopia percutânea:
 A nefroscopia percutânea também pode ser usada para diagnóstico e tratamento de CTUS,
principalmente de pelve renal.
 Pode ser útil para ressecção tumoral (uso de instrumentos maiores, como ressectoscópios),
biópsia ou simples visualização da lesão.

Citologia oncótica urinária:


 Ferramenta útil no diagnóstico dos CTUS.
 A infusão de solução salina na via urinária e aspiração (barbotagem), através de catéter
ureteral, melhora os resultados da citologia.
 Ideal é primeiro colher a citologia, e somente depois realizar a pielografia ascendente, com
solução contrastada (a exposição de contraste iônico, hiper-osmolar, às células uroteliais,
pode gerar anormalidades nos achados da citologia)

7. Estadiamento

Classificação TNM – American Joint Committee on Câncer (2002)

TNM Descrição
T Tumor primário
X Tumor primário não avaliado
0 Sem evidências de tumor primário
Is Carcinoma in situ
a Carcinoma papilífero não invasivo
1 Tumor invade o tecido conectivo subepitelial
2 Tumor invade camada muscular
3 Tumor invade além da camada muscular, tecido periureteral, gordura
peripélvica ou parênquima renal
4 Tumor invade outras estruturas adjacentes

N Linfonodos regionais
X Linfonodos não avaliados
0 Sem evidência de acometimento de linfonodos regionais
1 Metástase num único linfonodo com 2 cm ou menos em sua maior
dimensão
2 Metátase num único linfonodo maior que 2 cm, porém menor que 5
cm, ou múltiplos linfonodos menores que 5 cm em sua maior
dimensão
3 Metástase em pelo menos um linfonodo maior que 5 cm em sua
maior dimensão

M Metástase a distância
X Metástase a distância não podem ser avaliadas
0 Sem evidência de metástases a distância
1 Presença de metástase a distância

8. Tratamento

Algoritmo para tratamento Carcinoma de Pelve Renal e Ureter


Sintomas
(hematúria, dor lombar, etc.)

Urotomografia + Cistoscopia

Anormal Normal Tumor de bexiga

Se possível tratamento Se muito extensa RTU de bexiga


lesão para tratamento Observação Estadiamento
endoscoscópico
endoscópico

Ureteroscopia com Tratamento cirúrgico


biópsia / ressecção

Lesão pequena ou Lesão grande ou


única múltipla

Ressecção endoscópica Se pelve renal*


ou segmentar Se ureter*
Tratamento
Percutâneo Ressecção segmentar
vs. vs.
Nefroureterectomia Nefroureterctomia

* Lesões de alto grau são frequentemente invasivas e associadas com CIS, sendo a
nefroureterectomia opção mais apropriada.

8.1 Nefroureterectomia radical


 Indicação:
- Considerada o padrão-ouro para o tratamento de CTUS
- Tumores grandes, de alto grau e invasivos;
- Tumores grandes, multifocais ou recorrentes, baixo/médio grau, e não-invasivos, de
pelve renal ou ureter proximal.
 Técnica:
- Remover todo o ureter, incluindo a porção intramural e o meato ureteral (o risco de
recorrência em coto de ureter remanescente é de 33 a 75%)
8.2 Tratamento Conservador – Ressecções segmentares

8.2.1 Ressecção segmentar de Carcinoma de Pelve Renal (Cirurgia Poupadora de Néfrons)


 Indicação:
- Casos raros de tumores grandes e localizados, em rins únicos e tumores bilaterais
sincrônicos.
 A recorrência ipsilateral varia de 7 a 70%
 Obs.: em se tratando de tumor de alto grau, invasivo, órgão-confinado, este deve ser melhor
tratado por nefroureterectomia, mesmo que isso signifique a necessidade de diálise

8.2.2 Ressecção segmentar de Ureter

8.2.2.1 Ureterectomia segmentar e ureteroureterostomia


 Indicação:
- Tumores de baixo grau, não-invasivos, de ureter médio e proximal, muito grandes
para tratamento ureteroscópico;
- Tumor de alto grau ou invasivo, quando a cirurgia poupadora de néfrons deve ser
realizada para preservar função renal
 Recorrência:
Risco de recorrência ipsilateral é alto, em torno de 45%. Há relato de recorrência após
16 e 18 anos após cirurgia conservadora

8.2.2.2 Ureterectomia distal e reimplante ureteral (ureteoneocistostomia direta; ou com


bexiga psoica com ou sem retalho de boari)
 Indicação:
- Tumores de ureter distal que não podem ser removidos completamente
endoscopicamente. A maioria são lesões grandes, de alto grau, órgão confinada e invasivas.
 Risco de recorrência acentuado, como descrito acima

8.2.2.3 Ureterectomia subtotal ou total


 Indicação:
- Tumores multifocais e numerosos, quando há necessidade de poupar néfrons, por
déficit da função renal contralateral
 Técnica:
- Pode-se realizar a interposição de alça ileal, ou o auto-transplante renal para a fossa
ilíaca.
 Risco de recorrência acentuado, como descrito acima

8.3 Tratamento endoscópico

8.3.1 Ureteroscopia
 Indicação:
- Casos selecionados, em lesões pequenas, de baixo grau, e na presença de rim
contralateral com função debilitada ou rim único
- Pacientes com alto risco cirúrgico
- Nefroureterectomia é o tratamento padrão-ouro para tumores de alto grau, quando há
rim contralateral normal, mas o tratamento endoscópico pode ser considerado quando há indicação
imperativa de preservação de néfrons.
 Vantagens:
- Baixa morbidade, e manutenção de sistema fechado (diminui risco de exposição e
dispersão de células neoplásicas em superfícies não uroteliais)
 Desvantagens:
- Manipulação com pequenos instrumentos, com menor campo de visão e menor canal
de trabalho.
- Custo de freqüentes re-tratamentos em muitos dos pacientes (apesar de sobrevida
global equivalente ao tratamento com nefroureterectomia, quando indicação adequada)
 Técnica:
- A lesão deve ser primeiro biopsiada para análise histológica, se possível; e então
ressecada definitivamente. A preferência para ressecção é com o laser.
 Complicações (incomuns):
- Perfuração ureteral e estenose ureteral

8.3.2 Nefroscopia percutânea


 Indicação:
- Tumores grandes, localizados em pelve renal e ureter proximal.
 Vantagem:
- Possibilidade de usar instrumentos maiores, para remover maior quantidade de tumor;
possibilidade de manter uma sonda de nefrostomia e administrar terapia tópica adjuvante.
 Desvantagem:
- Maior morbidade em comparação a ureteroscopia, e o potencial de disseminação
tumoral fora do trato urinário.
 Técnica:
- A lesão deve ser primeiro biopsiada para análise histológica, se possível; e então
ressecada definitivamente.
- Realizar uma nefroscopia de controle (second-look) 4 – 14 dias após, para assegurar
que todo o tumor foi removido. Alguns autores recomendam uma terceira abordagem (third-look),
antes de remover a sonda de nefrostomia.

8.4 Terapia adjuvante

8.4.1 Após Procedimentos Conservadores


 Terapia de instilação via anterógrada (sonda de nefrostomia) ou retrógrada (por cateter
ureteral ou refluxo vesico-ureteral iatrogenicamente criado)
 Objetivo: tentativa de reduzir a alta taxa de recorrência ipsilateral
 Agentes: tiotepa, mitomicina C e BCG
Os dados são extrapolados do tratamento dos tumores de bexiga. A literatura carece de
estudos randomizados que comprovem vantagens inequívocas

8.4.2 Após Procedimentos radicais


 Quimioterapia sistêmica
 Combinação de metotrexato, vinblastina, doxorrubicina e cisplatina (MVAC). Combinação de
gencitabina e cisplatina (GC) pode substituir o esquema anterior em pacientes com
neoplasias vesicais.
 Remissões completas são raras, com duração de resposta limitada, determinando sobrevida
média de 12 a 24 meses na doença metastática. Ainda existem dúvidas quanto ao uso da
quimioterapia adjuvante. Estudos randomizados ainda são necessários.
9. Seguimento

- Exame físico, citologia oncótica urinária e cistoscopia


- trimestral – 1º ano
- semestral – 2º e 3º ano
- anual – em seguida

- Exame imagem lado contralateral (UGE ou PA)


- anual

- Ureteroscopia unilateral (pacientes submetidos a tratamento endoscópico)


- semestral – primeiros anos
- anual – em seguida

- Avaliação de metástases (alto risco progressão: alto grau, doença invasiva)

- Exame físico, raios-x de tórax, exames laboratoriais (cálcio, fosfatase alcalina, enzimas
hepáticas, hemograma e função renal)
- trimestral – 1º ano
- semestral – 2º e 3º ano
- anual – 4º e 5º ano
- após 5 anos – avaliação do urotélio somente
- TC ou RNM de abdome e pelve
- semestral – 1º e 2º ano
- anual – 3º ao 5º ano
- Cintilografia óssea
- quando sintomas de dor óssea ou elevação da fosfatase alcalina

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