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All content following this page was uploaded by Renato Parsekian Martins on 22 January 2021.
Controle de torque e
retração de incisivos
superiores: qual o
problema?
Renato Parsekian
Martins 1-6
Resumo
Palavras-chave
Todos sabemos que, ao aplicar uma força para de forças aplicado (a título de informação, se
lingual em um incisivo utilizando uma mecânica não houvesse a força sendo aplicada na coroa
Straight-wire, existe uma tendência de linguali- e somente a rotação fosse aplicada de alguma
zação desse dente. Como ortodontistas, podemos forma, os dois centros seriam coincidentes).
manejar como esse incisivo será movimentado
controlando as proporções momento/força. Ao aplicarmos uma força lingual de 100gF
Já conversamos sobre esse assunto em um em um incisivo, podemos modificar a movi-
artigo anterior, no qual o exemplo utilizado mentação desejada por meio da anulação da
era o de um canino 1. O mesmo ocorre com o tendência de lingualização. Mas, primeiro,
incisivo. Quando uma força distal está sendo para tomar essa decisão de como o incisivo
aplicada a um incisivo superior por meio de deverá ser posicionado ao final do tratamento,
braquetes e paralela ao plano oclusal, ela tende o ortodontista precisa não só apenas avaliar as
a incliná-lo para lingual. Isso ocorre porque a dimensões dentárias intra-arcadas e interar-
força está sendo aplicada abaixo do centro de cadas, mas também a face do paciente e as
resistência, que se localiza, aproximadamente, condições periodontais. Uma vez definida a
nos 2/5 cervicais da raiz (para facilitar, podemos posição desejada do incisivo, podemos seguir
dizer que ele está localizado, aproximadamente, às opções mecânicas:
no meio da raiz ou a 10 mm do centro da coroa) .2
Assim, uma força de “X” gramas aplicada no 1. Permitir uma inclinação descontrolada
centro da coroa tende a rotacionar o incisivo no do incisivo, por meio da ausência de um
sentido lingual em uma magnitude de 10 vezes binário (ou contra-inclinação ou momento)
a sua intensidade. Essa rotação ocorre ao redor produzido na interface canaleta-fio.
do seu centro de resistência, mas o incisivo 2. Produzir uma inclinação controlada do
rotaciona levemente apical desse ponto, já que incisivo, por meio da produção de um
também existe uma força “X” empurrando-o binário relativamente pequeno na interface
para lingual (Fig. 1). O ponto ao redor do qual um canaleta-fio.
dente rotaciona é chamado de centro de rotação. 3. Produzir uma translação do incisivo, por
Esses dois centros (de resistência e de rotação) meio de um binário maior, que anularia
podem ou não coincidir, dependendo do sistema totalmente a lingualização.
Entretanto, deve-se ter cuidado com grandes Figura 2: Estimativa de movimentação de um incisivo sendo
lingualizações descontroladas, pois o ápice lingualizado por uma força de 100 gF, sem qualquer aplicação
radicular se movimenta para anterior (Fig. 2 e 3). de binário nos braquetes, isto é, o controle é zero. A tendência
Essa mecânica pode gerar iatrogenias se a de rotação é dada pela força multiplicada pela distância
perpendicular de sua linha de ação de força ao centro de
escolha pela movimentação descontrolada for
resistência. Observa-se que, nessa situação, o centro de
para um caso não indicado. rotação é levemente apical ao centro de resistência. Em (A),
a força está diagramada no braquete; em (B), o sistema de
Para seguirmos a segunda opção, na qual forças está diagramado no centro de resistência.
deseja-se controlar o ápice radicular para que
ele não se movimente na direção oposta da
coroa, é necessária a aplicação de um binário
em terceira ordem, o que conhecemos como
torque (Fig. 4). No arco contínuo, utilizamos
uma torção no fio ou escolhemos, a priori, uma
prescrição adequada junto a um fio de dimensões
determinadas, a ser utilizado na retração para a
aplicação desse binário (Fig. 5). Nesse momento
é que podemos encontrar algumas controvérsias
na Ortodontia, que gostaríamos de esclarecer.
A. B.
Podemos especular se, em vez das opções acima, Figura 3: Figura 2 modificada. Como estamos descrevendo
uma curva reversa ou uma dobra gable poderiam uma mecânica de fio contínuo, iremos estimar as movi-
mentações com as canaletas seguindo a posição vertical
controlar a inclinação dos incisivos. A resposta
dada por um fio guia de rigidez supostamente infinita e
aqui é: depende. Não só a falta de precisão no
desconsiderar as forças verticais produzidas por ele (tudo
posicionamento da curva pode gerar forças a título de compreensão sobre o assunto descrito neste
verticais, aumentando o atrito no deslizamento, artigo). Nessa figura, o incisivo foi inclinado de maneira
mas também a própria posição dessas “pré-ati- descontrolada 15 graus. Um fio guia de formato redondo
poderia ser utilizado para permitir a rotação do braquete
vações” pode não produzir os efeitos desejados3.
e dente ao redor dele. Dependendo da posição do incisivo,
Colocar o gable (ou curvatura) quando estamos
do quanto ele seria retraído, da prescrição do braquete e
fazendo uma retração dos quatro incisivos pode do tamanho da canaleta, até mesmo um fio retangular
até funcionar4, mas a partir do momento que a calibroso poderia permitir esse movimento.
A.
Enquanto vinte graus de gable parecem ser exemplo, isso é feito com molas pré-calibradas,
suficientes para gerar uma inclinação contro- nas quais a força das alças diminui com a
lada dos incisivos em uma retração dos quatro desativação em uma proporção maior que o
incisivos feita com alças3,7, no caso de retrações gable. Já no caso de retrações por deslizamento,
por deslizamento existem mais variáveis que seria necessário trabalhar com os mesmos altos
podem influenciar os resultados, como o atrito binários para produzir translações. Entretanto,
e a altura do ponto de aplicação da força, por os fios ortodônticos podem defletir na região
exemplo. Mesmo utilizando braquetes com mais anterior e não ter a capacidade de recuperação
inclinação vestibulolingual pré-programada elástica total, o que pode acarretar num colapso
(prescrição) ou alterando a torção dos fios, é anterior da arcada. Muitas vezes, os ortodon-
importante que o ortodontista mantenha o tistas podem abrir mão de extensões nos arcos
controle do paciente durante a retração (Fig. 6). para retração (power arms). Isso facilitaria a
possibilidade de translação, pois a linha de
Na terceira opção, que pediria por uma movi- ação da força de retração mais próxima do
mentação de corpo, a mecânica torna-se mais centro de resistência requer um menor binário
complicada para que os incisivos realmente para contrapor a retroinclinação do incisivo
sejam movimentados de corpo. Mecânicas com causada por ela.
alças em “T” pouco ativadas e produzidas em
beta-titânio poderiam produzir as proporções Na quarta opção, fica muito difícil, se não impos-
binário/força (ou momento/força) compatíveis sível, produzir binários dentro da interface cana-
com a translação (Fig. 7). Entretanto, costuma- leta-fio em proporção tão alta (de 12/1 a 14/1) para
mos fazer essa movimentação em dois passos, que esse movimento ocorra ao mesmo tempo que
retraindo os incisivos primeiro por inclinação uma retração (Fig. 8). A tensão que os fios atuais
controlada e, depois, corrigindo as raízes, pouco teriam que produzir precisaria ser tão alta que,
a pouco. Na técnica do arco segmentado, por possivelmente, causaria uma deformação dos
próprios fios. O binário necessário para produzir Essa correção radicular sem a retração (pois ela já
uma inclinação radicular concomitante à retração foi feita) poderia ser realizada com o mesmo arco
teria que ser, aproximadamente, 2,5 a 3 vezes de retração. Se alças foram utilizadas, o gable deve
maior que o produzido por uma alça em gota ser ativado, mas sem ativação horizontal das alças,
para retração controlada. Nessas situações, inde- e, caso a retração tenha sido feita por deslizamento,
pendentemente da técnica utilizada, parece que torções ativas na região dos incisivos podem ser
a melhor opção seria retrair os incisivos com necessárias, acompanhadas de braquetes pré-pro-
controle para, depois, realizar a correção radicular. gramados com grande inclinação vestibular.
CONCLUSÃO REFERÊNCIAS
Abstract
INTRODUCTION: Incisors retraction demands
control over the torque of these teeth. The mechan-
ics used needs to be different depending on how
the orthodontist wishes their positioning at the
end of the treatment. OBJECTIVE: This article
aims to explain, in a simplified manner, what is
necessary for the orthodontist to control the torque
of maxillary incisors during retraction. The rela-
tionship between the applied retraction force and
the binaries to control the lingualization effect will
be discussed and illustrated. CONCLUSION: When
the orthodontist plans to retract the incisors, either
to close spaces or to distalize the entire arch, it is
necessary to plan their final axial positioning and
plan how the mechanics will be performed. It should
not be forgotten that in order to have control of Como citar: Martins RP. Torque control and maxillary incisor retraction: what
is the problem? Clin Orthod. 2020 Aug-Sept;19(4):62-9.
the incisors, there must be binaries within the
orthodontic wire-bracket slot interface. Enviado em: 17/07/2020 - Revisado e aceito: 08/08/2020
DOI: https://doi.org/10.14436/1676-6849.19.4.062-069.bio
Keywords
Orthodontics. Orthodontic wires. Endereço para correspondência: Renato Parsekian Martins
Moment-to-force ratio. E-mail: dr_renatopmartins@hotmail.com