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DIREITOS HUMANOS
1. Introdução
Ressalta-se que há diversas teorias que incidem sobre a disciplina de direitos humanos,
sendo assim, não raras vezes, é objeto de estudos de pós-doutorado.
Importante não confundir as principais teorias dos direitos humanos — teoria do status
e teoria das gerações — com as chamadas teorias críticas dos direitos humanos.
Essas últimas, objeto desta unidade, criticam uma visão majoritária sobre o que se
entende por direitos humanos e sua efetivação. Visam, portanto, oferecer um olhar
diferenciado, por meio de algumas posições filosóficas e doutrinárias, fugindo do
majoritário, do senso comum, em uma visão analítica sobre o que se entende e porque
se respeitam ou desrespeitam os direitos humanos.
Portanto, elas não criticam os direitos humanos. As teorias críticas não vão contra os
direitos humanos, pois são um olhar crítico, um olhar especialista sobre esses direitos
— se eles, de fato, são ou não respeitados ou como deveriam ser respeitados.
Dentre os autores críticos, merecem destaque Boaventura de Souza Santos, Karl Marx,
Giorgio Agamben, Michael Foucault, Joaquín Herrera Flores e David Sanchez Rubio.
Trata-se de um método de análise dos direitos humanos surgida a partir dos estudos de
um filósofo espanhol chamado Joaquín Herrera Flores, que foi professor na
Universidade Pablo de Olavide de Sevilha e faleceu em 2009.
Em sua obra Se Deus fosse um ativista dos direitos humanos, Boaventura pontua que a
hegemonia dos direitos humanos como linguagem de dignidade humana é hoje
incontestável. No entanto, a realidade demonstra que a maioria da população mundial
não é sujeito dos direitos humanos, sendo apenas sujeito de discursos desses direitos.
No mesmo julgado, o STF pontuou que a responsabilidade por essa falha estrutural é
dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), cabendo a este último retirar os
demais da inércia, coordenando ações voltadas à resolução do problema; bem como
monitorar a sua implementação.
Ainda segundo Carlos Alexandre, na mesma obra, citado na ADPF nº 347, exige-se para
o reconhecimento do estado de coisas inconstitucional, no caso concreto:
b) que a União libere, sem qualquer tipo de limitação, o saldo acumulado do Fundo
Penitenciário Nacional para utilização na finalidade para a qual foi criado, proibindo a
realização de novos contingenciamentos.
Um bom exemplo de choque em relação ao tema está disposto no Estatuto do Índio, Lei
nº 6.001/1973, em seu art. 57, ao abordar a tolerância de penalidades penais próprias
dos grupos tribais, desde que revistam caráter cruel ou infamante, proibida a pena de
morte.
Art. 57. Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições
próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não
revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.
Ora, essa visão de que um tratamento cruel e infamante atenta contra os direitos
humanos é uma visão ocidentalizada, porquanto em determinados grupos tribais há
rituais de passagem da infância à vida adulta, revestidos de crueldade, infamantes, mas
que são uma honra para os jovens que a eles se submetem.
O mesmo pode ser dito em relação à cultura oriental, que, não raras vezes, se
contrapõe à ideia de direitos humanos ocidentalizada, especialmente nos países árabes.
Exemplo disso está disposto na Constituição Federal de 1988 (CF/1988), art. 170, que a
ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
tendo por fim garantir a todos uma existência digna, revelando também um viés liberal
e social ao mesmo tempo, demonstrando esse entrelaçamento do Estado aos direitos
humanos.
Em suma, percebe-se que os direitos humanos, em que pese terem surgido de ideias
revolucionárias, tendem a ser avessos a essas mesmas ideias, em um movimento de
subsunção ao direito estatal, abandonando o viés emancipatório.
Nesse ponto, surgem questões como o trabalho infantil, a redução à condição análoga a
de escravo, o tráfico de pessoas.
Art. 1º Todo membro que ratifique a presente Convenção deverá adotar medidas
imediatas e eficazes para assegurar a proibição e eliminação das piores formas de
trabalho infantil, em caráter de urgência. (Grifos nossos).
Art. 3º Para efeitos da presente Convenção, a expressão "as piores formas de trabalho
infantil" abrange:
Há, portanto, o espraiamento dos ideais sociais no estudo dos direitos humanos. A
partir disso, a teoria de Jellinek estuda a estrutura de tais direitos, observando o seu
comportamento e revelando, sob essa perspectiva, que existem estágios de interação
entre os indivíduos e o Estado.
Nesse âmbito, é importante saber que, em verdade, a Teoria dos Status é uma
passagem, isto é, a evolução do jusnaturalismo para o positivismo. Contexto no
qual o positivismo passou abarcar conceitos jusnaturalistas de direito divino,
positivando-os por meio de um procedimento que observa alguns estágios de interação,
denominados de status.
Desse modo, consoante Jellinek, há quatro estágios de interação dos indivíduos entre si,
e entre o Estado e esses indivíduos, quais sejam:
a) Status passivo.
b) Status negativo.
c) Status ativo
d) Status positivo.
Inicialmente, é importante observar que, em prova, o assunto costuma ser cobrado por
meio de conceitos ou exemplos, nos quais o enunciado questiona em que status
determinada norma se encaixaria. Dessa forma, a cobrança costuma ocorrer, por
exemplo, nos seguintes moldes:
Nesse sentido, os tipos de status mais cobrados em prova costumam ser o negativo e o
positivo. Isso se dá pelo fato de haver um consenso doutrinário sobre a aplicação desses
conceitos, diferentemente dos demais. Outrossim, o examinador costuma confundir o
candidato invertendo os conceitos de status passivo com negativo, ou do status ativo
com o positivo. Posto isso, passa-se à apresentação de cada um deles.
As normas de direitos humanos que possuem status passivo são caracterizadas por
posição de sujeição e subordinação ao Estado. Logo, são normas que o Estado
impõe e codifica por meio dos pactos sociais, observando o caráter independente dos
poderes, que devem ser exercidos de forma harmônica. Nesse ínterim, tome-se como
exemplo a descriminalização do aborto e a regulamentação do casamento
homoafetivo, ou seja, temas que constituem maior embate na sociedade.
As normas do status negativo, por sua vez, tratam de limitações impostas ao Estado,
ou seja, as garantias de que suas ações não desrespeitarão os direitos do homem.
Tem-se, em essência, a esfera das liberdades individuais, as quais demandam uma
postura negativa e de abstenção do Estado.
Acrescente-se que o status negativo é o que cai com maior frequência na prova, na
medida em que é o mais simples, pois trata de liberdades individuais.
Nesse sentido, tem-se como exemplo os direitos sociais em espécie, como o direito à
educação, que é constitucionalmente previsto, estando presente, inclusive, na
Declaração dos Direitos Humanos e em diversos outros instrumentos jurídicos que
positivam a sua existência.
Contudo, para que o cidadão exerça o seu direito à educação, é necessário que o Estado
intervenha, fornecendo as ferramentas de maneira a garantir que uma pessoa tenha
acesso a esse direito, como a criação de escolas, criação de concursos públicos para a
contratação de professores, fiscalização etc. O mesmo processo vale para o direito à
saúde, que demanda a criação de hospitais, contratação de profissionais etc.
Contudo, ressalte-se que perpassar por esses períodos entre gerações não garante o
estabelecimento efetivo e completo deles. Isso porque, conforme estabelecido por
Rudolf von Ihering, “o fim do Direito é a paz; o meio de atingi-lo, a luta”. Portanto,
a transição de uma geração para outra não indica, necessariamente, que os direitos que
foram objeto daquela foram completamente conquistados, havendo momentos de
intersecção entre gerações.
Logo, para desenvolver a teoria das dimensões, Vasak observou uma Revolução Liberal,
5. Crítica Marxista
Para Karl Marx, Direito é uma forma de legitimação e manutenção das estruturas de
concentração do capital, com função de manutenção do status quo, de concentração do
capital na mão da burguesia.
Assim, ele era avesso à atuação dos direitos humanos dentro desse contexto. Em sua
obra A questão judaica, ele traz, pela primeira vez, uma visão crítica dos direitos
naturais do homem (e, principalmente, aqueles invocados na Revolução Francesa),
apontando uma visão crítica que é chamada de crítica de denúncia, melhor dizendo,
da mistificação ideológica em abstrato dos direitos humanos.
Em uma análise crítica dos direitos humanos invocados pela Revolução Francesa
(1789), Marx não enxergava a proteção a todo e qualquer ser humano pela sua simples
condição de ser humano, mas apenas a um ser humano pertencente a uma pequena
classe denominada burguesia, deixando à margem o proletariado.
Nessa ordem de ideias, Marx explica que a declaração distingue duas classes de
indivíduos destinatários de proteção: os homens, classe trabalhadora, proletariado,
cujos direitos se limitavam a manter o status quo, vale dizer, continuariam oprimidos e
exercendo suas funções como meros trabalhadores. Já os cidadãos, classe burguesa,
detentora do poder econômico, buscariam emancipação política e uma implementação
real em seus direitos.
6. Crítica biopolítica
Nesse viés, o direito, inclusive os direitos humanos, acaba sendo utilizado pelo Estado
para conseguir extrair do indivíduo as suas potencialidades, de acordo com critérios de
interesse do próprio Estado em um determinado momento.
Esse controle, gestão, se dá por meio das taxas de natalidade, das estatísticas, de
benefícios assistenciais etc. Assim, o Estado controla a produtividade e a utilidade de
cada indivíduo, como também sua vida biológica.
7. Crítica descolonial
Essa crítica possui suporte principalmente em Joaquín Herrera Flores e David Sanchez
Rubio. Traz uma visão dos países do sul, uma visão latino-americana sobre os direitos
humanos, impregnada de necessidade de maior igualdade e, principalmente, uma visão
contra a hegemônica, ou seja, contra a concepção eurocêntrica e ocidental dos direitos
humanos.
Tem por base, ainda, as premissas da chamada filosofia da libertação, com expressão
na América do Sul, nos países latino-americanos e nos países em desenvolvimento, com
ampla desigualdade social, carecedores de direitos humanos básicos, como bem ilustra
a situação de estado de coisas inconstitucional vivida pelos sistemas carcerários.
Para ele, os direitos humanos, dentro das relações sociais do sistema capitalista,
passaram por três fases:
Para Herrera Flores, os direitos humanos acabam surgindo, evoluindo e sendo criados
dentro de um processo de expansão do sistema e das relações capitalistas. A crítica
feita é no sentido de que a concepção hegemônica, ou seja, a concepção ocidental e
atual de direitos humanos, se dá baseado na relação de produção do sistema
capitalista.
Em trecho extraído de artigo escrito pelo juiz do trabalho Grijalbo Fernandes Coutinho
(<https://www.conjur.com.br/2009-out-05/joaquin-herrera-flores-militante-
integralidade-direitos-humanos>), em homenagem a Herrera Flores, destaca:
Em suma, o interlocutor deve se ater para que os discursos sobre direitos humanos se
transformem, na verdade, em medidas de concretização desses direitos e,
principalmente, em processos de abertura e de consolidação de espaços de lutas para
entender e se compreender a dignidade humana.