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LUCAS LEONARDO

POR UMA
PEDAGOGIA DA
INICIAÇÃO AO
HANDEBOL
TALU Esporte Educacional
POR UMA
PEDAGOGIA DA
INICIAÇÃO AO
HANDEBOL
LUCAS LEONARDO

TALU Esporte Educacional


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Leonardo, Lucas
Por uma pedagogia da iniciação ao handebol [livro
eletrônico] / Lucas Leonardo. -- 1. ed. -- Goiânia : Talu
Esporte Educacional, 2019.
PDF
ISBN 978-65-00-02737-2
1. Educação física 2. Esporte 3. Handebol
4. Handebol - Treinamento 5. Inovações educacionais
6. Pedagogia I. Título.

20-40775 CDD-796.07

Índices para catálogo sistemático:


1. Pedagogia do esporte 796.07
Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964
“É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo,
vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si,
quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado
forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar
não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação
pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um
corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência
(...)” (Paulo Freire, Pedagogia da Autonomia, p. 23).
PREFÁCIO

É com imensa satisfação que escrevo o prefácio deste e-book, principalmente por saber o
grande trabalho por de trás destas páginas, em que cada texto foi pensando, estudado e
praticado antes de se tornarem palavras penetrantes no cotidiano de professores de
handebol dedicados à formação e ao ensino de qualidade.
Em uma época em que ainda existe resistência aos novos paradigmas do ensino dos
esportes coletivos, encontrar um material de fácil acesso e compreensão para incrementar
os estudos acerca das novas tendências de ensino no handebol é um deleite para os
amantes da modalidade.
Sim, o handebol é um esporte apaixonante, ainda não sabemos bem qual das suas
qualidades envolve mais os seus praticantes, se a dinâmica do jogo, se as habilidades
necessárias para o seu desenvolvimento, se a forte interação entre os jogadores. O que
sabemos é que muitos dos seus apaixonados foram conquistados desde o inicio, desde o
primeiro contato com a bola, com o gol, com os colegas. Vejo nestas páginas uma forma
de intensificar as qualidades desse esporte, a partir de boas experiências e,
consequentemente, do aprendizado atraente às crianças e jovens.
Ensinar o handebol não é tarefa fácil. Muitos diriam que basta apenas saber passar,
receber, driblar e arremessar, mas o jogo é muito mais complexo, dinâmico e imprevisível
do que a soma dos seus elementos técnicos. Ensinar por meio do aprendizado tático,
utilizando estratégias em que os alunos participem de corpo e mente é uma tarefa difícil,
que impõe ao professor a necessidade constante de atualização e busca por novos
conhecimentos.
É isso que este e-book tem como proposta, levar informação aos professores de handebol
que atuam na iniciação ao esporte, para que possam aperfeiçoar a sua prática cotidiana
com conteúdos pertinentes as crianças e jovens. Ele é o primeiro resultado de um projeto
chamado “Pedagogia do Handebol”, do qual também faço parte e que inclui a experiência
prática aliada aos estudos acadêmicos de professores e treinadores de handebol.
E, por saber e fazer parte dessa pedagogia que fico grata em escrever as palavras iniciais
deste trabalho. Espero que os leitores “curtam” e “compartilhem” as experiências destas
páginas.

Profa. Dra. Tathyane Krahenbühl

5
SUMÁRIO
01 INTRODUÇÃO........................07

02 UM OLHAR PEDAGÓGICO
SOBRE ALGUMAS REGRAS
DO JOGO................................10

03 CONSIDERAÇÕES
PEDAGÓGICAS PARA
QUALIFICAÇÃO DE SUA
INTERVENÇÃO
PROFISSIONAL......................16

04 PRINCÍPIOS ESTRATÉGICO-
TÁTICOS PARA O BOM
ACESSO AO HANDEBOL.......32

05 AVALIAÇÃO COMO ELEMENTO


PEDAGÓGICO........................37

06 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....41

07 DICAS DE LEITURAS E
RECURSOS PEDAGÓGICOS
DIGITAIS.................................43
01 INTRODUÇÃO

7
Este e-book é fruto de muitos anos de reflexão, estudos e aplicação de ações
pedagógicas voltadas à iniciação ao handebol no que tange distintos ambientes em que
atuei profissionalmente: escolas públicas e privadas, programas esportivos de
associações, clubes e prefeituras. Desde minha formação (bacharelado em 2005 e
licenciatura em 2007), o que não faltou em minha vida foi prática, horas de sol na cabeça,
contatos com muitas (muitas!) crianças e jovens e claro acertos e equívocos do ponto de
vista do processo e ensino, vivência e aprendizagem no handebol.
Procuro, com este material, sintetizar aquilo que deu certo, não só em termos
pedagógicos, mas também em relação ao alcance valores e habilidades para a vida
trabalhadas com tantos alunos e atletas com os quais tive convívio.
A ideia é, por meio desta síntese, oferecer a você aquilo o que eu não tive no início de
minha carreira, afinal, meu contato com o handebol se deu meio que por acidente na
faculdade, já que antes disso eu tive pouco contato com o handebol enquanto
manifestação esportiva, exceto pelas parcas oportunidades que tive na escola,
principalmente durante meus anos de ensino fundamental. Logo, minha experiência e
contato com a modalidade era praticamente nenhuma.
Mas, quando menos percebi, os caprichos do destino me colocaram em quadra tendo
como objetivo ensinar handebol. Foi ali que apesar de minha boa formação acadêmica (à
qual me possibilitou adotar condutas pedagógicas bastante coesas, embora com pouca
especificidade para o handebol, no início de minha carreira profissional) o conhecimento
específico me faltava e, ao contrário de hoje, que muitas iniciativas são encontradas pela
internet e o acesso a boas obras que abordam especificamente a linguagem mais técnica
da modalidade é mais fácil, tive que empreender um duro processo de investigação-ação
no meu dia-a-dia.
Muitos alunos que passaram por minhas mãos serviram para que eu experimentasse
possibilidades que imaginava serem interessantes. Muitas deram certo, outras tantas
deram errado, e foi neste processo que identifiquei que o ponto de partida de minha ação
enquanto professor/treinador advinha em grande parte dos conhecimentos que os
alunos/atletas já possuíam sobre handebol. Aprendi muito com cada um deles e foi assim
que me moldei professor e treinador de handebol.
Foram muitas horas de aprendizagem à beira da quadra, afinal, enquanto aqueles alunos
aprendiam eles me ensinavam o que dava certo e o que dava errado. Não é à toa que foi
durante todo este processo que pensei na possibilidade de dividir com tantos outros
colegas, em meados de 2007, meus êxitos por meio de um despretensioso blog, chamado
Pedagogia do Handebol, que foi inspirado no precursor Pedagogia do Futsal, elaborado
pelo prof. Wilton Carlos Santana, o qual admiro demais!

8
O pequeno blog foi tomando corpo e forma. Passada sua infância, na qual pude
manifestar ali minhas primeiras impressões e resultados aplicados que deram resultados
positivos, ele passou a representar uma forma de pensar o ensino do handebol que ainda
é muito peculiar pelo que percebo quando ando pelo Brasil ministrando cursos,
acampamentos, palestras e oficinas pedagógicas.
Esta diferença está no forte apelo que o JOGO (com letra maiúscula) possui em minha
conduta pedagógica, ao ponto de eu não conseguir ensinar handebol de outro modo. A
influência do jogo é tão latente em minha conduta profissional ao ponto de me fazer um
professor melhor com turmas lotadas do que com escassez de alunos. Ao ponto de
permitir que um aluno ou atleta que esteja comigo por longos anos seja capaz de
aprender handebol sem, em nenhum dia sequer, realizar um exercício de passes dois a
dois, por exemplo. Tudo deve ser Jogo!
Este pensamento peculiar não se manifesta apenas pela adoção de uma Pedagogia do
Jogo, como denomina o Prof. Alcides Scaglia, meu orientador e amigo, pois tange também
aspectos didáticos, os quais se fundamentam numa práxis permeada pelo interacionismo,
pela abordagem sistêmica e complexa, pela compreensão de que a aprendizagem é um
processo não-linear e que tem em seu centro o aluno.
Ensinar pelo Jogo é instigante e desafiador, pois o controle sai de minhas mãos e passa
totalmente aos seus jogadores, que jogam e são jogados pelo Jogo. Os jogadores,
mergulhados de corpo e alma naquele ambiente, se suspendem da realidade e, por
disporem com seriedade seus melhores atributos para resolver os problemas do Jogo,
possibilitam que emerja dali aprendizagem pura, contextualizada, criativa e subversiva.
Esta tríade formada e fundamentada numa metodologia pelo Jogo, numa pedagogia pela
autonomia e numa didática pela sensibilidade é que faz ser tão peculiar aquilo que há
alguns anos coloco em prática e tento transcrever em palavras no site Pedagogia do
Handebol.
Este e-book tem como foco a iniciação, o começo de tudo, que na realidade não é bem
começo, pois as crianças, jovens ou mesmo adultos iniciantes já possuem experiências
que vão ser determinantes para sabermos de onde partir.
Espero, sinceramente, que este e-book ajude você com informações que eu não tive, mas
que construí e aprendi, e que agora faço questão de compartilhar.

Bons estudos!
Prof. Lucas Leonardo

9
02 UM OLHAR
PEDAGÓGICO
SOBRE ALGUMAS
REGRAS DO JOGO

10
CONSIDERAÇÕES PEDAGÓGICAS SOBRE AS COBRANÇAS ACESSE TAMBÉM ÀS REGRAS
OFICIAIS DO HANDEBOL (CLIQUE
DOS TIROS NO JOGO DE HANDEBOL: AQUI)

No mundial de handebol feminino realizado na Dinamarca em


2015, o jogo entre Brasil x França entrou com certeza para a
história do handebol, principalmente, pelo gol da jogadora
Fabiana "Dara" Diniz efetuado no último segundo da partida
apartir da cobrança de um tiro de saída numa situação muito VEJA NO VÍDEO ESTE INCRÍVEL
LANCE (CLIQUE AQUI)
especial: a França jogava com uma atleta como goleiro-linha.
Este gol deu a vitória ao Brasil pela a vantagem de 1 gol.
Esta circunstância fez-me pensar em todas as possibilidades que
a cobranças dos diferentes tiros do handebol dão ao dinamismo
do jogo e que, por muitos motivos, são desconhecidos por muitos
professores e pelas crianças que praticam a modalidade.
Deste modo, resolvi apresentar de uma forma bastante resumida
e por meio de toques pedagógicos as ricas possibilidades que as
cobranças dos tiros nos oferecem no handebol. Seguem, de
maneira bastante didática, algumas considerações específicas
sobre cada um destes tiros.

BOX 1: ASPECTOS ESPECÍFICOS DAS COBRANÇAS DOS TIROS DO HANDEBOL:

Tiro de 7 metros - são cobrados das proximidades linha de 7 metros (sem poder tocá-la) sendo que após ser definido
pelo cobrador qual será seu pé de apoio (aquele que ficará em constante contato com o solo) este não poderá mais sair
do chão até que a bola tenha sido solta pelo atacante. É o pênalti do handebol (mas não chame de pênalti, ok?) e
precisa ser autorizado pelo árbitro para ser cobrado.
Tiro de Meta - toda bola que for controlada pelo goleiro, que parar dentro da área ou que sair pela linha de fundo após
ação da equipe que estiver atacando sem tocar em jogadores da defesa (com exceção do goleiro, que pode tocar à bola
sem ceder lateral ao adversário quando a bola sai pela linha de fundo) é considerada como bola fora de jogo. Ela só
pode ser retornada para o jogo após a cobrança de um tiro de meta, ou seja, após cruzar completamente a linha de da
área delimitada pela linha de seis metros. Não precisa de autorização do árbitro para ser cobrado e é o único tiro que
pode ser cobrado saltando.
Tiro Lateral - são assinalados quando a bola cruza completamente as linhas laterais da quadra e são cobrados do
exato local em que a bola saiu. Também são considerados tiros laterais as bolas que tocam nos defensores e saem pela
linha de fundo, sendo que neste caso, o tiro será cobrado da intersecção entre as linhas de fundo e lateral (no cantinho
da quadra). Não existe a denominação “escanteio” no handebol, apenas tiros laterais. A cobrança deve ser realizada
com um dos pés sobre a linha sendo o segundo pé livre para pisar em qualquer lugar (fora da quadra, sobre a linha,
dentro do campo de jogo ou mesmo estar no ar). Não precisa de autorização do árbitro para ser cobrado.

11
BOX 2: ASPECTOS ESPECÍFICOS DAS COBRANÇAS DOS TIROS DO HANDEBOL (CONTINUAÇÃO)

Tiro Livre - são concedidos por faltas cometidas, erros de execução técnica, após paralisações
do jogo e após o jogo passivo ter sido assinalado pelo árbitro. Nunca são cobrados depois da
linha tracejada (linha de tiro livre) da quadra adversária mesmo que a falta aconteça muito
próxima da área de 6 metros da equipe defensor. Neste caso, a bola é que deve recuar para
antes da linha tracejada (Figura 1). Quanto mais próximos da linha tracejada forem assinalados
os tiros livres, mais próximos do local exato deve ser realizada a cobrança. Existirá uma
tolerância para o local das cobranças dos tiros livres quando estes tiros se afastam do ataque e
se aproximam da área de gol defensiva. Nunca deverá haver a cobrança de um tiro livre da área
do goleiro e deve ser sempre realizada de dentro quadra (não confundir com basquete). Os
demais jogadores da equipe executante devem ficar fora da linha tracejada da quadra de
ataque, pois, segundo a regra 13.7 "Os árbitros devem corrigir as posições dos jogadores da
equipe executante que se encontram entre as linhas de tiro livre e da área de gol antes da
execução do tiro livre, se é que a posição incorreta tiver influência no jogo". Não precisa de
autorização do árbitro para ser cobrado.

Local da Falta
Local Cobrança do Tiro Livre

FIGURA 1. LOCAL DA COBRANÇA DE UM TIRO LIVRE EM FUNÇÃO DO LOCAL DA FALTA

12
BOX 1: ASPECTOS ESPECÍFICOS DAS COBRANÇAS DOS TIROS NO HANDBEOL CONTINUAÇÃO)

Tiro de Saída - são as cobranças realizadas do centro da quadra para reinício dos tempos do jogo ou após gols
assinalados pela equipe adversária. A cobrança deve ser realizada com um pé sobre a linha de centro e o outro
pé atrás dessa linha até que a bola seja solta pelo cobrador. Assim como o tiro de 7 metros, necessita de
autorização para ser cobrado. Após o apito, os demais jogadores podem correr para a quadra adversária
mesmo que a bola ainda não tenha sido passada, logo, o passe pode ser feito em qualquer direção da quadra.
No caso de início dos períodos da partida, todos os jogadores devem estar em suas meias quadras, mas
durante a cobrança de tiros de saída devido a gols assinalados, apenas a equipe que cobra o tiro deve estar em
sua meia quadra antes do apito do árbitro, podendo a outra equipe ainda estar na quadra adversária (não é
preciso esperar o retorno defensivo da equipe que acabou de fazer um gol).

ASPECTOS COMUNS DAS COBRANÇAS DOS TIROS DO HANDEBOL:


Com exceção ao tiro de saída e ao tiro de 7 metros, não é necessário autorização da arbitragem para
que nenhum outro tiro seja cobrado. Logo, seu aluno não precisa ficar esperando o árbitro apitar para
colocar a bola em jogo num tiro lateral, tiro de meta e em tiros livres. Isso pode dar aos seus alunos a
possibilidade de colocar bolas em jogo de forma mais dinâmica, de modo a tirar proveito desta
particularidade de regra para êxito ofensivo.
Para todos os tiros pode ser necessária a autorização da arbitragem para sua cobrança em
casos específicos previstos em regra (como a correção da cobrança que foi realizada de modo errado –
não há reversão no primeiro erro, por exemplo, do tiro de saída, tiro de meta, tiros laterais e tiros livres
– ou após o reinício do jogo que foi paralisado por motivos variados). Para todos os tiros, as equipes
possuem três segundos para realizar a cobrança após posicionados. Nos casos de correção, após o
apito da arbitragem, o executante do tiro terá novamente até três segundos para realizar a cobrança,
sendo a transgressão deste tempo punida com tiro livre para a equipe adversária.
Logo, num tiro de 7 metros, por exemplo, todas aquelas fintas são possíveis e permitidas pois há até
três segundos para a sua cobrança, transformando o tiro de 7 metros num jogo particularmente
interessante entre o cobrador e o goleiro, fazendo deste momento, um show à parte em nossa
modalidade. Devemos incentivar nossos atletas a aproveitar esta possibilidade plástica do handebol.
Vale ressaltar que o tiro de 7 metros não tem direito a correção em caso de erros, como tocar a linha de
7 metros ou ultrapassar os três segundos regulamentares.
Para todas as cobranças (com exceção ao tiro de meta) é obrigatória à equipe adversária que
mantenha uma distância mínima de três metros do local da cobrança. No caso do tiro de meta, o
goleiro está autorizado a cobrá-lo de onde achar mais pertinente dentro da área de gol - podendo
inclusive realizar a cobrança em movimento ou saltando (características exclusivas da cobrança de tiro
de meta).
Outra característica que nem sempre é explorada pedagogicamente pelos professores de handebol é a
compreensão de quaisquer tiros podem convertidos em gols conforme explica a regra 15.2. Sim,
independentemente de qual for o tiro, ele pode ser lançado diretamente ao gol adversário. Por incrível
que pareça, um tiro lateral pode ser arremessado diretamente ao gol (seus alunos sabem disso?). Isso,
que nos parece um pouco estranho inicialmente, pode ser explicado de forma muito simples: Todos os
tiros do handebol devem ser cobrados de dentro da quadra. Ao pisar na linha lateral, por exemplo, o
jogador está dentro da quadra, e se está dentro da quadra, é possível arremessar a gol sem maiores
problemas.

13
A REGRA DO SÉTIMO JOGADOR DE QUADRA E AS
COMPETIÇÕES DE HANDEBOL PARA CRIANÇAS E JOVENS:
REFLEXÕES

Os jogos olímpicos Rio 2016 foram palco para a implementação


de novas regras para o handebol, todas elas aplicadas, ao me CONHEÇA ESTAS NOVAS REGRAS
(CLIQUE AQUI)
ver, com êxito do ponto de vista regulamentar. Porém, de
imediato, uma situação ficou evidente: como serão suas
aplicações nas competições de crianças e jovens?
Até os 14 anos de idade, muitas competições optam pela VER MAIS EM: LEONARDO, LUCAS;
SCAGLIA, ALCIDES JOSÉ. ESTUDO
utilização de regulamentos adaptados ou regulamentos técnico- SOBRE REGULAM ENTOS NO
pedagógicos e, destacam-se quase sempre, adaptações HANDEBOL DE JOVENS : UMA
ANÁLISE DOCUMENTAL S OBRE O
funcionais ajustadas aos sistemas defensivos do jogo. USO OBRIGATÓR IO DO SISTEMA
É comum observar, por exemplo, a obrigatoriedade de serem DEFENSIVO INDIVIDUAL EM
COMPETIÇÕES SUB-12 E SUB-14.
realizadas defesas individuais em parte do tempo de jogo. Em REVISTA DA EDUCAÇÃO FÍSICA, V. 29,
meu estudo de mestrado, ao questionar a importância do uso E2952 , 2018 (CLIQUE AQUI)
deste tipo de adaptação à competição, treinadores e árbitros
entrevistados destacaram que a utilização de sistemas VER MAIS EM: LEONARDO, LUCAS; UM
ESTUDO DAS COMPETIÇÕES DE
defensivos individuais possibilitam, entre outras implicações, HANDEBOL DE JOVENS DO ESTADO
a simplificação dos papeis defensivos por meio da relação mais DE SÃO PAULO : CARACTERIZAÇÃO
objetiva de um defensor contra um atacante, o estímulo à maior DAS ADAPTAÇÕES COMPETITIVAS E
OPINIÕES DE TREINADORES E
participação nos jogos e também a ampliação dos espaços ÁRBITROS SOBRE SUAS APLICAÇÕES.
defensivos, possibilitando maior variabilidade de situações a DISSERTAÇÃO DE MESTRADO.
UNICAMP, 2018. (CLIQUE AQUI)
serem exploradas pelos jogadores com bola e sem bola.
Mas, e no caso de ser utilizada nestas competições o uso de sete
jogadores na linha, como passa a ser permitido agora
oficialmente no handebol? Isso significa permitir que as equipes
poderão abrir mão do goleiro e deixar em quadra sete
especialistas no ataque. Logo, ao invés do 6x6, haverá agora um
7x6.
Onde ficará o apelo pedagógico que justifica a utilização da
defesa individual agora?

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FIGURA 2. COMO UM JOGADOR PODERÁ MARCAR DOIS NA INICIAÇÃO? TAREFA DE DIFÍCIL APRENDIZAGEM!
(ILUSTRAÇÃO: NATHALIA SEVARDIO)

Ligas e federações, no anseio de serem pioneiras, podem inserir esta mudança em suas
competições sem refletir sobre este fato e grandes problemas de ordem de normatização
das condutas, punições e aplicações de regulamento em seus campeonatos são possíveis
de ocorrer. Isso é observado, por exemplo na Liga de Handebol do Estado de São Paulo
(LHESP) que mantém em seu regulamento a obrigatoriedade do uso do sistema defensivo
individual em metade do tempo total de jogo em convívio com a possibilidade de ser
utilizada o sétimo atacante no jogo.
Este é um assunto polêmico, cuja discussão se sustentada em dois vieses: um do ponto
de vista pedagógico, que defende a necessidade de se manter o sistema defensivo
individual obrigatório, porém, com a proibição do uso do sétimo jogador e outro, do ponto
de vista competitivo, que busca obter vantagens ofensivas para a conquista de resultados
a todo custo no esporte de crianças e jovens.
Minha opinião? Se o regulamento prevê obrigação de marcação individual é mais
prudente a não aplicação desta regra até os 14 anos de idade. Eu aposto num viés
pedagógico anterior ao viés competitivo. Porém, tomando como exemplo a LHESP, caberá
ao treinador agir por uma ética pedagógica ou por uma ética competitiva. A escolha será
nossa, portanto. Pesemos, agora, de qual lado nossa conduta deverá ser direcionada.

15
03 CONSIDERAÇÕES
PEDAGÓGICAS PARA
A QUALIFICAÇÃO DE
SUA INTERVENÇÃO
PROFISSIONAL

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O HANDEBOL É JOGO DE "FOMINHA" CONFIRA AQUI A DEFINIÇÃO DE
FOMINHA (TERMO BRASILEIRO), NO
Geralmente, entendemos que para garantir a participação de CONTEXTO DO ESPORTE COLETIVO.
todos durante um jogo de handebol o uso do passe é um aspecto
fundamental, pois assim todos pegam na bola e participam
efetivamente do jogo. Frente a esta concepção é normal que o
jogador fominha fique cansado de ouvir: "passa a bola!".
Existem algumas caraterística do handebol reguladas por suas
regras que podem colocar em xeque este conceito, afinal, são as
regras deste esporte que fazem o handebol ser diferente dos
esportes coletivos de invasão mais tradicionais (futebol, futsal OS ESPORTES COLETIVOS DE
INVASÃO COMO FUTEBOL., FUTSAL,
e basquetebol) e, por outro lado, o faz aproximar-se de outros BASQUETE, HANDEBOL, RÚGBI E
esportes coletivos de invasão que ainda ganham espaço em FUTEBOL AMERICANO POSSUEM
SEMELHANÇAS FUNCIONAIS, PORÉM
nossa cultura esportiva, como o futebol americano e rúgbi, por AS REGRAS DO JOGO SÃO UM FATOR
exemplo. DISTINÇÃO ENTRE ESTAS
MODALIDADES. VOU EXPLORAR
Quando vemos crianças jogando futebol, futsal ou basquete, não NESTA PARTE DO E-BOOK A IDEIA DE
é incomum que uma delas, quando dotada de muita habilidade na QUE AS REGRAS DO FUTEBOL
AMERICANO E DO RÚGBI PODEM
relação com a bola, consiga carregar sua equipe com suas TRAZER MAIS SEMELHANÇAS AO
jogadas individuais de maneira a quase não depender HANDEBOL DO QUE AS REGRAS DO
FUTSAL, FUTEBOL E BASQUETEBOL
ofensivamente de seus colegas para conseguir êxito. NO TOCANTE À ACEITAÇÃO DO
Em relação à disputa direta pela bola, estes esportes são CONTATO FÍSICO. VER MAIS SOBRE O
ASSUNTO CLICANDO AQUI
bastante punitivos. No futebol/futsal, isso corre pela dificuldade
para se recuperar a bola com os pés e pela limitação do contato
físico (visto sempre como anti-jogo). No futsal, assim como no
basquetebol, o contato físico que ocasiona falta é bastante
negativo para a equipe, pois em ambos os esportes após um
determinado número de faltas a equipe é punida com lances
livres ou tiros de 10 metros que ampliam bastante as chances de
as equipes infratoras sofrerem gols/pontos. No caso do
basquetebol, o contato físico acumulado por um jogador pode,
inclusive, excluí-lo do jogo.
Logo, se nestes esportes a aproximação física é tão prejudicial
para o desenrolar do jogo, há espaço para o surgimento dos
jogadores “fominhas” que com lances de habilidade podem tirar
proveito desta limitação defensiva e destacarem-se
individualmente.

17
Do ponto de vista pedagógico, para estes esportes, o “fominha” é ruim para o desenvolvimento
geral dos colegas da equipe, pois suas ações realmente excluem seus colegas do jogo. Talvez
nestes esportes, caiba a ideia de que o “fominha” prejudica de forma geral a participação dos
colegas da equipe.

MAS, NO HANDEBOL NÃO É BEM ASSIM.


VAMOS PENSAR SOBRE ISSO?

O handebol é um esporte cujas regras permitem de forma deliberada a utilização do contato


físico para fins defensivos (regras 8.1 b e c). Inclusive, a repetitividade de faltas, se realizadas
dentro dos parâmetros regulamentares, é considerada normal dentro do jogo, fato que
aproxima o handebol muito mais do rúgbi ou futebol americano se comparado ao futebol/futsal
e o basquetebol, pois no Handebol, assim como no futebol americano e no rúgbi, o contato
faltoso (permitido dentro de parâmetros regulamentares) é um recurso defensivo que pode ser
amplamente explorado.

BOX 3: O HANDEBOL É TAMBÉM UM JOGO DE CONTATO FÍSICO

No handebol, um jogador habilidoso frente a relação 1x1 em que ele esteja com a bola
conseguirá êxito frente ao seu adversário algumas vezes, mas aos poucos, outros jogadores
passam a ajudar e a cobrir seu companheiro na defesa. Logo, o 1x1 transforma-se em 1x2 ou
1x3, sempre alicerçado pela permissão do contato físico defensivo. Assim, a vantagem deste
jogador mais habilidoso vai deixando de ser vantagem individual e passa a ser vantagem
coletiva.
Deste modo, sugerir simplesmente para o “fominha” que passe a bola é o mesmo que sugerir
que um indivíduo com grande potencial de gerar desequilíbrios defensivos deixe de fazer isso,
passando a bola para um colega (que pode estar marcado ou em situação pouco clara de gol)
apenas pela obrigatoriedade de passar, inibindo-o da possibilidade de explorar seu potencial de
perigo ao sistema defensivo adversário.
Ensinar seus alunos a serem “fominhas” no handebol é mais importante do que os ensinarem a
serem passadores de bola, pois os alunos não podem perder individualmente a essência cabal
do jogo: pegar a bola e tentar fazer um gol. O passe surgirá como resultado. Um jogador após
aprender a ser “fominha” atrairá contra ele não só um, mas dois ou três defensores adversários
e, como consequência, um ou dois companheiros estarão livres para receber um passe.
Pronto! A necessidade de passar surge pela própria lógica do jogo.

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Talvez, no início, o aluno não enxergue seus companheiros e retenha demasiadamente a bola,
mas isso faz parte do processo de aprendizagem. Para que isso mude, basta criar atividades
nas aulas/treinos que estimulem a visão deste aspecto do jogo para que os primeiros resultados
coletivos surjam e as primeiras assistências a gol aconteçam (ver Box 3).

BOX 4: EXEMPLO DE JOGO PARA ESTÍMULO À PERCEPÇÃO DE QUE COLEGAS ESTÃO LIVRES – O PIQUE BANDEIRA INVERTIDO

O Pique-Bandeira Invertido estimula aos alunos perceberem


quando seus colegas estão livres.
ALVO
Neste jogo, duas equipes possuem bolas que devem ser levadas
para os alvos adversários ao mesmo tempo e marca ponto quem
primeiro atingir esse objetivo. Os jogadores sem bola não podem
ser congelados no campo de ataque, mas os jogadores com bola
sim. As regras impedem que o passe seja realizado para dentro
da área tracejada ou para o alvo e que seja realizada do campo
de defesa para o campo de ataque, e permitem ao jogador com
bola que corra em sua posse fugindo dos adversários. Se ele for
pego, deverá congelar e passar a bola, podendo voltar ao jogo
caso seu passe seja corretamente recebido pelo seu colega. O
ideal é jogar com números ímpares (5x5, por exemplo), pois
assim situações de 3x2 acontecerão com mais facilidade. Como
o jogador com bola é o único que pode ser congelado e que
pode marcar ponto, a tendência será de a defesa tentar impedir
que ele progrida com a bola, tentando tocá-lo. Isso cria situações
de vantagem espacial (representada pelas áreas hachuradas).
Será muito proveitoso o “fominha” deixar-se ser congelado para
realizar o passe para o colega livre. Isso o estimulará a produzir
um jogo de tendência coletiva a partir de sua individualidade.

FIGURA 3. JOGANDO O PIQUE-BANDEIRA INVERTIDO SEU ALUNO


APRENDERÁ A USAR SEU POTENCIAL INDIVIDUAL PARA O
ALVO
BENEFÍCIO COLETIVO

Tudo começa com o “fominha” que, por não conseguir por muito tempo ser fominha, deixará
seus colegas livres e o passe acontecerá sem que ele precise ser avisado disso por nós
professores.
Handebol é jogo de “fominha”, pois só assim os demais jogadores da equipe poderão receber
passes em situações que os façam efetivamente jogar em busca do objetivo maior do handebol:
fazer gols.

19
SOBRE O USO DO PASSE BALÃO NA INICIAÇÃO AO HANDEBOL: DE QUEM É A
CULPA?

Estamos muito acostumados com uma verdade indiscutível: o passe balão não funciona muito
bem no jogo de handebol.
Esta afirmação tem muitas justificativas e não quero aqui questioná-las, afinal, este tipo de
passe possui características que incidem negativamente no jogo (de maneira geral) por
diminuir a sua velocidade, por ser muitas vezes ser interceptado pelos adversários e por ser de
difícil recepção, pois quase sempre a bola advinda desse tipo de passe é disputada por um ou
mais jogadores concomitantemente. Logo, com base nestas características é comum que o
funcionamento do passe balão seja questionado, e com razão.
Porém, muitas vezes ouvimos ou dizemos ao atleta que realiza o dito passe balão: "Pare de
fazer passe balão!". Acerca disso, gostaria de fazer um questionamento: de quem realmente
será o problema? Do passador, dos colegas que vão receber o passe ou dos princípios
(definidos pelo professor) que orientam a aprendizagem das crianças?

VAMOS PENSAR SOBRE O ASSUNTO?

A CRIANÇA QUE ESTÁ COM BOLA GERALMENTE


AS CRIANÇAS QUE ESTÃO SEM BOLA
OPTA PELO PASSE BALÃO QUANDO:
GERALMENTE:
1. Um colega se encontra à frente, livre e com
1. Correm em direção ao gol adversário
condições de fazer um gol, então, o jogador
mantendo este sentido de corrida até se
em posse de bola opta por um passe longo e
aproximarem da área adversária e ali param,
alto para que a bola chegue ao seu colega;
levando consigo seus marcadores;
2. Uma criança está sendo pressionada pela
2. Ficam paradas pedindo a bola ao colega
marcação e procura colegas livres, mas sem
(verbalizando e gesticulando) mesmo que
sucesso, tenta fazer a bola chegar a algum
seu defensor direto esteja fechando a linha
deles por meio de um passe por cima do seu
de passe.
marcador direto.

SOMA-SE AINDA:

1. O princípio definido pelo professor de que o handebol é um jogo em que passar a bola é VER MAIS EM : “O HANDEBOL
fundamental para o sucesso da equipe. Logo, passar a bola transforma-se em um balizador de É JOGO DE ‘FOMINHA’” (P. 15-
todo o processo de aprendizagem do jogo; 17)

2. Crianças entendem que a bola deve ser passada sempre em direção ao gol adversário, pois
quanto mais perto do gol, maiores as chances de se marcar um ponto.

BOX 5A: CIRCUNSTÂNCIAS QUE PODEM FAZER UMA CRIANÇA OPTAR PELO USO DO PASSE BALÃO

20
Vamos analisar agora como os fatores retratados no Box 4A se influenciam ao longo de
um jogo:
• Situação 1: A criança tem a posse de bola e está livre, sem ninguém marcando.
Como correr em direção ao gol é a melhor opção, segundo o entendimento do jogo
das crianças, todos os seus colegas correm em direção ao gol adversário levando
com eles vários marcadores. A criança tem ainda como balizador de suas ações a
ideia de que passar a bola é fundamental para o sucesso no jogo de handebol.
Resultado: ela fica procurando um colega livre e, mesmo que ninguém esteja
realmente livre, ele realiza um passe longo e alto (passe balão) na expectativa de que
a bola chegue a um colega seu. Ele não percebe que estava livre e opta pelo passe.
• Situação 2: A criança tem a posse de bola e está sendo pressionada por um
defensor. Alguns colegas correram na direção do gol adversário e outros ficaram ao
redor da criança com a bola, marcados e parados, pedindo bola. Como esta criança
aprendeu que passar a bola é fundamental para o sucesso do jogo, ela fica parada
com a bola, se esquivando de seu adversário à procura de um colega livre.
Resultado: como todos estão marcados (longe demais, perto do gol adversário, ou
parados ao seu redor pedindo bola) ele opta por passar a bola por cima de seu
marcador (passe balão) para um dos amigos que estão próximos pedindo a bola.
BOX 5B: CIRCUNSTÂNCIAS QUE PODEM FAZER UMA CRIANÇA OPTAR PELO USO DO PASSE BALÃO

Analisando estas duas situações, podemos entender que o jogador que tem a bola
orienta-se pela ideia de que passar a bola é fundamental e que o passe deve ser no
sentido do gol adversário. Porém, em se tratando de iniciação ao handebol, a criança
deve aprender como princípio que o passe só deve ser realizado quando
necessário. Simplificando: ter a bola no handebol é uma grande vantagem, pois o uso do
ritmo trifásico (para deslocar-se ou fintar um adversário) e do drible são bastante seguros
nas idades iniciais, resultando em sucesso ou falta recebida (e respectiva manutenção da
posse da bola). Já o uso do passe nada mais é do que, momentaneamente, abrir mão da
posse de bola e colocá-la à sorte do jogo – a bola pode chegar ao destino ou ser
interceptada, tornando-se um risco assumido. O estímulo ao 1x1 deve ser muito mais
enfatizado neste período de aprendizagem do que o uso do passe como um princípio do
jogo. Ou melhor, passar está subjugado ao 1x1 , assim:
• Se o 1x1 funciona, para que passar? A criança deve primeiro vencer o confronto e,
então, buscar deslocar-se com a bola em direção ao gol adversário;
• Se, após o 1x1 a criança atrair outro marcador e um colega seu ficar livre, vale à pena
passar? Sim, pois o uso do passe é intencional e não um princípio regido pela ideia
de que passar a bola é obrigatório.
• Se o 1x1 não funciona, é bom buscar o passe? Sim. Após o fracasso, a bola deve ser
passada para um colega com a finalidade de que não se cometam infrações às regras
do jogo (andar, duplo drible e etc..).

21
Os jogadores que não têm a bola nas situações descritas, por
não compreenderem integralmente o princípio do desmarque, DESMARCAR-SE É UM MEIO TÁTICO-
TÉCNICO DO JOGO DE HANDEBOL NO
fazem do jogo uma espécie de corrida ao alvo adversário ou, QUAL UM JOGADOR QUE SE
então, fazem os jogadores optarem por se aproximar de seu ENCONTRA MARCADO BUSCA SE
LIVRAR DESTA MARCAÇÃO. MUITOS
colega em apuros para que a bola chegue até eles, ficando ali PODEM SER OS TIPOS DE
parados e pedindo bola. Como consequência, para que a bola DESMARQUE, MAS BASICAMENTE,
chegue a eles o passe deve ser alto, por cima dos marcadores DOIS SÃO OS MAIS RECORRENTES, O
DESMARQUE EM RUPTURA (EM
que estão fechando a linha de passe (passe balão). PROFUNDIDADE NA DIREÇÃO AO
ALVO ADVERSÁRIO) E O DESMARQUE
Deslocar-se em direção ao alvo adversário é apenas uma das EM APOIO (QUE SE DIRIGE-SE
possibilidades no jogo. A criança deve compreender que correr PREDOMINANTEMENTE EM LARGURA,
COM A FINALIDADE DE AJUDAR O
nesta direção deve ser o recurso mais importante do jogo e que JOGADOR COM BOLA). VER
só deve ser feito após estar livre de seu marcador. Mais do que DETALHES NA FIGURA 4.
correr numa única direção, a criança deve aprender a correr em
sentidos e direções diferentes por meio de pequenas mudanças
de aceleração e ritmo. Se a criança aprende a se desmarcar, a
linha de passe ficará livre e o passe balão dará lugar a passes
retos e quicados e, assim, o jogo ganha em velocidade e
objetividade.
PROFUNDIDADE

DESMARQUE
DESMARQUE EM APOIO
EM RUPTURA

LARGURA
FIGURA 4. POSSIBILIDADES BÁSICAS DE USO DO DESMARQUE QUE INICIANTES DEVEM APRENDER A DIFERENCIAR

22
CONCLUSÕES:
Observando tais situações e seus desdobramentos, bem
como o olhar para os princípios de aprendizagem que
são repassados às crianças, percebemos que a falta de
um olhar mais atencioso para os conteúdos a serem
aprendidos podem criar pequenos vilões que não tem
culpa nenhuma, afinal, ao utilizarem o passe balão a
crianças estão sendo vítimas de princípios que não
valorizam o momento de maior segurança do jogo:
aquele em que a bola está retida com um atacante e que
dificilmente é recuperada pelo adversário.
PARA SABER MAIS SOBRE O QUE Buscar a finta (1x1 por meio do uso do ritmo trifásico) é
É RITMO TRIFÁSICO VER EM:
“HANDEBOL NÃO É BASQUETE fundamental para que haja desequilíbrio defensivo e
COM GOLS: APRENDENDO O
RITMO TRIFÁSICO” (P.22-24) para que o passe seja utilizado como uma necessidade
e não uma obrigação. Além disso, desmarcar-se garante
abertura de linhas de passe, e assim o passe balão dá
lugar a bolas mais aceleradas e orientadas para
crianças livres, diminuindo erros de recepção e criando
situações de passe realmente eficientes.
Logo, não basta dizer "Não faz passe balão!", é
necessário utilizar princípios pedagógicos corretos para
que as crianças tenham ferramentas para não
realizarem os passes balões.
A culpa? É muito mais nossa, dos professores, do que
deles, as crianças.
Assim, da próxima vez que seus pequenos alunos
transformarem uma partida de handebol num festival de
passes balão, repita para si mesmo: "Eu estou
ensinando-os a fazer isso. Como mudar?“. Sustente-se
nas reflexões aqui apresentadas.

23
HANDEBOL NÃO É BASQUETE COM GOLS: APRENDENDO O RÍTIMO TRIFÁSICO
Apesar de ser bastante ilustrativa a comparação entre handebol e basquete (uso
habitualmente este recurso para introduzir o handebol aos iniciantes) pelo fato de ambos
os esportes possuírem muitas semelhanças funcionais, existem entre eles muitas
diferenças do ponto de vista regulamentar que influenciam diretamente ações táticas
individuais, como o deslocamento com a bola durante o jogo, por exemplo.
Deslocar-se com a bola nas duas modalidades pode ser operacionalizado por meio do
quique da bola, mas a semelhança termina por aí.
Enquanto que no basquete (com exceção à passada da bandeja e o uso do pé do pivô)
não é permitido andar com a bola, no handebol isso não é só permitido pelas regras,
como deve ser uma das primeiras coisas a serem ensinadas do ponto de vista da tática
ofensiva.
Andar ou correr com a bola faz parte da aprendizagem do handebol e, muitas vezes, por
haver confusão na comparação entre basquete e handebol, o ato de quicar acaba sendo
ensinado antes do ato de se deslocar com a posse da bola, o que pode ser um grande
erro do ponto de vista pedagógico.
Considerando as regras do handebol, o ato de deslocar-se segurando a bola é limitado
pelo uso de até três passos. Do ponto de vista tático, chamamos esta ação de ritmo
trifásico.
O ritmo trifásico é, em essência, a forma mais segura de se deslocar com a bola no
handebol, já que a posse de bola está garantida e dificilmente o adversário consegue
recuperá-la sem que faça alguma obstrução à regra. Já durante o quique da bola, a posse
de bola não é tão segura, havendo maior facilidade para o sucesso adversário na
tentativa de recuperar a bola para si.
Ainda, por regra, pode ser realizado o ritmo trifásico imediatamente após ser recebida a
bola para em seguida ser dada sequência ao deslocamento por meio do quique. Ainda,
depois de segurar a bola novamente, o jogador pode realizar um novo ritmo trifásico. Este
ciclo é denominado como duplo ritmo trifásico. Portanto, respeitando a sequência descrita
anteriormente, é permitido que até seis passos sejam dados com a bola, além de pelo
menos mais um durante o quique da bola, o que para um esporte de quadra é uma
grande vantagem ofensiva (lembrando que mais passos podem ser dados durante o
quique contínuo da bola).
Do ponto de vista do aprendiz, deslocar-se segurando a bola é sinônimo de segurança e
maior liberdade para jogar, mas ao iniciar a ação ofensiva pelo quique da bola pode-se
inibir o surgimento de ações individuais para resolver problemas do jogo como ultrapassar
um adversário já que quicando a bola pode ser muito fácil perdê-la para seu oponente.

24
Por isso, não é incomum ver algumas crianças, que por medo de
perder a bola para um defensor direto, optam por passar a bola (ou
VER MAIS SOBRE A melhor, se livrar dela) ao invés de impor uma ação ofensiva frente à
CONDUTA DE SE
LIVRAR DA BOLA EM:
relação de 1x1 diante desta situação, afinal, para o iniciante passar é
“SOBRE O USO DO mais simples do que quicá-la e acabar se tornando o responsável pela
PASSE BALÃO NA sua equipe perder a sua posse. Por isso deslocar-se com a bola antes
INICIAÇÃO AO
HANDEBOL: DE é tão importante.
QUEM É A CULPA?”
(P.18-21)
Como sugestão ao processo de aprendizagem de iniciantes, usar o
ritmo trifásico como primeiro conteúdo ofensivo é uma boa forma de
reduzir problemas futuros na formação de jogadores corajosos e
ousados no ataque. Logo, inibir o quique inicial pode ser muito
importante em médio e longo prazo, mesmo que um jogador muito
habilidoso tire vantagem na iniciação ao handebol pela sua facilidade
de utilizar o quique para progredir.

CORRER COM A BOLA? MAS A REGRA NÃO PERMITE ISSO! praticamente nenhuma.
É necessário, quando falamos de iniciação ao handebol, que seu aluno
Para ensinar handebol, existem métodos variados e procedimentos se sinta à vontade jogando, alegrando-se com a oportunidade de jogar
pedagógicos das mais diversas naturezas. Porém, quando um aluno handebol. Ele precisa ter a chance de acessar o jogo a partir de suas
chega para fazer sua primeira aula de handebol, dentro de nossa cultura possibilidades momentâneas.
esportiva, ele geralmente possui pouco conhecimento específico sobre Neste momento, nosso papel vai além da aprendizagem meramente
nosso esporte. Muitas vezes entende o handebol como um esporte esportiva. Precisamos, portanto, cativar o aluno para que ele
análogo ao futsal, mas que é jogado com as mãos. permaneça, por meio de nossa SENSIBILIDADE PEDAGÓGICA.
Embora haja semelhanças funcionais entre futsal e handebol e a quadra Mas, afinal o que significa isso?
seja muito parecida, são esportes cujos códigos que os definem Significa permitir que o aluno, mesmo indo contra as regras formais do
apresentam muitas diferenças. jogo, não seja punido continuamente e seja permitindo que o jogo
Nossa tendência inicial é ensinar resumidamente as regras do jogo e prossiga normalmente.
ensinar aspectos técnicos básicos como passe, arremesso, drible, ritmo Ter sensibilidade é, depois que o lance tenha terminado, você conversar
trifásico (o uso dos “três passos”) e etc. com o iniciante sobre o que ele fez e que não pode ser feito no jogo de
O handebol, sem dúvidas, tem tudo isso entre seus códigos, sua handebol. Ter sensibilidade é repetir isso quantas vezes forem
linguagem, mas cobrar a "execução correta" destes aspectos técnicos necessárias e permitir que o iniciante entenda esta regra aos poucos, de
logo no início pode ser frustrante aos iniciantes. modo que por meio de nossa intervenção sensível ao seu aprendizado,
Imagine que seu aluno receba a bola e saia correndo com ela, o próprio aluno passe a ser seu próprio regulador, pois
executando cinco ou seis passos para ultrapassar um colega adversário progressivamente ele perceberá se acertou ou se errou.
que está à sua frente. Isso fica evidente por suas próprias condutas durante o jogo. Você
Como você se comportaria frente a esta situação? Por regra, seu aluno perceberá que o próprio aluno tenderá a parar o lance por avaliar que
realizou uma infração. Por sermos sustentados tradicionalmente num exagerou no número de passos.
ensino técnico da modalidade, temos a tendência em punir prontamente Então, somente depois que este estágio de aprendizado já estiver
nosso aluno fazendo-o perder a posse de bola, como deve ser num jogo consolidado, é que as correções pontuais podem ser feitas, afinal, seu
de handebol. aluno já entende plenamente estas regras do jogo e os modos de fazer
Agora imagine que isso aconteça repetidamente em sua aula e a todo associados a essas regras.
momento seu aluno que tem a bola (o objeto mais desejado do jogo) Cativar o aluno por meio de ações sensíveis pode fazer toda a diferença
perde sua posse porque errou algum elemento da linguagem oficial do para o crescimento do handebol. É por isso que sair correndo com a
jogo de handebol. bola é sim parte do processo de ensino-aprendizagem de iniciantes à
Como será a experiência dessa criança em suas aulas ou treinos? prática de handebol.
Provavelmente, a chance deste aluno continuar em sua aula é

BOX 6: SENSIBILIDADE PEDAGÓGICA PARA O ENSINO DO RITMO TRIFÁSICO

25
Com base nestes pressupostos, o ritmo
trifásico pode ser abordado em:
1. Atividades para manutenção da posse de
bola, como o jogo dos 10 passes, informando
ao aluno que se nenhum colega estiver livre,
ele pode correr com a bola para se desmarcar
e achar um colega em condições de receber
um passe (Figura 5);
2. Atividades de progressão simples em jogos
No Jogo dos 10 passes, pode ser incluída a regra que permite aos
jogadores correrem retendo a bola. Aprender que se deslocar com a bola é como o “mamãe da rua”, “rio vermelho” e suas
uma forma de se movimentar no jogo (além do deslocamento com o quique variações, nos quais a criança tem que passar
da bola) é importante para a futura utilização do ritmo trifásico.
--------------------------------------------------------------------------------- segurando a bola de um lado para outro da rua,
FIGURA 5 JOGO DOS 10 PASSES mas se ela quicar e o pegador a tocar bola, ele
a perde (Figura 6);
3. Atividades voltadas para a aprendizagem da
Quicar

finta, que nada mais é do que uma forma


especializada do uso do ritmo trifásico, cujo
objetivo é deixar um adversário para trás por
Correr

meio da aceleração e desaceleração do


deslocamento com a bola, enganado o
defensor (Figura 7).
O importante, sobretudo, é compreender que
No jogo Mamãe da Rua o pegador poderá ter duas possibilidades de em se tratado das maneiras de se deslocar
vencer, uma se pegar o jogador que corre com a bola na primeira metade
da rua e a segunda recuperando a bola que ele obrigatoriamente quica com a bola o handebol não é uma espécie de
conforme a regra do jogo. Os jogadores com bola deverão obedecer às basquete com gols no lugar das cestas
regras de “Correr” e “Quicar”, senão trocam de lugar com o pegador.
--------------------------------------------------------------------------------- devendo ser estimulado o deslocamento livre
FIGURA 6. MAMÃE DA RUA COM BOLA com a bola para depois e progressivamente
limitar esta possibilidade para a utilização de
três passos.
No jogo de Sair do Círculo o Lembre-se: quicar a bola só deve ser
jogador com bola deverá
enganar seu oponente saindo enfatizado depois da tentativa de seu aluno em
do círculo com a bola, se deslocar com a retenção da bola.
ultrapassando a metade do
circulo que é defendido pelo
seu colega.
-----------------------------------------
FIGURA 7. SAIR DO CÍRCULO

26
TEMOS QUE TIRAR OS INICIANTES DA LINHA DE SEIS METROS! – UM OLHAR
PARA A APRENDIZAGEM DEFENSIVA
O esporte de alto nível, para muitos professores e treinadores, transforma-se num
importante referencial pedagógico, afinal, os modelos apresentados nestes cenários
competitivos apresentam as tradições e as novas tendências para o rendimento esportivo.
Uma tradição que influencia muitas condutas pedagógicas para o processo de ensino,
vivência, aprendizagem e treinamento no handebol está associada à utilização de
sistemas defensivos que atuam em forma de barreira, circundando à linha dos seis
metros que delimita a área do goleiro, e que tenham como conduta básica fechar os
espaços defensivos por meio da atuação dos defensores com braços sempre levantados
e induzindo ao ataque que realizem arremessos de longa distância, mais difíceis para
iniciantes.
Predomina neste modelo defensivo o acompanhamento coletivo da bola no sentido da
largura da quadra, ação tática denominada como basculação defensiva (Figura 8), que se
configura como a defesa ir e vir de um lado ao outro acompanhando o local onde se
encontra a bola.

FIGURA 8. NA BASCULAÇÃO, A DEFESA SE DESLOCA COLETIVAMENTE NO SENTIDO DA BOLA E FICA POUCO EVIDENTE AS
RELAÇÕES ENTRE OS ATACANTE DIRETOS. EXEMPLO DE APLICAÇÃO AO SISTEMA 6:0 (JOGADORES TRIÂNGULO)

Considerando que estamos num cenário de iniciantes com pouca experiência com a
modalidade, ou mesmo crianças entre 10 e 12 anos de idade, será este modelo defensivo
aquele que mais se ajusta às possibilidades de aprendizagem deste público?
Esta pergunta tem que ser compreendida sob dois pontos de vista, um estrutural
associado à forma como o desenho defensivo inicial se configura - neste caso o uso do
sistema defensivo 6:0 (Figura 8) - e outra funcional associada ao modo como a defesa se
ajusta em função do padrão organizacional defensivo - neste caso, jogando com a
predominância da basculação defensiva que resulta num sistema defensivo fechado e
demasiadamente preocupado em defender a meta.

27
Do ponto de vista estrutural, o uso do sistema defensivo
6:0 não é um problema, pois se trata de um modelo
defensivo tradicional com e contra o qual atletas de
handebol devem aprender a jogar. É parte da tradição
do esporte e deve ser um conteúdo de aprendizagem.
Do ponto de vista funcional, ao consideramos o público
de iniciantes, o uso exclusivo da basculação defensiva
pela defesa 6:0, que se justifica pela proteção da meta,
pode ser um problema em termos de aprendizagem e
desenvolvimento dos jovens iniciantes tanto do ponto de
vista defensivo como ofensivo. Isso pode ser justificado
pela forma como iniciantes no handebol compreendem o
jogo, fator que torna este público mais sensível à
aprendizagem de certos aspectos funcionais nesta etapa
de aprendizagem.
Bascular, significa ter maior atenção na localização da VEJA O SISTEMA DEFENSIVO 6:0 EM
FUNCIONAMENTO COM BASE NA
bola, de modo que muitos jogadores estejam próximos à BASCULAÇÃO DEFENSIVA (CLIQUE
região da bola, o que é bom do ponto de vista defensivo, AQUI)
principalmente num esporte em que o ataque tende a
predominar sobre a defesa. Porém, é um elemento tático
defensivo coletivo e mais complexo por enfatizar o jogo
de coberturas e sustentado no desequilíbrio intencional
do número de defensores e atacantes do lado oposto da
bola e que, portanto, necessita de uma série de
conhecimentos anteriores para que seja realizado de
forma adequada.
Logo, para bascular, jogadores devem dominar o
conceito de coberturas e ajudas. Para saber que está
cobrindo ou ajudando, o jogador deve entender que está
se prontificando a marcar, mesmo que
momentaneamente, o atacante que está sob a
responsabilidade de seu companheiro de equipe. Este
jogador deve entender que seu atacante direto será
deixado momentaneamente sem marcação ou será
marcado pela cobertura de outro colega da defesa. Veja
o quanto o uso da basculação é complexa.

28
Iniciantes que aprendem a defender por meio do sistema defensivo 6:0 somado à
orientação tática da basculação tendem a pular etapas de aprendizagem e deixam de
aprender aspectos essenciais, tais como o reconhecimento do seu atacante direto e a
necessidade de descentrar-se da bola.
O resultado do uso deste tipo de sistema defensivo pode até gerar poucos gols sofridos –
pois, assim como ocorre em termos de aprendizagem defensiva, também se exige de
atacantes que atuem com ações táticas ofensivas que sobrepujam as etapas de
aprendizagem ofensiva em que estão inseridos – mas, o custo disso em médio prazo pode
ser a formação de atletas que não estão devidamente "alfabetizados" dentro da linguagem
da modalidade.
A "linguagem" do handebol sustenta-se na simetria e assimetria numérica entre jogadores.
É um esporte de simetria numérica formado por seis confrontos de 1x1, mas que tem em
sua lógica a busca e situações de assimetria numérica momentânea retratadas em
situações de 3x2, 2x1 ou 1x0.
Logo, reconhecer quem é o atacante direto (Figura 9) é parte fundamental da linguagem do
esporte, pois os defensores passarão a entender a importância de manter a relação de 1x1
preservada ao máximo em termos defensivos ao longo do jogo e que, em caso de utilização
de coberturas defensivas, este jogador terá a consciência de que sua equipe será deixada
momentaneamente em desequilíbrio numérico.

FIGURA 9. RECONHECIMENTO DO ATACANTE DIRETO. A PRESENÇA DO PIVÔ CRIA UMA


SITUÃÇÃO DE 2X2, LOGO, DEIXA DÚVIDAS AOS DEFENSORES SOBRE QUEM MARCA O
PIVÔ E QUEM MARCA O ARMADOR

29
Algumas dicas pedagógicas podem ser seguidas, diante da
utilização do sistema defensivo 6:0, para estimular a construção
de um jogar mais adaptado às possibilidades de aprendizagem de
iniciantes no handebol:
Jogar com sistema defensivo 6:0 alinhado à linha de 9
metros: ao subir a linha defensiva aos nove metros uma regra
pode ser inserida nas suas aulas e treinos: "o defensor só poderá
descer para os seis metros se seu atacante direto correr para este
espaço". Ao retirar os iniciantes dos 6 metros, criam-se espaços
defensivos que estimulam aos atacantes buscarem pelos
desdobramentos, tabelas e penetrações e fintas (Figura 10). Isso
amplia a atenção dos defensores para reconhecer quem é seu
atacante direto – aquele mais próximo de sua zona defensiva –
para estabelecer com ele uma relação direta. Caso haja um
desdobramento, tabela ou penetração dos atacantes os
respectivos defensores poderão segui-los, por exemplo.
Incentivar antecipações do defensor ao seu atacante direto:
você pode criar pontuações especiais para defensores que
consigam antecipar bolas que seriam passadas ao seu atacante
direto. Isso estimula os defensores a reconhecerem quem é seu
atacante direto e os ajuda a manterem presentes em suas
condutas defensivas a tentativa de recuperação da posse de bola,
fundamental para o êxito no jogo de transição ofensiva .
Jogar sem a presença de pivôs: o pivô é um fator complicador VEJA UM EXEMPLO DE COMO A
UTILIZAÇÃO DESTAS REGRAS
para que iniciantes possam aprender a reconhecer seus atacantes CONDICIONANTES À UTILIZAÇÃO DO
diretos, pois ele é responsável por mudanças de orientação dos SISTEMA DEFENSIVO 5:0 EM QUE O
defensores sobre quais serão seus atacantes diretos (Figura 9). O ATAQUE JOGA SEM PIVÔ PODE
ENRIQUECER O AMBIENTE DE
pivô pode ser inserido depois que esteja claro aos iniciantes quem APRENDIZAGEM (CLIQUE AQUI)
eles devem marcar diretamente. Portanto, pode-se explorar jogos
com seis jogadores abertos ou mesmo um 4x4 ou 5x5 .

FIGURA 10. JOGAR COM DEFENSORES FORA DOS NOVE METROS E


SEM PIVÔ PODE ESTIMULAR A CRIATIVIDADE E FACILITAR O
RECONHECIMENTO DOS ATACANTES DIRETOS

30
CONCLUSÕES:
Diante de mudanças como estas, realizadas na organização de aulas e treinos (as quais
podem ser também transferidas para o ambiente competitivo de jovens, por meio de
adaptação de seu regulamento), os conteúdos de aprendizagem se ajustam às
necessidades e possibilidades dos jovens iniciantes na prática do handebol,
demonstrando que o problema não é a utilização do sistema defensivo 6:0, mas aquilo
que em termos de funcionamento do jogo é exigido dos iniciantes na prática do handebol.
Depois de aprender a reconhecer seu atacante direto os defensores passarão
gradativamente para a aprendizagem da cobertura defensiva, depois para a cobertura
preventiva (a ajuda) e, finalmente, a basculação defensiva poderá ser utilizada, uma vez
que os jovens jogadores já estarão efetivamente "alfabetizados" e compreenderão de
maneira mais completa as exigências do jogo defensivo.
Para isso, temos que tirar os iniciantes no handebol da linha dos 6 metros

31
04 PRINCÍPIOS
ESTRATÉGICO-
TÁTICOS PARA O
BOM ACESSO AO
HANDEBOL

32
BASES DE ATAQUE NO HANDEBOL: PROPOSTAS VOLTADAS AO PROCESSO DE
INICIAÇÃO AO HANDEBOL:

CONCEITO:
Ouvi pela primeira vez o termo “base de ataque” numa aula de pós-graduação no ano de 2009 ministrada
pela Professora Rita Orsi, em que estávamos discutindo os meios táticos ofensivos e defensivos do
handebol.
Ao ouvir este termo consegui, pela primeira vez, conceituar algo que tinha muita dificuldade de fazer: sempre
tive por princípio, a partir de um determinado momento do processo de ensino-aprendizagem, o ensino do
que eu chamava de “jogadas que não sejam estruturalmente fechadas”. Isso significa na prática ser capaz de
organizar uma sequência de movimentações encadeadas que possibilitam o surgimento de erros defensivos,
porém, oferecendo abertura suficiente para que o atleta tome de decisões perante as circunstâncias do jogo.
Ao ouvir o termo “base de ataque” consegui, finalmente, conceituar esta longa explicação acima descrita, no
que resumidamente descrevo como:
“A base de ataque é um conjunto de referências que orientam ações encadeadas pelos atacantes de
maneira a possibilitar vantagem para a tomada de decisão frente as circunstâncias do jogo. É o que
possibilita que todos falem a mesma ‘língua’ num dado momento da organização ofensiva”.

BOX 7: CONCEITUANDO O TERMO BASE DE ATAQUE

Ensinar bases de ataque, principalmente durante a iniciação ao handebol, deve respeitar


uma série de conceitos já assimilados dentro do jogo (de modo processual) embora
reconhecê-los (de modo declarativo) seja também importante. Porém, as referências que
orientam uma base de ataque não devem ser simplesmente verbalizadas para a equipe,
devendo ser vivida pelos nossos alunos de corpo inteiro. Cada base de ataque necessitará
de elementos táticos-técnicos que o precedem e que devam estar bem sedimentados
dentro do processo de ensino-aprendizagem. Exemplos básicos serão descritos à seguir:
Passar com segurança e eficiência: deixar a bola cair, passar nas costas de um jogador
que está se movimentando para frente, passar alto demais ou baixo demais são indícios
de que ainda não é o momento certo de se inserir dentro do planejamento o ensino de
bases de ataque. Os jogadores devem ser seguros na execução dos passes e na sua
recepção. Devem dominar estes conteúdos com excelente grau de competência. Isso já é
possível em iniciantes de 11 ou 12 anos de idade. Inserir regras durante a aula que deem
desvantagem no caso de a bola cair, por exemplo, é um bom recurso pedagógico para
que durante a ação de passar a bola haja muita atenção por parte de quem realiza este
passe. Assim, aprende-se a passar com responsabilidade e segurança.

33
Orientar-se sempre em direção ao gol adversário:
nenhuma base de ataque existe com intuito de afastar a
bola do gol adversário. Logo, ter domínio espacial que se
relacione com a capacidade de orientar-se com a bola e,
principalmente antes de receber a bola, na direção ao
alvo adversário é um elemento muito importante para que
as bases de ataque sejam ensinadas. Desde o período
em que se exploram a marcação individual e suas
variações e até mesmo no processo do ensino do ataque
zonal isso deve ser enfatizado. Iniciando pelo goleiro até
chegar ao jogador das extremidades (pontas), todos os
jogadores devem, a todo o momento, buscar o alvo
adversário dirigindo seu corpo para ele. Somente com
este aspecto competentemente assimilado é que as
bases de ataque podem ser inseridas no seu
planejamento.
NO ALTO-RENDIMENTO, TENHO Saber reconhecer vantagem numérica momentânea:
PERCEBIDO QUE AS SITUAÇÕES DE
VANTAGEM NÃO SE ASSOCIAM
uma base de ataque deverá ter como conceito básico a
APENAS À SUPERIORIDADE conquista de superioridade numérica momentânea, caso
NUMÉRICA, MAS TAMBÉM À BUSCA contrário, ela não tem função efetiva. Logo, nossos
VANTAGENS ESPACIAIS DIANTE DA
RELAÇÃO DE 1X1. APESAR DESTA alunos devem conhecer e saber tirar proveito da
SER TAMBÉM UMA TENDÊNCIA PARA superioridade numérica, desde um simples do 2x1 como
A ELABORAÇÃO DE BASES DE
ATAQUE EFICIENTES, CONSIDERO
em situações mais complexas e completas a partir do
QUE NA INICIAÇÃO ISSO PODE SER 6x6. Logicamente, que em se tratando do processo de
MUITO PERIGOSO, POIS TAIS AÇÕES iniciação, o reconhecimento da vantagem numérica em
PODEM SER CONSTRUIDAS APENAS
PARA O JOGADOR DE MAIOR situação simplificadas, originadas do 2x2, já podem
DESTAQUE DA EQUIPE. CONSIDERO garantir o início da aprendizagem de bases de ataque e,
QUE BOAS BASES DE ATAQUE NO
PERÍODO DA INICIAÇÃO DEVEM
quanto mais o aluno aprende, mais sofisticadas e
BUSCAR POR SITUAÇÕES DE complexas podem ser as referências dessas bases de
SUPERIORIDADE NUMÉRICA ataque.
OFENSIVA POR OPORTUNIZAR QUE
OS JOGADORES OPTEM PELO USO Considerando o exposto, entendo que antes que estes
DO PASSE PARA COLEGAS EM
MELHOR CONDIÇÃO DE três elementos tático-técnicos estejam bem ensinados,
FINALIZAÇÃO. assimilados e bem aplicados, não se torna
“curricularmente viável” ensinar bases de ataque para seu
VER MAIS EM “AVALIAÇÃO DO NÍVEL grupo iniciante. Devemos, para isso, respeitar as fases
DE APRENDIZAGEM DOS ATLETAS”
(P.36-38)
de aprendizagem de nosso alunos e do grupo com o
qual estamos trabalhando. Pular etapas, apesar de em
alguns momentos resultar em bons resultados, pode
esconder problemas de formação para handebol que
serão evidenciados em médio prazo, como por exemplo,
a dependência do jogo pré-fabricado para jogar.
34
Pensando na organização ofensiva de nossas equipes, a
utilização de estratégias ofensivas livres (sem
características posicionais e zonais) devem ser exploradas
de modo contínuo em categorias mirim e infantil, sendo, em
muitos casos, o principal padrão ofensivo destas categorias,
sobretudo na categoria mirim (11 e 12 anos de idade).
Jogar de forma livre, porém, não significa deixar o jogo se
desenrolar para que apenas incidentalmente as situações O CONCEITO DE APRENDIZAGEM
INCIDENTAL, PRESENTE EM MUITAS
ofensivas aconteçam. Claro que nestas idades o jogo livre OBRAS DO PROFESSOR PABLO JUAN
torna-se um importante referencial para o desenvolvimento GRECO, DIZ RESPEITO A UMA
da criatividade, porém, é possível que pelo menos uma base APRENDIZAGEM QUE SE DÁ PELA
SIMPLES PRÁTICA, SEM QUE HAJA UM
de ataque já possa ser aprendida e utilizada com eficiência DIRECIONAMENTO ESPECÍFICO PARA
frente a este modo de se organizar ofensivamente. APRENDIZAGEM DE UMA DADA
HABILIDADE OU CONTEÚDO.
A base de ataque que será apresentada têm como PODEMOS DIZER QUE ELA ACONTECE
referência inicial o equilíbrio entre atacante com bola e PELO ACASO, AO LOGO DA VIVÊNCIA
DO JOGO.
defensor adversário, em situações que o atacante com bola
perde sua possibilidade de se deslocar, seja porque já tenha
quicado a bola e agora a está segurando, seja porque o
contato físico do defensor é capaz de controla-lo.
A Figura 11 ilustra um exemplo de uma situação de
equilíbrio defensivo frente ao atacante com bola, situação
típica do jogo contra a defesa individual, também bastante
interessante neste período de aprendizagem por retirar as
crianças da passividade de aguardar na linha de 6 NÃO É APENAS O USO DO SISTEMA
DEFENSIVO INDIVIDUAL QUE RETIRA
metros. AS CRIANÇAS DOS SEIS METROS.
VEJA MAIS EM: “TEMOS QUE TIRAR OS
INICIANTES DA LINHA DOS SEIS
METROS!” (P.25-29)

FIGURA 11. EQUILÍBRIO DEFENSIVO: O ATACANTE


NÃO CONSEGUE DESLOCAR-SE COM A BOLA.

Referência:
Equilíbrio
Ataque x Defesa
35
Mediante esta situação, uma base de ataque pode ser explorada, sustentada na aproximação
do companheiro atacante mais próximo da situação, o qual realiza um cruzamento muito
próximo por trás do atacante em posse de bola recebendo a bola. Isso gera dúvidas na
defesa, pois ainda nestas idades pode haver dificuldade em se trabalhar com a troca de
marcação (Figura 12) – veja quando realizar um cruzamento no handebol (clique aqui)

FIGURA 12. O JOGADOR SEM BOLA QUE CRUZA E RECEBE A BOLA GANHA UM CORREDOR LIVRE PARA ATACAR.
OS DEFENSORES PODERÃO FICAR EM DÚVIDA SOBRE QUEM DEVE ACOMPANHAR ESTE ATACANTE.

Esta situação, mesmo quando há a troca de marcação, ainda pode ser muito útil
ofensivamente por permitir a utilização da tabela (passe-e-vai) entre os atacantes
envolvidos. Conforme ilustra a Figura 13.

FIGURA 13. APÓS O CRUZAMENTO HÁ UMA TROCA DE MARCAÇÃO QUE É UMA ÓTIMA OPORTUNIDADE PARA
UTILIZAR A TABELA (PASSE-E-VAI).

Apesar de muito simples, considero esta uma base de ataque pelo fato de exigir ações
coordenadas envolvendo mais de um jogador e que tem em vista a conquista de
superioridade numérica momentânea de maneira intencional, superando o conceito de que
jogar com o ataque livre frente à defesa individual seja simplesmente um estilo de jogo
orientado por ações incidentais.
Espero que esta dica seja útil no seu dia-a-dia com suas equipes iniciantes (ou mesmo mais
experientes) frente ao jogo contra a defesa individual.

36
05 AVALIAÇÃO
COMO
ELEMENTO
PEDAGÓGICO

37
AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE APRENDIZAGEM DOS
ATLETAS
Um dos princípios básicos de qualquer organização curricular
é a adequação dos conteúdos/matérias com o atual momento
de aprendizagem e os potenciais a serem atingidos pelos
alunos. Na iniciação ao handebol isso não pode ser diferente,
afinal, engana-se o professor que já sabe o que deve ensinar
antes mesmo de conhecer quem vai aprender.
Compreender que o handebol é uma construção processual
com etapas de aprendizagem e que para cada uma delas há
a necessidade de construir um handebol possível de ser
aprendido é essencial. Uma das formas de conhecer o que
se trabalhar é saber avaliar seus atletas, porém, este
procedimento sempre cria grandes dificuldades, afinal, o que
devemos avaliar e como podemos avaliar?
Realmente essa não é uma tarefa simples, pois em se
tratando de esporte a avaliação coletiva é demasiadamente
complicada. Para isso, no livro "Educação Como Prática
Corporal" de 2003, cujo tema são aulas de educação física
escolar, os professores Alcides José Scaglia e João Batista
Freire propõem que a avaliação deve ser feita por uma
observação sistemática de poucos alunos por vez até que
todos possam ser avaliados.
Avaliar em pequenos grupos possibilita maior atenção às
características dos alunos. Como estamos tratando de
iniciação, não existe a necessidade de termos pressa neste
processo já que um dos princípios que devemos ter em
PARA SABER MAIS SOBRE nossas ações como professor é ter sensibilidade para que
SENSIBILIDADE PEDAGÓGICA VER
BOX 5 (P.23) o aluno permaneça conosco por muito tempo e possa ser
avaliado processualmente.
Definir os critérios de avaliação também é difícil, mas em se
tratando de estudos de currículo em programas esportivos,
pude publicar com feras como o os professores Alcides José
Scaglia, Riller Silva Reverdito e Cristian Lizana, em 2011, um
VER MAIS SOBRE OS “ESPORTES
COLETIVOS DE INVASÃO” EM
artigo científico que descreve a existência de três
GONZALEZ, DARIDO E OLIVEIRA, DE Competências Essências inerentes aos esportes coletivos
2014 (CLIQUE AQUI) de invasão denominadas Comunicação na Ação,
Estruturação de Espaço e Relação com a Bola, ideias
adaptadas da obra de Júlio Garganta, de 1995.

38
Abaixo, segue como se relacionam as Competências Essenciais do jogo e os níveis de
desenvolvimento do jogo, segundo Garganta (1995):
Comunicação na Estruturação de
Características Relação com a Bola
Ação Espaço
Centralização na Abuso da
bola. Problemas verbalização Aglutinação em Elevada utilização da
Jogo Anárquico
na compreensão sobretudo para torno da bola visão central
do jogo pedir a bola
Ocupação do
A função não
Prevalência da espaço em função Da visão central para
Descentração depende apenas
verbalização dos elementos do a periférica
da posição da bola
jogo
Ocupação racional
Conscientização e Verbalização e Do controle visual
do espaço (tática
Estruturação coordenação das comunicação para o
individual e de
funções gestual proprioceptivo
grupo)
Polivalência
Ações inseridas na funcional. Otimização das
Prevalência da
Elaboração estratégia da Coordenação das capacidades
metacomunicação
equipe ações táticas proprioceptivas
coletivas

O uso destas categorias nos permite enquadrar cada aluno de nosso grupo numa destas fases de
desenvolvimento e, assim, podemos realizar atividades voltadas para cada uma das Competências Essenciais
descritas e necessárias de serem trabalhadas.
Por exemplo:
• Podemos enfatizar o trabalho de propriocepção em relação ao controle da bola para alunos que ainda são
muito centrados na bola para jogar;
• Podemos enfatizar a descentração da bola por meio de jogos com mais alvos a serem atingidos, o que
aumenta a quantidade de elementos do jogo e incide na melhor estruturação de espaço;
• Podemos brincar de jogo do silêncio, no qual a equipe que falar durante o jogo dá um ponto para a equipe
adversária. Isso estimula a metacomunicação (ou comunicação feita por meio dos movimentos realizados
durante o jogo, como por exemplo, oferecer-se para receber um passe, mover-se em direção aos espaços
vazios do jogo e etc.).
• Para um grupo cuja característica geral em relação a estruturação do espaço ainda seja a concentração
na bola de nada servirá uma aula que traga exercícios sobre meios táticos de grupo, como cruzamentos,
permutas e bloqueios ofensivos, afinal, os alunos ainda não compreendem esse tipo de necessidade
tática, mas podemos enfatizar a aprendizagem do desmarque e da finta, prioritariamente.

BOX 8: EXEMPLOS DE APLICAÇÃO DAS CATEGORIAS DE AVALIAÇÃO: SOMENTE


AVALIANDO SABEREMOS DE ONDE PARTIR PARA ENSINAR

39
Em se tratando da passagem dos alunos pelas diferentes fases de aprendizagem,
temos que entender o que denomino "Síndrome dos 100m rasos".
O salto de qualidade do nível anárquico para o de descentração é bastante rápido, em
função do desenvolvimento cognitivo e motor da criança que possibilita a ela entender
rapidamente conceitos importantes do jogo. Porém, para que um grupo passe do nível
de descentração para o de estruturação, o caminho é mais trabalhoso, requerendo um
bom trabalho de iniciação ao handebol já entrando na fase de especialização. Esta
percepção é são fruto de minha longa experiência profissional com iniciantes na prática
do handebol.
Saltar, porém, do nível de estruturação para o de elaboração é tão difícil e trabalhoso
quanto baixar 1 décimo de segundo nos 100m rasos (por isso a analogia).
Existem grandes equipes que transitam entre os dois níveis de desenvolvimento e
compreensão do jogo, mostrando o quanto é difícil jogar em alto-nível o tempo todo.
Por isso, compreender a fase de aprendizagem de seu grupo, e de seus atletas em
particular, por meio de avaliações individuais de poucos alunos a cada dia e tendo
como critérios estes que lhe foram apresentados, oportuniza a chance de se verificar em
que momento de aprendizagem eles se encontram, para assim desenvolver aulas
adequadas ao que eles já sabem, mas sempre mirando naquilo o que eles podem
aprender, tornando viável a organização de um currículo adequado para o trabalho a
longo prazo.
Assim, fugimos de uma tendência empirista de ensino que se sustenta na ideia de que
todo iniciante deve aprender a mesma coisa. Essa teoria pedagógica se pauta na
compreensão de que nós professores somos os detentores de todo conhecimento e que
os alunos, feito tábulas rasas, estão em nossas aulas e treinos apenas para que
depositemos em suas mentes e corpos nosso saber. Logo, como diz Paulo Freire:

“É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, vá ficando


cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma
e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado.
É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos
nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a
um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência (...)”
(Pedagogia da Autonomia, p.23)

Avaliar, portanto, é mais do que entender como o aluno evoluiu, mas principalmente é
um meio para pautarmos nossas ações pedagógicas para o agora que transforma o
aluno e transforma o professor. Avaliar para saber o que ensinar é um passo
fundamental para uma pedagogia da iniciação ao handebol.

40
06 CONSIDERAÇÕES
FINAIS

41
Finalizamos assim nosso e-book.
Você pôde estudar assuntos ligados às regras do jogo com foco na cobranças dos tiros do
handebol e no debate sobre uma das mudanças de regras que o handebol sofreu
associando as dificuldades de se valer do uso do sétimo jogador de quadra durante a
iniciação, principalmente por impactar na aprendizagem defensiva. Isso mostra como
conhecer e analisar com mais detalhes as regras do jogo pode fazer a sua intervenção
pedagógica ser ainda mais qualificada.
Em relação aos aspectos pedagógicos, abordei temas relacionados à utilização do passe,
mostrando possíveis causas que levam nossos alunos a optarem por passar e não por
protagonizar o jogo e, em relação a este último aspecto, apresentei você o conceito do
“fominha” do ponto de vista pedagógico e sua importância para a construção do jogo
coletivo. Você descobriu ainda que o contato defensivo é um elemento que estimula o jogo
de 1x1 por meio da utilização do ritmo trifásico, do duplo ritmo trifásico e da utilização dos
desmarques e pôde refletir sobre as mazelas de se colocar as crianças lá na linha de seis
metros defendo com o sistema defensivo 6:0 durante a iniciação, pois com a utilização
desse padrão defensivo corremos o risco de deixar de apresentar conceitos importantes
como o reconhecimento do atacante direto antes de exigirmos o jogo de basculação
defensiva, o qual depende de que coberturas e ajudas sejam realizadas.
Em relação os aspectos estratégico-táticos do jogo, apresentei para você o conceito de
“bases de ataque” que não são exclusivamente relacionadas ao jogo ofensivo
posicionado, pois algumas bases de ataque simples sustentadas no jogo de cruzamentos
e tabelas (passe-e-vai) já podem ser inseridas mesmo diante da utilização do ataque livre
frente à defesa individual.
Por fim, abordei o tema da avaliação. Sustentado na ideia das três competências
essenciais do Handebol (comunicação na ação, estruturação de espaço e relação com a
bola), você pode avaliar individualmente seus alunos e construir uma visão de como é o
seu grupo de trabalho, pois somente partindo daquilo o que seus alunos poderão aprender
é que uma base pedagógica sólida pode ser construída.
Não deixe de dar uma olhada nas leituras recomendadas logo a seguir.
Também, não deixe de seguir todas as ações que o Pedagogia do Esporte vem realizando
no tocante à qualificação profissional para programas de Handebol para crianças e jovens.
Siga-nos no Facebook, Instagram e Youtube. Acesse também nosso site.
Espero, sinceramente, que este material tenha sido de grande ajuda para você.

Prof. Lucas Leonardo

42
07 DICAS DE LEITURA
E RECURSOS
PEDAGÓGICOS
DIGITAIS

43
ARTIGOS, LIVROS E CAPÍTULOS
• ESTRIGA, Luísa; MOREIRA, Irineu. Proposta metodológica de ensino do andebol. In.
TAVARES, Fernando (Org.). Jogos Desportivos Coletivos: ensinar a jogar. Porto:
FADEUP, 2013.
• GARGANTA, Júlio. Para uma teoria dos jogos desportivos colectivos. In. GRAÇA, A;
OLIVEIRA, J. (Eds.). O ensino dos jogos desportivos. 2ed. Porto: FADEUP, 1995.
• GONZÁLEZ, Fernando Jaime; BRACHT, Valter. Metodologia do ensino dos esportes
coletivos. Vitória: UFES, Núcleo de Educação Aberta e a Distância, 2012. [Clique
Aqui]
• GRECO, Pablo Juan; ROMERO, Juan J. Fernández (Ed.). Manual de handebol: da
iniciação ao alto nível. São Paulo: Phorte, 2011. [Clique Aqui]
• KNIJNIK, Jorge Dorfman. Handebol: Agôn: o espírito do esporte. São Paulo:
Odysseus, 2009.
• KRAHENBÜHL, Tathyane; LEONARDO, Lucas. O ensino do sistema defensivo
individual no handebol e suas considerações para a iniciação esportiva. Pensar a
Prática, v. 21, n. 1, 2018. [Clique Aqui]
• MENEZES, Rafael Pombo; MARQUES, Renato Francisco Rodrigues; NUNOMURA,
Myrian. O ensino do handebol na categoria infantil a partir dos discursos de
treinadores experientes. Movimento, v. 21, n. 2, p. 463-477, 2015. [Clique Aqui]
• REVERDITO, Riller Silva; SCAGLIA, Alcides José; MONTAGNER, Paulo Cesar.
Pedagogia do esporte: Aspectos conceituais da competição e estudos
aplicados. São Paulo: Phorte, 2009.

RECURSOS PEDAGÓGICOS DIGITAIS


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