Você está na página 1de 4

OS ELEMENTOS EXPRESSIVOS DO CINEMA

Curso Online de Cinema - AULA 002

A LINGUAGEM DO CINEMA

Para se tornar um diretor ou pesquisador é fundamental compreender a linguagem do


cinema. Uma linguagem complexa concebida a partir de vários elementos expressivos -
fotografia, montagem, roteiro, atuação - que atuam de forma isolada, porém articulam juntos
a unidade da obra.

O VALOR OBJETIVO E O VALOR SENSORIAL

Uma imagem em um filme possui um valor objetivo e um valor sensorial.

O valor objetivo diz respeito ao significado dessa imagem para a história do filme. O valor
sensorial diz respeito à sensação que sentimos ao nos deparar com essa imagem. A
riqueza do cinema nasce da ambiguidade entre esses dois valores.

O que define esses dois valores são os elementos expressivos do cinema. A forma como o
diretor usa os elementos da linguagem - a fotografia, a montagem, a atuação, etc.

A IDEIA DO DIRETOR

O impacto de um filme depende do equilíbrio de seus elementos expressivos e esses, por


sua vez, precisam responder a uma ideia de direção. No cinema o diretor é o autor do filme.
O roteiro possui uma história, mas como o diretor trabalha os elementos expressivos para
contar essa história é o mais importante.

GAROTA EXEMPLAR

O filme de David Fincher trata sobre a dimensão das aparências, sobre como o que vemos
não condiz com a realidade. A forma como Fincher conduz os elementos expressivos do
filme respondem a essa ideia. O diretor equilibra valores objetivos e valores sensoriais para
atingir essa ideia.

O primeiro plano do longa, por exemplo, possui um valor objetivo pequeno, já que não
sabemos do que a história se trata, porém possui um valor sensorial alto, porque já propõe
uma atmosfera sensorial peculiar.

O último plano do longa é igual ao primeiro - o personagem acaricia a cabeça da esposa -


porém o valor objetivo é outro pois sabemos de toda a história envolvendo os
protagonistas. Fincher ressignifica os valores dessas imagens ao reproduzir planos
semelhantes no início e no final do filme.
DAVID LYNCH

Enquanto “Garota Exemplar”, de modo geral, equilibra os valores objetivos e sensoriais, os


filmes de David Lynch dão mais atenção aos valores sensoriais. A proposta do diretor é
priorizar as sensações dos espectadores e não se ater a contar uma história linear. As
imagens têm significado, mas com um sentido mais simbólico e abstrato.

EXERCITAR O SENTIR

Em geral, ficamos muito presos ao aspecto objetivo de um filme, ao que as coisas


significam na história. Deixamos de lado o aspecto sensorial. Chegamos ao ponto de deixar
de lado o nosso sentimento em relação ao filme para tentar “entendê-lo”.

Os dois aspectos são importantes, tanto o objetivo como o sensorial. Mas muitas vezes ao
começar a estudar cinema se busca "entender demais" os filmes. Há um excesso de
empenho em decodificar os filmes. E algo básico é deixado de lado: sentir os filmes,
assimilar a dimensão sensorial das obras.

JOHN FORD

Mesmo nos filmes de um diretor clássico como John Ford é possível perceber um valor
sensorial. A maneira coreografada e delicada que os atores dançam e a forma como o
diretor utiliza elementos expressivos aparentemente simples - como um gesto ou uma fala -
contém um encanto característico, contém um significado implícito que reitera uma tradição
e uma ideia de nação.

A REPRESENTAÇÃO DO ATO VAI ALÉM DO QUE O ATO SIGNIFICA

Um pensamento essencial ao assistir, analisar ou fazer filmes é que a representação de um


ato vai muito além do que o ato por si só significa. Marcel Martin diz: ​"Ficamos mais
comovidos com a representação que o filme nos oferece dos acontecimentos do que pelos
próprios acontecimentos".

Ou seja, uma dança em um filme do John Ford é mais do que uma dança, representa o
fascínio por uma tradição. Um homem acariciando os cabelos de sua esposa em “Garota
Exemplar” é mais do que um ato de carinho de um marido, representa algo que toca apenas
na superfície de uma realidade.

Ao analisar qualquer elemento cinematográfico, seja fotografia, montagem, atuação, ou


qualquer outro, é preciso saber que a maneira como as coisas são articuladas
ressignificam, de algum modo, o acontecimento que está sendo filmado. O modo de filmar
traz um ambiguidade para o acontecimento.
2001 - UMA ODISSEIA NO ESPAÇO

“2001” é um excelente exemplo do poder objetivo e ao mesmo tempo sensorial do cinema.


O filme conta a sua história de forma objetiva - a decupagem de Kubrick é clara e nos
localiza bem nas cenas - ao mesmo tempo que, no desenrolar dos seus acontecimentos, o
longa propõe elementos simbólicos e abstratos que refletem sobre mistérios da humanidade
e da origem do homem.

ATITUDE ESTÉTICA

Olhar para um filme e perceber suas propostas sensíveis e sutis exige uma atitude do
espectador. Algo que chamaremos de "atitude estética".

A atitude estética consiste em assimilar ideias, sentimentos e sensações ao se deparar com


imagens, sons e experiências estéticas em geral. Os grandes filmes sabem despertar essa
atitude estética no espectador. Quanto mais nos colocamos diante de experiências
estéticas, mais nossa sensibilidade se desenvolve. Passamos a perceber mais sutilezas nos
elementos expressivos da linguagem.

Percebemos a forma como a luz incide no rosto de Lillian Gish em um filme de D. W.


Griffith, a maneira que uma atriz fala e a solenidade dos atores em uma cena de dança em
um filme do John Ford, o motivo de David Fincher repetir um mesmo gesto no plano inicial e
final de um filme.

Perceber essas sutilezas é essencial tanto para quem quer seguir uma carreira artística
quanto para os que desejam seguir como pesquisadores ou críticos. E isso só acontece de
uma forma: assistindo filmes e nos abrindo sensorialmente a eles, não apenas tentando
decodificá-los.

CINEMA CLÁSSICO JAPONÊS

O cinema clássico japonês, como os filmes de Yasujiro Ozu e Kenji Mizoguchi, são
exemplares na forma como trabalham sutilmente os elementos expressivos do cinema.
Nessas obras, um gesto ou uma simples troca de olhares entre os personagens podem
conter um peso dramático implícito muito envolvente.

A TÉCNICA DEPENDE DA SENSIBILIDADE

Muitos estudantes de cinema acabam se preocupando excessivamente em entender sobre


movimentos de câmera, enquadramentos e diversas questões técnicas (absolutamente
importantes, claro), mas esquecem de desenvolver a sua sensibilidade.
A técnica depende da sensibilidade. Ao fazer um filme, além do roteiro, é necessária uma
ideia de direção. É preciso saber que sensação você quer transmitir, que sentimento você
quer passar. Para aí sim usar uma técnica para alcançar isso. Para escolher a melhor
técnica e executá-la bem é necessário desenvolver sua atitude estética. É essencial olhar
para os elementos expressivos do cinema a partir dessa atitude.

CITAÇÕES DA AULA

FILMES:
Garota Exemplar (2014) - David Fincher
A Estrada Perdida (1997) - David Lynch
Cidade dos Sonhos (2001) - David Lynch
Paixão dos Fortes (1946) - John Ford
Way Down East (1920) - D. W. Griffith
2001 - Uma Odisseia no Espaço (1968) - Stanley Kubrick
Os Amantes Crucificados (1954) - Kenji Mizoguchi
Era uma Vez em Tóquio (1953) - Yasujiro Ozu
Pai e Filha (1949) - Yasujiro Ozu

LIVROS:
A Linguagem Cinematográfica - Marcel Martin

PESQUISADORES, CRÍTICOS E TEÓRICOS:


Marcel Martin
Mark Cousins
David Bordwell

DIRETORES:
David Fincher
David Lynch
Robert Bresson
John Ford
D. W. Griffith
Stanley Kubrick
Ingmar Bergman
Yasujiro Ozu
Kenji Mizoguchi

ATRIZES E ATORES:
Lillian Gish
Setsuko Hara
Ben Affleck

TÉCNICO:
Billy Bitzer (Diretor de Fotografia)

Você também pode gostar