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Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I

Tema I

Notas de Aula
INTRODUÇÃO GERAL
Teoria da Empresa

Fases do Direito Empresarial

Atualmente, é considerado correto tanto Direito Comercial quanto Direito Empresarial.

A disciplina deve ser estudada pelo Código Comercial/1850 ou Código Civil/2002?

O CC/2002 revogou a parte do CCom/1850 que tratava do comércio terrestre, de modo que a
única parte que ainda está em vigência é a que versa sobre Direito das Navegações.

Sendo assim, a partir do artigo 966 do CC/02 está disciplinado o Direito Empresarial.

Fase Subjetiva: focada na pessoa do comerciante. O comerciante deveria ser inscrito


em alguma Corporação de Ofício.
Fase Objetiva: Caracterizada pela Teoria dos Atos de Comércio. Origem francesa.
Fase Subjetiva Moderna: Caracterizada pela Teoria da Empresa. Origem italiana
Direito
Comercial - Artigo 22, I, CF
Empresarial – ADOTA teoria da Empresa

1. A classificação das sociedades, antes do advento do novo CC, assim se


desenhava: sociedade era o gênero, dividido nas espécies sociedades com fim
lucrativo e sociedades sem fim lucrativo.
2. As sociedades com fim lucrativo se subdividiam em sociedades mercantis,
aquelas em que o lucro é o escopo da atividade, e se destina a ser rateado entre
os sócios; e sociedades civis, em que o lucro também é buscado, mas o seu
destino é ser reinvestido na própria sociedade (aos sócios cabendo apenas a
contraprestação pelo trabalho denominada pró-labore, que não é rateio de
lucros).

As sociedades sem finalidade lucrativa, à época do antigo CC, eram as


associações e as fundações. Nestas, o lucro não era objetivado, mas não era vedado:
havendo lucro eventual, este deveria ser também reinvestido na própria associação ou
fundação.

Vale traçar o esquema gráfico:

Sociedades no CC de 1916

Com fim lucrativo Sem fim lucrativo

Sociedades civis Soc. mercantis Fundações Associações


Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I

O atual CC alterou esta classificação, em razão da adoção da teoria da empresa.


De acordo com os parâmetros desta teoria, o conceito de comerciante foi
substituído pelo conceito de empresário.
Isto porque a caracterização do comerciante era restrita à constatação da prática
ou não de atos de comércio – o que era deveras restrito. Por isso, o conceito de
empresário é bem mais amplo, pois engloba em si também as atividades de prestação de
serviços.
Empresário, então, não é apenas aquele que exerce atos de comércio. Hoje,
empresário é aquele que desenvolve atividade econômica organizada, nos termos do
artigo 966 do novo CC:

“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce


profissionalmente atividade econômica organizada para a
produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce
profissão intelectual, de natureza científica, literária ou
artística, ainda com o concurso de auxiliares ou
colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir
elemento de empresa.”

Veja que o objeto do conceito – produção ou circulação de bens e serviços – é


tremendamente mais amplo do que o antigo critério, a “prática de atos de comércio”.
Hoje, estão sob a categoria de empresários as pessoas que desenvolvam toda e
qualquer atividade que se subsuma a este objeto legal, sendo especial ampliação a
inclusão dos prestadores de serviço. O não-empresário, então, é somente aquele que
desenvolve atividade que se alheia a este objeto.
Passemos, então, ao estudo do empresário como hoje se delineia.

1.1. Empresário Individual

Este conceito veio em substituição do antigo conceito de comerciante individual,


como se viu. É empresário individual a pessoa física que exerce atividade econômica
organizada em nome próprio. Por óbvio, não há qualquer relação entre o conceito de
empresário individual e a sociedade empresária.
A regularidade do empresário individual é obtida com o registro da firma
individual na Junta Comercial, que hoje é denominada Registro Público de Empresas
Mercantis (RPEM) pelo CC, no artigo 967:

“Art. 967. É obrigatória a inscrição do empresário no Registro


Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do
início de sua atividade.”

Em outro aspecto, o empresário individual adquire a personalidade com o seu


próprio nascimento com vida: a regularidade da atividade empresária depende do
registro no RPEM, mas a personalidade do empresário é adquirida no nascimento 1,
1
Vale mencionar que o surgimento da personalidade é disputado por três correntes, a concepcionista, a
natalista e a condicionalista, mas esmiuçar esta questão é incumbência do Direito Civil. Aqui, então,
menciona-se apenas a tese majoritária, natalista.
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pois é uma pessoa física, apenas exercendo a empresa em nome próprio – sua
personalidade é de pessoa física, natural.

A regularidade do exercício, no entanto, depende do dito registro.

A pessoa física não-empresária, de seu lado, é conceituada no


artigo 966, parágrafo único, já transcrito. Aqueles que exercem seus ofícios – médicos,
engenheiros, etc – não são, em regra, empresários, sendo apenas profissionais liberais.

1.2. Sociedades

O conceito de sociedades, gênero, é trazido no artigo 981 do CC:

“Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que


reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços,
para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos
resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de
um ou mais negócios determinados.”

Assim, no gênero, as sociedades, todas elas, exercem atividade econômica, que


implica em objetivar lucro. Assim, de acordo com o novo CC, todas as sociedades
objetivam o lucro.

Há duas espécies de sociedades reguladas no novo regime privado: a sociedade


empresária e a sociedade simples.
Ambas têm finalidade lucrativa (pois esta finalidade é um pressuposto do
conceito de atividade econômica), e podem destinar o lucro para o que bem entenderem,
admitindo-se o rateio dos lucros pelos sócios, em qualquer das espécies (não é imposto
o reinvestimento dos lucros na própria sociedade).

Isto significa que as associações e as fundações não mais se configuram


como espécies de sociedades sem fins lucrativos, porque, simplesmente, não se
enquadram sob o conceito de sociedades.

Veja: o artigo 981 do CC, ao conceituar sociedades, estabelece que é um


pressuposto do conceito o exercício de atividade econômica, e este tipo de atividade é
naturalmente dedicado a perseguir lucro. Sendo assim, se a pessoa não busca o lucro,
não é sociedade, por simples silogismo.
Como fica classificada a associação e a fundação, então, no novo regime?

Qual é o ponto de interseção entre as sociedades e estas entidades?

Mais uma vez, o conceito é da lei: segundo o artigo 44 do CC, enquadram-se,


sociedades, associações e fundações, sob um gênero mais amplo, superior – são todas
espécies de pessoas jurídicas de direito privado.

“Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:


I - as associações;
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II - as sociedades;
III - as fundações.
IV - as organizações religiosas;
V - os partidos políticos.
(...)”

Assim, vale sintetizar a explanação: se a pessoa jurídica de direito privado


objetiva lucro, realizando atividade econômica, é sociedade; se não tem finalidade
lucrativa, é uma das espécies ali arroladas. Não permanece a classificação de 1916.

Veja como é hoje:

Pessoas jurídicas de direito privado

Sociedades no CC de 2002 Sem fim lucrativo

Todas com fim lucrativo Fundações Associações Partidos políticos Org. Religiosas

Simples Empresária

A sociedade, seja ela simples ou empresária, adquire regularidade quando leva


seus atos constitutivos ao registro. E é no registro que surge também a personalidade:
diferentemente do empresário individual, pessoa natural, a sociedade sói surge como
pessoa jurídica, só adquirindo personalidade, quando é devidamente registrada2.

1.3. Responsabilidades

A responsabilidade do empresário individual é ilimitada, respondendo pelas


obrigações com todo o seu patrimônio pessoal; a responsabilidade das sociedades é
igualmente ilimitada, nos limites do patrimônio da sociedade.

Veja: não se está cogitando da responsabilidade dos sócios, e sim da sociedade,


enquanto pessoa jurídica autônoma. Como pessoa que existe por si só, também responde
com todo o seu patrimônio pelas obrigações contraídas.

Esta regra é contida no artigo 591 do CPC:

“Art. 591.  O devedor responde, para o cumprimento de suas


obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as
restrições estabelecidas em lei.”

LEIA-SE DEVEDOR: SOCIEDADE

É comum se confundir a responsabilidade da sociedade com a dos sócios.


Quando se cogita da responsabilidade destes, esta sim vai depender do tipo societário
em questão, e poderá ser limitada ou ilimitada, a responsabilidade dos sócios, à sua
2
O registro Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) é necessário a qualquer um que exerça
atividade empresária, e, mesmo que o nome do cadastro seja de “pessoas jurídicas”, para efeitos de
tributação se impõe o registro ali, também, dos empresários individuais, por ficção jurídica.
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parcela do capital. Este assunto será abordado tempestivamente, quando se tratar de
cada tipo societário.

Por ora, fica apenas a separação da responsabilidade da própria sociedade desta


responsabilidade de cada sócio: a responsabilidade da sociedade, qualquer que seja o
tipo, é sempre ilimitada, tal qual a do empresário individual (pois são eles que
desempenham a atividade empresária, contraindo as obrigações que suscitam
responsabilidade).

1.4. Empresa,
Empresário e Estabelecimento

O conceito de empresa é um conceito econômico: empresa é a atividade


econômica organizada. É econômica porque busca o lucro; e é organizada, não sendo
eventual ou aleatória.
A empresa é uma atividade, e não uma entidade. Por isso, não é sujeito, mas
apenas objeto de direito: não pode exercer direitos ou contrair obrigações.

Mas esta confusão que se faz, corriqueiramente, entre os conceitos de empresa e


sociedade é tão arraigada que o próprio legislador se engana, por vezes: o artigo 2° da
CLT, no caput, ao definir o empregador, assim dispõe:

“Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou


coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica,
admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
(...)”

O artigo 20 da Lei 5.474/68, lei que trata das duplicatas, é outro exemplo de má
interpretação legislativa do conceito:

“Art . 20. As emprêsas, individuais ou coletivas, fundações ou


sociedades civis, que se dediquem à prestação de serviços,
poderão, também, na forma desta lei, emitir fatura e duplicata.
(...)”

Resumindo, empresa não é entidade: é atividade, não tendo personalidade


jurídica por sua própria lógica (não há como se personificar uma atividade). Entidade,
ou é o empresário, ou a sociedade.

Assim se passa ao conceito de empresário, lato sensu: se a empresa é uma


atividade, alguém precisa exercê-la, e este alguém é justamente o empresário, quer seja
ele a pessoa física, o empresário individual, quer seja a pessoa jurídica, a sociedade
empresária.
São eles que desempenham a atividade econômica organizada, a empresa.

A caracterização do empresário parte de um critério formal, qual seja, o registro


no órgão competente, ou de um critério real, que é o exercício da empresa?
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É empresário aquele que se registra como tal – a firma, se individual, ou o ato
constitutivo, se sociedade – ou aquele que pratica os atos de empresa?
O critério a ser utilizado é o real: se se valer do critério formal, ninguém teria
interesse no registro.
O critério formal serve apenas para aferir a regularidade do empresário
individual, e criar personalidade e regularidade à sociedade.
Destarte, o empresário, ele sim, é sujeito de direito: é ele quem detém direitos e
contrai obrigações, quer seja o empresário individual exercendo a atividade em nome
próprio, quer seja a sociedade empresária exercendo a atividade em seu próprio nome
empresarial – sendo que a sociedade empresária, por não ser ente corpóreo, é
representada pelo administrador no exercício da atividade de empresa.

Assim, ao representar a sociedade, o administrador manifesta a vontade da


própria sociedade, e é esta quem se obriga perante os credores, e titulariza direitos
perante seus devedores.
Os sócios, nem mesmo se administradores, não são considerados empresários:
quem exerce a empresa é a própria sociedade, em nome próprio.

É assim que os credores devem pedir a falência, por exemplo, da sociedade


(representada pelo administrador), e não dos sócios, assim como é a sociedade, pelas
mãos do administrador, que requer a sua recuperação judicial.
O conceito de estabelecimento, por sua vez, remete ao antigo fundo de
comércio: o empresário, pessoa física ou jurídica, ao exercer a empresa, precisa ter bens
que habilitem-no a desempenhar tal atividade. E este conjunto de bens, corpóreos ou
incorpóreos, dedicados à atividade de empresa é o estabelecimento.

O artigo 1.142 do CC traça conceito diferencial entre empresa, empresário e


estabelecimento:
“Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de
bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou
por sociedade empresária.”

Sempre houve, e persiste, controvérsia acerca da natureza jurídica do


estabelecimento. Dentre as inúmeras correntes, pode-se apontar um ponto central da
discussão, que define duas grandes correntes: seria o estabelecimento uma
universalidade de direito ou uma universalidade de fato?
A universalidade de direito é aquela que tem sua criação determinada por lei. são
exemplos o espólio, a massa falida e a herança jacente.
Já a universalidade de fato é aquela criada pela vontade de seu instituidor.
No estabelecimento, quem estabelece a sua reunião em uma universalidade é o
próprio empresário, a própria pessoa física ou jurídica que desempenha atividade de
empresa, e por isso a tese majoritária é a que defende que o estabelecimento é uma
universalidade de fato.

De uma forma ou de outra, os conceitos de universalidade, de direito ou de fato,


são apresentados nos artigos 90 e 91 do CC:
Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I
“Art. 90. Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens
singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação
unitária.
Parágrafo único. Os bens que formam essa universalidade podem
ser objeto de relações jurídicas próprias.”

“Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de


relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico.”

1.5. Registro

A natureza jurídica do registro é declaratória ou constitutiva? Para efeitos de


caracterização do empresário, o registro é claramente declaratório desta condição,
pois como se viu, empresário é constatação de fato, critério real, baseado na
verificação real de prática da atividade de empresa.

Há uma exceção, do empresário rural, que segundo os artigos 971 e 984 do CC


só ganha esta condição de empresário com o registro – sendo este constitutivo, então
(havendo quem entenda que, mesmo assim, é declaratório).

Veja:

“Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua


principal profissão, pode, observadas as formalidades de que
tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro
Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que,
depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao
empresário sujeito a registro.”

“Art. 984. A sociedade que tenha por objeto o exercício de


atividade própria de empresário rural e seja constituída, ou
transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade
empresária, pode, com as formalidades do art. 968, requerer
inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da sua
sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada, para
todos os efeitos, à sociedade empresária. Junta Comercial

Parágrafo único. Embora já constituída a sociedade segundo um


daqueles tipos, o pedido de inscrição se subordinará, no que for
aplicável, às normas que regem a transformação.”

O registro, como já se disse, é servível à outorga de regularidade ao empresário


individual, e à criação da personalidade jurídica (e conseqüente regularidade) à
sociedade. Assim dispõe o artigo 985 do CC:

“Art. 985. A sociedade adquire personalidade jurídica com a


inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos
constitutivos (arts. 45 e 1.150).”
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Assim, o registro, do ponto de vista da personalidade jurídica, é claramente
constitutivo.
Resumindo: o registro é declaratório da atividade de empresa, e constitutivo da
regularidade e personalidade jurídica da sociedade (e regularidade do empresário
individual).

Traços distintivos entre os conceitos jurídicos de empresário, empresa e


estabelecimento.

Consiste em empresário individual a pessoa física que exerce atividade de


empresa em nome próprio.
Jamais se confunda com o sócio: este é a pessoa física que integra sociedade
empresária, pessoa jurídica esta que vai desempenhar, em seu nome jurídico, a atividade
de empresa. O sócio sequer precisa exercer empresa, pois pode haver administrador
não-sócio, ou outro sócio que a exerça só.
Empresa é a “atividade econômica organizada” – ou seja, é conceito bem mais
amplo.

Estabelecimento é o conjunto de bens que o empresário reúne e destina ao


exercício da atividade de empresa. Antigamente, era denominado de fundo de comércio,
mas hoje, pela teoria da empresa, só é correto se falar em estabelecimento de empresa. É
sinônimo de azienda. Qualquer bem compõe o estabelecimento, seja corpóreo ou
incorpóreo.

Tema II

Notas de Aula
1. Empresário Individual

Muito do assunto já se abordou no tema anterior. A caracterização do empresário


individual, por exemplo, é de pessoa física que exerce a atividade empresarial em nome
próprio, ganhando personalidade no nascimento com vida, e regularidade com o registro
da firma individual.
A responsabilidade do empresário individual, também como já se disse, é
ilimitada, pois todos os bens de seu patrimônio respondem pelas obrigações contraídas 3,
em razão do disposto no artigo 591 do CPC, já transcrito.

O empresário individual tem um único patrimônio, uno e indivisível, com o qual


responde pela atividade da empresa, e pelas responsabilidades pessoais.

3
É justamente por conta desta responsabilidade ilimitada que é praticamente ausente a figura do
empresário individual, na prática comercial. Em geral, os empresários que deveriam ser individuais se
associam a outra pessoa, com baixíssima porcentagem de quotas, a fim de fugir à responsabilidade
ilimitada. Mas veja que esta sociedade aparente, fictícia, pode sofrer desconsideração de sua
personalidade, por fraude na constituição.
Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I
Não há divisão entre patrimônio pessoal e estabelecimento: confundem-se os
patrimônios dedicados à atividade de empresa e os bens pessoais do empresário
individual.

Havendo esta unicidade patrimonial, sequer há de se observar ordem na


execução dos bens: se o patrimônio é um só, executa-se como um todo, não havendo
que incidir primeiro nos bens que são dedicados à empresa, para depois adentrar nos
bens pessoais. Simplesmente não há qualquer separação a ser observada, na
responsabilização.

A fim de traçar um paralelo, nas sociedades esta não é a configuração dos


patrimônios.
Há um patrimônio da sociedade, e há o patrimônio pessoal de cada sócio, que
em nada se confunde com o patrimônio da sociedade (quando regular, pois do contrário
não existe a personalidade da pessoa jurídica, e não há patrimônio social desenhado em
separado).

E é por esta separação clara que se verifica a necessidade da exceção que se


configura na desconsideração da personalidade jurídica, instituto que será estudado
amiúde adiante.

1.1. Capacidade para a Atividade de Empresário Individual

A partir de dezoito anos, pode a pessoa natural ostentar a figura de empresário


individual. O artigo 972 do CC diz:

“Art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que


estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem
legalmente impedidos.”

Esta questão simples pode oferecer complicações quando se tratar de pessoas


emancipadas. Veja: pessoa com dezesseis anos está em pleno gozo da capacidade, e por
isso poderá, em regra, ser empresário. Assim sendo, tem responsabilidade ilimitada,
podendo sofrer execução individual, incidir em falência (a partir da Lei 11.101/05, pois
a legislação anterior impunha limite de idade).

Mas veja que a infração penal falimentar eventualmente cometida pelo


empresário menor de dezoito anos não poderá ser-lhe imputada. A responsabilidade
penal não se altera com a emancipação: o limite para ser imputável é de no mínimo
dezoito anos. Será responsabilizado exatamente como os demais menores, quando
cometem crimes: segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, recebendo medidas
terapêuticas.

1.2. Impedimentos ao Exercício da Empresa

O artigo 973 do CC impõe limite ao exercício da empresa:


Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I
“Art. 973. A pessoa legalmente impedida de exercer atividade
própria de empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações
contraídas.”

Os legalmente impedidos são diversos. Como exemplo, os magistrados. Veja


que se uma pessoa impedida de exercer empresa o fizer, responderá como empresário
irregular, pelo quê poderá até mesmo incidir em falência. Do contrário, estar-se-ia
fomentando a irregularidade.
Veja que os impedidos poderão compor os quadros societários de uma LTDA ou
de uma S/A; o que não poderão é exercer a atividade econômica organizada, a atividade
de empresa, quer em nome próprio, quer em nome da sociedade que compõem (como
sócios-administradores).
Note que, então, nunca poderão ser empresários individuais, mas podem compor
sociedades, desde que não exerçam a administração.

1.3. Empresário Individual Casado

O empresário individual tem um só patrimônio, que responde, todo ele, pelas


obrigações contraídas na atividade de empresa.
Ocorre que, se o empresário individual for casado, há que se considerar acerca
da meação do patrimônio com seu cônjuge. Como se resolve a comunicação
patrimonial?
A invasão ou não da meação cabível ao do cônjuge não-empresário é
controvertida. A solução empresarial entende aplicável o artigo 3° da Lei 4.121/62, que
dispõe:

“Art. 3° Pelos títulos de dívida de qualquer natureza, firmados


por um só dos cônjuges, ainda que casados pelo regime de
comunhão universal, somente responderão os bens particulares
do signatário e os comuns até o limite de sua meação.”

Isto significa que a responsabilidade do empresário será limitada à meação


que a este incumba, não podendo comprometer a meação do cônjuge não-
empresário, independentemente do regime de casamento.

A exceção, em que a meação será invadida, ou melhor, em que todo o


patrimônio conjugal (é claro que não incidindo jamais sobre o patrimônio pessoal do
não-empresário) será imputável pela divida empresarial, ocorre quando o proveito do
débito contraído pelo empresário reverte em benefício do casal. Neste caso, o ônus de
comprovar que o casal se beneficiou com o débito assumido é do credor.

Quanto à alienação dos bens, o empresário individual casado poderá alienar os


bens que integrem o patrimônio do estabelecimento, sem a vênia conjugal, como dispõe
o artigo 978 do CC:

“Art. 978. O empresário casado pode, sem necessidade de


outorga conjugal, qualquer que seja o regime de bens, alienar os
imóveis que integrem o patrimônio da empresa ou gravá-los de
ônus real.”
Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I

Veja que esta possibilidade é uma exceção legal. A regra, sobre a outorga uxória
(hoje chamada conjugal) é a presente no artigo 1.647, I, do CC:

“Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos


cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da
separação absoluta:
I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
(...)”

Note que o empresário individual tem um só patrimônio, mas é perfeitamente


definível quais são os bens que têm relação com o desempenho da atividade empresária
e quais não guardam relação direta, e para os que são pertinentes ao estabelecimento, há
esta exceção do artigo 978 do CC.

Mas veja que se a finalidade do imóvel não for exclusivamente a atividade de


empresa, não pode haver esta alienação sem vênia (como uma pousada, em que se
realiza a empresa e ao mesmo tempo residem os cônjuges).

2. Continuação da Empresa por Incapaz

Dispõe o artigo 974 do CC:

“Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou


devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele
enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança.

§ 1o Nos casos deste artigo, precederá autorização judicial, após


exame das circunstâncias e dos riscos da empresa, bem como da
conveniência em continuá-la, podendo a autorização ser revogada
pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do
menor ou do interdito, sem prejuízo dos direitos adquiridos por
terceiros.

§ 2o Não ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o


incapaz já possuía, ao tempo da sucessão ou da interdição, desde
que estranhos ao acervo daquela, devendo tais fatos constar do
alvará que conceder a autorização.”

O incapaz de que trata o caput deste artigo é definido no § 1°, como o menor ou
o interdito.
O interdito é o empresário individual capaz, que por algum motivo teve
decretada sua incapacidade superveniente, sendo interditado.
Teoria da Empresa – Direito Empresarial – I
Em regra, a atividade que exercia não poderia ser continuada por ele, depois de
interditado, vez que a empresa somente pode ser exercida por quem estiver em pleno
gozo da capacidade civil.
Este artigo traz esta exceção, desde que autorizada judicialmente, tendo por
mens legis a o princípio da preservação, bem como da função social da empresa.

Note que não é o interdito quem praticará a atividade de empresa, e sim o


representante, em nome do incapaz.
Quem exerce direitos e contrai obrigações é o representante, mas o faz em nome
do interdito. Por isso, quem tem a responsabilidade ilimitada é o interdito, e não o
representante.
O patrimônio do representante não é afetado pelas obrigações da atividade
empresária, exceto se houver uma das hipóteses que o tornam imputável, como quando
excede seus poderes, ou age de má-fé. Assim, em regra, o credor deve acionar o
incapaz, na figura de seu representante.
A lei salvaguarda parte do patrimônio do interdito, como se vê no § 2° deste
artigo 974.

O dispositivo é expresso, atribuindo uma “blindagem” patrimonial aos bens


previamente existentes à interdição (ou sucessão, no caso dos menores), que nada
tinham a ver com a atividade de empresa. Esta blindagem precisa ser consignada no
alvará de continuação da empresa.

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