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A Maçonaria que conheço tem TDAH?

(“Transtorno do Défice de Atenção com / sem Hiperatividade”)


O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas,

que aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas

de desatenção, inquietude e impulsividade. Ele é chamado às vezes de DDA (Distúrbio do Déficit de Atenção).

Vamos esclarecer?

Realmente, não é possível conhecer totalmente a Maçonaria, pois, do ponto de vista


vivencial pode-se conjecturar a existência de muitas formas de ser Maçom; por vezes, exagero
pensando que a sua prática seja quase individualizada; há um senso comum, contudo, reina uma
série enorme de convicções individuais.

Assim pensando, cada Loja, unidade legal básica e fundamental, para não nos
estendermos além deste microambiente, tem características próprias e isto, naturalmente, faz
com que, do ponto de vista prático, afora os Rituais e a legislação específica, a Instituição,
igualmente ao seu elemento mais básico, o Homem Maçom, acabe comportando-se como um
mosaico.

Dizendo isto, esclareço que a Maçonaria que conheço é aquela que convivo e vivo, em
níveis diversos, sem especificidades e sem rotulações; enfim, é como diz a letra da música
“Victória” de Noel Rosa: “O que eu falo é bem pensado. Não receio escaramuça. E que aceite a
carapuça quem se sente melindrado”.

TDAH?
Sim, significa “Transtorno do Défice de Atenção com (ou sem) Hiperatividade”.

Mas “que negócio é este?”, pergunta-me um amigo e irmão; e isto acrescido a fatos que
ultimamente ocorreram no nosso meio motivou o desenvolvimento da ideia.

Metáfora, escolhendo a parte da definição que me interessa, é uma figura de linguagem


em que se transfere o nome de uma coisa para outra com a qual é possível estabelecer uma
relação de comparação.

Vamos lá!
Sabemos que comparar, do ponto de vista comportamental, Maçonaria com TDAH é
muito injusto e muito inadequado! Não passa de uma metáfora!

Sim, talvez o título devesse mudar para “parte dos líderes maçónicos comporta-se
como se tivesse TDAH”, pois a Maçonaria tem a organicidade de uma Instituição juridicamente
reconhecida e, antes de tudo, é iniciática, filosófica, filantrópica, progressista e evolucionista.
Logo, não é portadora de TDAH!

Já neste início de discussão, desde o título, devo ter conseguido algumas escaramuças
como dizia Noel Rosa; mas que fazer? Vamos continuar a saga e tentar desenvolver o raciocínio
(ou a metáfora).

Neste contexto, apenas me utilizo do conceito para gerar, confesso, uma crítica e
esclareço que para meu uso, crítica é somente uma figura linguística que se refere à expressão
de uma reação pessoal que algo, seja um tema ou comportamento, me provoca; desta forma,
como visão individual não pode pretender representar verdades e, assim, não deve ter outra
interpretação além da intenção de estimular discussões que possibilitem mudanças.

Não ocorrerão mudanças sem discussões!


A passividade e acomodação não são boas conselheiras para ninguém, muito menos,
para uma instituição secular como a Maçonaria.

Para não me apoiar em compêndios médicos e nem numa bibliografia técnica extensa
tentando demonstrar o que não se é, um especialista na área de TDAH, busquei uma definição
de fácil acesso numa associação reconhecida: “O Transtorno do Défice de Atenção com
Hiperatividade é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância e
frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de
desatenção, inquietude e impulsividade”. Embora, atualmente, haja fortes convicções sobre o
início na adolescência e talvez mesmo, no adulto.

Vamos, pois à metáfora como suporte à crítica, sem obviamente, entrar em discussões
controversas sobre variações conceituais do problema, pois não é o foco.

Como base comportamental do portador de TDAH, especialmente no adulto, para a


qual devemos atentar-nos e priorizar é a habitual e prejudicial característica de desatenção às
consequências futuras do que fazemos ou deixamos de fazer no presente.

As decisões, estabelecimento de prioridades, ações e atitudes adotadas no presente é


que determinarão como será o nosso futuro. O “presente nada mais é do que a preparação para
as consequências futuras”. E esta, como dito e para reforçar, é uma das maiores dificuldades
dos portadores de TDAH!

Temos um condicionamento neurobiológico no funcionamento dos nossos lobos


frontais, especialmente e sem entrar em detalhes, que aproxima o futuro do presente.

Isto inclui um sistema de recompensas voltado para, socialmente, obter-se algo no


futuro a partir do se faz agora. A conquista de metas planeadas dá prazer e prestígio. Se
estivermos desatentos para o que pode acontecer depois, não conseguiremos dar a
importância, o peso real, para fazer o que se deve fazer agora; ou seja, se não estivermos atentos
às consequências futuras, não daremos a necessária importância ao que ocorre no momento.
O que vai acontecer no futuro – probabilidades e consequências que depende do
conjunto de experiências pessoais e culturais (que nada mais é do que a representação do
passado, do adquirido), circunstâncias/contexto do momento que caracteriza o presente e, o
mais importante, que é desenhar mentalmente os diversos cenários que nos prepararão para
as consequências futuras.

Temos que ter aquela sensação sistémica de angústia, aquele “frio na barriga ou na
espinha” que gera a ansiedade e o medo; aquela sensação de mal-estar, ao imaginarmos que se
algo acontecer no futuro que não trabalhamos preventivamente no presente, seremos
responsabilizados por não termos feito o que devíamos.

Se a isto não dermos a devida importância, acabaremos cumprindo o básico das nossas
obrigações, deixando apenas o tempo passar, esperando sair aparentemente ilesos das
responsabilidades que, social e institucionalmente, nos foram atribuídas. Como alguém já disse:
se me cobrarem, não pago; se não me cobrarem, esqueço!
Muitos indivíduos agem na sua comunidade buscando caminhos para antecipar
consequências e são taxados pejorativamente de “extemporâneos”, “apressados”, “nervosos”
ou “ansiosos”; agem hoje pensando no futuro e parecem estar sempre buscando recompensas,
quase nunca para si, mas para a comunidade em que vivem; mas invariavelmente são pouco
entendidos ou valorizados no presente; com sorte o serão no futuro! E aí, já não interessará
mais!

Outros não conseguem enxergar este futuro; são mais voltados para o presente e não
se preocupam com as consequências futuras dos seus atos. Agem como se as consequências
futuras não fossem a chave que regulam o funcionamento no presente.

Têm, portanto, uma insensibilidade às consequências futuras dos seus atos no presente.
Não ativam o sistema de recompensas futuras, pois as buscam agora, no presente, no imediato.
E estes, pelas suas aparentes “proatividades” (ou impulsividade?) são taxados como
“realizadores” e valorizados. Este resolve! Mas a que preço?

E estas são características comumente encontradas naqueles portadores de TDAH! Foco


no presente e sem condições neurobiológicas de planear o futuro!

E isto seria comum na nossa Instituição? Essa resposta é individual...

Aí surgiu na minha mente, há algum tempo, um questionamento padrão: porque a


“Maçonaria que conheço” dedica tão pouco tempo (ou, em muitos casos, nenhum) à análise dos
cenários futuros?

Cenários que, inclusive, vêm preocupando analistas e estudiosos há muito e que


sabemos, ameaçam a sua magnitude! Mesmo quando exemplos e alertas claros e objetivos são
expostos ao redor do mundo, inclusive, vindos de países berços ou daqueles que tínhamos como
exemplos; e não precisamos filosofar; é só mentalizarmos os números! [4] [5] [6] [7] [8] [9] [11]

Há um ditado popular que cabe bem aqui: “O pior surdo é aquele que não quer ouvir”!
[12]

E mais – só para lembrar: não devemos esquecer que “somos responsáveis não só pelo
que fazemos, mas também pelo que deixamos de fazer” (Molière)

O futuro sempre é responsabilidade do presente! E ele cobrará dos que no presente


apenas continuam procrastinando, ou seja, “colecionando um almanaque de desculpas”. Ou,
por outro lado, também cobrará dos que realizam ações no presente sem atentarem para as
consequências futuras.

E não estamos defendendo mudanças nas bases filosóficas-institucionais, conquistas de


tantos e ao longo de tanto tempo, mas sim, de discutir ideias como as do Irmão Michael W.
Walker que sugere “… melhorar a embalagem e torná-la mais atrativa a potenciais “clientes” e
mais apetecível aos atuais. No primeiro caso, podemos ativamente adotar um novo perfil e,
suave, mas firmemente, “deixar a nossa luz brilhar perante os homens” (…)”. E continua no
mesmo discurso: “… há que definir um programa de ação com um objetivo fundamental: tornar
as sessões de Loja atrativas, onde se está presente porque se quer e não porque há obrigação
em o fazer”. Ou ainda: “Qualquer pessoa é ocasionalmente um pouco introspectiva, ao
perguntar-se “quem sou eu e para onde vou?”. Mesmo uma organização como a Maçonaria
deve fazer-se a si mesma esta pergunta”.
Existem, portanto, sintomas que poderiam ser considerados comuns, como dificuldade
de focar e persistir, procrastinação e subvalorização do tempo, como se pudéssemos facilmente
resolver qualquer problema tão logo surja; sabemos que, desta forma, sem qualquer dúvida, vai
dar errado lá na frente!

Quantas ideias importantes vi serem entusiasticamente abraçadas e, após tempo


considerável investido em inúmeras reuniões, se perderem ou mesmo serem apequenadas nos
seus objetivos no interesse ou desinteresse de múltiplas causas.

Não devemos esquecer que as conquistas do presente só são importantes quando


ancoradas nos resultados futuros.

A Maçonaria que conheço continua a navegar em “mar de almirante”, confiante de que


nenhuma marola vai afetar o seu percurso, independentemente dos fartos exemplos existentes
(“Somos um grupo que está fora de moda e com o número de membros a diminuir – talvez não
nos países em desenvolvimento, mas no mundo desenvolvido, somos vistos como um
anacronismo, com um modo de estar que constitui um embaraço).

Não vai acontecer aqui!!!! Ora se vai…

Será? Posso até estar, como denominou Daniel Kahneman, na ilusão cognitiva do Viés
da Validade ou Heurística (arte de inventar) da Auto Validação, contudo, não me arriscaria!

O que vejo é uma inércia total, uma absoluta desatenção às consequências futuras!
Como nos portadores de TDAH!

E se continuarmos desatentos, despreocupados com o que pode acontecer depois,


nunca conseguiremos dar o real peso (valor) para fazer aquilo que tem que ser feito agora e,
assim, preventivamente, evitar danos irreversíveis no futuro.

Aprender a aproximar o futuro do presente, estratégia psicoterapêutica


frequentemente usada nos portadores de TDAH deveria também ser fonte de discussão e
ensinamento persistente nas Lojas Maçónicas criando cenários e preparando a Instituição para
possíveis impactos negativos no futuro do que já está a acontecer hoje e desta forma, termos
consciência do bem-feito na busca de resultados futuros melhores para todos! E cumprirmos
assim, os nossos deveres para com esta incrível Instituição!

Bibliografia
[1] Noel Rosa: https://pt.wikipedia.org/wiki/Noel_Rosa;
[2] ABDA – Associação Brasileira do Déficit de Atenção;
[3] André Palmini – Professor Neurologia PUC – Rio Grande do Sul – Brasil – Desatenção às consequências futuras como base do TDAH no adulto -– Palestra – 16/07/2021 –
Academia Brasileira de Neurologia.
[4] A visão de Thomas Jackson sobre a Maçonaria na actualidade;
[5] Thomas W. Jackson – Comunicação à Grande Loja de Montana, 27.06.2009;
[6] Thomas W. Jackson – O que é que estamos a tentar salvar?
[7] Kennyo Ismail – Dois mundos e uma verdade nua e crua;
[8] Michael W. Walker – Grande Secretário da Grande Loja da Irlanda – Considerações pessoais – Tradução de APF – R∴ L∴ Mestre Affonso Domingues;
[9] León Zeldis Mandel – O Futuro da Maçonaria: desafios e respostas – Tradução de Ranvier Feitosa Aragão;
[10] Daniel Kahneman – Rápido e Devagar, duas formas de pensar – tradução de Cássio de Arantes Leite – 1ª ed. – Rio de Janeiro; objectiva, 2012;
[11] Brian Louis Chaytor e Brian Lawrence Chaytor – Será a Maçonaria ainda relevante? – tradução de António Jorge;
[12] Tiago Valenciano – A “velha” versus a “nova” Maçonaria: os desafios da Irmandade na pós-modernidade;
[13] FH Becker Silva – Zur Friedenspalme;
** Walter Roque Teixeira (Médico Neurologista) – GOB – GOB/SC – CIM 184.372 – ARBLS Palmeira da Paz nº 2121 – Nome dado em Homenagem à primeira Loja de Blumenau
– “Zur Friedenspalme”[13] – Oriente de Blumenau – Santa Catarina – Brasil

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