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Gil Vicente e a revolução do teatro português

Gil Vicente foi um autor português que revolucionou a forma de expressão através do teatro.

O teatro vicentino foi o grande influenciador do teatro contemporâneo

⇒ Quem foi Gil Vicente?

Gil Vicente foi um autor português que teve o seu reconhecimento durante o reinado de D. Manuel até por volta
do reinado de D. João III. Sobre sua origem, sabe-se muito pouco, pois não há registros reais que revelem o
momento e o local nos quais teria nascido. No entanto, alguns lugares já foram citados como possíveis: Lisboa,
Barcellos e Guimarães. O único fato que se pode afirmar é que seu nascimento ocorreu no fim do século XV, ou
seja, momento em que o Humanismo dava seus primeiro passos na terra Portuguesa, deixando paul atinamente a
ideia da era medieval e abrindo-se para receber as boas novas do período renascentista.

Seus pais o colocaram na Universidade para que pudesse ter uma educação liberal e, apesar de estudar Direito
Civil, Gil Vicente possuía uma natureza poética e criativa que lhe possibilitou abandonar a vida jurídica e abraçar
a vida literária, tornando-se reconhecido por suas obras inovadoras para a época. Seu reconhecimento iniciou-se
por ocasião do nascimento do príncipe D. João, posteriormente D. João III, quando o autor escreveu um
monólogo em homenagem ao acontecimento Real e o apresentou à Rainha Dona Beatriz, que ainda estava de
resguardo do filho recém-nascido. Essa, por ter gostado do que vira, pediu ao autor que repetisse a apresentação
no natal, mas que, na ocasião, o texto fosse dirigido ao nascimento do menino Jesus. Assim, para honrar o
pedido de Vossa Alteza, Gil Vicente aprimorou seu texto e criou o seu primeiro Auto. Por isso, é possível afirmar
que suas primeiras produções inciaram-se em 1502, tornando-se autor sempre presente nas festas de ano,
nascimento e casamento da nobreza.

Gil Vicente não era conhecido apenas em Portugal, mas também nos países mais cultos da Europa na época. Tal
fama rendeu também ao autor grandes infortúnios, uma vez que, ser tão reconhecido, despertava inveja em
muitos que lhe acusaram de roubar ideias de outros autores para sua produção. Esse fato foi o que motivou Gil
Vicente a escrever a Farsa de Inez Pereira, comédia admirada em toda Europa, utilizando de um novo modo de
produção, foi o meio que teve para se defender das perseguições que estava sofrendo.

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O autor português foi casado com Branca Bezerra e teve três filhos, Gil Vicente, Luiz Vicente e Paula Vicente.
Todos os seus filhos herdaram seu talento, sendo que, no ápice de sua carreira, Gil Vicente sentiu-se ameaçado
pelas habilidades poéticas de seu filho mais velho (Gil Vicente) e, em uma atitude invejosa, enviou -o para a Indía
para evitar que o mesmo o ofuscasse.

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O ano de sua morte também é desconhecido, mas prevê-se que tenha sido por volta de 1557, em Evora.

⇒ A obra e seu antecessores

Os antecessores da produção vicentina são as produções teatrais do período medieval, que se dividiam
em Encenações Litúrgicas e Encenações Profanas. As litúrgicas possuiam influência direta da igreja e traziam
como tema os ritos, o culto da religião católica e todas as celebrações, sendo classificadas em mistérios,
milagres e moralidades. Já as profanas eram as ecenações realizadas fora do templo religioso, tendo como
temas festas e vida popular, e eram classificadas em Farsas, soties, momos, entremezes, sermão burlescos e
éclogas

A obra de Gil Vicente é divida entre Autos Pastoris, Autos de Moralidade, Farsas, Autos Cavaleirescos e Autos
alegóricos do tema profano. Por ser um autor que viveu no momento de transição entre a Idade Média e o
Renascimento, seu teatro era composto por características medievais e também características modernas,
trazendo para as terras portuguesas a escrita teatral, característica moderna que não existia na era medieval, já
que o teatro era figurativo.

Assim, temos:

 Autos Pastoris: eram representações que tinham como tema a conversa entre pastores e podiam ser
relacionadas a partes de peças profanas ou religiosas. Exemplos: Auto da Fé, Auto de Mofina Mendes.
 Autos de Moralidade: eram representações que tinham ensinamentos morais e religiosos com o objetivo
de denuciar comportamentos sociais indadequados por meio da sátira. Exemplo: Auto da Barca do
Inferno.
 Farsas: eram representações de episódios cômicos da vida de algum personagem social tipificado.
Exemplo: A Farsa de Inez Pereira.
 Autos Cavaleirescos: representações de momentos sentimentais cavaleirescos. Exemplo: Comédia do
Viúvo.
 Autos alegóricos de tema profano: eram encenações que possuíam um conjunto de outras formas de
representar, como episódios de farsas, cantigas e até dança. Exemplo: Cortes de Jupter.

Como é possível notar, Gil Vicente impulsionou a produção literária de sua época, revolucionando a forma como
assuntos religiosos e sociais eram tratados até então. Por sua escrita invovadora, esse autor é considerado o pai
do teatro moderno, uma vez que só conhecemos o teatro como ele é hoje em razão da criatividade desse
português que abriu caminho para as novas produções literárias que surgiriam com o Renascimento em Portugal.

Exercícios
1- O teatro de Gil Vicente caracteriza-se por ser fundamentalmente popular. E essa característica manifesta-se,
particularmente, em sua linguagem poética, como ocorre no trecho a seguir, de O Auto da Barca do Inferno.
Ó Cavaleiros de Deus,
A vós estou esperando,
Que morrestes pelejando
Por Cristo, Senhor dos Céus!
Sois livres de todo o mal,
Mártires da Madre Igreja,
Que quem morre em tal peleja

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Merece paz eternal.

No texto, fala final do Anjo, temos no conjunto dos versos

(A) variação de ritmo e quebra de rimas.


(B) igualdade de métrica e de esquemas das palavras que rimam.
(C) ausência de ritmo e igualdade de rimas.
(D) alternância de redondilha maior e menor e simetria de rimas.
(E) redondilha menor e rimas opostas e emparelhadas.

2- Considere as seguintes afirmações sobre o teatro vicentino.


I. Suas peças são escritas em versos, na medida velha, e revelam boa poesia dramática, ao lado da densidade da
crítica social, fundada em uma visão medieval, religiosa e cristã de um mundo em transformação.
II. Põe em cena todos os segmentos da sociedade portuguesa de seu tempo, da elite palaciana aos excluídos
socialmente, e até mesmo a corte, na qual representava suas peças, é alvo da crítica indireta do dramaturgo.
III. Não obedece à Lei das Três Unidades (tempo, lugar e ação). Suas peças compõem-se de cenas ou quadros
encadeados sem rigidez na sequência temporal e espacial.

Quais estão corretas?


(A) Apenas I.
(B) Apenas III.
(C) Apenas I e II.
(D) Apenas II e III.
(E) I, II e III.

3- Gil Vicente escreveu o Auto da Barca do Inferno em 1517, no momento em que eclodia na Alemanha a Reforma
Protestante com a crítica veemente de Lutero ao mau clero dominante na Igreja. Nessa obra, há a figura do frade,
severamente censurado como um sacerdote negligente. Indique a alternativa cujo conteúdo não se presta a
caracterizar, na referida peça, os erros cometidos pelo religioso.
a) Não cumprir os votos de celibato, mantendo a concubina Florença.
b) Entregar-se a práticas mundanas, como a dança.
c) Praticar esgrima e usar armamentos de guerra, proibidos aos clérigos.
d) Transformar a religião em manifestação formal, ao automatizar os ritos litúrgicos.
e) Praticar a avareza como cúmplice do Fidalgo, e a exploração da prostituição em parceria com a alcoviteira.

4- Leia o texto abaixo pautado para responder ao que se pede:


Frade
Corpo de Deus consagrado!
Pela fé de Jesus Cristo
que não posso entender isto!
Hei de ser eu condenado?
Um padre tão namorado,
tão dedicado à virtude!
Dê-me Deus tanta saúde
quanto estou maravilhado.

Diabo
Deixemos de mais demora.
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Embarcai e partiremos.
Tomareis um par de remos.

Frade
No ajuste isto não vigora.

Diabo
Pois vai na sentença, agora.

Frade
Não esperava por ela.
Não vai em tal caravela
minha senhora Florença.
Como, por ser namorado
e folgar com uma mulher
há de um frade se perder
com tanto salmo rezado?

Diabo
Ora, estás bem preparado.

Frade
E tu, bem mais prevenido.

Diabo
Devoto, padre e marido,
aqui serás castigado.

( Gil Vicente - Auto da Barca do Inferno )

A última fala do diabo, revela-nos que o teatro de Gil Vicente, especificamente este Auto da barca do Inferno, pode
ser visto também como uma espécie de tribunal, onde os homens são julgados segundo o que fizeram em suas
vidas. Sendo assim, é possível afirmar que:

a) o teatro vicentino apresenta preocupação político-social, pois seu autor defende as classes menos favorecidas,
excitando uma considerável revolta social.
b) Gil Vicente contemplou a sociedade de sua época através de um olhar crítico, que lhe permitiu condenar
livremente as pessoas que deveriam ir para o Inferno pagar os pecados cometidos em vida.
c) o diabo é uma figura decisiva nesta peça, pois é ele quem julga as pessoas. Com isso, Gil Vicente queria transmitir
ao público a idéia de que só o mal pode julgar o mal, enquanto o papel do bem consistia em apenas contemplar a
condenação irreversível de todos os homens.
d) o fato de o diabo atuar como um juiz caracteriza uma crítica à classe dos juízes, dos advogados, dos procuradores
e dos corregedores. Gil Vicente defendia a ideia de que só Deus pode determinar o destino dos homens,
independentemente das decisões humanas.
e) o teatro de Gil Vicente está sustentado pela ética católica medieval. Daí o julgamento dos homens segundo uma
perspectiva maniqueísta (anjo e diabo = céu e inferno, respectivamente). Essa interpretação aparece no Auto da
barca do Inferno através da crítica ao comportamento e às práticas morais da época.

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5- Sobre o Auto da barca do Inferno, de Gil Vicente, é incorreto afirmar:
a) O autor apresenta severa crítica à prepotência e tirania dos nobres, e à desonestidade e corrupção dos homens da
lei.
b) Na luta entre o Bem e o Mal são favorecidos aqueles que em vida pertenceram à classe social privilegiada.
c) O diabo atua como agente crítico, que revela as mentiras e falsidades das personagens.
d) Pelo julgamento do Anjo, o Parvo embarca para o paraíso, uma vez que o céu pertence aos simples.
e) O autor vale-se do tema do Juízo Final para estabelecer uma crítica à sociedade, fazendo desfilar em cena os tipos
sociais identificados através de suas qualidades e defeitos.

6- Sobre o teatro de Gil Vicente e em especial o Auto da Barca do Inferno, são feitas as seguintes afirmações:
I. Uma das características do auto é a rica elaboração de cenários e a retomada dos padrões clássicos do teatro
grego.
II. O texto é de fundamental importância, uma vez que toda a carga teatral está no que é dito e não no que é visto.
III. O talento e a intuição lírica trouxeram ao teatro de Gil Vicente uma universalidade nunca antes alcançada na
Literatura Portuguesa. Assinale:
a) se todas as afirmações forem corretas.
b) se todas as afirmações forem incorretas.
c) se as afirmações I e II forem corretas.
d) se as afirmações II e III forem corretas.
e) se as afirmações I e III forem corretas.

7- Leia as proposições abaixo e assinale a alternativa correta sobre o Auto da barca do Inferno.
I. O Frade é condenado ao Inferno somente porque é brincalhão e excelente dançarino.
II. O Judeu aceitou pagar propina aos membros do judiciário e do clero e por isso terá sua alma condenada.
III. Os quatro cavaleiros são salvos, pois representam os verdadeiros valores da fé cristã.
a) Estão corretas a I e a III.
b) Estão corretas a II e a III.
c) Apenas a III está correta.
d) Apenas a II está correta.
e) Estão corretas a I e a II

8- Indique a afirmação correta sobre o Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente:


a) É intrincada a estruturação de suas cenas, que surpreendem o público com o inesperado de cada situação.
b) O moralismo vicentino localiza os vícios não nas instituições, mas nos indivíduos que as fazem viciosas.
c) É complexa a crítica aos costumes da época, já que o autor é o primeiro a relativizar a distinção entre o Bem e o
Mal.
d) A ênfase desta sátira recai sobre as personagens populares, as mais ridicularizadas e as mais severamente
punidas.
e) A sátira é aqui demolidora e indiscriminada, não fazendo referência a qualquer exemplo de valor positivo.

9- Considere as seguintes afirmações sobre o Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente:


I. O auto atinge seu clímax na cena do Fidalgo, personagem que reúne em si os vícios das diferentes categorias
sociais anteriormente representadas.
II. A descontinuidade das cenas é coerente com o caráter didático do auto, pois facilita o distanciamento do
espectador.
III. A caricatura dos tipos sociais presentes no auto não é gratuita nem artificial, mas resulta da acentuação de traços
típicos.
Está correto apenas o que se afirma em:
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(A) I.
(B) II.
(C) II e III.
(D) I e II.
(E) I e III.

10- Na seguinte cena do Auto da Barca do Inferno, o Corregedor e o Procurador dirigem-se à Barca da Glória, depois
de se recusarem a entrar na Barca do Inferno:
Corregedor
Ó arrais dos gloriosos,
passai-nos neste batel!

Anjo
Ó pragas pera papel, pera as almas odiosos!
Como vindes preciosos,
sendo filhos da ciência!

Corregedor
Ó! habeatis clemência
e passai-nos como vossos!

Joane (Parvo)
Hou, homens dos breviairos,
rapinastis coelhorum
et perniz perdiguitorum
e mijais nos campanairos!

Corregedor
Ó! Não nos sejais contrairos,
Pois nom temos outra ponte!
Joane (Parvo) Beleguinis ubi sunt?
Ego latinus macairos.

Vocabulário:
pera: para
habeatis: tende
homens dos breviairos: homens de leis Rapinastis coelhorum/Et perniz perdiguitorum:
Recebem coelhos e pernas de perdiz como suborno
Beleguinis ubi sunt?: Onde estão os oficiais de justiça?
Ego latinus macairos: Eu falo latim macarrônico
(Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno. São Paulo: Ateliê Editorial, 1996, p. 107-109.)

I. O Corregedor é acusado de corrupção na passagem em que o Parvo se refere ao fato de ele receber subornos,
“presentes”, “propinas”, “agrados”, pequenos mimos tais como coelhos e pernas de perdizes.
II. O Corregedor é acusado, na peça, de ser desrespeitoso (mijar nos campanários), injusto com relação aos
desfavorecidos, preguiçoso e adúltero, pecados pelos quais é condenado a seguir com o Diabo na Barca do Inferno.

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III. O Parvo se expressa em latim para ridicularizar e ironizar a postura dos magistrados. Chega a admitir essa
intenção, ao afirmar que seu latim é macarrônico.

Quais estão corretas?


(A) Apenas I.
(B) Apenas II.
(C) Apenas I e III.
(D) Apenas II e III
(E) I, II e III.

11 - (UFRGS – 2002) Assinale a alternativa incorreta sobre a obra de Gil Vicente.


a) Gil Vicente tem suas raízes na Idade Média, mas volta-se para o Renascimento, aliando o humanismo religioso à
atitude critica diante dos problemas sociais.
b) Variada na forma, a obra vicentina desvenda os costumes do século XVI, satirizando a sociedade feudal sem
perder o caráter moralista e resguardando o sentido de intervenção social.
c) Embora critique o clero, a nobreza e seu séquito ocioso, o teatro vicentino faz a exaltação heroica dos reis, atitude
comum na Idade Média.
d) Ao mesmo tempo que desenvolve a sátira social, a produção vicentina aponta para a necessidade de reforma da
Igreja, devido aos abusos do clero.
e) Trabalhando com uma verdadeira galeria de tipos, Gil Vicente adapta o uso da linguagem coloquial ao estilo e à
condição social de cada um deles.

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