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COMPREENSÃO
E PRODUÇÃO DE TEXTOS
CONTEXTUALIZANDO
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médio, dos conteúdos diários trocados em aplicativos de mensagens instantâneas
à elaboração de uma hipótese de leitura para viabilizar um trabalho acadêmico de
conclusão de curso, tudo, absolutamente tudo exemplifica como estamos,
periodicamente, atuando na compreensão e na produção de textos.
Para subsidiar o nosso debate ao longo de toda a disciplina, daremos
destaque nesta primeira aula para certas reflexões teóricas que nos permitam
entender o que podemos intitular como um texto, afastando-nos de atribuições
sistematizadoras e pouco producentes. Em seguida, elucidaremos as
propriedades de um discurso e de um enunciado e, com base nisso, a
possibilidade para se cotejarem as fronteiras entre o que está dito e o que pode
ser percebido. Por último, discorremos a respeito das distintas manifestações de
um texto a partir do que se entende como gêneros textuais.
Nesta fase de contextualização, momento em que nos aproximamos da
disciplina, infiro que cada discente tenha postulado as suas inquietudes a respeito
de uma temática que frequenta os nossos horizontes de expectativas desde os
deveres escolares. Sendo assim, permito-me fazer um convite para que
julgamentos e certezas cristalizados possam ser, ao menos, (re)lidos e
reconsiderados. A compreensão e a produção não precisam – ou melhor, dizendo,
não podem – ser tomadas como a pedra que tinha no meio do caminho, mas o
caminho que pode recontar a história de muitas pedras.
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mim, um texto é algo com, no mínimo, 15 linhas”. O que acha agora? A sentença
estaria mais verossímil, cumpriria com o repertório de uma criança afoita em
querer demonstrar os seus conhecimentos?
Não cabe agora, claro, elucubrar qual seria o período mais consistente para
responder o que está em xeque. Responder o que é um texto, para nós, adultos,
não é uma das tarefas mais fáceis, mesmo para aqueles que vivenciam o seu dia
a dia na área das Humanidades e até mesmo nas Letras. A nossa dificuldade se
deve muito ao fato de que, ao longo das últimas décadas, a percepção em relação
ao que entendemos como língua acabou ganhando aportes teóricos
fundamentais, desconstruindo, pouco a pouco, uma concepção simplista do
fenômeno linguístico. Falar que um texto é somente “um bloco textual escrito” já
não era mais convincente. Ao texto caberia uma incumbência muito mais ampla,
capaz de exemplificar as inúmeras manifestações discursivas utilizadas pelo ser
humano em seu dia a dia.
Dessa forma, um texto não deve ser vislumbrado tão somente como uma
sequência de enumerações justapostas, mas como uma fonte de enunciação
potencial. O que isso quer dizer? Ora, como se pode imaginar, muita coisa (muitos
novos textos). Tal postura teórica permitiu entender que um bilhete deixado para
alguém que se ama ou que seja colado na geladeira também é um texto; da
mesma maneira, é um texto uma fotografia, uma bula de remédio, uma imagem
grafitada na parede, a receita de bolo herdada por alguém da família, até mesmo
uma palavra.
Apenas uma palavra pode se converter em um texto? Ora, assumindo uma
atribuição contextual, sem dúvida alguma. Experimente pensar empiricamente: a
palavra pare, sozinha, comunica algo imediato para você, certo? O que você
entenderia ao ler apenas essa palavra pare em uma folha de caderno rasgada de
maneira displicente, caída no chão da sua casa? Uma possibilidade seria imaginar
que alguém estava bravo ou que pedia para o seu possível interlocutor mais
respeito, por exemplo. No entanto, você pensaria o mesmo ao ver essa palavra
no contexto em que ela está aplicada na página seguinte?
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Figura 1 – Placa de trânsito
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utilizadas propositalmente por um falante ou uma comunidade falante). Ao
perceber o texto não como um resultado de enumerações e alinhamentos
sintáticos coerentes, mas como a representação de uma unidade múltipla de
sentidos, de interações sociais, passa a ser cada vez mais clara a ideia de
unidades comunicativas. Assim, nessa rápida digressão e linha do tempo, é
possível perceber como a problemática voltada à linguística textual não guarda
nem mesmo meio século de reflexões, o que aponta para o seu caráter inicial e,
ao mesmo tempo, a infinidade de contribuições que a área tende a receber ao
longo de todo o século XXI.
Como vimos, com base na postura textual-discursiva empregada por
Marcuschi (2009) e outros pensadores sociointeracionistas, o texto é
compreendido não apenas como unidade composta de estruturas, mas, também,
como uma fonte de enunciação. Um exemplo catedrático dessa abordagem é o
desenvolvido pela linguista Koch na obra Desvendando os segredos do texto
(2001). O texto passa a ser caracterizado como o único material linguístico
observável, diferente de um fonema ou do morfema, sendo, por sua vez, articulado
por diferentes níveis, tais como aspectos linguísticos, sociais/históricos e
cognitivos. Esse viés é corroborado por outros teóricos, como Norma Goldstein,
Maria Silvia Louzada e Regina Ivamoto, responsáveis por conceituar o texto como
“toda produção linguística, oral ou escrita, que apresenta sentido completo e
unidade. Tais produções podem ser elaboradas por um ou mais de um autor,
numa determinada situação. (Goldstein; Louzada; Ivamoto, 2009, p. 11).
Ratifico o quanto devemos entender sempre que nenhum texto se constrói
como um conjunto de práticas enunciativas, não como um simples conglomerado
de informações justapostas. Todo texto é, mais uma vez, um evento comunicativo
ou proposta de sentido, que necessariamente depende da interação do leitor ou
de um ouvinte (no caso de um texto não escrito). Além de depender da interação
de um eventual interlocutor, para ler e dar significado a um texto, seja ele qual for,
é fundamental inter-relacionar as informações contidas em cada uma das
unidades linguísticas.
Na leitura de um romance, por exemplo, não atribuímos significados
isolados, ou seja, não lemos apenas o título ou cada capítulo separadamente. Ao
contrário, construímos uma espécie de teia discursiva, capaz de ligar diversos
conteúdos em prol de um sentido macro. Da mesma maneira, em uma charge,
não atribuímos sentido apenas para as cores, para o desenho ou para uma
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eventual frase dita. Cada elemento integrante se conecta (ainda que, em um
extremo, de maneira antitética), viabilizando a significação. Como bem postulado
pelo linguista Macedo (1976, p. 32),
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No entanto, no enunciado lírico, se transforma em verbo para aludir ao processo
de construção de uma manhã sendo anunciada; vira também substantivo o céu,
que é uma tela etérea, leve, pronta para servir de espaço para poeta e leitor. Por
meio de uma leitura que busca o todo, conseguimos vislumbrar o diálogo do
poema com outros textos, garantindo, assim, a construção do significado (ainda
que nunca tenhamos vivido no campo, podemos facilmente atribuir significado e
relacionar o cantar de um galo com o raiar do dia e o despertar o trabalho). Não
convencidos totalmente com o exemplo, nos aventuraremos na leitura de outro
texto: agora, uma fotografia.
Na primeira imagem a seguir, qual significado é possível depreender? O
que exatamente você lê ao identificar a cena?
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envolvendo o corpo da mulher. Esse nível de leitura concederia, assim, o
descortinar de um novo significado, a possível relação da natureza da mulher com
o dado concreto do urbano que nos traga pelo corre-corre da rotina e nos recria.
Pois bem, tentando propor seguir a nossa leitura em textos imagéticos,
seguimos com a próxima fotografia:
Figura 3 – Guardas
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Figura 4 – Tomando o bastão no Baton Rouge
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afastamos do significado total, descontruindo o texto ou, no mínimo, criando
outros dois textos distintos.
Diante disso, podemos construir dois critérios quando pensamos em um
texto:
1. Jamais tomar apenas um fragmento e julgar todo o texto por conta disso;
2. Entender que toda leitura deve considerar o contexto e o tensionamento
com demais textos já existentes.
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Em uma concepção em que a língua não se faz simplesmente como um
código, uma estrutura isolada, e tampouco o texto se refere a apenas ao
encadeamento de ideias, sendo, na verdade, toda e qualquer unidade linguística
dotada de sentido completo em um dado contexto, o discurso acaba se
transformando em uma instância de inquestionável valor para a construção de
sentido. Trata-se, pois, de uma proposta para entendê-lo como uma prática, não
exatamente como o objeto concreto da enunciação, como a materialização com
base em estruturas tangíveis e definidas. Em vez disso, é próprio do discurso
apontar – de maneira direta ou alusiva – o posicionamento do emissor de
determinado texto, a sua relação com as condições de produção que motivaram
certa elaboração.
Para viabilizar a nossa reflexão, pensemos na charge a seguir:
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Pois bem, ao propor a decodificação do texto-charge, é possível atribuir
como significado uma crítica sobre a realidade de um determinado extrato social,
que, mesmo em tempos de suposta evolução por conta da tecnologia, segue à
margem do consumo e dos contextos discursivos de outra parte da população. O
jogo irônico é construído pela polissemia das palavras “rede” e “social”. No
primeiro caso, temos acesso ao significado do primeiro léxico por conta do termo
ser retratado não somente pelos significantes (verbal e visual) imediatos, mas,
também, por conta da alusão a um tipo de comunicação ou suporte que enreda
milhares de pessoas em torno da internet. Já no segundo, a ambiguidade está no
fato de o aditivo social não ser usado exatamente como complemento de rede e,
por isso, da primeira leitura voltada às plataformas tecnológicas, mas a uma
possível alusão ao condicionante social, àquilo que estaria – ou deveria estar – à
disposição da sociedade. A priori, a proposta de leitura do texto e atribuição de
significado poderia ser realizada, com maior ou menor dificuldade, por grande
parte dos interlocutores.
Todavia, pensando na realidade discursiva de um receptor brasileiro, a
leitura poderia ser expandida com base em seu repertório, no seu conhecimento
de mundo. Eis, aqui, a relevância do discurso responsável por acionar a criação
da charge. Não sendo anacrônico, isto é, estabelecendo uma leitura sincrônica ao
tempo de criação da charge, o receptor poderia ativar o fato de que, justo em
2011, começavam a despontar o que seria a febre das redes sociais para subsidiar
a interação interpessoal virtual. A ironia construída pelo uso polissêmico do termo
rede social poderia ser – por que não? – uma referência ao desconhecimento de
uma parte da população sobre o tópico, uma construção de sentido altamente
verossímil para aqueles não alfabetizados com a linguagem digital. Além disso,
com base no discurso, poderia se pensar em questões conjecturais da realidade
econômica e social brasileira, que protagonizou, sobretudo na primeira década do
século XXI, uma nova configuração e padrão de consumo com distintos subsídios
planejados pelo governo federal. Nesse caso, o conceito de social se expandiria
e se relacionaria diretamente a uma sistemática clara de governar então vigente;
rede social poderia ser a personificação de outra ideia, projeto ou plano de
assistência e cuidado para certa população em risco econômico. Também via
discurso seria possível potencializar as unidades não verbais do texto (a imagem
da família na rede), atrelando tal representação a uma realidade regional
brasileira, ao fato de que muitas famílias, sobretudo nas regiões mais quentes, o
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tipo de acomodação para dormir continua sendo a rede. Percebemos, então, o
quanto o discurso subsidia a construção de significado de um texto. Como
veremos a seguir, a divisão entre texto e discurso nem sempre será tão catedrática
assim, o que fortalece a ideia de uma fronteira bastante tênue entre o que se
intitula como texto e o que se toma como discurso.
Para viabilizar a continuidade da nossa reflexão nesta disciplina, vale
retomar, com base nos estudos de Marcuschi, três das definições mais frequentes
quando se discorre a respeito do discurso:
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que constitui o conjunto das condições de vida de uma determinada comunidade
linguística” (Bakthin; Voloshinov, 2006, p. 107).
Ainda que possamos, de maneira didática, buscar aqui nuanças entre texto
e discurso, é fato que a sua diferenciação nos estudos da linguística textual
acabou sendo problematizada. A tendência contemporânea nos estudos
linguísticos é não propor uma dicotomia ou uma separação contundente entre o
que é um texto e o que é um discurso. De qualquer forma, se precisássemos
pensar em certas matizes entre os dois, seria possível dizer que é o texto é uma
espécie de objeto de figura (manifestação e materialização de algo dito), enquanto
o discurso é um objeto do dizer, a representação máxima da enunciação.
Segundo Marcuschi (2009, p. 58)
esta distinção entre texto e discurso é hoje cada mais complexa, já que
em certos casos são vistas até como intercambiáveis. A tendência é ver
o texto no plano das formas linguísticas e de sua organização, ao passo
que o discurso seria o plano do funcionamento enunciativo, o plano de
enunciação e efeitos de sentido na sua circulação sociointerativa e
discursiva envolvendo outros aspectos.
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Frisa-se a importância de que texto e discurso não sejam tomados como
valores proporcionais para diferenciar, respectivamente, a escrita da fala. Essa
comparação, além de incoerente, se distancia – e muito – de tudo o que
conversamos até aqui. Além de apontarmos as fronteiras porosas entre texto e
discurso, esta seção arquiteta o raciocínio com base na asseveração da
linguagem como resultado de um recorte ideológico e, portanto, não neutro,
pontuando – ainda que de maneira subjacente – questões como a noção de língua
e de registro (sobretudo no contexto da escrita).
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DEL RIGOR EN LA CIENCIA
. . . En aquel Imperio, el Arte de la Cartografía logró tal perfección que el
mapa de una sola Provincia ocupaba toda una Ciudad, y el mapa del
imperio, toda una Provincia, Con el tiempo, esos Mapas Desmesurados
no satisfacieron y los Colegios de Cartógrafos levantaron un Mapa del
Imperio, que tenía el tamaño del Imperio y coincidía puntualmente con
él. Menos Adictas al Estudio de la Cartografía, las Generaciones
Siguientes entendieron que ese dilatado Mapa era Inútil y no sin
Impiedad lo entregaron a las Inclemencias del Sol y de los Inviernos. En
los desiertos del Oeste perduran despedazadas Ruinas del Mapa,
habitadas por Animales y por Mendigos; en todo el País no hay otra
reliquia de las Disciplinas Geográficas. (Borges, 1974, p. 847)
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convencionais ou incidentais. Por suportes podemos ter, por exemplo,
embalagens, para-choques de caminhão, roupas, paredes, livros, o corpo humano
etc.
De acordo com Marcuschi (2009), os gêneros textuais também cumprem
com um regime de poder social, já que, a partir deles, também acessamos a
diferentes espaços sociais. Um exemplo rotundo dessa capacitação de
adequação a uma esfera discursiva se dá a partir dos gêneros acadêmicos (tese,
ensaio, dissertação etc.). Tudo o que escapa dos limites possíveis para os
gêneros acadêmicos, por exemplo, acaba sendo sentenciado como uma não
ciência.
FINALIZANDO
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estilo textual; além da consequente possibilidade de se viabilizar a análise de
leituras com base em um mesmo texto, dando margem para a discussão sobre a
compreensão textual.
Ademais, além de tudo o que foi comentado, foi possível, neste primeiro
encontro, demonstrar como a produção discursiva vai muito além do ato de
comunicar-se, uma vez que, para alimentar tal prática, é necessário estabelecer
parâmetros argumentativos e, sobretudo, alinhar-se a eixos que possam garantir
o reconhecimento e a decodificação de um determinado gênero textual. Para
escrever uma tese de doutorado, mais do que o aprofundamento e a pesquisa em
uma área, será necessário construir discursivamente uma hipótese a partir dos
parâmetros de tal gênero, oferecendo aos interlocutores possibilidades de
relacionar esse trabalho com outros de um mesmo grupo textual.
Em nossa próxima aula, seguiremos com a reflexão, dando especial
atenção para os aspectos que caracterizam a textualidade.
LEITURA COMPLEMENTAR
FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 17. ed.
São Paulo: Ática, 2007.
Saiba mais
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REFERÊNCIAS
FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 17. ed.
São Paulo: Ática, 2007.
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MACEDO, W. Elementos para uma estrutura da língua portuguesa. Rio de
Janeiro: Presença, 1976.
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