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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Capítulo III – Princípios Fiscais Artigo 104.º


Adam Smith apresentava na sua obra, quatro máximas fundamentais: Impostos

• Os cidadãos devem contribuir em função dos seus rendimentos e 1. O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das
riqueza; desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e
• Os impostos devem ser certos, não arbitrários; os rendimentos do agregado familiar.
• Os impostos devem incidir sobre os contribuintes ou sobre transações, 2. A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu
através da forma mais conveniente; rendimento real.
• Os custo de incidência e cobrança fiscal devem ser reduzidos ao
3. A tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os
mínimo;
cidadãos.
4. A tributação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à
A estas máximas outras foram sendo acrescentadas e nos estados modernos evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça
existe cada vez mais a preocupação de edificar e manter sistemas fiscais social, devendo onerar os consumos de luxo.
competitivos e justos.
À semelhança de outros ordenamentos jurídicos, a CRP nos seus artigos 103º e
104º define sistema fiscal com referência aos princípios fiscais fundamentais –
legalidade, igualdade e proibição da retroatividade.
No âmbito da União Europeia assumem especial relevância os princípios da
Artigo 103.º proporcionalidade e da não-discriminação. Experiências recentes demonstram
que os países da União terão de conciliar as suas políticas ficais internas com os
Sistema fiscal
princípios comunitários fundamentais, nomeadamente livre circulação de
1. O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do capitais e direito de estabelecimento no espaço da União.
Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos
rendimentos e da riqueza. O sistema fiscal português tem por objetivo cumprir os princípios de direito
fiscal, em regra seguidos pelos estados-membros da União Europeia, ou outros
2. Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa,
países desenvolvidos.
os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.
3. Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido Estes princípios têm sido enunciados pela doutrina e jurisprudência nacional,
criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroativa internacional e europeia.
ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei.

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1. Princípio da Neutralidade Este princípio comunitário exige que as opções dos contribuintes não devam ser
distorcidas por fatores fiscais, reclamando-se que situações idênticas devem ser
Atualmente, o principal objetivo prosseguido pelos sistemas ficais é “ser
tratadas de igual modo, evitando-se desigualdades de tratamentos e situações de
neutral”, isto é, eliminação de impostos que penalizem mais uma pessoa em
dupla tributação ou mesmo ausência dela.
relação a outra.
O princípio da neutralidade em sede de IVA vem, ainda, proibir a dupla
O imposto ideal será aquele que retira do contribuinte em proporção da sua
tributação, com implicações ao nível:
riqueza ou despesa, de modo que altere ao mínimo o seu padrão de
comportamento. • Da territorialidade;
• Da proibição da ausência de tributação;
As exigências feitas por este princípio podem resumir-se do seguinte modo:
• Do direito à dedução;
redução das taxas marginais do imposto e adoção de bases tributárias gerais com
um reduzido apelo a isenções ou benefícios fiscais. • Da transmissão de bens;
• Da faturação;
De um modo geral, estas exigências não se encontram observadas no sistema
legal português. De facto o rendimento do contribuinte português ainda se 2. Princípio da Equidade
encontra sujeito a elevadas taxas marginais de imposto e a existência de Não existe uma definição única de equidade. Para Adam Smith, um sistema
inúmeras isenções ou benefícios fiscais em nada contribuem para a neutralidade fiscal equitativo seria aquele no qual o contribuinte contribuiria em função dos
do sistema. benefícios que retirasse do uso de serviços públicos.
Num contexto internacional, este princípio pode assumir duas facetas: O princípio da equidade visa uma distribuição equitativa do rendimento através
neutralidade nas importações é alcançada quando investidores nacionais ou de uma tributação progressiva do rendimento. Os contribuintes com níveis mais
estrangeiros são tratados igualmente pelo país onde é realizado o investimento. elevados de rendimento ou património ficam sujeitos a taxas mais elevadas de
Neutralidade nas exportações é alcançada quando o sistema fiscal não incentiva imposto, graduadas em função do montante de rendimento obtido ou valor do
investimento no território nacional ou no estrangeiro. seu património.
Presentemente, tomando em consideração que a maioria dos países O sistema progressivo de tributação contrapõe-se aos sistemas regressivo
desenvolvidos são simultaneamente importadores e exportadores, os dois (estabelece uma redução gradual das taxas de imposto à medida que o
objetivos acima mencionados deverão ser prosseguidos simultaneamente. rendimento aumenta) e proporcional (indica apenas uma taxa fixa a aplicar ao
Em sede de IVA, o princípio da neutralidade aparece no contexto da rejeição do rendimento do contribuinte independentemente do seu montante) de tributação.
modelo de impostos em cascata, sendo também invocado para se opor às O sistema progressivo tem vindo a ser utilizado pela maioria dos países,
legislações nacionais consideradas incompatíveis com as regras comunitárias, especialmente ao nível dos contribuintes singulares. Pessoas coletivas, em geral,
bem como pelas administrações fiscais nacionais e pelos contribuintes dos são sujeitas a taxas proporcionais.
diversos estados membros.

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No caso português passou-se de um sistema proporcional de tributação para um O Estado exerce a sua jurisdição fiscal sob três vias:
sistema progressivo, penalizador do investimento e potenciador de fraude ou
abuso fiscais. • Territorial (ex.: tributação de imóveis);
• Residência do contribuinte (ex.: geralmente, e meramente para efeitos
Deste modo, este princípio tem vindo a demonstrar dificuldades em atingir o seu fiscais aplica-se o prazo de 6 meses para fixação de residência do sujeito
principal objetivo – distribuição equitativa do rendimento. num certo país);
• Nacionalidade (ex.: caso dos EUA, um americano está sujeito à
Recentemente, alguns países têm vindo a introduzir uma taxa proporcional
jurisdição fiscal americana ainda que residente ou possuidor de imóveis
aplicável a contribuintes individuais, em conjugação com uma isenção de
noutro país);
rendimento mais alargada de modo a beneficiar os contribuintes com níveis de
rendimento mais baixo. Uma vez definidas as fronteiras da sua jurisdição, que se realiza através de um
ou mais critérios acima referidos, a maioria dos Estados distingue entre os
Igualmente, a defesa do princípio da simplicidade fiscal que implica uma
contribuintes sujeitos a essa jurisdição e os contribuintes que não caem sob a
eliminação progressiva dos escalões do imposto, reduzindo deste modo tanto os
alçada da sua soberania fiscal.
custos individuais como da máquina administrativa para apuramento da taxa
efetiva do contribuinte, vai de encontro à lógica de um sistema proporcional de Esta distinção pode gerar comportamentos discriminatórios, nomeadamente
tributação. pela atribuição de isenções ou benefícios fiscais exclusivamente aos seus
residentes ou nacionais. Por exemplo, a mesma transação pode ser tributada
Presentemente, as pessoas coletivas encontram-se sujeitas a um sistema
diferentemente pelo facto de ser efetuada por um residente/nacional ou não
proporcional de tributação de tributação. Ao nível da tributação individual, o
residente/estrangeiro.
sistema fiscal português estabelece taxas proporcionais para certas espécies de
rendimento. No entanto, na tributação global do rendimento individual, o No seio da União Europeia, o objetivo é de permitir de facto a livre circulação
sistema ainda se encontra sediado numa lógica de tributação progressiva. de pessoas, serviços e capitais, abolindo quaisquer elementos discriminatórios
que possam impedir o cabal cumprimento desse objetivo, tais como, tratamentos
3. Princípio da Não-Discriminação
discriminatórios efetuados pelos estados-membros e diluindo ao mesmo tempo
O princípio da não-discriminação tem assumido um papel proeminente no o efeito útil de certas distinções como, a distinção entre residente e não residente.
contexto da política fiscal da União Europeia.
4. Princípio da Territorialidade
Trata-se de um princípio que só ganha efeito útil quando confrontado com o caso
De acordo com este princípio, os Estados exercem a sua jurisdição fiscal sobre
concreto. Este casuísmo, necessário para evitar iniquidades, impede a definição
todos os bens, pessoas e transações conectados com o seu território. Deste modo,
completa e teorética do conceito “não discriminação”.
o Estado pode tributar qualquer atividade de qualquer contribuinte dentro do seu
Não-discriminar implica tratar igualmente o que é igual ou diferentemente o que espaço territorial independentemente da “filiação” do sujeito à sua jurisdição.
é diferente. O problema reside precisamente em identificar as igualdades ou
desigualdades.

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A aplicação exclusiva deste princípio levanta problemas em sede de tributação ➢ Aplicação de tributação segundo o princípio da territorialidade às
de transações, uma vez que, atualmente, com a crescente expansão do comércio pessoas singulares – art. 13º nº1 (residentes) + art. 15º nº2 CIRS (não
eletrónico, especialmente via internet, trona-se muitas vezes complicado ou até residentes);
mesmo impossível relacionar uma específica transação com uma dada jurisdição ➢ Estabelecimento estável – art. 5º nº1;
fiscal. Frequentemente, as transações escapam à “rede” fiscal, com manifesto
5. Princípio da Residência
prejuízo para os cofres fiscais dos Estados envolvidos.
O princípio da residência é adotado em quase todos os países à exceção dos
A definição do princípio da territorialidade faz-se, no sistema fiscal português,
EUA.
com base nos seguintes critérios:
A tributação segundo o critério da residência envolve tributar o rendimento
• Existência de estabelecimento estável (instalação física, não tem
independentemente do local onde é originário, isto é, a jurisdição fiscal é
personalidade jurídica, mas desenvolve uma atividade económica)
exercida pelo Estado da residência do contribuinte.
localizado em território português;
• Definição e tipos de rendimentos sujeitos a retenção na fonte a taxas Assim, o Estado da residência do contribuinte toma em consideração para efeitos
reduzidas; de cálculo da sua dívida fiscal, a totalidade dos seus rendimentos, ainda que
obtidos noutros Estados. Nestas circunstâncias, o contribuinte poderá ver a sua
Em conjugação, estes dois critérios, são utilizados pelo Estado português sobre
carga fiscal diminuída, caso seja por via unilateral ou bilateral (através de
os não-residentes.
convenções sobre dupla tributação internacional), existam mecanismos para
No que toca aos rendimentos sujeitos a retenção na fonte, a taxas reduzidas, eliminar ou atenuar a dupla ou múltipla tributação internacional.
convém distinguir entre os que são obtidos em território nacional e os que são
O princípio da residência é definido no CIRC com base em dois critérios:
pagos direta ou indiretamente por sujeitos passivos com residência ou
estabelecimento estável aí localizado. • Critério da sede – corresponde ao local onde se encontra a sede da
sociedade, isto é, o local onde se dá a tomada de decisões da sociedade.
Por este meio e tornando extensível à entidade empregadora a obrigação de reter
É no local desta que a empresa será tributada;
e entregar o imposto em substituição do beneficiário ou contribuinte, preserva-
• Critério da direção efetiva – corresponde ao local onde efetivamente se
se a base tributária e permite-se uma arrecadação rápida e tempestiva do
encontra a atividade financeira da sociedade independentemente da sede
imposto. Permite-se igualmente transferir parte do esforço de fiscalização ou
se situar noutro país;
inspeção tributária para agente económicos que, em princípio, dispõem de uma
determinada capacidade económica e organizativa. Exemplo: A sede da sociedade X encontra-se no paraíso fiscal das Caraíbas,
mas a sua atividade financeira ocorre em Portugal, logo a sociedade é
Artigos Relativos:
considerada residente no local da sua direção efetiva, ou seja, Portugal.
➢ Aplicação de Tributação segundo o princípio da territorialidade às
Nota: A questão dos paraísos fiscais leva a que o critério da sede não seja
pessoas coletivas – art. 4º nº2 CIRC;
suficiente, logo, é necessário aplicar-se o critério da direção efetiva.

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Na prática podem acontecer situações de dupla residência (sede localizada num ➢ Estabelecimento estável – art. 5º nº1 CIRC;
local e direção efetiva noutro), prevendo as convenções sobre dupla tributação ➢ Aplicação de tributação segundo o princípio da residência às pessoas
disposições para alocação da jurisdição fiscal apenas a um dos Estados coletivas – art.4º nº1 CIRC;
contratantes. ➢ Aplicação de tributação segundo o princípio da residência às pessoas
singulares – art. 13º nº1 + art. 15º 1 CIRS;
Situação inversa pode ocorrer, e recentemente têm vindo a público situações de
➢ Direção efetiva – art. 19º nº12 LGT;
plenamente abusivo, onde os contribuintes, devido a uma repartição dos critérios
➢ Residente não habitual – art. 16º nº 8 a 12 CIRS;
de alocação de residência, acabam por não ser tributados em qualquer dos
Estados onde estão sediados ou têm a sua direção efetiva. 6. Princípio da Nacionalidade
Para contribuintes singulares, o princípio da não residência encontra-se definido O princípio da nacionalidade é aplicado nos EUA.
no CIRS que estabelece uma série de testes, como por exemplo:
De acordo com este princípio, o Estado da nacionalidade exerce plena jurisdição
• Um mínimo de 183 dias de presença no país (seguidos ou interpolados) fiscal sobre o contribuinte. Rendimentos obtidos noutros Estados, seja ele
em qualquer período de 12 meses, com início ou fim no ano em causa; Estado da residência ou Estado da fonte, são também tributados pelo Estado da
• Se forem menos de 183 dias, um indivíduo é considerado residente no nacionalidade do contribuinte.
caso de dispor, em Portugal, de habitação em condições que façam supor
Este princípio assume uma abrangência jurisdicional máxima, colidindo com os
intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual;
princípios da residência e da territorialidade. Por exemplo, ainda que o
• Os tripulantes de navios ou de aeronaves são considerados residentes no
contribuinte resida noutro Estado, e aí esteja sujeito à jurisdição fiscal em
país desde que, a 31 de dezembro, estejam ao serviço de entidades com
consonância com o princípio da residência, a competência jurisdicional fiscal
residência ou sede (ou direção efetiva) no país;
permanece com o Estado de nacionalidade.
• Os funcionários do governo português que trabalhem no estrangeiro
continuam a ser considerados como residentes no país; A aplicação deste princípio pode dar origem à dupla tributação, principalmente,
• No caso de um agregado familiar, a residência fiscal é aferida em em países em que não existam acordos relativos à tributação.
relação a cada sujeito passivo do agregado.
7. Princípio da Transparência
Recentemente, o legislador português tem vindo a ficcionar o conceito de
Um sistema fiscal que se propõe ser transparente e simples tem de reduzir ao
residência em várias situações, nomeadamente, em casos de planeamento fiscal
mínimo as situações de exceção e abolir simultaneamente o número de isenções
abusivo. Ainda aperfeiçoou o conceito de residente introduzindo a figura do
especificas ou casuísticas e a atribuição de benefícios fiscais a certos
residente não habitual, assim como, as situações de perda da qualidade de
contribuintes ou transações em particular.
residência.
Tanto a OCDE como a Comissão das Comunidades Europeias têm desenvolvido
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esforços consideráveis tendentes à publicitação e racionalização de particulares
➢ Conceito de residência - art. 16º nº1 CIRS; incentivos ou benefícios fiscais atribuídos pelos Estados-membros. O fenómeno

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da concorrência fiscal prejudicial tem vindo a ser analisado, nomeadamente o Cumpre referir que o trabalho da OCDE neste domínio levou à modificação ou
uso de “paraísos fiscais” ou adoção pelos Estados dos chamados “regimes ficais abolição de mais de 30 regimes fiscais preferenciais, conforme definida por esta
preferenciais”. organização internacional.
A noção de paraíso fiscal pressupõe a existência de algum ou alguns dos Finamente, cumpre referir os acordos do GATT, e posteriormente do seu
seguintes fatores: sucessor a OMC, e a fiscalização do seu cumprimento no âmbito Trade Policy
Review Mechanism.
• Isenção total de impostos ou aplicação apenas de taxas nominais;
• Ausência de troca de informações e sigilo bancários; No caso específico da tributação, o princípio da transparência na OMC comporta
• Falta de transparência (ex.: atribuição de benefícios fiscais numa base 4 elementos fundamentais.
contratual e informações ou procedimentos fiscais não devidamente
• A descrição do tipo de medida fiscal adotada;
publicitados);
• A sua função e objetivos;
• Ausência de prática efetiva ou real de atividades;
• O seu custo (ou benefício) em termos de receita fiscal;
A noção de regime fiscal preferencial compreende os seguintes critérios: • A sua avaliação económica em termos de eficácia na prossecução dos
objetivos pretendidos;
• Isenção total ou aplicação de taxas efetivas reduzidas de impostos;
• Atribuição de benefícios fiscais ou regimes fiscais mais favoráveis 8. Princípio da Simplicidade
exclusivamente a não residentes;
É comummente aceite entre fiscalistas que o sucesso de um sistema fiscal passa
• Falta de transparência;
também pela simplicidade. Um sistema fiscal deverá ser simples.
• Ausência de troca de informações e sigilo bancário;
Primeiramente, deverá ser dotado de leis fiscais claras e objetivas, evitando
O objetivo é eliminar ou reduzir progressivamente estas situações de exceção, noções ambíguas, leis atualizadas e condensadas num só documento, afim de
tornando os sistemas mais transparentes para o contribuinte e de mais fácil evitar incertezas ou contradições legislativas.
administração para o aparelho estadual.
Seguidamente, o sistema deverá eliminar elementos burocratizantes, com
Várias iniciativas forma lançadas no sentido da implementação prática do excessivo formalismo e rigidez. Por exemplo, a imposição exagerada de
princípio da transparência, nomeadamente publicação de um código europeu de obrigações acessórias pode ela própria ser indutora de fraude, penalizando os
conduta, introdução de tratados específicos, refinamento das disposições contribuintes cumpridores.
relativas às trocas de informações entre Estados e ajuda na cobrança de impostos
no âmbito da Convenção Modelo da OCDE sobre o rendimento e capital e, por Igualmente, e em conjugação com o princípio da transparência, deverão ser
último, a utilização de medidas defensivas que visam a preservação da base eliminadas ou reduzidas situações de favorecimento de certo tipo de
tributável ou evitar a utilização abusiva dos regimes fiscais nacionais. contribuintes, mediante a concessão via legislativa ou administrativa de
benefícios ou incentivos fiscais.

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Finalmente, importará seguir certas diretrizes básicas tais como: Eficiência, em sentido económico, só poderá ser alcançada se o sistema neutral,
impondo que todo o rendimento seja sujeito à mesma taxa de imposto. No
• Redução dos escalões de imposto; entanto, o princípio comporta outras vertentes, nomeadamente de natureza
• Eliminação da aplicação de diferentes taxas ao mesmo tipo de jurídica e de gestão.
rendimento;
• Redução das taxas marginais; Para Adam Smith, por exemplo, o princípio da eficiência implicaria que os
• Adoção de impostos simples e de fácil compreensão pelos contribuintes custos de incidência e cobrança fiscal deveriam ser reduzidos ao mínimo.
e administração fiscal; Numa aceção mais lata, poderá defender-se que um sistema fiscal eficiente
9. Princípio da Reciprocidade deverá também tomar consideração os princípios da simplicidade,
reciprocidade, transparência e, no contexto da União Europeia, o princípio da
Conforme doutrina internacional consolidada, o princípio da reciprocidade é de não-discriminação.
exclusiva aplicação internacional e logra também aplicação no contexto da
União Europeia. 11. Princípio da Não-Retroatividade

De acordo com este princípio, e via de regra quando os estados negoceiam Portugal pode ser apontado como um excelente exemplo de um país que cumpre
tratados sobre dupla tributação, pretende-se um equilíbrio entre os benefícios e integralmente o princípio da não-retroatividade mas, infelizmente, pelas razões
os custos fiscais alcançados pelos Estados envolvidos no processo de erradas.
negociação. Na perspetiva constitucional, a CRP estabelece no art. 103º dois tipos de
A reciprocidade pode ser geral, cobrindo o sistema fiscal na sua globalidade ou limitações reativas à retroatividade das leis fiscais. A primeira é a proibição de
o tratado globalmente considerado, ou específica, visando um tipo ou categoria aplicação de impostos com efeito retroativo e a segunda concerne à legalidade
específica de rendimento. Pode ainda ser formal ou efetiva. Neste último, existe do pagamento e cobrança dos impostos.
uma igualdade de cargas fiscais efetivas. Há um consenso generalizado de que a introdução de novos impostos e
Geralmente aplica-se quando os Estados cobram iguais taxas de retenção na mudanças nas bases fiscais ou taxas não devem ser aplicadas retroativamente.
fonte aos rendimentos de juros, dividendos e royalties. Contudo, as opiniões divergem na aplicação da segunda limitação concernente
à retroatividade das disposições fiscais relativas ao pagamento e cobrança de
Esta reciprocidade especifica pode ser alargada, implicando o abandono desta impostos. Vários autores admitem que o principio da não retroatividade pode ser
paridade em favor da atribuição pelos Estados de outros tipos de concessões ao afastado no âmbito do pagamento e cobrança de impostos porque,
investimento estrangeiro. frequentemente, essas disposições visam aumentar a eficiência e a segurança no
10. Princípio da Eficiência processo de pagamento e cobrança de impostos.

O princípio da eficiência está intimamente relacionado com o princípio da Na perspetiva do Direito Civil, começando pelo princípio geral previsto no CC,
o art. 12º dispõe que alei só se aplica a circunstâncias futuras, depois da sua
neutralidade.
publicação e entrada em vigor. Tanto os factos como os seus efeitos, que

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ocorreram sob o domínio temporal da “lei antiga”, não podem ser objeto do novo A implementação de penas é também coberta pelo âmbito da retroatividade e
regime. Diferentemente, no art. 13º, a retroatividade é aceite no caso de leis ou deve ser ajustada ou eliminada em conformidade. A retroatividade não é
disposições interpretativas se aquelas não excederem o objetivo e a substância admitida se derrogar princípios comummente aceites de Direito Internacional.
da lei interpretada e também salvaguardando os casos julgados ou acordos
Estes critérios constitucionais são confirmados pelo art. 2º CP, mas,
celebrados.
infelizmente, desconsiderados no art. 3º do Regime Geral de Contraordenações.
Por sua vez, na perspetiva do direito fiscal, o princípio da não retroatividade (art.
Na área das contraordenações fiscais, a retroatividade de um regime fiscal mais
12º LGT), é conforme os supramencionados e adapta os mesmos à área fiscal,
benéfico é permitida, mas negada nos casos de casos julgados e de leis que
abrangendo também as disposições processuais fiscais.
estipulam o seu específico período de validade (leis temporárias).
Estas adaptações introduzidas pelos art. 12º consideram o caso especial dos
Por fim, sob a perspetiva internacional ou da UE, a retroatividade é aceite se
factos passados cujos efeitos ainda persistem sob o domínio da lei nova e a
prescrita pela legislação internacional ou da UE, de acordo com o art. 8º da CRP.
solução geral dada pela LGT é regular tais efeitos de acordo com a lei nova. Esta
derrogação ao princípio geral de direito civil, constitui uma violação do Ressalva-se que as leis internacionais e da UE prevalecem sobre as leis internas
princípio da não retroatividade que pode ser aceite sobretudo por considerações e, em caso de conflito, as primeiras prevalecem sobre as segundas.
económicas e de eficiência.
No respeita às normas processuais fiscais, a retroatividade não é admitida e os
efeitos da lei revogada podem persistir ao abrigo do novo regime legal para
salvaguardar direitos estabelecidos ou espectáveis do contribuinte.
O princípio da não retroatividade tem também diferente impacto legal e
económico no sistema fiscal, dependendo da estrutura ou tipo de imposto. No
caso de impostos sobre o consumo, frequentemente, o desfasamento temporal
entre os factos tributáveis e a ocorrência dos seus efeitos é reduzido ou até nulo
e consequentemente a aplicação do princípio não levanta problemas
particulares. Contudo, o caso para os impostos sobre o rendimento ou
património cujos factos ou efeitos se produzem ao longo do ano civil e qualquer
alteração legal neste período pode colocar questões de retroatividade.
Na perspetiva do direito penal ou contraordenacional fiscal, o art. 29º CRP
expressamente proíbe a retroatividade nos casos penais e contraordenacionais a
não ser que a nova lei introduza um regime mais favorável para o cidadão.

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Capítulo IV – Os Impostos sobre o Rendimento 1.1 As categorias de rendimentos


1. IRS O CIRS estabelece 6 categorias:
O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares foi introduzido no sistema • Categoria A – rendimentos de trabalho dependente;
fiscal português pelo DL nº 442-A/88 de 30 de novembro.
Os rendimentos elencados na categoria A aparecem descritos pelo legislador de
Este imposto incide sobre o valor anual dos rendimentos dos contribuintes uma forma exaustiva, compreendendo as renumerações principais e acessórias,
singulares, depois de efetuadas as correspondentes deduções. fixas ou variáveis, periódicas ou ocasionais, pagas ou postas à disposição do
trabalhador.
O rendimento dos contribuintes aparece agrupado segundo categorias às quais
correspondem regimes específicos. • Categoria B – rendimentos empresariais e profissionais (trabalho
independente);
O rendimento tributável do contribuinte é apurado após sujeição, das suas
diferentes categorias de rendimento, às regras estipuladas no código de IRS e Na categoria B, a determinação dos rendimentos é feita em consonância com as
feitas as correspondentes deduções a essas categorias específicas de regras contabilísticas e fiscais aplicáveis (art. 32º CIRS) ou, em alternativa o
rendimentos. regime simplificado de tributação nos termos do art. 31º CIRS.
O rendimento líquido total consiste na soma dos rendimentos específicos do • Categoria E – rendimentos de capitais;
contribuinte após deduções permitidas ao abrigo de cada uma das categorias
(técnica de englobamento). No âmbito da categoria E, optou o legislador também por cobertura
compreensiva, incluindo, nomeadamente os juros, os dividendos, os ganhos
Uma vez efetuadas as deduções, o rendimento final tributável do contribuinte é decorrentes de instrumentos financeiros derivados, etc.
sujeito a um sistema de taxas progressivas.
• Categoria F – rendimentos prediais;
Para o cálculo do imposto final, o CIRS concede ainda deduções ao montante
de imposto a pagar: deduções à coleta. Os rendimentos da categoria F consistem nas rendas dos prédios rústicos,
urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares. O
Apenas os rendimentos de contribuintes individuais residentes em território legislador define o conceito fiscal de renda que integra não só a componente
português estão sujeitos ao princípio da “tributação mundial” – princípio da jurídica, mas também a componente económica subjacente à exploração do bem
residência. ou direito.
Aos contribuintes com residência no estrangeiro, mas com rendimentos • Categoria G – incrementos patrimoniais;
originários em território português, aplica-se o princípio da territorialidade.
Na categoria G assumem especial relevo as mais-valias, não esquecendo o
Indivíduos não residentes, sem rendimentos originários em território português, legislador de integrar também nesta categoria, nomeadamente, os acréscimos
não estão sujeitos a IRS. patrimoniais não justificados e outros de natureza incerta ou variável.

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• Categoria H – rendimentos de pensões; • A percentagem do saldo negativo a que se refere o nº2 do art. 43º do
CIRS só pode ser reportada aos cinco anos seguintes àquele a que
A categoria H fundamentalmente consiste nas prestações devidas a título de
respeita;
pensões de aposentação ou de reforma, velhice, invalidez ou sobrevivência e
• O saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações
ainda as pensões de alimentos.
previstas no art. 10º nº1 alíneas b), c), e), f), g) e h) CIRS, pode ser
1.2 Deduções reportado para os cinco anos seguintes quando o sujeito passivo opte
pelo englobamento.
O CIRS prevê dois tipos de deduções. Deduções aos rendimentos das categorias
acima enunciadas (deduções específicas) e deduções ao montante de imposto, Quando a determinação do rendimento for efetuada nos termos dos art. 87º, 88º
calculado após efetuadas as deduções ao rendimento e aplicação das taxas e 89-Aº da LGT, não há lugar à dedução do resultado negativo apurado em
(deduções à coleta). qualquer categoria de rendimentos, sem prejuízo da sua dedução nos anos
seguintes, dentro do período legalmente previsto.
As categorias de rendimentos admitem deduções especificas à exceção da
categoria E. O direito ao reporte do resultado líquido negativo previsto na alínea b) fica sem
efeito quando os prédios a que os gastos digam respeito não gerem rendimentos
Exemplo: na categoria A são dedutíveis sem limite as contribuições obrigatórias da categoria F em pelo menos 36 meses, seguidos ou interpolados, dos cinco
para a segurança social; na categoria F os gastos com o prédio, despesas de anos subsequentes àquele em que os gastos foram incorridos.
condomínio obrigatórias, gastos relativos a obras de conservação e manutenção
do prédio, IMI e imposto do selo; na categoria H prevê o legislador uma dedução 1.3 As taxas
específica fixa.
O sistema fiscal português visa tributar os contribuintes em consonância com o
A dedutibilidade de gastos ou despesas, em sede de “deduções à coleta”, está princípio da progressividade.
diretamente relacionada com razões de política social, familiar e cultural.
O CIRS estabelece taxas progressivas de imposto aplicáveis a um número
Prevê ainda o CIRS a possibilidade de dedução de perdas nas seguintes alargado de escalões de rendimento. Critérios de simplicidade impõem um
situações: relativamente a cada titular de rendimentos, o resultado líquido número reduzido de taxas e escalões.
negativo apurado em qualquer categoria só é dedutível aos seus resultados
Salvaguardando o chamado “mínimo de existência”, que implica a não
líquidos positivos da mesma categoria, nos seguintes termos:
tributação de rendimentos necessários à subsistência, os rendimentos dos
• O resultado líquido negativo apurado na categoria B só pode ser contribuintes em geral, após englobados e efetuadas as deduções específicas às
reportado, de harmonia com a parte aplicável do art. 52º CIRC, aos 12 categorias de rendimentos, são sujeitos a um sistema de taxas progressivas
anos seguintes àquele a que respeita; ´ definidas pelo legislador como taxas normais e médias.
• O resultado líquido negativo apurado em determinado ano na categoria Este sistema progressivo de tributação é afastado pelo legislador nas situações
F só pode ser reportado aos seis anos seguintes àquele a que respeita; de aplicabilidade de taxas liberatórias ou taxas especiais. Nestes casos, os

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rendimentos estão sujeitos a taxas proporcionais reduzindo a carga fiscal A redução de custos administrativos e a transparência do sistema passa também
inerente a um sistema progressivo de tributação. por uma maior participação/colaboração do contribuinte. Na maioria dos países
desenvolvidos é pedido ao contribuinte não só que declare os rendimentos que
A técnica de retenção na fonte, consiste em atribuir a certas entidades a
aufere ou possui, mas também o cálculo do imposto a pagar. Este mecanismo
capacidade de arrecadação de imposto que subsequentemente será entregue aos
permite libertar os serviços da administração fiscal para tarefas essenciais a um
cofres do Estado. Por motivos de facilidade e a fim de evitar a fraude fiscal,
regular e normal funcionamento do sistema fiscal.
certos rendimentos são entregues ao contribuinte líquido de imposto: o imposto
é retido na fonte. A retenção pode ser definitiva ou provisória, qualificando neste 1.5 Os trabalhadores dependentes e independentes
último caso como “pagamento por conta” (art. 188º CIRS).
Os trabalhadores podem exercer a sua atividade como trabalhadores
O princípio da progressividade atinge essencialmente as classes com menores dependentes ou trabalhadores independentes.
recursos ou/e trabalhadores dependentes. Contribuintes com mais recursos
Na primeira situação, nos termos CIRS, os seus rendimentos consideram-se
beneficiam não só da aplicação de taxas proporcionais a certos tipos de
rendimentos da categoria A e consistem em renumerações periódicas (fixas ou
rendimentos, como da não tributação efetiva de benefícios em espécie,
variáveis) que podem assumir designadamente as seguintes modalidades –
frequentemente atribuídos pela entidade patronal ou instituições a que estão
ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões,
vinculados.
participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos,
Igualmente, a diversidade de taxas (normais art. 68º; liberatórias art. 71º e indeminizações ou outras renumerações acessórias.
especiais art. 72º) e regimes aplicáveis aos diferentes rendimentos dos
Diferentemente, na segunda situação, o CIRS qualifica como rendimentos de
contribuintes gera injustiças e torna o sistema mais complexo e dispendioso de
trabalho independente:
administrar. Os principais beneficiários destes regimes são as instituições
financeiras. Tais características impedem a transparência do sistema, podendo • Os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial;
levar a um aumento da fraude ou evasão fiscal. • Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de
Contrariamente à tendência atual em Portugal, e mesmo no caso de países prestação de serviços;
tradicionalmente associados a regimes de tributação elevada, assiste-se a uma • Os provenientes da propriedade intelectual: incluindo-se os direitos de
redução progressiva das taxas de imposto sobre o rendimento bem como à autor e direitos conexos;
redução das taxas que incidem sobre as contribuições para a segurança social. • As indemnizações auferidas, conexas com a atividade exercida;
• Os subsídios ou subvenções auferidos no âmbito do exercício, por conta
Cumulativamente, têm vindo a ser introduzidos nos sistemas fiscais os própria, de qualquer atividade de prestação de serviços;
chamados “impostos verdes ou ambientais”, que propiciam uma fonte de receita • Os provenientes da prática de atos isolados de qualquer atividade
alternativa para o decréscimo de receite fiscal que advém da progressiva redução comercial;
de taxas de imposto. • Os provenientes da prática de atos isolados de qualquer atividade de
1.4 A colaboração do contribuinte prestação de serviços;

11
Direito Fiscal – 1ª Frequência

No exercício da sua atividade como trabalhador dependente o CIRS permite 1.5.1 Os pensionistas
também a dedutibilidade das seguintes despesas ao seu rendimento bruto ou
As pensões estão sujeitas a tributação nos termos gerais do CIRS. Incluem-se
ilíquido:
aqui as pensões de aposentação ou reforma, velhice, invalidez ou sobrevivência
a) uma dedução especifica fixa de 4104 euros; e ainda as prestações pagas por companhia de seguros, fundos de pensões e
b) as contribuições obrigatórias para a segurança social, pela sua outras entidades equiparadas.
totalidade, caso excedam o limite acima indicado;
Aos rendimentos brutos do pensionista estabelece o CIRS uma dedução fixa de
c) as quotizações sindicais nos termos do art. 25º nº1 c) CIRS;
4104 euros, podendo ainda ser deduzidas as seguintes despesas:
d) as indemnizações pagas pelo trabalhador à entidade patronal por
rescisão unilateral do contrato individual de trabalhador sem aviso • quotizações sindicais nos termos do art. 53º nº4 a) CIRS;
prévio. • as contribuições obrigatórias para a segurança social;
Diferentemente, o trabalhador que exerça a sua atividade como trabalhador 1.5.2 Os trabalhadores com deficiência
independente determinará os seus rendimentos e despesas de acordo com os
seguintes regimes estabelecidos no CIRS: Os rendimentos brutos de trabalhadores com deficiência são apenas tributados
em 85% no caso de trabalhadores dependentes e independentes e 90% no caso
a) contabilidade organizada; dos pensionistas.
b) regime simplificado, caso tenha obtido no ano de tributação
imediatamente anterior um rendimento ilíquido da sua atividade que não 1.5.3 Os bolseiros
ultrapasse os 200.000.
No sistema fiscal português, as bolsas de estudo encontram-se isentas da
No exercício de início de atividade, o enquadramento no regime
incidência de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, em virtude de
simplificado faz-se em conformidade com o valor anual de rendimentos
não gerarem relações de natureza jurídico-laboral, nem de prestação de serviços.
estimado, constante da declaração de início de atividade;
c) opção pela tributação como trabalhador dependente, caso preste Cumpre salientar que a atividade intelectual a exercer pelos bolseiros deve ser
serviços a uma única entidade, com ressalva de prestações de serviços efetuada sob a autoridade e supervisão de uma terceira entidade devendo
abrangidos pelo regime de transparência fiscal; entidade financiadora fiscalizar as condições da instituição de acolhimento e
d) no caso de atos isolados, aplicam-se os limites acima estabelecidos para resultados obtidos pelos bolseiros, no período de estudo e formação.
opção entre o regime simplificado e o regime de contabilidade
organizada; 1.5.4 As taxas de imposto e as deduções à coleta
e) o CIRS não aceita a dedutibilidade das seguintes despesas: Os trabalhadores dependentes e independentes, estão sujeitos às taxas
renumerações do trabalhador, ajudas de custo, utilização de viatura progressivas de imposto estabelecidas no art. 68º CIRS exceto se aplicáveis
própria ao serviço da atividade, subsídio de refeição e outras prestações taxas liberatórias ou especiais sobre determinados rendimentos (rendimentos de
de natureza remuneratória capitais, prediais ou mais valias) ou taxas de tributação autónoma sobre
determinadas despesas, nomeadamente:

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

• despesas não documentadas, de sujeitos passivos que devam possuir • tributação de rendimentos resultantes da transmissão onerosa de
contabilidade organizada, no âmbito do exercício de atividades participações sociais de entidades com sede ou direção efetiva em
empresariais e profissionais; Portugal.
• encargos suportados por sujeitos passivos que devam possuir
Salvo exceções previstas no CIRC, o IRC é devido por cada exercício
contabilidade organizada, no âmbito do exercício de atividades
económico, que coincide com o ano civil.
empresariais e profissionais, relativos a despesas de representação e a
viaturas ligeiras de passageiros ou mistas nos termos do art. 73º CIRS; 2.1 Matéria coletável e lucro tributável
• despesas relacionadas com importâncias pagas a entidades residentes
em “paraísos fiscais”; A matéria coletável é determinada pela dedução ao lucro tributável dos prejuízos
e benefícios fiscais aplicáveis.
O CIRS prevê ainda a dedutibilidade de determinadas despesas em sede de
deduções à coleta, nomeadamente a dedução de despesas de formação e Por regra, o lucro tributável deverá ser determinado com base na contabilidade,
educação nos termos do art. 78-D. mas ajustado pelo CIRC em função, nomeadamente dos seguintes critérios:

2. IRC • conformidade com o princípio da especialização dos exercícios;


• definição de rendimentos e gastos;
O imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas incide sobre o lucro das • não dedutibilidade ou apenas dedutibilidade parcial de determinados
sociedade cooperativas, empresas públicas e outras pessoas coletivas que gastos;
exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou • regime de depreciações e amortizações;
agrícola de modo continuado. • regime de imparidades e provisões previstos no CIRC;
O IRC incide sobre a totalidade dos rendimentos das pessoas coletivas, com sede De acordo com o CIRC, consideram-se rendimentos os derivados de operações
ou direção efetiva em território português, incluindo os obtidos em território de qualquer natureza em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica
estrangeiro (princípio da residência). ou meramente acessório e gastos todos aqueles que comprovadamente forem
As pessoas coletivas que não tenham sede em direção efetiva em Portugal, ficam indispensáveis para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
sujeitas ao principio da tributação territorial. Para além da razoável margem de apreciação que é deixada à administração
Vários exemplos podem ser indicados da aplicabilidade do princípio da fiscal relativamente à admissibilidade, ou não, de determinados gastos, este
territorialidade no sistema fiscal português: critério possibilita uma maior compatibilização entre as regras fiscais ou
contabilísticas, simplificando e reduzindo os custos de cumprimento das
• tributação dos rendimentos de estabelecimentos estáveis de sociedades obrigações fiscais por parte do contribuinte.
com sede ou direção efetiva no estrangeiro;
• tributação de rendimentos relativos a imóveis situados em Portugal; 2.2 A dedutibilidade de gastos
Os gastos devem ser comprovados através de documento válido (fatura).

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Em matéria fiscal, estabelece-se a prioridade ou prevalência da prova escrita O CIRC concede uma dedução para depreciação de bens do ativo fixo do
sobre a prova oral. De facto, provas testemunhais, em sede de direito comparado, contribuinte. Bens do ativo fixo podem ser bens tangíveis (edifícios, máquinas
raramente são utilizadas devido à sua incerteza e subjetividade. Diferentemente e outro equipamento utilizado na produção de bens ou serviços) ou intangíveis,
acontece no caso do recurso a provas periciais: nas jurisdições analisadas pela (despesas de I&D, se reconhecidas como ativos fixos intangíveis, e elementos
autora neste manual, frequentemente os juízes recorrem a provas periciais para da propriedade industrial).
firmarem a sua convicção acerca de determinada facto ou transação tributária.
Os terrenos não são depreciáveis, pois não estão sujeitos a deterioração.
No sentido de preservação da base tributária, impõe o CIRC limites à Igualmente, nenhuma dedução é aceite no que respeita a obras de arte porque
dedutibilidade de determinados gastos, nomeadamente, encargos não também não estão sujeitas a deterioração.
devidamente documentados, despesas de caráter confidencial ou ilíciyo,
Os gastos dos inventários e outros gastos fiscalmente dedutíveis em outros
pagamentos de juros sujeitos a taxas superiores à taxa de juro interbancária, etc.,
artigos do CIRC estão excluídos do âmbito deste regime.
ou permite a sua dedutibilidade até determinados limites, ou se preenchidos
determinados requisitos. De acordo com o CIRC, os bens do ativo sujeitos a deperecimento podem ser
amortizados ou depreciados, em regra, pelo método da linha reta, atendendo ao
O objetivo principal desta limitação é a tributação do lucro real do contribuinte,
seu período de vida útil.
evitando-se situações não transparentes, ou desconformes com a prática
contabilística, ou disposições fiscais relevantes. Os valores depreciáveis ou amortizáveis são determinados com base na
contabilidade e sujeitos às correções do CIRC e respetiva legislação
Podem ser deduzidos parcialmente, gastos suportados com despesas de
complementar.
representação, de consumo pessoal e donativos concedidos a entidades isentas,
nos termos do CIRC. 2.4 Os prejuízos fiscais
A dedutibilidade parcial destes gastos justifica-se por razões de natureza No CIRC é permitido o reporte para o futuro de prejuízos fiscais por um período
comercial ou pessoal e, no caso da dedução dos donativos, por razões de temporal limitado. Esta regra geral está sujeita a várias limitações no código,
utilidade social. justificadas fundamentalmente por razões de evitar a erosão da base tributável e
aproximar a tributação o mais possível da realidade económica e contabilística
O CIRC sujeita ainda ao preenchimento de determinados requisitos para o caso
da empresa, nomeadamente:
dos créditos incobráveis ou créditos de cobrança duvidosa.
Trata-se essencialmente de estabelecer critérios objetivos para a dedução deste • proibição de comunicabilidade entre prejuízos e lucros (caso de
tipo de gastos, pretendendo-se ainda conciliar os objetivos de arrecadação de exercício cumulativo de atividades isentas e atividades tributáveis);
receita, evitando dedutibilidade injustificada de gastos, com os interesses dos • não dedutibilidade de prejuízos no caso de alteração substancial da
contribuintes. titularidade do capital social ou dos direitos de voto;

2.3 O regime das depreciações e amortizações No entanto, cumpre salientar que a limitação temporal do reporte afeta
principalmente as pequenas empresas, a entrar pela primeira vez no mercado.

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Repare-se que em certos setores de atividade os gatos de início de produção são mais-valias no caso de alienação das ações ou pagamentos de montante fixo,
extremamente elevados, podendo a empresa levar vários anos até obter lucros. também são atribuídos ao acionista e tributados como rendimento de dividendos.
Nestas circunstâncias e à semelhança de outras experiências europeias, o reporte Estas regras nacionais de imputação aplicam-se a residentes e não residentes e
para a frente deveria ser ilimitado. Igualmente a opção do reporte para trás podem ser complementadas por disposições específicas anti abuso instituídas na
deveria ser permitida, caso as circunstâncias económicas e financeiras da legislação fiscal da UE ou convenções sobre dupla tributação. A alteração da
empresa assim o exigissem. Diretiva sociedade mãe/sociedade afiliada demonstra a preocupação do
legislador europeu pelo problema da dupla não tributação dos dividendos,
2.5 Os dividendos
reforçado pela recente publicação da Diretiva anti abuso.
De acordo com o CIRC, uma sociedade residente pode deduzir integralmente
2.6 Isenções
aos lucros tributáveis dividendos recebidos ao abrigo, nomeadamente das
seguintes circunstâncias: O CIRC prevê que ficam isentas de tributação determinadas entidades ou
atividades que prossigam fins de interesse público, social ou cultural, sempre
• a sociedade que distribui os dividendos deve ter residência no país ou que os rendimentos auferidos se destinem aos fins para que foram criadas e em
em outro país da UE; caso algum se distribuam, direta ou indiretamente, rendimentos ou lucros entre
• a sociedade que distribui os dividendos deve estar sujeita ao imposto os sócios ou associados, nomeadamente:
sobre o rendimento das pessoas coletivas;
• a sociedade-mãe deve ter uma participação mínima no capital social da • certos entidades públicas;
sociedade afiliada durante um período mínimo de tempo; • pessoas coletivas de utilidade pública e de solidariedade social;
• rendimentos derivados do exercício de atividades culturais, recreativas
As outras sociedades, em geral, que recebam dividendos e não preencham os
e desportivas;
requisitos acima indicados, podem, no entanto, beneficiar do crédito de imposto
• certas cooperativas;
por dupla tributação internacional.
Pretende-se com esta limitação fazer com que as referidas entidades não
Os dividendos são atribuídos aos seus proprietários formais ou beneficiários
desenvolvam atividades de natureza empresarial ou se afastem do objeto ou fins
incluindo propriedade direta e indireta.
para que foram originalmente criadas ou autorizadas.
Comummente, os dividendos são tributáveis aquando do recebimento ou
Deste modo, então obstante se tratar de entidades isentas, se receberem,
pagamento ao nível do acionista, mas também em casos de não distribuição, ao
rendimentos que tenham sido sujeitos previamente a retenção na fonte, estão
abrigo de regras específicas de imputação indicadas pelas leis fiscais. Assim,
sujeitas ao pagamento de imposto sobre esses rendimentos nos termos gerais do
pagamentos adiantados de dividendos, quer na forma de pagamentos regulares
CIRC.
ou na forma de um montante fixo ou dividendos não distribuídos pagos como
uma renumeração ao acionista, que pode assumir a forma de rendimentos de Ainda, e não obstante se tratar de entidades isentas, deverão cumprir
determinadas obrigações contabilísticas e fiscais, cuja relevância para um

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

normal funcionamento do sistema tributário, como um todo, nomeadamente de Pretende-se alargar, mais uma vez, a incidência do imposto a todos os
fiscalização e controle de contribuintes ou rendimentos isentos, não poderá ser rendimentos do sujeito passivo, mesmo que não se encontrem reunidos ou
subalternizada. Entre estas obrigações contam-se: preenchidos os necessários requisitos legais para a sua criação ou prática das
suas atividades.
• dever de calcular e efetuar retenções na fonte sempre que exigido pelas
disposição dos códigos ficais; 3.2 O estabelecimento estável
• obrigação de apresentação da declaração anual de informação
O conceito de estabelecimento estável está diretamente ligado com o princípio
contabilística e fiscal, nos termos do CIRC.
da territorialidade pois permite tributar rendimentos de não residentes que
3. Tributação de Rendimento: noções fundamentais possuam uma base organizativa estável em território português sem preencher,
no entanto, os testes de residência (sede ou direção efetiva).
3.1 Os sujeitos passivos
Não possuindo personalidade jurídica, mas podendo assumir personalidade
O CIRS e o CIRC indicam os seguintes sujeitos passivos que ficam obrigados tributária (art. 15º LGT), o estabelecimento estável está dependente de outra
ao pagamento de imposto, caso possuam residência, sede ou direção efetiva em entidade, residente ou não residente, e desenvolvendo uma atividade de natureza
território português: empresarial pode assumir, nomeadamente, as seguintes formas: escritório de
• sociedades comerciais; representação, fábrica, oficina, sucursal, pedreira, mina, estaleiro de construção
• sociedades sob forma comercial; (com duração de obra superior a 6 meses).
• cooperativas; Este regime é particularmente importante pois permite tributar rendimento que
• empresas públicas; eventualmente o contribuinte aufira através da exploração ou utilização de
• pessoas coletivas de direito público; recursos naturais ou humanos do país.
• pessoas coletivas de direito privado (ex.: associações, fundações, fundos
O CIRC obriga os não residentes com estabelecimento estável cobre ainda as
e outros);
situações do agente dependente que atua na dependência e subordinação do
• pessoas singulares;
mandante ainda que, e na qualidade de intermediário, possa ter autoridade para
Outras entidades poderão qualificar como sujeito passivo de imposto, não concluir contratos em sua representação.
obstante não estarem preenchidos todos os requisitos legais necessários par a
No entanto, não cabe na definição de estabelecimento estável e, como tal, nãos
sua existência jurídica ou para a prática dos seus fins ou atividades.
são sujeitos passivos de imposto, as situações de armazenagem ou depósitos de
Para além do estabelecimento estável podem indicar-se as chamadas “entidades bens, instalações utilizadas unicamente para fins publicitários, etc.
irregulares” e consistem, nomeadamente nas heranças jacentes, sociedades
3.3 O regime da transparência fiscal
irregulares ou declaradas inválidas, etc.

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

O regime de transparência fiscal foi criado para solucionar o problema da A investigação produzida até ao presente atesta claramente a dificuldade de
tributação de determinados tipos de sociedades, para os quais o regime geral de determinação ou definição de base tributável. Várias teorias têm sido avançadas
tributação seria desadequado ou ineficiente. no sentido da sua concretização, mas nenhuma delas, por si só, conseguiu obter
amplo consenso ou aceitação.
Dadas as características especificas deste tipo de sociedades – sociedades civis
não constituídas sob a forma comercial, sociedade de profissionais, sociedades Inicialmente, o rendimento foi definido como o produto obtido durante certo
de simples administração de bens e agrupamentos complementares de empresas período através da participação na atividade produtiva (teoria da fonte ou do
–, assumindo a prestação de serviço um caráter fundamental e com manifesta rendimento-produto). Esta definição, com origem no direito romano, assenta na
relevância económica, estando por consequência a figura do membro ou sócio distinção “raiz-fruto”, tributando-se apenas os frutos.
indissociavelmente ligada à sociedade ou grupo a que pertencem, pretende-se
As limitações desta teoria, nomeadamente a não consideração dos rendimentos
com este regime fazer coincidir fiscalmente as figuras do sócio e sociedade,
ocasionais e dos ganhos ou perdas de capital, levou ao seu abandono após a I
sujeitando o sujeito passivo a um só nível de tributação.
guerra mundial e substituição por aceções mais latas de rendimento ou lucro
Com consequência, o rendimento ou lucro da sociedade passa a ser tributado tributável (ex.: teoria do acréscimo patrimonial ou do rendimento acréscimo).
unicamente ao nível do sócio ou membro, ignorando-se para estes efeitos a
A tributação efetiva do lucro ou rendimento poderá levar ainda à tributação de
estrutura societária ou de grupo subjacente (art. 6º LGT). É, no entanto, de
benefícios derivados de bens ou serviços, não transacionáveis, no âmbito do
salientar que as sociedades ou grupos deverão apresentar sempre a respetiva
conceito “imputação de rendimento”.
declaração anual de informação contabilística e fiscal, conforme exigido pelo
CIRC. Recentemente tem vindo a ser utilizada também pelos legisladores a chamada
teoria do rendimento de mercado que se aplica especialmente aos instrumentos
3.4 As atividades ilícitas
financeiros. Esta teoria que surgiu para resolver o problema da tributação das
Os impostos sobre o rendimento incidem sobre os rendimentos dos sujeitos obrigações “cupão zero” ou títulos que incorporam juros - tributação do “juro
passivos, mesmo que provenientes de atividades ilícitas, durante o período de implícito” – ou outro tipo de rendimentos de capitais, tem por objetivo
tributação (art. 10º LGT). determinar a “intenção lucrativa” subjacente à atuação do contribuinte.
Ao alargar o âmbito de imposto a todos os rendimentos ou atividades do Em Portugal, a reforma da tributação do rendimento de 1989 adotou, com
contribuinte, nomeadamente à prática de jogos ilegais ou atividade não limitações, a noção de rendimento-acréscimo (nº5 preâmbulo CIRS). Em termos
licenciadas ou não regulamentadas (ex.: rendimentos ou ganhos com moedas concisos, esta noção sujeita a imposto as mais-valias ou “acréscimos de poderes
virtuais) evitam-se situações de discriminação ou desigualdade, entre aquisitivos obtidos sem esforço ou pelo acaso da sorte”, Em sede de IRC, esta
contribuintes ou tipo de rendimento obtido. noção levou a um alargamento do conceito de lucro, consistindo este na
diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período
Prevê ainda ao legislador que os incrementos patrimoniais injustificados, de
de tributação (art. 3º nº2 CIRC).
valor superior a 100.000 euros, são tributados à taxa especial de 60%.
3.5 A base tributável

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Apesar dos esforços de investigação, os conceitos de rendimento ou de lucro 3.6 O conceito jurídico-económico de “realização”
continuam a ser conceitos de contornos indefinidos que respeitam a um período
Na sua vertente essencialmente económica ou material, este conceito aparece
de tempo definido (geralmente o ano civil). No entanto, ainda aqui e
geralmente associado às situações de “preço efetivamente recebido” ou
frequentemente, problemas surgem na imputação de rendimentos ou gastos a
“rendimento auferido ou colocado à disposição”. Assim, a tributação real ou
esse período ou exercício económico: vejam-se os casos de contratos de
efetiva do lucro ou rendimento apenas se verifica nestas situações, não se
formação sucessiva ou continuada, a constituição de imparidades para créditos
tributando rendimentos latentes, ou ainda não recebidos, ou auferidos pelo
de cobrança duvidosa, etc.
sujeito passivo.
A indefinição aumenta quando se tomam igualmente em consideração os
A vertente jurídica do conceito aparece associada com as situações já acima
princípios bem diferenciados da capacidade contributiva e do benefício.
mencionadas de posse, tradição, alienação ou transmissão, liquidação, etc.
O princípio do benefício apresenta igualmente dificuldades, atendendo por
Pode ainda ficcionar-se o conceito de realização em casos de transferência de
exemplo às características de unilateralidade imperfeita ou bilateralidade
sede ou residência do contribuinte e em situações de alteração no estatuto ou
indireta dos impostos, não diretamente relacionados com benefícios concedidos
regime fiscal do contribuinte (ex.: reorganizações empresariais, saída ou
pelos Estados.
transferência de ativos da sociedade para o sócio ou estabelecimento estável
Neste âmbito, a constituição portuguesa fixou em sede de IRC a tributação do localizado no estrangeiro, isenções fiscais e tributação em “regime
rendimento real ou efetivo e em sede de IRS o princípio da equidade vertical ou consolidado”). Pode ainda, numa posição extrema, imputar-se rendimentos de
progressividade. Com esta enunciação curta e objetiva evitou o legislador fonte estrangeira a entidades nacionais ou ao abrigo de cláusulas anti abuso que
constitucional querelas doutrinais, que muito poderiam contribuir para a permitam a requalificação de negócios jurídicos.
incerteza e insegurança jurídica, a evitar a todo o custo, em áreas fiscais ou
Nestes últimos casos, o conceito “realização” foi abandonado em favor de
financeiras.
utilização de técnicas tributárias que permitam uma tributação efetiva de
Se o conceito “progressividade” é de fácil aplicação o mesmo não acontece com rendimentos obtidos mundialmente por entidades residentes ou para evitar a
a aplicação do conceito “rendimento real” ou efetivo. erosão da base tributável através da simulação de negócios ou atos jurídicos.
Tomando em consideração esta dificuldade prática, acolhem os diferentes Nos EUA, o conceito “realização” é, na atualidade, essencialmente uma questão
legisladores e igualmente o português, diferente “auxiliares” que permitem uma de “conveniência administrativa”: uma permuta de imóveis, por exemplo, onde
maior aproximação ao conceito de rendimento real e portanto uma tributação se verifique uma “diferença material” entre os imóveis permutados, preenche o
“mais aproximada” do rendimento real ou efetivo: vejam-se, nomeadamente os critério de realização. Igualmente, adianta aquele autor, caberão no mesmo
conceitos jurídico-económicos de “colocação à disposição”, “uso ou fruição”, conceito as operações de “titularização” ou seguro contra riscos financeiros,
“alienação ou transmissão”, “envio ou expedição”, “prática do ato”, “sujeito de com fixação prévia de preço do título ou transação (e consequente eliminação
facto ou económico”, “gerente de facto”, “posse”, “preço efetivamente do risco), e que não acarretem transferência ou transmissibilidade,
recebido”, “disponibilidade económica”… conceitos utilizados nos CIRS e permanecendo o bem na esfera patrimonial do titular “nominal”. Inserem-se
CIRC e complementados ou aperfeiçoados pela jurisprudência nacional.

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

nesta última categoria, transações financeiras típicas tipo “equity swaps”, • a anulação de liquidações por incumprimento de procedimentos
“collars”, etc. essenciais ou obrigatórios, com consequências ao nível da incidência
temporal do imposto e diferimento da tributação;
Deste modo, em situações onde o risco de perda ou prejuízo ou a oportunidade
• disponibilidade jurídico-económica do rendimento, com ou sem
de ganho tenham sido substantivamente eliminados, ficciona o legislador o
transferência de propriedade;
conceito “realização”, ignorando aqui tanto os requisitos jurídicos de
• correções ou ajustamentos nos preços praticados por entidades
transmissibilidade como mesmo conceitos económicos de pagamento ou
relacionadas, com vista a uma tributação efetiva e obstar ao diferimento
colocação à disposição.
ou mesmo exclusão da tributação;
Se nas situações tipificadas pelo legislador, ao abrigo de ficções ou mesmo em • recurso a ficções ou critérios de imputação, aplicáveis não só em sede
detrimento do abandono do conceito “realização”, não surjam “conflitos de impostos sobre o rendimento, mas também aos impostos sobre o
positivos” desde logo por se tratar de regimes, via de regra, específicos ou consumo ou património;
suficientemente concretizados, já o mesmo não sucede quando se atenta na dupla
vertente jurídico-económica do conceito “realização”. Em sede jurisprudencial, o supremo tribunal administrativo tem proferido
algumas decisões sobre a matéria em que se aborda a problemática da tributação
A interligação entre as duas vertentes acima mencionadas, a jurídica e a do rendimento real, seja através da utilização de técnicas de diferimento de
económica, pode originar soluções de tributação díspares, conforme prevaleça o imposto, seja através do recurso a operações ou transações isentas.
critério jurídico ou económico: vejam-se os exemplos lineares de alienação ou
transferência não ocorrendo o pagamento do preço estipulado, a situação inversa No âmbito da definição/aplicação do conceito realização, tem vindo o STA a
de tributação de rendimentos anterior à sua transmissão ou alienação ou ainda o emitir vários acórdãos, nas situações de tributação do chamado “juro implícito”
caso da não tributação das mais-valias latentes ou não realizadas. ou “incorporado no título”. Nestas situações colocava-se a questão se se deveria
autonomizar jurídico-fiscalmente o rendimento de capitais em análise – “juros”
O legislador português utiliza os dois critérios, em função do tipo de rendimento – e tributá-los nos termos legais, ficcionando-se o conceito de realização, ou se
ou realidade tributária, fazendo apelo também a ficções ou técnicas tributárias diferentemente tal rendimento deveria ser qualificado como mais-valias e
específicas, à semelhança de outros ordenamentos jurídicos. A jurisprudência eventualmente sujeito a tributação.
nacional evidência algumas das situações tipificadas pelo legislador e o
respetivo tratamento jurisprudencial, nomeadamente: Ao nível do direito comparado e no contexto de títulos de dívida é frequente a
utilização do conceito “rendimento de juros” devido à facilidade de
• situação de detenção, ainda que irregular, pode despoletar os determinação do rendimento, à periodicidade e certeza jurídica. Tais
mecanismos de tributação (incidência real e pessoal e respetiva características estão ausentes no caso de rendimentos de mais valias ou em
aplicação de taxa); determinados tipos de rendimentos de capitais. Por si só bastam para afastar o
• situação de reinvestimento de rendimentos de mais-valias e regime de tributação aplicável aos rendimentos de mais-valias e ao consequente
preenchimento de requisitos formais e substantivos, mais estritos, enquadramento jurídico-fiscal em sede de rendimentos de capitais.
quando se atribui ao contribuinte benefícios fiscais deste tipo;

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Na EU, a diretiva aplicável aos rendimentos de juros acolheu esta noção mais Igualmente, para efeitos de planeamento fiscal, pesam os regimes fiscais
abrangente de rendimento – “pago” ou “colocado à disposição” – sufragada previstos para as situações de reinvestimento, as reorganizações empresariais ou
tanto no CIRC como pela jurisprudência do STA. societárias, o regime de tributação pelo lucro “consolidado” ou integrado” e as
disposições das convenções sobre dupla tributação que via de regra, atribuem ao
Estado da residência competência exclusiva para a tributação dos rendimentos
de mais-valias.

3.7 Diferimento e tributação das mais-valias Ao nível internacional, são conhecidos os entraves fiscais colocados pelas
diferentes legislações nacionais à transmissibilidade de mais-valias latentes,
A quantificação para efeitos tributários do valor das mais ou menos-valias especialmente quando adquiridas por entidades isentas ou pagas a entidades
aparece associada ou integrada, nos diferentes sistemas fiscais continentais e residentes em jurisdições que isentam ou sujeitam a regimes mais favoráveis os
anglo-saxónicos, com os regimes de depreciação ou amortização de ativos ou rendimentos de mais-valias. Em conjugação, o diferimento de tributação em país
direitos e ainda com regimes de indexação de valor dos bens para efeitos de de tributação normal e posterior “realização” em país de tributação nula ou
inflação. privilegiada, conduz a uma isenção total ou não tributação deste tipo de
O tratamento fiscal das mais e menos valias exige desde logo uma indexação rendimentos.
pelos valores de inflação de modo a prevenir a tributação dos chamados “ganhos Cumpre notar que mesmo a difícil tarefa de tributar estes rendimentos, que os
ilusórios ou fictícios”. Estados na esfera internacional, até ao momento, têm feito, por exemplo, através
Mas uma atualização anual revela-se muitas vezes dispendiosa, exemplo dos da aplicação dos chamados impostos de saída ou aplicáveis em caso de mudança
imóveis e impossibilidade prática de uma avaliação anual por parte da de residência de um contribuinte de um Estado para outro Estado), tem vindo a
administração tributária, e complexa, optando alguns Estados por isentar até ser posta em causa através de decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia
determinado limite os rendimentos de mais mais-valias ou aplicar taxas e da Comissão Europeia.
diferenciadas a esses rendimentos. 3.7.1 Cálculo das mais-valias e menos-valias
No caso português, a história da tributação das mais-valias no sistema fiscal As mais-valias e as menos-valias correspondem à diferença entre o valor de
português está longe de ser pacífica e resulta mais de “lutas ideológicas ou de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição
conveniência” do que propriamente de uma aplicação técnica e objetiva de um deduzido das perdas por imparidade e outras correções de valor e das
determinado sistema fiscal que tem de ser visto de um ponto de vista integrado depreciações ou amortizações que tenham sido fiscalmente aceites.
e coerente. Este trabalho cientifico tem de ser feito, sem perder de vista a
especificidade portuguesa, mas sempre inserido num contexto internacional ou O valor de aquisição é atualizado mediante a aplicação dos coeficientes de
de direito comparado. desvalorização da moeda publicados por portaria.

No sistema fiscal português, o período de detenção deste tipo de rendimentos 3.7.2 Despesas e encargos com mais-valias em sede de IRS
tem sido determinante para a sujeição a imposto ou isenção de tributação.

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição financeiros derivados celebrados em mercados regulamentados de bolsa, por
acrescem: entidades ou pessoas singulares que não tenham residência em território
português e aí não possuam estabelecimento estável ao qual as mesmas sejam
• Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados imputáveis.
nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente
praticadas, inerentes á aquisição e alienação, bem como a indemnização
comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou
3.7.4 Mais valias imobiliárias isentas em sede de IRS
outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações
previstas no art. 10º nº1 alínea a) do CIRS; São excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de
• As despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do
e alienação, nas situações previstas no art. 10º nº1 alíneas b) e c) do seu agregado familiar, desde que verificadas, cumulativamente, as seguintes
CIRS; condições.
Os encargos e as despesas referidos na alínea a) relativos a imóveis que tenham • O valor de realização da amortização de eventual empréstimo contraído
beneficiado de apoio não reembolsável, concedido pelo Estado ou outras para a aquisição do imóvel, seja reinvestido na aquisição da propriedade
entidades públicas para a aquisição, construção, reconstrução ou realização de de outro imóvel, de térreo para construção de imóvel e ou respetiva
obras de conservação de valor superior a 30% do valor patrimonial tributário do construção, ou na ampliação ou melhoramento de outro imóvel
imóvel para efeitos de IMI e sejam vendidos antes de decorridos 10 anos sobre exclusivamente com o mesmo destino situado em território português
a data da sua aquisição, da assinatura da declaração comprovativa da receção da ou no território de outro Estado membro da EU ou do EEE, desde que,
obra ou do apagamento da última despesa relativa ao apoio público não neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal;
reembolsável que, nos termos legais ou regulamentares, não estejam sujeitos a • O reinvestimento previsto na alínea anterior seja efetuado entre os 24
ónus ou regimes especiais que limitem ou condicionem a respetiva alienação, meses anteriores e os 36 meses posteriores contados da data da
apenas são considerados na parte que exceda o valor do apoio não reembolsável realização;
recebido. • O sujeito passivo manifeste a intenção de proceder ao reinvestimento,
Para efeitos da alínea a), não são considerados os encargos com a valorização ainda que parcial, mencionando o respetivo montante na declaração de
de bens imóveis que tenham sido realizados durante o período em que rendimentos respeitante ao ano da alienação;
permaneceram afetos à atividade empresarial e profissional. Não haverá lugar ao benefício acima referido quando:
3.7.3 Mais valias mobiliárias de não residentes • Tratando-se de reinvestimento na aquisição de outro im+ovel, o
Salvo as exceções previstas na lei, ficam isentas de IRS e de IRC as mais-valias adquirente e não afete à sua habitação ou do seus agregado familiar, até
realizadas com a transmissão onerosa de partes sociais, outros valores decorridos doze meses após o reinvestimento;
mobiliários, warrants autónomos emitidos por entidades residentes em território • Nos demais casos, o adquirente não requeira a inscrição na matriz do
português e negociados em mercados regulamentados de bolsa e instrumentos imóvel ou das alterações decorridos 48 meses desde a data da realização,

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

devendo afetar o imóvel à sua habitação ou do seu agregado até ao fim ou superior a 10 anos, de montante máximo anual igual a 7,5% do
do quinto ano seguinte ao da realização; valor investido;
• Os imóveis que tenham beneficiado de apoio não reembolsável • O sujeito passivo manifeste a intenção de proceder ao
concedido pelo Estado ou outras entidades públicas para aquisição, reinvestimento, ainda que parcial, mencionando o respetivo
construção, reconstrução ou realização de obras de conservação de valor montante na declaração de rendimentos respeitante ao ano da
superior a 30% do valor patrimonial tributário do imóvel para efeitos de alienação.
IMI, sejam vendidos antes de decorridos 10 anos sobre a data da sua
3.7.5 Mais valias mobiliárias isentas em sede de IRS
aquisição, da assinatura da declaração comprovativa da receção da obra
ou do pagamento da última despesa relativa ao apoio público não No caso de se verificar uma permuta de parte sociais nas condições mencionadas
reembolsável que, nos termos legais ou regulamentares, não estejam no CIRC, a atribuição, em resultado dessa permuta, dos títulos representativos
sujeitos a ónus ou regimes especiais que limitem ou condicionem a do capital social da sociedade adquirente aos sócios da sociedade adquirida não
respetiva alienação. dá lugar a qualquer tributação destes últimos se os mesmos continuarem a
valorizar, para efeitos fiscais, as novas partes sociais pelo valor das antigas,
Estes ganhos são igualmente excluídos de tributação, desde que verificadas,
determinado de acordo com o estabelecido neste código, sem prejuízo da
cumulativamente, as seguintes condições:
tributação relativa às importâncias em dinheiro que lhes sejam eventualmente
• O valor de realização, deduzido da amortização de eventual atribuídas.
empréstimo contraído para a aquisição do imóvel e, se aplicável, do
Nos casos de fusão ou cisão de sociedades a que seja aplicável o art. 74º do
reinvestimento acima previsto, seja utilizado para a aquisição de um
CIRC, não há lugar à tributação dos sócios das sociedades fundidas ou cindidas,
contrato de seguro financeiro do ramo vida ou de uma adesão
desde que verificadas as seguintes condições:
individual a um fundo de pensões aberto, ou ainda para contribuição
para o regime público de capitalização; • Havendo lugar à atribuição àqueles sócios de partes de capital, sejam
• O sujeito passivo ou o respetivo cônjuge, na data da transmissão do observadas, com as necessárias adaptações, as regras previstas nos
imóvel, se encontre, comprovadamente, em situação de reforma, ou números 1 e 3 do art. 76º do CIRC consoante se trate de fusão ou cisão,
tenha, pelos menos, 65 anos de idade; respetivamente;
• A aquisição do contrato de seguro financeiro do ramo vida, a adesão • Não havendo lugar à atribuição de partes de capital, seja dado
individual a um fundo de pensões aberto ou a contribuição para o cumprimento, com as necessárias adaptações, ao disposto nos números
regime público de capitalização seja efetuada nos seus meses 4 e 5 do art. 76º do CIRC, consoante se trate, respetivamente, de fusão
posteriores contados da data de realização; ou cisão;
• Sendo o investimento realizado por aquisição de contrato de seguro
ou da adesão individual a um fundo de pensões aberto, estes visem, Tais regimes não prejudicam a tributação dos sócios relativamente às
exclusivamente, proporcionar ao adquirente ou ao respetivo importâncias em dinheiro que lhes sejam eventualmente atribuídas.
cônjuge, uma prestação regular periódica, durante um período igual

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Os sujeitos passivos devem declarar a alienação onerosa das ações, bem como a 3.7.7 Mais valias e regimes transitórios em sede de IRS e IRC
data das respetivas aquisições.
IRS
3.7.6 Mais valias de residentes singulares
Os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, criado pelo CIRS
O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao aprovado pelo DL nº 46/373, de 9 de junho de 1965, bem como os derivados da
saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, alienação a título oneroso de prédios rústicos afetos ao exercício de uma
determinadas nos termos do CIRS. atividade agrícola ou da afetação destes a uma atividade comercial ou industrial,
exercida pelo respetivo proprietário, só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos
Este saldo, respeitante às transmissões efetuadas por residentes previstas nas
bens ou direitos a que respeitam tiver sido efetuada depois da entrada em vigor
alíneas a), c), d) e i) do nº1 do art. 10º do CIRS, positivo ou negativo, é:
do CIRS.
• Integralmente considerado nas situações previstas na alínea a) do nº1 do Cabe ao contribuinte a prova de que os bens ou valores foram adquiridos em
art. 10º, quando os imóveis tenham beneficiado de apoio não data anterior à entrada em vigor do CIRS, devendo a mesma ser efetuada, quanto
reembolsável concedido pelo Estado ou outras entidades públicas, aos valores mobiliários, mediante registo nos termos legalmente previstos,
quando o valor total do apoio concedido par aquisição ou para depósito em instituição financeira ou outra prova documental adequada e através
realização de obras seja de valor superior a 30% do valor patrimonial de qualquer meio de prova legalmente aceite nos restantes casos.
tributário do imóvel para efeitos de IMI e estes sejam vendidos antes de
decorridos 10 anos sobre a data da sua aquisição, da assinatura da Quando, nos termos dos nº 8 e 10 do art.10º do CIRS, haja lugar à valorização
declaração comprovativa da receção da obra ou do pagamento da última das participações sociais recebidas pelo mesmo valor das antigas, considera-se,
despesa relativa ao apoio não reembolsável que, nos termos legais ou para efeitos do disposto no CIRS, data de aquisição das primeiros a que
regulamentares, não estejam sujeitos a ónus ou regimes especiais que corresponder à das últimas.
limitem ou condicionem a respetiva alienação;
Os ganhos ou perdas realizados por sujeitos de IRC com a transmissão de ações
• Apenas considerado em 50% do seu valor, nos restantes casos;
ou partes sociais cuja aquisição tenha ocorrido antes da entrada em vigor do
Este saldo, respeitante às operações previstas na alínea b) do nº1 do art. 10º, CIRC não concorrem para a formação do lucro tributável.
relativo a micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado
3.7.8 Mais valias em sede de IRC
ou não regulamentado da bolsa de valores, quando positivo, é igualmente
considerado em 50% do seu valor. Consideram-se mais valias ou menos valias realizadas os ganhos obtidos ou as
perdas sofridas mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que
Para apuramento do saldo positivo ou negativo, respeitante às operações
se opere, e, bem assim, os decorrentes de sinistros ou os resultantes da afetação
efetuadas por residentes previstas nas alíneas b), e) e g) do nº1 do art. 10º CIRS,
permanente a fins alheios à atividade exercida respeitantes a:
não relevam as perdas apuradas quando a contrapartida operação estiver sujeita
a um regime fiscal a que se referem o nº1 ou 5º do art. 63º da LGT. • Ativos fixos tangíveis, ativos intangíveis, ativos biológicos não
consumíveis e propriedades de investimento, ainda que qualquer destes

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

ativos tenham sido reclassificado como ativo não corrente detido para • Aos ativos intangíveis adquiridos ou alienados a entidades com as quais
venda; existam relações especiais nos termos do nº 4 do art. 63º do CIRC;
• Instrumentos financeiros, com exceção dos reconhecidos pelo justo • Às mais e menos-valias realizadas pelas sociedades fundidas, cindidas
valor nos termos das alíneas a) e b) do nº 9 do art. 18º CIRC. ou contribuidoras no âmbito de operações de fusão, cisão ou entrada de
ativos, bem como às mais e menos-valias realizadas na afetação
Para efeitos da determinação do lucro tributável, a diferença positiva entre as
permanente de bens a fins alheios à atividade exercida pelo sujeito
mais-valias e as menos-valias, realizadas mediante a transmissão onerosa de
passivo ou realizadas pelas sociedades em liquidação;
ativos fixos tangíveis, ativos intangíveis e ativos biológicos não consumíveis,
• Às propriedades de investimento, ainda que reconhecidas na
detidos por um período não inferior a um ano, ainda que qualquer destes ativos
contabilidade como ativo fixo tangível;
tenha sido reclassificado como ativo não corrente detido para venda, ou em
consequência de indemnizações por sinistros ocorridos nestes elementos, é Não concorrem para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de
considerada em metade do seu valor, quando: IRC com sede ou direção efetiva em território português as mais-valias e menos-
valias realizadas mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por
• O valor de realização correspondente à totalidade dos referidos ativos
que se opere e independentemente da percentagem da participação transmitida,
seja reinvestido na aquisição, produção ou construção de ativos fixos
de partes sociais detidas ininterruptamente por um período não inferior a um
tangíveis, de ativos intangíveis ou, de ativos biológicos não
ano, desde que, na data da respetiva transmissão, se mostrem cumpridos os
consumíveis, no período de tributação anterior ao da realização, no
requisitos previstos nas alíneas a), c) e e) do nº1 do art. 51º do CIRC, bem como
próprio período de tributação ou até ao fim do 2 período de tributação
o requisito previsto na alínea d) do nº1 ou no nº2 do mesmo artigo.
seguinte;
• Os bens em que seja reinvestido o valor da realização: Este regime é igualmente aplicável às mais e menos valias realizadas com a
o Não sejam bens adquiridos em estado de uso a sujeito passivo transmissão de outros instrumentos de capital próprio associados às partes
de IRS ou IRC com o qual existam relações especiais nos sociais aí referidas, designadamente prestações suplementares, sendo
termos definidos no nº4 do art. 63º CIRC; igualmente aplicável às mais valias e às menos valias resultantes da transmissão
o Sejam detidos por um período não inferior a um ano contado do onerosa de partes sociais e de outros instrumentos de capital próprio no âmbito
final do período de tributação em que ocorra o reinvestimento de operações de fusão, cisão, entrada de ativos ou permuta de partes sociais não
ou, se posterior, a realização; abrangidas pelo regime especial previsto nos art. 73º CIRC e seguintes, quando
realizadas pelas sociedades fundidas, condidas ou adquiridas, incluindo as
Não sendo concretizado, total ou parcialmente, o reinvestimento até ao fim do
obtidos pela sociedade beneficiária em resultado da anulação das partes de
2º período de tributação seguinte ao da realização, considera-se como
capital detidas por esta no capital das sociedades fundidas ou cindidas, desde
rendimento desse período de tributação, respetivamente, a diferença ou a parte
que os sócios sejam sujeitos passivos de IRC com sede ou direção efetiva em
proporcional da diferença não incluída no lucro tributável, majorada em 15%.
território português.
Este regime não é aplicável:
Este regime não é aplicável às mais valias e menos valias realizadas mediante
transmissão onerosa de partes sociais, bem como à transmissão de outros

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

instrumentos de capital próprio associados às partes sociais, designadamente Os estados-membros têm formas diferentes de lidar com o problema de dupla
prestações suplementares, quando o valor dos bens imóveis ou dos direitos reais tributação económica interna e/ou internacional de lucros distribuídos. Para
sobre bens imóveis situados em território português, com exceção dos bens efeitos teóricos e de classificação, os sistemas fiscais foram separados em cinco
imóveis afetos a uma atividade de natureza agrícola, industrial ou comercial que categorias principais:
não consista na compra e venda de bens imóveis, represente, direta ou
indiretamente, mais de 50% do ativo. • Sistemas clássicos;
• Sistemas de imputação;
4. A tributação dos lucros: os sistemas fiscais • Sistemas de isenção;
Em geral, os lucros distribuídos estão sujeitos a dois níveis de tributação: • Sistemas de dedução;
primeiro ao nível da sociedade e subsequentemente ao nível do sócio, ao • Sistemas de Cash-Flow;
contrário do tratamento fiscal dado aos rendimentos de juros. De facto, limitado Apenas as três primeiras categorias forma usadas ao nível mundial. No entanto,
apenas por algumas disposições anti abuso fiscal aplicáveis, os rendimentos de é também feita referência aos sistemas de cash-flow e dedução, sendo avaliados
juros são dedutíveis e, consequentemente, estão sujeitos a um único nível de os seus principais pontos fortes e pontos fracos. Na prática, nem os sistemas de
tributação. dedução, nemos os sistemas de cash-flow foram adotados por qualquer estado-
O tratamento fiscal discriminatório conferido ao financiamento através de membros da EU e, consequentemente, apenas os três sistemas principais serão
capitais próprios em comparação com aquele conferido ao financiamento objeto de investigação exaustiva quer ao nível interno, quer ao nível
através de empréstimo levanta dúvidas quanto à neutralidade e eficiência dos internacional.
atuais sistemas fiscais. Estas distorções aumentam consideravelmente quando No seio da EU, os sistemas de imputação foram favorecidos em relação a outros
os lucros da sociedade passam além-fronteiras com a aplicação de elevadas taxas sistemas fiscais.
fiscais efetivas sobre rendimentos de dividendos em consequência de sucessivos
encargos fiscais acumuláveis. 4.1 O conceito de “integração”

A definição apresentada pela Convenção Modelo de Impostos sobre Rendimento Na EU, o problema de dupla tributação económica de lucros distribuídos tem
e Capital da OCDE, é aquela segundo a qual a dupla tributação económica sido abordado no âmbito do enquadramento teórico da “integração”. Pode-se
ocorre quando “duas pessoas diferentes são taxadas em respeito do mesmo considerar a abordagem perspetiva integracionista da tributação das pessoas
rendimento ou capital”. coletivas, incluindo todos os rendimentos desse tipo na base tributária de pessoas
singulares. O pressuposto na base desta abordagem é o facto de, em última
Várias respostas têm sido apresentadas pelos sistemas fiscais a fim de reduzir análise, todos os impostos deverem ser suportados por pessoas físicas e do
ou eliminar o problema da dupla tributação económica interna e/ou internacional conceito de tributação equitativa só poder ser aplicado a pessoas físicas.
de lucros distribuídos. No entanto, até à data, não foi alcançado um consenso
neste campo ao nível da EU. Nos casos em que o objetivo é a integração fiscal, e a consequente redução ou
eliminação da dupla tributação económica de dividendos, sem qualquer tentativa

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

no sentido de resolver o problema da dupla tributação económica das mais- Os sistemas clássicos encara a sociedade como uma entidade legal com
valias, podem ser escolhidas duas soluções: existência própria. Daqui se conclui que, sendo uma entidade separada, a
sociedade também tem uma capacidade tributável autónoma estando portanto
• Tratar a totalidade ou parte do imposto sobre rendimento das pessoas sujeita a imposto distinto.
coletivas (IRC) como um imposto retido na fonte na medida em que é
aplicável aos rendimentos distribuídos da sociedade (o sistema de Apesar da consciência das vantagens associadas à introdução de sistemas de
imputação) ou, de forma equivalente, aplicar diferentes taxas de IRC integração parcial, esses países não puseram a hipótese de substituir os seus
aos rendimentos distribuídos e não-distribuídos da sociedade (o sistema sistemas clássicos. DE facto, não só ao nível interno, mas também ao nível
de dualidade de taxas); internacional, os sistemas de integração parcial são complexos, com custos
• Permitir à sociedade a dedução da totalidade ou de partes dos elevados de aplicação. Fazem distinção entre investidores internos e
dividendos pagos semelhante à dedução relativa a juros pagos (o internacionais e podem conduzir a tratamentos discriminatórios como aqueles a
sistema de dedução). ser analisados atualmente pelo TJUE.

A integração no verdadeiro sentido da palavra só poderá ser alcançada através Por outro lado, as desvantagens associadas aos sistemas clássicos incluem,
da atribuição aos sócios dos rendimentos obtidos ao nível da sociedade, quer nomeadamente taxas fiscais efetivas elevadas sobre os dividendos ao nível
tenham, ou não, sido distribuídos, e da tributação desses rendimentos de acordo interno e internacional. Ambos geram a necessidade de encontrar um sistema
com as taxas aplicáveis aos rendimentos dos vários sócios. Os defensores desta fiscal mais equitativo e eficiente, adequado a uma sociedade com uma
posição sublinham que com esta abordagem o problema da tributação das mais- mobilidade crescente.
valias de longo prazo seria resolvido e que as desigualdades e distorções do
De facto, a perspetiva “absoluta” ou clássica que encara a sociedade como uma
sistema fiscal seriam eliminadas. Na prática, esta abordagem nunca foi adotada
entidade separada com uma capacidade fiscal separada é praticamente
como base para um sistema fiscal nacional, sobretudo devido à complexidade e
insustentável. Vale a pena ter em conta que apesar do estatuto legal distinto e
aos elevados custos administrativos associados à tributação das mais-valias.
independente das sociedades, existe apenas uma atividade produtiva, que só
Por outro lado, sistemas de integração parcial foram implementados em vários deve ser tributada uma vez. Por outro lado, as respostas apresentadas pelos
estados-membros da EU, juntamente com outros sistemas assentes em sistemas integracionistas já não se enquadram nos atuais padrões económicos e
enquadramentos fiscais diferentes. Apesar dos aspetos aliciantes do conceito de financeiros, e pressões por parte do TJUE indicam claramente que, do ponto de
integração fiscal, as desigualdades e os custos elevados com o cumprimento de vista de receita fiscal, esses sistemas não poderão sobreviver a longo prazo. Por
obrigações fiscais ao nível interno e/ou internacional estão a pressionar de forma exemplo, se o TJUE seguir a via da implementação efetiva do princípio da não-
crescente os conceitos tradicionais que já não conseguem satisfazer as discriminação, os estados-membros que atualmente utilizam sistemas de
exigências dos contribuintes e das administrações fiscais. imputação e estendem os créditos de imposto para além das fronteiras nacionais
poderão ser forçados a rever as suas políticas de CDTs. De facto, para evitar o
4.2 As desvantagens da “integração” problema do tratamento fiscal discriminatório, esses créditos deverão ser
Vários países que atualmente utilizam sistemas clássicos têm acompanhado concedidos não só a determinados parceiros de CDT(s) mas também a todos os
atentamente a utilização de sistemas de integração parcial. estados-membros da EU.

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

4.3 Em busca de um sistema fiscal moderno receitas dos estados-membros, ao nível interno e internacional. O compromisso
em termos de receitas consagrado no sistema clássico refletiu-se n Convenção
Os sistemas integracionistas visam eliminar a dupla tributação económica dos
Modelo da OCDE, que abrange apenas o problema da dupla tributação jurídica.
dividendos, mas muitas vezes não conseguem fornecer uma resposta satisfatória
Inicialmente este compromisso favorecia os estados de residência ou os países
ao problema da dupla tributação económica das mais-valias, nem obedecer ao
exportadores de capitais. Com as reduções subsequentes ao nível de taxas de
princípio de progressividade da tributação.
tributação sobre rendimentos das pessoas coletivas, o efeito deste compromisso
Deste ponto de vista, as sociedades são encaradas como uma via para foi invertido, e os Estados da fonte ou os países importadores de capitais surgem
rendimentos pessoais e, consequentemente, os seus lucros devem ser atribuídos agora como os principais beneficiários de receitas fiscais devido às taxas
aos sócios e tributados de acordo com as respetivas taxas aplicáveis a pessoa inalteradas de retenção na fonte. Esta tendência tem estado a prejudicar os
singulares. principais países exportadores de capitais cuja atitude predominante tem sido
isentar da retenção na fonte os dividendos pagos a sócios estrangeiros. As atuais
Uma vez aceite eu, do ponto de vista fiscal, as sociedades e os sócios são uma mudanças de políticas fiscais internas parecem indicar que os sistemas clássicos
realidade unificada, apesar da independência legal e jurídica, podem ser já não satisfazem as necessidades de receitas de países exportadores de capitais,
previstas duas alternativas: exceto nos casos em que esses países aplicam taxas de retenção na fonte sobre
• Sistemas integracionistas; rendimentos de dividendos estrangeiros. Não obstante estas mudanças
fundamentais nos resultados da política fiscal e nos padrões de comércio, execto
• Sistemas de isenção que tributam os lucros ao nível da sociedade e
nos casos de implementação de um sistema de imputação, a perspetiva clássica
isentam os dividendos e as mais-valias ao nível do sócio. Os
ainda constitui a norma no contexto internacional, apoiada pelos princípios da
rendimentos dos sócios passariam a estar sujeitos ao regime fiscal
não-discriminação e da reciprocidade.
aplicável a pessoas coletivas e, por consequência, o regime fiscal das
pessoas singulares deixaria de ser aplicável. Com o desaparecimento das barreiras não-tributárias ao investimento além-
fronteiras, os efeitos negativos da dupla tributação económica de rendimentos e
Tanto o objetivo de eliminação da dupla tributação económica dos dividendos e
de capital têm recebido mais atenção e comentários. As desvantagens associadas
das mais-valias, como o objetivo da redução dos custos com o cumprimento das
à utilização de um sistemas clássico têm sido sujeitas a uma análise exaustiva,
obrigações fiscais podem ser alcançados mas, no entanto, com prejuízo do
tendo sido apresentadas algumas propostas para resolver estas questões. De
princípio da progressividade. Note-se que este já está a ser questionado em vária
facto, as desigualdades e ineficiências relacionadas com sistemas clássicos, tais
sistemas fiscais da EU.
como o tratamento discriminatório do financiamento com recurso a capitais
4.4 O sistema clássico próprios com a consequente distorção de decisões financeiras ou de
investimento, têm sido referidas em vários estudos e têm conduzido a exaustivas
Tal como foi referido anteriormente, o sistema clássico rejeita a perspetiva discussões críticas, não só nos EUA, mas também na EU.
integracionista e tributa em separado sociedades e sócios.
4.5 Sistemas de Imputação
As principais vantagens dos sistemas clássicos têm sido a sua simplicidade ao
nível administrativo e a sua capacidade de satisfazer as exigências em termos de

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

Os sistemas de imputação obedecem à perspetiva integracionista embora não especial referência o sistema fiscal de imputação utilizado na Alemanha,
tenham tentado implementar totalmente os seus efeitos e pressupostos teóricos frequentemente classificado nas obras especializadas como um “sistema de
(integração parcial). Visam tributar lucros de pessoas coletivas em poder dos dualidade de taxas”. O sistema fiscal de imputação alemão assentou numa
sócios e, por consequência, eliminar ou mitigar a dupla tributação económica estrutura de dualidade de taxas combinada com um sistema de crédito integral
dos dividendos sem abolir a tributação dos rendimentos da sociedade. No na altura da distribuição para o IRC pago (sistema de imputação total). Assim,
entanto, o problema mais alargado da dupla tributação económica de lucros os lucros retidos estariam sujeitos a taxas de imposto mais elevadas e os lucros
distribuídas (nomeadamente a dupla tributação das mais-valias) não é distribuídos estariam sujeitos a taxas de imposto mais reduzidas. Para além
considerado. Este facto compromete a concretização dos objetivos acima disso, ao permitir aos sócios residentes no país receberem o crédito integral (ou
apresentados: progressividade do sistema fiscal e eliminação da dupla tributação obter um reembolso, se aplicável) relativos a IRC pago, o sistema fiscal de
económica de rendimentos e de capital. Os sistemas de imputação podem imputação (total) alemão evitou (internamente) os aspetos distorsivos da dupla
assumir duas formas: tributação económica dos dividendos.

• Sistemas de imputação total; O caráter atrativo da aplicação de sistemas de imputação deriva da sua
• Sistemas de imputação parcial; capacidade potencial para conciliar o princípio de progressividade com o
objetivo de eliminar a dupla tributação económica dos dividendos.
O termo sistemas de imputação é usado para referir exclusivamente sistemas em Simultaneamente, estes sistemas satisfazem as necessidades ao nível de receitas
que existe uma ligação direta entre o crédito de imposto atribuído ao sócio em ao garantir a cobrança de um imposto mínimo apesar da atribuição da carga
relação a dividendos recebidos e o IRC pago pela sociedade distribuidora. Num fiscal definitiva ao sócio individual.
sistema de imputação, todos os lucros cujo montante de imposto tenha sido
reduzido terão estado sujeitos a IRC aplicado às taxas vigentes; uma parte ou a No entanto, do ponto de vista do cumprimento das obrigações fiscais, estes
totalidade do IRC pago sobre os lucros distribuídos é creditado pelo sócio sistemas são complicados, exigindo uma administração fiscal onerosa e
relativamente aos dividendos recebidos ou reembolsados caso o IRC pago dessa eficiente. Com a importância crescente dos fundos de pensões e a generalização
forma ultrapasse o imposto a pagar pelo sócio. Num sistema de imputação total, de mecanismos de poupança fiscal, a sua importância como “responsáveis” pela
o IRC pago é integralmente creditado (ou reembolsado, se necessário) ao nível obtenção de receitas fiscais está a diminuir progressivamente. De facto, as
do sócio individual. A dupla tributação económica dos dividendos é evitada ao autoridades fiscais estão plenamente conscientes dos custos associados aos
submeter-se os dividendos apenas à estrutura progressiva individual de taxas. reembolsos fiscais devidos a entidades isentas e que conduzem a uma redução
do valor do IRC cobrado. Esta tendência também coloca graves entraves à
De forma diferente, num sistema de imputação parcial, os sócios que recebem implementação do princípio da progressividade. Para além disso, os sistemas de
dividendos beneficiam de um crédito (ou reembolso) que reflete apenas uma imputação não proporcionam uma resposta satisfatória ao problema do
parte do imposto subjacente aos dividendos. A dupla tributação económica dos tratamento discriminatório dos lucros retidos. Mesmo que os dividendos não
dividendos mantém-se, pelos menos, no caso dos sócios sujeitos a taxas mais sejam sujeitos a uma dupla tributação, as mais-valias continuam a ser
elevadas de imposto. Esta distinção fundamental proporciona o enquadramento penalizadas a não ser que passem a estar isentas de impostos ao nível do sócio
básico para a multiplicidade e variedade de sistemas de imputação existentes na altura da sua distribuição. Para efeitos fiscais, tendo em conta que em geral
atualmente em vários países. Dentro da EU, e em termos históricos, merece

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

os juros são livremente dedutíveis, o financiamento através de empréstimo neutralidade e de eficiência. De facto, os lucros distribuídos estão sujeitos
continua a ser preferível ao financiamento com recurso aos lucros retidos da apenas a um nível de tributação – isto é, ao nível da sociedade – e quer os
sociedade. dividendos, quer as mais-valias, estão isentos nas mãos do sócio. A nível
internacional, o sistema é fácil de implementar e obedece ao princípio da
Ao nível internacional, a conciliação do princípio de reciprocidade com o
neutralidade da importação de capitais que prevalece quando os fornecedores de
princípio da não-discriminação cria motivos para uma forte oposição ao
capitais internos e internacionais, para qualquer determinado mercado nacional,
alargamento dos sistemas de imputação para além das fronteiras nacionais. De
obtêm a mesma taxa após dedução de impostos sobre os seus investimentos
facto, a natureza bilateral do princípio de reciprocidade pode entrar em conflito
nesse mercado.
com o princípio geral de não discriminação da EU que reflete a perspetiva
segundo a qual a legislação fiscal dos países não deve discriminar sociedades e Apesar destas qualidades e da simplicidade administrativa associada à sua
sócios estrangeiros, nem sociedades ou indivíduos nacionais a investir no implementação, do ponto de vista político este sistema não é muito usado. Isto
estrangeiro. deve-se essencialmente à sua incapacidade para integrar os princípios de
progressividade ou de equidade vertical. De facto, mesmo no caso da escolha de
Os sistemas de imputação evoluíram sem dar particular atenção às questões
uma isenção com progressividade, os dividendos seriam considerados apenas
internacionais. Isto apesar de nalguns países os aspetos internacionais terem sido
para efeitos do cálculo do imposto aplicável a outro tipo de rendimentos (não-
um motivo para adotar o sistema.
isentos). Por outras palavras, o rendimento de dividendos é incluído quando se
Do ponto de vista dos tesouros nacionais, e pondo de lado considerações determina a taxa, mas é excluído, quando essa taxa é aplicada a rendimentos
financeiras ou comerciais, o alargamento dos sistemas de imputação a sócios não-isentos. Com a globalização crescente da economia, será necessário
não-residentes no país tem como resultado uma perda de receitas considerável. verificar se o princípio da progressividade e os objetivos a ele associados irão
Isto poderá não ser compensado pelo sistema fiscal existente no país onde reside sempre prevalecer em relação ao princípio da neutralidade da tributação.
o sócio (por exemplo, país com um sistema clássico). Nestas circunstâncias, e
4.7 Sistema de Dedução
deixando de lado outras considerações fiscais, para manter um equilíbrio
adequado ao nível de receitas entre países de residência, o princípio de Neste sistema, é permitida uma dedução total ou parcial dos lucros distribuídos.
reciprocidade defende a adoção de um sistema clássico. No entanto, este Consequentemente, os lucros distribuídos são parcial ou totalmente tributados
princípio pode entrar em conflito com o princípio de não-discriminação, não só nas mãos dos sócios. Este tratamento fiscal não é discriminatório em relação ao
ao nível interno, mas também ao nível internacional. De facto, ao conceder financiamento com recurso a capitais próprios tendo em conta que tanto o
créditos de imposto a sócios nacionais ou ao alarga-los a sócios estrangeiros pagamento de juros como os lucros distribuídos podem ser deduzidos da base
selecionados ao abrigo de regimes de CDTs, os sistemas de imputação são de IRC. No entanto, por motivos práticos, sobretudo para garantir a cobrança de
discriminatórios, conduzindo a distorções e desigualdades no seio da EU. um valor mínimo de receitas fiscais, este sistema não é aceite como uma forma
adequada e apropriada de tributar os lucros das sociedades. De facto, apesar da
4.6 Sistemas de Isenção
sua capacidade para tratar de forma equitativa o financiamento através de
Num sistema de isenção, os lucros distribuídos são tributados ao nível da empréstimo ou capitais próprios, a não ser que uma taxa elevada de retenção na
sociedade e isentos nas mãos dos sócios. O sistema obedece aos princípios de fonte seja aplicada ao nível da sociedade, um sistema de dedução não fornece

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Direito Fiscal – 1ª Frequência

uma resposta satisfatória aos problemas do incumprimento ou da evasão fiscal.


Do ponto de vista de receita fiscal, este sistema é rejeitado logo à partida. Para
além disso, e tendo em conta as tendências atuais de abolição de taxas de
retenção na fonte sobre rendimentos de dividendos e da redução de isenções
fiscais, um sistema de dedução não constitui uma alternativa viável aos atuais
sistemas fiscais da EU.

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