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CARACTERIZAÇÃO DE DENSIDADE E

MICROESTRUTURAS DE FIBRAS DE CANA-DE-AÇÚCAR


EM FUNÇÃO DO DIÂMETRO1
Amanda Luiza Bezerra Sandes Martins2
Raíssa de Almeida Gouvêa2
Verônica Scarpini Cândido3
Sérgio Neves Monteiro4
Resumo
As fibras naturais surgem como alternativa ao uso de fibras sintéticas para as mais
variadas aplicações. Isso se deve pelo seu baixo custo, por serem recicláveis,
biodegradáveis e principalmente por sua alta resistência ao impacto e a tração. Esse
trabalho objetiva caracterizar a microestrutura da fibra da cana-de-açúcar e
determinação da massa específica em função do diâmetro. Para análise das fibras,
lavou-se essas em água corrente, colocou-se em estufa a 60°C durante 24 h, depois
se desfiou 100 fibras. Foram feitas, posteriormente, 20 medidas do diâmetro em
cada fibra. Os resultados encontrados foram dispostos em um histograma,
dividindo-o em seis intervalos. Em seguida, pesaram-se as fibras em grupos de três,
dentro dos intervalos a qual cada uma pertencia. Mediu-se ainda o comprimento das
fibras e os resultados foram dispostos em outro histograma. Desse modo, calculou-
se a densidade média da fibra por intervalo de diâmetro. Além disso, foi observada a
estrutura da fibra do bagaço no MEV, para melhor compreender as estruturas. Os
resultados indicaram que a massa específica diminui com o aumento do diâmetro e
que fibras mais grossas apresentam uma microestrutura porosa e com maiores
imperfeições.
Palavras-chave: Fibra de cana-de-açúcar; Densidade; Diâmetro.
CHARACTERIZATION OF MICROSTRUCTURE AND DENSITY OF SUGAR CANE
BAGASSE FIBERS AS FUNCTION OF THEIR DIAMETERS
Abstract
Natural fibers arise as an alternative to using of the syntactical fibers for many
applications. This is due to their low cost, recyclable characteristics, biodegradability
and mainly for high impact strength and tensile. The goal of this work is characterize
the fiber sugar cane’s microstructure and define the relation of the specific gravity
and diameter. In order to analyze the fibers, the bagasses were cleaned in with
running water and put in a stove at 60°C for 24 h, after that unraveled 100 fibers.
Each fiber was then measured 20 times and the results arranged in a diagram
divided in six intervals of diameters. Afterwards the fibers were weighted and their
lengths were also measured. Thereby the density of the fibers were calculated and it
was found that the density is a function of the diameter. Finally, the microstructure of
the fibers were analyzed by SEM. Was concluded that the density of fiber decrease
with the diameter and that the thicker fibers presents a microstructure more porous
and with grater in.
Key words: Sugar cane fibers; Density; Diameter.

1
Contribuição técnica ao 67º Congresso ABM - Internacional, 31 de julho a 3 de agosto de 2012,
Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
2
Graduanda, engenharia, Instituto Militar de Engenharia (IME), Rio de Janeiro, Brasil.
3
Mestre em Engenharia e Ciências dos Materiais, doutoranda, IME, Rio de Janeiro, Brasil.
4
Doutor em Materials Science And Engeneering, professor titular, IME, RJ, Brasil.

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1 INTRODUÇÃO

Recentemente os compósitos reforçados com fibras sintéticas têm sido estudados e


utilizados em muitas aplicações envolvendo as mais altas tecnologias tais como
construção civil, indústria automotiva, componentes para setores aeroespaciais de
defesa.(1-2) Entretanto, para algumas empresas o custo é de essencial importância,
sendo necessário o estudo de fibras mais econômicas como a fibra de vidro, ou
mesmo as fibras naturais.(3-5)
Neste último caso os compósitos de fibras naturais, lignocelulósicas, permitem que
sejam aproveitados na sua fabricação resíduos de outros materiais como os de
origem vegetal, resultantes de processos agroindustriais. Essa aplicação vem
mostrando uma grande perspectiva para fabricação de compósitos já que as fibras
lignocelulósicas possuem muitas características que tornam seu uso vantajoso
como:(1-7)
 baixo custo;
 abundantes;
 renováveis;
 baixa densidade;
 não abrasivas; e
 não tóxicas.
A cana-de-açúcar (Saccharum l.), desde a época da colonização, é cultivada em
larga escala pelo Brasil, mas foi com a explosão do álcool com(o combustível que
esse vegetal se tornou conhecido e cultivado por todo o Brasil.(8) O centro-oeste, sul
e sudeste juntos correspondem a 85% do cultivo da cana no país, deixando para o
norte e nordeste os 15% restantes. De acordo com a FAO (Food and Agriculture
Orgaization of the United Mations), cerca de 35% em peso da cana de açúcar
produzida é constituída do bagaço, e na maioria das vezes inutilizado.(9)
Os compósitos da fibra do bagaço da cana-de-açúcar, então além das vantagens
comuns as outras fibras naturais, ainda contribuem para a diminuição do desperdício
dessa matéria-prima já que fornece uma nova aplicação a esse resíduo.(10)
Assim, esse trabalho tem o objetivo de caracterizar a microestrutura da fibra do
bagaço da cana-de-açúcar, bem como determinar a variação da massa específica
dessas fibras em relação ao seu diâmetro.

2 MÉTODOS E MATERIAIS

O bagaço de cana-de-açúcar (Figura 1), foi lavado em água corrente para tirar o
excesso de açúcar, depois foram retiradas possíveis partes danificadas do bagaço,
como regiões com fungos e quebradas. Logo após, as fibras foram secas em estufa
a 60ºC durante 24 h. Posteriormente as fibras foram desfiadas manualmente e
separadas em um grupo de 100 com um tamanho mínimo de 10 cm.

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Figura 1. Bagaço de cana-de-açúcar.

Após a etapa de lavagem e secagem, as fibras foram desfiadas até que se


encontrasse um total de 100 fibras com tamanho mínimo de 10 cm. As fibras
desfiadas estão apresentadas na Figura 2.

Figura 2. Fibras de bagaço de cana-de-açúcar desfiadas.

Para cada uma das 100 fibras foram feitas 20 medições do diâmetro em um
estereoscópio da Zeiss, modelo Stemi 2000-C com aumento de 1,6 x 10. As dez
primeiras medições foram feitas e depois rotacionou-se de 90° a fibra e mediu-se
outras 10 restantes.
Para determinação do comprimento utilizou-se uma régua metálica e para cada
grupo de três fibras foi calculado o comprimento médio.
As fibras foram consideradas aproximadamente cilíndricas e, portanto, pode-se
determinar o volume pela Equação 1.
(Volume médio) = π * (Raio médio)² * (comprimento médio) (1)
As fibras foram pesadas em uma balança analítica Gehaka, modelo BK300, de
precisão 0,001 g.
Após a determinação do volume e da massa das fibras pode-se calcular a massa
específica aparente pela Equação 2.
(Massa específica) = (massa) / (volume) (2)
A caracterização microestrutural foi feita em fibras de menor e maior diâmetro. Para
tal análise, as amostras foram previamente recobertas com ouro em metalizador

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Shimadzu, modelo IC-50, e observadas, com feixe de elétrons secundários, em
microscópio eletrônico de varredura (MEV) da Jeol, modelo FSM 6460 LV.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

A Figura 3 apresenta a distribuição do número de fibras em função dos intervalos do


diâmetro. Pode-se notar que o maior número de fibras foi observado nos intervalos
de 0,11 – 0,17 e 0,17 – 0,23. Tal resultado pode estar associado à natureza das
fibras que geralmente é mais compacta e de menor diâmetro e, por tanto menos
quebradiças.

Figura 3. Número de fibras de bagaço de cana-de-açúcar por intervalo de diâmetro.

O número de fibras de bagaço de cana-de-açúcar em função do seu comprimento


está representado na Figura 4. Nota-se que há um maior número de fibras nos
intervalos de menor magnitude, isso se deve provavelmente a dificuldade de extrair
fibras de grandes comprimentos, visto que ao serem desfiadas manualmente há o
rompimento ao longo de sua extensão, devido ao bagaço estar com parte de sua
estrutura danificada da moagem e estocagem.

Figura 4. Número de fibras de bagaço de cana-de-açúcar por intervalo de comprimento.

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O resultado da massa específica em função do diâmetro das fibras está apresentado
na Figura 5. De maneira geral, pode-se observar que com o aumento do diâmetro,
há uma diminuição da massa específica aparente. Isso indica que fibras de menor
diâmetro são mais compactas e possuem menos espaços vazios em sua
microestrutura que as fibras de maior diâmetro, isto é menos defeitos estruturais.

Figura 5. Massa específica das fibras de bagaço de cana-de-açúcar em função do diâmetro.

Os valores de massa específica, desvio padrão, bem como os intervalos de diâmetro


das fibras estão representados na Tabela 1.

Tabela 1. Diâmetro e Massa específica das fibras de bagaço de cana-de-açúcar


Massa específica
Diâmetro (mm)
(g/cm3)
0,11 - 0,17 4,45 ± 0,67
3,33 ± 0,32
0,17 - 0,23
2,42 ± 0,18
0,23 - 0,29
1,80 ± 0,15
0,29 - 0,35
1,38 ± 0,15
0,35 – 0,41
0,41 – 0,47 1,00 ± 0,02

Na Figura 6 está apresentada a massa específica em função do inverso do diâmetro


e a aproximação linear dos pontos. Baseado na aproximação linear feita obteve-se a
Equação da aproximação linear da massa especifica pelo inverso do diâmetro
(Equação 3).
Massa específica = (0,70943)/(diâmetro) – (0,44542) (3)

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Figura 6. Massa específica em função do inverso do diâmetro e aproximação linear dos pontos.

A Figura 7 apresenta a micrografia da fibra fina (Figuras 7a e 7b) e a Figura 8 mostra


a micrografia da fibra grossa (Figuras 8a e 8b) do bagaço de cana-de-açúcar.
Pode-se observar que a fibra fina (Figuras 7a e 7b), apresenta áreas lisas
associadas a poucas áreas rugosas. Já a fibra grossa (Figura 8a e 8b), apresenta
muitas áreas rugosas com poucas áreas lisas, além de defeitos. Observa-se ainda,
de modo geral, que as fibras de bagaço de cana-de-açúcar apresentam células
parenquimáticas dispostas ao longo de todo o comprimento.

a b
Figura 7. Micrografias obtidas por MEV da fibra fina de bagaço de cana de açúcar. (a) aumento 100x;
e (b) aumento 400x.

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a b

Figura 8. Micrografias obtidas por MEV da fibra de bagaço de grossa de cana de açúcar. (a) aumento
100x; (b) aumento 400x.

5 CONCLUSÃO

A caracterização microestrutural e a determinação da massa específica em função


do diâmetro das fibras de bagaço de cana-de-açúcar revelou:
 os diâmetros e os comprimentos com maior número de fibras foram os
intervalos de menor tamanho supondo que na natureza é comum encontrar
fibras evidenciando que fibras mais grossas estão menos compactadas que
as finas;
 a densidade das fibras de cana-de-açúcar varia inversamente com o diâmetro
e se ajusta a uma equação matemática hiperbólica; e
 a análise microestrutural revelou que as fibras mais finas apresentam uma
microestrutura mais compacta, com menos defeitos e mais áreas lisas que as
fibras grossas. Isso sugere que as fibras mais finas podem ser mais
resistentes que a fibras grossas.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Fundação Ricardo Franco, ao Instituto Militar de


Engenharia, Coppe/UFRJ. É também motivo de agradecimento a esta pesquisa a
Faperj, CNPQ e Capes.

REFERÊNCIAS

1 K. BILBA, M-A.M.-A. Arsene / Composites: Part A 39 (2008) 1488–1495


2 TITA, SANDRA P. S.; DE PAIVA, JANE M. F. ; FROLLINI, ELISABETE. Resistência ao
impacto e outras propriedades de compósitos lignocelulósicos: matrizes termofixas
fenólicas reforçadas com fibras de bagaço de cana-de-açúcar. Polímeros: Ciência e
Tecnologia, vol. 12, nº 4, p. 228-239, 2002.
3 FERREIRA, A.; LEBRÃO, G. W.; L. NAGASHI; M. T. SU; R. K. HANNA; S. M. G.
LEBRÃO; T. VICENTINI. Avaliação de compósito de poliéster e fibra de cana-de-açúcar.
In: Congresso Brasileiro de Engenharia e ciência dos materiais, 17, 2006, Foz do
Iguaçu, PR – Brasil. Disponível em:
http://www.metallum.com.br/17cbecimat/resumos/17Cbecimat-212-001.pdf. Acesso em:
9 mar. 2012
4 CALLISTER, W. D. Materials Science and Engineering- 2ª Introduction, Jonh Wiley and
Sons, Canadá p. 445, 2000.

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5 S.N. MONTEIRO, R.J.S. RODRIQUEZ; M.V., DE SOUZA. Sugar cane bagasse waste
as reinforcement in low cost composites. Advanced Performance Materials, v. 5, p. 183–
191,1998.
6 MOTA, J. M.; DA LUZ, S. M; DEL’ARCO JR ,A. P.; GONÇALVES ,A. R.. Estudo do
reprocessamento de compósitos de polipropileno reforçado com diferentes tipos de
fibras de bagaço de cana-de-açúcar. VI Congresso Brasileiro de Engenharia Química
em Iniciação Científica –UNICAMP, 2005.
7 K. BILBA *, M-A. Arsene, A. Ouensanga Cement & Concrete Composites 25 (2003) 91–
96.
8 HISTORIA DO BRASIL.NET. Resumo da História do Brasil Colônia, principais fatos e
ciclos da história. Disponível em: http://www.historiadobrasil.net/colonia/ acessado em
02/04/2012.
9 BIODIESELBR.COM. Resíduo da Cana-de-Açúcar: Energia. Disponível em:
http://www.biodieselbr.com/energia/residuo/residuo-setor-sucroalooeiro.htm acessado
em 02/03/2012.
10 UNIÃO DA INDÚSTRIA DE CANA-DE-AÇÚCAR (UNICA). Setor Sucroenergético -
Histórico. Disponível em:
http://www.unica.com.br/content/show.asp?cntCode=9E97665F-3A81-46F2-BF69-
26E00C323988 acessado em 02/03/2012.

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