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G4 - Ilicitude

97. Introdução
O conceito de ilicitude material foi uma
conquista dos neoclássicos que
também analisaram quais eram as
consequências relevantes da distinção
entre ilicitude material e ilicitude
formal.
Nomeadamente a partir dum conceito
de ilicitude material permita-se uma
graduação do conceito de ilicitude, ao
mesmo tempo que permitia descobrir
novas causas de justificação e aderir à
chamada justificação supra legal.
Quanto ao conceito de ilicitude pessoal
e o contributo dado para esta categoria
pelos finalistas.
Uma acção é penalmente relevante,
essa acção pode ser subsumível aos
termos gerais e abstractos dum tipo
legal de crime.
Se a tipicidade objectiva e subjectiva
estiver preenchida, tem-se que o tipo
indicia a ilicitude.
A um facto típico está indiciado um
juízo de ilicitude, ilicitude formal, no
sentido de que aquilo que se fez é algo
que contraria a ordem jurídica na sua
globalidade, é algo que é contrário à lei.
Mas este juízo de ilicitude indiciado
pela tipicidade pode ser excluído, e é
excluído pela intervenção relevante das
chamadas causas de exclusão da
ilicitude ou causas de justificação.
Estas são causas, que visam excluir a
ilicitude do facto típico; visam dizer
que aquele facto, que é típico, é
aprovado pela ordem jurídica porque é
um facto que está justificado.
Mas um facto justificado[38], não deixa
por esse facto de ser um facto típico.
Portanto um facto justificado
permanece típico – tão só se exclui a
ilicitude.
Um facto, ainda que justificado, não
deixa de ser típico, porque os factos,
ainda que aprovados pela ordem
jurídica (factos cuja ilicitude esteja
excluída) não são valorativamente
neutros.
A própria função que o tipo deve
desempenhar inculca a que se faça uma
análise tripartida do facto punível, com
as categorias da tipicidade, de ilicitude
e da culpa. E isto porque o juízo que é
dado sobre a tipicidade de um facto que
acaba por ser justificado é um juízo que
não volta atrás: o tipo tem uma função
de apelo, desde logo pelos fins das
penas, visível em cada tipo legal de
crime, quer-se dizer com isto que o
legislador quando tipifica
comportamentos o faz com uma
determinada intenção.
Portanto, o tipo tem uma certa função
de apelo:
- No sentidonodeaplicativo
Siga-nos que as pessoas não
devem empreender essas condutas que
a lei considera proibidas;
- Ou no sentido de fazer com que as
pessoas adoptem determinadas
condutas que a lei exige.
Esta função de apelo inerente aos tipos
só se satisfaz se ainda que o facto esteja
justificado, o tipo permanecer intacto:
em princípio não se deve matar, no
entanto aprova-se que alguém mate
outrem em legítima defesa.

98. Juízo de ilicitude


É um juízo que é feito pela ordem
jurídica, um juízo generalizado, um
juízo de desvalor que incide sobre o
facto praticado, ou seja:
- A ordem jurídica fórmula um juízo
negativo sobre quem adopta um
determinado facto que a ordem jurídica
considera um facto proibido;
- Ou faz incidir um juízo de desvalor,
porque efectivamente a pessoa não
adoptou o comportamento que devia
ter adoptado quando a lei o exigia.
Neste sentido tem-se que o juízo de
ilicitude é um juízo de desvalor
generalizado que incide sobre o próprio
facto.
Este juízo de ilicitude diverge de um
juízo de culpa, ou de um juízo de
censura de culpa.
No juízo de censura de culpa há
também um juízo de desvalor, mas que
é já um juízo individual, é um juízo
feito pela ordem jurídica mas que
incide já não sobre o facto praticado,
mas recai sobre o agente, precisamente
porque o agente actuou tendo
praticado um facto ilícito, quando
podia e devia ter-se decidido
diferentemente, quando podia e devia
ter actuado de harmonia com o direito.
Portanto, no juízo de censura de culpa,
o que se reprova é o agente (por isso é
um juízo individualizado) por ele,
naquele caso concreto, ter actuado
ilicitamente, quando podia e devia ter
actuado de forma diferente, ou seja,
licitamente. Donde, o juízo de ilicitude
é um juízo que procede
necessariamente o juízo de censura de
culpa: se em sede de culpa a ordem
jurídica dirige ao agente um juízo de
desvalor porque ele praticou um facto
ilícito, então o juízo de ilicitude tem de
ser anterior; tem se der firmado
anteriormente que o facto praticado
pelo agente é um facto ilícito.

99. Regras gerais e princípios que


enformam as causas de exclusão
da ilicitude
As causas de exclusão da ilicitude são
determinada circunstâncias que, a
estarem presentes excluem a ilicitude
do facto praticado, ou justificam o facto
típico praticado pelo agente.
Vigora um princípio, que é o princípio
da unidade da ordem jurídica, ou o
concerto unitário de ilicitude, princípio
esse que está expresso no art. 31º CP.
Portanto, o facto, não é ilícito quando a
ilicitude for excluída pela ordem
jurídica na sua globalidade.
Quando a ilicitude de um facto for
excluída por qualquer elemento do
ordenamento jurídico, então esse facto
não deve ser visto, para o direito penal,
como um facto ilícito, como um facto
não justificado.
Como explicar este conceito unitário e
esta exclusão da ilicitude, em sede de
exclusão da ilicitude?
Desde logo por força do princípio da
subsidiariedade do direito penal.
Se o direito penal, de harmonia com
este princípio, só deve intervir e
emprestar a sua tutela robusta quando
a tutela fornecida por outros ramos do
direito não for suficientemente eficaz
para tutelar cabalmente bens jurídicos
reputados como fundamentais e
essenciais à sociedade; então se os
outros ordenamentos jurídicos para
determinados factos consideram que o
comportamento é lícito, não deve vir o
direito penal incriminar e emprestar a
sua tutela àquele facto, que não merece
tutela jurídico-penal, precisamente
porque outros ordenamentos jurídicos
prescindiram da sua consideração
como facto ilícito, mas consideram-no
um facto aprovado.
As causas de justificação, como visam
excluir a ilicitude e irresponsabilizar o
agente, são normas penais favoráveis.
Assim sendo, a elas não estão ínsitos os
princípios de garantia e as limitações
impostas, enquanto garante do
princípio da legalidade, como acontece
com as normas positivas ou normas
que fundam positivamente a
responsabilidade jurídico-penal do
agente.
As causas de exclusão da ilicitude em
direito penal não são apenas as que
estão enumeradas no art. 31º CP mas
todas aquelas que o ordenamento
jurídico na sua globalidade considera
como relevantes para afastar a ilicitude
de um determinado facto.
Inerente a toda a justificação existe
uma ideia comum: não há participação
em facto justificados, ou seja, a
participação num facto justificado não
é punida.
Quando existe comparticipação
criminosa, quando existe um
envolvimento plural de vários agentes
no mesmo crime, uns desses agentes
podem ser qualificados como autores e
outros como participantes. A
participação está prevista no art. 27º
CP e participantes são os cúmplices e
também, para alguma doutrina, os
instigadores.
Quando se diz que não existe
participação penalmente relevante, em
termos de punição, dum facto
justificado, significa que não existe
punibilidade da participação num facto
típico justificado.
Outra ideia comum às diferentes
causas de justificação é a seguinte:
inerentes a todas as causas de
justificação existem elementos
subjectivos. O elemento subjectivo da
causa de justificação é, um elemento
comum a todas as causas de
justificação.
Toda a doutrina concorda num ponto:
havendo elemento subjectivo da
justificação só está aprovado, só está
justificado, se se verificarem
simultaneamente os elementos
objectivos e subjectivos das causas de
justificação.
Porém, verificando-se tão só a situação
objectiva de justificação mas faltando o
elemento subjectivo:
a) Para determinada doutrina o facto é
ilícito, mas o agente é punido por
tentativa;
b) Para outro sector da doutrina o facto
é também ilícito, mas o agente é punido
por facto consumado;
c) Outros autores distinguem
consoante a causa de justificação
tenha, quanto ao elemento subjectivo
um elemento intelectual e um elemento
volitivo:
* Nas causas de justificação cujo
elemento subjectivo tenha esta dupla
estrutura, se o elemento subjectivo
tenha esta dupla estrutura, se o
elemento subjectivo não estiver
preenchido o agente é punido por facto
consumado;
* Se o elemento subjectivo da
justificação prescindir do elemento
volitivo e se contentar só com o
elemento intelectual do conhecimento,
ou seja, se o elemento subjectivo não
tiver uma estrutura dupla, estão
faltando o elemento subjectivo o agente
é punido por facto tentado.

REGIME DAS CAUSAS DE


EXCLUSÃO DA ILICITUDE

a) Legítima defesa

100. Introdução
A legítima defesa assenta precisamente
numa reacção a uma agressão actual e
ilícita que ameaça interesses
juridicamente protegidos do
defendente ou terceiro. Essa reacção
trem de ser uma reacção adequada,
necessária a afastar ou repelir a
agressão actual e ilícita.
Existe doutrinas que fundamentam a
existência da legítima defesa, como
causa de justificação: a doutrina
monista e a pluralista.
a) Doutrina monista
Para esta doutrina todas as causas de
justificação se filiam numa ideia
comum; a noção de ideia comum é que
varia de autor para autor.
Poder-se-á dizer que inerente a todas
as causas de justificação existe uma
ideia de ponderação de interesses: do
interesse a salvaguardar do interesse
ameaçado. Portanto, uma ideia de
ponderação de interesses.
b) Doutrina pluralista
Há quem considere diferenciadamente,
para cada uma das diferentes causas de
justificação, diferentes fundamentos.

101. Fundamentação da legítima


defesa
Não é tanto uma ideia de ponderação
de interesses, uma ideia de proporção
entre o interesse ofendido e o interesse
lesado com a defesa, mas a ideia de que
o direito não deve ceder ao não direito.
Esta ideia é de alguma forma visível se
distinguir na legítima defesa duas
vertentes:
- Uma vertente ao lado individual;
- Uma vertente ao lado colectivo-social.
E isto porque, inerente à legítima
defesa, dum ponto de vista (ou dum
prisma) meramente individual, está
uma ideia de auto-protecção.
Mas, quando se olha a legítima defesa
já por um prisma social ou colectivo,
vê-se que o seu fundamento é a
reafirmação do direito negado. Se há
uma reacção contra uma acção ilícita,
de alguma forma está-se a repor um
direito negado com a agressão,
precisamente porque a agressão é
ilícita.
Partindo desta ideia do lado individual
e do lado social da legítima defesa,
pode-se assentar no seguinte.
Em primeiro lugar, com base nesta
ideia de auto-protecção (lado
individual da legitima defesa) não há
legítima defesa de interesses públicos.
Quer-se dizer com isto que a defesa de
interesses públicos é feita pelos meios
coercivos normais, pelas forças
públicas de defesa. No entanto, existem
determinados interesses públicos que,
ao serem ofendidos, podem ter uma
certa repercussão pessoal na esfera
jurídica dum titular. E se assim for
podem defender-se interesses ou bens
de natureza pública.
Por outro lado, à ainda atendendo a
esta ideia de auto-protecção, não há
legítima defesa de terceiros contra a
vontade do agredido ou do ofendido,
isto é, não há legítima defesa de
terceiros se esse terceiro não se quiser
defender ou não quiser ser defendido
por uma determinada pessoa em
concreto.
Como princípio, e ainda dentro da ideia
de auto-protecção, diz-se que não há
legítima defesa contra tentativa
impossível.
Na ideia de reafirmação do direito
negado e já numa perspectiva social da
legítima defesa, pode-se assentar a
seguinte ideia: a legítima defesa
justifica-se e funda-se numa ideia de
prevenção geral, numa óptica de
prevenção geral inerente aos fins das
penas visa-se evitar que as pessoas
voltem a cometer crimes.

102. Distinção entre legítima


defesa e direito de necessidade
Na legítima defesa, ao contrário com o
que sucede com o direito de
necessidade, não se exige que haja uma
sensível superioridade entre o bem que
se pretenda salvaguardar e o bem que é
lesado com a defesa.
Já no âmbito do direito de necessidade,
nos termos do art. 34º CP uma pessoa
só actua em direito de necessidade
quando, para afastar um perigo que
ameaça de lesão um determinado bem
jurídico, lesar outro bem jurídico que
não seja superior ao bem que se
pretende salvaguardar. Portanto, tem
de haver uma ideia de ponderação
entre os interesses a salvaguardar e os
interesses lesados com o exercício do
direito de necessidade.

103. Elementos da legítima defesa


O defendente, defende-se duma
agressão actual e ilícita.
Uma agressão, para efeitos de legítima
defesa, é todo o comportamento
humano que lese ou ameace de lesão
um interesse digno de tutela jurídica.
Tem de ser uma agressão humana.
Dentro deste conceito de agressão
também se entende que todos aqueles
movimentos corpóreos que não
constituem acções penalmente
relevantes, não são considerados
agressões para efeitos de legítima
defesa, porque são movimentos que
não são dominados pela vontade
humana.
A agressão pode consistir ou num
comportamento positivo ou numa
omissão.
A agressão pode ser dirigida quer a
bens ou interesses de natureza pessoal,
quer a bens de natureza patrimonial do
defendente ou de terceiro, consoante se
esteja no âmbito de uma legítima
defesa própria ou alheia. E é uma
agressão qualificada: para além de
haver uma agressão, ela tem de ser:
actual e ilícita.
a) Agressão ilícita
É toda a agressão contrária à lei, não
necessitando contudo de consistir
numa actuação criminosa. Para ser
uma agressão ilícita, tem de se tratar de
uma agressão não justificada, contra
legítima defesa não existe legítima
defesa.
b) Agressão actual
É actual, a agressão que está iminente,
isto é, prestes a ocorrer, a agressão que
está em curso ou em execução, ou
simplesmente a agressão que ainda
dura.
Nos crimes duradouros há actualidade
enquanto durar a consumação, isto é,
há actualidade para efeitos de legítima
defesa enquanto não cessar a
consumação.
As situações em que falta o requisito da
actualidade da agressão podem ser
reconduzidas a situações de acção
directa (art. 336º CC).
Existem também determinadas causas
de justificação supra-legais,
nomeadamente a legítima defesa
preventiva.
São situações em que não existe uma
agressão iminente, mas essa agressão é
tido como certa, e portanto o
defendente tem de antecipar a defesa
para um estádio anterior ao da própria
agressão. Por isso é que ela se designa
legítima defesa preventiva.
Ainda em sede de legítima defesa e
para caracterizar esta agressão actual e
ilícita, tem-se que distinguir os casos
de mera provocação de pré-ordenação
(ou provocação pré-ordenada).
c) Mera provocação
A agressão que o defendente repele
com a defesa há-de ser uma agressão
que até pode ter sido provocada pelo
próprio defendente e aí, ainda existe
legítima defesa. O que não pode é a
agressão que o defendente repele ter
sido pré-ordenada pelo defendente
com o intuito de agredir simulando
uma defesa.
Um outro elemento da legítima defesa,
também de natureza objectiva, no
entendimento da Profa. Teresa Beleza a
impossibilidade de recurso à força
pública, ou a impossibilidade de
recurso em tempo útil aos meios
coercivos normais.
A Profa. Cristina Borges Pinho na
esteira de pensamento do Prof.
Cavaleiro de Ferreira considera que
esta ideia de impossibilidade de recuso
em tempo útil aos meios coercivos
normais não é tanto um pressuposto da
legítima defesa, mas é um problema
que se reconduz à racionalidade do
meio empregue, a adequação da defesa.
Vale mais não exigir como pressuposto
da legítima defesa a impossibilidade de
recorrer em tempo útil aos meios
coercivos normais; é depois, na análise
do meio que o defendente utiliza para
repelir a agressão actual e ilícita é que
se vai ver se há ou não uma defesa
necessária.
Se o defendente puder recorrer, em
tempo útil aos meios coercivos e não o
fizer, defendendo-se por suas próprias
mãos, então pode-se dizer que o meio
já não é adequado, mas é antes um
meio excessivo.
Um outro elemento objectivo da
legítima defesa é a racionalidade do
meio empregue, ou defesa necessária:
meio necessário para repelir a agressão
actual e ilícita que ameaça interesses
juridicamente protegidos do
defendente ou de terceiro.
Para que se actue ainda legitimamente,
para que se actue ao abrigo desta causa
de exclusão da ilicitude é preciso
verificar se o meio utilizado para
repelir uma agressão iminente e ilícita
de que esta a ser vítima, ou de que está
a ser vítima um terceiro, é um meio
racional, adequado para afastar essa
agressão. Se o meio utilizado pelo
defendente para afastar a agressão for
um meio desajustado, um meio que
ultrapassa os limites da racional, então
já não se está perante a situação de
legítima defesa, estar-se-á no âmbito
de um excesso de legítima defesa (art.
33º CP).
O que seja efectivamente o meio
necessário para repelir a agressão deve
aferir-se sempre no caso concreto.
Em teoria, pode-se dizer que o meio
necessário é aquele dos vários meios
que o agente tem à sua disposição, de
eficácia mais suave, ou seja, aquele que
importa consequências menos gravosas
para o agressor. Mas, meio de eficácia
suave, mas simplesmente meio eficaz,
ou de eficácia certa.
Quer-se dizer com isto que, em última
análise, a necessidade do meio
empregue para repelir a agressão é
aferida em concreto atendendo a
múltiplos factores. Desde logo,
atendendo:
- Às características da vítima (do
defendente) e do agressor;
- Aos meios que o ofendente tenha à
sua disposição;
- Ao meio com que o agressor ameaça
de lesão o interesse jurídico protegido
do defendente ou de terceiro;
- Etc.

104. Excesso de legítima defesa


As situações de excesso de legítima
defesa, pela não verificação da
racionalidade do meio empregue na
defesa, porque é um meio que
ultrapassa o necessário, faz com que já
não esteja perante uma causa de
exclusão da ilicitude. O facto é pois
ilícito.
E sendo facto ilícito, contra um excesso
de legítima defesa é admitida a legítima
defesa.
Perante uma situação de excesso de
legítima defesa, como o facto não está
justificado, como o facto é ilícito, pode-
se efectivamente actuar em legítima
defesa.
Se o defendente, podendo recorrer à
força pública para evitar a agressão não
o faz e resolve actuar, mas usando um
meio racional, tão só omitindo esta
obrigação que é a de recorrer aos meios
coercivo normais, então entende-se que
há aqui uma situação de excesso de
legítima defesa.
As situações de excesso de legítima
defesa não justificam o facto praticado,
este continua a ser um facto ilícito.
Nestas situações de excesso de legítima
defesa[39], o facto praticado pelo
defendente é um facto ilícito; pode ser
objecto de uma atenuação especial
facultativa da pena.
A defesa excessiva pode resultar
também do art. 33º/2 CP onde se fala
em não censuráveis, esta não
censurabilidade é uma causa de
desculpa.
O facto é ilícito, mas o agente não é
punido: ainda que o agente, para se
defender, tenha actuado ou respondido
em excesso, ele não vai ser punido. O
facto praticado pelo agente é ilícito,
sendo ilícito constitui uma agressão
ilícita em termos de poder ser
defendida legitimamente.
Pode-se então dizer que o meio
necessário para repelir a sua agressão
é, dos vários meios que o agente tem à
sua disposição, o mais suave[40], mas
um meio de eficácia certa.

105. Restrições ético-sociais à


legítima defesa
São aqueles casos em que as agressões
provêm de crianças, de pessoas com a
sua capacidade de avaliação
sensivelmente diminuída, pessoas
embriagada, etc. De um modo geral, de
pessoas inculpadas, de inimputáveis,
ou também daquelas pessoas que têm
quanto à vítima uma relação de
parentesco.
Nestes casos entende-se que o lado
social da legítima defesa desaparece,
ficando tão-só, dentro da sua
fundamentação, o lado individual, a
necessidade de auto-tutela ou auto-
protecção de interesses.
Estas restrições traduzem-se
precisamente em considerar mais
exigente o meio necessário para repelir
essas agressões que partem das pessoas
referidas.

106. Elemento subjectivo:


“animus defendendi”
Há autores que entendem que as
causas de justificação não têm
elementos subjectivos e referem
inclusivamente que não existe
nenhuma expressão literal, em sede
por hipótese de legítima defesa, que
inculque a ideia ou a necessidade de ter
presente este elemento subjectivo que é
o “animus defendendi”, ou seja, a
consciência que uma pessoa tem de que
está na iminência de ser agredida é a
vontade que tem de se defender.
A maior parte da doutrina considera
que isso não é verdade. O elemento
subjectivo do consentimento é
precisamente o conhecimento do
consentimento.
Se existe consentimento na realidade,
mas o agente desconhece esse
consentimento, o agente actua com
falta do elemento subjectivo, porque
não tem conhecimento do
consentimento. E a lei diz: se assim for,
se houver consentimento mas o agente
actuar desconhecendo esse
consentimento, ou seja, faltando o
elemento subjectivo desta causa de
justificação, o agente é punido por facto
tentado.
O “animus defendendi” é a consciência
que uma pessoa tem de que está
perante uma agressão e a vontade que a
tem de repelir, ou a vontade que tem de
se defender dessa mesma agressão.
Existe divergência doutrinária quanto à
falta do elemento subjectivo, quando
estão preenchidos os elementos
objectivos da legítima defesa.
Em primeiro lugar, existe unanimidade
doutrinária (para aqueles que os
elementos subjectivos integram as
causas de justificação) no sentido de
que se faltar o elemento subjectivo da
legítima defesa ou de qualquer outra
causa de justificação, concretamente se
faltar o “animus defendendi”, o facto
não está justificado – o facto é um facto
ilícito.
A doutrina não está de acordo quanto à
forma de punir o agente, nestes casos
em que objectivamente está preenchida
a causa de justificação, mas tão só falta
o elemento subjectivo.
É possível a analogia em direito penal?
Dentro deste entendimento, a analogia
em direito penal só está proibida nos
termos do art. 1º/3 CP quanto a
normas penais desfavoráveis, normas
penais positivas que fundamentam ou
agravam a responsabilidade jurídico-
penal do agente. Pelo agravamento ou
criação de pressupostos de
punibilidade e de punição.
Tratando-se de uma analogia favorável
ao agente, as razões que vedam o
recurso à analogia ínsitas no princípio
da legalidade perdem razão de ser.
Ora, esta analogia do art. 38º/4 CP é
favorável, porque é mais favorável ao
agente ser punido por facto tentado do
que por facto consumado:
- Em primeiro lugar, porque nem
sempre a tentativa é punível: a
tentativa só é punível quanto ao crime,
a ser consumado corresponda pena
superior a três anos de prisão (art.
23º/1 CP), a não ser que a lei
expressamente diga o contrário;
- Por outro lado, na tentativa a pena é
especialmente atenuada (art. 23º CP).
Portanto, é melhor ser-se punido por
facto tentado do que por facto
consumado.

107. Limite à legítima defesa


resultado do art. 337º CC
Enquanto no Código Civil a legítima
defesa exige que o prejuízo causado
pela acção de defesa não seja
manifestamente superior àquele que se
pretende evitar, portanto joga-se aqui
com uma ideia de ponderação de
prejuízos entre os bens danificados
com a defesa e os bens que se
pretendem defender. O art. 32º CP não
joga com essa ideia.
Por outro lado e ainda em confronto
com o art. 337º CC vê-se, que a
legítima defesa na lei civil apresenta
um carácter subsidiário, ou seja, só é
possível recorrer aos próprios meios
quando não seja possível fazê-lo
através dos meios coercivos normais.
Essa situação não é um pressuposto da
legítima defesa do art. 32º CP:
- Esta matéria em sede de direito penal
é regulada não pelo Código Civil mas
pelo Código Penal;
- Depois, porque o Código Penal é em
relação ao Código Civil lei posterior;
- Finalmente, porque esta
interpretação que se propõe, confere
uma maior cumplicidade ao
funcionamento da legítima defesa e,
consequentemente, um alargamento da
não responsabilização criminal do
agente; de outra forma seria alargar o
campo de punibilidade.

b) Direito de necessidade

108. Fundamentos
Esta causa de justificação vem prevista
no art. 34º CP funcionando
relevantemente, afastar a ilicitude do
facto punível.
Quanto ao seu fundamento, assenta já
numa ideia de ponderação de
interesses entre o bem jurídico ou
interesse ameaçado por um perigo e o
bem jurídico ou interesse que se
sacrifica para afastar esse perigo.
Note-se que o interesse ou bem jurídico
cujo perigo se afasta tem de ser
superior ao interesse sacrificado.
O estado de necessidade ora reveste a
natureza de um verdadeiro direito de
necessidade, e então é uma causa de
exclusão da ilicitude, ora tem a
natureza de causa de exclusão de culpa.
O Código Civil clarificou de algum
modo a questão, admitindo no seu art.
339º CC um verdadeiro direito de
necessidade, por consagrar ser lícita a
acção daquele que destruir ou danificar
coisa alheia com o fim de remover o
perigo actual de um dano
manifestamente superior, quer do
agente quer de terceiro.
Mas por esta via continuaram sem
solução os casos de identidade de
valoração de bens jurídicos e aqueles
em o sacrificado tem maior valoração
que não cabiam nem cabem
manifestamente no direito de
necessidade.
Por isso, a partir da vigência do Código
Civil cimentou-se a teoria diferenciada
do estado de necessidade, segundo a
qual esse estado abrange casos de
exclusão da ilicitude (havendo então
um verdadeiro direito de necessidade)
e de exclusão de culpa.
Nessa linha de orientação se integrou
também o Código Penal ao estabelecer
no art. 34º casos de direito de
necessidade e no art. 35º de estado de
necessidade desculpante.
O direito de necessidade torna a
conduta lícita, dai a imposição feita no
art. 34º-b CP quanto à superioridade
do bem ou interesse jurídico a
salvaguardar. Daí também que o art.
34º CP tenha que se conjugado com o
art. 35º CP, particularmente com o seu
n.º 1, e que uma vida nunca possa ser
sacrificado no exercício de um direito
de necessidade, já que, sendo o bem
jurídico de maior valoração, nunca
qualquer outro lhe pode ser superior.
Segundo a jurisprudência:
- O estado de necessidade surge
quando o agente é colocado perante a
alternativa de ter de escolher entre
cometer o crime ou deixar que, como
consequência necessária de o não
cometer, ocorra outro mal maior ou
pelo menos igual ao do crime. Depende
ainda da verificação de outros
requisitos, como a falta de outro meio
menos prejudicial do que o facto
praticado e probabilidade de eficácia
do meio empregado.

109. Direito de necessidade


Esta causa de justificação vem prevista
no art. 34º CP funcionando
relevantemente afasta a ilicitude do
facto punível.
Quanto ao seu fundamento, assenta já
numa ideia de ponderação de
interesses entre o bem jurídico ou
interesse ameaçado por um perigo e o
bem jurídico ou interesse que se
sacrifica para afastar esse perigo.
O interesse ou o bem jurídico cujo
perigo se afasta tem que ser superior ao
interesse sacrificado. Isso diz-se
expressamente um dos elementos do
direito de necessidade, nomeadamente
pela verificação do preceituado do art.
34º-b CP.
A causa de justificação ou de exclusão
da ilicitude, designada direito de
necessidade ou estado de necessidade
objectivo, também dito estado de
necessidade justificante (art. 34º CP),
precisamente para distinguir do art.
35º CP que prevê o chamado estado de
necessidade, também dito estado de
necessidade subjectivo ou desculpante:
- Enquanto que o direito de
necessidade, ou estado de necessidade
objectivo ou justificador é uma causa
de exclusão da ilicitude;
- O estado de necessidade “tout court”
ou estado de necessidade subjectivo ou
desculpante é uma causa de desculpa.
Consequências desta distinção:
Em primeiro lugar, enquanto no art.
34º CP é excluída a ilicitude do facto
típico, no art. 35º CP não se exclui a
ilicitude do facto típico mas tão só a
culpa. É portanto uma causa de
desculpa, o facto permanece típico e
ilícito.
Se assim é, é possível haver uma
situação de legítima defesa perante
uma situação de estado de necessidade
do art. 35º CP. Já não é possível haver
uma situação de legítima defesa face ao
art. 34º CP porque este exclui a
ilicitude e para efeitos da legítima
defesa a agressão tem que ser actual e
ilícita. Se o facto está justificado pelo
direito de necessidade, contra facto
justificado não há justificação.
Por outro lado, há uma importância
também relevante porque, partindo da
teoria da acessoriedade limitada, não
há comparticipação num facto
justificado. Ou seja, não se
responsabilizam os comparticipantes
se o facto imputado estiver justificado.
Assim, se o facto praticado pelo autor,
o facto principal, for um facto
justificado pelo direito de necessidade
do art. 34º CP os comparticipantes,
virtualmente cúmplices ou
instigadores, não terão também
responsabilidade jurídico-penal, uma
vez que o facto praticado é um facto
lícito.
Já o contrário se passa no âmbito do
estado de necessidade subjectivo ou
desculpante do art. 35º CP porque não
há comparticipação num facto lícito,
mas já há comparticipação na culpa.
A culpa é um juízo de censura
individualizado e pode existir uma
causa de desculpa que beneficie um
determinado agente e não aproveitar
aos demais. Então só beneficia da causa
de desculpa quem dela pode aproveitar,
já podendo responsabilizar-se
criminalmente os comparticipantes a
quem essa causa de desculpa não
aproveita. É por isso que a teoria se diz
de acessoriedade limitada: porque
delimita a responsabilidade criminal
dos comparticipantes a um facto típico
e ilícito praticado pelo autor. Se o facto
for típico, mas não for ilícito, já falta
um dos requisitos da acessoriedade
limitada, portanto, já não há
responsabilidade do participante.
As situações do art. 35º CP que têm
relevância em sede de culpa (são causas
de desculpa) são aquelas em que o
agente age numa situação em que não
tem uma normal liberdade de
avaliação, de determinação e não lhe
era exigível que ele adoptasse um
comportamento diferente: ou porque
está numa situação de flagrante
desespero, de medo ou de coacção.
Pode-se então concluir que a
superioridade que se exige nos termos
do art. 34º CP entre o bem jurídico
sacrificado e o bem jurídico ameaçado
pelo perigo não se mede em termos de
quantidade: a quantidade não implica
superioridade qualitativa.

110. Elementos do direito de


necessidade
Em primeiro lugar, viu-se que por força
do preceituado no art. 34º CP a
situação de perigo não pode ter sido
voluntariamente criada pelo agente,
excepto se se tratar de proteger um
interesse de terceiro.
O perigo tem que ser um perigo real e
efectivo. Se o perigo for uma mera
aparência de perigo, estar-se-á então
no âmbito do chamado direito de
necessidade putativo, aqui não há um
perigo real e efectivo, há tão só um
perigo pensado ou suposto, o perigo é
tão só na cabeça do agente, é uma
situação de direito de necessidade
putativo, em que o perigo é só penado
na cabeça do agente e que se chama
erro sobre os pressupostos de facto de
uma causa de justificação, cuja
previsão normativa e regulamentação
está no art. 16º/2 CP.
Por outro lado, o perigo que se visa
afastar tem que ser um perigo actual,
ou seja, tem que ser um perigo que
exista naquele momento ou que está
iminente, perigo esse que pode advir de
factos naturais ou facto humanos[41].
É preciso ainda que cumulativamente
se verifique outro elemento desta causa
de justificação previsto no art. 34º-b
CP: que exista uma sensível
superioridade entre o interesse a
salvaguardar relativamente ao
interesse sacrificado.
Isto passa pela análise de se verificar
qual é o interesse mais valioso, daí que
a doutrina por vezes aponte alguns
índices para a determinação da sensível
superioridade que tem de existir entre
o interesse salvaguardado e o interesse
sacrificado:
- A medida das sanções penais
cominadas para a violação dos bens
jurídicos em causa, por referência à
axiologia constitucional;
- Deve atender-se também aos
princípios ético-sociais vigentes na
comunidade em determinado
momento;
- À modalidade do facto;
- À reversibilidade ou irreversibilidade
das lesões;
- Às medidas de culpa;
- À medida do sacrifício imposto ao
próprio lesado.
Note-se quando se trate de bens
eminentemente pessoais o seu número
é irrelevante para aferir a
superioridade entre um e outro. Em
caso de igualdade de bens jurídicos,
não há lugar à aplicação do art. 34º CP.
O último requisito previsto no art. 34º-
c CP: a razoabilidade da imposição ao
lesado do sacrifício do seu interesse,
tendo em atenção o valor e natureza do
interessa ameaçado.
Esta é uma limitação ético-social que
visa proteger da violação a dignidade e
autonomia ética da pessoa de terceiro,
pois o direito tem de se conter e de se
manter de certos limites, recuando
mesmo, se necessário, em face desses
valores.
Elemento subjectivo:
O agente tem de conhecer a situação de
perigo, actuado precisamente para
evitar esse perigo, que é uma
probabilidade de lesão.
Se o agente desconhece a situação de
perigo, mas objectivamente está
perante uma situação de direito de
necessidade “mutatis mutandis” aplica-
se o regime geral da falta do elemento
subjectivo da causa de justificação,
responsabiliza-se o agente por facto
tentado, se a tal houver lugar.

111. Estado de necessidade


desculpante
Consagra-se no art. 35º/1 CP o estado
de necessidade como obstáculo à
existência de culpa.
O agente fica excepcionalmente
dispensado da pena (art. 35º/2, 2ª
parte CP). É que a isenção da pena e
dispensa da pena são institutos
diferentes (ver art. 74º CP),
enquadrando-se o art. 35º/2 CP o
instituto da dispensa de pena, porque
ainda há culpa, embora em grau muito
reduzido, e não no da isenção de pena,
que afasta logo abinitio a punibilidade
do facto.
Os casos de identidade de valoração de
bens jurídicos e aqueles em que o bem
sacrificado tem maior valoração que o
ameaçado não cabem no âmbito do
direito de necessidade e têm portanto
que ser resolvidos por via dos
normativos deste art. 35º CP.
A lei escalona a valoração de alguns dos
interesses, pelo que se deve observar a
ordem por que os enumera o art. 35º/1
CP. Trata-se de interesses
eminentemente pessoais.
Para os casos em que a lei não refere
expressamente, deverá entender-se que
em princípio os interesses
eminentemente pessoais predominam
sobre os patrimoniais e que a própria
lei, pela indicação dada através das
sanções, estabelece o escalonamento
entre os interesses da mesma natureza.
A este respeito e dentro desta
orientação, expendeu o Prof.
Figueiredo dias “…são conhecidas as
dificuldades que uma avaliação em
concreto da hierarquia dos interesses
conflituantes pode suscitar. Nesta
matéria deve bastar-me com acentuar
que pontos de apoio para a levar a cabo
são oferecidos quer pela medida das
sanções penais cominadas para a
violação dos respectivos bens jurídicos,
quer pelos princípios ético-sociais
vigentes na comunidade em certo
momento, quer pelas modalidades dos
factos, a medida da culpa ou por pontos
de vista político criminais. Como ainda
e também, noutro plano, pela extensão
do sacrifício imposto e pela extensão e
premência do perigo existente. Mas
para além disso no novo Código existe
ainda, para a justificação, que seja
razoável impor ao lesado o sacrifício do
seu interesse em atenção à natureza e
ao valor do interesses ameaçado. Esta
limitação ético-social do direito de
necessidade – independentemente de
saber se ela poderá ver-se já contida, ao
menos em certa medida, na exigência
de sensível desproporção dos interesses
conflituantes – é, minha opinião, de
sufragar incondicionalmente. O direito
de necessidade, justificado, embora
como disse por razões de recíproco
solidarismo entre os membros da
comunidade jurídica, tem em todo o
caso de recuar perante a possibilidade
de violação da dignidade e da
autonomia ética da pessoa de terceiro.
E isso mesmo quer dar a entender a
alínea c) do art. 34º CP…”
Por maioria de razão, deve entender-se
que há lugar a indemnização, se se
verificarem os seus pressupostos no
caso de estado de necessidade
desculpante, pois que também o há no
caso de direito de necessidade.
c) Outras causas de exclusão da
ilicitude

112. Acção directa


Na acção directa visa-se não tanto
repelir uma agressão, como na legítima
defesa, mas evitar a inutilização prática
de um direito.
Aqui se exige como pressuposto a
impossibilidade de recurso em tempo
útil aos meios coercivos normais e diz-
se que o agente, para evitar a
inutilização prática de um direito, pode
adoptar um dos comportamentos aqui
descritos: ou apropria-se de uma coisa,
ou destrui-la, ou deteriorá-la ou opor
uma certa resistência.
Neste sentido, esta causa de
justificação distingue-se também da
legítima defesa porque assenta já numa
ideia de ponderação de interesses, na
medida em que o interesse inerente ao
direito cuja inutilização o agente visa
evitar tem de ser superior ao interesse
lesado com a actuação do exercício da
acção directa.
Distingue-se também da legítima
defesa na medida em que esta causa de
justificação não exige já o requisito da
actualidade, exigindo como
qualificativo da agressão na legítima
defesa.

113. Direito de retenção


O seu regime não está traçado no
Código Penal, mas no Código de
Processo Penal.
De um modo geral quando uma pessoa
for apanhada em flagrante delito de um
crime que corresponde a pena de
prisão, os agentes da autoridade devem
deter esse indivíduo; os outros
indivíduos, que não os agentes da
autoridade podem proceder à detenção.
Em princípio, enquanto que para as
autoridade públicas se trata do
cumprimento de uma obrigação
imposta por lei, para o comum dos
cidadãos existe a faculdade de poder
exercer o direito de detenção.
E isto, porque de um modo geral as
pessoas não se podem andar a prender
umas às outras, porque podem incorrer
em responsabilidade criminal pelo tipo
de sequestro; ou eventualmente para
deter outra pessoas podem ter de lhe
lesar a integridade corporal e pratica as
ofensas corporais; ou podem ter de
coagir o indivíduo a um determinado
comportamento, tudo isto são factos
típicos penalmente relevantes.

114. Direito de correcção


Direito de correcção que os pais têm
sobre os filhos e que os professores têm
sobre os alunos.
É esta uma causa de justificação
entendida como de origem costumeira.
O costume não é fonte de direito em
direito penal, mas quando funciona
como contra-norma, ou seja, afastando
a responsabilidade penal do agente,
portanto no âmbito de uma norma
favorável, já não lhe vê serem-lhe
aplicadas as limitações decorrentes do
princípio da legalidade.
Portanto, o legislador aceita aqui o
costume como causa de justificação ou
de exclusão da ilicitude.
Qual é o fundamento desta causa de
justificação?
Só são detentores e só podem invocar
esta causa de justificação determinadas
pessoas que tenham uma posição
específica em relação a outra: pais em
relação a filhos, professores em relação
a alunos.
Este direito de correcção deve ser
aplicado utilizando precisamente o
meio adequado a exercer essa missão
pedagógica do direito de correcção.
Quanto ao elemento subjectivo desta
causa de justificação, tem-se o “animus
corrigendi”ou a intenção de corrigir.
Portanto, o agente tem que se
aperceber da situação fáctica que
carece de correcção e actuar com o
objectivo de pedagogicamente corrigir
aquela situação.
Quando o agente, para corrigir, excede
o limite imposto, quando se afasta do
meio necessário dentro da função
pedagógica de reeducar, então já não
há o preenchimento desta causa de
exclusão da ilicitude.

115. Consentimento
O consentimento do ofendido está
previsto, como causa de exclusão da
ilicitude no art. 38º CP. Importa
distinguir:
- Por vezes, o consentimento é uma
causa de exclusão da ilicitude;
- Noutros casos, o consentimento já
não faz parte da ilicitude, não íntegra
uma causa de justificação, mas é um
elemento do tipo ou da tipicidade,
podendo ser um elemento positivo ou
um elemento negativo do tipo.
Existem determinados tipos legais que
só estão preenchidos por exemplo sem
o consentimento do agente, neste caso
o consentimento não é uma causa de
exclusão da ilicitude, mas um elemento
negativo do tipo, tem que se verificar a
ausência do consentimento para que a
tipicidade esteja preenchida.
Noutras vezes o consentimento é
também um elemento do tipo, mas um
elemento positivo, nestes casos, para
que o tipo esteja preenchido é
necessário que a vítima de alguma
forma dê um certo consentimento à
conduta desenvolvida pelo agente.
Quando o consentimento é um
elemento do tipo e ele não está
presente, o tipo está logo afastado; já
não se vai ver se o comportamento do
agente é ilícito ou não.
Quando o consentimento não for um
elemento do tipo, mas uma causa de
justificação, então é que se tem de
verificar se o comportamento típico do
agente está ou não justificado pelo art.
38º CP.
Desde logo são de referir as
características da pessoa que dá o
consentimento, não é qualquer pessoa
que pode validamente prestar o
consentimento: a lei indica desde logo
no art. 38º/3 CP: só maiores de
quatorze anos podem, validamente
consentir.
Por outro lado, tem de ser um
consentimento actual (art. 38º/2 CP).
E só se admite o consentimento para
justificar lesões a bens jurídicos que
sejam livremente disponíveis pelo seu
titular.
A integridade corporal é um bem
jurídico que pode ser de alguma forma
disponível. Portanto, há que adequar
um pouco a motivação que leva ao
consentimento da lesão e também a
relevância em termos de
reversibilidade ou irreversibilidade da
lesão.
Quanto ao elemento subjectivo desta
causa de justificação, é ele o
conhecimento do consentimento. No
art. 38º/4 CP prevê-se a punibilidade
para o agente que actua perante uma
situação objectiva de justificação, mas
com a falta do elemento subjectivo da
causa de justificação, ou seja, no art.
38º/4 CP prevê-se a punibilidade por
facto tentado para quem lesar um bem
jurídico livremente disponível pelo seu
titular, desconhecendo que o seu titular
consentia a lesão.
Consentimento presumido: vem
previsto no art. 39º CP; neste há uma
situação em que se permite a lesão de
determinados bens jurídicos, tendo em
conta que se o titular desses bens
tivesses conhecimento das
circunstâncias em que a lesão ocorre,
teria consentido essa mesma lesão.

116. Conflito de deveres


É uma causa de exclusão da ilicitude
prevista no art. 36º CP. Trata-se
daquelas situações em que se torna
lícito ao agente não cumprir um dever
se cumprir outro dever de categoria
igual ou superior.
Se colidirem dois deveres a que o
agente está obrigado, de igual valor, o
agente tem a liberdade de optar por um
deles, não cumprindo o outro, sendo
certo que só tem a possibilidade de
cumprir um deles.
Se colidirem dois deveres, um de
natureza inferior e outro de natureza
superior, então está justificado o agente
que não cumpre o dever de natureza
inferior satisfazendo um dever de
natureza superior.
Colidindo imesuravelmente dois
deveres, sendo certo que o agente só
pode cumprir um deles, está justificado
o não cumprimento do outro dever ou
da outra ordem, se tiver valor igual ou
inferior ao dever (ou ordem) que o
agente cumpre.
Esta causa de justificação, justifica-se,
quando o cumprimento de um dever
superior em deterimento de um dever
jurídico ou de uma ordem de valor
inferior, está aqui inerente uma ideia
de ponderação de interesses.
Para o Prof. Figueiredo Dias, no âmbito
do art. 36º CP só há conflito de deveres
quando colidem dois deveres de acção;
já não é assim quando colidem um
dever de acção e um dever de omissão.
Há quem entenda (e parece bem) que
podem coexistir um dever de acção e
um dever de omissão, desde o
momento em que se trate de bens
eminentemente pessoais, ou de
natureza pessoal, aí o dever de acção
cede sempre perante o dever de
omissão.
117. Causas de justificação supra-
legais
A justificação supra-legal não encontra
o seu regime plasmado na lei, mas sai
causas de justificação que se constroem
a partir dos princípios gerais do
ordenamento jurídico e, mais
concretamente, a partir dos princípios
que norteiam o regime jurídico da
exclusão da ilicitude.
Assim, costuma a doutrina apontar
duas causas de justificação supra-
legais:
1) A legítima defesa preventiva:
Esta é aceite naqueles casos em que o
defendente actua antes da própria
agressão, mas com o intuito de a evitar,
sendo aceite que o defendente não
pode esperar pelo momento da
agressão sob pena da sua defesa ser
absolutamente ineficaz.
2) O direito de necessidade (ou
estado de necessidade) defensivo:
É uma causa de justificação supra-legal
que nasceu para de alguma forma dar
cabimento à exclusão da ilicitude do
crime de aborto, quando a interrupção
voluntária da gravidez era efectuada
sob indicação médica na medida em
que o nascimento do feto poderia
redundar na morte da mãe.
Para remover ou afastar o perigo de
morte da mãe – mulher grávida –
admitia-se esta causa de justificação
supra-legal.
Hoje em dia e face à nossa lei tem-se
um regime especial de justificação para
o crime de aborto, e que se denomina
precisamente “causas especiais de
justificação do crime de aborto”. São
causas de exclusão da ilicitude
especiais, em sentido próprio. E isto
porquê?
As causas de justificação estão
plasmadas na parte geral e valem, em
princípio, para toda a parte especial, ou
seja:
- O consentimento enquanto causa de
justificação pode servir para excluir a
ilicitude de uma ofensa corporal, ou a
ilicitude de outro tipo qualquer;
- A legítima defesa pode efectivamente
justificar um homicídio, uma ofensa
corporal, ou um outro tipo legal de
crime, mesmo um furto.
Agora existem causas tipificadas na
parte especial que o legislador cria para
esses tipos concretos. Donde, as causas
de justificação que estão contidas na
parte especial do Código Penal e que
valem só para aquele tipo legal de
crime que a lei indica são designadas
causas de justificação especiais.
Mas ainda se pode encontrar na parte
especial do Código Penal causas de
justificação especiais, umas que o são
em sentido próprio e outras que o são
em sentido impróprio.
Está-se perante causas de justificação
especiais em sentido impróprio quando
elas, estando embora previstas na parte
especial do Código Penal para
determinado tipo de crimes (e daí a sua
especialidade) apresentam já uma
semelhança muito grande com o que
esta preceituado na parte geral do
Código Penal a propósito do regime das
causas de justificação. Outras causas de
justificação há que, estando previstas
na parte especial, têm um regime
jurídico que não pode ser reconduzido,
não tem atinência ou semelhança com
o que está preceituado na parte geral.
Essas são as designadas causas de
justificação especiais em sentido
próprio, de que é exemplo a justificação
do crime de aborto.

118. Erro sobre os pressupostos


de facto ou elementos normativos
de uma causa de justificação
Tem-se “mutatis mutandis”
precisamente o inverso do que
acontece naquelas situações em que
existe objectivamente uma situação de
justificação mas falta o elemento
subjectivo.
Aqui é precisamente o contrário: o
agente tem o elemento subjectivo, falta
é o elemento objectivo da justificação,
por isso é que é uma causas de
justificação putativa.
São situações que são reconduzíveis ao
art. 16º/2 CP que exclui o dolo; e nos
termos do art. 16º/3 CP ressalva-se a
punibilidade a título de negligência.
São aquelas situações em que o agente
representa erradamente que está
perante uma situação objectiva de
justificação e actua com o elemento
subjectivo correspondente a essa
mesma causa de justificação que ele
julga que está efectivamente presente,
quando na realidade falta o elemento
objectivo: falta um pressuposto de facto
um elemento normativo dessa causas
de justificação.
Para estas situações de erro sobre os
pressupostos de facto ou de direito de
causas de justificação, a solução esta
consagrada no art. 16º/2 CP ou seja, o
erro sobre um estado de coisas que a
existir excluiria a ilicitude do facto,
exclui o dolo.
Viu-se em sede do art. 16º/1 CP que
fala em “erro sobre os elementos do
facto típico” –, o dolo que estaria
excluído seria o dolo do tipo.
Agora aqui pergunta-se: como é que o
dolo do tipo pode estar excluído se o
agente actuou, ainda que na convicção
errada de que estava actuar em
legítima defesa, não deixou, em termos
de tipicidade, de conhecer e querer
aquele resultado?
Como é que em termos de tipo ele
actua como dolo e depois a
consequência do art. 16º/2 CP é excluir
o dolo?
Daí, várias formulações para explicar
esta solução deste tipo de erro:
1) Teoria rigorosa da culpa
Os partidários desta teoria vêm dizer
que no caso de erro sobre os
pressupostos de facto de uma causa de
justificação, o dolo de tipo não está
excluído. Então, aquilo de que o agente
pode beneficiar nestas situações de
erro é de uma atenuação da culpa, ou
mesmo de uma exclusão da culpa.
E eles distinguem consoante o erro seja
essencial ou não essencial, consoante
seja um erro evitável ou não evitável.
2) Teoria limitada da culpa
Para os partidários desta teoria, a
consequência do erro sobre os
pressupostos de facto ou elementos de
direito das causas de justificação deve
ser a mesma das situações de erro de
tipo: aplica-se na mesma a exclusão do
dolo como se de um erro de tipo se
tratasse. E isto por analogia, ou seja,
eles chegam à conclusão de que nesta
circunstância o dolo de tipo deveria
estar excluído, não porque
dogmaticamente seja essa a solução,
porque por um processo analógico, ou
por uma entidade de razão, se deve
estas situações como se de um
verdadeiro erro de tipo se tratasse,
portanto, por analogia aplicam o
mesmo regime do erro sobre elementos
do facto típico – o erro do art. 16º/1
CP.
Esta posição é de alguma forma
criticável, mesmo quando o agente está
em erro sobre um elemento que a
existir excluiria a ilicitude do seu facto,
ele do ponto de vista da tipicidade não
deixa de actuar dolosamente, portanto,
não faz muito sentido excluir o dolo de
tipo. Mas repare-se: nas situações de
exclusão do dolo de tipo (erro sobre
elementos de facto, de direito ou sobre
proibições) do art. 16º/1 CP o dolo está
excluído porque:
- Ou há uma ignorância total da
realidade;
- Ou há uma errada representação da
realidade.
Porque há um erro ignorância ou um
erro suposição.
3) Teoria dos elementos negativos
do tipo
Elementos negativos do tipo são causas
de justificação. O tipo é composto, para
estes autores, não só pela tipicidade
positiva (elementos positivos do tipo),
mas também por elementos negativos,
que são as causas de justificação, tudo
isto faz parte do tipo de ilícito, porque
eles não separam tipicidade, ilicitude e
culpa como categorias diferenciadas.
Assim, as causas de justificação, que
são elementos a ponderar em sede de
ilicitude, categoria autonomizada da
tipicidade, para eles são elementos
negativos do tipo.
Ora, se as causas de justificação são
elementos negativos do tipo, não
deixam de ser elementos do tipo, logo,
se há um erro sobre um elemento de
uma causa de justificação, não deixa de
haver um erro sobre um elemento do
tipo. Se é um erro sobre um elemento
do tipo então o dolo de tipo está
excluído.
4) Teoria do Duplo
enquadramento do dolo em sede
de tipo e em sede de culpa (culpa
dolosa)
O dolo tem um duplo enquadramento
não só em sede de tipo, como elemento
subjectivo geral, mas também em sede
de culpa como elemento subjectivo do
tipo, enquanto referenciador do facto
proibido pela ordem jurídica ou
enquanto referenciador do facto
exigido pela ordem jurídica, é o
chamado dolo de tipo, elemento
subjectivo geral.
Mas em sede de culpa o dolo também
tem alguma função a desempenhar: o
dolo, ou a culpa dolosa, manifesta já o
grau mais censurável da deficiente
posição que o agente adopta para com a
ordem jurídica quando se decide pela
prática de um facto ilícito, podendo e
devendo decidir-se de forma diferente,
podendo e devendo decidir-se pelo
lícito. Neste sentido ter-se-á a culpa
dolosa e o referenciador do dolo de
culpa.
Assim, para quem faz esta bipartição
entre o dolo de tipo e a culpa dolosa
(ou dolo de culpa) é fácil dizer que
nestas situações de erro sobre os
pressupostos de facto de uma causa de
justificação o dolo de tipo não está
excluído; então, quando muito, aquilo
que se exclui é a culpa dolosa.
Nos termos do art. 16º/2 CP a
estatuição é o “preceituado do número
anterior”, que é a exclusão do dolo; e
que o dolo abrange também o erro
sobre pressupostos de facto ou de
direito de causas de justificação ou
sobre elementos da culpa.

119. Erro sobre a existência e erro


sobre os limites de uma causa de
justificação (art. 17º CP)
Ambas as modalidades – erro sobre a
existência e erro sobre os limites de
uma causa de justificação – são
espécies do chamado erro sobre a
ilicitude indirecto ou erro sobre a
proibição indirecto.
No âmbito do erro sobre a existência de
uma causas de justificação, como o
próprio nome indica, tem-se desde logo
aquela situação em que o agente actua,
tem consciência que aquilo que está a
fazer é um facto ilícito, é desaprovado
pela ordem jurídica.
Mas pensa que aquele facto, no fim de
contas irá ser aprovado pela ordem
jurídica porque ele está a actuar ao
abrigo de uma causa de justificação que
julga existir, quando na realidade a
ordem jurídica não conhece essa causa
de justificação, nem é possível inferi-la
a partir dos princípios jurídicos gerais
que norteiam o regime jurídico da
exclusão da ilicitude ou da justificação.
Erro sobre a proibição indirecto,
porque o agente em princípio tem
consciência da ilicitude do facto, mas
pensa que depois esse facto vai estar
justificado quando na realidade não
vai. Por isso é um erro indirecto sobre a
proibição.
As situações de erro directo sobre a
proibição são aquelas em que o agente:
- Actua conhecendo que aquilo que está
a fazer é proibido;
- Ou não actua, desconhecendo que
agir era uma obrigação.
Nas situações de erro sobre a existência
de uma causa de justificação, o erro
sobre a proibição já é indirecto, porque
o agente tem consciência do carácter
ilícito do facto que pratica; ou tem
consciência do carácter ilícito da
omissão que desenvolve.
Simplesmente, julga que depois esses
factos vão ser aprovados pela ordem
jurídica, pela existência de uma causa
de justificação ou de exclusão da
ilicitude que a ordem jurídica afinal
não conhece.
Um outro tipo de erro sobre a proibição
indirecto e que tem a ver com causas de
justificação ou de exclusão da ilicitude
é o erro sobre os limites de uma causa
de justificação.
Aqui o agente age desconhecendo o
carácter proibido da conduta que
empreende, mas está convencido que
está a actuar ao abrigo de uma causa de
justificação, que na realidade existe e é
reconhecida na lei; mas o agente erra
quanto aos limites dessa causa de
justificação.
Tem-se, portanto as situações de erro
sobre a proibição indirecto ou erro
sobre a ilicitude indirecto, seja erro
sobre a existência ou sobre os limites
de uma causas de justificação, que não
erros intelectuais, mas erros morais ou
de valoração, e como tal o regime de
relevância é dado pelo art. 17º CP.
Então distingue-se consoante esses
erros sejam erros censuráveis ou erros
não censuráveis, consoante esses erros
sejam erros evitáveis ou erros
inevitáveis, e assim:
- Se o erro for um erro evitável, logo
um erro não censurável, nos termos do
art. 17º/1 CP a culpa está excluída;
- Se pelo contrário for um erro
censurável, porque evitável, nos termos
do art. 17º/2 CP o agente é punido com
a pena correspondente ao crime doloso
que pode ser especialmente atenuada.

[38] Um facto que é aprovado pela


ordem jurídica, porque nele intervêm
relevantemente causas de exclusão da
ilicitude.
[39] E o excesso é dado porque o
agente excedeu o meio necessário à
defesa.
[40] Aquele que menores
consequências tem para o agressor.
[41] Factos humanos, sejam eles lícitos
ou ilícitos, culposos ou inculposos.

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