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A educação das crianças de 0 a 6 anos: regularidades do

desenvolvimento
Suely Amaral Mello

Por que atualmente falamos em educar e cuidar das crianças na creche?


Por que as creches passaram recentemente da Secretaria do Bem–Estar Social (ou
da Promoção Social) para a Secretaria da Educação? Porque temos hoje uma lei que
estabelece que os/as profissionais que trabalham no cuidado e educação das crianças
pequenininhas devem ser formadas, preferencialmente em curso superior?
Isso aconteceu porque observando e estudando as crianças pequenininhas,
descobrimos que elas aprendem desde que nascem e só quando aprendem é que elas
formam e desenvolvem a inteligência e a personalidade. Isto é bastante diferente do que se
pensava até pouco tempo atrás quando se acreditava que as crianças desenvolviam
naturalmente sua inteligência e sua personalidade à medida que iam crescendo. Quando
pensávamos assim, assumíamos a ideia de que a educação era secundária e o adulto que
ficava com a criança na creche não precisava se preocupar com a formação e o
desenvolvimento de sua inteligência e sua personalidade, pois estas já nasciam com a
criança e, com o tempo, iriam se desenvolver. Mesmo que isto não fosse dito, era com base
nesse pensamento que agíamos. Por isso, nosso trabalho na creche era essencialmente
cuidar, proteger e esperar a criança crescer e se desenvolver... por isso éramos pajens,
monitoras, babás, auxiliares de desenvolvimento infantil.
Com os estudos realizados ou conhecidos nas últimas décadas, temos aprendido que
tudo o que somos é resultado das experiências de vida e de educação que tivemos desde que
nascemos e que, entre o nascimento e os seis anos de idade, a criança forma as bases de sua
inteligência e de sua personalidade com as experiências que vive, com as situações de que
participa, com aquilo que faz, com tudo o que aprende fazendo, vendo, ouvindo e
percebendo da vida que acontece à sua volta.
 É importante lembrar que a forma como as crianças pequenas aprendem é
diferente da forma como os adultos aprendem: quando dizemos que as crianças
aprendem desde pequenininhas, queremos dizer que as crianças pequenininhas
estabelecem relações com os objetos, pessoas, situações que acontecem à sua volta,
interagem com eles e vão percebendo suas características, para que servem... e, com
isso, aprendem.

Essa nova compreensão muda tudo o que vínhamos fazendo com as nossas crianças
nas creches. Descobrimos que o trabalho do adulto que convive com a criança não se reduz
a cuidar, proteger e esperar. Cuidar sim, pois as crianças pequenininhas precisam de
cuidados (alimentação, higiene, conforto). Mas, além de cuidado, precisam muito de
estímulo, de experimentação, de companhia nas brincadeiras e em atividades livremente
escolhidas por elas num espaço rico e provocador de seu desejo de explorar e descobrir. Por
isso, deixamos de ser pajens, babás e monitoras para ser educadoras/educadores (nesse
processo, descobrimos também a importância de educadores homens nesse universo que
aos poucos se tornou exclusivo de mulheres).
Estamos descobrindo/construindo essa nova identidade de professora/professor de
crianças pequenininhas e pequenas sabendo que:

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1. Uma vez que a criança aprende desde que nasce, ela não é incapaz e bobinha
(como acreditávamos até pouco tempo atrás). Ao contrário, ela é capaz (e
desde muito pequenininha) de estabelecer relações com as pessoas que se
aproximam dela para cuidá-la, capaz de estabelecer relações com as coisas
que aproximamos dela para ver, ouvir, pegar, cheirar, levar à boca. Sendo
assim, precisamos rever a concepção de criança pequena que tínhamos, e
para isso, além de conhecer os estudos e pesquisas realizados sobre as
crianças pequenas e pequenininhas, precisamos observar as nossas crianças e
perceber nelas suas possibilidades. Se começamos a observar com o olhar
curioso de quem quer descobrir todos os dias pequenas mudanças nas
atitudes e capacidades da criança, perceberemos como ela muda ao longo de
um tempo. Com isso, vamos começar a perceber as possibilidades e não as
impossibilidades das crianças pequenininhas.

2. Uma vez que a inteligência e a personalidade são formadas pela experiência


que a criança vive, então nós educadoras/educadores de creche temos uma
responsabilidade essencial: a de formar cada criança para ser inteligente e
solidária (para ser um dirigente, dizia o filósofo italiano Antonio Gramsci).
Por isso, precisamos refletir sobre o que queremos para as nossas crianças
pequenininhas e o que podemos fazer para isso.

3. Com o nosso trabalho na creche estamos formando a inteligência e a


personalidade das crianças. Por isso, somos profissionais importantes na
sociedade (talvez os mais importantes!!!) e precisamos pensar bem sobre o
que propomos como vivências e situações para as crianças na creche, como
nos relacionamos com elas, como organizamos o espaço em que elas passam
o dia, como organizamos o dia delas na creche para que elas experimentem
objetos, conheçam as pessoas, vivam experiências que permitam que elas
aprendam sobre as coisas, a natureza, as pessoas, os hábitos e os costumes,
aprendam a falar, aprendam a pensar... e à medida que explorem objetos e
vivam situações com as pessoas, possam se desenvolver.

4. Estamos construindo nossa identidade de professora/professor sabendo ainda


que a criança pequena e pequenininha aprende de um jeito diferente dos
adultos... tateando, explorando e experimentando com os objetos que
disponibilizamos na altura dela nas salas, nos corredores, no pátio, no
parque, no refeitório, no solário e até mesmo no banheiro; aprende imitando
as ações dos adultos enquanto explora os objetos e quando brinca de faz-de-
conta. O lúdico é característica marcante do modo como as crianças
aprendem, pois elas podem explorar e descobrir sobre os objetos sem se
preocupar com sua sobrevivência... aprendem enquanto brincam e quanto
mais diversificados forem os materiais que encontrarem na altura de suas
mãos e olhos, mais exploração e tateio e ginástica para o cérebro.

5. Construímos nossa identidade como professora/professor considerando que a


criança é sempre ativa no processo em que aprende, ou seja, a criança
aprende sempre por meio de uma atividade que ela realiza junto com a

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educadora/educador, junto com outras crianças ou sozinha... em qualquer
situação, a criança é ativa. Nós, adultos, somos importantes na organização
do espaço, na proposição de atividades significativas, na coordenação das
atividades que propomos, mas, a criança precisa realizar, ela própria, as
atividades. Por exemplo, para aprender a usar a colher, é preciso que a
criança utilize a colher para comer, da forma como nós adultos a utilizamos.
A educadora/educador ensina a segurar a colher, corrige quando a criança a
segura de forma inadequada... Por isso, o processo de ensinar e de aprender é
sempre colaborativo, ou seja, resulta da nossa ação conjunta com a criança.

Quando entendemos esse novo papel da educação, quando vemos a criança


como capaz, quando percebemos o papel da atividade da própria criança no
processo de aprender, quando percebemos nosso papel de educadores muito mais
como o de um intelectual (que estuda, reflete e analisa sua prática, que
intencionalmente organiza o espaço, a rotina, as relações e as atividades, que planeja
como vai enriquecer as vivências das crianças na creche, que observa e aprende
sobre as crianças, que registra sua prática e produz conhecimentos) estamos
construindo nossa nova identidade:

1. de forma reflexiva (ou seja, aprendendo com a nossa própria


experiência de todos os dias e a melhor forma de fazer isso é
registrá-la e documentá-la, e nesse processo refletir sobre ela.);
2. de forma cooperativa e colaborativa (ou seja, refletindo e
aprendendo em conjunto com as educadoras e educadores em
nossa unidade e com as outras unidades)
3. sem perder de vista os estudos e pesquisas feitas em outros
lugares por outros educadores, pesquisadores e estudiosos.

Conhecer as regularidades do desenvolvimento das crianças ajuda em nosso


trabalho. Em cada idade, as crianças aprendem por meio de atividades que são mais
significativas para elas.
No primeiro ano de vida, a atividade principal da criança (isto é, aquela através da
qual ela entra em contato com o mundo que a rodeia, aprende e se desenvolve) é a
comunicação com os adultos que cuidam dela.
Essa comunicação ainda não é verbal, mas emocional, pois a criança, nessa idade,
não é capaz de se comunicar através de palavras, mas já é capaz de se comunicar através do
olhar e do movimento corporal, percebendo emoções no toque, na fala e no olhar do adulto.
Por isso, chamamos essa comunicação entre a criança e o adulto de comunicação
emocional. A atenção e a fala carinhosa do adulto é o maior incentivo ao seu
desenvolvimento nessa idade. A iniciativa dos adultos de falar com a criança pequenininha
antes que ela seja capaz de responder e de aproximar objetos para ela ver e pegar, cria na
criança novas necessidades: a necessidade de comunicação e de percepção (de ver, ouvir e
de pegar objetos). A hora do banho, da troca e da alimentação é momento importante para
essa troca individual. No entanto, a educadora só terá tempo para essa criança se as outras
estiverem fazendo alguma coisa que atraia sua atenção e as mantenha entretidas. Por isso, o
espaço (bonito, atrativo, rico de objetos diversificados e em quantidade, organizado e

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acessível às crianças) é o segundo educador da turma, pois, organizado dessa forma, divide
a atenção das crianças com a educadora.
A primeira função do cérebro que se forma na criança pequenininha é a percepção.

E como mostram as pesquisas, o melhor momento para a intervenção do


educador, é quando uma função está se formando (nem antes dela se formar e nem
depois que estiver formada, mas enquanto ela está se formando)

A criança vai acumulando experiências por meio do que vê, ouve e pega. Por isso,
música agradável e objetos coloridos, sonoros e em movimento para ver, pegar, cheirar e
levar à boca devem ser apresentados aos pequenininhos, pois estimulam sua percepção.
A atividade de explorar os diferentes objetos que apresentamos a ela é o melhor
incentivo ao seu desenvolvimento até próximo dos três anos de idade.

Ao pegar, lamber, morder, amassar, abrir, fechar, empilhar, rolar,


atirar... enfim experimentar com os mais variados objetos, a criança observa, se
concentra, escolhe, experimenta, troca um objeto por outro, interage com as outras
crianças que estão à sua volta, tenta resolver as dúvidas que a manipulação dos
objetos gera e, com isso, envia importantes estímulos ao seu cérebro. Nesse brincar,
ela descobre coisas leves, pesadas, grandes, pequenas, lisas, coisas que param em
pé, coisas que rolam, coisas de diferentes cores e tamanhos, coisas que flutuam e
afundam, coisas que fazem barulhos diferenciados, coisas moles, duras, macias e
ásperas, coisas que se encaixam uma na outra, coisas que podem ser empilhadas,
coisas que podem ser abertas e fechadas. Com isso, vai conhecendo o mundo dos
objetos e vai ampliando sua percepção, sua comunicação, seu desenvolvimento
motor, vai acumulando experiências e criando uma memória.

Nesse processo, vai aprendendo a focar a atenção. Enquanto explora os objetos


disponíveis, vai conhecendo e, do seu jeito, vai interpretando e entendendo o que vai
conhecendo. Em outras palavras, vai formando e desenvolvendo o pensamento por meio
das ações. Isso quer dizer que enquanto explora os objetos e experimenta com eles, ela
pensa. Por exemplo, enquanto brinca com uma garrafa pet e umas tampas, ela pensa: “Isso
cabe aqui? Não! E isso? Também não! E isso aqui? Cabe!!”. Esse é só um exemplo, pois
nessa idade, a criança pensa sem as palavras... seu pensamento não é verbal ainda; o
pensamento será verbal quando ela aprender a falar. Mas enquanto explora os objetos, ela já
pensa: pensa enquanto age.
Nessa atividade com objetos, a criança desenvolve as percepções e vai
categorizando as características que percebe nos objetos. Vai distinguindo o que é grande
do que é pequeno, o que é frio do que é quente, o que é leve do que é pesado, o que é seco
do que é molhado, o que é macio do que é áspero. Com isso, vai formando as bases para a
fala que vai se manifestar próximo aos dois anos, mas cuja base se forma desde que a
criança nasce com os objetos que vê, tateia, com o que ouve e leva à boca e nas situações
em que os outros falam com ela.
A fala vai abrir caminho para o pensamento verbal que vai promover um salto em
todo o desenvolvimento da criança.

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Junto com esse processo de formação dessas capacidades, está o movimento que
vai do sustentar a cabeça, rolar, firmar-se de bruços com apoio dos braços, ao engatinhar,
levantar-se com apoio dos objetos até o andar. Estudos têm demonstrado que quanto mais
autonomia de movimento a criança tiver, mais saudável será seu desenvolvimento físico.
Por isso, não se deve forçar a criança a assumir nenhuma postura (sentar-se, andar) antes
que ela própria seja capaz de chegar a essa postura e sair dela sozinha.
Junto com todo esse processo, a criança vai formando uma imagem de quem ela é.
Dependendo de como ela é tratada, de como se sente nas situações que vive, daquilo que
permitimos e não permitimos que ela faça, ela vai formando uma autoimagem. Em outras
palavras, ao longo da experiência vivida já no 1º ano de vida, ela começa a formar sua
inteligência e sua personalidade. Esse processo continua ao longo do segundo e do terceiro
ano de vida e vai em frente.
As pesquisas têm mostrado que as crianças aprendem por sua própria atividade ao
imitar os adultos e outras crianças, procurando fazer sozinhas aquilo que veem os outros
fazendo. Como lembra Vygotsky (um psicólogo russo que estudou o desenvolvimento
humano), o desenvolvimento da linguagem, do pensamento, da memória, da atenção, da
autodisciplina na criança é impulsionado de fora para dentro. Quando a criança convive
pessoas que falam com ela, que convivem, que se respeitam, essas atitudes vão se tornando
internas ao seu comportamento.
Vale repetir que é a vida que a criança vai vivendo (aquilo que faz, as relações que
os adultos ou os parceiros mais experientes estabelecem com ela, o acesso que tem ao
conhecimento, aos objetos) que possibilita que ela aprenda a pensar, a se expressar, a
memorizar, a prestar atenção, a ser sensível, a imaginar...Daí, podemos perceber a
importância da interferência do adulto, bem como de atividades conjuntas de crianças de
idades diferentes, onde quem sabe ensina quem não sabe.
Nós, educadores, devemos, portanto, intervir para provocar avanços que de forma
espontânea não ocorreriam.

 Como a creche deve ser para garantir que as crianças vivam


experiências ricas e diversificadas que estimulem sua aprendizagem e
desenvolvimento? Que tipo de experiências devemos propor para nossas crianças?
Como devemos agir?

Creio que fazemos bem o nosso trabalho de educador/a ou professor/a de criança


pequenininha quando:
1. garantimos que só as crianças que ainda não engatinham dormem em
berços. As crianças que já engatinham dormem em colchões no chão de
onde podem sair por livre iniciativa;
2. mesmo as crianças que ainda não engatinham, só ficam nos berços para
dormir. Quando estão acordadas, são colocadas no chão, sobre um
cobertor forrado com um lençol e com muitos objetos ao redor e
pendendo do teto. De costas, o bebê poderá pegar seus próprios pés, rolar,
se contorcer, se alongar, observar e pegar objetos pendentes. De bruços,
começará a firmar a cabeça e seus braços e tentará se deslocar para
alcançar objetos que colocamos ao seu redor;

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3. quando organizarmos a sala com muitos objetos, organizados, atrativos e
acessíveis o tempo todo às crianças de modo que elas tenham sempre
algum brinquedo ou objetos para explorar;
4. quando apresentarmos regularmente objetos novos e atraentes para as
crianças.
5. quando o ambiente tem objetos firmes e apoio lateral nas paredes ( barras
de PVC) nas quais as crianças possam se apoiar, ficar em pé e caminhar
com apoio;
6. quando organizarmos uma rotina que possibilite às crianças explorar
todos os ambientes da escola: dentro (os diferentes ambientes) e fora
(areia, grama, cimentado, água, jardim, sombra de árvore, sol) respeitando
seus ritmos.
7. quando permitimos que as crianças sejam autônomas na hora de comer e
de escolher com que brincar;
8. quando conversamos com elas em grupo e também individualmente na
hora do banho, da alimentação e da troca;
9. enfim, quando criamos na creche um ambiente acolhedor e estimulante.

Os primeiros três anos de vida constituem o período de mais rápido


desenvolvimento físico e psíquico das crianças e para que este desenvolvimento se dê de
forma adequada, vale lembrar, é necessário organizar corretamente a educação desde os
primeiros meses de vida. Nós, adultos, temos papel essencial nesse processo, pois para se
desenvolver, a criança precisa experimentar, ver, ouvir, se movimentar, pegar. Em outras
palavras, para se desenvolver, o cérebro precisa de ginástica. Se a criança não for
estimulada a observar coisas diferentes, a brincar com objetos diferentes, a ouvir sons
diferentes, a pegar objetos que têm formas, cores, tamanhos, texturas diferentes, se
ninguém falar com a criança, ela não desenvolverá seu raciocínio, sua linguagem, suas
capacidades de ouvir, prestar atenção, lembrar e até de gostar das coisas.

O primeiro ano de vida da criança

Para além, dos cuidados e do respeito aos ritmos da criança (essenciais ao seu
crescimento saudável), podemos sintetizar assim as principais tarefas da educação da
criança no 1o. ano de vida:
a. garantir que ela tenha sempre coisas para ver, ouvir, pegar e que possa
explorar objetos variados (pegar, jogar, morder, rolar: a cesta de tesouros;
b. garantir que ela possa se movimentar (virar-se no chão ou no berço,
sentar, engatinhar e mais tarde andar com apoio);
c. garantir momentos de atenção individual quando a educadora fala com a
criança;
d. ao fazer a passagem da mamadeira para a alimentação sólida, permitir que
a criança mantenha um papel ativo nesse processo. Vale lembrar que enquanto mama, a
criança é ativa em sua alimentação... ela define a ritmo, a quantidade... Quando passa a ser
alimentada pela educadora, é a educadora que é ativa. Então, nossa atenção ás necessidades
da criança é fundamental. Deixar que a criança pegue a comida e logo tenha uma colher
para imitar a educadora e se alimentar sozinha, é fundamental para sua saúde e bem estar.

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No primeiro ano de vida, o trabalho educativo com a criança se realiza de duas
formas principais:
- através da atividade independente da criança com brinquedos e objetos
- e sob a forma de atividade individualizada com a criança quando alimentamos,
trocamos, damos banho.

O cesto de tesouros é importante não apenas para a criança, mas também ajuda o
nosso trabalho, pois, enquanto a criança se entretém com os objetos da cesta, podemos
cuidar dos que exigem atenção e cuidado. Quando as crianças aprendem a entreter-se nos
pequenos grupos, realizando elas próprias suas experiências e tateios com os objetos, elas
estão formando as bases para a sua autonomia: isso implicará disciplina no trabalho escolar
quando ela tiver mais idade, iniciativa em relação aos seus interesses, organização e
possibilidade de aprendizagem mesmo quando a educadora não está perto.
Quando organizamos o espaço da creche devemos considerar essa necessidade de
tateio das crianças e devemos oportunizar essa experimentação rica e diversificada em
relação ao material disponível. É na hora do tateio que as crianças vão percebendo as
características e propriedades dos objetos, e, dessa forma, vão conhecendo e interpretando o
mundo, formando seu pensamento e autoestima...
O desenvolvimento intelectual das crianças acontece em todos os momentos: na
atividade de tateio, na conversa que mantemos com elas, no banho (que é uma experiência
rica de sensações para a criança), na hora da alimentação. Vale lembrar que a atividade
psíquica que se desenvolve neste período da vida da criança é simples em comparação com
as crianças mais velhas, mas é importante para toda a vida futura. Só isto já justifica todos
os esforços que tivermos que fazer para criar um ambiente acolhedor par as crianças.
A atividade motora vai se refinando: depois dos objetos de tamanhos, formas e
texturas variadas, a criança começa a pinçar objetos pequenos (pedacinhos de pão para
pegar com os dedos, pedaços de fruta, bolacha) e a desenvolver ações mais complexas com
objetos (tirar de caixa, recolocar em caixa, juntar e separar partes..), segurar a caneca, a
mamadeira, a colher.
No final do 1o ano, podemos oferecer apoio para a criança ficar em pé sozinha e
caminhar com apoio: a área externa reservada ao horário de sol dos pequenininhos pode
conter grandes tubos fixos no chão e que servem para a criança engatinhar por dentro e
apoiar-se neles para ficar em pé ou andar em volta. Outros materiais também podem ser
úteis para a criança caminhar com apoio: troncos de madeira no pátio, barras de tubo de pvc
fixadas junto às paredes.
O material das atividades deve expandir-se à medida que as crianças crescem:
revistas, livros infantis de pano ou de papel grosso para ver e manusear, caixas, vasilhas
para guardar coisas dentro, objetos para empilhar, jogos de encaixe simples e todo os tipos
de material reciclável, arrumado e organizado por tipo, por tamanho ou por cor...

Retomando: a palavra de ordem em relação ao material que deve estar disponível


para o tateio livre e constante da criança é DIVERSIDADE: quanto mais variado for o
material a que a criança tiver acesso, mais ela percebe o mundo na sua diversidade, mais ela
é levada a comparar, a estabelecer relações, enfim, mais ginástica faz o seu cérebro e assim
desenvolve sua inteligência.

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Elementos que enriquecem a experiência da criança no 1o. ano de vida são: espelho,
panos, chapéus, bolsas, além dos já mencionados (objetos para ver, pegar, cheirar, balançar,
fazer barulho) que podem ser pendurados no teto e chegar até a altura da mão das crianças
ou mesmo até o chão, musica para ouvir e dançar, caixas de papelão (para entrar dentro,
guardar coisas, empurrar, puxar), almofadas de formas, cores e tamanhos diferentes...

E O MAIS IMPORTANTE.... a educadora/educador precisa CONVERSAR COM


A CRIANÇA. O tom de voz é fundamental, por isso, nunca falamos alto, em tom
agressivo ou gritamos com as crianças.
Desde pequenininha, já podemos exercitar a fala e a participação da criança naquilo
que acontece na creche... conversamos sobre as atividades de rotina, sobre os interesses das
crianças, sobre o que estamos fazendo. Mesmo quando a criança é ainda pequenininha já
começamos a nos exercitar na relação respeitosa e principalmente envolvente que podemos
estabelecer com as crianças. Frente a um problema, em lugar de decidir as coisas,
começamos por perguntar: “O que aconteceu? Como podemos resolver este problema?”
Esta atitude da educadora/educador ensina respeito, autonomia, disciplina e forma uma
auto-imagem positiva, além de ensinar a criança a pensar e a resolver problemas.
Quando tentamos nos colocar no lugar das crianças que pela primeira vez sai de
casa para um ambiente desconhecido, percebemos a importância de assegurarmos um clima
de serenidade e de bem-estar às crianças na creche. Além disso, serenidade e bem estar são
elementos essenciais à formação adequada de sua inteligência e personalidade. A
afetividade é um elemento importante para a criança se sentir segura e a melhor forma de
expressar essa afetividade é a conversa e a escuta - e tanto a escuta (a observação, o
interesse pelo que a criança faz ou conta, a atenção na hora em que surge um problema ou
uma dificuldade) como a conversa acontecem o tempo todo, pois com as crianças, os
tempos não se dividem como os adultos costumam fazer.
Além de conversar, as palavras de estímulo dos adultos são também fundamentais,
pois as crianças estão aprendendo a falar, a andar, a controlar os movimentos, a conviver
em grupo...
Precisamos nos empenhar em falar todos os dias, ainda que seja só um pouco, com
cada criança. Se não conversarmos, nossa relação se torna uma série de mandos e ordens.

Ao final do 1o. ano, a criança já será bem diferente do que era nos primeiros dias de
vida: já não é tão dependente do adulto, pois é capaz de se deslocar pela sala e buscar o que
precisa, já se comunica com o adulto, já tem vontades, já percebe coisas de que gosta e não
gosta. É preciso que a educadora/educador perceba essa sua nova fase de vida e deixe de
tratá-la como um bebê: a criança se sente mais independente e quer cuidar de suas coisas.
Se o adulto continuar a tratá-la como um bebê, ela certamente viverá uma crise de
relacionamento com o adulto querendo ser tratada diferentemente. Por isso, deixá-la fazer
coisas por si é importante para sua autoestima e para seu desenvolvimento.
O desenvolvimento da autoconfiança e da autoestima (que hoje são reconhecidos
como essenciais para superar o fracasso escolar e a indisciplina) começa nos primeiros
meses de vida. Quando o adulto permite que a criança tateie, experimente e faça coisas por
si mesma, demonstra confiança na criança e isso faz nascer nela a autoconfiança. Portanto,
atenção! A ideia de que se a gente faz sozinha, vai mais rápido, não vale para o
desenvolvimento infantil!

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A criança entre um e três anos

Nesta etapa que chamamos 1a infância, a criança vai querer fazer coisas de forma
cada vez mais independente e isso é bom! Ela será mais independente que no 1º ano, pois
estará se deslocando com facilidade pelo espaço, será capaz de se fazer entendida em
relação ao que quer e entenderá muito do que a educadora fala, ou seja, começa a entender
as palavras e não apenas o tom e a emoção.
Dar pequenas tarefas que ela já possa fazer é significativo para ela (buscar o sapato,
ajudar a guardar os brinquedos... mais tarde pode pendurar sua sacola no gancho próprio,
encontrar sua escova de dentes, colocar a pasta na escova, comer sozinha, depois e servir
sozinha de água...). A iniciativa da criança em querer fazer atividades que os adultos fazem
é uma boa oportunidade de ensinar o que é de brincar e o que não (e porque não).
No segundo ano de vida, a grande aquisição é o andar... a criança quer exercitar seu
deslocamento o tempo todo e devemos estar atentas para não impedir sua movimentação.
No terceiro ano de vida, a principal aquisição é a linguagem e, novamente, as
crianças querem explorar sua nova capacidade: viram perguntadeiras e conversadeiras.
Nosso papel é manter a conversação que elas iniciam e estimular sua fala.
As tarefas da educação nesta etapa são:

a. aprofundar a experiência com movimentos (andar, subir e descer escadas,


correr, pular, mover o corpo com mais desenvoltura) por meio de passeios, pular de
pequena altura, subir e descer de pneus e caixas, engatinhar por baixo e por meio de
coisas...
b. ensinar a independência em relação a atos simples (reconhecer suas coisas
na creche, guardar seus pertences na sacola, guardar o chinelo/sapato na caixa dos sapatos
quando estiver na areia, encontrar seus sapatos no final da atividade, lavar as mãos... mais
tarde, cuidar da sua própria higiene: vestir e desvestir-se, escovar os dentes, pentear-se...)
c. ensinar (quem ainda não sabe) a usar sozinho objetos de uso diário
(caneca, xícara, talheres)
d. ensinar a usar os brinquedos e guardar
e. estimular a linguagem oral (falando com as crianças e ouvindo-as)
f. aperfeiçoar a percepção visual, auditiva e táctil, a atenção por meio de
histórias, passeios, manuseio de livros de história e revistas, exploração de material
diversificado
g. aproveitar as situações para exercitar a fala, a memória e o pensamento
das crianças
h. ensinar a conviver com os amigos, dividindo, compartilhando, esperando
a vez
i. ensinar o respeito à natureza: plantando e cuidando de plantas (cada
criança pode ter um canteiro num pneu), cuidando de pequenos animais, mantendo a
limpeza do ambiente, jogando lixo no lixo.

O fortalecimento do movimento e da linguagem é condição para todas as outras


funções. A vida em espaço aberto, fora das salas permite tomar o sol necessário nessa idade
e a atividade de movimento. Uma atividade a ser introduzida nesta etapa são os jogos de

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movimento (agachar-se, rolar, passar por baixo de mesa, cadeiras, por dentro de tubos,
caixas).
A conversa com as crianças é o estímulo mais importante para a linguagem oral:
contar e ler histórias com livros, fantoches, objetos, cantar, relato das experiências vividas
na escola e em casa estimulam a aquisição da fala.
Além das atividades que as crianças realizam por sua própria iniciativa num espaço
rico e diversificado, a educadora/educador pode programar pelo menos uma atividade por
dia para propor para o grupo todo.
À medida que as crianças dominam o andar, é possível começar a fazer passeios ao
redor da creche (ou no quarteirão) coletando folhas, sementes, pedrinhas ou observando os
veículos que passam... Quanto menores as crianças, mais paradas serão necessárias (sentar,
observar o que acontece, coletar coisas, comentar sobre o que vêem). Para isso, as
educadoras/educadores precisam ter um levantamento das possibilidades da comunidade e
arredores em distância caminhável com as crianças (sem subestimá-las!) e um
procedimento para aglutinar a turma... pais, mães e responsáveis e outros profissionais da
creche são bem-vindos para ajudar o grupo.
Modelagem (com areia molhada, com argila, massa de papel e massa de farinha que
se pode preparar com as crianças), preparação de tinta para pintar a dedo e com pincel,
fazer bolinha de sabão, contar e ler histórias são atividades que a educadora propõe para
o grupo, mas não precisa juntar o grupo todo para realizar a atividade. Muitas crianças
inicialmente poderão querer continuar a atividade em que estão envolvidas... se a atividade
proposta pela educadora/educador for atraente, todos acabarão por aderir, senão no mesmo
dia, em breve!

O fato é que se o espaço for rico e diversificado, quem está em outra


atividade, está explorando, descobrindo, se exercitando e aprendendo também.

Que outras atividades coletivas você já propôs para crianças entre 1 e 3 anos e
considera que as crianças se envolveram e aproveitaram?

Mais perto dos 3 anos, a criança começa a gostar de objetos que favorecem a
imitação dos adultos (objetos de cozinha -pratos, talheres, xícaras, panela, tampas-, caixas
de todos os tamanhos -para se entrar dentro, guardar coisas, abrir e fechar, fazer garagens-,
carrinhos, bonecas, bonecos de superheróis), além de aprofundar os jogos de movimento,
jogos de encaixe, quebra cabeças, bloquinhos de madeira para construção (de torres,
cidades, estradas).
As atividades devem ser desenvolvidas em lugar que favoreça a ação das crianças:
mesinha, chão, fora da sala... Atividades diárias envolvendo água (em bacias ou torneira) e
areia são muito bem-vindas pelas crianças e saudáveis: baldinhos, vasilhas recicladas,
barcos... objetos que flutuam e afundam enriquecem tais atividades. As crianças gostam de
coisas para empurrar ou puxar por um barbante (carrinhos, caixas, etc.)
Os lápis de cor, giz de cera, tinta para pintar a dedo sobre papel e com pincel
também permitem atividades agradáveis e as primeiras experiências de expressão.
Ao observar as crianças pequenas em suas atividades, descobrimos rapidamente o
que elas gostam de fazer e como exploram os diferentes materiais... Com isso, poderemos
aperfeiçoar nossas propostas de atividades e material, lembrando sempre que cabe ao
educador diversificar a atividade da criança: ou seja, devemos conhecer suas preferências e

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gostos e permitir que se criem outros prazeres que nós podemos ensinar com as atividades
que propomos.

E a coordenação motora fina, perguntarão alguns? Está em tudo: quando a criança


se alimenta sozinha, escova os dentes, desenha, pinta, brinca, recorta, se veste sozinha
...tudo isso desenvolve sua coordenação motora. Por isso, o trabalho da
educadora/educador deve ser sempre com e não para e nem pela criança.
Em todas as situações que experimenta, a criança aprende: observa, levanta
hipóteses sobre o que vê, tira conclusões, interpreta o mundo que passa a conhecer. Quanto
mais situações diferenciadas puder experimentar, mais se desenvolverá sua inteligência. A
expressão, que expressa a interpretação que a criança faz do que vê e conhece, é importante
nesse processo: é hora de ouvir a criança, valorizar seus desenhos, suas histórias e teorias.
O desenho pode ir se tornando uma importante forma de expressão da criança onde
ela expõe o que aprende do mundo e fixa as imagens do mundo que passa a reconhecer.
Nessa idade, já pode desenhar como forma de registrar o que a criança vê, gosta, vive (as
situações vividas na escola, os passeios, as coisas observadas), o que lembra das histórias
que ouve. Por isso, de nada adiantam os desenhos mimeografados.
Próximo aos três anos, as crianças passam dos jogos individuais às formas mais
simples da atividade coletiva. Para esses jogos coletivos e esse brincar de faz-de-conta,
muito ajudará se ela estiver aprendendo a ajudar os colegas, ajudar na limpeza da sala, da
mesa, ajudar a guardar o material da sala, ouvir os amigos e esperar sua vez para falar.

Uma creche de qualidade: os direitos das crianças

O documento do MEC de 1995 e reeditado em 2009 acerca dos critérios para


atendimento em creche aponta os direitos da crianças pequenas que devemos considerar
como forma de avaliar nosso trabalho e de orientar as mudanças na relação com as
crianças:
. o direito à brincadeira;
. à atenção individual;
. o direito a um ambiente aconchegante, seguro e estimulante;
. o direito ao contato com a natureza;
. o direito à higiene e saúde;
. o direito a uma alimentação sadia;
. o direito a desenvolver sua curiosidade, imaginação e capacidade de expressão;
. o direito ao movimento em espaços amplos;
. o direito à proteção, ao afeto e à amizade; o direito a expressar seus sentimentos;
. o direito a uma especial atenção durante seu período de adaptação à creche;
. o direito a desenvolver sua identidade cultural e racial.

Uma palavra sobre a crise dos 3 anos

Podendo andar, correr, falar e entender os colegas e os adultos ao seu redor, a


criança próximo a completar três anos de idade pensa que é grande e quer ser tratada como
tal. A partir dessa idade, a criança começa a perceber-se como alguém que tem existência
independente do restante das pessoas e do mundo ao seu redor, que tem suas próprias

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inclinações e desejos coincidentes ou não com os desejos dos adultos. Cresce seu desejo e
possibilidade de independência, e aparece a palavra “eu” em seu vocabulário. É momento
de ruptura com seu comportamento anterior. Isso implica que sua relação com os adultos se
modifique: compara-se com os adultos e quer ser igual a eles, quer fazer as mesmas ações
que os adultos realizam (“eu faço”, “eu sozinha”).
Se nós adultos não percebemos essas novas possibilidades da criança e continuamos
a tratá-la como um bebê, teremos o que se conhece na Psicologia como a crise dos três
anos. Ela faz birra, bate, chora... Esta não é uma crise natural, mas criada pela circunstância
da criança querer fazer as coisas por si mesma e nós adultos continuarmos achando que ela
"não pode fazer nada por que ela ainda é muito pequena” , “é criança e criança é incapaz de
fazer ou de aprender a fazer".
Quando compreendemos a tempo as crescentes possibilidades da criança e as
satisfazemos propondo novas atividades e novas relações, ou se supera a crise ou ela nem
chega a acontecer. Nessa idade, pois, a criança já deve estar se alimentando sozinha, se
vestindo e se despindo sozinha, ajudando em pequenas tarefas, ajudando a guardar os
brinquedos, os materiais de sala..., ou seja, deve ter autonomia na vida diária.
Por ser um período de transição, a criança pensa e quer se comportar às vezes como
adulto e às vezes como criança; às vezes faz manha e às vezes quer fazer tudo sozinha.
De todo modo, o fato de que a criança comece a distinguir-se dos outros, a
comparar-se com os outros constitui um grande avanço em seu desenvolvimento. Por que
se compara aos adultos e com as outras crianças e porque se percebe como alguém
separado dos outros, nesse período surgem os sentimentos de orgulho e de vergonha.
Precisamos estar atentos a isso, pois a insatisfação emocional contribui para o
desenvolvimento de qualidades negativas da criança em relação a si mesma e aos outros.
Ao mesmo tempo, nossas palavras de afirmação, nossos elogios vão orientá-la em relação à
conduta adequada na relação com os colegas, com os materiais da escola, na relação com a
natureza e com os adultos.
Próximo aos três anos, o interesse da criança recai sobre a utilização dos objetos tal
como os adultos os utilizam. Percebemos com isso que a relação da criança com os objetos
muda ao longo do tempo que passa na creche: começa ao longo do primeiro ano com uma
atitude que lembra a pergunta: o que é isso? Mais tarde, por volta dos dois anos, a pergunta
evolui para: o que eu posso fazer com isso? E próximo aos 3 anos, ela se torna: como se
usa isso?
Nesse momento de seu desenvolvimento, a criança passa a imitar os adultos em suas
relações com as outras pessoas e com os objetos e começa a ensaiar a brincadeira de faz-de-
conta que será a atividade principal da criança até os 6 anos. O faz-de-conta vai impulsionar
a linguagem, o pensamento, a atenção, a memória, os sentimentos morais, os traços de
caráter; vai ensinar a conviver em grupo, a controlar a própria conduta. Nesse período da
vida, forma-se a imaginação e todas as capacidades formadas até aqui (fala, memória,
pensamento, imaginação) criam as bases para o autocontrole da conduta ou da vontade
(para a autodisciplina).
Por tudo isso, nossa relação com a criança precisa considerar que ela precisa se
sentir causa de alguma coisa. Como lembra Leontiev (outro psicólogo russo), o lugar que a
criança ocupa nas relações sociais das quais participa tem força de motivação no seu
desenvolvimento. Assim, se a criança é tratada como alguém importante na creche, essa
relação impulsiona seu desenvolvimento para a frente. Se, ao contrário, a criança for tratada
como alguém sem importância, essa relação retarda seu desenvolvimento.

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Nossa função como adultos/as é ser leitor/a das necessidades das crianças e
organizador/a do contexto para garantir que este responda às necessidades de conhecimento
das crianças e crie novas necessidades/vontades de conhecer e saber. Para fazer essa leitura
das situações de modo a reconhecer as crianças e suas famílias nas suas particularidades, na
sua diversidade cultural é preciso que estejamos dispostos. Cabe a nós, também, a
proposição de um projeto de educação e desenvolvimento das crianças e o
acompanhamento deste projeto. Para fazer isso, precisamos refletir sobre quem é a criança,
sobre como se dá seu processo de desenvolvimento, ter clareza sobre as forças que
impulsionam esse desenvolvimento, e, a partir daí, refletir sobre nosso papel no processo de
oportunizar o máximo crescimento e desenvolvimento da criança. Não é nosso papel vigiar,
controlar, fazer pela criança, mas propor atividades atraentes, desafiar a criança a agir, ser
companheiro das brincadeiras, estabelecer uma relação de carinho e cumplicidade com a
criança. Não é o funcionário que se curva ao peso do trabalho que é capaz de tal relação.

Entre 3 e 6 anos

A criança começa a gostar dos jogos com regras simples (do tipo vivo-morto, duro-
mole, e outros jogos cada vez mais complexos quanto às regras). Ao perceber a existência
de regras, a criança começa a criar regras. É importante prestar atenção a isto e não tratar
como se fosse mania da criança, mas como uma conquista.
A fala – que é o sistema de signos mais importante para a constituição da pessoa -
continua a deslanchar e deve continuamente ser estimulada: ouvir histórias para ampliar o
vocabulário, vivenciar experiências diferentes e sempre falar sobre elas, conhecer objetos
novos e conversar sobre eles, relatar as experiências vividas fora da escola (hora da roda),
adivinhar o conteúdo de um pacote na roda (cada criança tateando, cheirando, balançando,
ouvindo, imaginando ...e falando das características percebidas), conversar sempre sobre as
experiências vividas na escola, solucionar problemas em grupo, planejar as brincadeiras,
planejar o dia com a/o professor/a, avaliar o dia vivido na escola, enfim... ao longo do dia
as crianças encontram múltiplas situações em que a comunicação se faz necessária quando
ela vive a condição de sujeito no processo educativo
À medida que a criança vai ampliando sua experiência, ela começa a perceber as
propriedades dos objetos, começa a perceber relações simples entre eles e começa a
experimentar essas relações em suas explorações. O início de sua atividade intelectual está
relacionado às ações de percepção. Esse tipo de pensamento se chama pensamento visual
por ações, pois tem suporte nas ações externas que a criança realiza. No entanto, essas
ações externas são o ponto de partida para ações internas, intelectuais, que se realizam
mentalmente. Inicialmente esse pensamento se apoia em imagens, em modelos já vividos.
No entanto, à medida que a fala se estabiliza – o que significa que a criança percebe
a significação generalizada dos objetos e situações na palavra -, o pensamento se torna
verbal (quer dizer, começa a se realizar por meio da fala). O pensamento deslancha com a
ampliação da fala e a criança se coloca cada vez mais tarefas de conhecimento e de
explicação dos fenômenos que observa no mundo que a cerca. Conversar sobre o que elas
pensam, como explicam as coisas que acontecem, como entendem as histórias ouvidas,
argumentar sobre suas explicações colocando novos problemas que desafiam sua
explicação são formas de estimular o exercício do pensamento. Por isso, não resolvemos os
problemas, não explicamos, nem planejarmos por elas, mas as convidamos para pensarem

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juntas em voz alta quando planejamos o que fazer, como fazer, como resolver um
problema.
A imaginação da criança se relaciona com a formação da função simbólica da
consciência. Por um lado, a criança começa a ser capaz de usar uns objetos para substituir
outros, substituir objetos por sua representação, chegando ao uso de signos (palavras,
símbolos matemáticos). Por outro lado, começa a ser capaz de completar e substituir
situações, acontecimentos e coisas por representações, começa a ser capaz de construir
novas imagens a partir das representações acumuladas. No início, a imaginação se forma
dentro da brincadeira: ligada à percepção dos objetos e à execução de atividades lúdicas
com eles.
Na idade pré-escolar ( 3 a 6 anos) começa a se constituir a autorregulação da
conduta, das ações externa e das ações internas. O autocontrole da vontade ou da
conduta começa quando a criança é capaz de dirigir sua percepção, sua memória, seu
pensamento; quando é capaz de se colocar um objetivo e se lembrar da orientação dada
pelo adulto. Esse controle exige uma atitude firme da criança em relação a motivos
diferentes que se encontram em luta: terminar o que eu comecei a fazer ou ir brincar com as
outras crianças? As ações planejadas coexistem com ações impulsivas.... até que dê conta
de subordinar os diferentes motivos que o afetam. A brincadeira de faz de conta é um
exercício importante nesse processo e as escolhas que a crianças pode fazer também
ajudam a hierarquizar os motivos que movem suas ações.
E a partir dessas funções, também a memória, a atenção, o aprofundamento da
percepção acontecem de modo cada vez mais firme e nesse processo se dá a formação da
identidade. O lugar que a criança ocupa nas relações sociais de que participa (em casa - no
grupo familiar - e na escola, na relação com os adultos e as outras crianças, na prórpia
relação que a escola mantém com a família e as famílias, tudo isso constitui o pano de
fundo da formação da identidade e da personalidade da pessoa na infância.
Como lembra Zaporozhets, a melhor maneira de impulsionar esse desenvolvimento
não é abreviando a infância e tratando precocemente a criança pequena como pré-escolar
ou o pré-escolar como escolar. Devemos sim aprofundar as formas da atividade prática,
plástica e lúdica se quisermos formar crianças para serem sujeitos da atividade de estudos
que ela realizará ao longo da escola de ensino fundamental.
A partir da idade pré-escolar, portanto, ampliam-se as necessidades das crianças:

- gostam de ajudar em pequenas tarefas como a guardar os brinquedos, distribuir


e guardar materiais, cuidar dos menores. Isso acontece porque se sentem “grandes”, querem
se sentir parte do grupo dos adultos e por isso querem fazer coisas por si mesmas: "deixe
que eu faço!". É importante que elas possam ajudar nas tarefas da casa e da escola
desenvolvendo atividades que estejam ao seu alcance, que suas iniciativas sejam acolhidas
e estimuladas.

- gostam de movimentos em grandes espaços, já que podem correr, pular... gostam


de brincar com areia, com água e quanto mais objetos elas tiverem para brincar, mais
experiências vão ter.

- gostam de ouvir histórias e gostam que o adulto repita histórias já conhecidas: com
isso desenvolvem preferências, a memória e a imaginação.

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- gostam de fazer coisas sozinhas (sem a ajuda do adulto), mas, ao mesmo tempo,
adoram a atenção e a cumplicidade do adulto.

É importante lembrar que a opinião do adulto tem grande importância para a criança: a
partir dessa atenção e da opinião do adulto sobre ela (o que a criança não percebe apenas
nas palavras, mas também nas atitudes do adulto para com ela), ela constrói sua auto
estima. Portanto, prestar atenção ao que falamos e fazemos em relação às crianças,
evita muitas complicações presentes e futuras.
Nesta etapa de sua vida, a criança gosta ainda:

- de pequenos animais e o convívio com eles pode ser muito bom para desenvolver seu
interesse pela vida e pela natureza: a orientação e o exemplo do adulto são fundamentais
nesse aprendizado de uma atitude respeitosa.

- de brincar com objetos (com material natural como toquinhos de madeira, folhas,
sementes, com material reciclado, com brinquedos... quanto mais coisas ela tiver
disponível, mais rica sua experiência) e com os amigos. Por isso, ao mesmo tempo que
devemos propor vivências amplas e diversificadas para a criança, também precisamos
garantir a ela um tempo livre para atuar sem a intervenção e orientação direta do
adulto e explorar o material, expor a maneira como percebe o mundo, experimentar os
papeis sociais que percebe ao seu redor.

Se o adulto tem o cuidado de comentar e combinar com as crianças as situações


e atividades que vão realizar, por volta dos 4 anos, as crianças estarão programando elas
próprias as atividades que desejam realizar.
Nessa idade, as crianças adoram colecionar coisas (tampinhas, figurinhas...), o que
devemos incentivar, pois, com isto, a criança desenvolve a memória, a atenção, gostos e
preferências.
À medida que vão desenvolvendo a identidade, elas gostam de criar seus cantinhos.
Também para isto é fundamental um tempo livre para que elas possam estabelecer
relações de intimidade com os espaços, é importante ter um canto delas na sala onde
possam guardar suas coisas: um armário feito com caixas de madeira ou papelão
empilhadas contra a parede. O espaço pode ser um grande estímulo para sua auto-
organização.
É no tempo livre que a criança desenvolve o faz-de-conta: quando ela brinca de faz de
conta (também chamada de jogo de papéis), assume o lugar de adulto, de profissionais e
“faz”coisas que de outra forma ela não poderia fazer. Quando assume um papel, a criança
passa a agir de acordo com ele: toma outras atitudes, submete sua própria conduta a
determinadas regras. Esta aí a importância do faz-de-conta para o desenvolvimento da
personalidade da criança: ao se aproximar, através da brincadeira, das atividades e da vida
dos adultos, a criança compreende cada vez mais as funções sociais dos adultos e estas
convertem em modelos para sua própria conduta.
No brincar, assim como na atividade lúdica de um modo geral, se formam a atenção,
a memória, a imaginação e a capacidade de pensar e solucionar problemas. Além
disso, a criança exercita a comunicação e o relacionamento com outras crianças, pois
precisa combinar as divisões de papéis. Nesse sentido, a brincadeira de faz-de-conta que a

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criança inicia a partir dos 3 anos tem uma influência fundamental no desenvolvimento
de sua inteligência e personalidade.
Da mesma forma acontece com o desenho, a modelagem, as atividades de construção
e colagem chamadas de atividades produtivas (pois resultam num produto: o desenho, a
boneca feita de massinha ou de argila, a estradinha construída de toquinhos de madeira, a
cena da história feita de colagem). Entre 3 e 6 anos, essas atividades podem também ser
registradas pelas crianças: os relatos feitas pelos amigos de sala, os passeios, as
descobertas e as experiências individuais tudo pode ser expresso através de colagens,
modelagens, construções, desenhos e pinturas. Vale observar que essas constituem um
tipo novo de atividade das crianças, pois antes se empolgavam apenas com o processo de
explorar coisas sem criar um produto.
A partir dessas atividades, o/a professor/a pode criar na sala um clima de utilização da
escrita: junto aos desenhos e às colagens, o/a professor/a pode sempre escrever a história
verbalizada pela criança sobre o que ela produziu (e que ela expressa oralmente ao ser
questionada: o que você desenhou? O que está acontecendo no seu desenho? Que parte da
história você desenhou?).
A partir dos quatro anos, as crianças podem ser estimuladas a escrever seu nome nos
trabalhos, a partir de uma plaquinha com seu nome em um tipo de letra padrão escolhido
pelo/a professor/a (a script minúscula, por ser parecida com a letra de imprensa e ao
mesmo tempo guardar alguma semelhança com o manuscrito, é recomendável).
Daí em diante, o desenho, a colagem e a modelagem como forma de registro devem
estar sempre presentes, mesmo convivendo com a escrita no 1o. grau. Nesse processo de
registrar as experiências, o/a professor/a apresenta técnicas (de desenho e pintura, de
modelagem, de colagem) e materiais diferentes (sempre de forma que o fazer tenha um
sentido para a criança, sempre como registro de alguma experiência vivida)
É importante destacar que o desenho e as outras formas de expressão da criança
correspondem à sua compreensão da realidade e à imagem mental que ela tem dos objetos.
De um modo geral, elas não correspondem ao que o adulto espera. O adulto precisa cuidar
dos os comentários que sobre o desenho da criança: nem dizer que está tudo sempre lindo
sem prestar a atenção e nem desfazer do trabalho da criança.
A atividade de construção, assim como a modelagem, constitui também um exercício
importante de desenvolvimento do pensamento e de conhecimento da realidade. Se
sugerimos para a criança construir com toquinhos de madeira uma casinha que ela vê num
desenho, colocamos para ela um desafio: aprender sobre o material com que está
trabalhando, perceber as diferentes formas e pesos das peças, transferir o que vê no
desenho para um objeto concreto. Quando a criança constrói algo, estará projetando,
experimentando, conhecendo os materiais... tomando inciativas e criando soluções... Por
isso devemos diversificar a proposição de atividades para a criança.
A escrita realizada pelo/a professor/a deve acontecer sempre como uma outra forma de
registro que se diferencia do desenho. À medida que o/a professor/a faz uso da escrita e as
crianças testemunham sua escrita, elas vão percebendo a função social da escrita e esta vai,
aos poucos, se tornando uma necessidade para elas. Desta forma, a passagem do desenho à
escrita é um processo atrativo para a criança uma vez que a nova atividade vem carregada
de sentido para ela. Quanto mais portadores de texto houver para uso na sala
(enciclopédias e folhetos, livros de história e de consulta, dicionários e gibis, jornais e
revistas) sendo utilizados pelo/a professor/a e pelas crianças, mais a criança se aproxima da
escrita e da leitura.

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A atividade de escrita começa com a compreensão do papel social e da função da
escrita em nossa sociedade... Se a criança presencia a escrita pelo/a professor/a, logo mais
vai querer, ela também, escrever. Da mesma forma se dá com a leitura. E ensinaremos a
criança a escrever o que lhe interessa... em geral serão textos e palavras e não letras ou
sílabas com as quais não se faz nada e que não têm qualquer significado para as crianças.
À medida que a criança aprende mais sobre o mundo que a cerca, vem a fase dos
por quês!!!! Quer saber o que são as coisas, como funcionam, para que servem, por que. É
uma etapa importante no processo de aprendizagem da criança: não se deve assumir uma
atitude de se livrar das perguntas ou das respostas, mas de incentivar sua curiosidade e seu
processo de investigação através do manuseio de livros, revistas, observação da natureza,
T.V., pessoas que sabem e podem contar... Esse processo de investigação, o/a professor/a
planeja junto com as crianças, executa com as crianças, registra com elas e avalia com elas.
A atividade de investigação pela criança, ao mesmo tempo que responde às suas
curiosidades, cria nela o interesse pelo conhecimento.
É importante não perder de vista que o que impulsiona o desenvolvimento da
inteligência, do raciocínio e da personalidade é a própria vida, ou seja a atividade que a
criança realiza, seja a externa (aparente), seja a interna. Nesse sentido, quanto mais
diversificada for essa atividade, mais possibilidades de desenvolvimento abrimos para ela.
Isso não deve significar, no entanto, que devemos preencher o dia da criança na escola
com um conjunto enorme de atividades programadas. Como lembra Leontiev (1988), em
cada etapa da vida, uma atividade se destaca como aquela que mais permite o contato da
criança com o mundo ao redor. Na infância, a atividade que motiva e mais desenvolve a
criança é o brincar.
Partindo das considerações acima, podemos dizer que as TAREFAS DA EDUCAÇÃO
das crianças de 3 e 6 anos envolve atividades pelas quais as crianças possam:

- manipular os objetos, os instrumentos, as técnicas;


- relacionar-se com os outros,
- aprender os hábitos e costumes e a linguagem,
- expressar-se através do desenho, modelagem, linguagem oral, dança, música,
dramatização...
- interpretar o que vão conhecendo, buscando explicações para as situações e
fenômenos que vivenciam, expressando-se através das diferentes linguagens (fala,
desenho são as mais comuns e são importantes, mas não nos esqueçamos das outras
como a modelagem, a pintura, a dança, a dramatização)
- desenvolver uma atitude de cuidado em relação à natureza, às outras pessoas, a si
mesmas.

Com que conteúdo se trabalha? Com tudo o que faça sentido para as crianças, com
tudo o que elas queiram conhecer, com tudo o que o que trouxermos para a sala e para a
escola (livros, vídeos, objetos da natureza, brinquedos, material reciclável, música) e
situações (leitura de histórias, brincadeiras modernas e brincadeiras do tempo dos avós,
contato com a natureza, passeios pelos arredores da escola, piqueniques, idas à
biblioteca...).
Se o/a professor/a se preocupa com educar (mais do que com ensinar), vai ter inúmeras
possibilidades para promover nas crianças:

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.a educação dos sentidos (ver, ouvir, sentir..)
.a educação política e ética: (aprender a pensar também nos outros e
não apenas em seu próprio bem estar)
.a educação científica (um método para produzir conhecimentos e
para buscar a explicação dos fenômenos sociais e físicos: a observação já se faz a partir dos
3 anos de idade)
.a educação do pensamento (a criança, à medida que interpreta o
mundo, faz teorias... é preciso que os outros a escutem!)

Através de que atividades se pode educar os sentidos? Quando orientamos a criança a


perceber as diferenças das coisas que vê e ouve (ou seja, se ensinamos a criança a ver e
ouvir com atenção), a observar o desenho, a pintura, a modelagem e as construções dos
colegas, a ver desenhos de boa qualidade na TV, manusear livros infantis. É possível
acostumar as crianças a ouvir o vento, os barulhos do ambiente, sons produzidos com os
objetos do ambiente, músicas de diferentes tipos. Para isto, conhecer instrumentos
musicais, improvisar instrumentos, montar uma bandinha são situações que podem
contribuir. Em relação à educação dos sentidos, é fundamental ensinar a perceber e gostar
do diferente: observar, perceber diferenças, lembrando que quanto mais se conhece mais se
está aberto para entender, respeitar e gostar das coisas novas.

Através de quais atividades realizar a educação política e ética na pré-escola?


Ensinando a criança a perceber o outro, ajudar, dividir, fazer junto, para que aos poucos se
vá garantindo para o futuro adulto em formação uma referência mais ampla que seu próprio
bem-estar.
Através de que atividades se pode desenvolver a educação científica já na educação
infantil? Quando deixamos a criança buscar soluções para os problemas que enfrenta,
quando a incentivamos a observar, investigar, explicar do seu jeito coisas que acontecem,
comparar, analisar, discutir, concluir ou elaborar conceitos, registrar e guardar as
informações que aprende.
Através de quais atividades podemos educar o pensamento? Ao desenvolver o que
chamamos de educação científica já estaremos educando seu pensamento. Também ao
ouvir as crianças em sua explicações e interpretações do que veem ou vivem. Quando
permitimos que as crianças encontrem soluções para os problemas que vivenciam, quando
participam verdadeiramente como sujeitos da vida na escola. Além disso, algumas
categorias ajudam neste processo: perceber que as coisas se transformam é uma ferramenta
importante para a criança, pois ela pode passar a buscar a origem das coisas: a categoria de
transformação pode ser compreendida quando fazemos papel reciclado ou preparamos
massinha de modelar com as crianças na escola (ou a cola e a tinta que usamos nas
atividades chamando sua atenção para a transformação sofrida pelo material). Da mesma
forma, as atividades de culinárias cumprem esse importante objetivo.
Levar a criança a perceber a passagem do tempo e as mudanças que este acarreta - a
história - também é instrumento fundamental e isto pode ser feito levantando com ela sua
história de vida, a história de sua família (registrando sempre as informações), e também
trazendo objetos antigos para a sala. Perceber que as coisas não são boas ou ruins, mas
podem ser boas e ruins ao mesmo tempo, dependendo do ponto de vista de onde se olha,
também é elemento fundamental que já pode ser ensinado para a criança como um
exercício de pensamento.

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Com que material trabalhar? O material deve ser sempre o mais diversificado possível.
Na escola estamos acostumados a restringir o uso dos materiais a papel e lápis... é
importante ousar e experimentar todos os materiais.

Como trabalhar?

1. Baseado na atividade da criança:


.planejar junto as atividades diárias (no início dando a conhecer os objetivos
da atividade, mais tarde permitindo que as crianças participem do planejamento sugerindo
atividades, programando um dia da semana...).

.deixar que ela execute o que deve ser feito (lembrar que é a criança quem
precisa aprender a recortar, pintar, desenhar... e não o/a professor/a e para esse argumento
de que fica mais bonito quando o adulto faz pela criança, duas questões se colocam: o
objetivo da escola é educar ou é "fazer coisas bonitas"? E se o argumento é de que os pais
querem coisas bonitas, que tal explicar para os pais que quando a criança trabalha com as
mãos, quando ela recorta, pinta, cola, desenha, modela, monta, ela desenvolve seu
pensamento.

.avaliar com ela o que ela aprendeu, como fez, se gostou...


.deixar todos os dias um tempo livre no horário para a criança quando ela
escolhe o que fazer... desta forma ela estará planejando o que fazer no tempo que tem,
organizando o material com que realizar a atividade, combinando o que fazer com os
colegas da brincadeira ou da atividade... É importante lembrar que após o tempo livre, a
turma se reúne para contar um para os outros, o que fez nesse tempo e avaliar a forma como
usou o tempo.

2. Desenvolvendo atividades significativas que tenham sentido para as crianças. Para


isso é importante que as crianças ajudem a planejar, combinem o que fazer, como fazer,
juntem material, explorem o material com a educadora, registrem o que vão aprendendo...

A definição desses objetivos deve resultar da reflexão de cada educador/a a


partir daquilo que conhece a cerca do desenvolvimento infantil e a partir ainda
daquilo que deseja para a sociedade. Portanto, o processo de definição de objetivos
não é algo que possamos importar da experiência de alguém: deve partir da nossa
reflexão, pois deve espelhar nosso compromisso com o desenvolvimento das
crianças que estão sob nosso cuidado.
Por isso, tomem este texto apenas como uma provocação para a reflexão e a
discussão.

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Para saber mais:
1. BONDIOLI, Anna e MANTOVANI, Susanna (orgs). Manual de Educação Infantil: de
0 a 3 anos - uma abordagem reflexiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
2. BONDIOLI,Anna (org). O tempo no cotidiano infantil. Perspectiva de pesquisa e
estudo de casos.São Paulo: Cortez, 2004
3. BONDIOLI,Anna (org.). O projeto pedagógico da creche e a sua avaliação.Campinas,
Autores Associados, 2004
4. EDWARDS, Carolyn, GANDINI, Lella e FORMAN, George (orgs). As cem linguagens
da criança. A abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto
Alegre:artmed,1999.
5. ZABALZA, Miguel (org). Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1998.
6. MUKHINA, Valéria. Psicologia da Idade Pré-escolar. São Paulo: Martins Fontes,
1998.
7. VYGOTSKY, Lev. Obras Escogidas. v. 4 . Madrid, Visor, 1995.
8. FALK, Judit (org.) Educar os três primeiros anos: a experiência de Loczy.
Araraquara: Junqueira e Marin, 2004.

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