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PROCESSO Nº : 20.

950-3/2010
INTERESSADO : PREFEITURA MUNICIPAL DE COMODORO
GESTOR : MARCELO BEDUSCHI
ASSUNTO : CONSULTA
RELATOR : CONSELHEIRO GONÇALO DOMINGOS DE
CAMPOS NETO

A U T O S D I G I T A I S

PARECER Nº 9748/2010

I – RELATÓRIO.

1. Versam os autos acerca de consulta subscrita pelo


Sr. Marcelo Beduschi , Prefeito do Município de Comodoro,
objetivando parecer técnico do E. Tribunal de Contas do Estado acerca
da carga horária de trabalho de assistente social estabelecida na Lei
Federal nº 12.317/2010.

2. Com efeito, de forma objetiva, eis a indagação do


Consulente:

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Fls.............

Rub...........

3. A douta Consultoria Técnica emitiu Parecer


conclusivo, manifestando-se pelo conhecimento da consulta, vez que
presumível a constitucionalidade de toda lei promulgada, e pelo fato de
prevalecer a Lei Nacional acerca do caso versando, infere-se que os
gestores públicos devem adequar a jornada dos assistentes sociais
conforme os ditames da Lei nº 12. 317/2010.

4. Ademais disso, manifestou-se no sentido de que essa


Corte de Contas promova a revogação da Resolução de Consulta
nº 27/2009, e que ato contínuo, em comungando tal entendimento,
envie resposta ao Gestor por meio de Resolução de Consulta com a
seguinte redação:

Resolu ç ã o de Consul t a nº /20 1 0 . Pesso a l .


Direi to Soci a l. Jornada de trabalho.
Profissõ e s regul a m e n t a d a s . Prev a l ê n c i a
de Lei Na c i o n a l . Rea d e q u a ç ã o da jorn ad a
de cada ente. Obrig a t o r i e d a d e .
Apli c a ç ã o aos cargos públic os
específicos.

1) A lei nacional que regulamenta o exercício de


profissões específicas, nos termos do art. 22,
inciso XVI da Constituição Federal, e fixa carga
horária máxima de trabalho, é aplicável ao setor
público, devendo cada ente adequar a jornada de
trabalho destes profissionais. 2) A jornada
especial é aplicável aos cargos públicos
específicos, voltados ao desempenho da
profissão regulamentada. Não se aplica, por
consequência, aos servidores que, embora
possuam a qualificação técnica em uma
profissão regulamentada, ocupem outros cargos,
da mesma forma não se aplica ao servidor
público ocupante de cargo comissionado ou
função gratificada, pois trata-se de cargos com
dedicação exclusiva.

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5. Vale ressaltar, outrossim, que a totalidade dos
requisitos de admissibilidade objetivos e subjetivos do expediente
jurídico encontram-se satisfeitos.

6. É o sucinto relatório.

II – FUNDAMENTAÇÃO.

Do juízo de admissibilidade da consulta formulada.

7. A consulta consiste no mecanismo (decorrente da


função consultiva das Cortes de Contas) posto à disposição dos
jurisdicionados legalmente legitimados, por meio do qual o respectivo
Tribunal de Contas responde a dúvida quanto à interpretação e
aplicação de dispositivos legais e regulamentares , concernentes à
matéria de sua competência. Ressalte-se, por oportuno, que a resposta
à consulta é sempre em tese, em situação abstrata, não podendo
versar sobre caso concreto, exceto na hipótese do § 2º, do art. 232, do
Regimento Interno do E. TCE.

8. Para tanto, é imprescindível, ainda, que o legitimado


formule a consulta em tese, apresentando-a através de quesitos
objetivos. Somente quando for constatado relevante interesse
público , devidamente motivado, é que o Tribunal de Contas poderá
conhecer de consulta em caso concreto, oportunidade na qual a
resposta será, sempre, em tese ( ex vi do art. 48 e parágrafo único, da
LC nº 269/2007).

9. Assim, cuida-se de um procedimento de extrema


importância, porquanto a decisão tomada por maioria de votos do
Tribunal Pleno, em sede de consulta, tem força normativa, constituindo
prejulgamento de tese de modo a vincular a apreciação dos demais

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feitos sobre a mesma matéria (conforme estabelece o art. 50 do
diploma legal referido).

10. Nesse contexto, uma vez não preenchido qualquer


dos requisitos de admissibilidade da consulta (os quais integram o
próprio conceito acima mencionado), compete ao Conselheiro Relator
arquivá-la, conforme autoriza o art. 232, § 3º, da Resolução nº 14/2007
(RI-TCE/MT).

11. No vertente caso, observa-se que a consulta foi


formulada por autoridade legítima, eis que se trata do Prefeito do
Município de Comodoro. Portanto, resta preenchido o pressuposto de
admissibilidade de natureza subjetiva.

12. Além do mais, extraem-se dos autos da consulta


marginada, a existência de correlação entre a dúvida levantada e a
matéria de competência desse E. Tribunal de Contas, preenchendo,
assim, o pressuposto de admissibilidade de natureza objetiva.

13. Convém ressaltar também, que a matéria de fundo da


consulta em foco afigura-se como questão que representa verdadeiro
“benefício qualificado para coletividade”, o que evidencia um interesse
público passível de ser respondida a consulta à luz da legislação
aplicável à espécie.

14. Com efeito, os pressupostos objetivos de


admissibilidade são condições que autorizam a consulta, a teor do
disposto no artigo 48 da Lei Complementar n° 2269/2007 e artigo 232,
do Regimento Interno dessa Corte de Contas. O não preenchimento
desse requisito impede seja conhecida a consulta.

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15. Feitas tais considerações preliminares, o Ministério
Público de Contas, preambularmente, manifesta-se pelo conhecimento
da consulta.

Do Mérito

16. Como relatado, versa a consulta epigrafada acerca


da indagação da aplicação da Lei Federal nº 12.317/2010 aos
assistentes sociais (concursados), no que diz com a carga horária de
trabalho, prevista em tal regramento legal.

17. A objetividade na resposta à consulta formulada


possui aspecto ímpar, uma vez que trata de prática da Administração
Pública contemporânea, em busca do alcance da eficiência e da
qualidade dos serviços públicos, questão intimamente associada com a
renovação da capacidade e da produtividade dos seus servidores, tal
como ventilado no parágrafo 2º do artigo 39 da Carta da República.

18. Em primeiro lugar, a toda e qualquer atividade


administrativa deve estar atrelada ao princípio da legalidade, sob pena
de ato praticado pelo gestor ser considerado ato de improbidade
administrativa. Por seu turno, dispõe a Lei nº 8.429/1992 em seu artigo
11, senão vejamos:

“(...) constitui ato de improbidade administrativa


que atenta contra os princípios da Administração
Pública qualquer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade,
legalidade , e lealdade às instituições, (…).”
(destaquei).

19. À luz das diretrizes acima expostas, oriundas da Lei


de Lei de Improbidade Administrativa, conclui-se que a atuação do
administrador deve ser pautada pela legalidade, impessoalidade,

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moralidade, publicidade e eficiência, conforme expressa determinação
constitucional no art. 37, caput.

20. De outro lado, embora haja prejulgado no que tange


ao assunto versando, temos que o posicionamento externado no
verbete merece ser revisto, a fim de adequá-lo à legislação e à
jurisprudência atualizada.

21. Embora estarmos diante de matéria de entendimento


controverso, faz-se mister lançarmos mão de alguns posicionamentos
doutrinários, bem como entendimento do Supremo Tribunal Federal e
Tribunal de Contas de Santa Catarina.

22. Sobre o assunto, importante posicionamento de Ivan


Barbosa Rigolin ao comentar o art. 19 do Estatuto dos Servidores
Civis da União (Lei Federal n. 8112/90), que trata da carga horária dos
servidores federais:

“Obriga-se pelo art. 19 cada servidor efetivo a


prestar até quarenta horas semanais de
trabalho, o que significa cinco dias de oito horas
cada, bem conforme a tradição do serviço
público brasileiro, encampada até mesmo pela
Constituição Federal, art. 7º, XIII. Outras leis,
entretanto, podem estabelecer duração diversa
do trabalho, como seguramente o farão, e como
já tem feito quando referentemente a profissões
regulamentadas para as quais as leis federais
prevêem outras cargas horárias normais. É o
caso dos Médicos, dos Professores, dos
Mecanógrafos, dos Ascensoristas e de outros
profissionais.”

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23. Entretanto, a Confederação Nacional de Saúde-CNS,
entidade do setor patronal de saúde que representa os hospitais,
clínicas, laboratórios e demais serviços de saúde do país, contestou
por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade-ADI nº 4468, de
5/10/2010, ajuizada no Supremo Tribunal Federal, os artigos 1º e 2º da
Lei Federal nº 12.317/2010.

24. Já o entendimento do Ministro do STF Eros Grau,


conforme decisão liminar proferida no Recurso Extraordinário nº
589.870, datado de 31/08/2009, é no sentido de:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO . Apelação Ação


Ordinária. Servidor Público municipal. Pretensão
da redução da jornada de trabalho para 30 horas
semanais, nos termos da Lei 8.856/94, referente
aos profissionais fisioterapeutas e terapeutas
ocupacionais. Alegação de violação aos arts. 5º,
caput, e II, art. 37, caput, e 22, I e VI, da CF. -
Cabe à União legislar privativamente sobre as
condições para o exercício de profissões. Assim,
a Lei n. 8.856/1994 é norma geral aplicável a
todos os profissionais da área, tanto do setor
privado quanto no público. A recusa em
conceder a redução de jornada pleiteada
ofendeu o art. 22, XVI da CF. (STF, RE n.
589.870, rel. Min. EROS GRAU, julgado em
31/08/2009)” (grifamos)

25. Nesse sentido, também decidiu o Tribunal de Contas


do Estado de Santa Catarina no seguinte prejulgado:

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“Prejulgado 1095

Compete ao Poder Público municipal dispor do


pessoal (médicos, enfermeiros e outros
profissionais) necessário para operacionalização
de unidade pública de pronto-socorro de
atendimento em tempo integral (24 horas),
devendo promover adequação de cargos e
admissão dos profissionais, respeitadas a carga
horária máxima permitida em lei para cada
categoria profissional.” (grifamos)

26. Do exposto acima, constata-se que não há que se


falar em entendimento dominante. Contudo, temos que a legislação
nacional que regulamenta as profissões é aplicável ao setor público,
devendo os entes públicos realizarem as adequações necessárias em
suas normas, sob pena de infração ao artigo 22, inciso XVI da
Constituição da República.

27. Todavia, não se pode olvidar que a jornada especial


se aplica aos cargos públicos específicos e voltados ao desempenho
da profissão regulamentada. Não se aplicando, dessarte, aos
investidos em cargos comissionados ou função gratificada, bem como
aos servidores que, embora possuam a qualificação técnica em uma
profissão regulamentada, ocupem outros cargos, ainda que encontrem-
se desviados de suas funções.

28. Por conseguinte, em razão da presunção de


Constitucionalidade das Leis, e em razão da prevalência da Legislação
nacional no caso em tela, somos pelo conhecimento da presente
Consulta.

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III – CONCLUSÃO.

29. Dessa maneira, o MINISTÉRIO PÚBLICO DE


CONTAS , ratificando in totum o entendimento exposto pelos experts da
Consultoria Técnica dessa Corte de Contas, manifesta:

a) pelo conhecimento da consulta marginada, eis que restam


preenchidos os pressupostos subjetivos e objetivos de admissibilidade;

b) profira resposta à Consulta nos termos expostos no presente


Parecer, em consonância com o Parecer nº 124/2010 e sugestão de
ementa da douta Consultoria Técnica, conforme regra o artigo 81,
inciso IV do Regimento Interno dessa Corte;

c) pela revogação da Resolução de Consulta nº 27/2009, em


comungando este Egrégio Tribunal Pleno desse entendimento;

d) ressalva de que a deliberação plenária não constitui prejulgado do


fato ou caso concreto, nos termos do art. 232, § 2º, do RI-TCE/MT.

30. É o Parecer.

31. Cuiabá/MT, 15 de dezembro de 2010.

ALISSON CARVALHO DE ALENCAR


Procurador-Geral Substituto

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