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ÉTICA E

CIDADENIA
ÉTICA E CIDADANIA

INSTRODUÇÃO

Ética e cidadania são conceitos abrangentes que perpassam os vários


contextos das diversas esferas da vida social. Vemos a utilização desses
termos em excesso por aqueles que buscam defender posições, ações
políticas e individuais e tentam regrar condutas e ditar como as coisas devem
ser feitas, quais atitudes devem ser tomadas e quais os princípios devem ser
defendidos. Fazer uma exposição sobre essa questão é sempre um
empreendimento complicado tendo em vista o risco de cair em artifícios
normativos e transformar a análise em um texto panfletário que tenta impor um
padrão de conduta certa. Como critério de exposição trato de enfatizar a
divisão entre julgamentos de fato ( tratar como as coisas são e qual a natureza
do objeto estudado) e os julgamento de valor (tratar como as coisas deveriam
ser ou qual o melhor caminho a seguir). Como um pressuposto de uma
exposição com critérios científicos o texto vai se deter aos julgamentos dos
fatos, ou seja, se esforçar na caracterização, definição e desenvolvimento das
diversas dimensões que a Ética e a Cidadania apresentam.
Em nossa experiência cotidiana nos deparamos com situações difíceis
que, embora nos exijam uma resposta rápida, com freqüência nos sentimos
inseguros e sem parâmetros para definir a melhor ação a ser seguida. Em
seguida encontra-se diversas situações hipotéticas como meios de pensar os
dilemas éticos cotidianos. A primeira situação hipotética ocorre no ambiente de
trabalho e observamos um colega X, em torno do qual temos uma amizade
intima, se apropriar de recursos da empresa para fins privados. Nosso colega
com freqüência tira cópias ou imprime na empresa de material de interesse
pessoal, leva para casa resmas de papel, canetas e outros pequenos bens da
empresa e etc. É óbvio para todos que os bens da empresa em que se trabalha
devem ser distinguidos das posses individuais, independente se empresa é de
ordem pública ou privada. Qual seria a melhor atitude a ser tomada nesse
caso? Listo aqui algumas possíveis respostas à essa situação, embora haja
outras diversas possibilidades de escolha: opção 1- Não há problema algum
que o colega se aproprie de alguns pequenos bens da empresa, pois há muitos
desses bens e a empresa não esta sendo prejudicada com isso. Opção 2- o
colega X está tirando vantagem e abusando de sua condição de funcionário. O
melhor a fazer é manter uma atitude correta e ignorar o que o colega X esta
fazendo. Opção 3 – Ficar omisso a essa situação é ser conivente com ela. As
relações de amizade entre colegas de trabalho não podem comprometer a
integridade ética do indivíduo. O melhor a ser feito nessa ocasião é conversar
com o colega X e mostrar que sua ação é incorreta, caso ele insista devemos
denunciá-lo a um superior.
A situação hipotética seguinte também é cotidiana e não é difícil nos
depararmos com alguém que passa por situação parecida. Este seria o caso de
uma menina de condições financeiras precárias que engravida ainda
adolescente. Como toda gravidez precoce, observamos a imaturidade tanto
psicológica quanto fisiológica da adolescente para ter um filho tão jovem que é
agravado pelas dificuldades financeiras de sua família. O pai da criança
também é adolescente da mesma classe social que a menina e não tem
condições de apoiar a companheira de maneira apropriada a nível financeiro,
psicológico ou afetivo. Os pais de ambos os adolescentes se esforçam
trabalhando tempo integral todos os dias para manter a família. Qual seria a
melhor opção nesse caso? Opção 1- Os adolescentes devem assumir a
responsabilidade de seus atos e mesmo que não tenham concluído a educação
básica, devem agora se sacrificar para sustentar essa criança, mesmo que isso
signifique se submeter a sub-empregos de baixa remuneração ou abandonar a
escola. Opção 2- Os pais dos dois adolescentes por serem os responsáveis
legais dos menores de idade devem criar a criança até o momento em que os
adolescentes tenham maturidade e condições financeiras para conseguir criar
a criança. Opção 3- O melhor a ser feito nesse caso é interromper a gestação.
O feto não é um ser humano nos primeiros meses de gravidez é apenas um
conjunto disforme de células. Dentro do contexto dessa situação hipotética é
justificável que se realize o aborto para garantir o futuro dos adolescentes e dar
uma chance às famílias de ambos os lados de sair dessa situação precária.
As vezes as questões que a vida nos impõe podem ser bem mais
abrangente embora tão complexa quanto as demais. Podemos constatar isso
no próximo exemplo que se expõe o caso dos países islâmicos como o Irã,
Iêmen, Malásia e etc., onde o tratamento das mulheres se diferenciam muito
do observado nos países do Ocidente. A vida da mulher mulçumana esta
sempre correlacionada às decisões masculinas, seja inicialmente por parte do
pai e do irmão ou posteriormente por parte do marido. A mulher fica limitada ao
âmbito doméstico e ao sair de casa e freqüentar espaços públicos deve se
preservar, seja com um véu sobre os cabelos e roupas fechadas, seja com
traje que lhe tampe todo o corpo (a burca). Outras questões polêmicas sobre o
tratamento da mulher no Islã são relacionadas às praticas violentas que as
mulheres sofrem com a mutilação do clitóris, a permissividade do marido
violentar a mulher e as penas violentas. Como lidar com relação a essa
questão? Opção 1- As mulheres islâmicas estão nessa condição por que elas
consentem com essa situação. Não é incomum ver as próprias mulheres
defendendo o regime islâmico e criticando a situação das mulheres no mundo
ocidental. Opção Opção 2- Isso é um caso explicito de violação dos direitos
humanos e dos direitos das mulheres. Essas civilizações são atrasadas e os
países mais desenvolvidos devem educá-los para que essas manifestações de
selvageria não aconteçam. Opção 3- A relação com as mulheres islâmicas faz
parte de um processo muito maior que inclui toda uma rede de padrões
culturais mulçumanos. A mídia faz um sensacionalismo sobre a condição da
mulher. Na verdade a violência não é cotidiana, mas não é mostrado os
benefícios que a mulher mulçumana tem. Na verdade, até nas sociedades dos
países desenvolvidos a relações com homens e mulheres tem um lado
negativo. O certo a fazer é preservar a cultura islâmica e não tentar impor
nossos padrões sobre eles. Quais dos três posicionamentos acima você
escolheria?
Os três casos são ilustrativos de questões éticas e morais que fazem
parte de nosso cotidiano. Qual o caminho para resolver essas questões? Como
disse acima não tentarei fazer julgamentos de valor de maneira que o texto
acabe se tornando um sermão. O compromisso científico aqui é analisar a
natureza dos julgamentos e dos valores implicados nos dilemas de
comportamento individual e coletivo dos homens e mulheres. O estudo da Ética
nos auxilia a entender como esses processos se dão.

A Ética: Conceito e dimensões

A Ética, abordada como conceito usado cotidianamente, pode adquirir


dois significados principais:

1. um conjunto de valores compartilhados por um determinado número de


indivíduos que condiciona as ações individuais e seus julgamentos e se crê que
esses são os princípios corretos.
2. um campo de estudos que pode ter feições filosóficas, cientificas ou
teológicas e tem como objeto um raciocínio prático através do qual os homens
guiam sua conduta e seus julgamentos e classificam condutas em bem ou mal,
certo ou errado, virtude ou ao vicio, justo ou injusto. Observa-se que a palavra
ética pode ser utilizada como um fenômeno ou uma área de conhecimento, ou
seja, são denominados pela mesma palavra a ciência que estuda um fenômeno
e o objeto de estudo da ciência.
O filósofo espanhol Adolfo Sánchez Vázquez define ética da seguinte maneira:

“A ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos


homens em sociedade. Ou seja, é a ciência de uma forma
específica de comportamento”

Adiante o autor acrescenta:


“Como ciência, a ética parte de certo tipo de fatos visando
descobrir-lhes os princípios gerais. Neste sentido, embora
parta de dados empíricos, isto é, da existência de um
comportamento moral efetivo, não pode permanecer no
nível de uma simples descrição ou registro dos mesmos
mas os transcende com seus conceitos, hipóteses e
teorias.” (SANCHEZ VAZQUES,1970, p.12,13)

A busca de uma definição da Ética como ciência colocada por Sanchez


Vazquez nos defronta com o desafio de diferenciar moral de ética. Os vários
dilemas mostrados nas situações hipotéticas já mencionadas seriam de
natureza ética ou moral? O que distingue a palavra ética da palavra moral? A

etimologia da palavra ética mostra que sua origem é grega advinda da


expressão ethos, enquanto a palavra moral é de origem latina advinda de mos,
moris. Interessante notar que o significado das palavras grega e latina
designam a mesma coisa, ou seja, os costumes e hábitos de uma sociedade.
Não há um consenso quanto à distinção das duas palavras e cada autor,de
acordo com sua origem, língua e herança intelectual, vai dar ênfases diversas à
distinção entre os dois conceitos. Mas de maneira geral podemos diferenciá-los
com a seguinte formula comumente usada (VAZQUEZ,1970; CHAUÍ,2005;
VALLS,2004): a moral refere-se ao conjunto de normas destinadas a regular as
ações dos indivíduos que são experienciadas e postas em prática
cotidianamente e se relaciona diretamente com escolhas pessoais e à
subjetividade individual. Importante notar que a moral é variável de acordo com
a época histórica, entre sociedades e muitas vezes entre grupos de uma
mesma sociedade. A Ética, por sua vez, é uma empreendimento cientifico,
filosófico ou teológico que analisa essas práticas morais e pode ter como
finalidade somente o conhecimento ou estabelecer um agir e um modo de vida
justos, razoáveis e universalmente válidos. De maneira geral, podemos
resumir a diferença entre as duas concepções frisando a intenção da moral de
moldar a ação humana e da ética em conhecer e estabelecer os princípios
gerais e os valores das diversas ações.
Essa distinção nos aponta que os três casos hipotéticos colocados no
início do texto se encarados no intuito de responder qual a melhor opção de
ação caem em uma questão moral, pois implicam a pratica de moldar o que
deve ser feito. No entanto, se tomarmos essas situações hipotéticas para um
estudo de princípios esta nos servirá para o estudo da Ética. Para fins didáticos
costuma- se separar a ética entre seus problemas gerais (centrado em
questões consciência moral, o bem, a justiça, a liberdade, a racionalidade, as
leis e etc.) e os problemas localizados e específicos como a ética profissional,
bioética, ética empresarial entre outros. Tal separação não existe em termos
reais mas somente como uma maneira de facilitar a abordagem satisfatória das
diversas questões.
As questões éticas e morais dizem respeito à vida social do indivíduo e
suas diversas relações sociais. A superação da natureza puramente natural e
instintiva para a busca da reflexão da ação e da natureza social do
comportamento humano configura a necessidade dos parâmetros morais de
comportamento e da Ética enquanto campo de estudo.
A Ética tem relações intrínsecas com aquilo que denominamos valores.
Um valor consiste em levar em conta certo princípio ou aspecto das coisas na
tomada de decisões e estar inclinado a se comprometer com tal aspecto no
processo de escolha da ação a ser seguida e de julgamento das ações dos
outros. Muitos discursos e ditados buscam mostrar a hierarquização que
fazemos entre os vários valores. Um exemplo interessante é a famosa frase
que inspira os discursos ufanistas atuais e foi proferida por nosso imperador D.
Pedro I: “Independência ou Morte!”. Nessa frase vemos uma hierarquização
dos valores de liberdade política como superiores à própria vida individual que
serve como inspiração para o nosso nacionalismo até hoje. As decisões morais
muitas vezes implicam nessa hierarquização de valores. No caso acima citado
da situação de trabalho que nosso colega X se aproveitava para fins privados
do patrimônio da empresa nossa ação depende se valorizamos mais a amizade
ou a integridade da empresa. No caso da adolescente grávida, depende se
valorizamos o futuro dos pais adolescentes ou a vida do bebê que vai nascer.
Em relação à mulher mulçumana uma tomada de posição depende se
valorizamos mais a preservação e autonomia das culturas islâmicas ou a
integridade das mulheres como um todo.
Encontramos diversos Códigos de Ética que mostram os princípios pelos
quais nossas ações devem ser ancoradas. Esses códigos podem ser formais e
escritos ou apenas realizados de maneira tácita. A parte da Ética que se
esforça em prescrever as normas e posicionamento dos indivíduos em uma
determinada situação é chamada de Deontologia. Podemos incluir aqui os
diversos Códigos de Ética principalmente àqueles que normatizam a conduta
nos ambientes de trabalho. Dessa forma, a ética pode se expressar a nível
subjetivo ou a nível objetivo.
A seguir encontramos os desenvolvimentos da Ética através de uma
rápida visão dos desenvolvimentos filosóficos na área.

Um Percurso Filosófico sobre a Ética.

A Filosofia foi a primeira a se interessar em desenvolver um


conhecimento racional e reflexivo sobre as questões éticas. De maneira geral,
podemos dizer que a filosofia clássica e suas diversas temáticas abordadas
tocavam constantemente nessas questoes. A análise do desenvolvimento
filosófico da Ética será realizada de maneira a evidenciar princípios gerais.
Sem dúvidas os princípios e teorias estão relacionados intimamente com
aqueles que as produziu, no entanto, o foco será sobre as teorias deixando a
análise das obras e da biografia do autor para pesquisa posterior àqueles que
se interessarem em se aprofundar melhor.
Obviamente o percurso filosófico deve ter início no berço da filosofia, ou
seja, a Civilização Grega Clássica. Os pensamentos e idéias do período têm
relações intimas com a polis e a inserção do indivíduo e sua conduta no
sistema político da cidade-estado grega; e também o conceito de cosmos como
uma relação do individuo com o todo, as regras que regem o universo e as leis
da natureza.
Um grupo de pensadores da Grécia antiga dedicava a enfatizar a
relatividade do conhecimento e das regras de conduta. Os chamados sofistas
proclamavam a impossibilidade de criar valores gerais e universais e
defendiam a flexibilidade da ética segunda cada situação. Desde a gênese dos
estudos éticos encontramos a contraposição entre relativismo e universalismo,
ou seja, o conflito entre a defesa da variabilidade dos valores e das regras
morais e a busca de parâmetros universais para determinar a conduta humana
no sentido de definir bem, o justo, o belo, por outro. Posteriormente esse
debate toma novo fôlego na inserção da questão do relativismo cultural.
Nesses debates Sócrates defende o universalismo e aplica métodos
racionais na determinação da conduta certa a ser seguida e para que ocorra a
evidência de valores gerais. O princípio de ação denominado intelectualismo
socrático se baseia na valorização do logos (razão) como elemento central na
determinação da boa conduta. Ou seja, argumenta-se que quem sabe o que é
o bem age de maneira benéfica e virtuosa, somente o ignorante é vicioso.
Todos os indivíduos teriam o bem como interesse maior em suas vidas,
partindo da premissa de que ninguém age contra seus interesses, o indivíduo
que conhece o bem age de maneira benéfica e dessa forma chegaria à
felicidade.

A Ética platônica, por sua vez, incorpora a relação entre razão e virtude
de Sócrates, mas insere a questão da responsabilidade e questões políticas e
sociais. Platão defende quatro virtudes cardeais e relaciona cada virtude a um
grupo social em busca da ordem política ideal na polis grega. A primeira virtude
cardeal é a sabedoria que implica no desenvolvimento do lado racional da alma
e deve ser cultivada pelos dirigentes da polis (filósofos). A virtude seguinte é a
coragem adquirida a partir do lado espiritual da alma humana de sua força
moral e sua impulsividade. Esta, por sua vez, deve ser predominante nos
guardiões da polis. Em seguida encontra-se a temperança ou a moderação que
tem implicações sobre a questão dos desejos e dos instintos da alma humana
e deve ser cultivada pelos artesãos e agricultores. Por ultimo a virtude principal
e mais geral que é a justiça que diz respeito a toda alma humana e é cultivada
quando toda a polis esta em harmonia gerando a felicidade da sociedade e do
indivíduo. De maneira geral, Platão defendia que o indivíduo deve se livrar de
suas paixões para se submeter a um critério racional.
O terceiro grande filósofo clássico grego defende que a ética é o
empreendimento da busca da felicidade. Aristóteles concebe a virtude como
um saber pratico. O autor defende que a virtude é alcançada em um exercício
de buscar o meio-termo entre dois vícios: o excesso e a falta. Logo a coragem
seria uma virtude que se encontra no meio termo entre um vicio pelo excesso
(temeridade) e a falta (covardia) e da mesma forma ocorreria com as demais
virtudes. Aristóteles distingue as virtudes intelectuais (bom-senso e o saber)
das virtudes morais (justiça, coragem, amizade, temperança e etc). Nenhuma
virtude é inata e podemos alcançá-las através do aprendizado que se realiza
por meio do conhecimento ou da prática
Uma mudança considerável ocorre quando o mundo grego clássico se
desfaz com a invasão de Alexandre Magno. As teorias éticas se
redimensionam com a fusão da cultura grega e macedônica. A política se
afasta das preocupações éticas e a busca individual em viver bem se torna o
foco das discussões. Uma das teorias expressivas dessa época é o epicurismo
que se reveste de caráter empirista, hedonista finalista. Empirista por buscar no
mundo real as causas do bem e do mal. Hedonista ao ter como máxima a
busca do prazer e o afastamento da dor. No entanto, deve haver um
discernimento na análise
desse prazer pois não pode causar maiores dores no futuro. E finalista por
colocar o sentido e a finalidade da vida humana na busca por felicidade.
Outra teoria importante desse período é o estoicismo que pregava que o
indivíduo deveria viver de acordo com a lei da natureza. A razão era um
instrumento para se conhecer as leis do universo e o indivíduo deveria se
conformar com essas leis. Uma corrente radical que segue a mesma tendência
são os chamados cínicos. Estes interpretavam que viver segundo a natureza é
viver de maneira instintiva, primitiva e fugir das convenções sociais. E a ultima
concepção ética fundamental desse período são os chamados céticos que de
defendem que não há possibilidade de conhecimento concreto, logo todo
indivíduo deve esforçar-se em abster-se de julgar ou criar opiniões sobre
qualquer tipo de prática.
Durante a Idade Média as produções éticas se entrelaçaram com as
questões teológicas e cristãs. Os dois principais filósofos da época são
Agostinho e Tomás de Aquino que defendiam que a felicidade é alcançada a
partir da relação do homem com Deus recuperando a tradição clássica
platônica e aristotélica.
A partir do Renascimento e início da Idade Moderna há uma proliferação
de pensamentos variados sobre a questão e podem ser classificados a partir
de grandes correntes de pensamento. O Racionalismo com uma fé em
conhecer o mundo através da razão tenta negar todo o misticismo na
determinação da conduta humana. Um dos maiores autores racionalista, René
Descartes não consegue colocar parâmetros seguros para ação humana e se
resigna ao afirmar que o homem deve somente seguir o que dita as
convenções e normas vigentes. O Empirismo tenta se contrapor ao
racionalismo, buscando no mundo material a sua base de argumentação. John
Locke defendia que os homens nascem todos com os mesmos direitos e sua
teoria ética se baseia na respeitabilidade dos direitos inatos dos homens.
O Iluminismo por sua vez faz uma junção entre o racionalismo e o
empirismo de maneira a manter a fé na razão e na ciência com a busca de agir
no mundo. A partir daí surge toda a filosofia que dará suporte às revoluções
políticas na Europa. Dentre um grupo grande de filósofos e pensadores da
época destaca- se o nome de Immanuel Kant. Em sua filosofia moral, o autor
busca definir não o conteúdo das ações mas a forma de uma ação ética.
Para isso tem como principio o chamado “imperativo categórico” que consiste
na regra que todo ser racional deve seguir:

“Existe... só um imperativo categórico, que é este: Age


somente, segundo uma máxima tal, que possas querer ao
mesmo tempo que se torne lei universal."(KANT,2003,
p.70)

A noção ética de Kant diz que devemos agir com os outros da uma
maneira possamos agir com toda humanidade e da maneira como queremos
que os outros ajam com conosco. Esse imperativo tem bases na chamada
regra de ouro muito usada em várias tradições religiosas e prega que deves
fazer com os outros o que espera que os outros façam contigo.
Uma ultima concepção ética importante é o chamado utilitarismo que tem como
principais representantes Jeremy Betham e Stuart Mill. A regra moral dessa
filosofia parte do pressuposto de que o bem é aquilo que se mostra útil em
proporcionar o bem-estar para o maior numero de pessoas possível e o mal é o
seu contrario. A ética utilitarista tem relações fortes com a idade
contemporânea e toda ética do sistema econômico que se fixou no período
atual.
Observamos que durante toda a história da filosofia e da ciência o homem
se preocupou em tentar achar os critérios segundo os quais este poderia guiar
sua conduta no sentido do bem e criar normas gerais para as suas condutas
dos outros. Posteriormente o estudo das éticas também se dedicou em mostrar
como as regras éticas e morais podem servir para fins de dominação, à serviço
das classes burguesas (Karl Marx) ou a serviço dos fracos (Friedrich
Nietzsche). Outro tipo de ênfase tem tomado o estudo da ética principalmente
nas ciências humanas e sociais onde se enfatiza a pluralidade dos valores e a
busca do entendimento de cada um e não mais tentar estabelecer o valor
universal.

A Cidadania

A cidadania pode ser definida como uma visão do ser humano como
munidos de dignidade intrínseca que lhes garante direitos de natureza política,
civil e social. O noção de cidadania é uma herança da civilização grega
clássica, onde significava a ação política na polis. A democracia grega clássica
não era para todos os cidadãos e os grupos que podiam ser considerados
cidadãos acabavam tidos como superiores. A cidadania era uma espécie de
fonte de privilégios para um grupo de pessoas.
Em um processo histórico longo o conceito de cidadania foi reformulado
ampliado e tem relações diretas com a noção de Estado Democrático de
Direito. A noção de cidadania hoje se relaciona a um conjunto de liberdades e
obrigações civis, políticas, sociais e econômicas. O cidadão é um individuo que
tem as seguintes prerrogativas essenciais o direito à vida, à liberdade , ao
trabalho, à moradia, à educação, à saúde, à escolha de seus representantes, à
cobrança de ética por parte dos governantes e etc. Esses direitos devem ser
preservados tanto na relação entre os cidadãos quanto na relação entre Estado
e sociedade civil. O Estado mostra-se como o principal ator no processo de
garantia da cidadania e dos direitos dos cidadãos a partir da fixação de um
aparato de leis e normas.
A cidadania reflete os valores que são atribuídos aos homens que lhe
capacitam ter poderes políticos nas decisões no nível das diversas estâncias
do Estado. Deve-se ter cuidado em não simplificar a cidadania ao simples
direito de votar. A capacidade de ação política dos cidadãos se estende para
além do momento eleitoral. Um cidadão reconhece a si mesmo como um
membro de seu país e passa a ter a sua disposição uma série de canais para
participação, controle e influência das instituições político-sociais. Estes canais
vão do direito de votar ao direito de ser votado; da liberdade de expressão à
possibilidade de assumir cargos políticos. A cidadania tem um significado
político muito valioso, pois permite que os indivíduos tenham mecanismos para
melhorar sua situação através de vias pacíficas.
Na consolidação em nível internacional da valor do ser humano e da
cidadania, a Declaração de Direitos Humanos é considerada um grande
avanço. Formulada no ano de 1948, a Declaração representa a consagração
de um conjunto de valores produto de um processo histórico tortuoso que
levaram séculos para se definir e a obter um consenso alargado a nível
mundial. Hoje, estes valores fundamentam um conjunto de direitos nas
diversas nações e apesar de ser reconhecido o direito à diferença a cada
Estado, as diferenças nas suas legislações internas não podem contudo
contrariar o que está consignado na Declaração. Os valores gerais da
Declaração são os seguintes: a Pessoa Humana como valor maior, a dignidade
humana (integridade física e moral), a liberdade (pessoal, civil e política)
Igualdade (de direitos, econômica, política e cultural) e a Solidariedade.
Bibliografia

CHAUÍ, Marilena de Sousa. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática,
2005.
COVRE, Maria de Lourdes Manzini. O Que e cidadania. 3. ed. Sao Paulo:
Brasiliense, 1995.
GALLO, Silvio,. Etica e cidadania: Caminhos da filosofia: elementos para o
ensino de filosofia. Campinas: Papirus, 1997.
KANT, Immanuel,. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros
escritos: texto integral. São Paulo: Martin Claret, 2003
SANCHEZ VAZQUEZ, Adolfo. Etica. Rio de janeiro: Civilização Brasileira,
1970

VALLS, Alvaro L. M. O Que e ética. Sao paulo: Brasiliense, 2004.

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