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Um Certo Alguém - Míddian Meireles
Um Certo Alguém - Míddian Meireles
M514u
Meireles, Míddian, 1988 -
Um certo alguém / Míddian Meireles. — [1. ed.] — Florianópolis,
SC: Qualis Editora, 2019.
Recurso digital
Formato e-Pub
Requisito do sistema: adobe digital editions
Modo de acesso: word wide web
ISBN: 978-85-7027-074-0
Não importava quais planos havia feito para minha vida, a chegada
naquela cidade mudara tudo. O desejo que a mulher dentro de mim incitava
conhecer deixara de ser meramente profissional e passara a ser os segredos
do jogo, aqueles poderosos, repletos de luxúria e desejo, que atrelavam ao
frenesi único, sexual e conduzia-me cada vez mais longe nas trêmulas e
eróticas asas do prazer.
Diferente das meninas na minha idade, nunca acreditei em contos de fadas,
sempre vi o amor como uma fraqueza tola, que trazia consigo uma promessa
rasa, jamais algo real, palpável, profundo, mas, sim, uma teoria de que
ninguém poderia ser feliz para sempre, em especial o outro ser motivo para
tal felicidade. Amar alguém era o mesmo que adentrar um terreno perigoso,
como uma cova infinita de areia movediça, que nos afunda, sem chance de
emergir. Era como conhecer o seu inimigo, aquele capaz de lhe destruir em
um piscar de olhos, com um ataque – de preferência pelas costas –, ou talvez
uma faca enfiada em cheio no peito.
As Princesas da Disney, os romances literários, as novelas e até mesmo a
vida das pessoas ao meu redor funcionaram como uma escola para mim,
sobre como eu não deveria agir, e fizeram-me enxergar muito cedo que ceder
esse poder a alguém poderia ser fatal, exatamente por isso tornei-me meu
próprio universo. Eu me orgulhava do meu senso de autopreservação, da
astúcia em guardar meu coração, congelado, como alguns diriam,
resguardado de qualquer mal que pudesse afligi-lo.
Costumava me envaidecer por ser tão racional, segura, decidida, e quando
saí da cidade em que nasci para galgar os primeiros passos como recém-
formada, aceitando um emprego que acreditava ser a oportunidade da vida,
em minha cabeça não havia espaço para qualquer pessoa além de mim e do
desejo de me provar, de tornar-me alguém que venceu as próprias batalhas.
Contudo transformei-me em uma pessoa que costumava abominar. Do tipo
diferente de quem achava ser, aquele que o desejo e a paixão a o subjugavam.
Embora assustasse sentir-me daquela maneira tão leviana pela primeira
vez na vida, meu corpo doera para finalmente conhecer quem
inevitavelmente me tornara, para aprender as lições e táticas de jogo que só
poderiam vir de alguém pressionando o corpo contra o meu.
O desejo, o sexo, a paixão… mudaram tudo. Tornara-me,
irrevogavelmente, outra pessoa. Era como se uma cortina se abrisse diante
dos meus olhos, como se meu corpo se descobrisse, de repente, faminto.
Talvez sempre tivesse sido, eu apenas era muito cega para notar. Afinal,
estava tudo ao meu redor, desde o espírito faminto dos jovens para liberarem-
se dos hormônios adolescentes que borbulhavam dentro de si; a sedução dos
solteiros – e comprometidos – em busca de um parceiro para saciar os mais
intensos desejos carnais; ou os casais apaixonados, quase no cio,
praticamente implorando pelo outro com toques – nem sempre sutis –,
olhares intensos, ardentes, em busca de satisfação e júbilo. Estava em toda
parte, viral e prolífico, só demorei para enxergar, embora não me
arrependesse.
Aquilo tudo era como sussurros inegáveis, o canto da sereia, um eco
erótico, encorajando-nos, incitando-nos à entrega carnal. Pela primeira vez na
vida invejei aquilo, vi-me ansiosa para me jogar, me entregar com gana para
experimentar o ranger de quadris, alguém me tomando, dando-me o que eu
queria tão desesperadamente, entregando-nos ao nosso bel-prazer. Desejei
absorver todo o conhecimento do jogo de outra pessoa, ao mesmo tempo,
queria entregar meu universo para outrem.
Mantive-me centrada no meu mundo, casta, como achava ser o bastante
por muito tempo, todavia chegara a hora de parar de lutar contra minha
natureza. Cada parte íntima em mim tremia, provando aquele ponto,
torcendo, desejando, incitando a conflagração carnal, e a prova estava ali,
comigo, de pé, nua em frente ao responsável por aquela redenção.
— Na cama — instruiu, o timbre desgraçadamente rouco, profundo.
Ansiosa, obedeci, pondo-me de joelhos no colchão macio, ao tempo em
que ele se debruçou sobre mim, agarrando os cabelos de minha nuca,
puxando-me para si, mordiscando-me o pescoço, lambendo o caminho até o
ponto atrás da minha orelha. Joguei a cabeça para trás, perdida, rendida, a
respiração cada vez mais difícil de sorver, então sua boca encontrou a minha,
desejosa, sedenta, eriçando-me ainda mais.
Quando se afastou, notei seu esforço para parecer menos afetado,
sustentando uma calmaria calculada. Mas tudo no homem de 1,90 m o
denunciava, desde a voz grave, a íris escura queimando-me a pele, a forma
ávida que me beijava, parecendo alguém privado de água por dias no pior dos
desertos. Suas ações pareciam um reflexo das minhas.
Diante de mim, havia o espécime masculino mais surpreendente que já
conheci. Tudo nele era opulento, majestoso. Os músculos trabalhados nos
braços, peitoral e barriga, as coxas grossas, malhadas, como de um atleta.
Ainda que os traços contivessem certa dureza, a boca carnuda, olhos claros
intensos, intimidantes, cílios cheios e sobrancelhas grossas formavam o
espetáculo que era o homem.
A aproximação, como de uma ave de rapina em busca da caça, deveria
fazer-me temer. Instintivamente, sabia o que aquilo significava, ainda assim
não foi o suficiente para que eu recuasse, na verdade, o queria ainda mais.
Desejava sentir tudo o que tinha para oferecer… tudo.
Avançando em minha direção, suspirei, vendo-o desabotoar a calça, o ato
de descer o zíper com compelido controle deixando tudo ainda mais
envolvente. Contudo foi o sorriso, um tanto perverso, e as pupilas dilatadas,
que fizeram-me engolir com dificuldade. E apesar do alerta na boca do
estômago, não abaixei a cabeça, corajosa, e mais do que isso, desejosa,
sustentando o olhar dele.
— Quero sua boca aqui — ele ordenou baixo, o timbre aveludado, ainda
assim sublinhado por um aviso férreo, transformando-me em uma poça ébria.
Não me fiz de rogada. Cobiçosa, fiz exatamente o que pediu.
PAULA
CAPÍTULO
UM
— Não vai pedir nada para beber? — o cara atrás de mim perguntou, em
uma tentativa patética de puxar conversa, e não como se tivesse a intenção de
extinguir a sede que eu não sentia.
Pelo visto os caras da capital não eram diferentes dos da minha cidade.
Homem era homem em qualquer lugar, só mudava mesmo o endereço e o
tamanho dos documentos.
Por um segundo ou dois, deliberei se o ignoraria, pois estava claro como
sol que passar a noite comigo era mais especificamente o ponto. Talvez não a
noite, mas ao menos parte dela.
O que, claro, não aconteceria!
A tarefa de não encará-lo com mais atenção tornara-se quase impossível
com ele estando tão perto, afinal, o cara parecia um maldito Adônis. Muito
alto, ombros largos e olhos claros, que oscilavam de um turquesa
impressionante para um verde profundo; os lábios cheios eram levemente
encobertos pela barba um pouco mais escura do que o cabelo, como se já
tivesse passado da hora de ir ao barbeiro. Com muitos predicados, ele era
daqueles que provocavam um frio na barriga com apenas um olhar
significativo.
E, sim, ele causava mesmo!
Já o havia notado desde que cheguei ali, até porque, com aquela
imponência era difícil não fazê-lo. Trocamos olhares furtivos, outros
significativos e também roubamos sorrisinhos bobos um do outro por cerca
de uma hora. O que mudou em um determinado momento, já que ele não
estava mais sozinho, pois duas garotas peitudas enroscaram-se a ele, uma
delas até mesmo sentou em seu colo, beijou-lhe o pescoço, ambas soltando
risinhos quando ele sussurrou alguma coisa no ouvido das duas para que
apenas elas pudessem escutar. O que, claro, acabou fazendo-o perder
qualquer chance que pudesse ter comigo.
Ridículo! Típico macho vadio!
As luzes da boate piscaram por sobre o ombro dele, refletindo na pele
clara o arco-íris de cores, piscando em total sincronia com a batida eletrônica
que tocava.
— Apesar de não ser da sua conta, não estou a fim — foi a resposta seca
que lhe dirigi, fingindo não haver um mísero interesse da minha parte,
enquanto virava-me para verificar os farristas em expansão.
Não que não tivesse entendido o fato de que ele estava pretendendo me
oferecer uma bebida, porque o fiz, porém esperava mais. Honestamente, um
cara do calibre dele decerto tinha toda a intenção de me levar para cama e
apenas isso. Compreensível, porém se as primeiras frases que me dirigira se
limitariam àquele xaveco fraco, não me faria perder tempo por mais que
diante de mim estivesse uma divindade nórdica.
Jamais me comportaria como uma acéfala apenas por estar com um
homem bonito, mesmo que este fosse o verdadeiro significado da palavra. Se
alguém tinha que aprender a usar as sinapses necessárias para fazer o cérebro
funcionar era ele, e não eu. Isto é, se tivesse um. O que não seria nenhuma
surpresa.
E, ok, era um desperdício constatar aquilo!
Quando não se afastou de imediato, me vi suspirar, aquela noite seria
longa e parecia longe de acabar. Tudo o que eu realmente queria era encontrar
Larissa e convencê-la a finalmente ir embora. Mas não tinha tanta certeza de
que aquilo aconteceria tão brevemente, pois desde que cheguei ao lugar, a
mulher dizia estar ocupada trabalhando, embora vez ou outra a tenha visto
beber alguma porcaria alcoólica, fuxicar e gargalhar com mais gente que eu
tinha paciência para lidar em um ano, como se estivesse em uma festa, e não
no ambiente de trabalho.
Embora tivesse dito que não se demoraria, alegando que precisaria
recepcionar os DJs da noite como parte da função dela como gerente, a
verdade era que já tinha dado tempo suficiente para que me levasse ao
apartamento que dividiríamos e mostrar-me o quarto que seria meu até que
arranjasse um lugar para viver sozinha. Pelo visto, foi estúpido da minha
parte confiar de boa-fé meus arranjos habitacionais à idiota da minha prima.
Prima esta que honestamente nunca suportei.
— Mesmo? — o cara insistiu, um sorriso lascivo brotando em seus lábios.
Por questão de análise feminina, apenas para fins acadêmicos, claro, dei
outra checada nele e notei o que vestia: uma camisa de botão branca e calça
jeans de lavagem escura, tudo possivelmente caro. Pelo porte, era inegável
que se tratava de um típico rato de academia, provavelmente daqueles que
levantavam milhares de pesos, tiravam selfie no espelho do lugar para provar
que suara e de quebra ainda praticava algum esporte sexual antes do café da
manhã.
Não duvidava nada que fosse também um daqueles arrogantes de pau
pequeno, que não deixava de ser algum tipo de pervertido viciado em
provocar as mulheres para serem mais uma em sua lista. Vai entender, talvez
aquilo deveria lhe trazer alguma adrenalina. Deus sabia que, por mais que o
cara não fizesse o meu tipo e que odiasse sujeitos com o padrão macho
escroto, ainda assim aquele sujeito estava bombeando a minha.
As turquesas azuis explicitavam tudo, bebendo-me com um olhar cheio de
carícias, despindo-me de um jeito quase indecente, desconcertante. Não
precisava ser esperta para adivinhar que deveria estar imaginando tudo que
poderia fazer comigo caso eu cedesse. Se duvidar, na mente dele já
estávamos na segunda rodada.
— Você já teve certeza de que eu tenho uma boca que fala e caso quisesse
uma bebida, pediria eu mesmo uma. Assim como posso fazer o que quiser
com ela, também sei usá-la para fazer um pedido.
Droga! Eu não deveria ter dito aquilo!
Senti-me um tanto insegura por utilizar de insinuações na conversa, afinal,
provavelmente aquela era a língua nativa dele no quesito azaração. Fora que
o cara poderia interpretar aquilo como um convite, e por mais interessante
que fosse, estava longe de querer um flerte passional.
Observando a multidão, tentava me distrair da consciência de que ele era
ainda mais alarmantemente bonito de perto do que os outros não apenas
naquele lugar, como em qualquer um.
— Pode fazer o que quiser com ela e sabe usá-la? — repetiu o que eu
dissera, sedutoramente, a voz baixa, aveludada e rouca, gostosa, provocativa.
Suspirei, culpada, porque fui a única que lhe dei munição para aquilo. —
Hm… Muito bom saber — o sussurro quente bem próximo ao meu ouvido
deixou claro um desejo feroz moldado em cada palavra, do tipo que dava
medo.
Contudo, ainda assim foi capaz de iniciar um incêndio através das minhas
entranhas, corpo, que, de repente, tornou-se mais consciente da proximidade
dele, do calor, da energia quase nuclear por trás da postura régia de um
jogador, despertando em mim algo em um nível primitivo.
Embora a música estridente ainda tocasse, meus olhos se fecharam
involuntariamente com a proposta implícita, tentada a sucumbir ao reboliço
acontecendo em meu interior, como um tornado silencioso que faz sua
bagunça sem aviso ou prévia licença.
Merda! O que era aquilo?
Sobressaltei-me com a súbita consciência singular que me acometeu e
tomei meu tempo para examinar a sala em busca de alguma coisa que eu não
sabia dizer o que era, talvez a ingênua e decidida pessoa que chegara ali antes
de encontrá-lo.
Onde diabos estava a Larissa?
Eu poderia estrangulá-la quando a encontrasse. Havia ido da rodoviária
direto para o lugar quando liguei e me passou a localização em que se
encontrava. Já desembarquei direto em uma boate diferente de todas que
conheci, mas não fui atrás de curtição e muito menos à caça, só estava ali por
ser local de trabalho da filha mais velha da irmã da minha mãe e esperava que
saíssemos daquele antro o quanto antes. No entanto, a bagagem aos meus pés
não fora o suficiente para demovê-la da tarefa de tirar-me dali.
Parecendo recordar-se de algum tipo de piada, o deus nórdico sorriu,
fazendo um par de profundas covinhas aparecerem, deixando-me indefesa de
um jeito que nunca senti antes.
Quem era aquele cara, pelo amor de Deus?
Jamais fui o tipo de garota imprudente, que se perde de forma leviana por
um belo espécime por pouco. Contudo, juro por Deus, estava perto, perto
assim de puxar o Sr. Gamer – porque o cara era claramente um jogador –,
para juntar meu corpo ao dele e acabar com aquela coisa que me fazia sentir.
Não que tivesse alguma experiência ou feito algo parecido antes, nem
jamais me vi motivada e muito menos tentada a fazê-lo, afinal, minha
virgindade estava ali, intocável, mesmo aos 22 anos de idade, para corroborar
aquilo, no entanto me vi balançada de verdade. Depois de um longo dia de
viagem da cidade interiorana onde nasci, em um ônibus lotado, mais as horas
em cima dos saltos de 12 centímetros, sexo casual não parecia ruim.
— Caio Ornelas. — A mão estendida em minha direção passava a
impressão de que estávamos prestes a fechar algum negócio, e não como se
tivesse toda intenção de me levar para cama, para algumas horas de sexo sem
sentido. Então algo em mim relaxou, como se guardasse, mesmo que
provisoriamente, o escudo e armas de defesa.
Em meio à sombra da iluminação fraca, os olhos glaciais queimavam nos
meus. Intensos, penetrantes sob os cílios grossos, ele me observava à espera
de aceitar o cumprimento, ao passo que perfurava-me, como se tentasse
desvendar o que eu escondia nos meus. Não era apenas um olhar qualquer,
ele me inspecionava de maneira genuína, como se fosse mesmo do interesse
dele saber quem eu era.
Desviei-me do escrutínio demorado para analisar o nariz de traços retos,
em harmonia com o formato quadrado do rosto levemente bronzeado. As
sobrancelhas bastas franziram-se sutilmente, como se elucidasse questões
filosóficas profundas que se atinham ao prazer que aquela estranha sentada
diante dele no bar poderia lhe proporcionar. O sorriso torto nos lábios, um
daqueles malditos convencidos, carregava um desafio, promessas também,
muitas delas, denunciando exatamente a intenção para comigo.
— Paula — gritei sobre a música que pareceu mais alta, aceitando o
cumprimento ao apertar a mão masculinas de dedos quentes e grossos, coisa
que antes nunca repararia em outro homem.
Caio parecia seguro, confiante e por algum motivo senti que poderia
confiar nele. Algo se moveu em mim quando nos tocamos, afetando-me. A
bem da verdade é que afetar era eufemismo. O problema era que o fazia além
da conta.
O infeliz interpretou corretamente os sinais do meu corpo e sorriu ainda
mais, de lado, presunçoso, parecendo satisfeito com o efeito que me causara.
Pisquei, um tanto aturdida, tanto pelo que me causou, quanto pela maneira
como me senti quanto àquilo.
— Prazer em conhecê-la, minha linda. — Um sorriso malicioso tomou
forma em seus lábios. Quando pronunciou o vocativo, algo brilhou nos olhos
dele e por odiar aquele tipo de coisa, vi-me obrigada a reagir, elevando o
queixo, numa postura defensiva, forçadamente desinteressada. Era uma
tentativa clara de mostrar que estava pronta para o embate, afinal, ele ainda
estava agindo como o playboy caçador que certamente era, e eu não era um
animal frágil, que se permitiria ser vencida com facilidade e sem lutar.
— É Paula — repeti meu nome de maneira proposital, deixando claro que
não seria um peão em seu jogo. Em reconhecimento, o sujeito meneou a
cabeça sustentando aquele ar sério, inabalável, de um jogador que estava
acostumado com a vitória.
A verdade é que embora odiasse apelidos e adjetivos toscos vindos de
estranhos sem qualquer intimidade, ainda assim a maneira com que
pronunciara soara terrivelmente atraente. Talvez pelo desafio implícito que as
sublinhava. Prova daquilo foi não ter soltado a mão dele tão rápido quanto
deveria, somado ao fato de me ver esfregando com o polegar os nós dos
dedos longos, inevitavelmente memorizando a sensação do toque ou de
simplesmente senti-lo, e foi quando percebi o erro que estava cometendo,
deixando-o ir em seguida.
Semicerrei os olhos, desconhecendo-me, mas diante do sujeito atraente
minha curiosidade simplesmente levou a melhor e passei a encará-lo com
ainda mais interesse. O cara era grande, do tipo muito mais alto que eu,
mesmo com saltos, não que aquilo fosse difícil, claro, dado o meu 1,60 m de
altura; os ombros eram largos, conferindo-lhe uma postura confiante,
relaxada. Uma das mãos passara a descansar dentro do bolso, dando-lhe um
ar charmoso, sedutor, enquanto a outra tinha uma garrafa de cerveja
longneck, e os cotovelos ajudavam-no a se escorar no balcão. As pernas
grossas eram perceptíveis pelo tecido agarrado a elas, os pés cruzados,
calçados com sapatos caros, deixando-o bem à vontade e sustentando o corpo
magro, apesar de forte, e o tronco firme era encoberto pela camisa de botões.
Sendo bem sincera, o cara bonito diante de mim era um paradigma cru
emoldurado por um rosto nascido para atrair. Um jogador viciado em caçar a
presa, um exímio predador por natureza, era exatamente como consegui
enxergá-lo.
Apesar da sensação nada familiar de alerta, pois nunca houvera outro que
invocasse algo parecido, eu gostaria de ser uma “daquelas” garotas capazes
de aproveitar o momento. Especialmente aquela noite.
— Desculpe, mas você é muito bonita para que eu use uma palavra
diferente do adjetivo para me dirigir a você — a voz profunda, sussurrada
muito próxima, me fez piscar, aturdida, enquanto ele baixava os olhos claros,
reverenciador.
A mão no bolso foi para o cabelo, arrumando os fios escuros de volta ao
lugar, antes de colocá-la novamente onde estava. Embora o gesto tenha
acontecido rapidamente, não perdi o momento em que a camisa agarrou-se
ainda mais ao dorso másculo do homem, oferecendo-me um vislumbre dos
músculos ondulados, sólidos como granito, e me vi engolir com dificuldade,
a boca indubitavelmente ressequida.
Porra, ele era mesmo gostoso!
Com o coração batendo violentamente contra o peito, tive que resistir ao
impulso de correr os dedos sobre a pele dele, como uma forma erótica e
bastante atrativa de leitura em braile.
Deixei escapar um suspiro, trêmula. Ele não precisava falar, não era
necessário realmente, sabia muito bem o que queria de mim e, se fosse
sincera comigo mesma, também desejava o mesmo. Negar que não me
excitava seria mentira e dizer que me atiçava era um maldito eufemismo, pois
me peguei sentindo uma ansiedade incomum, sobretudo bastante
impressionante.
Ao redor, pelo menos seis outras mulheres pareciam prontas, esperando
ansiosas pela oportunidade de cometer uma série inteira de atos indecentes
com ele e se o desejasse fazê-los ali, em total desrespeito aos demais
amontoados no lugar, tinha certeza que não lhe negariam. Afinal, o cara era
como uma promessa de prazer, satisfação e perversidade. Não era à toa que
me fuzilavam com o olhar.
Contudo, eu não era como nenhuma delas. Não era experiente, sequer era
graduada em relacionamento ou em transas sem compromisso. Não que fosse
uma total inocente quando o assunto era o sexo masculino, mas nunca
houvera alguém que me fizesse desejar ir além.
Apesar da idade, permiti-me trocar no máximo alguns beijos, amassos sem
muita importância. Nunca impus alguma regra que me proibia aquilo, apenas
não tive desejo de ir além. Longe disso, sentia-me ainda na fase “pré-
adolescente” quando o assunto eram homens. Tampouco conheci alguém que
me demovesse da ideia. Limitava-me a alguns olhares estranhos, conversas
rasas, paqueras furtivas, nada passional. Não me via pronta para embarcar em
algo parecido, especialmente quando esse certo alguém que parecia me
oferecer aquilo, o único que me fizera titubear até então, tinha o ar tão
perigoso e letal.
Remexi-me no banco, de repente, muito ciente do quanto mexia comigo.
— Você é nova na cidade? — a pergunta foi feita em um tom casual,
embora não conseguisse esconder o interesse sublinhado. Esperando pela
resposta que decidi deixar em suspensão, ele tomou um gole da bebida.
Confesso, me surpreendi com a mudança de ritmo, afinal, ele começara
aquela conversa de uma maneira bastante desinteressante.
É… talvez ele não fosse sem cérebro, afinal!
Minha recusa em responder de imediato só o fez fitar-me com mais
atenção, como quem acabava de encontrar um adversário e trazia consigo um
enigma que ele adoraria desvendar e vencer. A partir do que via refletido nos
olhos claros, senti-me compelida a retribuir a civilidade.
— Cheguei hoje de mudança. — Eu me virei num esforço de parecer
afável, mas não tinha o mínimo tato para continuar a ser alvo do seu
interesse. — Olha… — suspirei, sem saber direito o que faria a seguir e
muito menos o motivo. — Na verdade, estou esperando meu noivo chegar
para me levar para casa.
Por algum motivo, senti-me impelida a desestimulá-lo e recorri à jogada
clássica de inventar um companheiro falso, na esperança de dissuadi-lo de me
conquistar e como lobo fosse encontrar outro cordeirinho para fazer o ataque.
— Sério? — Li a palavra nos lábios dele, o sorriso no rosto me dizendo
que ele tinha certeza de que não passava de um blefe.
— Sério. Namoramos desde o ensino médio e depois da minha formatura
ele fez o sonhado pedido. — Por razões óbvias resolvi deixar de fora a parte
que nunca tive um namorado e muito menos que jamais sonhei com um
casamento. — Sou muito apaixonada… — por mim, completei em
pensamento, mas não era da maldita conta de Caio Ornelas mesmo.
Ao contrário do efeito desejado, não gostei do olhar glacial no rosto dele,
sobretudo a frieza dando vazão para algo que passou a queimar, como fogo.
Gostei menos ainda dos lábios levemente repuxados com um sorriso, de
humor, eu diria. Pelo visto minhas habilidades de persuasão eram piores do
que eu julgava ser, pois foi como se em um piscar de olhos o sujeito me visse
como uma carne fresca, um desafio pronto a ser cumprido antes do abate
sexual.
Droga!
O resultado foi que a postura e divertimento dele diante da minha mentira
se revelou como ondas de provocação, arrepiando-me a nuca.
— Uma pena essa coisa do noivado. — A ênfase dada na última palavra
não passara despercebida, muito menos a sutil ironia.
Surpreendendo-me ainda mais, ele se aproximou atrevidamente, movendo-
se para mais perto, roçando o nariz nos meus cabelos, fazendo-me ainda mais
ciente da energia absurda que emanava. O perfume de um suave amadeirado
gostoso envolveu-me como um par de braços fortes; o calor que irradiava do
corpo dele cobriu-me como um casaco. E estavam ali, todos os elementos no
cara deixavam-me com o céu da boca seco de antecipação. Engoli a saliva
com dificuldade, de repente, sobrecarregada pelo desafio que era tentar não
me envolver em sua bruma macia, deixando-me ébria, à mercê de incertezas.
Um garçom se aproximou para pegar a bandeja cheia, repleta de drinks
pedidos pelos clientes, que o bartender lhe entregava e quando minha
atenção se desviou para o sujeito franzino, não pude deixar de notar o quanto
o ambiente mudara, lotara rapidamente. Estava tão absorta na interação com
Caio, que sequer me dei conta que em um piscar de olhos andar tornara-se
uma tarefa difícil. Ainda assim, o garçom abriu caminho pela multidão, como
o milagre de Moisés no Mar Vermelho.
Tentei ignorar, juro que tentei, mas a ondulação do homem, a força que
Caio fazia irradiar em mim, especialmente tão perto como estávamos, quase
imprensados contra o balcão, o abdômen musculoso pressionado contra mim,
como se nada pudesse ficar entre nós, tornaram-me refém e repentinamente
fascinada pela sua segurança.
Com a expressão serena, Caio correu o olhar em brasas pelas minhas
feições, fazendo com que meus lábios se abrissem involuntariamente. Apesar
do tato absolutamente presunçoso, a expressão franca mostrava que o que
havia entre nós não era apenas uma revelação, mas também um fato.
Os olhos claros pareciam bloqueados nos meus e nenhum dos dois se
moveu, era como se não quiséssemos nos afastar.
E não queríamos…
A batida pulsante morreu, dando espaço para uma outra menos enérgica,
quase sensual. Tudo ali parecendo injetar doses cavalares de feromônios nos
dois seres vivos já biologicamente ativos. Muito ativos e excitados.
Os dentes brancos e alinhados mordiscaram o próprio lábio inferior, como
se tentasse manter o compelido controle diante da presa. Contudo a maneira
que os olhos brilhavam de modo sobrenatural, como de um lince,
denunciavam o próprio estado de espírito.
— Você acredita em amor à primeira vista, minha linda?
A pergunta me pegara de surpresa, fazendo-me paralisar de súbito.
Acreditar em amor à primeira vista era o mesmo que crer em uma lenda
urbana, que não passava disso. Todavia, se acreditasse, Caio Ornelas
certamente se encaixaria no papel do meu par perfeito. Mas não era. O corpo
duro feito pedra, mas macio e convidativo pressionado ao meu, podia parecer
uma bênção em meio à desgraça, ainda assim a resposta continuava a ser não.
— Acredito tanto quanto acredito em Papai Noel. — Apesar das palavras
muito mais irônicas do que gostaria, tudo em mim demonstrava que a “triste
notícia” era realmente a única resposta honesta que poderia lhe oferecer, e
também uma verdade absoluta.
Recebi de volta um sorriso sexy que me queimou em lugares que nunca
senti antes, afinal, o cara indubitavelmente mexia comigo para o bem e para o
mal. Exalar perigo pelos poros deveria ser o bastante para me fazer
retroceder, no entanto as partes de mim que não deveriam se deixar abalar
sofriam de efeito contrário, umedecendo e esquentando. Nunca, nem mesmo
nos meus sonhos, conheci alguém que capturasse tal reação.
Existem homens que escondem o que são, sempre sorrindo, para tentar
conquistar, no entanto, caras como Caio eram como um livro aberto, não
escondiam o que queriam, simplesmente jogavam as cartas sobre a mesa,
como um jogador que se garantia. E embora não tivesse dito explicitamente
sua intenção, desde que se aproximara ele manejava com destreza o que fazia,
segundo as próprias regras, deixando implícito que estava jogando.
— Não acredito também. Mas não estrague as coisas com o Papai Noel
para mim. — O sorriso dele se alargou e acabei tendo que morder o lábio
para não rir.
Aproximando-se ainda mais, assisti-o engolir com dificuldade, como se a
saliva se tornasse um bolo preso na garganta. O flerte brincalhão deu lugar a
traços sérios, os olhos fecharam-se como se ele preparasse a cartada final.
Com as batidas selvagens do coração, meu corpo entrou em estado de alerta e
eu não tinha dúvidas do poder que Caio tinha de provocar um problema
cardíaco completo com apenas um pouco mais.
Ele era perigoso demais, principalmente porque fazia algo que nenhum
outro conseguiu: tornar-me tentada a experimentar o que podia oferecer.
— Acho melhor ir embora. — Empurrei o peitoral rijo com cuidado,
desvencilhando-me dele, minha racionalidade empírica ganhando do lado
químico, físico, da matéria que viesse, a atração que me acometia
sobrepujada pelo juízo e preservação. — Desculpe, tigrão, mas preciso ir. —
Eu me pus de pé, afastando-me ainda mais da amarra em que o cara me
envolveu. — Você está claramente à caça, mas acredite, não sou a presa de
que está atrás.
— À caça? — devolveu, um tanto perplexo, mas em vez de aceitar o fato
de ter sido dispensado, livrou-se da garrafa vazia e colocou as mãos macias
nas minhas, segurando-as sobre o peitoral firme. E quando veio em minha
direção, feito um gato prestes a pegar o peixe, achei que me beijaria, contudo,
os lábios tentadores moveram-se em direção ao meu ouvido. — Acredite,
linda, você é tudo o que quero. Mas como você mesma bem colocou, o velho
ditado diz que um dia é o da caça e outro do caçador. Assim como a canção,
por destino ou dispor, jogarei a armadilha. — Engoli em seco, chocada,
tentada e sobretudo sobrecarregada com o desafio.
Não entendia bem o que Caio queria dizer com o que me pareceu um aviso
enigmático, no entanto não tive chance de perguntar, pois sem dizer mais
uma palavra ele simplesmente se foi. Ainda perplexa, resolvi que não
brincaria com a sorte, pois se ficasse ali parada, talvez mudasse de ideia. O
que não diria sobre ele, que não esperaria por uma qualquer, quando não
precisava, já que tinha tantas ao dispor. Uma pontada inesperada de ciúmes
irracional espalhara-se através do meu peito, obrigando-me a me mover sem
lançar um olhar ao redor para procurá-lo, pois certamente descobriria que ele
estava mais uma vez rodeado pelo próprio harém.
Perto da porta de saída, vi Larissa se pavonear vestida com uma roupa de
couro exageradamente colada e um par de saltos assassinos. Suspirei, ainda
mais cansada. Apesar de ser minha prima, não erámos parecidas em nada, e
talvez por isso nunca tivéssemos nos dado bem. Especialmente após o ensino
médio, quando ela viera para capital concluir os estudos e mesmo que não
tivesse chegado a terminar a graduação na faculdade, se formara em
vadiagem e passou a tratar o resto da família com certa arrogância,
conferindo-lhe um status permanente de vadia babaca.
Apesar de pouco nos falarmos, nas raras ocasiões que nos encontrávamos,
sua mãe me disse que ela ficaria feliz em me ceder um lugar para que eu
ficasse enquanto não arranjava o meu próprio espaço, e depois disso
conversamos por mensagem algumas vezes para finalizar os arranjos.
Acertamos de ela me pegar na rodoviária, mas ao lhe mandar mensagem
na última parada avisando que estava chegando, ela me respondeu que tinha
uma “emergência” e acabei tendo que gastar uma fortuna com Uber apenas
para transportar-me para aquele antro de imoralidade que ela chamava de
trabalho. Algo me dizia que a “emergência” tinha tudo a ver com o fato de ela
não estar a fim mesmo de se dar ao trabalho de me buscar, e não com o
emprego.
Depois de pegar minhas duas malas, acelerei os passos e, ignorando a cara
de antipatia e desgosto que me dirigiu, puxei-a para o lado.
— Ei! Sei que está ocupada. — Desembolsei todo autocontrole que pude
reunir e para não soltar uma piada. — A festa está muito divertida e tudo, mas
estou cansada. Você poderia me passar a localização do seu ap e todas as
instruções de como chegar, e me entregar uma cópia da chave? Daí não
precisa mais se preocupar comigo.
Encontrar um lugar para morar naquela cidade se tornara uma tarefa muito
difícil. Desde que fui contratada pela agência onde trabalharia, estava em
busca de algum imóvel em potencial para alugar, mas ou era caro demais ou
ruim demais. Apesar de a internet facilitar a vida de formas indiscutíveis,
aquele era o tipo de coisa que se fazia pessoalmente. Além do mais, o risco
de concretizar um aluguel pela internet era tamanho, os incontáveis golpes
que as pessoas recebiam diariamente provavam aquilo. Eu certamente não
poderia arriscar a sorte, então por mais animosidade que sentisse, a oferta de
ficar uns dias sob seu teto era tipo um de milagre de Natal.
Por mais que sorrisse para ela, tentando a todo custo não demonstrar o
quanto a situação me irritava, algo em seus lábios se enrugando fez meu
sorriso morrer.
— Sobre isso… — titubeou, incerta, os olhos escuros pérfidos, sem
conseguir me encarar.
— Sobre isso o quê? — pressionei, dessa vez não conseguindo controlar o
tom quase colérico. Eu não precisava ser Sherlock[01] para saber que aquela
conversa não terminaria bem.
Larissa tombou a cabeça, de modo que pudesse me encarar, dissimulada,
soltou o ar pela boca com força exagerada, fingindo uma irritação que parecia
longe de sentir.
— Nada de mais. — Em sinal de descaso, abanou uma das mãos de unhas
excessivamente compridas, ainda assim, minha expressão não se aliviou. Para
mim estava claro que havia sim alguma coisa que ela enrolava para contar.
Larissa era alta e bonita, mas a maneira que se portava e vestia tirava um
pouco da beleza, tornando-a um tanto vulgar. Eu não era do tipo de mulher
machista, nem costumava julgar ninguém pelo que vestia, mas Larissa…
bem, ela era a razão pela qual nós, mulheres, tínhamos que nos munir para
tentar defender-nos no dia a dia.
— Você terá que ficar em um hotel por algumas noites, porque meu
namorado chegou de viagem sem avisar. — Ela revirou os olhos, como se
fosse um pequeno detalhe sem importância, nos lábios, um sorriso levemente
debochado, não deixando negar que estava adorando aquilo. — Sabe como é,
né? Precisamos de um pouco de privacidade… Assim que ele partir
novamente, você pode ir para lá.
— O quê? — lancei, meu tom de pura descrença, fios de pânico
enrolando-me, me cercando tipo novelos de teia de aranha. — Você está
querendo dizer que não tenho para onde ir? — a pergunta saíra mais como
um gemido do que uma dúvida.
— Não. — Ela rolou os olhos, impaciente, balançando a cabeça,
claramente bêbada. — É só por alguns dias…
— Alguns dias? — repeti, estupefata. Nunca tinha me visto tão tentada a
dar cabo de alguém quanto naquele momento.
O choque me atingiu mais do que deveria. Contudo, viera seguido de uma
cólera sem precedentes, que me fez cerrar os punhos com força para não
socá-la e trincar o maxilar a ponto de me fazer sentir dor, os lábios travados
numa linha dura.
Talvez fosse melhor assim e eu devesse manter a língua dentro da boca,
então respirar fundo, contar até mil e não permitir que o espírito homicida
que me rondava se apoderasse do meu corpo e me dominasse por completo.
Talvez devesse seguir minha vida, apenas virar as costas para aquela vaca e
partir, sem me preocupar em ser grata a alguém que não merecia nada de
mim, nem mesmo um segundo do meu tempo. Todavia, claro que não foi
como me senti.
— Você sabe que viajei o dia inteiro, sequer tenho um lugar para ficar,
porque estava confiante de que esse assunto estava resolvido! — gritei,
lembrando-a da minha situação, ainda assim Larissa não pareceu satisfeita. —
Por que não disse apenas que eu não poderia ficar na sua casa? Se tivesse
dito, teria dado um jeito e não a incomodaria! — fui ácida propositalmente, o
rosto repuxando em uma careta pirrônica. — Como espera que eu consiga me
arranjar em uma cidade que não conheço, depois da meia-noite? — foi o que
consegui perguntar, dado meu ceticismo, raiva e estupefação.
— Você não é idiota, prima, muito menos criança. Pode se virar sozinha.
— E sem mais, simplesmente partiu.
Continuei a encará-la enquanto se afastava, atônita, ainda afogada em
perplexidade, sem fazer ideia do que faria dali em diante. Eu simplesmente
não podia acreditar no que estava acontecendo.
Meu Deus! Como fui me meter naquela furada?
A música ao meu redor ainda pulsava, as pessoas amontoadas dançavam,
felizes, completamente alheias ao meu dilema. Se aquela garota odiosa que
compartilhava do mesmo DNA que o meu tivesse dito antes, teria
providenciado ao menos um hotel, mas não, ela quis me sacanear e além de
ter me feito esperar por horas, me dispensou, deixando-me sem teto algum
para passar a noite.
Tudo bem que eu tinha como me virar, na minha conta bancária havia uma
quantia razoável de dinheiro poupado e não me restaria apenas buscar abrigo
na rua ou em bancos de parques. Poderia procurar na internet por um hotel
decente e ir de Uber até lá, mas ainda estava chocada demais pela traição da
minha odiável prima.
Apesar de não estar muito entusiasmada com a ideia de viver sob o mesmo
teto que ela, tinha sonhado que as coisas seriam diferentes desde que tive o
resultado do concurso de publicidade do qual participei e, como prêmio,
recebi a oferta de emprego em uma das maiores agências de publicidade do
país. Era a oportunidade da minha vida, ter de conviver com ela, mesmo que
por alguns dias, já parecia ruim o suficiente. Todavia nada se comparava à
rasteira que minha própria prima me dera.
Filha da mãe asquerosa!
Decidida a não me acovardar diante da primeira pedra em meu caminho,
tornei a pegar minhas malas e segui adiante, navegando com dificuldade pelo
labirinto humano. A tarefa de passar por entre as pessoas se tornou árdua,
quase como mover rochedos, e a vontade era de gritar minha frustração, mas
concentrei-me apenas em sair do lugar o quanto antes.
Passando à entrada da boate, o orvalho fresco batizou-me com o perfume
noturno da cidade grande. Pisquei algumas vezes, completamente aturdida
pelo rumo que minha vida tomara. De tantas coisas que pensei enquanto
idealizava a primeira noite na capital, me ver sem lugar para ficar e sem
sequer saber para onde ir não era uma delas.
Soltando o ar com força pela boca, me vi fechar os olhos quando a mala
maior caiu no chão por causa do peso e cortou um belo talho no meu
tornozelo.
— Era só o que me faltava — deixei escapar, com um suspiro denso, e
tornei a arrastar as malas como se realmente tivesse algum lugar para ir.
Embora me encontrasse decidida a não me afastar muito da entrada, afinal,
a boate tinha ao menos os armários parados à porta para me manter em
segurança enquanto deliberava, precisava de um tempo para pensar
racionalmente em qual próximo passo daria.
Um carro com som alto passou por mim, os caras no interior deviam se
achar muito corajosos para soltar piadinhas escrotas e machistas direcionadas
a mim, mas ao contrário do meu normal, não dei um segundo de atenção.
Apenas o dedo do meio.
Um pouco longe, os sons de uma sirene transformam-se em minha mente
para um grito assustador e outro suspiro derrotado me escapou.
Em que merda você se meteu, Paula?
Sentia o corpo tremular devido à força da ira que o percorria. Em conjunto
com meu estado consternado, completamente mortificada, os sentimentos se
espalhavam pelas minhas veias como pólvora, deixando-me incapaz de
reagir. Isso tudo somado ao vento lambendo a ferida no meu tornozelo com a
língua gelada, fazendo-me arrepiar e tudo se tornar ainda mais intenso,
assustador.
Nunca estive sozinha antes. Especialmente em uma cidade estranha, onde
não conhecia ninguém e sem ter ou fazer ideia para onde ir. Via-me perdida,
presa numa armadilha, e pela primeira vez na vida tive noção do mundo cruel
que me abria os braços nefastos.
Um casal à minha esquerda ria enquanto se abraçava e resfoleguei,
invejando a alegria deles. Tinha que fazer alguma coisa para resolver minha
situação de merda, não podia ficar simplesmente parada.
Um sinal divino, foi o que acreditei ser, ao ver Caio. Acompanhado da
ruiva magra, que tinha visto no colo dele mais cedo, ele parecia ainda mais
impressionante fora da penumbra da boate.
E feito uma mariposa atraída pela luz, nossos olhos se encontraram, a
energia refletida naquele instante ocasionando uma descarga elétrica
emocionante pelo meu corpo. Não os desviamos, até que o dele desceu para
minha mala, um vinco se formando em sua testa, os lábios franzindo em
seguida. Tentei conter a sensação de explosão no estômago pelo calor que me
acometeu, mas fora em vão. Sobre os saltos estúpidos que calçava, escorei-
me na alça da mala como se, de repente, minhas pernas tivessem se
transformado em gelatina.
Caio sussurrou algo no ouvido da mulher e decidi fingir costume,
demonstrando uma naturalidade que estava longe de sentir. Afinal, era uma
sem-teto cheia de malas no meio da rua, morta de fome e ainda por cima
estava sangrando.
Com uma elegância calculada, ele se deslocou até findar a distância entre
nós. Então impôs sua presença, tamanho e sedução, tão malditamente
próximo e intoxicante, que fui forçada a levantar os olhos para encarar os de
lince.
— Nos encontramos novamente, linda — o tom de Caio era calmo,
levemente rouco, contrariando o sorriso torto, um tanto arrogante, mas que
ainda assim me desarmara completamente.
Por sobre o ombro do cara, assisti ao momento que a ruiva magricela
voltava para a boate batendo os pés, uma verdadeira criança mimada que
perde o jogo. O que acontecera. A conclusão de que a garota fora dispensada,
inevitavelmente, me fez sorrir, embora não entendesse por qual motivo
sentia-me regozijada.
— Você decepcionou a mulher — provoquei quando voltei a encará-lo,
elevando o queixo, embora a perplexidade moldasse cada sílaba.
Ele não era um maldito jogador?
— Ela sobreviverá. — Ele parecia animado demais para quem recusara
uma transa e o tom levemente debochado nem tentou disfarçar o quanto.
Incerta, procurando-me blindar da névoa de sedução que o cara projetava,
cruzei os braços quando dirigiu-me um sorriso de canto, os olhos um tanto
enigmáticos, e sem pedir licença simplesmente pegou minhas malas. — Além
do mais, prefiro mesmo ter você como companhia, minha linda.
Um detetive de uma série de histórias de ficção.
CAIO
CAPÍTULO
DOIS
— Nem acredito que você me fez assistir a esse filme meloso — Caio
resmungava enquanto saímos da sala de cinema depois do final da sessão e
adentrávamos os corredores do shopping lotado.
— A ideia do cinema foi minha. Minha sugestão de saída, minha escolha.
Além do mais, eu bem vi o momento em que você tentou esconder que
limpava as lágrimas — apontei, antes de cair na gargalhada, e o vi fazer uma
careta emburrada.
— Nada disso. Eu… eu apenas enfiei o dedo no olho sem querer —
desconversou, se mostrando verdadeiramente constrangido, o que me fez rir
ainda mais.
— Deixa de ser ridículo, seu mentiroso. Você chorou sim! — Empurrei-o
com o ombro e ele revirou os olhos antes de enrolar o braço em volta da
minha cintura, juntando meu corpo ao dele.
— Você nunca vai ouvir uma confissão dessas vindo de mim — brincou e
foi a minha vez de revirar os olhos.
Homens!
Estava prestes a retrucar, porém, naquele instante, uma senhora bonita e
muito bem vestida passava perto da gente. Ela poderia passar despercebida
por mim como todos os outros transeuntes do shopping, no entanto a maneira
que nos encarava, especialmente a colocação estratégica do braço de Caio ao
meu redor, a fizerem estreitar os olhos. Instintivamente me indaguei o que
aquilo significava, mas dei-me conta rapidamente que ela talvez o conhecesse
e tive aquela certeza quando parou diante de nós. Caio paralisou, meio pálido,
o corpo de alguma maneira tornando-se tenso quando a ouvi limpar a
garganta.
— Olá, filho — o cumprimento saiu frio como aço, e ele suspirou,
profundamente.
— Oi, mãe — Caio respondeu enquanto me vi aturdida, piscando
demasiadamente.
Ai. Meu. Deus.
— Depois de um dia me ignorando, deveria era te dar uns bons tapas,
menino. — O timbre grave de mãe zelosa e um tanto decepcionada estava lá,
claro, e tive que reprimir o riso que ameaçou me escapar.
Caio era o filhinho da mamãe! hahahahahaha
— Mãe! — Caio gemeu, em pura vergonha, como se estivesse
constrangido demais ao se ver sendo censurado pela mãe em público. Com
todo aquele tamanho e opulência, era difícil vê-lo naquele papel. O que,
admito, só tornava a situação ainda mais engraçada.
— Nada de “mãe” com esse tom de quem não quer ouvir algumas
verdades. Fiquei tão nervosa pelo seu descaso, que tive que vir ao shopping
fazer umas compras para aliviar. — Dramática, ela apontava para as sacolas
de grife penduradas no braço, e mordendo os lábios para não rir, vi Caio
revirar os olhos.
— Deixa de ser exagerada, mãe. Você só me ligou uma vez e foi quando
eu estava no cinema. Por isso que não atendi. E a senhora fala como se
precisasse se decepcionar comigo para ficar torrando dinheiro, deixando o
povo do cartão de crédito louco! — Ele bufou, sarcástico, demonstrando o
desgosto pelo exagero dela.
— Uma vez, mas eu poderia estar morrendo e você jamais se perdoaria por
isso. — Abanou uma das mãos, em sinal de descaso, ainda assim, a expressão
descontente de Caio não se aliviou. — E não me julgue, é pecado! Em todo
caso, eu te perdoo. Claro, se for amanhã no almoço em família… —
Encarando o filho com um olhar pidão claramente teatral, ela aguardava por
uma resposta, que veio com um aceno nem um pouco feliz e lhe arrancou um
sorriso exultante.
A mulher era mesmo linda. Elegante, com um sorriso simpático.
Exuberante como poucas que já conheci. E quando a atenção dela voltou-se
para mim, eu estava morta de vergonha, sem fazer ideia de como agir.
Definitivamente não estava esperando por aquele encontro, e, pelo visto, os
dois também não, dada a reação de Caio à chegada da mãe e o olhar
estupefato dela ao nos ver de longe.
Sem deixar de me analisar com interesse genuíno, a bela mulher em minha
frente parecia esperar que Caio dissesse alguma coisa e me senti ainda mais
desconfortável, porque a última coisa de que gostaria era forçar uma situação
entre a gente.
— Paula, essa é minha mãe, Ana Célia. Mãe, essa é a Paula… Uma amiga.
— ele rapidamente completou e me vi forçando um sorriso.
Claro que não gostei de como se referira a mim. Era ridículo, claro, porque
nem mesmo amigos erámos, afinal, nos conhecíamos há menos de um dia,
mas dada a intensidade com que tudo nos aconteceu, era como se aquele
encontro tivesse sido há tempos, embora pouco soubéssemos um do outro,
ainda assim aquilo doeu. Tentei manter a naturalidade, fingir que aquela
situação não era nada de mais, mas não era fácil. Em especial porque eu
parecia passar pelo escrutínio rigoroso da mãe do homem para quem eu
mentia descaradamente para tentar conquistar.
Os olhos dela estreitaram-se um pouco mais enquanto ela ainda parecia me
analisar, sentindo que aquela situação não podia ficar mais constrangedora,
me afastei de Caio e dei um passo à frente, estendendo a mão para
cumprimentá-la, e senti o rosto esquentar na mesma hora. No entanto a
atitude dela me surpreendeu:
— É um prazer, querida. — Ignorou meu gesto e beijou cada lado do meu
rosto, envolvendo-me em uma nuvem de Chanel n° 5 e pegando-me
completamente desprevenida, abraçou-me com carinho em seguida, como
alguém que matava as saudades de uma pessoa querida que não via há muito
tempo.
O sorriso dela não saiu do seu rosto quando nos afastamos e ela olhava de
mim para o filho, provavelmente fazendo suposições equivocadas sobre nós.
Sorri sem jeito, contudo, não me atrevi a corrigir qualquer que fosse a ideia
dela. Até porque se ela fizesse o estilo mulher romântica como a minha mãe,
e eu acreditava que sim, ela já estava planejando casamento e netos, e eu não
me atreveria a desiludi-la, coitada. Mas claro que aquilo não tinha nada a ver
comigo.
Claro que não! Eu nem mesmo queria aquilo, certo? Sim, certo!
Não mesmo. Casamento nunca esteve em meus planos. Sempre fui
diferente das garotas que conheci, que tinham essas fantasias de menina boba
de encontrar o príncipe encantado. A bem da verdade, dentro de casa eu tinha
um exemplo de por que não deveria ser daquele jeito, afinal, o constante
troca-troca de homens e as desilusões da minha própria mãe eram o principal
motivo para eu ser tão cética quando o assunto era amor.
Passei a vida toda me dedicando para ir longe, para fazer a minha vida por
mim mesma, e isso, definitivamente, não incluía marido ou filhos no pacote.
Não que não pudesse ter tudo aquilo mais tarde, só que estava longe de ser o
momento ideal, em especial por ser tão nova, com tanto pela frente, e estar
apenas no início da minha carreira profissional. Ademais, eu mal conhecia o
cara. Sim, queria ficar com ele, contudo, sonhar com um conto de fadas era
ridículo, para dizer o mínimo.
— Caio, por que você não leva sua amiga no almoço de amanhã? Nós
ficaremos felizes em recebê-la! — a mãe dele sugeriu, e ainda que não tivesse
tirado por um só segundo o sorriso simpático do rosto, não perdi a forma um
tanto irônica que ela impôs na palavra amiga e em como seu lábio se contraiu
um pouco enquanto o fazia.
— Não sei, mãe… — Caio deixou a frase no ar, mas estava mais do que
claro o quanto estava desconfortável com a sugestão, e eu ainda mais, mas,
sorrindo, tentei ignorar aquele aperto doloroso sentido no peito o gosto
amargo da decepção.
Não seja ridícula, Paula! Pare com essas fantasias de menina boba já!
Sem fazer questão de ser discreta, a mãe dele limpou a garganta e o cortou
com um olhar mortal, como se desaprovasse o fato de Caio não me querer
junto à família. Embora me sentisse um pouco miserável com aquele fato,
ainda assim me senti na obrigação de defendê-lo.
— Desculpe, dona Célia, agradeço o convite, foi muito gentil da parte da
senhora, mas infelizmente vou ter de recusar. Amanhã tenho… uma coisa
para fazer — menti, forçando ainda mais um sorriso, esperando em Deus que
a desculpa fosse o suficiente para me livrar daquele compromisso indesejado.
Não era bem uma mentira, afinal, eu realmente tinha pretensão de ir em
busca de um lugar para morar, já que tinha prometido a Caio que não ficaria
no seu apartamento por muito tempo. Contudo, não tinha planejado nada
ainda, pois acontecera tudo muito rápido desde a minha chegada, e dada a
situação atual, achei ainda mais providencial. Eu precisava mesmo separar
uma coisa da outra.
— É uma pena, querida. Mas espero, sinceramente, que possamos nos
encontrar em uma nova oportunidade em breve — emitiu em sinceridade, e
embora tivesse devolvido o sorriso que recebi, esperava não ter deixado
transparecer o quanto não estava à vontade com aquela mera sugestão de
reencontrá-la. — Falar em oportunidade, Caio, você esteve com seu irmão
desde que ele chegou de viagem com a Mona? — ela mudou de assunto num
piscar de olhos, felizmente revertendo minha atenção para saber um pouco
mais da vida familiar de Caio.
— Não, mas devo vê-lo segunda-feira na empresa. — Ele pareceu
desconfortável sobre os próprios pés, e ao notar ser observado, recebi um
olhar sem jeito em troca.
— Vocês são irmãos, deviam passar mais tempo juntos — a mãe dele
começou a se queixar, ignorando a postura cada vez mais tensa do filho
enquanto prosseguia: — A Mona trouxe presentes para todos nós — ela
tagarelava de forma animada e praticamente não pisquei assistindo à reação
de Caio. — Além do mais, você sabe que eles estão tentando engravidar —
sussurrou como uma confissão, e Caio engoliu em seco, olhando para as
pessoas que passavam, e não para a mãe. — Deve imaginar o quanto esse
assunto é delicado para ela. O apoio da família é importante, sabe disso.
— Amanhã estarei lá, mãe. Não se preocupe. — Ele voltou a segurar a
minha mão e de alguma forma me senti estranha quando o fez. Caio
claramente tinha problemas com a família, mas até então, quem não tinha?
Mas por que por algum motivo me senti incomodada? — Que todos nós
possamos ser felizes. — Os olhos dele buscaram os meus e alguma coisa
brilhou nas duas safiras de um tom impressionante azul.
E, Deus, como assim eu queria ser feliz com ele?
Em um mundo perfeito, nada seria como era. Caio não seria um jogador e
eu não fingiria ser uma assanhada em busca treinamento, não quando meu
único objetivo em toda aquela história de aprendizado era ficar com ele.
Suspirando profundamente, tive que piscar rapidamente ao dar-me conta,
talvez pela primeira vez, de como queria que aquela mentira desse certo.
Afinal, seria muito mais fácil se estivéssemos entrando naquilo querendo a
mesma coisa.
— Vai dar tudo certo — soltei em um fio de voz, esperando que a mãe
acreditasse que me dirigia a ela, mas era sobretudo para mim. Eu queria
mesmo que desse certo e aquele desejo apenas se intensificou ainda mais
quando o olhar de Caio não desgrudou do meu.
Eu só esperava não me decepcionar…
CAIO
CAPÍTULO
OITO
Encontrar minha mãe durante a minha saída com a Paula estava na minha
lista de coisas inesperadas. Não foi apenas constrangedor ou estranho, foi
meio que… por falta de palavra melhor, bizarro. Eu a amava, mas dona Ana
Célia tinha uma certa tendência a ser exagerada, sobretudo quando o assunto
eram os filhos.
Apertando o volante com mais força do que deveria, tentei não pensar
mais sobre o assunto. Não queria ter envolvido, mesmo que sem querer, a
Paula naquilo. Até porque agora minha mãe com certeza viria à minha
procura esperando saber mais dela e passaria a idealizar um relacionamento
que nem mesmo eu sabia para onde iria.
— Sua mãe parece legal — Paula cortou o silêncio constrangedor que
pareceu nos rodear desde que saímos do shopping e entramos no carro. Eu
tinha planejado levá-la a um restaurante para jantar, com a desculpa de ser
mais um tópico de ensino, contudo mudei de ideia e achei que o melhor
mesmo seria ir para casa.
— Sim, ela é — concordei e, virando para encará-la, recebi um sorriso
tímido em resposta.
Podia imaginar o quanto tinha sido ainda mais constrangedor para ela do
que fora para mim, afinal, qual mulher ficaria confortável com um encontro
daqueles? Até mesmo senti pena, porque minha mãe podia ser bem
determinada e intensa quando queria. A bem da verdade, a situação pareceu
pior não porque não queria que se conhecessem ou não a quisesse envolvida
com a minha mãe ou algo assim, apenas queria entender primeiro aquilo que
tínhamos antes de misturar as coisas.
Ainda que Paula dissesse me querer apenas com intuito acadêmico, eu
secretamente desejava que fosse mais do que aquilo. E acreditava estar no
caminho certo, porque tudo entre a gente deixava aquilo claro. Não era só
química, era mais. Embora na maioria das vezes as cenas pornográficas que
costumavam se desenrolar na minha mente fossem impossíveis de evitar.
Paula era como a porra de uma fantasia adolescente que ganhara vida, e tê-
la por perto, com os cabelos soltos, o rosto quase sem maquiagem, vestida
sem intenção alguma de ser provocadora e ainda conseguindo parecer como
uma supermodelo sexy, faziam-na cada vez mais irresistível aos meus olhos.
O celular vibrou no bolso do meu jeans, mas como estava dirigindo, o
sistema do carro conectou-se automaticamente a ele e o painel iluminou com
o nome da pessoa que não deveria ter a cara de pau de me ligar depois de
tudo ou sequer deveria pensar em fazê-lo.
Merda!
Fui rápido em rejeitar a ligação, esperando que Paula não tivesse visto ou
sequer prestado atenção naquele detalhe, mas dada a minha sorte, não tinha
tanta certeza. Nervoso como apenas aquela filha da mãe parecia ser capaz de
me fazer sentir, aumentei a pressão no volante enquanto tentava normalizar a
respiração. Sentia o sangue correndo frio em minhas veias e o coração quase
na boca, sensações nada boas, que eram especialidade dela. Embora fizesse
questão de rechaçá-la quando me obrigava, não costumávamos nos falar e
dificilmente ela me ligava. Não que fizesse questão daquilo, claro. Entretanto
não podíamos ter tudo na vida e desde que terminamos a única coisa que
desejei foi que me deixasse em paz.
— Não se preocupe comigo, pode atender, Caio. — Paula me analisava
com atenção e suspirei, desgostoso.
— Não. Não é importante — murmurei de volta e limpei a garganta um
tanto incomodado, esperando que a resposta fosse o suficiente para ela. O que
felizmente pareceu ser, dada a forma como ela pareceu à vontade a seguir.
— Então, conte-me tudo sobre sua família. — Os olhos cálidos me
encararam em expectativa para que eu falasse e foi impossível não sorrir,
apesar do assunto.
A última coisa que queria era falar da minha família, principalmente
quando havia nela muita coisa que não gostaria que soubesse. Dividindo a
atenção entre ela e o trânsito, comecei a me perguntar se me envolver com
Paula era a coisa certa a se fazer. Há anos que não me envolvia com ninguém,
contudo, ainda não sabia até onde poderíamos e, claro, ela também queria ir.
Por isso hesitei por um momento, buscando mil formas diferentes de falar
sobre aquilo com ela, especialmente quando havia prometido para minha mãe
que iria vê-los no dia seguinte. Por mais que pudesse ser um almoço
tecnicamente inocente, ainda assim era complicado quando havia um passado
envolvido, um que era sobretudo difícil de ignorar. E mediante a notícia que
minha mãe dera mais cedo, eu sabia que para eles aquele seria o assunto da
vez.
— Tenho dois irmãos, pode-se dizer que sou o do meio. — Meneei a
cabeça, tentando controlar o desconforto. — E você? — Aproveitando-me do
pequeno congestionamento, virei-me, à espera de uma resposta.
— Nenhum irmão. Deve ser legal ter dois irmãos. — Ela sorriu outra vez e
acabei bufando, com ironia.
— Deve ser legal ser filha única — fiz questão de corrigi-la e ela pareceu
não perceber o quanto a afirmação não poderia ser mais verdadeira.
— E o seu pai? — animou-se a perguntar, completamente alheia ao meu
incômodo, contudo senti-me aliviado quando a conversa passou a ir para um
caminho mais seguro.
— Meu pai se aposentou há pouco mais de um ano e desde então dedica-se
aos seus hobbies, que inclui golfe e viajar com minha mãe. Ele é bem na dele,
embora seja do tipo homem de família, assim como minha mãe, gosta de ter
os seus ao redor. A família é tudo para o velho, assim como a esposa, a quem
ele tem num pedestal. — Sorri, porque a afirmação não podia ser mais
verdadeira, e prossegui, meneando a cabeça: — Falar em minha mãe, me
desculpe caso ela tenha te deixado constrangida.
— Tudo bem. — Abanou uma das mãos em sinal de descaso e tive que
segurar o riso, porque ela era uma péssima mentirosa. Claro que ela tinha
ficado, só era muito educada para dizer que estava com medo do tornado
mais conhecido como minha mãe. — Mas você ficou incomodado? — ela
quis saber, analisando-me com atenção, ao mesmo tempo em que mordia o
lábio, daquela forma adorável e sexy para caralho. Era quase como um
convite ao qual estava sendo obrigado a resistir.
— Não, não fiquei. — Não como ela pensava, certamente. Voltando a
atenção para o trânsito, que resolvera andar um pouco, não contive a
curiosidade: — E você? Como é a relação com a sua família?
— Bem, como eu já disse, minha mãe é uma romântica incurável, embora
a vida já tenha lhe dado muitos motivos para desacreditar. Uma coisa é certa,
ela é perseverante, afinal, já se casou umas cinco vezes, fora uma quantidade
exorbitante de namorados que teve. Felizmente só teve a mim de filha, senão
seriam mais pessoas com propensas complicações psicológicas por causa dos
problemas paternos. Apesar de ser muito diferente de mim, nos damos bem,
mesmo tendo nossas divergências. Divergências estas que se dão
principalmente porque na maioria do tempo eu pareço mais a mãe dela, e não
o contrário. Não conheci meu pai, minha mãe disse que ele era cantor de uma
banda na região e deu no pé quando descobriu que ela estava grávida. Então
não ficaria surpresa caso descobrisse que tenho uma caralhada de irmãos. —
Os lábios dela franziram-se em um ricto nervoso, ao passo que observava a
unha com interesse fingido, tentando demonstrar uma naturalidade que estava
longe de sentir. E olhando para ela com atenção, a notei pela primeira vez
com outros olhos, percebendo o quão parecidos erámos.
Apesar de negar, erámos duas pessoas feridas que sorriam fingindo não
dar a mínima ao que nos machucou. Embora por motivos diferentes e mesmo
que tivesse tido o que Paula não teve, entendia sua dor. Ela não era daquele
jeito apenas por ser uma jovem obstinada, que não acreditava no amor, na
verdade, ela não tivera aquela chance, pois deixou de acreditar quando soube
que a pessoa que mais deveria amá-la fugiu e não deu a ela o que merecia e
precisava.
E agora, mais do que nunca, eu tinha a certeza de que Paula merecia sentir
que era um ser especial. Ela merecia alguém que preenchesse todo vazio
habitado em seu peito outrora, alguém que a amasse verdadeiramente, que a
adorasse, que a fizesse feliz, capaz de colocar o mundo aos seus pés. Ela
merecia muito mais e não uma mísera vida de libertinagem, de encontros de
uma noite só, com homens estranhos e aleatórios.
A minha vontade mesmo era de ir até ela e abraçá-la, contudo o momento
não permitiu. Embora sentisse meu corpo inteiro implorando, ardendo para
tocá-la.
— Não me olhe com essa cara! — Apontou o dedo, parecendo deveras
irritada, e icei a sobrancelha, sem entender.
— Que cara? — indaguei, um tanto confuso, e ela bufou, danada da vida.
— De quem sente pena de mim. — Arregalei os olhos de pronto, chocado,
porque não era bem como estava me sentindo. E estava prestes a lhe dizer
aquilo, quando ela me cortou com um gesto reprovador: — Por isso que eu
digo que o final feliz só pode ser assim quando se é feliz consigo mesmo. O
amor é para os tolos, lembra? Se você não der o coração, ninguém tem o
poder de quebrá-lo. E só um tolo dá o que é mais vital em sua vida, certo?
Meu coração pareceu perder uma batida, para em seguida capotar. Ela
estava certa. Como um tolo, eu havia dado aquele poder a alguém uma vez,
para no fim recebê-lo de volta em pedaços. Por isso que decidi que jamais
cometeria aquele erro, afinal, a vida é como uma parada de ônibus, se você
pisca pode perder a chance de pegar o próximo coletivo e ser tarde demais.
E eu teria coragem de dar aquele poder a Paula?
Depois de alguns minutos em silêncio, com cada um de nós parecendo ter
coisas demais para pensar, finalmente estacionei na garagem do prédio. Ao se
dar conta de que chegamos, Paula suspirou e então sorriu, aliviando o clima,
e ante aquele sorriso perfeito, pela primeira vez em muito tempo senti como
se estivesse fazendo algo certo. Foi quando me dei conta de que eu não
apenas já havia dado aquele poder a ela, como também queria ser aquela
pessoa capaz de lhe dar tudo que merecia.
— Hoje tivemos nossa pequena lição sobre amassos, e como seu professor
posso garantir que passou com êxito — falei, em tom de brincadeira, e Paula
gemeu em pura vergonha, escondendo o rosto entre as mãos, mortificada. —
Contudo, posso te dar um ponto extra, caso me mostre o que aprendeu —
lancei, sugestivo, e Paula tirou a mão que encobria o rosto, para me encarar
com um sorriso provocador, olhando-me como quem havia gostado da
sugestão.
— É uma proposta bastante tentadora, professor. Caso não tenha te dito
ainda, sempre fui o tipo de aluna nerd, que não aceitava menos do que uma
nota dez. Então um ponto extra não é nada mau — balbuciou em resposta,
enquanto nos aproximávamos um do outro e então meus lábios se encontram
com os dela em um beijo suculento.
Em um movimento rápido, trouxe-a para o meu colo outra vez e, lutando
contra o gemido que ameaçava me escapar, deliciava-me com seu sabor
levemente adocicado. Pareceu impossível conter as comportas do turbilhão
de emoções que ela me causava, por isso não me importei em deixá-las seguir
o curso. Já era até mesmo possível sentir as muralhas em torno do meu
coração começarem a desmoronar. E isso foi bom. Assustador, mas bom.
Paula Maia mal havia entrado naquela batalha e já havia mostrado que
estava nela não para outra coisa, a não ser vencer. E nem mesmo precisou de
artilharia pesada, pelotão especializado, militares invasores, trincheiras
fortificadas nem nada do tipo, a própria magia dela estava fazendo o mais
ímpio dos soldados se render.
No dia seguinte, acabei indo cumprir o que prometi à minha mãe, e depois
do desastroso e desconfortável almoço na casa dos meus pais, acabei
convocando reforços e liguei para o meu melhor amigo, para um chope no
final de tarde daquele domingo nublado, assim como o meu humor.
— Não precisa nem dizer, com essa cara tenho certeza que está voltando
da mansão D — Rodrigo soltou ao se aproximar, sentando-se em uma das
banquetas ao meu lado. Mansão D era como ele chamava a casa onde cresci,
porque dizia ser muito fresco utilizar o sobrenome completo, ao invés da
primeira letra, como ele o fazia. — Por ter me chamado aqui, a ida até lá deve
ter sido tão satisfatória quanto uma ida ao proctologista para fazer
colonoscopia.
Bufei, sarcástico, demonstrando meu desgosto. Não precisava mesmo falar
nada, Rodrigo não era meu melhor amigo à toa, nossa amizade começou há
tanto tempo que nem me lembrava. O cara me conhecia mesmo como
ninguém e era a única pessoa com quem dividi certos detalhes da minha vida.
— Dizer que foi ruim é um eufemismo. — Enquanto o moreno alto, com o
cabelo raspado e duas vezes o meu tamanho ria, aproveitei para pedir mais
um chope para mim e um para ele.
— O que aconteceu dessa vez? — Ele sorveu um longo gole da bebida
gelada que fora rapidamente colocada à sua frente, antes de prosseguir: —
Cauã finalmente conseguiu o intento de beijar o próprio rabo?
— Por aí — me limitei a resmungar, emburrado, bufando em seguida,
porque não queria trazer novamente aquele almoço caótico à mente.
— Ela é foda! — ele soltou sem hesitar, a simples menção dela, mesmo
sem precisar pronunciar o nome, me trazendo um desconforto sem tamanho.
— Falando nela, ela te procurou?
— Me ligou ontem, mas não atendi.
— Vadia! — proferiu, sem qualquer constrangimento.
Apesar do almoço ter sido uma dor nos colhões, era em Paula que eu me
via pensando, pois de alguma forma ela parecia ter o poder de melhorar as
coisas.
— Eu já ameacei inúmeras vezes contar a verdade e se ela me procurar
mais alguma vez, será meu último aviso. Realmente o farei, sem pestanejar
ou me importar com as consequências.
Olhando-me como se tivesse descoberto uma rola na minha cara, Rodrigo
fitava-me, assustado.
— Cara, essa é nova. — Levando o copo à boca outra vez, ele tomou um
longo gole e eu o imitei, enquanto esperava que continuasse: — O que
aconteceu para que finalmente você tenha ganhado suas bolas de volta? —
indagou, curioso, e foi impossível conter o sorriso que tomou conta do meu
rosto.
Claro que eu poderia mentir. Até cheguei a cogitar a hipótese. E se fosse
outra pessoa ali, qualquer outra, era exatamente o que eu faria. Contudo,
Rodrigo era meu melhor amigo, não havia motivos para esconder, por isso
contei a ele toda história sobre Paula.
— Isso é sério? — emitiu em surpresa quando terminei de contar,
deixando transparecer o quanto parecia achar aquela ideia absurda.
— E por que não seria? — Dei de ombros e ele sacudiu a cabeça,
discordando.
— Sei muito bem como isso vai acabar — o tom sisudo e o sarcasmo
habitual de quem sabia o que falava estavam presentes, assim como o aviso
férreo feito de forma subliminar.
— Não começa. — Virando o resto da bebida do meu copo, notei uma
morena do outro lado do bar abertamente molestando-me com os olhos, e
apesar de muito bonita, eu preferi ignorar. E não apenas porque havia feito
um acordo com Paula sobre não ter outras pessoas, mas, sim, porque não
havia um real interesse em outra que não ela.
— Caio…
— Relaxa, tá? — tratei logo de cortá-lo.
Rodrigo poderia estar certo e ela talvez não fosse nada além de problemas.
Mas talvez ela também fosse exatamente um problema, e eu, a solução dele.
PAULA
CAPÍTULO
NOVE
O domingo foi diferente de tudo que esperei que fosse. Apesar de ter visto
Caio no café da manhã, para cumprir a promessa de lhe fazer o desjejum, não
o vi depois disso. Passei o restante do turno matutino procurando na internet
imóveis para alugar e depois de selecionar alguns e marcar com os
respectivos corretores, fiz um almoço para mim e então saí para ver os
imóveis em questão.
Embora dirigir nas avenidas congestionadas de uma cidade grande pudesse
parecer um tanto intimidador, passei a maior parte do tempo lamentando não
ter um carro, porque o que eu tinha dividia com minha mãe e não poderia
deixá-la sem nenhum, quando aqui eu poderia utilizar de todos os tipos de
transporte urbano que uma metrópole podia oferecer. Contudo, pareceu ainda
mais assustador pegar o metrô, coisa que eu eventualmente teria que aprender
a fazer, já que não podia ficar gastando o pouco dinheiro que tinha com Uber.
O perigo mesmo nessas viagens acabou por ser eu me vendo pensar
demais sobre Caio e não sabia se aquilo era uma coisa realmente boa. Não
estava apaixonada, não podia estar. Eu o queria, claro. Gostava de estar com
ele. O que sentia era tesão, certo? Uma forma de vencê-lo no próprio jogo,
não é? Mas se fosse sincera comigo mesma, talvez não fosse tudo. Afinal,
passei a vida toda acreditando no quanto se sentir daquele jeito por alguém
poderia ser nocivo. Sim, era apenas isso. Não poderia permitir que uma ilusão
nascida do desejo pudesse me guiar e muito menos atrapalhar meus planos de
conquistá-lo.
♥
Depois de passar o resto da tarde perdendo tempo com a minha busca de
um imóvel para morar, voltei para meu apartamento provisório. Durante o
banho, comecei a me perguntar se estava fazendo a coisa certa, já que mesmo
que não me conhecesse, Caio havia estendido a mão e me dado um teto para
morar.
Afinal, eu estava realmente tentando enganá-lo? E por que razão? Para
ter um namorado? Era mesmo o que eu queria?
Talvez estivesse fazendo tudo errado. Afinal, como poderia um
relacionamento dar certo, quando começava errado? Porque era exatamente
isso que eu estava fazendo, enganando-o. O que fazia de mim uma pessoa
não muito boa. Sim, estava atraída por Caio e nunca tinha acontecido antes.
Embora tenha lhe dito querer ser uma espécie de vadia sem coração, não
podia continuar mentindo mais, já que a única pessoa que queria era ele.
O trabalho começaria no dia seguinte, então me concentraria nele, na
minha carreira e provavelmente esqueceria aquela ideia estúpida de
conquistá-lo e talvez até mesmo faria com que meus níveis hormonais
voltassem ao normal. Até porque, eu pretendia mesmo sair dali o quanto
antes, o que tornaria praticamente impossível uma convivência com Caio.
Sim. Tudo voltaria ao normal e aquela loucura seria deixada para trás!,
foi o que repeti para mim durante um tempo, mas acabei por esquecer quando
tornei a vê-lo aquela noite.
Era um pouco depois das sete da noite quando Caio me mandou uma
mensagem me convidando para jantar. Eu não estava com muita vontade de
cozinhar, além do mais, se fosse sincera comigo mesma sentia falta dele e
achei que aproveitar o resto do tempo que tínhamos juntos não seria nada de
mais, então quando isso aconteceu, acabei aceitando.
O jantar foi agradável e divertido, como era sempre ao lado dele. Contudo,
algo pareceu mudar em algum momento entre Caio pagar a conta e entrarmos
no carro, porque ele simplesmente acelerou como se estivesse em uma
emergência e dei graças a Deus por estar usando cinto de segurança, caso
contrário, tenho a impressão de quer iria dar de cara com o para-brisa e
comecei a rezar para que nenhuma força física fosse a causa da minha morte
prematura.
Passei o restante da viagem em silêncio, meio assustada, admito, afinal,
ele poderia estar começando a se revelar um maníaco psicopata, então era
melhor não arriscar a minha sorte. Quando Caio finalmente estacionou na
garagem, resfoleguei, agradecendo a Deus por aquele livramento, contudo, o
alívio logo passou, quando ele veio abrir a porta e me ajudou a sair do carro,
como se de repente eu precisasse da sua ajuda.
— Er… Desculpa… Mas é agora que você vai mostrar sua outra face e me
dizer sobre seu plano maníaco sexual para com a minha pessoa? — perguntei,
rindo e chorando ao mesmo tempo, começando a ficar um pouco preocupada
demais com seu rompante. E o fato de ele rir não ajudou em nada.
— Você é engraçada. — Caio meneou a cabeça, ainda rindo, e minha
expressão apreensiva não se aliviou.
— Tinha alguma coisa na sua bebida que não tinha na minha? — testei,
estreitando os olhos em direção a ele, quando entramos no elevador, e passei
a ponderar se aquilo era mesmo seguro.
— Isso é sério? — ele quis saber, sem tirar o sorriso animado do rosto, e
dei de ombros. — A única coisa que poderia me entorpecer, está aqui diante
de mim — admitiu, baixinho, depositando um beijinho demorado nos meus
lábios que tornaram-se de repente sedentos.
Tentei manter a naturalidade, afinal, estava começando a gostar realmente
daquele lado dele sincero e fofo. Ao menos era o que meu coração disparado
dizia. Fizemos o resto da viagem em silêncio e quando chegamos ao segundo
andar, eu mordia os lábios, ansiosa pelo que viria enquanto abria a porta. E
por mais que achasse aquilo emocionante, comecei a sentir um pouco de
medo. Afinal, talvez significasse que meu plano estava dando certo, contudo,
também significava que eu gostava mais dele do que queria admitir.
Merda! Como pude deixar aquilo acontecer? E tão rapidamente?
Fechando a porta atrás de si, como uma ave de rapina, Caio aproximou-se
devagar, me puxando para ele em seguida, segurando meu queixo, a fim de
que pudesse encará-lo.
— Não vai perguntar qual a lição de hoje? — balbuciou a pergunta e com
seu talento sedutor, abaixou o rosto, juntando-se ao meu, e engoli em seco.
Não sei o que eu esperava naquele momento, talvez alguma coisa mais
romântica envolvida, contudo o desejo que via nos olhos dele parecia um
meio caminho para o que eu desejava. E uma frase que li no para-choque de
um caminhão uma vez me veio à mente e nunca pareceu fazer tanto sentido:
“Um ‘eu te amo’ pode ser falso, mas um pau duro sempre será sincero”.
Que horror! Era péssimo, eu sei!
Certo, um pau duro é apenas pau duro, oras, não é demonstração de
afetividade, mas de excitação. Contudo, eles podem falar “eu te amo” da boca
pra fora, só pra conseguirem certas coisas e, ainda assim, não deixa de ser
falso. Pode parecer bobagem, mas naquele instante pareceu ser o primeiro
passo. Um meio para o fim.
— Tenho certeza que você me dirá. — Tentei fingir uma naturalidade que
estava longe de sentir e, quando me desvencilhei dele, Caio me puxou de
volta, o corpo gostoso e visivelmente excitado provando-me estar certa com
minhas suposições… Ou ao menos parte delas… Uma parte bem dura, devo
ressaltar.
— Tudo começou com o jantar. — Um sorriso perverso se formou nos
lábios dele, ao mesmo tempo em que as sobrancelhas escuras se arquearam
em um V acentuado e como se fosse possível, ele pareceu ainda mais lindo.
— Foi? — quis ter certeza e chiei quando me apertou pela cintura.
— Foi. Sem que soubesse quis testar o quanto sua presença e falta de
interesse podem impactar o sexo masculino ao redor. E a maneira despeitada
com que as mulheres a encaravam, te garantiram um ponto bônus. — Ele deu
de ombros, mordendo os lábios, e abri e fechei a boca, sem saber ao certo o
que dizer. — Não há nada mais sexy do que uma mulher indiferente ao
quanto impacta os outros com a sua beleza. Você não sabe o quão animado
me deixou por isso.
Não, eu sabia. Estava sentindo aquela “animação” naquele momento!
— Paula — meu nome foi dito em um timbre que me arrepiou a nuca e
apensar com aquelas piscinas que me bebiam, tinha a sensação de estar
prestes a derreter. Especialmente porque o clima mudara de repente. — O que
quer mesmo de mim?
A pergunta só não me surpreendera mais do que a sinceridade na voz dele.
Algo cru, de um jeito com o qual eu não tinha estado de frente ainda. Era
como se houvesse alguma coisa que eu não podia identificar e estivesse lá no
fundo. Contudo, o cara diante de mim parecia ser muito mais real do que o
playboy sedutor que ele parecia ser na maior parte do tempo.
Aquela poderia ser a oportunidade perfeita de ser honesta. Todavia, fazer
aquilo também podia significar o fim, já que talvez desse um tiro no meu
próprio pé. Ainda assim, titubeei, sem saber como lhe responder, e considerei
sinceramente dizer-lhe que a única pessoa que queria era ele. Que talvez,
apenas talvez, pudéssemos criar algo além e vivenciar uma coisa especial.
No entanto, foi meu instinto covarde, assustadiço e escapista que venceu e
acabei por me acovardar. Se eu não acreditava naquelas atitudes impulsivas
de filmes de comédia romântica em que a personagem principal confessava
ter se apaixonado à primeira vista pelo mocinho, duvidava muito que ele não
fosse correr, caso eu fizesse o mesmo.
— Que seja meu professor — foi o que soltei, e a forma com que as
palavras saíram deixaram um gosto amargo em minha boca, trazendo um
aperto no peito, que me fez desejar ter o poder de voltar atrás imediatamente.
Não era a verdade em tudo, mas aquilo também deixou claro para mim que
era ainda mais profundo, especialmente quando tive a certeza de que não era
tão imune ao amor como gostaria de acreditar. Não era apenas por querer
aprender, eu tinha certeza que estávamos criando algo juntos e além do que
acreditei a vida toda, eu queria, mais do que tudo, experimentar viver aquilo
com a pessoa maravilhosa que me fizera duvidar de tudo que eu acreditava
ser certo.
Olhando para ele, qualquer dúvida que pudesse ainda ter borbulhando em
minha pele, por mais nova e assustadora que fosse a experiência, em meu
coração eu já sabia. Eu estava apaixonada, e por mais errada que pudesse
estar perante minhas escolhas, estar com Caio ainda assim parecia tão certo.
Todavia, foi a maneira que ele passou a me encarar, uma máscara fria
encobrindo aquele brilho excitante de poucos segundos antes, que fez com
que me arrependesse. Só que já era tarde. Senti como se meu coração
congelasse sob o olhar gélido, e um arrepio incômodo perpassou minha
espinha.
— Tudo bem. Se é o quer, é isso que vou te dar. — Com o maxilar
trincado e um sorriso de escárnio repuxando os cantos dos lábios, ele se
afastou e, sem dizer mais uma palavra, simplesmente partiu.
CAIO
CAPÍTULO
DEZ
Aquelas palavras não eram bem o que eu gostaria de ter ouvido, mas o que
poderia esperar de uma mulher que só conhecia há 48 horas?
Rodrigo tinha razão, aquela história estava indo para um caminho que não
deveria. Embora não fizesse ideia do motivo de me incomodar tanto, talvez
eu estivesse encantado demais para acreditar que ela seria uma pessoa
diferente da que achei conhecer. Só que o mais difícil ainda era tentar
entender aquela escolha de Paula.
Será que ela mentira para mim e alguém a machucou a ponto de não
querer correr aquele risco novamente?
Eu não sabia, por isso apenas saí do apartamento, porque precisava me
acalmar. Se continuasse lá, acabaria colocando para fora minha amargura e
poderia ser o fim de tudo. E estava longe, bem longe, de ser o que eu queria
para mim… para nós.
Meu dia tinha sido um longo pesadelo até o momento em que a encontrei
novamente para o jantar. Foi quando entendi de verdade o quanto queria estar
perto dela. Era na sua presença que queria ficar. Eram os lábios dela que
queria beijar. E toda vez que a beijei, eu não apenas tinha a certeza de estar
beijando alguém especial, como também era alguém por quem estava me
apaixonando de um jeito que jamais aconteceu antes.
Depois de andar por um tempo no meu apartamento, desci até a academia
e passei umas duas boas horas descontando a frustração no saco de areia, em
uma tentativa de exorcizar aquela dor incômoda no peito. Quando deixei de
sentir os músculos dos braços, achei que talvez fosse hora de voltar e depois
de um banho demorado, bati à porta do apartamento 202.
Ante ao pedaço de madeira muito bem escovado, esperei que Paula me
atendesse e mesmo possuindo uma cópia das chaves, achei de bom tom não
invadir sua privacidade, quando eu havia deixando-a ali sem maiores
explicações. Enquanto aguardava, sorri diante da ironia daquela situação,
pois após anos vivendo relações rasas, fugindo das complicações que um
relacionamento trazia, oferendo às mulheres com as quais ficava apenas sexo
e nada mais, finalmente encontrei uma que rapidamente me fez querer algo
que nunca cogitei desejar, dando a ela o poder de quebrar meu coração, como
já tinham feito no passado. Paula havia sido clara, ela queria o mesmo que eu
achava ser suficiente antes: sexo.
Por que diabos estava pensando em confessar como me sentia mesmo?
Como podia estar sendo tão tolo outra vez?
— Segunda lição — foi o que eu disse assim que a porta se abriu e Paula
me encarou, surpresa, e sem esperar por um convite, passei por ela e quando
prestei atenção no pijama de alcinhas que vestia, tive que conter o gemido
que ameaçara me escapar.
— O-oi? — gaguejou, sem entender, os olhos escuros saltando,
estupefatos.
— O amasso no estacionamento foi a lição número um, lição esta em que
você passou com êxito. Embora eu tenha que sugerir que continuemos a
praticar para manter seu conjunto de habilidades em alta. — Sorrindo,
malicioso, assisti-a engolir em seco e depois de trancar a porta atrás de nós,
aproximei-me apenas o suficiente para provocá-la. — A primeira parte da
segunda lição foi o jantar, mas hoje vamos avançar para o que acontece
depois dele. Algo mais comumente conhecido como a “esticadinha”, seguida
para a segunda base.
Pensando em ir em frente com meu plano, puxei-a para se sentar ao meu
lado no sofá, onde corri meus dedos pela coxa nua dela. Suas pálpebras se
fecharam, a boca entreabrindo-se para deixar um pequeno ofego escapar, os
seios redondos, cheios, subiam e desciam rapidamente, por causa da
respiração difícil.
— É? — Abrindo os olhos, ela tombou a cabeça para o lado a fim de me
encarar e os dentes roçando no lábio me deram a certeza de que ela aprovava
aquela ideia e me limitei a menear a cabeça para confirmar. — Tipo aquele
papinho de “você aceita beber alguma coisa?” — testou, e o tom sugestivo
que emitiu fez a situação na minha cueca se apertar.
— Exatamente. — Sorri, sem conseguir esconder o quanto aquele jogo
estava me excitando. — Mas você estava empenhada no seu papel de
aprendizado, que eu seria obrigado a responder de uma maneira diferente.
— E como você responderia? — quis saber em um fio de voz.
Olhando-me daquele jeito pidão, eu podia sentir que ela queria e ansiava
para me ter. Era exatamente meu plano, queria que ansiasse, que me quisesse
mais do que já quis qualquer outra pessoa. E a vontade de estar comigo
doesse a ponto de ela não aguentar e abandonar os esforços de tornar-se uma
predadora de homens por querer apenas uma pessoa, eu.
— Quer mesmo saber? — indaguei, trazendo-a para o meu colo, e
prolongando seu sofrimento admirei por algum tempo o rosto bonito que me
encara em expectativa. — Que a única coisa que eu queria beber era o seu
prazer — murmurei sem hesitar.
Paula resfolegou, parecendo tão desconcentrada com a minha confissão, e
apesar de um pouco assustada pela sinceridade, estava tão fora de si como eu
naquele momento. Ela queria aquilo também, porra! Lambi os lábios e, em
seguida, os mordi quando minha mão deslizou pelo quadril dela, apertando a
curva da cintura esguia.
— E por que não faz? — A indagação foi praticamente um balbucio e
pareceu demandar um enorme esforço da parte dela, mas o que me deixou em
chamas mesmo foram os olhos pesados de tanto desejo.
— É o que você quer? — o aviso no tom da minha pergunta estava
explícito: eu estava lhe dando uma chance de correr. E ela parecia saber,
porque titubeou, enquanto eu lhe acariciava a coxa e corria com o polegar
pela borda do pijama e também da sua calcinha.
Sendo sincero, por mais louco de tesão que me sentisse para estar e me
enterrar nela, não queria que as coisas fossem daquela maneira. Queria
mesmo que me quisesse por ela e não por causa de uma ideia estúpida de se
transformar em uma versão feminina minha.
— Então? — insisti por uma resposta, ansioso.
— Não. — Ela se levantou rapidamente, como se tivesse voltado à razão e
nunca tivesse qualquer intenção de fazer algo tão vil.
Talvez não devesse, já que ela havia acabado de rejeitar o melhor sexo oral
que poderia ter, contudo, me vi sorrindo satisfeito, pois não estava enganado,
ela realmente era uma farsa.
— Eu disse que acho melhor irmos devagar — murmurou, sem sequer
conseguir me encarar.
Corri a mão pelo cabelo e me pus de pé, dei um passo para frente até
chegar a ela, que ainda parecia fugir de mim. Segurando seu queixo, fiz com
que me encarasse, os olhos tão escuros como o mar com ondas tumultuadas.
— Tudo bem. Acho mesmo que não está preparada para ir tão fundo —
sussurrei como um desafio, apenas para tirar prova, e depois de respirar
fundo, ela finalmente assentiu.
Aproveitando-me da nossa proximidade, beijei suavemente os lábios cor
de carmim.
— Eu não disse que necessariamente a esticadinha precisa ir além, isso
podemos deixar pra próxima lição — minha voz ficou baixa e ela engoliu em
seco.
— Estarei preparada. — Com um sorriso tímido enrolou os braços no meu
pescoço, de forma suave e meio insegura.
Seus olhos estavam presos ao meus, mas na medida em que o desejo
crescia, eles se fecharam, ao tempo em que me aproximava, nossos corpos
colados, fazendo com que cada movimento provocasse uma nova onda de
excitação. Um ofego lhe escapou juntamente a um gemido baixo e, sem
poder mais esperar, ela tomou coragem e investiu contra mim, tomando
minha boca com lascívia.
Beijei-a com tudo aquilo que sentia por ela desde que a vi pela primeira
vez. Não fui o único a sentir aquela ânsia, já que ela também sentiu, pois
apertou minha nuca e tudo transformou-se tão rápido, deixando-me a ponto
de esquecer a razão.
Brincando com a língua em sua boca, me via prestes a me perder, e talvez
Paula tivesse razão e devêssemos desacelerar. Mas como conseguiria quando
aquilo entre nós era tão bom?
Como havia uma boa diferença de altura entre nós, curvei-me para
alcançar seus lábios, ao tempo em que ela se colocava na ponta dos pés no
mesmo intento. Passei os braços em torno de sua cintura, levantando-a do
chão, demovendo qualquer obstáculo que pudesse nos interromper.
Enrolando as pernas torneadas em torno da minha cintura, minha ereção
pressionou seu centro e naquele instante não dei a mínima para o quanto
parecia desesperado. Queria que soubesse o quanto eu a desejava e Paula não
se fez de rogada, puxando minha camisa enquanto aprofundava a carícia.
Com as mãos agarradas ao traseiro empinado, apertei-a mais firmemente
contra mim, fazendo com que um som escapasse daqueles lábios deliciosos
quando sentiu de forma mais detalhada a ereção através dos tecidos que nos
cobriam.
Sabia que precisava desacelerar, porque se continuasse com aquilo não
resistiria e explodiria por causa da necessidade atroz que tinha daquela
mulher. Já havia chegado até ali e precisava resistir. Por isso interrompi o
beijo e, mesmo sem querer me desgrudar dela, deslizei o corpo feminino de
volta ao chão. Sem fôlego, afastamo-nos devagar. Com a boca entreaberta, os
olhos fechados como se quisesse se controlar, ela era a visão mais linda que
já tive.
Ainda sem deixar de encará-la, respirei fundo e, quando os olhos dela se
abriram lentamente, quase perdi a razão outra vez. Aquela imensidão
brilhante me dizia que ela esperava por algo que eu desesperadamente queria
lhe dar, no entanto, tive que conter o desespero e anseio, caso quisesse
mesmo minha recompensa no final. E seria ela.
PAULA
CAPÍTULO
ONZE
Projeto
Missão Jogadora
Tarefas:
1. Mapeamento de persona[06];
2. Estudo de TTO[07] (Tongue and Touch
Optimization);
3. Elaboração do cronograma de satisfações;
4. A arte visual e produção de imagens;
5. A arte do toque e o uso de produtos;
6. Testes;
7. Verificar resultados e fazer as conclusões
finais.;
8. Manutenção ou não do projeto, caso tenha
data final.
Mas o quê?
Conjunto feminino de vestimenta clássica e elegante, composto de saia e blazer, geralmente do mesmo
tecido, ajustado na cintura e comumente utilizado pelas mulheres sofisticadas.
Prêmio promovido pela American Marketing Association, AMA NY.
Nome do troféu do Festival de Criatividade de Cannes, que premia as ideias mais inovadoras e
audaciosas do ramo da comunicação.
Persona é a representação fictícia do cliente e o mapeamento é baseado em dados reais sobre
comportamento e características demográficas dos clientes, assim como suas histórias pessoais,
motivações, objetivos, desafios e preocupações. O mapeamento de persona guia a criação de
conteúdo e de marketing.
Tongue and Touch Optimization, que traduzindo significa Otimização do Toque e da Língua, um
trocadilho com SEO, siglas de SEARCH ENGINE OPTIMIZATION, que significa Otimização para
mecanismos de busca e é um conjunto de técnicas muito utilizadas na área de publicidade para
otimizar páginas da web. Essas otimizações visam alcançar bons rankings orgânicos gerando tráfego
e autoridade para um site.
CAIO
CAPÍTULO
DOZE
Com um sorriso bobo nos lábios, assisti pela parede de blindex com
películas escuras a Paula ler o que eu havia deixado em sua mesa. E diante da
reação estupefata e do rosto vermelho, não tinha dúvidas de que tinha sido
uma sacada de mestre a ideia de inserir aquela nossa experiência em um
modelo de projeto para marketing. A verdade é que não me lembrava de me
sentir tão feliz e realizado daquele jeito. Pelo contrário, muito tempo estive na
entoca, como um covarde, apenas atendendo a um desejo estúpido dela, para
no final ser traído e ainda ter o coração arrancado.
Aquele fora, sem dúvidas, o pior arrependimento da minha vida. Embora
tivéssemos vivido uma relação por anos, nem mesmo meu luto foi respeitado
quando tive o novo relacionamento dela esfregado na minha cara. Talvez
devesse lhe agradecer por ter feito o que fez, senão não estaria daquele jeito,
sentindo como se finalmente o mundo fizesse sentido outra vez.
Eu havia corrido para minha sala pela porta alternativa que havia nela,
apenas para assistir ao momento em que Paula encontraria o que havia
deixado para ela em sua mesa, e mesmo odiando me atrasar para qualquer
coisa, ainda assim valera a pena. Depois de uma última olhada para ela, voltei
a passar pela porta dos fundos e chamei o elevador exclusivo, usado apenas
pelos profissionais de alto posto e família, para finalmente subir.
A presidência do Grupo DiFiori ficava localizada no último andar do
prédio e com exceção do setor pelo qual eu era responsável, era uma
extravagância luxuosa, com muito mármore e decoração requintada. Aquela
era a ideia do meu irmão: a empresa mostrar o poderio em cada metro
quadrado, e como eu não pensava da mesma maneira que ele, fazia questão
de que o ambiente de trabalho do meu andar fosse confortável e moderno,
com intuito de aguçar a produção e criatividade dos meus funcionários.
Embora tivesse começado a trabalhar na empresa quando ainda era apenas
um calouro na faculdade, assim como acontecera com meu irmão, somente há
cinco anos havíamos assumido nossos novos postos de trabalho. Depois de
anos de dedicação, nosso pai havia decidido se aposentar e fez o mesmo com
os colegas que estava na empresa desde que ainda era apenas um sonho para
ele. Como filho mais velho e mais experiente, meu irmão se tornou o
comandante máximo e é presidente de todo o grupo, já eu assumi o cargo de
Presidente de Planejamento e ainda que nosso pai fizesse questão de
continuar fazendo parte do conselho, auxiliando-nos, e acredito que também
para continuar a fazer parte da DiFiori de alguma maneira, ele ainda era o
dono de tudo, claro, mas por acreditar que seríamos capazes, delegou-nos
nossas funções.
Assim como todos os irmãos, Cauã e eu tínhamos nossas divergências.
Nem todas explícitas, claro, mas algumas delas desconfortáveis a ponto de
preferir não vê-lo quando pudesse evitar. Éramos, sobretudo, diferentes, não
apenas na aparência ou no jeito de ser, mas também na forma de pensar,
então não era de se admirar que na maior parte do tempo vivamos em uma
pequena Guerra Fria.
Só que mesmo estando feliz que meu plano com Paula estivesse dando
certo, eu não estava nem um pouco empolgado em participar daquela reunião
e muito menos encontrá-lo, porque sabia que meu humor se esvairia em um
piscar de olhos. Todavia, preferi pensar que quanto mais rápido terminasse
com aquilo, mais rapidamente poderia voltar ao que de fato me interessava.
Diferente da senhora competente e mais velha do que minha mãe que
trabalhava com papai antes de ele se aposentar, como um completo clichê, a
secretária da presidência era uma loira bonita, que se encaixava perfeitamente
no estereótipo. Sempre escondendo-se por trás dos sorrisos, olhares, roupas
apertadas e decotes provocantes, o desejo de fazer parte da estática de
romance Patrão x Empregada estava mais do que claro. Infelizmente para ela,
as tentativas não me causavam efeito algum, mas eu não podia colocar a mão
no fogo pelo meu irmão, que até mesmo com Roberto DiFiori brigou para
garantir que a mulher permanecesse na empresa.
— Bom dia, Sr. DiFiori. — O sorriso que ela julgava ser sedutor estava lá,
inabalável, assim como a minha vontade de bocejar pela tentativa inútil de
sedução.
— Bom dia. Cauã já chegou? — fui direto de propósito e os lábios
pintados de vermelho se contraíram, por notar mais uma vez ser frívola a
tentativa de me seduzir.
— Sim. Está esperando o senhor na sala dele. Pediu que avisasse assim
que chegasse. — Meneei a cabeça, assentindo, e não pedi licença antes de
virar as costas para ir entrar no campo de guerra.
Como imaginei, a conversa não foi fácil. Cauã tinha uma visão
completamente diferente da minha no que dizia respeito à forma de gerenciar
o império que era o Grupo DiFiori. Ele via o que fazíamos apenas como um
trabalho publicitário com ideias criativas para os clientes, que investiam
mundos e nos rendiam um honorário absurdo. Contudo, fazíamos mais do
que aquilo, muito mais, e não apenas para lucrar, assessorávamos os
anunciantes em suas necessidades de propaganda, executando trabalhos para
a sua realização, coordenando o trabalho dos fornecedores e produtoras e
intermediando tudo. Ou seja, erámos diretamente responsáveis pelo sucesso
de romper a mentalidade dos alvos, atrair o público e inflamar as marcas e
empresas. O antigo ditado não podia ser mais certo: a propaganda é, de fato, a
alma do negócio.
Saí da sala de Cauã me sentindo como se tivesse corrido uma maratona. E
o estúpido sorriso no rosto de mais cedo parecia ter sido temporariamente
esquecido. Era início do ano ainda, já tínhamos projetos em andamento para
um semestre inteiro, sobrecarregar-nos de campanhas publicitárias só poderia
contribuir para diminuição do nosso padrão de qualidade e com isso acabar
por nos prejudicar. O Grupo DiFiori não era apenas uma agência que fazia
bilhões por ano, era uma empresa tradicional, que há anos mantinha-se no
ranking como maior conglomerado de comunicação e era mundialmente
conhecido no setor. Lucro deveria ser a última coisa com a qual nos
preocuparmos.
Embora tentasse ao máximo não dar uma de irmão fofoqueiro, precisava
conversar com meu pai sobre as decisões impulsivas do seu primogênito
cabeça-dura. E apesar de ter batalhado a vida toda para o crescimento da
agência, dedicando-se para torná-la o que era, assim como eu, o velho DiFiori
também tinha um pensamento mais conservador. Esperava sinceramente que
concordasse comigo e ficasse ao meu lado, caso contrário, não sabia bem o
que faria.
A fim de me acalmar, resolvi sair direto para comer, já que estava quase na
hora do almoço. Tinha planejado levar Paula comigo, mas dado meu humor
ácido, comecei a achar que não seria uma boa ideia. Não seria uma boa
companhia naquele momento e não queria que aquilo respingasse na nossa
relação. Até porque, conhecendo o temperamento um tanto explosivo de
Paula, não tinha tanta certeza de que aceitaria, e se o fizesse, apostava um
mês de celibato que não seria nada agradável dividirmos o mesmo ambiente.
Então o melhor mesmo era que ambos acalmassem os ânimos.
Andando pelos corredores que margeavam a sala do meu irmão, peguei
um vislumbre de cabelo loiro, que imediatamente chamou a minha atenção e
me fez paralisar de imediato, ao que ela balançava as mãos daquele jeito tão
seu, apenas para confirmar o pesadelo de revê-la. Batendo os saltos altos no
piso marmorizado, ela passou a caminhar com seu habitual rebolar, e eu sabia
que só podia estar indo para o lugar de onde eu havia acabado de sair.
Contudo, quando os olhos brilharam perversos ao captaram os meus, ela
sorriu para mim como se eu fosse a pessoa por quem procurava.
Merda! Aquilo só podia ser sacanagem com a minha cara!
Sem precisar de mais um segundo para pensar, dei as costas e segui na
direção oposta.
PAULA
CAPÍTULO
TREZE
Assim como havia acontecido pela manhã, não vi mais Caio no resto do
dia e quando chegou a hora de finalizar o expediente, ainda estava intrigada
com a ausência dele. Não que fosse da minha conta, claro, afinal, o que ele
fazia ou deixava de fazer não me dizia respeito. Só era estranho que ele
simplesmente sumisse, quando em nenhum momento o vi sair ou entrar na
sala que ficava próximo à minha estação de trabalho.
O céu ainda estava repleto de nuvens escuras, então outra vez achei que
meu teste com o metrô seria arriscado, no entanto, não querendo continuar
gastando além do necessário com aplicativo de transporte, acabei indo em
frente. Afinal, o máximo que podia acontecer era pegar o metrô lotado e
demorar para chegar ao meu destino.
E foi exatamente isso que aconteceu.
Então depois de dois metrôs cheios, uma parada na estação mais à frente,
que me resultou em uma bela pernada, finalmente cheguei em casa, já
pensando em colocar um tênis na bolsa para o dia seguinte, caso acontecesse
algum imprevisto que me fizesse ter de andar um bocado outra vez.
Morta de cansaço, abri a porta para encontrar Caio ainda em seu terno,
sentado no sofá, nitidamente à minha espera. Só de olhar para aquela farsa de
homem diante de mim, todo ressentimento que senti por ter me escondido sua
real identidade retornou. Por isso que quando abri a boca para falar, minha
voz escorria sarcasmo:
— Caio… Oh, eu sinto muito. Devo chamá-lo de senhor? Ou meu querido
chefe ainda prefere que o chame de Professor? Desculpe, mas estou um
pouco confusa, já que o pervertido que paga meu salário me deu um projeto
absurdo para “trabalhar”.
— Então você ainda está chateada. — Não era uma pergunta, apenas uma
afirmação, uma de quem parecia ter bastante propriedade para falar.
Levantando-se do sofá, ele pareceu ter a intenção de se aproximar,
contudo algo em meu rosto o impediu de fazê-lo, obrigando-o a recuar. Ainda
assim, ele teve a cara de pau de me dar um sorriso nefasto, como se com
apenas jogar seu charme pudesse melhorar as coisas entre nós.
— O que te deu a dica de que estaria chateada? — indaguei, jogando a
bolsa no aparador, para em seguida começar a tirar os saltos que calçava. —
A maneira agradavelmente surpreendida que fiquei por saber que a pessoa
que está comigo há dias sabia exatamente quem eu era e preferiu não me
dizer que era meu chefe? Ou o porquê de a pessoa que prometeu ser meu
mentor na arte da libertinagem decidiu misturar as coisas e envolver o pessoal
com o profissional em pleno horário de trabalho? Não sei, estou confusa. —
Eu não sorri, ri ou deixei qualquer margem para dúvidas da minha irritação
para com ele. Na verdade, meu tom de voz irreconhecível fez aquilo por mim.
Deus. Eu estava mesmo puta da vida!
— Você sabia desde o início quem eu era e nem por um só segundo
pensou em me contar? — sussurrei a pergunta e suas covinhas apareceram.
— E você aceitaria a minha ajuda caso o fizesse? — jogou a pergunta de
volta para mim, como quem dizia que estava com a razão.
— Claro que não! Na verdade, ainda não faço ideia de como aceitei —
bufei, irritada comigo mesma por ser tão inocente. — Você me mostrou um
documento que dizia que seu sobrenome era Ornelas, como queria que eu
desconfiasse? Mais uma mentira!
— Não. É verdade. O documento é legítimo. Esse é o sobrenome da minha
mãe e por uma questão de segurança uso-o toda vez que saio à noite —
impacientou-se, o rosto bonito tornando-se uma máscara fria.
— Então eu era uma espécie de experimento? — acabei perguntando à
queima-roupa e Caio franziu o cenho, assumindo uma expressão assustada.
— É esse juízo que faz de mim? — quis saber, forçando um sorriso, no
entanto a pergunta fora retórica, pois ele não demorou para prosseguir: —
Acho que apesar do pouco tempo, você já me conhece o suficiente para saber
que não preciso inventar nenhuma artimanha para pegar alguma mulher. Se
quer considerar a minha ideia de fornicação com você uma espécie de
experimento, então acho melhor pararmos por aqui.
Pararmos por aqui? Ele estava mesmo falando sério?
Tudo bem que eu estava chateada, mas talvez aquele cara diante de mim
parecesse ser alguém diferente, alguém que parecia querer o mesmo que eu.
Ou talvez ele fosse mesmo uma farsa. Poderia mesmo ser um plano ardil?
Não sabia, eu estava confusa.
Meu coração se apertou com o pensamento de Caio ter me usando o tempo
todo.
— É agora que você vai querer usar a Terceira regra? Como é mesmo?
Ah! “Qualquer motivo de desavença pode ser resolvido na cama… ou fora
dela, contanto que envolva sexo” — fui irônica de propósito e Caio estreitou
os olhos, sem deixar de me encarar com uma expressão séria.
— Não, mas talvez devamos ir em frente com o “projeto” — ele refutou
baixo, fazendo minha pele se arrepiar.
— Então como funciona? Simplesmente começamos a cumprir cada uma
das tarefas? — Aproximando-me devagar, puxei-o pelo colarinho e com a
boca colada à sua continuei: — Ou meu querido professor quer ir direto ao
que interessa?
O sorriso provocativo, somado às covinhas na bochecha, deixavam clara a
aprovação daquela ideia.
— Pensei que poderíamos começar desde o início, mas se quiser pular essa
etapa, ficaria feliz em adiantar para a coisa do toque e da língua — sussurrou,
enrolando os braços ao redor da minha cintura.
Por um segundo, ponderei se deveria ceder ou não ao desejo de seguir em
frente com a sugestão, afinal, além de lindo com aquele terno e pose de CEO
fodão dono da porra toda, como nos livros de romance, ele era irresistível, o
filho da mãe. Mas se tinha uma coisa sobre mim que ele ainda pareceu não se
dar conta, é que eu era obstinada e que o queria. Mesmo. Só que nos meus
termos. Então se o que queria era conquistá-lo para poder chamá-lo de meu,
deveria manter os hormônios sob controle. E, claro, também era um pouco
vingativa, admito.
— Hm… Assumo que essa coisa do toque e da língua foi uma das que
achei mais interessantes. — Os olhos dele brilharam perversos, achando que
eu certamente havia esquecido o ocorrido, e quando abaixou o rosto para me
beijar, afastei-me de súbito, saindo completamente da sua aura de sedução.
— Até amanhã, chefinho — soltei irônica, virando as costas em seguida para
ele.
— Até amanhã? Você está falando sério? Mas e nossas aulas? — indagou,
surpreso, embora não conseguisse esconder a irritação que sublinhava cada
sílaba, e me virei para encará-lo enquanto ouvia o que lhe diria a seguir.
— Apesar de paralisações estudantis não estarem regulamentadas em lei,
todo e qualquer tipo de protesto, manifestação e movimento é meu direito
como cidadã. E meu “movimento” agora será para a banheira, onde a
“protestarei” apenas para mim e mais ninguém, e lá mesmo farei “uns
movimentos”, se é que me entende. — Mexendo as sobrancelhas para dar
ainda mais ênfase aos meus próximos passos, foi a minha vez de sorrir ante
sua estupefação.
— E eu? — Isso saiu como uma súplica, o que me fez ter vontade de
gargalhar.
— Acho que você poderá experimentar a coisa do toque sozinho.
Jogando as cobertas para o lado, sentia a pele úmida pelo calor, suando
para caramba, a garganta seca, como se estivesse atravessando o deserto do
Saara, e foi quando sentei-me na cama que me dei conta de que o que me
acordara fora uma música barulhenta de rock que tocava no sistema interno
de som do apartamento, mas a impressão que tinha era que estava
acontecendo dentro da minha cabeça.
Aturdida, olhei ao redor para descobrir que eram três da manhã. Estava
tão, mas tão quente, que não parecia nem mesmo viver em uma das capitais
com o clima mais frio do Brasil. Talvez até pensasse que aquele súbito calor
todo era apenas uma brusca mudança de temperatura, afinal, a cada dia
tínhamos mais novidades e surpresas sobre o assunto, contudo, o fato de não
apenas meus tímpanos estarem prestes a serem estourados, a cama começou a
se mexer em alta velocidade, como uma plataforma vibratória louca.
O que diabos estava acontecendo?
Um grito abafado me escapou quando algo parecido com pequenos
choques parecerem vir do colchão e um filme erótico bem ruim, com uma
loira peituda escandalosa que começou a gemer enquanto o parceiro a comia
de quatro. Pulando e rolando entre as cobertas, tentava escapar da cama, e
depois de muito sacrifício e quase uma queda épica, finalmente consegui sair,
o coração tão rapidamente batendo no peito, coloquei a mãos no joelho,
buscando ar para os meus pulmões.
Merda! Merda! Merda!
Andando pelos corredores, as luzes começaram a acender e apagar, quase
como um pisca-pisca com mau contato, a cada passo a situação parecia tão
ruim, se não pior. Fui até a sala em busca do controle que comandava tudo,
no entanto, letras e números pareciam dançar na pequena tela do objeto.
Meu Deus, o que eu faria?
Não fazia ideia de como resolver a situação. Na verdade, nem mesmo
sabia onde ficava o painel de controle elétrico do imóvel, o que significava
que não poderia reiniciá-lo. Sem ter noção alguma do que fazer, peguei o
celular para ligar para a única pessoa que poderia me ajudar naquele
momento.
— Que ótimo, desligado — resmunguei, depois de ouvir a voz da caixa
postal.
Não pensei duas vezes antes de abrir a porta do apartamento e com a chave
na mão, chamar o elevador. Ele não demorou a chegar e entrei, antes de
apertar o botão que me levaria à cobertura.
— Quem está morrendo? — foi o que Caio falou quando toquei
insistentemente a campainha do seu novo lar. Ele me encarava confuso. — O
que aconteceu, diabos?
Deixando escapar um suspiro, ri, sem humor algum.
— É realmente necessário que eu te responda? — indaguei, com a voz
escorrendo escárnio, as mãos na cintura deixando claro que a minha visita
não era nada amigável.
Alguma coisa na expressão dissimulada que recebi como resposta me fez
começar a duvidar que o que estava acontecendo não se tratava de um
simples descontrole tecnológico. Juro por Deus, estava começando a pensar
que era apenas um ardil para que fôssemos para a cama juntos.
Ah! Com certeza era!
— Você sabe muito bem o motivo da minha visita. — Isso saiu de forma
acusatória, como se ele tivesse planejado tudo.
— Não — respondeu, cínico.
— Claro que não sabe. Afinal, está acontecendo uma espécie de Era de
Ultron[08] dentro do apartamento que você me emprestou, com som nas
alturas, aquecedor no máximo, televisão passando um filme pornô ruim e
escandaloso e você é inocente… — afirmei sarcasticamente, porque ambos
sabíamos que ele era o culpado.
— É mesmo? Que estranho — insistiu naquele papo de inocência, mas eu
não estava caindo mesmo. — Acho melhor dar uma olhada. — Ele então
abriu a porta por completo e foi quando me dei conta de que ele estava
seminu.
Nossa Senhora das virgens, o que era aquilo tudo?
Caio era lindo, mais como a confirmação da existência de Deuses vivendo
entre nós na Terra, porque algo tão perfeito não poderia ser outra coisa que
não um deus. Lindo demais era pouco, alguém precisava inventar uma
palavra superlativa com intuito de fazer jus a ele. Não havia nada nele que
não fosse perfeito, o corpo malhado e cheio de músculos, a barriga tanquinho
com um traço de pelos escuros e aquele “V” sexy que indicava o caminho da
sua masculinidade me deixaram com a boca sedenta para lambê-lo.
— Se já acabou com a inspeção, podemos descer para ver o que está
acontecendo? — indagou, sem tirar o sorriso convencido do rosto.
Argh! Filho de uma mãe gostoso!
Não respondi, apenas dei as costas para ele e marchei direto para o
elevador.
— Não vou dormir na cama com você! — soltei, irritada, logo depois de
voltarmos para o apartamento dele na cobertura.
Quando estávamos no meu apartamento temporário, Caio alegou que não
conseguiria resolver a situação da revolta do sistema automotivo do
apartamento e me ofereceu para que fosse dormir na cobertura com ele. Não
queria ter cedido, mas precisava dormir e com todo aquele barulho seria
impossível. Enquanto retornávamos para o apartamento de Caio, ele me
informou que o apartamento possuía isolamento acústico e por isso os
vizinhos não haviam se dado conta da rave que rolava ali dentro. Descobri ao
chegar que o segundo quarto de imóvel estava em reforma e que o sofá de sua
sala havia sido mandado para higienização, restando como opção apenas o
seu quarto e a sua cama.
— Não vou morder — respondeu, voltando a me encarar profundamente,
um brilho perverso cintilando nos olhos claros. — A não ser que você peça,
claro.
Não foi exatamente o que disse que me deixou sem ar, mas a forma como
foi dito. Sem tirar os olhos de mim, era possível sentir o sangue fluir em meu
corpo como uma descarga de adrenalina, pulsando, fazendo meu coração
palpitar e a pele esquentar. O ar se esvaiu dos meus pulmões e respirar
pareceu se tornar difícil, pois aquele olhar, com o sorriso malicioso, fazia a
tarefa de resistir difícil, muito difícil.
— De que lado você prefere? — a pergunta dele poderia soar inocente,
contudo não para nós, que sabíamos muito bem o que significava.
— Só farei isso essa noite, porque permanecer lá dentro daquele
apartamento está impraticável. Mas só vamos dormir, ouviu bem? — Apontei
o dedo em riste de forma acusatória, enquanto ele mordia os lábios, como se
tentasse muito não rir.
— Claro. Garanto que vou resolver o seu problema. — Levantou as mãos
em rendição, cínico. — E, sim, eu te ouvi — bufei, quando piscou para mim,
e pisando duro, segui para o lado que percebi que ele dormia. Apenas para
pirraçá-lo, claro.
— Eu não acredito em você, Caio! — lancei, após me ajeitar
confortavelmente entre as cobertas grossas. — E acho melhor manter
distância! — avisei, quando o colchão cedeu ao deitar-se.
— Distância é algo que não pretendo manter. — E sem mais, o corpo
seminu juntou-se ao meu e, segurando a respiração, paralisei quando o nariz
passou a fuçar meu pescoço e senti os lábios macios fazerem um caminho
longo e lento pela minha pele.
— Você que planejou tudo, não foi? A Era de Ultron foi culpa sua? —
perguntei em um fio de voz e senti o calor morno da sua respiração quando
ele riu.
— Claro, eu sou o próprio Tony Starks. Ou Hank Pym, caso prefira a
clássica história de quadrinhos de Ultron. — Ele estava definitivamente
zombando de mim, no entanto devo admitir que aquele papo meio nerd era
sexy, mas ainda assim não conseguia me convencer de que não tinha nada a
ver com a história.
— Claro que foi você! — meu tom saiu acusador. — E aposto que você
vem planejando isso há um bom tempo, já que até uma reforma inventou e o
sofá tirou. — Ele gargalhou com vontade.
— Certo! Você me pegou! Sou o único culpado por Ultron tentar acabar
com seu sossego e correr para minha cama. Mas não se preocupe com isso,
meu próximo passo é usar de técnicas de hipnose para que possa fazer sexo
com você.
— Não duvido. — Revirei os olhos, mesmo que não pudesse ver, ainda
assim tive que me conter para não dizer que ele não precisaria me hipnotizar
para conseguir o que queria.
— Hoje vamos mesmo dormir.
Com o coração batendo de forma errática, senti a boca secar. Tudo em
mim desejava dizer que eu não queria apenas dormir, que queria mais, mas
simplesmente emudeci.
— Apenas hoje — sussurrou, enquanto a mão masculina acariciava a
minha barriga por dentro da blusa do pijama, e com a boca próximo à minha
orelha, notei a respiração dele ganhar um ritmo acelerado.
Fechando os olhos, aproveitei a sensação de ter o corpo gostoso encaixado
ao meu. Parecia tão natural, que a impressão que tive era de ter desfrutado
daquele encaixe perfeito a vida toda.
Vingadores: Era de Ultron é um filme de super-herói estadunidense produzido pela Marvel Studios. Ao
tentar proteger o planeta de ameaças, Tony Stark constrói um sistema de inteligência artificial que
cuidaria da paz mundial, mas o projeto acaba dando errado e gera o nascimento do Ultron. Ultron
desenvolveu consciência própria e sua inteligência artificial concluiu que a melhor maneira de
garantir um mundo melhor é exterminando a raça humana. Com isso, Ultron se rebelou contra seu
“pai” e torna-se uma espécie de nêmese não apenas dos Vingadores, mas de toda a vida no Planeta
Terra.
CAIO
CAPÍTULO
CATORZE
Paula estava certa, tinha sido ideia minha ocasionar uma espécie de pane
no sistema de automação do apartamento. Ainda podia me lembrar da linha
silenciosa quando estava em ligação com a empresa que instalara o sistema
quando pedi um novo controle e dicas para embaralhar tudo. Acho que a
fortuna que gastei para instalar aquilo foi a melhor coisa que fiz, porque
senão não teria dormido agarrado com Paula na minha cama.
Tentei muito não perder a cabeça e tomá-la ali no instante que colei o
corpo ao dela. Nem mesmo a luz do luar parecia facilitar, pois iluminava a
pele da minha linda menina, abrilhantando ainda mais a beleza delicada dela,
tornando-a quase irresistível.
Fui firme em meu propósito de não ir além, mas não significa que não tirei
uma casquinha, abraçando-a mais apertado, deleitando-me com seu calor no
meu corpo e a forma que Paula ofegava e arrepiava a pele apenas me dava a
certeza de que estava gostando tanto daquilo quanto eu.
Eu poderia tê-la naquele instante. Poderia me enterrar nela, colocar um fim
naquele desejo incontrolável que fermentava dentro de mim desde que pus os
olhos naquela mulher, contudo Paula merecia mais. Ela merecia alguém
apaixonado, que lhe dissesse aquelas palavras mágicas, aquelas pelas quais
não apenas ela, mas eu também, havia declarado guerra por diferentes razões.
Se eu não estivesse tão louco por ela, tinha certeza que ousaria ser idiota o
suficiente para ir em frente sem pensar, afinal, era só sexo, certo? Sim, mas
com ela não era. Era mais…
Vê-la irritada quando abri a porta do meu apartamento quase fez com que
me arrependesse do plano de levá-la para a minha cama. E até estava
inclinado em resolver o problema do sistema do apartamento, contudo, a
forma como pela primeira vez olhou meu corpo seminu me fez seguir
adiante.
Porra! Eu precisava tê-la o quanto antes!
— A empresa de automação avisou que só poderá vir no final da tarde —
foi o que disse durante o café da manhã na bancada da cozinha na manhã
seguinte.
— Mesmo? — quis saber, a boca franzida e o tom de voz me dizendo que
não acreditava no que eu dizia. O que era verdade, já que o novo controle do
sistema do apartamento estava comigo e eu o havia usado quando baguncei
tudo no apartamento pouco antes de ela ir atrás de mim.
— Mesmo. Tentei fazer com que viessem antes, mas parece que a agenda
deles está bem cheia. — Meneei a cabeça, concentrando-me na tarefa de
permanecer sério sobre o assunto e trazer um pouco de veracidade para
aquela história arquitetada.
— Interessante que isso tenha acontecido apenas agora. Que sorte você ter
escolhido comprar outro apartamento no mesmo prédio, não é? — a voz dela
escorria sarcasmo, contudo me mantive inabalável.
— Sim. Muita sorte estar aqui para sempre poder dividir a cama com você
— falei, enigmático, antes de sorrir para ela.
Ainda não sabia explicitar exatamente o que sentia, só sabia dizer que era
mais forte do que qualquer coisa que já senti por qualquer pessoa. Todavia,
por mais que quisesse desesperadamente estar com ela, não queria que
acontecesse por uma manipulação da minha parte. Na verdade, tinha intenção
de adiar aquilo até que ela estivesse preparada e soubesse exatamente como
me sentia. E esperava mesmo que fosse recíproco.
Consegui evitar Caio durante boa parte do dia. Primeiro, depois que
terminei o relatório e fui à cafeteria do setor, onde ele tentou falar, contudo
perdeu a coragem quando viu outros funcionários chegarem. Novamente
tentou na saída de uma reunião, onde ele pediu para falar comigo, mas
simplesmente perguntei se o assunto era profissional ou pessoal, dada a falta
de resposta, não esperei, porque nós dois havíamos entendido o que aquilo
significava.
No final do expediente, ao invés de ir para casa, fui direto para meu
encontro com Túlio, o cara que havia conhecido na tarde anterior. Tinha
pensado em dar uma passada no apartamento de Caio para tomar um banho,
mas sabia que acabaria encontrando com ele por lá e era a última coisa que
gostaria que acontecesse. Até porque não queria ter de lhe dar satisfação do
que faria. E por mais inevitável que fosse, já que praticamente morávamos
juntos, pretendia adiar um pouco mais aquele encontro.
Túlio era um cara muito simpático, e apesar da minha reticência em aceitar
um café de um estranho, nos identificamos desde o início e não me arrependi
de lhe dar uma chance. Claro que não faria aquilo se tivesse que ir para outro
lugar. Fiz aquilo com Caio, mas porque algo nele havia me passado uma
confiança, não me arrependia, ainda assim não me arriscaria uma segunda
vez.
— O que acha de uma costela de porco com molho da casa? — Túlio
indagou estudando o cardápio.
Ele era um cara alto, realmente bonito e de impressionantes olhos azuis.
Naquele início de noite, tinha escolhido vestir uma jaqueta de couro marrom,
que deixava o moreno de cabelos castanhos levemente enrolados ainda mais
charmoso.
— Por mim tudo bem — concordei, finalmente encontrando minha voz, ao
mesmo tempo em que retribuía seu sorriso fácil.
— E para beber? — indagou, antes de estender o cardápio para mim. —
Eu não sei se você gosta, mas eles têm uns chopes especiais que são
realmente gostosos.
— Não sou fã de cerveja. — Fiz uma careta. — E na verdade não queria
beber nada alcoólico, porque amanhã trabalho. — Dei de ombros, meio que
me desculpando.
— Tudo bem. Mas você não se incomoda de que eu peça uma dessas né?
Porque depois do dia que tive, realmente preciso disso. — Eu ri, abanando
uma das mãos, em sinal de descaso.
— Imagina, fica à vontade. — Fechando o cardápio, me dirigi para o
garçom que anotava nossos pedidos para fazer o meu: — E um suco de
laranja com morango para mim.
— Então, como está sendo tudo? — indagou, curioso, e suspirei, me
sentindo sobretudo cansada.
— Exaustivo. — Ele meneou a cabeça, assentindo.
— Conte-me mais sobre isso — ele quis saber, fitando-me com
curiosidade genuína.
O garçom se aproximou com nossas bebidas e enquanto bebericava a
minha com o canudo, comecei a falar sobre tudo.
CAIO
CAPÍTULO
DEZOITO
Ela não fora dormir comigo na noite anterior. Tinha me deixado sozinho.
Encarando a vista lá fora através das janelas de vidro do chão ao teto,
sentia a cabeça latejar pela ressaca que parecia não ter intenção alguma de ir
embora, como um castigo por ter sido tão estúpido. A lua estava cheia,
iluminando o céu escuro, que tinha poucas estrelas iluminando-o.
Dando um passo para trás, sentei-me na poltrona mais perto e cobri os
olhos com o braço, tentando encobrir a realidade em geral. Desde o início eu
sabia que Paula não seria mais uma a passar pela minha cama, mas algo nela
me prendeu como nenhuma outra fizera, e eu não conseguia me livrar
daquelas amarras.
Por anos flutuei em um mar de decepção e desilusão e acabei sendo
obrigado a viver à deriva, um náufrago, sem chance de resgate. Foi então que
Paula surgiu do nada, como um bote salva-vidas ao meu socorro, que me
levara para uma terra firme que eu ansiava explorar.
Se tinha uma coisa que aprendi era que intensidade da paranoia era
diretamente proporcional ao quanto já fomos ingênuos no passado, e me via
perdido, com o mundo e todo controle dele se esvaindo pelos meus dedos.
Estávamos vivendo numa época em que o fim do mundo não assustava tanto
quanto se apaixonar. E se eu achava que o que senti pela traição de Mona foi
ruim depois de estarmos juntos há anos, tinha o pressentimento de que com
Paula o sentimento seria o mesmo que um estalar de dedos usando a Manopla
do Infinito[09], uma destruição em massa.
A noite já havia chegado há muito tempo, as horas passavam, e por mais
ansioso que estivesse esperando que chegasse, Paula parecia ter planos
maiores, que incluíam me enlouquecer, pelo visto. De soslaio, olhava para o
sofá com certa amargura, porque ele era o motivo de ter dormido sozinho.
Tinha o colocado de volta na sala, esperando que Paula viesse para a minha
cama de bom grado, o que obviamente não aconteceu. Estava mais do que
arrependido da minha decisão.
Mais do que tudo, desejava que ela me quisesse. Estava mesmo decidido a
dar-lhe a verdade que tanto merecia, mas a minha coragem recebeu uma
ferroada quando a vi com aquele cara na Starbucks. Como um adolescente
desiludido, enchi a cara, querendo desesperadamente esquecer, mas o que eu
queria mesmo era chorar como um bebê apenas com o pensamento de ela
estar com qualquer outro.
Meus lábios se contorceram em um sorriso triste, pois uma parte minha
queria esquecê-la, pois sabia que continuar insistindo naquela mulher poderia
ser um erro, mas Paula me fisgara de tal maneira, tinha-me tão em torno do
seu dedinho, que eu não me importava. Aprendi com os meus próprios erros
que sofrer não torna mais poético, chorar não nos alivia e implorar não traz
ninguém de volta. Contudo, nada pode nos impedir de tentar, pois não há
erros onde se pode haver felicidade.
Vi em algum filme algo que dizia assim: você pode ter seu coração
partido ou pode ter o maior caso de amor que o mundo já conheceu. Mas
você não vai saber se não tentar. Covardia é tentar fugir dos próprios
sentimentos, e se tinha uma coisa que jamais fui, era covarde.
— Ei, você chegou — emiti aliviado quando Paula abriu a porta e entrou,
quase às nove da noite. — Estava preocupado — completei, quando me
levantei e andei na direção dela.
— Desculpe, meu celular descarregou e acabei não conseguindo avisar
que demoraria. Precisava me distrair — Ela me deu um sorriso tímido, ao
passo que trocava os pés, nitidamente desconfortável, ainda assim não
parecia ser capaz de me encarar.
Acabei me sentindo culpado, porque não tinha facilitado em nada o seu
dia, cercando-a para me desculpar pelo show de stripper e pela bebedeira
desnecessária. Precisava recompensá-la pela minha falta de tato e desespero
em fazer as coisas entre nós dar certo.
— Bem, aqui vai uma sugestão. — Juntando o corpo ao dela, envolvi um
braço ao redor da sua cintura, onde fui capaz de senti-la estremecer por causa
do meu toque e com um sorriso sedutor prossegui: — O que acha de ir para o
banho e depois sairmos para jantar? — Esperei por uma reação vindo dela,
mas certamente não foi os olhos se arregalando ou o fato de não conseguir
me encarar.
Todavia, apenas quando ela falou que percebi a gafe Freudiana de cometi.
— Desculpe, mas já comi antes de vir. — Abri a boca para voltar atrás
com o convite, mas ela foi mais rápida: — Ainda assim ficaria feliz em
acompanhá-lo.
Queria perguntar mais, saber onde ela estava, se estava com alguém, por
que demorara tanto, mas naquele momento senti-me aliviado e me contentei
com o fato de saber que ela queria estar comigo. Por isso meneei a cabeça,
com um sorriso nos lábios, enquanto admirava meu objeto de desejo. Paula
era linda de um jeito só dela, que embora fosse tão segura de si, nem mesmo
parecia se dar conta daquele detalhe. E talvez essa certa dose de ingenuidade
a tornasse ainda mais bela.
— Vou ficar te esperando, então, minha linda. — Aproveitando nossa
proximidade, lhe dei um beijo suave e, quando me afastei, mesmo contra
vontade, ainda assim não consegui tirar os olhos dela.
— Já volto, Caio. Prometo não demorar. — E com uma última olhadela,
reduziu-me a um vulcão de hormônios, prestes a entrar em erupção.
Eu estava apaixonado mesmo… Quem diria?
No início eu não sabia se ele estava brincando para depois dizer que não
passava de uma pegadinha, uma espécie de lição maluca sobre ilusão, ou se
havia sido apenas uma loucura da minha cabeça, que apenas fantasiava uma
situação hipotética e surreal, que em um universo paralelo Caio era mesmo
apaixonado por mim. Pisquei uma e outra vez, esperando acordar daquele
sonho, contudo, ainda estava ali, com ele. Embasbacada e meio trêmula, me
inclinei para trás, para encará-lo melhor e ter certeza de que não, não estava
ouvindo coisas demais.
— O que disse? — perguntei baixinho, querendo apenas uma confirmação
de que aquilo não passava de uma insanidade da minha cabeça.
— Você ouviu. — As covinhas se aprofundaram nas bochechas dele
quando sorriu, tímido dessa vez. — Você não faz o tipo de mulher que quer
apenas sexo casual. Você merece mais que isso, minha linda.
Havia sentimentos crus nos olhos dele, sentimentos que nunca vi antes ou
em qualquer outra pessoa, emoções desconhecidas que me forçaram a engolir
com certa dificuldade e fechar os olhos em seguida, sentindo tanta coisa que
não sabia nem por onde começar a explicar. Um alvoroço turbulento parecia
girar dentro de mim, um frêmito louco que me causava um ataque cardíaco,
em uma tentativa de digerir tudo que ouvia. Porém Caio ainda parecia ter
mais a dizer.
— Talvez você mereça mais do que uma pessoa como eu, pois é especial
demais para mim como homem. Mas a verdade é que merece mesmo ser
amada, querida e desejada por alguém que aprecie o tesouro que é, minha
linda. — Um sorriso maroto brotou nos lábios dele e me vi ainda mais boba.
— Nunca tive a intenção de te ensinar a jogar. Desde o início nunca quis
mesmo que se tornasse uma versão feminina minha. Paula, eu era o único que
estava jogando, mas jogava com intuito de conquistá-la.
Ainda embasbacada, levei a mão à boca, sem acreditar. Porque tudo aquilo
ainda parecia surreal demais para mim.
— Quando te vi pela primeira vez, não quis mais ser aquela pessoa que era
antes. Eu só queria você, Paula Maia. O tempo todo. — Dando uma pausa,
Caio respirou forte, como se estivesse preparando-se para falar algo muito
difícil, e o fez. — E eu estou profunda e loucamente apaixonado por você.
Qualquer dúvida ou medo absurdo de não ser correspondida se esvaiu. O
alívio por aquilo era tamanho, pois me senti, pela primeira vez na vida,
completa em todos os sentidos.
— Você está mesmo apaixonado por mim? — sussurrei a pergunta, ainda
sem fôlego.
— Sim, estou. — Ele riu, parecendo perplexo por eu ainda ter dúvidas.
Então, sem hesitar, eu o beijei. Foi suave, delicado, mas repleto de
significados que me atingiram em cheio, roubando o ar e também meu
coração. O que era redundante, já que Caio Ornelas DiFiori o roubara desde
que pus os olhos nele.
Com o coração aos pulos, tive a impressão de que sairia do meu peito. O
beijo se aprofundou, e nunca fui beijada daquele modo antes, tão afoito e
apaixonado, como se ele estivesse sedento para me provar. A boca na minha
causando-me um alvoroço por dentro, começando no coração e se espalhando
como fogo líquido.
Afastando-se um pouco de mim, as mãos de Caio acariciaram-me o rosto,
ao passo que os lábios roçaram os meus.
— Ainda tem dúvidas? — perguntou baixinho, e meneei a cabeça
negando. — Então entende agora o que quero dizer?
Meus olhos permaneceram fechados, sentia-me tonta com as palavras dele,
bêbada com o beijo, e, confesso, ainda estava um pouco confusa também.
Todavia, mais que tudo, queria muito, muito mais.
Abrindo os olhos, encarei a imensidão daqueles olhos lindos e mal podia
respirar quando indaguei:
— O quê?
— Entende que quando o atacante tem a oportunidade, ele a agarra, pois
perdê-la pode significar que o jogo terminou? — Inclinando-se para alinhar
nossas bocas mais uma vez, ele voltou a sussurrar: — O jogo terminou para
mim, linda. E a vitória é minha, pois você é o meu prêmio, Paula.
— Eu? — Estremeci quando nossos lábios se tocaram novamente,
enquanto ele acariciava meu rosto com ternura.
— Sim. Não será um caso de uma noite só. Eu quero ser o sortudo que te
dará tudo isso. — Sorri, sentindo o rosto esquentar, e decidi que também era
hora de ser sincera como ele fora comigo.
— Eu nunca quis nada daquilo, Caio. Desde o início, a única coisa que eu
queria era você. Também estou apaixonada por você. — Aliviado e feliz, ele
se aproximou, a língua deslizando por meus lábios entreabertos, e eu o beijei
de volta rapidamente, antes de corajosamente sussurrar em seu ouvido: — E
quando chegarmos em casa, vou mostrar-lhe exatamente o quanto te quero.
Quando comecei, juro que não era a minha intenção que me retribuísse. Já
havia perdido a conta de quantas vezes fizeram aquilo para mim. Afinal, todo
homem adorava um boquete, era simplesmente contra a natureza recusar um
ato tão generoso vindo de uma mulher. Contudo, resistir a Paula parecia
impossível.
Inúmeras vezes desde que a conheci já havia me masturbando em
“homenagem” a ela, mas diante de mim era como se minhas fantasias mais
selvagens se tornassem realidade, e com o gosto dela ainda na minha boca,
nunca estive mais duro e ansioso na vida. A verdade é que nenhuma outra
parecia ser páreo para como me senti e ainda sentia depois de dar a chupada
mais deliciosa da minha vida.
E, porra, ela queria fazer o mesmo comigo!
Fitando-me com aqueles olhos escuros, um pequeno sorriso hesitante
apareceu em seus lábios cheios.
— Como quer que eu comece?
A ânsia na voz e também no olhar dela era inconfundível e foram a minha
ruína, o que fez meu autocontrole ir para o espaço em um piscar de olhos.
Cacete! Foda-se toda a coisa cavalheiresca! Eu queria sua boca em meu
pau, pois estava a segundos de distância de explodir!
— Como quiser, minha linda — consegui dizer, embora não reconhecesse
minha própria voz.
O sorriso traquina que recebi em resposta fez ainda mais difícil a situação
para mim. Sentia uma pressão no peito, inesperada e intensa. Ansioso, mudei
o peso dos meus pés, mas quando a mão macia deslizou suavemente pelo
meu comprimento, me vi perdido. Paula tinha a mim. Eu era completamente
dela.
Se fosse sincero comigo mesmo, embora tenha estado com outras
mulheres, jamais estive com alguém daquela forma tão entregue como me
sentia com ela. Então, inexoravelmente, sempre fui seu, só demorei demais
para encontrá-la, e então finalmente descobri aquele fato.
Mordendo aquele maldito lábio suculento ela examinava meu pau com um
escrutínio demorado, e aquele interesse quase inocente me fez querer beijá-la
novamente, mas um silvo me escapou, o ar fugiu dos meus pulmões quando
ela começou um movimento cadenciado de vai e vem.
Que porra era aquela? Eu me sentia um maldito virgem!
Olhando para ela compenetrada, sentia todo o corpo contrair. Cacete, ela
era sexy para caralho com os cabelos escuros caindo sobre os ombros,
ocultando parcialmente os seios fartos, os lábios úmidos pela língua que os
contornava quase o tempo todo, como se tivesse sede, e eu esperava que fosse
de mim. A verdade era uma só, homens eram criaturas extremamente visuais,
então cada pequeno gesto era o suficiente para nos deixar acesos, e a maneira
como Paula fazia aquilo estava quase me pondo de joelhos.
Sério, estava começando a achar que não duraria muito!
Eu podia observá-la para sempre, mas como um maldito homem faminto,
estendi a mão para jogar o cabelo dela para trás, porque não queria perder
nada e também tinha o intuito de expor os seios empinados para o meu bel-
prazer. Abaixando a cabeça, os dedos pequenos desceram em volta da minha
base e, puta merda, estava perdido mesmo. Minhas costas se curvaram
quando o deslizou lentamente para cima e depois para baixo, o movimento
cadenciado ganhando um ritmo gostoso que me forçou a fechar os olhos,
porque sabia que se continuasse a encará-la eu não duraria mais do que
alguns segundos.
Ok… Não que eu estivesse longe, de qualquer maneira!
A mão dela se movia em cursos determinados, ora lentos, ora mais
rápidos, os movimentos um pouco desajeitados, mas ainda assim havia algo
sexy sobre aquele momento íntimo. Talvez fosse o fato da sua quase nula
experiência com outros caras, o que me deixava ainda mais satisfeito, como
um neandertal louco e possessivo que queria tudo dela apenas para si.
Paula estava insegura, era verdade, mas não o suficiente para impedi-la de
buscar o que queria. E tive que abrir os olhos, porque precisava ver de perto
toda aquela determinação em me dar prazer. Meu corpo inteiro se contraiu
quando seu aperto se tornou mais confiante e mais rápido.
— Paula…
Ela olhou para cima, com os lábios entreabertos e bochechas coradas.
Quando sorriu, parecendo muito satisfeita com a reação que obteve, tive que
fechar os olhos novamente, porque era demais para mim. Então, abrandando
o aperto na base, o polegar roçou a glande e um calor quente e úmido o
envolveu, enviando-me diretamente ao ápice, e me ouvi gemer quando
minhas pernas se enrijeceram.
Puta que pariu!
Aquilo era demais para mim. Por mais que quisesse que ela me chupasse,
talvez, no fundo, achasse que não teria coragem de ir em frente e não ficaria
decepcionado, afinal, oportunidades não faltariam para que fizesse o que
quisesse comigo, mas não podia estar mais enganado, e ela caiu de boca em
tudo. Tentei afastá-la, porque aquela sua ânsia era demais para mim, mas ela
não cedeu e pelo visto não iria até conseguir o que queria de mim.
Entregue, joguei a cabeça para trás, gemendo, meus dedos apertaram seu
cabelo, ajudando-a com seu empenho fenomenal. Apesar de receosa,
inicialmente, Paula pegou o ritmo e pareceu saber exatamente o que estava
fazendo. Com um talento nato saboreava-o por completo, o que por si só já
seria o bastante para me deixar fora de controle, e visão do meu pau sendo
mamado com gosto por ela era a imagem mais foda que eu poderia ter.
Meu gemido preencheu todo o quarto, misturando-se com o dela, que
parecia tão excitada quanto eu enquanto chupava-me e brincava com minhas
bolas. Então me perdi.
— Paula… Pare… Eu vou… Oh, merda!… Eu… — tentei alertá-la do que
viria, mas foi em vão, pois ela não parou.
E também não havia mais como parar o êxtase que se construiu dentro de
mim e com um rosnado rouco jorrei em sua boca preenchendo-a com meu
gozo enquanto chamava seu nome no orgasmo mais espetacular da minha
vida. Por um segundo ou dois me vi desnorteado e respirando com
dificuldade, a agarrei pelos braços e me deitei com ela na cama. Paula estava
deitada debaixo de mim, quente e úmida, como um convite nefasto difícil de
recusar. Enterrando meu rosto no pescoço dela, mordisquei, acariciei os
mamilos rijos, antes de afundar o dedo em minha próxima parada.
— Você está tão molhada — grunhi, antes de sorrir como um drogado
prestes a alimentar seu vício.
Eu sabia que não dava mais para voltar atrás. Na verdade, já era tarde
demais. Por isso, enquanto a masturbava com uma das mãos, com a outra eu
tentava alcançar a gaveta para pegar uma camisinha. Meu polegar deslizava
para o canal apertado, sentindo o desejo úmido e depois de um trabalho
gigantesco de contorção para alcançá-lo sem soltá-la, finalmente consegui
encontrar o preservativo e com uma alta dose de desespero abri a embalagem
com os dentes, antes de me afastar apenas o suficiente para desenrolá-lo no
meu pau.
Voltando para o que importava, tornei a beijá-la, minha língua brincando
com a dela como se estivesse travando uma batalha. Afoita, Paula envolveu
as pernas em volta da minha cintura e de uma forma meio desajeitada tentou
guiar-me para onde me queria, mas apenas provoquei-a, brincando com meu
pau na sua entrada. Gemendo, ela praticamente me implorou para que fosse
adiante, então tornou-se impossível não ceder. Paula queria aquilo e eu
planejava deixá-la satisfeita em todos os sentidos, naquela noite e em todas as
outras que viriam.
Afastando a boca da dela, levei suas mãos para contornarem meu pescoço
e, ofegante, Paula piscava rapidamente, mordendo o lábio em seguida,
parecendo um pouco nervosa, ainda assim não poderia estar mais linda. Com
cuidado, empurrei contra o canal apertado, os olhos dela se alargando,
brilhando em excitação e êxtase.
Um gemido pareceu sair das minhas entranhas quando fui mais a fundo.
Centímetro por centímetro, ganancioso para que me envolvesse, quente e
apertada. Havia uma barreira e foi apenas quando a perpassei que me dei
conta do significado.
Porra! Ela era virgem! A pequena jogadora mentira para mim!
Um suspiro lhe escapou quando se deu conta de que seu segredo acabara
de ser descoberto, e por um tempo fiquei parado dentro dela, mas embora
tivesse ficado surpreso, não foi o suficiente para me assustar. Pelo contrário,
só queria fazer aquele momento ainda mais perfeito para ela. Paula pareceu
prestes a dizer alguma coisa, mas a calei, correndo a língua por seus lábios
antes de beijá-la outra vez. De forma lenta e metódica, para que ela se
acostumasse com o meu tamanho, entrei e saí do corpo dela incontáveis
vezes, engolindo seus gemidos de prazer com a minha boca.
— Você está bem? Estou te machucando? — perguntei, mal reconhecendo
minha própria voz.
Eu esperava mesmo que não estivesse. Pois estava custando todas as
minhas forças não me afundar nela, exatamente como queria, do jeito que
meu corpo exigia que fizesse. A maneira como reagia poderia ser um sinal,
ainda assim, eu precisava ter certeza.
— Não. Estou bem — gemeu baixinho, de modo que fui ainda mais
devagar, empurrando contra ela, porque aquilo estava sendo foda demais para
mim também.
Quando parei de me mover, deixando-a tomar o passo seguinte, os quadris
dela se contraíram, apenas um pequeno movimento, mas eu o senti como uma
onda de choque. Tomando aquilo como uma permissão para seguir, a beijei
enquanto puxava para fora lentamente, e então deslizei de volta para dentro, o
suspiro de prazer sendo o que eu precisava ouvir para ir em frente.
— Ah… Porra, Paula! — rosnei, perdendo todo o controle.
Como era sua primeira vez, a deixei definir o ritmo e, meu Deus, com
movimentos ansiosos, Paula mostrava querer mais e isso fez com que minha
contenção se quebrasse e então me vi como um louco, enfiando
profundamente nela, uma e outra vez, os gemidos suaves que lhe escapavam
tornando-se cada vez mais altos à medida que a intensidade e ritmo
tornavam-se cada vez mais febris. Seu canal se contraiu em torno de mim,
enquanto ela gritava meu nome e arranhava minhas costas com as unhas
compridas em meio ao êxtase.
— Eu vou gozar — avisei, porque não conseguia segurar.
Não mais…
Em ritmo implacável, passei a fodê-la sem dó, enterrei o rosto em seu
ombro, o corpo tremendo sobre o dela enquanto me enterrava tão profundo
quanto o seu corpo permitia, e então vim com um rosnado animalesco,
derramando todo meu prazer, gozando como nunca tinha acontecido em toda
a minha vida.
Com o corpo ainda trêmulo pela libertação, caí em cima dela, os dois
quietos, recuperando as respirações e o controle dos batimentos cardíacos
acelerados. Depois de um momento, levantei a cabeça e encarei seus olhos
lânguidos, que me fitavam com ansiedade.
— Você está bem? — quis ter certeza, de fato estava preocupado que
tivesse sido demais para ela.
— Sim… — foi sua resposta, ainda ofegante.
Pensei em me levantar de cima dela, porém a maneira como Paula
acariciava meu cabelo, como se quisesse garantir que não me afastasse, me
fez pensar melhor. Ela não tinha que se preocupar, pois eu não pretendia me
afastar. Não havia qualquer outro lugar no planeta onde gostaria de estar.
Paula era como uma droga narcotizante, tinha acabado de ter a melhor dose
da minha vida e estava viciado. Não havia nenhuma maneira de deixar aquele
vício partir.
Invertendo nossas posições, não consegui deixar de sorrir, porque mesmo
que tivesse acabado de ter um orgasmo intenso, ainda assim queria mais. Não
me ajudava em nada nossos corpos desnudos estarem colados um no outro,
pois era como se as portas do paraíso estivessem abertas e como um menino
afoito queria correr e explorar tudo quando o assunto era ela.
Roubei um beijo seu e como se ela tentasse recuperar o fôlego, me
surpreendeu ao perguntar:
— Eu me saí bem? — o tom de insegurança estava lá, e de olhos
arregalados eu encarava o rosto dela ruborizado.
Sério mesmo?
— Você está mesmo me fazendo essa pergunta? — eu quis saber, porque
não conseguia acreditar que ela tivesse alguma dúvida sobre o que nos
acontecera. Contudo, o menear hesitante, bem como a maneira ansiosa que
mordia os lábios me provaram que sim. — Bem é uma palavra ínfima para
você. Embora a sua pequena mentira tenha me assustado por cerca de um
segundo, sua performance foi digna de um 10. — Eu ri, quando ela fechou os
olhos, envergonhada e com vontade de mais, beijei-a em seguida.
Eu não tinha dúvidas, Paula Maia era a pessoa que estive esperando a vida
toda e nem mesmo sabia.
PAULA
CAPÍTULO
VINTE E UM
O percurso até o aeroporto foi bem demorado, mas como nosso voo era
apenas no início da tarde, o fato de pegarmos um engarrafamento monstruoso
por causa da hora do rush não interferiu em muita coisa. Embora tenha
apenas ajudado a intensificar sobremaneira minha ansiedade.
Por estar representando a DiFiori no evento, todas as despesas da viagem
seriam pagas pela empresa, e como se viajar para outro país já não fosse
suficiente, ainda iríamos fazer aquilo no jatinho da empresa. Tudo bem que
só estava acontecendo aquilo por causa de Caio, porque duvidava muito que
haveria um avião particular à minha disposição, ainda assim era um pouco
demais para minha cabeça.
No terminal de embarque particular, fiquei deslumbrada olhando as
aeronaves de pequeno porte, todas alinhadas e a postos para levar seus
tripulantes abastados. A que pertencia à DiFiori era branca, com adesivos
estilizados na cauda e a logomarca da empresa destacada. Depois de
pegarmos as malas, embarcamos no jatinho e por um tempo admirei o interior
em bege com detalhes de madeira. Como todos os outros, contava com
algumas poltronas comuns, mas também havia uma área para descanso e
jantar, que ficavam ao lado de uma pequena acomodação com uma cama.
Sentamo-nos em duas poltronas confortáveis e logo uma comissária muito
bonita e elegante se aproximou com um largo sorriso:
— Bom dia, senhor DiFiori! Bom dia, senhora.
— Bom dia, Margô. — Ele sorriu para ela, antes de nos apresentar. —
Paula, essa é Margô, nossa comissária de bordo. Margô… Essa é Paula,
minha namorada.
— Prazer, Margô — eu a cumprimentei com um sorriso que esperava que
fosse amigável, mas dado o meu estado de nervosismo, não me surpreenderia
que estivesse assustando a mulher.
— Prazer em conhecê-la também, Senhora Paula — retribuiu, muito
simpática. — Posso lhes servir alguma coisa? — perguntou.
— Apenas um café, Margô. Obrigado. — Ele se virou para mim,
esperando que me pronunciasse: — E você?
— Não, obrigada. — Sorri, porque do jeito que estava nervosa, não tinha
tanta certeza que ingerir alguma coisa seria ideal, já que era bastante
arriscado que eu não conseguisse manter dentro do estômago.
— Somente isso então. Obrigado. — Ele sorriu, antes de a aeromoça se
retirar para atendê-lo.
Devo ter feito um trabalho muito ruim ao tentar não demonstrar meu
nervosismo, pois assim fechei os olhos, Caio perguntou, à queima-roupa:
— Essa é a primeira vez que você anda de avião, não é? — Assenti, sem
nem me preocupar em fitá-lo. — Claro, por isso que está tão nervosa a
semana toda! — ele soltou, como se fosse óbvio.
Não, não era, mas ele não precisava saber disso… Pelo menos não ainda.
Respirando fundo, tentei não pensar muito sobre aquilo e também não
corar.
— Por que não me disse? — indagou, parecendo realmente preocupado, e
me vi obrigada a encará-lo.
— Não sei. — Dei de ombros como se não fosse nada de mais e eu nunca
tivesse cogitado a possibilidade de passar semanas em um navio para chegar
ao nosso destino, ao invés de me submeter àquela tortura. Ou então
simplesmente fingir que estava doente e não ir.
— Ei! — ele me chamou, a mão masculina cobrindo a minha quando
tornei a suspirar. — Prometo que assim que decolarmos vou fazer você
esquecer esse nervosismo — emitiu baixo, a voz mais rouca que o normal, o
que me fez piscar sem entender, mas ele rapidamente ganhara minha atenção.
— Como? — eu quis saber, mas antes que ele respondesse a voz do piloto
nos interrompeu:
— Boa tarde, senhoras e senhores. Sejam bem-vindos à bordo. Para vosso
conforto e segurança, na preparação para a decolagem, queiram sentar-se,
apertar os cintos de segurança, colocar as costas do assento e a mesa na
posição vertical. Obrigado. E boa viagem.
Ai, meu Deus, era agora!
Com a respiração interrompida, me certifiquei de que o cinto estivesse
mesmo afivelado e pela janela ao lado dele, vi o jatinho taxiar. Fechei os
olhos com força e comecei a pensar em coisas para me distrair e me livrar
daquela sensação terrível de desconforto, bem como do frio estranho na
barriga.
Tentei lutar contra, mas o mal-estar aumentava, mesmo após perceber que
a aeronave estava estabilizada no ar. Senti um tremor me dominar
vagarosamente e pensei que fosse desmaiar. Notando minha reação, Caio
apertou ainda mais minha mão, enquanto sentia meu estômago revirar.
— Ei, olha para mim — ele pediu, segurando meu queixo para forçar-me a
atendê-lo, o que eu fiz. — O que acha de depois da decolagem irmos para o
quarto e eu te levar para as alturas de outro modo? — a pergunta feita de
forma nefasta fez meu estômago revirar de outra maneira, dessa vez de uma
forma boa.
— Podemos fazer isso? — perguntei, subitamente interessada.
— Claro, podemos fazer o que quiser, minha linda. — O timbre de Caio
arrepiou-me a nuca, e com aquelas piscinas que me bebiam, tinha a sensação
de que aquela viagem seria, de fato, inesquecível.
Fazer sexo estava, com certeza, entre as melhores coisas da vida. Mas
fazer sexo dentro de um avião nas alturas fora uma experiência para guardar
eternamente na memória. E, como sempre, Caio não decepcionava quando o
assunto era fazer das nossas as melhores. Como ele mesmo disse, tudo fazia
parte do modelo de projeto pervertido, já que ele tinha elaborado de forma
bastante detalhada nosso cronograma de satisfações e tínhamos que
cumpri-lo, claro.
Uma limusine nos aguardava quando aterrissamos no aeroporto de Nova
York e depois de cumprir todos os trâmites com a imigração, seguimos até o
carro, onde eu olhava tudo com admiração. Obviamente era comum para
pessoas ricas como Caio usarem do serviço de chauffeur[11], mas aquele tipo
de coisa só tinha visto nos filmes, então era de se esperar o quanto eu estava
deslumbrada com todo aquele luxo.
Quanto mais andávamos, mais me surpreendia com tudo que via. Nova
York era mesmo impressionante. Um lugar único, onde ao lado de arranha-
céus vivem parques extremamente arborizados. Eu mal me continha, animada
demais, querendo ver tudo, desde os impressionantes prédios altíssimos em
contraste com os menores com fachadas de tijolinhos vermelhos e escadas de
incêndio, aos parques, as avenidas congestionadas, milhares de pessoas
caminhando pelas ruas, as feiras, os imensos letreiros, restaurantes, lojas,
expressões de diferentes culturas e também tão distintas da nossa.
Um ambiente tipicamente nova-iorquino, que encanta por si só, formando o
cenário de filmes e séries, que pareciam de alguma forma nos transbordar
para dentro da história outra vez.
Caio, já acostumado com o ambiente tipicamente nova-iorquino, achou
graça da minha empolgação, mas pediu ao motorista que fizesse um percurso
maior para darmos mais algumas voltas. E depois de algum tempo seguimos
para a famosa 5ª Avenida, onde paramos no hotel onde ficaríamos
hospedados, o mundialmente conhecido The Plaza.
O Plaza fica localizado na região central de Manhattan, bem perto do
Central Park e também dos maiores pontos turísticos da cidade, como
MoMA, Rockefeller Center e a St. Patrick`s Cathedral. O hotel que teve
como referência o estilo dos castelos renascentistas franceses é uma
construção imponente, elegante e grandiosa e a decoração de seu interior era
ainda mais bonita, com toques clássicos e enormes lustres de cristais.
Há mais de um século o Plaza recepciona artistas e convidados notáveis,
além de ser ponto de encontro para importantes reuniões políticas e outros
eventos de grande repercussão. E agora seria a minha vez de me sentir dentro
do meu próprio filme. Uma das Legacy Suites era o local onde nos
acomodaríamos pelos próximos dias e, desde que passei pela porta, não tive
dúvidas de que era realmente digna de tantas estrelas que acompanhavam seu
nome.
Combinando mobiliário atemporal com um toque contemporâneo e
adicionando um pouco de elegância clássica, a suíte contava com uma cama
king-size, sala de estar, copa, banheiro em mármore com mosaicos florais e
uma saleta separada do quarto. E o mais impressionante: a energia acolhedora
e a vista sensacional para o Central Park e quase toda Manhattan.
Depois de descansarmos um pouco da longa viagem, nos preparamos para
o jantar que antecederia o evento e aconteceria em um dos restaurantes do
Hotel, onde apenas alguns poucos convidados participariam. Como grande
conglomerado de publicidade mundial, claro que a DiFiori fora convidada
daquele jantar tão seleto, até porque ela seria uma das grandes homenageadas
do evento.
Como namorada de um dos homenageados, claro que não poderia fazer
feio, por isso que antes de viajar havia feito uma “pequena farra”. Fui ao
salão, me depilei, fiz as unhas. Também fui forçada a fazer algumas compras
e depois de finalizar a maquiagem que fiz seguindo o tutorial da internet,
optei pelos cabelos soltos, calcei os saltos e coloquei o vestido que havia
trazido especialmente para aquela noite, um tubinho longo na cor preta, que
dava uma valorizada legal nas minhas curvas.
Quando o experimentei na loja, dias antes, a moça que me atendera fizera
inúmeros elogios e até mesmo disse que me conferia um visual sexy, mas
como eu não acreditava muito em papo de vendedora, o levei apenas porque
havia gostado. Todavia, comecei a acreditar que ela estava certa no momento
em que entrei na sala e senti os olhos de Caio em mim. Foi impossível não
sorrir quando notei que ele nem mesmo conseguia disfarçar a forma cobiçosa
que me fitava. E claro, aquilo elevou bastante meu ego.
Eu o vi abrir a boca mais de uma vez, parecendo sem palavras e gostei
mesmo de ser o motivo de vê-lo emudecer.
— Você está linda demais — disse, por fim, fazendo-me enrubescer.
E com toda sua magnificência, veio até mim, o terno feito sob medida
deixando-o ainda mais bonito e elegante, a aproximação fazendo o calor
reverberar pelo meu corpo, aquecendo-me por dentro e me arrepiando por
completo. Meu pobre cérebro parecia ter entrado em curto circuito e minha
calcinha, bem, ela estava, literalmente, estragada.
Linda de uma maneira inesquecível — sussurrou, depois de encostar
suavemente os lábios nos meus e com os olhos de lince brilhando completou:
— Resta para mim a tarefa de fazer da sua noite também memorável. Sorriu
enigmaticamente.
Ai, Senhor! O que ele queria dizer com aquilo?
Não tive tempo de perguntar ou até mesmo responder, não conseguia, e
com o corpo colado ao meu, ele cumpriu exatamente com o que prometeu.
Motorista de carros de luxo.
CAIO
CAPÍTULO
VINTE E SEIS
Nada está totalmente em nosso controle e por mais empenhado que você
seja, nem sempre sai como o planejado. Talvez por esse motivo que os
acontecimentos inesperados são mais propensos a serem mais bem-sucedidos.
Ou não, porque ver minha namorada desmaiar em pleno pedido de casamento
não apenas atrapalhou o momento, como também me deixou assustado para
caralho.
Felizmente não demoraram para chegar com os primeiros socorros e com
Paula ainda desacordada, seguimos na ambulância até o hospital mais
próximo do hotel. Ainda durante o caminho, me fizeram algumas perguntas
sobre o estado de saúde dela e mesmo que estivesse nervoso, respondi que ela
estava normal até então, sem sentir nada, mas me lembrei de que no fim de
semana anterior Paula não estava muito bem, que inclusive passou boa parte
do dia no banheiro, vomitando.
Na ocasião, embora eu insistisse em levá-la ao médico, Paula não aceitara
e depois de um dia ruim garantira que estava melhor, e parecia mesmo. Mas
vendo-a desfalecida em uma cama de hospital, comecei a me culpar por não
ter insistido mais. Talvez ela não passasse por aquela situação se tivéssemos
ido ao médico antes.
— Caio? — a voz baixa e muito fraca dela me chamou e imediatamente
abri os olhos para encontrar os dela um tanto perdidos. E naquele instante
finalmente voltei a respirar, aliviado.
— Oi, minha linda. — Acariciando seu rosto, sorri para ela. Eu estava
sentado na cadeira ao lado da cama dela, lugar, de onde não saí de jeito
nenhum. Inclusive acompanhei a retirada do sangue para exames.
— O que aconteceu? — indagou, o timbre cada vez mais baixo,
preocupado.
— Você desmaiou… — comecei a explicar, no entanto ela me cortou:
— Você me pediu em casamento! — ela soltou, a voz subindo alguns tons,
e eu não sabia se ficava feliz por vê-la reagir ou se me preocupava com o fato
daquilo parecer tê-la assustado, já que obviamente fora o motivo do seu
desmaio.
— Não se preocupe com isso agora — soltei como se não fosse nada e por
dentro não me sentisse mal. — O que importa agora é a sua saúde. — E era
verdade, meus sentimentos ou ego feridos eram irrelevantes no momento.
— Caio? — ela me chamou, fitando-me com os olhos cheio de lágrimas, e
meu peito se apertou, porque talvez tenha sido precipitado e não queria ser o
motivo de ela se sentir triste ou culpada.
— Está tudo bem. Podemos conversar sobre isso depois… — Abanei uma
das mãos, em sinal de descaso, esperando ter sido convincente, e ainda assim
a expressão dela não se aliviou.
— Não, Caio, não é nada disso — rapidamente falou e franzi o cenho,
quando parou por um momento ou dois e esperei que continuasse. — Existe
um outro motivo para acontecer o que aconteceu. Talvez eu possa ter
cometido um erro… — Fungando, ela limpou as lágrimas que começam a
rolar em seu rosto.
Porra, eu era o erro a que ela se referia?
Sentindo-me miserável pela possibilidade, engoli qualquer pergunta que
pudesse ter quando o médico entrou no quarto.
— Que bom que acordou, Sra. Maia. Como se sente? — ele perguntou em
inglês enquanto analisava o prontuário e depois voltou a atenção para ela.
— Ela esteve vomitando todo o fim de semana passado, mas desde então
me dizia estar melhor — também em inglês, me apressei a responder, só no
caso de ela decidir ocultar coisas que podiam ser relevantes para o
diagnóstico médico.
— Mais alguma coisa? — ele indagou, sério, fitando-a diretamente dessa
vez, e ela desviou os olhos dos dele e meneou a cabeça, negando, ao passo
que passara a analisar as unhas com atenção.
— Como pode ver no prontuário, somos brasileiros e estamos na cidade
apenas de passagem e tudo que ela comeu, também comi. E o mesmo
acontece no Brasil, pois moramos e trabalhamos juntos. — Por algum motivo
ele riu, o que, claro, eu não entendi o motivo.
— Então, pelo Brasil ter um clima tropical, há diversas possibilidades de
doenças relacionadas com os poucos sintomas que ela teve, mas vamos
começar verificando os exames inicias e ir descartando as suspeitas mais
óbvias. É o tempo de acabar com o soro, para chegarem os resultados. Mas
pode ser até mesmo apenas uma gripe motivada pela mudança de tempo. A
não ser, claro, que a Sra. Paula suspeite de alguma outra coisa. — Com um
simples sorriso, ele aparentemente esperava que minha namorada o
desmentisse, e olhei de um para o outro sem entender nada.
— Sim — titubeou, nervosa, e limpando a garganta, tomou coragem para
finalmente dizer: — Eu acho que posso estar grávida.
Todo o sangue do meu corpo pareceu se esvair enquanto eu os encarava
boquiaberto. E teria caído no chão, se não estivesse sentado, embora tenha a
ligeira impressão de que devo ter tido uma espécie de apagão de um ou dois
segundos, porque quando voltei a mim, o médico estava me examinando e
não a Paula.
— Você está bem? — minha namorada quis saber, em um fio de voz.
Assenti, embora a verdade é que eu estava muito, muito assustado.
— Eu estou bem — garanti, quando notei o médico indo pegar o
estetoscópio e ele então recuou ao notar que não precisava.
— Certo. Eu acho que vocês precisam conversar. Vou tentar apressar os
resultados e daqui a pouco retorno. — Paula concordou com o médico, que
logo em seguida saiu do quarto, fechando a porta atrás dele.
Se eu fosse sincero, estava meio que em pânico. A última coisa que
imaginei que aconteceria quando decidi pedir Paula em casamento era parar
em um hospital e descobrir que talvez pudesse ser promovido a pai, e não a
noivo.
Deus! Eu seria pai mesmo?
— Você está grávida? — Alcei a sobrancelha ao perguntar e ela abaixou o
olhar, nitidamente querendo fugir do confronto.
— E-eu… Eu… Eu não sei… — gaguejou, as palavras ficando presas na
garganta, e acabei suspirando.
— Por que não me disse? — indaguei, sentindo-me um pouco magoado
por não dividir aquela dúvida comigo.
— Achei que você fosse ficar chateado… Que ia me culpar, ou coisa
assim. Prometo que não foi de propósito. Sei que foram poucas as vezes que
aconteceu sem camisinha, mas juro que fui até a farmácia e tomei aquelas
pílulas do dia seguinte. Até mesmo marquei um ginecologista para ver a
possibilidade de ele me prescrever algum anticoncepcional, mas comecei a
passar mal na semana passada e comecei a desconfiar. Não consegui fazer
nenhum teste e muito menos falar sobre o assunto com você, porque estava
assustada, mas ia. Só estava tomando coragem — lançou de uma vez, ainda
sem conseguir me encarar, e ofeguei em surpresa.
— Eu nunca poderia culpá-la, Paula — apontei o óbvio, antes de segurar o
queixo dela, forçando-a a me fitar. — Além do mais, sou bem grandinho e
sabia bem do risco que corríamos. — Meus lábios se torceram enquanto
considerava aquilo. — É inesperado, mas…
— Mas e se eu estiver grávida? — Ela tinha um olhar assustado no rosto,
que me deu vontade de beijá-la, mas o que ela precisava mesmo era de apoio.
— Você não fez sozinha. — Isso pareceu aliviá-la um pouco, ainda assim
sua expressão não deixara de explicitar sua preocupação.
— Mas e se… — Interrompi-a, silenciando a boca com um beijo suave.
— Vamos nos preocupar em fazer essa pergunta apenas se o resultado for
positivo. E caso seja, está tudo bem — murmurei em resposta, ainda que
estivesse surtando com a possibilidade e fechando os olhos, ela meneou a
cabeça, assentindo, antes de me abraçar.
Caio ainda parecia muito assustado com o conselho que ouviu horas
depois. Comecei a imaginar que ele estava pensando seriamente em desistir,
mas quando ele me chamou em sua sala e entrei, fiquei surpresa em descobrir
que ele realmente estava seguindo o conselho da Melissa e assistia aos vídeos
que ela postava.
— Vem aqui, noiva — ele me chamou e eu sorri.
Ainda era meio estranho ouvi-lo me chamar daquela maneira. Era recente
ainda e acontecera tudo tão rápido, que sentia-me meio anestesiada, todavia,
estava feliz como nunca me senti antes. Passar todas as noites enroscada nos
braços dele, presos numa felicidade que era só nossa, deixava-me numa
espécie de êxtase sem fim.
Aproximei-me da mesa, o olhar malicioso dele pegando-me em cheio, e
quando me puxou para o seu colo, beijou minha boca de um jeito que me
aqueceu até os dedos dos pés.
— Não sei se você se lembra, mas falta um item da nossa lista de tarefas,
que eu propositalmente deixei por último.
O modelo de projetos imediatamente me veio à mente. Número 4…
— A arte visual e produção de imagens — balbuciei, sem conseguir
fazer mais do que piscar.
Era o grand finale!
— Sim… E como estamos no ambiente de trabalho, podemos até incluir
isso no cronograma de satisfações.
Agarrando seu pescoço, o puxei para mim e ele sorriu, satisfeito, antes de
nossos lábios se encontrarem. O beijo foi a combinação perfeita entre
suavidade e firmeza, que nos fez gemer, tudo vibrando, ateando fogo em
mim. Eu queria experimentar tudo.
— A ideia de que estamos assim em pleno expediente te excita? —
assenti, incapaz de negar.
Caio não perdeu tempo e voltou a me beijar com ímpeto, antes de me
colocar sentada na mesa virada para a parede de vidro que tinha uma visão
completa de todo o andar, embora ninguém pudesse ver o que acontecia lá
dentro. Com um sorriso perverso, ele me despiu rapidamente com a destreza
de um mágico, antes de deslizar a boca pelo meu pescoço, uma trilha úmida
pela minha pele, lento e constante, como se o mundo e tudo nele fosse nosso.
E naquele momento era mesmo.
Sentando novamente na cadeira, segurou meus quadris e puxou-me em sua
direção, abrindo minhas pernas para nosso bel-prazer. Quando os dedos
longos correram entre as minhas pernas e deslizaram pelas minhas dobras,
finalmente entrando em mim, gemi e então sem prévio aviso Caio começou a
me chupar com desejo, deixando-me cada vez mais louca pelas suas
investidas com a língua.
Aquela posição vulnerável não me envergonhou, na verdade me fez sentir
poderosa: eu me arqueava para trás, completamente perdida, sentindo o
orgasmo se aproximando rapidamente, e quando ele chegou, veio com força
total.
Virando-me de costas para ele, ouvi o farfalhar das roupas de Caio, que me
deixara saber que ele também estava livre. Mordendo os lábios em
expectativa, senti o corpo quente rodear o meu, provocando-me apenas com
beijos, as mãos apertando meus quadris, ofegante, estava praticamente
implorando por ele. E como a monstrinha que ele mesmo criou, não me fiz de
rogada e estendi a mão para encontrar o pau dele e o guiei para dentro de
mim, até que meu corpo arqueou para encontrar o dele, deixando-me sem
fôlego e ainda assim querendo mais.
Ali no meio do escritório, com tantas pessoas por perto e outras passando a
apenas alguns metros sem saber de nada, e, mesmo assim, tudo se resumia a
nós e àquele momento. Em um ritmo que era apenas nosso, as investidas
foram aumentando a velocidade, os sons irregulares das respirações cada vez
mais descompassados, os gemidos se misturando, tudo nos levando cada vez
mais perto do limite. Caio virou meu rosto para beijar-me os lábios, depois se
moveu para a minha orelha, pescoço, como se não pudesse ter o bastante. Ele
mordia e lambia, gemendo e chamando o meu nome, quase como se recitasse
uma oração, até que nos perdemos naquela viagem e não havia nada que
fosse aquela sensação que parecia me engolir. Não havia mais medos ou
inseguranças, apenas anseios.
— Porra! — xingou, no exato instante que ondas de prazer se quebraram
em mim em pleno êxtase.
Em meio às convulsões do meu orgasmo, Caio intensificou as estocadas,
urrando, estremecendo em seguida, antes de encontrar a própria libertação. O
corpo suado não desgrudou do meu e ele descansou a testa contra o meu
ombro, nós ficamos daquele jeito por um tempo, lutando para acalmar nossas
respirações.
— Eu filmei — ele sussurrou, ainda sem sair de dentro de mim.
O que ele disse?
Demorou alguns instantes para que as palavras fossem registradas no meu
cérebro.
— Oi?
— Não podíamos fazer uma produção de imagens sem uma gravação —
brincou e, notando que eu estava séria, rapidamente completou: — Não se
preocupe, não dá para ver nossos rostos, e se você quiser, eu apago. — Ele
fitou-me demoradamente e por um tempo nada disse, provavelmente para me
deixar pensar.
Engoli em seco, porque ainda não sabia muito bem como me sentia a
respeito, mas acabei dando de ombros, pois era uma coisa nossa, íntima,
confiava em Caio. Ele resfolegou, aliviado, e voltou a se aproximar para me
beijar.
— Seria estranho se eu dissesse que achei excitante saber que temos uma
sextape? — Ele riu, voltando a entrar e sair novamente de mim com
estocadas lentas e deliberadas.
— Não. Na verdade, isso me faz achá-la ainda mais perfeita. Que bom
então que podemos fazer quantas sextape você quiser. — Mordi os lábios e
nada disse em resposta.
É… Talvez pudéssemos fazer mais mesmo.
Era para ter conversado com Paula há muito tempo, ter lhe contato tudo.
Se tivesse feito, ela não teria fugido, pensando sabe-se lá o que sobre mim, e
eu também não estaria acelerando feito um maluco com o carro, sem me
importar com multas ou sinais vermelhos. Queria apenas chegar em casa,
chegar até ela.
O caminho até lá se passou em um borrão, enquanto tentava ligar para ela,
que não me atendia, e durante todo o tempo a culpa me corroía as veias. A
culpa pelos meus erros, omissões, pela minha covardia… Culpa. Culpa. Era a
maldita culpa me corroendo por dentro. E a viagem de elevador, que
normalmente era rápida, pareceu mais longa do que nunca. Eu não conseguia
suportar a possibilidade de perdê-la. Simplesmente não podia.
As portas do elevador começaram a se abrir e nem mesmo esperei
terminar, antes de sair de uma vez, angustiado para chegar, e a cada passo
que diminuía a distância até o apartamento, rezava para que estivesse lá
dentro.
Só esperava que não fosse tarde demais…
Abri a porta e resfoleguei quando pus os olhos nela, dando graças a Deus
que estivesse ali. Contudo, ela não estava sozinha, e aquilo foi uma enorme
surpresa para mim. Paula estava sentada no sofá, e ao lado dela, segurando
sua mão, estava um rapaz moreno, bem-apessoado, que não demorei muito a
reconhecer: era o mesmo cara da cafeteria.
O que diabos ele estava fazendo ali com a minha mulher?
— Que merda está acontecendo? — eu quis saber, a pergunta saindo
estranha pelos meus lábios.
— Não é o que está pensando, Caio… — Paula se pôs de pé, na defensiva,
e o seu nervosismo deixou claro para mim que aquilo significava apenas uma
coisa: ela era culpada.
— Sério que você vai vir com essa desculpa clichê péssima, Paula Maia?
— devolvi, num tom tão irônico e exasperado que a surpreendeu.
— Caio, eu… — Ela deu um passo à frente, fazendo-me dar outro para
trás, a sua titubeação golpeando-me em cheio.
— Acho melhor eu ir, vocês com certeza têm muito o que conversar — o
cara teve a coragem de falar e eu ri, com ironia.
— Não tenha dúvidas! — não hesitei em lhe dizer, deixando-o de certa
forma constrangido.
— Caio! — Paula soltou meu nome, certamente chocada pela minha
sinceridade.
— O que quer eu faça, Paula? Que eu trate bem o cara que estava na
minha casa com a minha noiva? — Ela pareceu insultada e abriu a boca para
responder, contudo o corajoso foi mais rápido.
— Não se preocupe comigo, Paulinha. Qualquer coisa, sabe que pode me
ligar, não é? — Paula aquiesceu e ele foi até ela abraçá-la, deixando-me
boquiaberto.
Paulinha? Que filho da puta ousado!
Queria quebrar-lhe a cara e expulsá-lo dali a ponta pés, mas não o fiz,
porque se ele tinha coragem para fazer aquilo, era porque certamente tinha
intimidade para tal. O que, claro, me deixou puto. Juntando todo autocontrole
que tinha, esperei calado que partisse, e por um momento ou dois nenhum de
nós falou qualquer coisa.
— Você não vai dizer nada? — ela quis saber ante meu silêncio, e meneei
a cabeça, negando, os lábios travados numa linha dura. — Caio, por favor,
não é nada disso… — negou, os olhos sofridos em minha direção — Ele só
estava aqui em casa porque eu o chamei. Ele é apenas um amigo…
— Amigo? — repeti a palavra, sentindo o amargo gosto em minha língua.
— Desde quando, Paula? — questionei, estreitando os olhos em sua direção,
meu tom de voz não escondendo em nada minha decepção.
— Há algum tempo — respondeu por fim, depois de certa titubeação.
— E você nunca me disse por quê? — insisti, cada vez mais nervoso.
— Não sei. Nunca tive um antes… E não fazia ideia de que fôssemos
continuar amigos. Mas juro que ele é só isso. — Paula deu de ombros,
envergonhada, e meneei a cabeça, mas permaneci calado e não consegui nem
a encarar mais. Percebendo o meu afastamento, ela se aproximou, e com a
voz baixinha pediu: — Por favor, não me torture assim, eu não mereço isso.
Talvez não, mas estava de cabeça quente e ainda tinha muito o que digerir.
— Caio, fale comigo! Ao contrário de você, não escondi nada! Apenas não
mencionei o fato de ter um amigo com quem saio de vez em quando! — ela
me lembrou, com indignação transbordando em suas palavras, e dessa vez ri
com escárnio.
Opa, como assim de vez em quando?
— Sai de vez em quando? — joguei entredentes, dando o meu melhor para
manter a voz baixa, quando minha vontade era esbravejar ante aquele detalhe
que ela propositalmente se esquecera de me contar.
— Sim, algum problema com isso? — ela me enfrentou e abri a boca para
responder, contudo, o interfone do apartamento tocou e Paula foi atender.
Enquanto ruminava toda aquela história, fui capaz de ouvir a voz dela, mas
não entendi o que falava, mas naquele instante nem mesmo me importei.
Tinha coisas demais para me preocupar. E quando retornou para sala, a vi
parecendo um pouco perdida e aquilo chamou a minha atenção.
— O que foi? — apressei-me em perguntar, enquanto ela respirava fundo,
nitidamente nervosa.
— Teremos que deixar essa conversa para depois — foi o que ela disse
antes de a campainha tocar.
— Quem é? — Com o cenho franzido, esperei por uma resposta e ela
engoliu em seco, antes de responder:
— Minha mãe.
— Sua mãe? — repeti, ainda sem acreditar.
— Sim. — Ela mordeu os lábios, incerta.
— Ela disse que viria? — sussurrei a pergunta e ela negou. — Então o que
diabos ela veio fazer aqui?
— Acho que é porque acidentalmente lhe contei que além de morar juntos
estamos noivos.
Ai, porra!
A campainha tocou outra vez e Paula respirou fundo, antes de ajeitar a
roupa que usava, um vestido manga longa floral na altura dos joelhos e botas
de salto.
— Tenho que atender. — Assenti, porque mesmo que estivéssemos no
meio de uma discussão, não podia simplesmente deixar a minha sogra do
lado de fora.
— Sim — anuí, deixando nossos problemas de lado. Ao menos por
enquanto. Paula foi até a porta e, assim que a abriu, sua mãe a abraçou.
— Oh, filha, que saudades!
— Oi, mãe… Eu também estava — Paula disse, ainda atordoada por vê-la
na nossa casa.
— Desculpe vir sem avisar, mas…. — A mãe de Paula parou de falar
quando me avistou e, surpresa, me analisou de forma deliberada. — Você
deve ser Caio — emitiu em reconhecimento.
— Sim. Caio DiFiori. É um prazer conhecê-la. — Ofereci a mão para
cumprimentá-la, contudo, ela resolvera me surpreender com um abraço
apertado, da mesma forma afetuosa que fizera com a filha.
Senti o rosto esquentar e quando voltou a olhar para mim, notei que ela
tinha o mesmo cabelo escuro de Paula, apesar de curto, e seus olhos eram de
um castanho mel. Mas fora isso, era como olhar uma versão mais velha da
minha noiva.
— Sou Carla, e o prazer é todo meu. — Os olhos dela varreram o
ambiente com escrutínio demorado e eu engoli em seco, sem saber direito
como agir, já que nunca tinha passado por uma situação parecida antes.
Afinal, nunca houve namoradas, noivas, muito menos uma mãe.
— Mãe, por que não disse que estava vindo? — Paula quis saber, embora
parecesse um pouco nervosa com a resposta.
— Preciso mesmo dizer, Paulinha? — A expressão da mãe dela dizia que a
resposta era óbvia e que provavelmente lhe devia algumas explicações.
— Ah… — Paula engoliu em seco, subitamente tímida, antes de nos
indicar o sofá e sentar-se ao meu lado. — Caio e eu… hã… bem, ele me
ofereceu um lugar para ficar quando cheguei.
Sério que era apenas aquilo que ela diria?
Depois de meses juntos, dividindo o mesmo teto, a mesma cama e até
mesmo um pedido de casamento, com certeza não era aquilo que eu esperava
que ela dissesse sobre nós.
— E isso por um acaso é um código novo para pedidos de casamento? —
Carla perguntou com certa ironia.
— Mãe… Eu estou… — Paula titubeou e a mãe dela foi mais rápida para
completar:
— Grávida? É por isso que vocês decidiram se casar assim depois de tão
pouco tempo? — testou, nos surpreendendo sobremaneira.
O quê?
— Não! — Paula apressou-se em garantir. — Eu não estou grávida! — Ela
deu uma risada nervosa para a mãe, antes de limpar a garganta, realmente
mexida.
— Desculpe, mas eu tinha que me certificar de que não estava me
escondendo mais nada, porque você há de convir que descobrir de um dia
para o outro que sua filha, que era virgem até sair de casa, está em um
relacionamento e de um dia para noite diz estar morando com o namorado de
quem tinha acabado de se tornar noiva é estranho, não é mesmo? — Ela nos
olhou como se esperasse uma resposta, e nós assentimos.
— Mãe! — Paula gemeu em pura vergonha, escondendo o rosto vermelho
entre as mãos, mortificada.
Puta merda, nem acreditava que ela tivesse dito aquilo!
Olhei para Paula, esperando que ela dissesse alguma coisa para negar o
que a mãe dissera, um flashback da nossa primeira vez se contorcendo ao
longo da cama enquanto se entregava completamente a mim me viera à
mente. Tudo fora tão intenso e inesquecível, que eu ainda podia ouvir todos
os seus sons, sentir seu calor, o gosto e o fato de a mãe dela estar à nossa
frente me impediu de fazer aquela fantasia ganhar vida outra vez.
— Então vocês têm certeza disso? — A mulher olhou de mim para ela e
nos entreolhamos, antes de assentir novamente, pois apesar dos nossos
problemas, que poderiam muito bem ser resolvidos com uma boa conversa,
ainda assim não havia como mentir quando casar-me com ela parecia ser a
decisão mais acertada.
— Eu amo sua filha, Sra. Carla — admiti, sem tirar os olhos dela, que me
fitavam emocionados.
— E eu o amo, mãe — Paula murmurou em resposta e eu sorri, recebendo
um sorriso dela em resposta.
— Parece que devo dar os parabéns a vocês — Carla disse com um
sorriso, antes de nos abraçar outra vez para nos felicitar.
Com uma força que não sabia de onde viera, consegui sair do bar e peguei
o primeiro táxi que passava na rua. Quando me perguntou para onde eu iria,
pedi apenas que seguisse sem parar, pois ainda não fazia ideia para onde ir
dali em diante. Chorei e chorei até que finalmente me senti pronta para voltar
para casa.
Depois de rodar por algumas horas, retornei para a casa que não seria mais
nossa e quando comecei a arrumar minhas coisas, minhas lágrimas
retornaram, descendo sem parar, como uma chuva incessante de verão. Eu
não tinha visto a tempestade no horizonte, ignorei todos os sinais e não houve
tempo para me precaver. Por isso me vi engolfada naquele ciclone de
emoções, sem chance de escapatória.
E a cada vez que tentava controlar, era impossível não pensar nas palavras
dizendo que nunca me amara e do arrependimento por ter dito alguma vez
que ficaríamos juntos para sempre. O arrependimento só não era maior que o
meu, que como uma tola havia caído no seu jogo, acreditando em tudo que
me disse, entregando-me por inteiro a uma relação com alguém que não
merecia nem mesmo parte de mim.
Deus, como pude ser tão burra?
Logo eu, que sempre havia me considerado tão esperta, sempre
determinada a ser alguém que não precisava de outra pessoa a não ser eu
mesma para me fazer feliz, havia caído naquela armadilha do amor.
Em que momento me tornei o que mais temia e caí naquele ardil?
Não sabia dizer, talvez desde que pus os olhos nele, mas tudo que podia
pensar agora, era no fato de sentir-me tão entorpecida por dentro, quase como
uma casca de quem era há apenas algumas horas. Como uma menina tola que
acreditava em contoS de fadas, soluçava, sentindo as bochechas e o nariz
arderem de tanto chorar, mas eu tinha que parar. Precisava me recompor.
Precisava colocar a cabeça no lugar e dar um basta na garota que fora
estúpida o suficiente para acreditar nas palavras vãs de um jogador ardiloso.
Liguei para Túlio e contei tudo que havia acontecido, ele prontamente se
ofereceu para ajudar com as minhas coisas e ainda disse que eu poderia ficar
com ele pelo tempo que precisasse. O que outra vez me lembrou de quando
outra pessoa me disse a mesma coisa e acabei me envolvendo a tal ponto, que
esqueci o bom senso e não parti. Mas não cometeria aquele erro uma outra
vez, mesmo que a pessoa que estivese me estendendo a mão fosse
verdadeiramente um amigo.
A porta se abriu no exato instante que acabei de arrastar as minhas malas
até a sala e tudo em mim congelou. Enxugando minhas lágrimas, preparei-me
para o que tinha que fazer.
Com um sorriso de tirar o fôlego, Caio livrou-se da jaqueta de couro, que
encobria um moletom do Flash, que contornava todos os músculos definidos
dos seus braços e dorso. O eterno nerd que vivia nele, quase como um alter
ego, sempre parecia revelar-se nos seus momentos de intimidade, e eu
costumava achar tão sexy a forma como ele parecia resplandecer naquelas
ocasiões, era quase divino.
E como pude me iludir que alguém como Caio Ornelas DiFiori pudesse
me amar?
Aquilo só me provara o quanto eu estava certa em me resguardar e no
quanto fui idiota por me apaixonar.
— Oh! Pensei que chegaria em casa e encontraria uma espécie de noite de
pijamas — gracejou assim que notou a minha presença.
Se não tivesse escutado o que ouvi, acreditaria que eu não era a única
pessoa magoada, mas sabia melhor do que aquilo, passei a ver a verdade por
trás daquela máscara de homem amoroso. Os olhos dele foram para as malas
ao meu lado, antes de voltarem para mim, o rosto bonito sendo transformado
por uma genuína surpresa.
— O que está acontecendo? — indagou e quase acreditei que ele não
queria que eu fosse.
— Vou ficar com o Túlio — não hesitei em responder, meus olhos ainda
grudados aos dele, sentindo o coração sendo arrancado do peito. — Acho que
já abusei da hospitalidade.
— É? — testou baixo, desconfiado, e eu limpei a garganta, incomodada.
— Não quero ocupar o lugar de outra pessoa — tentei soar firme, mas
meus olhos se fecharam e a voz saiu vacilante, sem nenhuma convicção.
Sentia aquele aperto forte, incômodo, daquele jeito que parecia nos impedir
de respirar.
— E eu estou ocupando o lugar de outra pessoa, Paula Maia? — a
pergunta saiu como um rugido, o timbre baixo, perigoso, de forma a se
infiltrar na pele, e tornei a abrir os olhos para encarar os seus de lince, que
fizeram meu coração perder uma batida, pois fitavam-me de um jeito
incisivo, inabalável.
Horas antes, acreditava veementemente no que tínhamos e no que eu
achava que ele sentia por mim. Ser com ele a coautora do nosso projeto
chamado vida parecia ser o certo, mas ali estávamos, provando exatamente o
contrário.
— Talvez, afinal, como é mesmo que dizem? Ah! Homem é que nem
biscoito, vai um e vem dezoito! — murmurei, dando um passo para trás,
tentando me afastar. E mais do que isso, precisando desesperadamente me
afastar dele. — Não era essa a intenção desde o início? Ser uma versão
feminina sua?
Seu peito subiu e desceu como se estivesse prestes a rir, a chorar, mas ele
abortou o esforço.
— Você tem um talento nato. — Ele parecia frustrado, o que não condizia
em nada com o sorriso irônico que me dirigiu, os olhos faiscando não
deixando de me encarar.
— Acho que sim — titubeei no exato instante que olhei para o anel no
meu dedo, e por um segundo ou dois continuei a fitá-lo, antes de tirá-lo de
uma vez e entregá-lo a Caio, que não me impediu, muito menos tentou me
fazer reconsiderar com algum apelo apaixonado, o que só me deu a certeza de
tudo que ouvi e entendi.
Nada do que vivemos foi real. Ao menos não para ele. Caio foi apenas
uma ilusão. Uma da qual por muito tempo eu fugi, mas que quando menos
esperei me enganou, fazendo-me acreditar que o que sentíamos um pelo outro
era maior do que a razão que me impedia de me entregar.
— Item 6? Era apenas um teste, certo? — minha pergunta era retórica,
porque nem mesmo conseguiria escutar uma resposta, era mais como uma
afirmação para mim mesma. — Deveria ter desconfiado do bug[17], já que um
jogador nunca deixa de ser um jogador até que acabe a partida.
Fechando os olhos por um tempo que me pareceu eterno, Caio respirou
fundo, como se precisasse tomar fôlego, os lábios tremeram e por um
segundo me enganei achando que ele poderia negar tudo aquilo, que me
amava e nunca mais deveria tirar o anel do meu dedo, porque era ali que ele
pertencia, mas obviamente não foi o que aconteceu.
Caio era tão covarde, que nem mesmo podia ser sincero e admitir como de
fato se sentia. E eu não tinha mais que suportar aquilo.
— Adeus, Caio. — E sem mais uma última olhadela, arrastei minhas
malas em direção à porta e, quando a abri, recebi um abraço gelado do
mundo, que me dava indícios do carinho estilo arame farpado que receberia a
partir daquele instante.
Sem que pudesse conter, minhas lágrimas voltaram com força total e me
recusava a dar-lhe o gostinho de ver que ele era o motivo delas, por isso as
engoli, sem dar chance para vazão.
— Paula? — ele chamou meu nome, quase como se implorasse, e o timbre
da sua voz me fez estacar.
Virei-me para encará-lo e soube naquele instante que nunca esqueceria
aquela visão, a do homem que me estragara para todos os outros. Jamais
poderia esquecer o quanto amar alguém pode doer.
— Não, Caio. Não fala mais nada, por favor — eu praticamente implorei,
porque apenas uma linha tênue mantinha-me sem desabar, e então virei as
costas e parti.
Parti para longe de Caio e da sua casa, onde nossos corações são usados
como um mero peão no tabuleiro de xadrez, para no final serem derrubados
pelo Rei.
Bug é quando uma grande quantidade de erros, defeitos ou falhas são encontrados no Software.
CAIO
CAPÍTULO
TRINTA
Como um maldito psicopata, tentei falar com Paula, durante toda a noite e
madrugada, mas ela não atendeu ou retornou minhas ligações e depois de um
tempo me bloqueou, o que só fez com que a ferida já aberta se tornasse ainda
mais profunda.
Acabei ficando no apartamento 202, mas tal como eu suspeitava, até
mesmo ali, onde ela mal esteve, parecia carregar um pedaço seu em cada
canto. O que me fez chegar a inevitável decisão: eu tinha que vendê-los, não
havia nenhuma maneira de continuar em um ou outro. A única questão é que
não me sentia nem um pouco disposto a procurar um novo local para morar,
quando nem mesmo me vestir para o trabalho queria.
Contudo, recebi uma mensagem pela manhã do meu pai, exigindo a minha
presença na sua casa. Com certeza não era o que eu esperava ler, muito
menos de quem. Mas por mais destruído que me sentisse, sabia que para ele
pedir que eu fosse até lá deveria significar que o assunto era sério e sendo
assim não poderia deixar de comparecer.
O relógio não marcava oito da manhã ainda quando adentrei a mansão que
fora meu lar por tantos anos e ao fazer aquilo, tentei esquecer sobre a
constante dor me roendo desde que a minha vida pareceu desmoronar horas
antes depois da partida de Paula. O empregado avisou que estavam à minha
espera no escritório, o que só me deu ainda mais certeza de que havia algo de
muito errado.
Bati na porta e quando a voz baixa do meu pai ordenou que eu entrasse, o
fiz, mas nem mesmo tentei esconder o meu humor colocando um sorriso falso
no rosto, afinal, eu me sentia um merda e não via motivos algum para
esconder. Só que ver todos da família presentes, com olhares reprovadores
dirigidos a mim, me trouxe um frio na barriga.
— Caio — meu pai falou meu nome, mas ao invés de vir me
cumprimentar como de costume, se limitou apenas em levantar o queixo e
olhar pra mim carrancudo.
Não gostei da sensação, sobretudo quando minha mãe fez o mesmo, coisa
que nunca acontecera antes, já que ela costumava ser tão carinhosa e
atenciosa. Tive inclusive um vislumbre dela enxugando uma lágrima e isso
fez com que ele se aprumasse um pouco na cadeira, o rosto bonito marcado
pela idade parecendo mais cansado aquela manhã, como se tivesse passado a
noite em claro.
— Te chamei aqui porque acredito que esse assunto deve ser resolvido em
família. Mas a verdade é que além de devastado por algumas notícias, me
sinto também decepcionado.
Merda! Que porra aconteceu?
— Está tudo bem? — indaguei baixo, com medo da resposta, e respirei
fundo, esperando.
— Não. — Ele meneou a cabeça, negando, os lábios finos travados em
uma linha dura, o queixo estremecendo com a raiva compelida. — Você pode
me explicar isso, Caio?
Meu pai deslizou o tablet do outro lado da mesa e, curioso, me adiantei
para pegar, o sangue correndo frio em minhas veias antes mesmo de ver do
que se tratava. E quando o fiz, soltei um ofego estrangulado.
Era o vídeo meu e de Paula no dia em que transamos em cima da mesa da
minha sala. Apesar de não mostrar nossos rostos, dava para ver nitidamente
que estávamos no escritório, nus, meu rosto enterrado no pescoço dela e até
mesmo podia sentir o prazer correndo pelas minhas veias como se estivesse
revivendo aquele momento.
— O que tem a dizer sobre isso, Caio? — ele quis saber, meu nome saindo
estranho pelos seus lábios.
Não disse nada, tudo que eu conseguia fazer era me concentrar naquele
vídeo, onde ela estava comigo no nosso arroubo de paixão, fazendo-me
desejar não apenas repetir, como também beijar aqueles lábios pelos quais eu
morreria para tocar apenas uma última vez.
Talvez ele estivesse esperando por uma resposta e pensei seriamente em
dizer que me sentia miserável, que queria ela de volta, mas nada saiu.
— Você não vai dizer nada? — Cauã pareceu não conseguir se conter para
perguntar.
— O que quer que eu diga? Que eu sinto muito? — lancei, começando a
ficar irritado, e ele bufou, sarcástico, demonstrando seu desgosto.
— Não, quero que me diga o que isso significa. — Meu pai me entregou
uma simples folha de papel e meus olhos se arregalaram quando li que era o
cronograma do projeto que entreguei a Paula no primeiro dia de trabalho.
Caralho! Como diabos aquilo tudo viera à tona?
— Como conseguiu isso? — apressei-me em perguntar, porque não fazia
ideia de como aquilo fora parar ali.
— Alguém me entregou — o timbre de voz do meu pai não deixava negar
a decepção dele, mas outra vez não me importei.
Paula? Paula fizera aquilo?
Eu duvidava muito, por mais magoada que pudesse estar, duvidava que
fosse capaz de fazer algo do tipo. E olhando para loira à minha frente, eu
soube quem era a culpada.
— Caio, estou profundamente decepcionado com você — meu pai
prosseguiu. — Passei a madrugada acordado, tentando conter os danos
causados, tentando tirar esse maldito vídeo dos sites porque ele se espalhou
rapidamente. Você pode ser meu filho e ninguém mais do que eu sente por
estar fazendo isso, mas dada a repercussão que essa história tomou, terei que
te demitir.
As palavras dele me atingiram em cheio e me sentindo zonzo, dei um
passo para trás. E quase ri da ironia, porque pelo visto desgraça pouca era
bobagem, já que ela me alcançara de caminhão e desencadeou tudo de ruim
de uma só vez. Só que o mais engraçado em tudo é que realmente não me
importava com porra nenhuma daquilo.
— Lamento tê-lo desapontado, pai. — Era verdade, no entanto, não me
sentia miserável por nada daquilo.
— Você não parece muito arrasado por conta disso — observou, a
expressão dele não se aliviando em nenhum momento.
— Não estou. — Dei de ombros. — A coisa mais importante da minha
vida perdi ontem, ter sido demitido ou ter decepcionado a minha família não
chega nem perto de como me sinto por dentro.
— Não esperava isso de você, Caio — minha mãe sussurrou, com os
lábios trêmulos, e eu ri, com escárnio.
— Aposto que a querida Monalisa ajudará vocês com essa decepção! —
lancei com ironia.
— Óbvio que sim, eles são meus pais! — ela soltou, levando a mão ao
peito, dramatizando, enquanto eu a encarava com um sorriso debochado.
— Claro, afinal, você faz o tipo morde assopra, não é? E já que você
mesmo lhes contou tudo, tinha que fazer seu papel em estar ali por eles,
quando na verdade é uma cínica.
— Caio! — minha mãe ofegou e Mona levou as mãos à boca, sabendo que
não havia mais escapatória para ela.
— Olha lá como fala da minha mulher, seu filho da puta! — Cauã rosnou,
sendo contido pela fingida da Mona, que parecia prestes a fugir.
— Sou filho da puta mesmo, mas esse agravante é culpa do nosso pai, e
não minha! Afinal, ele quem arranjou um filho na rua e trouxe pra esposa
criar como seu! — eu o lembrei entredentes.
— Eu não vou discutir isso com você, Caio! — meu pai bradou em fúria,
espalmando a mão sobre o tampo da mesa, chamando atenção de todos nós.
— Se você não tem respeito à sua família, ao menos respeite a sua mãe,
porque ela sempre te amou e ninguém aqui pode dizer, especialmente você,
que ela não merece ser chamada assim!
— Eu respeito, sempre respeitei. Ela sempre será a minha mãe, de quem
me orgulho e a quem sou tão grato! — admiti, reiterando o que dizia com um
gesto de cabeça. — Mas pelo visto vocês preferem dar ouvidos para essa
cínica, que sempre foi uma interesseira e fez tudo da forma que mais
beneficiaria a ela — esclareci, estreitando os olhos na direção dela, que teve a
audácia de parecer ofendida.
— Eu não tenho que ficar ouvindo esses insultos! — ela tentou correr, mas
eu não faria tão fácil assim para ela.
Sim. Falta de aviso não foi, vadia!
— Foi você, não é? Você que deu um jeito de invadir meu computador da
empresa, achar o cronograma e ainda por cima vazou o vídeo, não foi? —
indaguei colocando-me em seu caminho, de modo que ela não tivesse como
fugir de mim, apesar de ela se recusar a me encarar.
— Não sei do que está falando — insistiu e abri um sorriso zombeteiro.
— Ah, sabe sim! Já que anos antes de se casar com o precioso filho mais
velho e que era a óbvia escolha para assumir a empresa DiFiori, era na minha
cama que você dormia toda noite! E é atrás de mim que continua até hoje!
— É mentira! — Mona gritou, insana, o rosto vermelho em pura revolta, e
Cauã abriu a boca em choque.
— É verdade e eu posso provar! Tenho mensagens, ameaças, vídeos…
Você acha mesmo que sou burro só porque por muito tempo acreditei em sua
história? Deixei tudo guardado para me resguardar, porque sabia que você era
uma mulher perigosa e sem escrúpulos, capaz de tudo para atingir seus
objetivos. — Tratei logo de fazê-la entender com quem estava lidando e ela
arfou, dissimulada.
— Isso nunca aconteceu… Não sei do que ele está falando. — ela se fez
de desentendida e eu ri, porque era inútil que ela continuasse insistindo
naquela mentira.
— Ela dizia que não queria assumir para todos porque tinha medo que
desistissem da adoção e foi me enrolando, e eu acreditando — apressei-me
em dizer, após respirar fundo. Eu não queria estar ali, muito menos tendo
aquela conversa, mas passara da hora de falar a verdade. — Quando Cauã
voltou dos Estados Unidos e eles assumiram diante de todos estarem juntos,
ainda não tínhamos terminado, mas eu o fiz e fui embora, porque percebi
finalmente a pessoa ardilosa que era. Não satisfeita, Mona tentou me
chantagear com a gravidez, alegando estar grávida de um filho meu, e mesmo
depois que perdeu, abortou, não sei, porque nunca quis saber, ela continuou a
vir atrás de mim.
— Isso é mentira… por favor, vocês têm que acreditar em mim! Ele que
tentou me seduzir! — ela insistia, chorando alto, agarrando-se a Cauã, que a
empurrou, como se sentisse nojo dela.
— Chega, Monalisa! Deixe Caio falar! — meu pai exigiu com a voz
inexpressiva, e a expressão em seu rosto revelando o choque pela descoberta
da verdade.
E eu não me intimidei, assim como prometi que faria caso continuasse a
me importunar ou mexer comigo, contei tudo.
Monalisa foi levada pela emergência ainda com vida, apesar da pulsação
fraca. Todos fomos para o hospital, até mesmo Cauã, que ficou sabendo por
mim. Embora estivesse muito pálida e desacordada, ela estava bem.
Independente de tudo, meu irmão ficou ao lado dela e também estava
arrasado. Eu não tinha certeza de como as coisas entre eles seriam depois e
ainda que tivesse todos os defeitos, tinha certeza que Cauã não a deixaria na
mão.
Os médicos garantiram que ela estava bem, ao menos fisicamente. O lado
emocional certamente precisaria de cuidados redobrados dali em diante. E
talvez todos precisássemos, depois daquela cena que ela protagonizou. Meu
pai estava arrasado e minha mãe seguia inconsolável pela filha ter tentado se
matar, mas tentamos passar por aquele dia sem mais dramas.
Eu me sentia tão cansado e acabado, que não sabia ainda como consegui
manter-me de pé. Ainda assim me mantive firme, porque meus pais
precisavam de mim e não poderia deixar de apoiá-los. Eu deveria saber que
Mona seria capaz de fazer algo do tipo, já que ela sempre se mostrara um
tanto desequilibrada, mas ninguém além dela mesma poderia evitar aquilo.
Ela ficaria internada por mais alguns dias e meus pais decidiram que, depois
que tivesse alta, a levariam para passar um tempo em uma clínica
especializada fora do país. Talvez fosse bom para ela, e a despeito de tudo
que me causara, nunca quis seu mal, apenas distância, e desejava
sinceramente que ficasse bem.
No dia seguinte ao ocorrido, tentava descansar, mas não conseguia dormir
mais do que alguns minutos. Minha vida parecia uma página em branco,
como se todos os meus planos simplesmente tivessem sido apagados e eu não
fazia ideia do que aconteceria dali em diante. Eu sabia que deveria tentar me
focar em alguma coisa que pudesse me distrair, mas ainda parecia ser uma
tarefa difícil pensar em qualquer coisa quando minha mente estava presa a
uma única pessoa.
Gostaria de poder dizer que estava bem ou ao menos melhor, que em dois
dias havia superado o que acontecera, mas estaria mentindo. Paula parecia ter
feito morada em meu coração e mente. Não havia um só segundo que não
pensava nela, até mesmo nos poucos momentos de sono ela vinha assombrar
meus sonhos.
O interfone tocou e pensei seriamente em ignorá-lo, mas decidi atendê-lo.
— Oi?
— Sr. Caio? Bom dia! — o porteiro me saudou assim que atendi.
— Bom dia — cumprimentei-o, embora meu humor estivesse dos piores,
não conseguia ser mal-educado.
— Tem uma visita aqui para o senhor. — Meu coração disparou e só
consegui pensar em uma pessoa.
— Quem? — ansioso, apressei-me em perguntar e senti que estava prestes
a hiperventilar.
— Túlio, senhor.
— Túlio? — repeti o nome, querendo me lembrar de onde o conhecia, mas
ninguém me veio à mente.
— Sim, senhor. Ele disse que é amigo da senhorita Paula.
— Amigo de Paula? — testei, perplexidade moldando cada sílaba, até que
me lembrei.
Bufei, cético, sem acreditar que tivera mesmo a coragem de me procurar.
Ele era muito cara de pau, para dizer o mínimo. Não fazia ideia do motivo da
visita, se fora ali com o intuito apenas de me provocar, mas estava disposto a
descobrir. Afinal, ele já estava com a garota, o que mais eu teria a perder?
— Mande-o subir — murmurei em resposta, antes de desligar o interfone.
Caminhei de volta para sala, pensando sobre aquela visita surpresa e
quando a campainha tocou, respirei fundo antes de abrir a porta. O cara alto,
quase da mesma altura que eu, me encarava com cara de pouco amigos, mas
não me intimidei, não tinha medo dele, não quando tudo que poderia temer
ele já tinha feito.
— Olá, Caio — ele me saudou, fitando-me com os olhos estreitos, de tal
modo, que não conseguia esconder o desgosto de estar na minha presença.
— Não venha com essa merda, quando tudo que eu quero é dar uma surra
em você! — rosnei, antes de virar as costas para ele e voltar para a sala.
Merda! Aquilo fora má ideia! Não seria tão fácil me segurar quanto
pensei!
— E por que isso? — Ele não pediu licença ou esperou por um convite,
entrou assim mesmo, como se não temesse o que eu poderia fazer com ele, o
que, claro, só aumentou ainda mais a vontade de quebrar a sua cara de
playboy. — Por que fui o único a estar com ela? — inquiriu, levantando as
sobrancelhas de modo significativo, e bufei em resposta.
Nem acreditava que ele viera mesmo para esfregar aquilo na minha cara!
— Você veio para isso? Para dizer que a tirou de mim? — mal consegui
controlar o tom desgostoso que me escapou, o que fez com que ele me
encarasse de cenho franzido.
— Você está falando sério? — ele quis saber depois de um segundou ou
dois. — Você quis dizer que tirei Paula de você?
— Do que diabos você está falando? — devolvi, completamente confuso.
— Paula — ele disse o nome dela como se fosse óbvio. — Você acha que
ela e eu estamos juntos? Que eu a tirei de você? — O timbre incrédulo me
pegou em cheio, muito mais até do que a resposta em si.
Um choque no peito, foi como me senti, como se o desfibrilador trouxesse
meu coração de volta à vida e o fizesse bater novamente. Meu rosto
esquentou, como se o sangue corresse rapidamente em minhas veias, todo
meu corpo recebendo uma descarga de adrenalina que nem mesmo um salto
de paraquedas poderia ser capaz de me fazer sentir.
— Vocês não são mais do que amigos? — testei, sentindo-me subitamente
leve depois de toda dor que carregava.
— Claro que não! — Ele sacudiu a cabeça enfatizando o que dissera. —
Eu sou gay, cara — soltou, abrindo o primeiro sorriso do dia, enquanto eu
olhava para ele assustado por um segundo ou dois, até que finalmente reagi.
— Ah, graças a Deus! — emiti em surpresa, não conseguindo deixar de
esconder o alívio por saber daquilo e surpreendendo-nos, fui até ele e o
abracei. — Você não sabe o quão aliviado estou por ouvir isso! — Eu ri
baixinho, não acreditando que tinha sido tão tolo por acreditar que Paula
estava com aquele cara.
— Er… Obrigado — devolveu, ainda cético, e me afastei sem deixar de
sorrir.
— Vou consertar as coisas — eu disse para ninguém em particular. — Sei
que você não deve estar entendendo nada e na verdade nem deve ir com a
minha cara, mas vou precisar da sua ajuda.
E precisava mesmo. Eu tinha um grande passo a dar e um projeto maior
ainda para consertar.
PAULA
CAPÍTULO
TRINTA E UM
Míddian Meireles
Um CEO para chamar de meu
Berhends, Lucy
9788568839416
246 páginas
Laís Oliveira é uma garota com grandes sonhos profissionais que luta
bastante para alcançá-los. Ela foi criada no interior, mas veio para a cidade
grande em busca de vencer por seus próprios esforços. Quer terminar seu
mestrado e se tornar professora universitária.Antony Cavalcanti é um CEO
viciado em controle. Ele cuida de tudo o que lhe pertence e os mantêm em
segurança, mas talvez precise aprender que pessoas não são propriedades de
ninguém.Eles se esbarram, literalmente, e juntos vão construir uma história
cheia de sedução, prazer e sentimentos que os confundem. Conflitos, ciúmes
e obstáculos podem ser apenas alguns dos ingredientes que os desafiarão até
que o amor fale mais alto e, finalmente, alcancem seu 'happy end'.Laís e
Antony o convidam a conhecer e a participar desse intenso enredo que
envolve conquista, surpresas, raiva, sexo, e muito, muito amor.
História sobre amore sempre fizeram parte da vida de Mia; emoções que ela
nunca vivenciara além das aulas como professora de literatura. Até que um
dia as páginas ganharam cores e tornaram Mia a protagonista de um romance
onde a tristeza deixara marcas profundas que o tempo nunca fora capaz de
apagar. Fugir da dor passou a ser a melhor opção para aplacar a culpa que
sentia. Contudo, assim como nas grandes histórias de amor, um passado mal
resolvido sempre retorna para cobrar as mágoas deixadas pelo caminho. E
encontrar o equilibrio entre o certo e o errado talvez fosse a única solução
para uma segunda chance.
Ele não estava procurando, mas encontrou mesmo assim... Ela deveria ter
fugido, em vez disso, se rendeu... Evelyn de Castro Santana estava em vias de
se casar com o que pensava ser o homem de sua vida, mas o encontra na
cama com sua melhor amiga e madrinha de casamento. Isso a desestrutura e a
induz a fazer escolhas perigosas. A moça se aventura no universo das
acompanhantes de luxo para se manter na cidade grande até concluir o curso
de Medicina. Dylan do Prado Thompson III é um médico renomado,
descendente dos Thompsons, uma tradicional e influente família norte-
americana, radicada no Brasil no período da Guerra da Civil nos Estados
Unidos. Um Homem metódico, acostumado a ter o que deseja,
principalmente uma carteira invejável e uma bela esposa a quem pensa amar.
No entanto, as aparências enganam... O casal vive uma relação aberta e
libidinosa que chocaria seu meio social. Dylan e Evelyn, duas vidas de lados
opostos da cidade, são jogados juntos por um golpe caprichoso do destino. A
atração é imediata, forte, densa, voraz. E enquanto os dois se envolvem em
ardentes jogos sexuais, fatos intrigantes começam a acontecer ao seu redor.
Em meio ao preconceito, suspense, atentados e boas doses de erotismo, pode
nascer o verdadeiro amor?
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