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Livro: Até que o contrato nos separe

Autora: Ângela Maria


Capa: E. S Design

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A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n° 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
PRÓLOGO
Phill Castallaneta
Eu tenho o controle de tudo. Tudo acontece exatamente da forma que eu
prevejo. Até quando as coisas estão fora do controle, a margem de erro já foi
milimetricamente calculada por mim. Eu não perco, eu invisto. Eu não ganho,
eu permaneço incansavelmente em busca do topo. Não nasci berço de ouro,
tampouco tive regalias até aqui, porém estou tão louco pelo sucesso, que nem
mesmo o destino poderá me parar de erguer meu próprio império.
— Passageiros com destino a Nashville, portão liberado na entrada G. – A
chamada ecoa em um dos altos falantes do aeroporto, enquanto traço o
percurso que eu bem conheço.
O celular em meu bolso toca, e atento no terceiro toque vendo que se trata de
Ethan. Ele já havia ligado pelo menos umas trinta vezes desde que sol saiu
hoje pela manhã.
— Alô.
Depois de um longo e pesado suspiro, ele exclama aliviado como se ele
estivesse literalmente encurralado entre a cruz e a espada.
— Céus, ainda bem que atendeu! O Seu John Sang está aqui na empresa
desde às sete horas da manhã querendo falar com o senhor. Ele quase nunca
vem aqui e está muito impaciente com sua ausência, a coisa está ficando bem
feia, — ele faz uma longa pausa e diz pesaroso: — Ele está com a carta. –
Ethan é secretário exclusivo da presidência da rede de hotéis do grupo Sang,
empresa a qual me contratou para presidi-la nos últimos onze meses, já que
John não tem mais o mesmo fôlego de quando era jovem para gerir uma
multinacional lotada de compromissos; no entanto, com muita insistência do
pai, o filho mais velho de John Sang, Matthew, subitamente começou a se
envolver nos negócios da família há alguns meses. Era de se imaginar que eu
seria carta fora do baralho mais cedo ou mais tarde.
— Diga a ele não vou poder comparecer. No momento estou embarcando
para Nashville.
— Embarcando para Nashville? O senhor está no aeroporto? Por quê? –
Ethan parece nervoso do outro lado da linha. — Perdão, mas o senhor não
pode simplesmente sair da cidade agora...
— Infelizmente não posso estar aí, Ethan, diga ao John que mande a carta de
demissão por e-mail, amanhã terei de estar assumindo minhas atribuições em
outra companhia.
— Espera! O senhor já está trabalhando em outro Grupo?
— Amanhã será meu primeiro dia...
— O senhor vai apenas desistir da Sang!? Essa empresa estará um caos daqui
a algumas semanas... – Ethan exagera, puxando meu saco.
— O filho do John não é tão ruim assim – talvez daqui a dois meses, penso
dentro das possibilidades reais.
No entanto, eu não poderia fazer nada. E na verdade, pouco me importa, já
não é mais minha responsabilidade. Que John fizesse bom proveito da gestão
de sua cria.
Entrego o cartão de embarque no portão G-05 enquanto Ethan persiste ao
telefone.
— Senhor...
— Mande lembranças ao velho John.
Guardo o celular no bolso do blazer, e a linda morena de cabelos cacheados
me devolve o cartão de embarque, dizendo com um sorriso tímido:
— Tenha uma boa viagem, senhor.
— Obrigado, senhorita!
CAPÍTULO UM
Claire

Esperando na sala de embarque, olho para o relógio em meu pulso e desejo


ansiosamente pela liberação do portão C-05¸ destino: Nashville.

Finalmente, o grande dia chegou! Há cinco anos, eu ansiava pelo contrário,


pelo dia que iria à Nova York cursar administração de empresas fora do
alcance da superproteção de minha avó.

Agora, em Nova York, eu desejava com todas as minhas forças estar em casa
novamente. Descanso! Era disso o que eu precisava. Principalmente, devido
os acontecimentos que marcaram meus últimos meses de graduação.

Ir à universidade não significa apenas estudar, assistir às aulas, fazer provas e


apresentar trabalhos. O significado de ir à universidade é inegável que vai
muito além das salas de aulas. Novas amizades, talvez algumas inimizades,
nova visão de mundo e novos amores, sim, amores, no plural. Isso tudo vinha
como um adicional de experiência de vida acoplado com o diploma ao final.

Aliás, admiro quem consegue encontrar o amor na primeira tentativa, já que


na minha vida nunca aconteceu assim. A última vez que isso aconteceu não
faz muito tempo, há dois meses. No entanto, não foi tão traumático como o
primeiro. Não por Jason ter pegado leve em sua arte de iludir, mas porque o
coração vai calejando e criando resistências com o tempo.

Sempre começa assim: elogios, conversas que se encaixam por um ou dois


meses, e quando finalmente penso que vamos engatar um namoro, o
afastamento! Ou descubro ele está apaixonado pela ex ou aparece namorando
outra garota ou simplesmente ele não está preparado para um relacionamento
sério! Que a verdade seja dita: quando um homem fala isso, ele está querendo
dizer que não quer um relacionamento sério com VOCÊ!
É duro? Sim, é difícil de aceitar a realidade e que isso não tem nada a ver
com você. Não importa se você é gorda ou magra, alta ou baixa, bonita ou
simpática, a verdade é que estamos todas suscetíveis a ter o coração partido
pelo menos uma vez na vida e isso não te torna inferior em relação a outra
pessoa, mas apenas significa que ela não é “A sua pessoa”.

A hora do embarque chegou.

Ajeito os fios de meus cabelos em um coque apertado, resvalo meus óculos


pretos para o rosto e recoloco meu casaco de lã cinza. Levanto, conferindo a
mensagem de minha avó, me desejando uma boa viagem, e sorrio ao pensar
que a verei logo, logo.

Não que estivéssemos muito tempo sem nos vermos, na verdade, de dois em
dois meses ela costumava vir me visitar em Manhattan e só não fazia mais
pois, se bem a conheço, estava ocupada demais com as reuniões da Sullivan,
a empresa de nossa família. Além de ela detestar ficar em hotéis. Elizabeth
Sullivan é uma senhorinha muito geniosa, não gosta de nada que não é de seu
gosto, isso também inclui as escolhas dos netos.

— Sejam bem-vindos a bordo. Observem o número de seu assento no cartão


de embarque e, por medidas de segurança, acomodem suas bagagens de mão
nos compartimentos acima de seus assentos, e as que não couberem, embaixo
da poltrona à sua frente... uma boa viagem, a companhia agradece sua
preferência! – Diz a aeromoça loira e peituda. Pergunto-me se são silicones,
no entanto, me constranjo quando ela percebe que estou olhando fixamente
para seus seios.

Levo a garrafa d’água aos lábios e desvio o olhar para a janela do avião, e
agradeço pela poltrona ao meu lado ainda estar desocupada. Abro o
Instagram e me animo com a notícia de que a academia de Teatro de Martha
abriria uma nova turma daqui a um mês. Atuar é um sonho antigo, mas eu já
havia o enterrado há muito tempo quando comecei a me dedicar
integralmente ao curso de Negócios, e provavelmente continuaria enterrado
por vários anos.
— Boa tarde, poderia me dar licença?! – Ouço a voz rouca e ao mesmo
tempo suave reverberar ao meu lado.

Olho para cima e me deparo com as írises esverdeadas sobre mim. Apesar de
estarmos na primeira classe, as poltronas ali não eram separadas por
espaçosos vãos de voos internacionais.

— Claro! – Digo espremendo minhas pernas para que o homem de cabelos


dourados, que aparenta ter uns 30 e pouco anos, alcance seu assento ao meu
lado.

Apesar da enorme estatura, com agilidade, ele passa com facilidade e se senta
ao meu lado.

BLEU – Chanel da linha masculina, reconheço o cheiro. Refinado. Seu


casaco de couro está longe de ser algo de baixa qualidade, arrisco dizer
Armani. Ele tinha estilo, confesso. E um charme peculiar que envolve seus
pequenos movimentos. Aposto que tem um monte de mulheres atrás deste
moço. Alto, bonito, cheiroso, estiloso e provavelmente rico, um verdadeiro
potencial a Heartbreak. Um canalha sem coração.

Ah, céus! Eu não creio que eu esteja virando uma mulher amargurada, que
julga as pessoas sem conhece-las. Apenas durma e pare de pensar bobagens,
Claire!

Sinto um forte cheiro mentolado invadir minhas narinas e instintivamente


direciono o olhar para o homem ao meu lado. Sua mão estanca enquanto a
goma de mascar ia de encontro aos seus lábios.

Ele era bonito, muito bonito. Não uma beleza que se enjoa fácil, muito menos
comum. Seu nariz tem uma curvatura perfeita, assim como sua boca. Ele me
olha de soslaio e depois me encara. Droga! Por que ele está me
encarando? Por que você está o encarando, Claire?! – meu subconsciente
responde sem paciência. Mas por que eu não consigo parar de encará-
lo? Parecia que eu havia petrificado, feito uma colegial.
— Errr... A senhorita aceita? – ele diz me oferecendo o chiclete de menta.

Ele não parece constrangido, nem algo do tipo, apenas incomodado com
meus olhares persistentes, levando-o a tomar uma atitude.

Solto um sorriso envergonhado e digo meneando a mão no ar copiosamente:

— Não, não, não! Obrigada.

Despreocupado, ele meneia a cabeça em positiva e torna a olhar seu celular,


mascando o chiclete de menta.

Sorrio forçadamente e torno a fitar o televisor atrás da poltrona à frente. No


entanto, o som ao lado faz com que eu olhe de esguelha para seu celular
institivamente. Havia chegado uma mensagem. Ele abre e bum! Peitos.
Enormes peitos. Mas que safado!

Ele desliga o celular e me encara novamente, no entanto, mais incomodado


do que antes.

Ele abre a boca e fecha em seguida. No entanto, diz:

— Fiquei sabendo que oferecem revistas durante a voo para entreter os


passageiros.

— Sim, legal! – abro um sorriso amarelo. Eu sei o que ele quis dizer.

— Devia pedi-las.

— Não, não curto revistas – respondo, tornando a olhar para frente a fim de
encerrar o papo, mas ele fala baixinho:

— Deveria gostar!

— Aconselho o senhor peça uma, já que está tão incomodado. Acho que eles
devem ter uma de conteúdo adulto.
Uma senhorinha na poltrona a frente arregala os olhos para mim, arrastando
as grossas lentes para rosto que antes estavam penduradas no pescoço.

— Adulto como finanças, economia, essas coisas... – sorrio, constrangida.

— No momento não tenho interesse. Obrigado – ele estica um riso falso e se


apruma em sua poltrona, fechando os olhos.

Oh, que rude! Esses homens bonitos são todos estragados!

Depois de um momento piscando, ignoro as encaradas descaradas da


senhorinha a frente e recosto toda minha coluna dorsal no estofado da
poltrona, fazendo o mesmo que o homem ao meu lado: ignorando
completamente sua existência; desejando chegar o quanto antes em Nashville.
CAPÍTULO DOIS
Claire
É uma noite chuvosa quando o avião pousa em Nashville. Matt, meu primo e
melhor amigo, me espera no saguão do aeroporto com o apelido estampado
na plaquinha de papel A4: "Made in lua!" Sorrio do apelido o qual havia me
esquecido e me lembro da época que me chamavam de aluada por nunca
prestar atenção às conversas a minha volta.

— Hey – abro os braços, e Matt desmancha um sorriso largo vindo ao meu


encontro, me erguendo em seu colo branquelo, quase albino, e nós fazemos
nossa pequena algazarra entre as pessoas ali.

Meu primo sempre foi um homem muito bonito. Cabelos castanhos estilo
surfista, músculos bem divididos e um queixo quadrado de arrancar suspiros.
Oh, ele é um partidão! Além de ser uma pessoa maravilhosa.

— Parabéns, você sobreviveu! – Ele diz se referindo aos anos da


universidade. Matt nunca conseguiu terminar o curso de administração, mas
em contrapartida, teve de atuar muito cedo nos negócios de meu tio.

— Parece que sobrevivi –, me desvencilho dele, ainda sorrindo.

Seus olhos risonhos resvalaram para meu lado por um segundo, tempo
suficiente para reconhecer alguém que saía também da porta de desembarque
atrás de mim.

— Não. Não. Não. Eu não acredito! – diz Matt em minha frente. Olho para
trás e vejo o tarado do avião se aproximar. Ele usa um casaco longo branco e
óculos escuros. – Não acredito, é você mesmo, irmão?

O tarado retira os óculos e olha com surpresa para Matt, no entanto, não tão
entusiasmado quanto meu primo.
— Matt Sullivan? – sua voz rouca indaga.

— Phill Castellaneta?

O tarado identificado como Phill aperta a mão de Matt, que o puxa para um
abraço de "Brothers".

— Por onde você andou, cara? – Matt pergunta, enquanto o olhar esverdeado
recaí sobre mim. – Ah, deixe-me apresentar minha prima Claire.

Ele continua me fitando com um olhar curioso, misterioso e um tanto que


desconfiado. Parecia que ele não estava tão confortável na presença de Matt.

— Claire, este é o Phill, um amigo do colegial. – Ele me apresenta e torna a


falar com Phill: — nós não nos vemos desde quando...?

— Desde a formatura do colegial – ele responde, em um tom desinteressado.

— Caramba, onde você se meteu? – Matt não para de fazer perguntas.

Phill inclina a cabeça para o lado, suspirando pesadamente e dizendo:

— Eu estava em Nova York – deu de ombros, com aquele tipo de sorriso


educado. Ele olha para o relógio e diz: — Eu tenho que ir. Tenho um
compromisso daqui a uma hora.

— Tudo bem, cara..., mas antes me passa seu número.

Phill dita o número rapidamente a Matt e se despede com um leve acenar de


cabeça, seguindo o fluxo de pessoas para a saída do aeroporto.

Enquanto Matt salva o número em sua agenda, minha atenção ainda continua
no homem que atendia pelo nome de Phill. Seus passos eram firmes e
precisos, características de pessoas confiantes. Não nego que ele tem estilo.
Mas tinha alguma coisa de errado nele, talvez não soubesse identificar
naquele momento, mas com certeza existia algo de errado com ele.
Matt empurra o carrinho com minhas malas, me convidando a sairmos dali.

— Como foi de viagem? – Pergunta enquanto caminhávamos para o andar de


baixo do aeroporto.

— Foi boa. Tirando a turbulência na metade do caminho, a viagem foi ótima.

— Sério?! Que tenso – ele foge o olhar do celular em sua mão para mim,
enquanto empurra o carrinho com a outra mão. – Foi muito forte?

— Hãmm... – penso lembrando dos breves momentos de pavor. – Algumas


malas e bolsas que estavam em cima caíram no chão. Mas não demorou
muito para a estabilizarem o voo.

— Ainda bem. Imagina se esse avião não chegasse aqui. Eu iria ficar órfão de
prima – ele dramatizou, e eu sorri dizendo:

— Bobo!

Seus olhos tornam a fitar a tela do celular, enquanto ele entorta a boca ao
dizer:

— Acho que eu devo ter digitado o número de Phill errado. Está dizendo aqui
que esse número não existe.

— Sério?! – Espio de esguelha seu celular e pergunto curiosa: — Vocês eram


tão próximos assim?

— Tá brincando? Phill e eu erámos muito parceiros na escola...

— Naquela escola só para meninos em que você estudava?

— Sim, naquela mesmo. Ele era um cara fechadão, era o único bolsista da
sala, deve ser por isso que ele sempre tirava as notas mais altas, não gostava
muito de interagir com ninguém. Eu até o achava meio metido. Mas o cara é
muito gente fina. Ficamos amigos num passeio de escola em que foi apenas
ele e eu. Todo o restante dos alunos havia ido viajar, não tinha muito o que
fazer a não ser caçoar com Phill do sotaque esloveno do Sr. Mischer.

— Que legal! Uma pena ter pegado o número errado.

— Sim, — ele disse decepcionado deslizando o celular para o bolso e se


animando: — Então, pronta a festa de boas-vindas?

— Como assim “festa de boas-vindas”?

— Você não sabe?

Ele repuxou o lábio inferior e fez uma cara de quem acabou de fazer merda.

— É uma festa surpresa?!

— Era pra ser, mas eu estraguei tudo pelo visto. Desculpa, prima. Não prestei
atenção ao que a vovó me falou antes de eu vir pra cá. – Eu ri alto com
aquilo. Eu simplesmente amo minha família.

— Quem disse que eu sei de alguma coisa?

Ele me olha confuso, e eu prossigo:

— Segredo nosso. Vou usar todo meu talento de atriz da Broadway, não se
preocupe. Será como se nunca você tivesse deixado escapar – disse lhe
lançando uma piscadela. Ele meneia a cabeça, rindo com os ombros mais
relaxados, enquanto avistávamos um dos carros pretos de vovó parado em
frente ao aeroporto, com o pisca-alerta ligado.

— Olá, Tom! Como vai? – digo entrando pela porta de trás enquanto Matt
senta no banco do carona.

— Muito bem, graças ao meu bom Pai! E a senhorita?

Tom era o motorista da família há anos, muito antes do meu nascimento ele
já trabalhava para minha avó.
Chegar em Nashville e o ver ali, me traz um sentimento que estou realmente
de volta, em casa, deixando meu peito quentinho, quentinho, mesmo que
ansiosa para viver o meu mais novo ciclo de vida.

— Estou bem. Só com uma estranha sensação: parece que foi ontem que você
me deixou neste aeroporto. Cinco anos se passaram e voilà, aqui estou
novamente.

Tom deu aquela risada gostosa e completou:

— É, minha filha! A vida passa rápido, e quando menos se espera, a metade


dela já se foi.

— E o que você me recomenda?

— Viva o máximo que puder. E acredite, mesmo vindo de um velho pobre


feito eu, viva sua vida de acordo com o que te faz feliz. Não busque isso nas
coisas ou nas pessoas. Busque isso em você.

Mesmo sem ter a intenção, as palavras de Tom era tudo o que eu precisava
ouvir. Talvez esquecer um pouco os desejos dos outros e ir em busca da
minha felicidade era o melhor a se fazer.

— Esse é o melhor conselho que eu já ouvi de umas melhores pessoas que já


conheci – eu disse, e Tom soltou aquela risada gostosa, a mesminha que
ouvia quando eu tinha 7 anos.

Era bom estar de volta. Era bom retornar ao meu lugar.


CAPÍTULO TRÊS
Claire
Assim que chego ao casarão no rancho Boulevard, não encontro minha avó
pelos nossos aposentos, o que era de se esperar, já que a uma hora dessas ela
ainda estava na Sullivan. Então aproveito para ir ao jardim e matar a saudade
do meu avô, que tomava banho de sol no jardim.

Quase todas as boas memórias que eu tenho com meu avô são assim: no fim
de tarde no jardim de casa, enquanto minha avó trabalhava incansavelmente
na Sullivan. Vovô foi diagnosticado com osteoporose avançada aos cinquenta
anos, e desde então, está sempre em casa, tomando banhos de sol pela manhã
e no fim de tarde, cuidando da saúde, jogando xadrez, contando piadas e
rindo muito com os velhos amigos que vinham o visitar sagradamente às
sextas à tarde.

Era sempre muito bom poder sentar ao seu lado e poder conversar desde as
coisas mais triviais aos assuntos mais complexos da vida. Eu sinto que tenho
sempre muito a aprender com ele.

Quando a noite cai, subo para meu quarto com o intuito de tomar uma ducha
quente e trocar de roupa. Tudo estava exatamente do jeito que deixei: a
parede cor de rosa bebê, a penteadeira ao lado da janela de vidro que dava
vista para o jardim, e os móveis em marfim.

Conforme as informações que Matt deixou escapulir, às oito horas todos


estariam na sala, então tratei logo de escolher algo apresentável para vestir.

Opto por um vestido amarelo soltinho fresco, ideal para a reunião familiar
que já acontecia na sala. Abro minha mala outra vez e procuro pelo meu
celular. Não encontro e o busco em minha bolsa de mão. E, bingo, estava lá!

Noto que ele está desligado, então pressiono o botão ao lado.


— Quando foi que troquei o papel de parede? – Pergunto-me ao olhar a
imagem de uma das praias de Santa Bárbara estampada em meu aparelho.

Abro o WhatsApp quando a surpresa me vem.

Nenhuma daquelas conversas eram minhas. Droga! — Eu peguei o celular


de outra pessoa. Mas como?

Tento resgatar algo em minha memória, no entanto, o Wi-Fi conecta e o


celular vibra com uma nova mensagem.

Vejo minha foto no perfil da conversa e suspiro, aliviada.

"Esse é meu celular. Você acabou trocando o seu pelo o meu no avião.

Preciso dele para ontem. Me encontre agora! "

Leio a mensagem e digito:

"Oi, senhor. Desculpe-me, mas agora não terei como trocar, tenho uma
reunião familiar. Podemos nos encontrar amanhã pela manhã?"

Envio e em poucos minutos recebo a mensagem:

"Desculpe-me você, mas eu preciso dele A-G-O-R-A. Diga-me onde está, e eu


vou até aí. "

Que ser humano petulante! – penso eu.

"Está bem. Sabe onde fica as casas do rancho Boulevard?"

"Acho que sei. Fica entre a 8th Avenue South e a 12 Avenue South?"

"Sim"

“A casa de minha avó é a trigésima terceira. Mande-me mensagem quando


você chegar."
"Ok."

A pessoa fica offline, e começo a me perguntar quem estava do outro


lado. Seria o tal amigo de Matt que estava ao meu lado? Pergunto-me
abrindo seu perfil pessoal, me deparando com o sujeito de olhos verdes
intensos. Na foto, ele usa terno e gravata, e parecia estar dentro de um carro
de luxo, devido ao revestimento fino dos bancos, típico daqueles carros de
playboys ricos amigos de Matt, que vivem às custas dos pais e torram
dinheiro com festas, sexo e bebidas. Parece que Phill se deu bem na vida
depois da escola.

Resvalo o celular para o bolso e me direciono para fora do quarto.

Enquanto desço os degraus da escada, as lembranças sopram em minha


mente. Lembro-me como se fosse ontem eu descendo esta mesma escada
todos os dias pela manhã antes de ir à escola e quase sinto o cheiro do café
fresquinho vindo da cozinha.

Minha avó havia trocado alguns móveis, claro, porém todos continuam com a
mesma tonalidade bege e em tons bem clarinhos, enquanto os vasos
recheados de plantas gramíneas parecem fazer o ar respirar e dar mais vida
àquele ambiente da casa.

— Surpresa! – dizem todos em uníssono quando desço o último degrau.

Abro um sorriso largo, erguendo as sobrancelhas em surpresa, olhando para o


meu cúmplice do outro lado da sala.

— Minha doce Claire! – Minha avó vem ao meu encontro, com uma taça de
champanhe nas mãos.

Ela me abraça pela primeira vez desde que cheguei, e eu sussurro baixinho
em seus braços:

— Acho que o Dr. Jackson não ficaria feliz se soubesse dessa taça em suas
mãos.
Desvencilho-me dela e a rechaço com o olhar.

Minha avó foi diagnosticada com diabetes aos sessenta anos, e diferente do
meu avô, ela sempre resistia em seguir as recomendações médicas.

— Pare de ser velha. Nem eu que sou velha não sou velha.

— Não é ser velha, vó. É sua saúde. Responsabilidades, sabia?

— Sabia, estou tenho várias delas na empresa. Pare de exagerar. É só um gole


para comemorar sua volta – ela diz, teimosa.

O jazz que recendia na sala fica mais alto e minha avó começa a mexer os
ombros enquanto Matt vem estalando os dedos de acordo com o ritmo da
música e eu começo a rir, estalando os dedos também.

Matt pega minha mão e me rodopia, assim como fazíamos quando crianças.
Começamos a dançar ao som da minha avó cantando Frank Sinatra, enquanto
meu tio Ben se entretém com o champanhe e meu avô fazendo o que ele sabe
fazer de melhor: ganhar o Seu Charles, amigo da família, no xadrez de ouro
que ele herdou do meu bisavô Robert.

Certas coisas não mudam e talvez eu goste disso. Faz-me sentir segura. No
entanto, eu sabia que essa segurança talvez pudesse soar perigosa, comodista.
No entanto, é esta a segurança que eu mais amo: o alento da minha família.
CAPÍTULO QUATRO
Claire
Depois do jantar delicioso encomendado por vovó, sentamos novamente nos
sofás da sala, saboreando a mouse de limão siciliano. Eu conversava com
Matt sobre sua vida amorosa, e fiquei feliz em saber que eu não era a única
fracassada amorosamente nesta família.

No meio da sala, minha avó chama a atenção de todos ali e diz animada:

— Um brinde a mais nova presidente do grupo Sullivan.

O quê? – Engasgo com o champanhe em minhas mãos.

— Sim, a mais nova presidente do grupo Sullivan! – ela repete, mais


enfática.

— Espere um momento, vó! – Digo com dificuldade. – Como assim eu sou?


O combinado não seria esperar alguns meses ou anos? ...

— Esqueça o combinado. Eu estou velha demais, Claire.

— Eu não estou preparada...

— É claro que está!

— Será?!

— Está mais que preparada, meu amor. Veja só: eu assumi a empresa quando
seu bisavô faleceu, e eu nem ao menos tinha um diploma.

Não era surpresa para ninguém ali que eu iria assumir a presidência. A
história da nossa família não é como nos filmes em que todos querem herdar
a presidência do grande grupo empresarial. Na verdade, é o contrário. Parecia
que todos ali pareceram fugir da obrigação de ocupar a presidência.

Meu tio tem seu próprio negócio desde os vinte anos, e sempre deixou claro
que não assumiria a presidência, pois não havia como conciliar o grupo
Sullivan com sua empresa do ramo automobilístico, a qual Matt iria herdar
seu cargo logo, logo.

Era para meu pai assumir essa obrigação, mas como ele não estar entre nós,
caiu sobre os meus ombros a grande responsabilidade de gerir uma empresa
com muitos anos de história.

— Não se preocupe, Claire! Você se adaptará muito bem à presidência.


Acredite! – meu tio diz me encorajando.

Torno a olhar a velhinha animada em minha frente e digo:

— Tudo bem, vó!

— Maravilha! – ela bate palma, dizendo: — Amanhã o escritório do grupo


Sullivan irá receber sua mais nova presidente depois de longos 48 anos de
gestão.

Minha avó brinda novamente, enquanto o celular vibra furiosamente em


minha mão. Resvalo o olhar para o aparelho, que estampa o meu número no
visor.

Afasto-me das pessoas ali, caminhando para o jardim e atendo a chamada:

— Alô!

— Estou em frente à sua casa. Venha até aqui e traga o celular! – A voz rouca
do outro lado da linha soa grosseira.

— Espere um momento.

Pego discretamente um casaco no armário da sala de estar e desço pela grama


gélida do jardim até o caminho de pedras que levava ao portão gradeado. É
uma noite fria de segunda-feira e os seguranças já haviam se recolhido para o
terraço de entrada do casarão. Apenas restava o senhorzinho dentro da
casinha ladeada de vidros.

Aceno para o porteiro para que abra o portão, que me olha meio desconfiado,
mas faz o que eu peço.

Caminho para fora, esfregando meus braços que congelavam, procurando o


homem que respondia pelo o nome de Phill.

Qual era seu sobrenome mesmo?

Castaneta? Deve ser algo assim -, penso dando de ombros.

Percorro com o olhar pela rua escura e congelante, enquanto um arrepio


irrompe em minha espinha dorsal. Não sei explicar o porquê, mas um
pressentimento ruim me acomete neste momento. Concentro-me no carro do
outro lado da rua, envolvido pela penumbra. Noto que há uma pessoa
encostada ao lado da máquina; talvez, o tal Phill.

Quando atravesso a rua e sua imagem vai se revelando aos poucos, um


suspiro involuntário escapole entre os meus lábios e fico um pouco mais
aliviada ao me certificar que é o mesmo homem que vi no avião.

Diferente do casaco pesado que ele usava da última vez em que o vi, Phill
agora usa uma blusa de manga azul escura que se agarra muito bem em seus
músculos definidos. A calça jeans surrada lhe dava um ar revel e confesso
que... sexy.

Ele descola as costas da superfície do Porsche prata, subtraindo o espaço


entre nós. Sinto seu olhar percorrer meu corpo até minhas pernas desnudas,
fazendo minhas bochechas queimarem em meio ao frio.

O que esse safado está fazendo? – Pergunto-me, me lembrando dos enormes


peitos que vi em seu celular naquele avião.

Ele cala o silêncio entre nós, erguendo a mão esquerda.


— O aparelho! – ele exige.

Seu tom um tanto rude me incomoda, me levando a crer firmemente que


aquele cara é um provável babaca. Apesar de Matt ter dito ser amigo deste
homem no passado, não consigo imaginar meu primo se misturando com essa
classe de homens babacas e grosseiros.

— Devolva meu celular primeiro que eu devolvo o seu.

Ele me olha por cima, desconfiado, porém abaixa o braço e desliza a mão
para o bolso da calça:

— Pegue!

Ele me entrega o que meu e, logo em seguida, exige franzindo o cenho:

— Agora, sua vez.

— Qual a palavrinha mágica?! – debocho, me divertindo com aquele tipo de


homem. Ah, como eu detesto esse tipo de homem! Cara de príncipe para
conquistar uma mulher, e quando consegue o que quer, mostra finalmente a
verdadeira face da babaquice.

— Você acha que eu estou com tempo para criancices de uma patricinha?
Devolve logo essa porra de celular! – ele rosna.

— Ih, patricinha? Que termo mais antiquado – provoco o machão. Olho para
o Porsche atrás dele e digo: — Que carrão, hein?! Você é por um acaso um
mauricinho?

Ele cai o olhar para o lado, suspirando profundamente. Aquele suspiro de


quem já estava perdendo a paciência.

— Pegue! Não vou mais tomar seu tempo. – Eu digo sacando o celular do
casaco e lhe entregando.

Ele guarda o celular no bolso, meneando a cabeça em positiva.


— Boa noite! – Ele acena com a cabeça e se prepara para adentrar o carro
atrás.

— Ei, espere! – Digo me lembrando de algo.

Ele se vira a contragosto e me lança um olhar entediado.

— Eu posso passar o seu número para o meu primo Matt?

Ele dá de ombros e diz:

— Por que está perguntando?

— Você deu o número errado no aeroporto, algo me diz que foi proposital.

— Por que daria meu número a ele?

— Então estou certa. Foi intencional? – Pergunto.

Ele ignora e torna a caminhar em direção ao carro.

— Parece que eram amigos no passado...

— Disse bem. No passado. – Ele responde.

— O que ele te fez de mal?

— Nada pessoal. Eu só não sou a mesma pessoa que seu primo conheceu.
Vai por mim, melhor deixar seu primo longe de um cara chato feito eu. – Ele
diz por fim, abrindo a porta e entrando no Porsche prata.

Ele dá partida, e eu fico sozinha ali, no meio da rua, enquanto vento frio
sacude meus cabelos castanhos com minha mente tentando entender o que
aquele cara quis dizer.

Deixa pra lá! Que homem estranho.


Inspiro fundo, com os braços cruzados, e giro os calcanhares para tomar o
caminho de volta ao casarão de minha avó.

Uma luz forte e o som estrangulado do pneu encontrando o asfalto ao meu


lado faz com que minhas pernas congelem, petrificando todos os meus
sentidos.

Tudo acontece muito rápido. Em questão de segundos, um carro preto para


em minha frente, e quando as portas traseiras se abrem, sinto minha alma sair
do corpo.

Dois homens encapuzados e armados vêm em minha direção e me seguram


pelo cabelo, me jogando contra o banco traseiro com tamanha brutalidade,
que faz meu coração parar.
CAPÍTULO CINCO
Claire
Com a adrenalina e tensão correndo em minhas veias, tudo o que desejo neste
momento é que isso seja um pesadelo e que eu acorde de supetão em uma
cama, ansiando por um copo d'água.

No entanto, sei que isto não se trata de que um sonho ruim, isto estava
mesmo acontecendo. Eu estava suando frio, sendo levada por três brucutus
ossudos e nervosos. Um sequestro — concluo. O maior pesadelo da minha
avó estava acontecendo e não quero nem imaginar quando ela souber disso.

— Não acredito que conseguimos assim tão rápido — O homem que dirigia o
veículo exclama, batendo com as mãos no volante.

— Essa aqui deu mole!

De esguelha, olho para o outro homem encapuzado a meu lado, que percebe
meus olhos atentos.

— Até que você é nada mal, princesa! — a voz fina diz em um tom nojento,
tocando minhas costas com a mão gelada e me fazendo sentir o cheiro azedo
de roupa suja. — Aposto que essa boca rosadinha faz loucuras...

— TIRA AS MÃOS DE MIM, SEU IMUNDO! – rosno entredentes.

Ele puxa meus cabelos com tanta força, que sinto que meu couro cabeludo
poderia descolar a qualquer momento de minha cabeça.

— O QUE DISSE, VADIA? – ele toca a parte inferior de minhas costas e


sinto que vou vomitar.

— MACKZEINE, CALA BOCA, PORRA! Tem gente nos seguindo — diz o


homem na condução.
— Não fala meu nome, caralho! — A voz ao meu lado repreende e se espicha
para trás para olhar pelo vidro traseiro. — Quem é esse filho da puta? — ele
pergunta. — Algum segurança?

— Sei lá, porra. Eu acho que era ele que estava com a bacana na frente da
casa. — O outro homem de voz mais estrangulada responde.

— Afunda a merda do teu pé no acelerador.

Com o corpo inteiro tremulando, viro o rosto cuidadosamente para trás para
espiar.

Um Porsche. Um Porsche prata. Não dá direito para ver quem exatamente


est[a atrás do para-brisa, mas algo me diz que é ele. Phill. Ele está vindo
atrás de mim? – penso com dificuldade, confusa. — Vendo por essa
perspectiva, até que ele não parece ser uma pessoa ruim -, pondero com o
cérebro quase travando e o corpo anestesiado pela adrenalina.

— Hora de dormir, princesa! — São as últimas palavras que escuto antes de


minhas narinas serem tampadas por um pano úmido de cheiro forte.
CAPÍTULO SEIS
Phill
Entro no carro e dou partida, deixando aquela garota para trás. Olho pelo
retrovisor e observo que ela ainda continua parada no meio da rua, de braços
cruzados contra o corpo e os cabelos castanhos esvoaçantes ricochetando as
maçãs do rosto. Desvio o olhar do retrovisor lentamente e sigo meu caminho.

O celular toca no banco do carona, e vejo pelo visor de multimídia que se


trata de Morgana, a dona da concessionária de carros que transei antes na
semana passada, em Nova Iorque.

Ela me deu um singelo desconto em um Audi SUV depois de uma transa


fodida em seu escritório. Foi tudo muito gostoso, no entanto, ela ainda não
percebeu que foi algo casual, apesar de ela já ter uma idade madura para
compreender isso.

Além do mais, Morgana era um péssimo negócio para se envolver. Ex-esposa


de policial e filha de Juiz de direito, não me parecia uma boa ideia prolongar
mais o caso.

Ignoro pela enésima vez sua chamada e torno a me concentrar na estrada. Um


carro dá partida no canto da rua e passa por mim pela pista contrária e, sem
pretensão, confiro o rosto do motorista atrás do para-brisas. Diminuo
gradativamente a velocidade quando vejo os rostos encobertos por um tecido
preto.
Paro o carro no acostamento, desligando o farol e observando tudo
furtivamente.

Vejo dois homens saírem do carro e arrancarem a mulher a força da rua para
dentro do carro. O carro dá a volta rapidamente e passa por mim novamente,
em alta velocidade. Só que dessa vez, eu estou mais atento e observo a placa
do carro de números familiares.

"J2 435"

Solto um suspiro pesado:

— Caleb! — Balbucio.

Porra! O que esse idiota pensa que está fazendo? — aperto o punho, socando
o volante, e vou atrás do desgraçado do meu primo. Ligo para seu celular,
que cai na caixa postal.

— Porra!

Ao perceber minha presença, o carro da frente acelera em uma velocidade


perigosa numa curva sinuosa.

No meio do caminho, desisto de segui-lo, e pondero que seja melhor esperá-


lo em casa, já que aparentemente ninguém havia notado o sumiço da garota,
ainda. Pelo menos assim não assustarei o imbecil e tentarei impedi-lo que
fazer uma merda maior.

***

Depois de um banho quente, visto roupas limpas e vou até a adega ao lado da
sala em busca de uma boa dose de Whisky. Encho o copo com o líquido
avermelhado e me sento no sofá de linho, ao lado da porta.
Encaro o relógio em meu pulso e vejo que faltam apenas meia hora para a
meia noite e nada daquele moleque ter chegado. Ligo novamente, no entanto,
diferente da última vez, a ligação não cai na caixa postal, mas, dessa vez, é
recusada.

Desviro um palavrão, perdendo a paciência com Caleb. Neste minuto, escuto


a chave eletrônica encostar na fechadura, e vejo o garoto anêmico adentrar a
sala.

— Primo? — Caleb pergunta, surpreso. Ele se aproxima da mesa ao lado do


sofá e jaze a chave ali. – Pensei que já estivesse no quarto.

— Por que a surpresa? — dou um gole generoso do Whisky em meu copo,


descruzando as pernas. – Por que não atendeu às minhas ligações?

Ele pisca duas vezes e coça o topo da cabeça.

— Desculpe, fui ao cinema com uns amigos e desliguei o celular. Recusei a


chamada ainda agora pois eu já estava no prédio.

Ele mente descaradamente, no entanto, pela primeira vez em tantos anos


reflito o quanto meu exemplo pode ferrar a vida de Caleb. Passei onze meses
fora de Nashville e todas as vezes que o vi durante esse período, persisti em
dá péssimos exemplos a ele.

— Onde está a garota? — vou direto ao ponto.

Ele torna a piscar freneticamente.

— Que garota? Você trouxe alguma mulher hoje? — ele pergunta sem
entender.

— A garota que você e seus amigos sequestraram em Downtown? Onde ela


está?

— Como? — gagueja. — Como o senhor sabe da garota?


Solto uma respiração densa e respondo:

— Eu estava lá.

— Estava lá? Onde? Espera, primo o senhor não está bêbado, não é?

Largo o Whisky na mesa ao lado, perdendo a paciência com Caleb.

— Escuta aqui, moleque! Eu mal cheguei nesta cidade e já descubro que você
virou uma porra de bandido. Se quiser ferrar sua vida, se foda sozinho. Não
use um carro meu para fazer merda. Você vai me dizer agora onde essa
menina está!

— Calma, primo.

— Diz, porra! Temos que devolvê-la antes que a polícia se envolva.

— Tarde demais — ele diz.

— Tarde demais? — pergunto pensando em que merda aquele garoto havia


feito.

— Já pedimos o resgate.

Caralho!

— Mas pedimos sigilo, primo. Eles não irão envolver a polícia, ao menos,
não agora.

Se bem conheço a família de Matt Sullivan, eles já haviam colocado o


departamento de Polícia inteiro atrás desta garota.

Inspiro pesadamente e pego a chave do carro:

— Vamos! Você vai me levar agora até àquela garota.

— Eu não vou primo. Com todo respeito, mas eu não vou levar você lá. Vai
estragar tudo. Isso é negócio meu.

— É isso ou eu entrego você a polícia agora.

— Você não faria isso, primo...

***
Ainda é noite. O ar está mais úmido do que horas atrás, quando coloco meus
pés no piso oleoso do galpão atrás de uma borracharia no centro da cidade.

Ao lado de uma aparelhagem velha de oficina, vejo a garota amordaçada no


chão imundo, sendo vigiada por um dos amigos juvenis de Caleb.

No fundo eu sabia que Caleb estava rodeado de péssimas amizades, mas


ignorei isso por um momento. Não me sentia alguém de conduta ilibada para
criticá-lo, mas ele está passando dos limites. Aliás, pensando bem, já passou
há muito tempo.

O parceiro de Caleb acorda de supetão e levanta num rompante.

— O que é isso, porra? Quem é esse cara? — ele pergunta exasperado


apontando uma arma em minha direção.

— Calma, irmão! Ele é meu primo. — Caleb diz apaziguando os nervos do


rapaz.

Ele abaixa a arma, devolvendo-a para a superfície do caixote no chão e


sussurra para Caleb:

— Teu primo? Por que trouxe esse maluco pra cá? Está louco? Se o J9 souber
disso...

Enquanto Caleb discutia com o outro magricela, saco uma pistola calibre 380
e aponto para os dois, indo em direção à garota no chão.

— Tu não disseste que ele é teu primo, irmão? — o amigo de Caleb grasna.

Ele olha de esguelha para a arma ao lado então rosno mirando o braço do
garoto:
— Mãos na cabeça. Se tentar tocar no revólver, eu te deixo sem punho.

— Calma aí, tio! — o magricela leva as mãos imediatamente a cabeça.

Resvalo o olhar para a garota, que parece acordar com o meu brado.

Ela geme alguns sons sem nexo, e, num ritmo letárgico, abre as pálpebras
arroxeadas. Seus olhos azuis-turquesa me encaram confusos, e seus lábios
desidratados se incomodam com o pano calando sua voz.

Com uma só mão, desfaço com dificuldade o nó atrás de sua cabeça e as


cordas apertando seus punhos, enquanto sustento a arma apontada para o
magricela.

— Água! — ela ofega quando finalmente desfaço a mordaça.

— Caleb, traga água — ordeno, enquanto fito seus lábios ressecados.

Seus olhos me fitam na defensiva, enquanto franze a testa e se remexe no


chão. É como se ela estivesse sentindo algo.

— Está sentindo dor?

Ela aquiesce em um gemido.

— Onde? — pergunto.

Ela pressiona a mão contra o ventre, se contorcendo para frente. Deslizo meu
olhar para o seu vestido e, neste instante, meu cérebro congela quando vejo a
enorme mancha vermelha na barra atrás de vestido amarelo.

O que esses filhos da puta fizeram? — Pergunto-me ensandecido. — Ah,


Caleb! Em que você se meteu?
CAPÍTULO SETE
Claire
Anestesiada. Era assim como eu me sentia toda vez que meus olhos
encontravam força para se abrirem e verem o enorme pedaço de chão úmido
que cheirava a óleo e fumo, antes de eu apagar mais uma vez.

Acordo ao som do timbre grave de uma voz familiar e me esforço para não
dormir novamente. Lentamente, resvalo meu olhar para cima, para o conjunto
de pernas. Pelos grunhidos, aquelas pessoas parecem estar discutindo até um
deles me perceber acordada.

Minha mente processa aos poucos a imagem do homem em minha frente, que
possui um revólver apontado para outro alguém naquele galpão. Algo dentro
de mim suspira aliviado quando vejo que se trata do homem sério de cabelos
dourados e íris esverdeada. O “safado” do avião, Phill. Ele veio mesmo atrás
de mim.

Com dificuldade, ele me liberta da mordaça e das cordas prendendo meus


punhos. Em seguida, rogo por água, com a garganta seca e uma dor
insuportável no pé da barriga.

Ah, não! Justo hoje?! – Penso, desvanecendo aos poucos com a dor pungente
decorrente ao início dos meus dias vermelhos.

— Está sentindo algo?

A voz rouca pergunta, preocupada, estudando com aqueles olhos brilhantes


meu rosto, provavelmente marcado por uma expressão horrível. Uma pontada
mais forte me fisga o ventre e todas minhas entranhas se contorcem, enquanto
meu corpo solavanca para frente.
— Você está machucada?

Inspiro fundo, admoestando um pouco da dor em mim e olho furtivamente


para aquele homem de sobrancelhas naturalmente alinhadas e queixo
suavemente quadrado.

Vejo seus olhos se arregalarem quando descem para a barra do meu vestido.
No mesmo instante, sigo seu olhar para o que ele estava mirando e dou de
cara com a enorme mancha de sangue na parte traseira de meu vestido.

Seu semblante passou de assustado para irado em menos de um segundo e


vociferou para o par de pernas magricelas:

— Filho da puta! A garota está sangrando...

O estrondo da arma disparando faz meu coração parar por um instante.


Aperto os olhos e abro quando apenas ouço a respiração pesada de Phill.

Ele havia atirado no chão, fazendo o garoto de cabelos amarelados cair para
trás, arrastando o corpo contra o chão.

— Eu não estou sangrando –, gastei o resto de saliva para dizer.

Phill me olha, com a testa franzida e as mandíbulas trincadas.

— Não? – ele indaga.

— Quer dizer, eu estou sangrando... – mordisco o lado de dentro da bochecha


antes de dizer: -, mas é outro tipo de sangue... – meu corpo estremece com
uma fisgada mais forte. — Eu preciso de um remédio. Para cólica – gemo,
levando outra pontada, mais agressiva ainda

Um garoto, que aparentava ter a metade da idade de Phill, fica de cócoras em


minha frente e me entrega a água dentro de um copo de cerveja.

Rechaço, mas Phill me tranquiliza:


— Beba! Ele é meu primo, Caleb. Na teoria, ele é de confiança.

Aceito prontamente, hidratando-me e restabelecendo um pouco minhas


cordas vocais.

O garoto se levanta e sai da minha frente, e Phill se aproxima para perguntar


com calma:

— Consegue se levantar?

Olho para os lados, temerosa. Não entendo quando foi que o sequestro havia
acabado. Os dois meninos a minha direita seriam de confiança ou apenas seu
primo? Argh, isso está tão confuso! Onde estão o resto dos homens que vi
naquele carro?

Olho para o intenso verde em seus olhos e assinto:

— Claro!

Administro a dor em mim e ergo meu corpo com dificuldade, recebendo a


ajuda das mãos ágeis de Phill. Minhas pernas estão dormentes, e meu corpo,
dolorido.

— Caleb! Pegue aquelas cordas ali. – Phill acena com a cabeça para cima da
carcaça de um Chevette antigo.

— O que eu faço com elas? – o menino indaga.

— Você sabe o que fazer – Phill responde e olha por fim para o magricela
loiro tremulante na mira de sua arma.

— Vamos! – ele diz, incentivando-me a andar para o portão no fim do salão.

Dou o primeiro passo, no entanto, tão logo estanco. Quando ele percebe
minha relutância, me encara com a testa franzida.

— O que foi? Há algo de errado? – pergunta, um tanto ríspido, da forma que


eu me lembro dele naquele avião.

Alterno meu peso de uma perna para outra, tentando me fazer entendida da
maneira mais rápida.

— Sabe, está sujo atrás de mim. Tem como ir na frente?

— Se assim preferir... – Ele dá de ombros e desce o olhar para o meu vestido.


Ele retira a jaqueta de couro preto e me entrega. – Amarre isso em volta de
sua cintura!

— Não precisa, irá sujar...

— Mais vale uma jaqueta suja do que o banco do meu carro manchado. –
Pela forma grosseira com que falou, isso não era uma opção, mas sim uma
exigência.

— Obrigada por me deixar sujar sua bela jaqueta – desdenho, fazendo o que
ele me pede.

Ele tem razão, porém não pactuo com a grosseira.

Ele caminha em minha frente e sigo em seu encalço até o Porsche prata.

— Tenho uma dúvida: de quem você é filho? Conheço seus pais?

— Não tenho pais – ele responde, abrindo um meio sorriso.

— Como assim? Você é órfão? – pergunto, pressionando minha mão contra a


barriga, a fim de aliviar um pouco a dor.

— As pessoas não costumam usar essa palavra em minha frente. Mas sim.
Sou órfão.

— Oh, perdão! Não quero ofender – gemo mais uma vez.

Ele abre a porta do carona e diz arqueando a sobrancelha esquerda, com um


olhar mais escuro:

— Apenas fique calada até que eu me livre de você!

— É o quê? Livrar-se de mim? – fico assustada.

Ele explica melhor, no mesmo tom algoz:

— Livrar-me de você, no sentido de devolvê-la a sua família. Entre! – ele


incentiva para que eu sente no banco revestido a couro marrom.

— E o seu primo?

— Não se preocupe. Ele vai ficar aí até a polícia chegar.

Ele olha novamente para o banco em nossa frente e finalmente faço o que ele
pede, enquanto faz a volta no carro. Logo ele está ao meu lado dando partida.

— Posso fazer mais uma pergunta?

— Não.

— Onde estão o resto dos homens que estavam no carro? Quer dizer, me
lembro pelo menos de mais dois caras. Onde eles estão?

— Quando cheguei, havia apenas um. Mais uma pergunta? Não? Que
maravilha – ele diz sem me dar tempo de responder.

Apesar do sarcasmo, ele não me intimidava. As minhas dúvidas haviam


cessado até o presente momento e, por enquanto, tudo o que me importava
era achar uma posição confortável naquele banco até ser medicada.

Devido ao cansaço, não demorou muito para eu colar os olhos e apenas


acordar quando ouvi a porta ao meu lado ser aberta.

Endireito a coluna de supetão e fito o lugar conhecido em minha frente. Era o


jardim da casa da minha avó. Em um ímpeto, olho para trás e vejo a barreira
de segurança no portão, mais agitada do que eu me lembro hoje mais cedo.

Meu olhar recai para o lado e encontro as esferas esverdeadas de Phill me


encarando duramente, seguido de um profundo suspiro, que não parecia vir
dele.

Saio do carro, sendo recebida pela luz do alvorecer, e — além de Phill —


encontro meus avós, Matt e tio Ben aflitos perto dos degraus da escada do
terraço.

Minha avó leva a mão a boca, com os arregalados e aflitos, exclamando:

— Graças a Deus!

Dou um passo à frente e minhas pernas falham, fracas.

Phill envolve minha cintura com seus braços cálidos, enquanto Matt vem
minha direção e me carrega nos braços para o sofá da sala. A partir disso,
tudo acontece mais rápido.

— Ela precisa de um analgésico – escuto a voz de Phill dizer.

— Quem é você, rapaz? – minha avó pergunta, enquanto fecho os olhos


devido a claridade das luzes da sala.

— Ele é Phill Castallaneta, vó. Um velho amigo meu do colegial.

— Sim, mas por que ele estava com minha neta? – vovó ainda está meio
alterada.

— Perdão, senhora. Deixe-me explicar. Eu estava com sua neta antes do


ocorrido, e antes de ir embora, vi toda a ação dos sequestradores.

— Ah, meu Deus! – vovó exclama novamente.

— Felizmente, consegui segui-los. Levaram para um galpão aqui perto, nas


redondezas, não passavam de bandidos juvenis. Enfim, consegui deter um
deles e trazer Claire de volta.

Ele sabe meu nome – penso ao ouvir pela primeira vez meu nome sendo
pronunciado por Phill. Algo me diz que ainda ouviria isso muitas vezes, e, de
alguma forma, gosto dessa ideia.

Tão logo, sou medicada e levada ao banho. Depois disso, não me lembro de
muitas coisas, apenas que apaguei em minha cama de lençóis limpos, com as
cortinas do quarto fechadas, impedindo que os raios solares adentrassem o
local.
CAPÍTULO OITO
Claire
Acordei com a imagem das bochechas rechonchudas e as curiosas esferas cor
de âmbar me encarando.

Levo a mão à boca, bocejando e pergunto:

— Que horas são, vó?

Ela se afasta um pouco, se aprumando na ponta da cama.

— Quase sete da noite – ela responde.

— O quê? A empresa! – Lembro-me, preocupada. – Nós iríamos visitar a


Sullivan hoje. Mil desculpas, vó!

— Não pense nisso agora, querida! Depois do que aconteceu com você
ontem, seu único trabalho hoje é descansar. Aliás, já descansou o bastante. Já
está até com as pálpebras inchadas – ela observa.

— Obrigada, vozinha. – Agradeço, percebendo o colar de pérolas em seu


pescoço e o vestido rosa que ela apenas usava em ocasiões especiais. –
Espera um pouco! A senhora irá a uma festa hoje?

Arqueio uma sobrancelha, e minha avó dá um pequeno sobressalto.

— Ah, querida! Era isso o que eu vim fazer aqui: dizer para você tomar um
banho quente, colocar um vestido bonito e descer para o jantar especial de
hoje à noite.

— Espere! Jantar especial? – Semicerro o olhar e pergunto-me confusa “Será


que me esqueci de alguma data importante? ”; “Por que, de repente, aquela
casa está realizando tantos jantares especiais? ”.
— Sim, um jantar que mandei preparar para o amigo de Matt.

— Phill? — Indago, surpresa.

— Sim, querida. Vamos fazer um jantar em agradecimento ao ato de coragem


do rapaz. Eu estava tão atordoada hoje pela manhã, que mal pude agradecê-lo
de forma adequada. Enfim, apenas levante-se e arrume-se para receber seu
salvador.

— Salvador, vó? – Sorrio.

— Super-herói como vocês jovens chamam...

— A senhora não acha que está exagerando com essa história de


agradecimento? Phill não me parece ser do tipo de homem que faz alguma
coisa para ser recompensado no final. Ou, pelo menos para mim, não se
mostrou ser assim. Pode ser que ele interprete errado e não queira vir.

A verdade é que pareceu que ele fez aquilo a contragosto. Como se eu fosse
um grande fardo que ele teve que carregar, atrapalhando seus planos para a
noite – mas eu não queria ter que explicar uma impressão que tive a minha
avó. Impressão não é algo preciso, certo; por isso não teria muita relevância
para ela, se bem a conheço, ela dá mais credibilidade a inflexibilidade dos
pensamentos palpáveis.

— Claire, ele já aceitou o convite e foi um verdadeiro cavalheiro. Aliás, eu


vou descendo para administrar o trabalho na cozinha, nosso convidado estará
aqui às oito.

Ela vai até a porta do quarto e antes de desaparecer pelo corredor, ela
adverte:

— Não se atrase, minha filha. Quero começar cedo para terminar cedo.
Amanhã teremos um longo dia de trabalho.

Ela bate a porta, e suspiro profundamente.


Busco com o olhar o analgésico em cima da mesinha ao lado da cama, e
deslizo meus pés para fora do colchão, indo em direção ao banheiro.

Olho minha imagem no reflexo do espelho emoldurado por luzes


incandescentes e respiro fundo outra vez. Amanhã eu finalmente teria de
começar a me dedicar ao ofício que sempre soube que ocuparia um dia, e,
sinceramente, eu não sei se eu estou preparada para ser a CEO de uma
multinacional tão cedo.

Foram cinco anos cansativos de graduação, e incontáveis cursos de extensão,


e tudo o que eu quero no momento é descansar e me dedicar, ao menos por
pouco tempo, a algo que verdadeiramente gosto antes de mergulhar de cabeça
na posição de minha avó.

Mas sabia que isto é quase impossível.

Abro a torneira e enxáguo o rosto com uma boa quantidade de água, e afasto
aqueles pensamentos ansiosos. No entanto, outro tipo inquietação toma conta
do meu corpo, esquentando-me debaixo da pele. Phill estará aqui em uma
hora, e eu estou estranhamente ansiosa para isso.
CAPÍTULO NOVE
Claire

— Por favor, Dimitri, vá à cozinha e pergunte se o escargot está pronto.


Nosso convidado está prestes a chegar – escuto minha avó dizer ao mordomo
e velho amigo da família, que tão logo desaparece pela porta lateral da sala.

Desço o último lance da escada e as atenções de todos se voltam para mim,


como na noite passada. Pelas vidraças, noto que as luzes do jardim estão
acesas e há mais funcionários do que o normal circulando pela casa.

— Até que enfim, Claire! Já estava quase subindo para chamá-la novamente.

— Desculpem-me, eu tive que lavar e secar o cabelo outra vez.

— Não há o que se desculpar. O convidado ainda nem deu caras. Não sabe
como é sua avó? – Tio Ben comenta do outro lado da sala, segurando um
copo com Whisky de sua esposa, Camila.

— Gostaria de saber como eu sou, Ben – vovó replica, desafiadora.

— Afanada! – vovô Robert responde se intrometendo, explodindo uma


gargalhada com tio Ben.

— Com licença! O Sr. Castallaneta acabou de chegar. – Liz anuncia ao passar


pela porta de entrada da sala.

— Mande-o entrar, Liz! – Vovó responde, ansiosa.

Liz aquiesci.

Sorrateiramente, Matt abandona o sofá e caminha em minha direção, parando


ao meu lado, e beija o topo da minha cabeça.

— Como você está? – Ele murmura.

— Bem!

— Graças a Deus, você me preocupou muito ontem.

Tão logo o homem alto de cabelos úmidos adentra a sala, usando uma camisa
de tricô cinza embaixo de um estiloso sobretudo marrom escuro, combinando
com a calça jeans surradas e as botas Chelsans.

Liz se oferece para guardar seu casaco, e ele aceita tirando o sobretudo e
entregando a ela, murmurando um “Obrigado! ”.

Subo o olhar despretensiosamente para os seus contornos bem delineados,


talvez resultado de algumas horas regulares de academia, e reparo na metade
da tatuagem à mostra. O que seria? Uma caveira? Não dá de ver muito bem.
O curioso é que ele não aparentava nem um pouco ser um rebelde com pele
marcada. E caramba...com o desaparecimento de toda aquela primeira má
impressão que tive dele, posso admitir para mim mesma: Caramba! Esse cara
é muito gato.

O silêncio permanece na sala por alguns instantes até a voz rouca dele
reverberar, cumprimentando:

— Boa noite! Perdão pelo atraso, eu estava no trabalho e tive que voltar ao
meu apartamento para tomar um banho e trocar de roupas.

Observo vovó piscar duas vezes e dizer complacente:

— Atraso? Não, querido. Você não está atrasado! Chegou na hora. Venha,
vamos sentando! – Ela se coloca ao lado de Phill e o incentiva a se aproximar
do conjunto de sofás.

— Mesmo assim, peço perdão!


— Além de corajoso, é muito educado. Seus pais devem ter muito orgulho.

— Talvez, se eles estivessem entre nós – Phill diz com naturalidade.

Lembro-me do que ele me dissera ontem, e um silêncio sepulcral se faz


quando minha avó decodifica o que Phill havia falado.

— Ah, querido! Perdão! Eu sinto muito.

— Não há problema. A morte é uma das poucas certezas que temos nesta
vida, não é mesmo?

Minha avó inspira fundo, pensando por um momento, talvez recobrando algo
da história de nossa família e, por fim, concorda:

— Sim, disse bem! É uma das poucas certezas que temos. – Dando-se conta
do comentário mórbido, ela completa: — Mas não devemos provocá-la
também.

Phill expande o olhar pela sala e cumprimenta Matt ao meu lado, que o
responde com um “E aí, cara? ”

— Já soube que vocês eram amigos no colegial – minha avó comenta.

Phill abre um meio sorriso e diz:

— Claro! – ele pigarreia -, tenho boas lembranças de Matt Sullivan.

— Não exagere, vó! Não éramos amigos, estava mais para colegas de turma.
Phill nunca me deu muito abertura.

— Abertura?! – vovó indaga, confusa.

— Afinal, amigos não informam o número errado de telefone, não é? – Matt


ironiza.

— Como? – Phill se faz de desentendido.


Vovó interfere no clima embaraçoso que se formou, chamando a atenção de
Phill:

— Deixe-me apresentar a você meu marido e meu filho...

Nosso convidado é arrastado pela conversa de minha avó.

Na mesa de jantar, as perguntas e elogios também não paravam.

— Phill, eu não tenho palavras para agradecer o que fez ontem pela minha
família. Estou até agora sem palavras, meu querido. Você poderia contar um
pouco mais sobre o que aconteceu ontem à noite? – Vovó pergunta ao seu
lado, tocando seu braço. – Desculpe-me, ontem estávamos tão atordoados
pela manhã, que mal conseguimos compreender direito o que houve.

Vejo seu olhar deslizar para frente e me encarar. Ele solta um leve suspiro,
disfarçando, talvez, o desconforto imperceptível; e pergunta com um sorriso
de lado:

— Eu já prestei meu depoimento à polícia. Mas posso fazer isso aqui


também. O que exatamente a senhora quer saber?

— Tudo. Exatamente, tudo.

— Tudo? Parece-me um bom pedido. Pois bem. Por onde começo?... – Ele
suspira mais uma vez. – Sua neta e eu estávamos em frente a esta casa ontem
à noite e...

— Perdão! Por que você estava aqui com Claire ontem? – Matt indaga,
confuso.

Eu tomo a liberdade de explicar:

— É uma longa história, Matt! Resumindo: acabamos trocando nossos


celulares no avião e combinamos de nos encontrar aqui em frente para
destrocarmos.
Pensando melhor, trocar os celulares no avião não parece mais um infortúnio,
mas sim, obra boa do destino.

— Feito isso, entrei em meu carro e presenciei toda a ação dos delinquentes.
Eu segui o carro e fiquei à espreita no galpão esperando a hora apropriada
para entrar.

— E Caleb? – questiono, recordando-me de seu primo.

— Caleb? Que Caleb? – Matt indaga mais uma vez, curioso.

— Havia outra pessoa também, querida? – Agora é a vez de vovó perguntar.

— Sim, Caleb. O primo de Phill. – Torno a fitá-lo. — Ele estava no carro


com você? – pergunto, tentando recobrar algo assim em minha memória. –
Estranho! Não me lembro de ter o visto...

— Como poderia lembrar de alguma coisa detalhadamente depois de um


estresse tão grande, Claire? – Vovó argumenta.

Penso por um instante e concordo:

— Tem razão, vó.

— Prossiga, meu querido... — vovó diz.

— O que houve depois que chegou ao cativeiro?! – Agora é a vez do meu


avô perguntar.

Phill e eu nos entreolhamos, e ele disse por fim:

— Esperei um pouco até alguns deles saírem de lá. Aproveitei o momento e


entramos sorrateiramente. Encontramos um magricela adolescente, então meu
primo e eu rendemos o garoto, e eu trouxe Claire para cá. O resto da história,
suponho que já devam saber!

— Adolescente? O sistema de segurança dessa casa foi furado por um grupo


de delinquentes juvenis? – Meu tio murmura, apertando o punho sobre a
mesa.

Recobro novamente a memória da noite anterior e pergunto, confusa:

— Espere... nós deixamos Caleb e o loiro amarrado para trás... o que houve
depois? A polícia prendeu o garoto?

— “Prender”? Eu não soube de prisão alguma... eles não haviam fugido? —


vovó me interrompe, olhando para o meu avô. – Robert, você soube de
alguma prisão?

Meu avô meneia a cabeça em negativa, então pergunto a Phill:

— O que aconteceu com aquele garoto?

Ele faz uma pausa e, tranquilamente, responde:

— Como foi dito em meu depoimento à polícia: mais outros dois garotos
chegaram ao balcão e renderam Caleb com um taco de beisebol.

— Ah, meu Deus! – Levo a mão a boca com o coração gelado.

— Não se preocupe! Caleb está bem. Ele teve o antebraço faturado, mas nada
tão grave. Isso poderia ter sido mais dramático se eles usassem a arma de
fogo, por exemplo.

— Se quiser, podemos pagar as despesas do hospital... – Vovó se oferece,


preocupada.

— Agradeço, mas não é preciso. Ele já está em casa desde o início da tarde.

— Esses são os jovens que nosso país está formando? Esses vermes merecem
passar alguns longos atrás das grades. Só assim para virarem gente decente! –
Meu avô resmunga ao meu lado, indignado. E é seguido pela dura promessa
de minha avó:
— Eles pagarão pelo que fizeram, Robert! Essa semana mesmo irei a polícia
me certificar de que irão tirar esses garotos das ruas. Não podemos deixar que
fique por isso mesmo e correr o risco de acontecer algo a nossa Claire outra
vez.

O ar de repente fica denso na sala de jantar.

Com o olhar inexpressível, vejo os dedos longínquos de Phill tamborilar na


superfície da mesa. Vovó inspira fundo, pigarreia de modo teatral e recupera
a leveza da conversa:

— E ainda saiu para trabalhar hoje à tarde, meu querido? – Vovó indaga a
Phill, com um ar maravilhado, e ele assente formalmente. – Aliás, você
trabalha com o quê?

Ele cola as costas na cadeira atrás, pousando as mãos em cima das coxas.

— Atualmente, sou apenas um mero gestor de uma rede de supermercados


aqui em Tennessee.

— Uau! Gestor de supermercados? Nada mal! – Vovó elogia sorrindo. – Qual


a empresa?

— Hill Supermercados.

— UAU! – Agora todos à mesa exclamam, surpresos.

— Que legal, cara. – Matt diz. – Muito bom mesmo.

Apesar de ter ficado exilada por um tempo de Nashville, eu sabia muito bem
que a rede de supermercados que mais cresce e domina todo a região de
Tennessee era a do grupo Hill.

— Já foi à Universidade também?

— Sim, me formei em Negócios em Vanderbilt e fiz pós-graduação em


gestão empresarial em Stanford.
No mesmo instante, resvalo o olhar para gentil senhora vendo suas esferas de
âmbar brilharem e penso: — A pós-graduação perfeita para o cargo de chefe
diretor executivo.

— Poxa vida! Ainda bem que você não nasceu como meu primo, Phill! –
Matt brinca.

— Oh, não! Não é para tanto! De que vale ter a formação se não temos a
própria empresa? Eu sou apenas um funcionário tentando a vida. Não sou
melhor que ninguém, apenas consegui a sorte de uma bolsa em uma boa
escola como a qual nós estudamos.

Meu avô sorri, pensando alto:

— Um CEO sem império.

— Não acho que isso seja apenas sorte! – Vovó prossegue com a voz macia:
– Se não for muito incômodo, meu querido, você pode dar algumas dicas a
nossa Claire? Ela irá assumir meu lugar na presidência do grupo
empresarial de nossa família e seria enriquecedor se ela recebesse
algumas dicas de um profissional tão capacitado como você. Não é mesmo,
Claire?

Aquiesço:

— Claro, seria muito enriquecedor! Se não for muito incômodo para Phill,
claro!

Ele franze um a testa e pela primeira vez na noite sinto o olhar esverdeado
flamejante sobre mim.

Sinto um arrepio na nuca quando ouço sua voz reverberar:

— Claro que não! Será um prazer – Ele responde respeitosamente.

Um silêncio ensurdecedor se faz na mesa enquanto Phill e eu nos encaramos.


— Engraçado! – Vovó diz.

— O quê? – indago, perdida.

Ela me lançar um olhar rápido e em seguida estuda o rosto de Phill.

— Acho vocês que fariam o belo casal! – Minha avó comenta, criando uma
nuvem de embaraço entre nós.

No entanto, diferente dele; eu ainda sustento o olhar; e afugento o assunto,


dizendo por fim:

— E esse escargot que não fica pronto!

***

Depois do jantar, Phill e eu caminhamos para a varanda da sala, sendo


incentivados por minha avó a ficarmos a sós.

Esfrego os braços, devido a brisa gélida que chegava em minha pele,


arrepiando. Em seguida, aqueço-me ao ouvir o som grave de sua voz:

— O que gostaria de saber especificamente?

— Hum... – mordo o lado de dentro da bochecha, pensando em qualquer


coisa. Mas não me vem nada em mente. – Quantos anos você tem?

Pergunto sem criatividade alguma, mas é algo que realmente tenho


curiosidade. 31, como Matt?

Ele me fita não muito receptivo como antes, quando estava ao lado de minha
avó.
— Eu tenho um compromisso marcado ainda essa noite. Se pudesse ser
rápida e fazer suas perguntas, me faria um grande favor.

— Parecia-me mais gentil minutos atrás – pontuo.

— Sua avó me pareceu mais assuntada do que a senhorita. – Ele responde


calmamente, com as palavras mais afiadas que uma lâmina. – Quando aceitei
o convite de sua avó, pensei que seria adequado vir aqui e esclarecer tudo o
que aconteceu ontem à noite...

— Que compromisso? Sua namorada? – Ignoro-o, completamente. Me


interessa saber mais um pouco sobre ele.

Ah, céus! Aqueles peitos no avião eram dela? Enrubesço violentamente,


pensando em como fui injusta ao julgá-lo apenas pela aparência. Ele não é
um cafajeste como pensei, apenas um homem com intimidade.

Eu e minha péssima mania de julgar e colocar todos os homens dentro da


mesma cesta.

— Não tenho namorada – Ele responde impenetrável. – São essas suas


perguntas?

— Sinceramente? Sim, são essas. Estou sem cabeça para pensar em


administração, empresas, presidência... eu acabei de me formar.

— Acabou de se formar? Então está cansada? – Ele pergunta em um tom


quase complacente.

— Você se sentiu assim também?

— Não, eu não tive tempo para me sentir assim, mas já ouvi muito relatos de
colegas de turma que se sentiram assim.

— Eu só queria respirar, sabe? Fazer algo que realmente gosto, não apenas
pular de um estresse, que é a Universidade, para outro.
— Que vida difícil! – ele solta um longo suspiro e isso soa meio sarcástico. –
Fiquei curioso! O que faria se não tivesse esse terrível fardo de ser presidente
de uma empresa multimilionária e estável como a Sullivan.

Se havia alguma dúvida de que ele estava sendo sarcástico, agora não há
mais.

— Atuaria.

Ele pisca duas vezes e indaga, surpreso:

— Atuaria? Como uma vedete?

— Sim, antes de entrar na Universidade, meu sonho era ser uma atriz
profissional de teatro, mas parei de praticar há muito tempo. Seria ótimo
poder voltar e sentir novamente a adrenalina de ensaiar e me apresentar em
um palco. Só por uns meses, isso abasteceria muito minhas baterias.

— Perdão mais uma vez, mas por que deve ser você a ocupar o lugar de sua
avó? Por que não Matt?

— Matt já tem a empresa do pai para assumir. Infelizmente, há apenas nós


dois de netos. Não temos a opção de vender a empresa. Isso é a paixão dela,
meu avô nunca levou jeito para os negócios de qualquer modo e ela
conseguiu administrar e levar o nome de nossa família com muita honra.

— Entendo. Talvez se tivesse mais parentes em sua família, você não teria
que carregar esse fardo sozinha. – Ele diz reflexivo. – Estou realmente muito
tocado com seu difícil dever, mas eu tenho que ir.

Ele gira os calcanhares, e eu o paro:

— Espera! Você disse que trabalha como gestor em uma rede de


supermercado? – ele me olha por cima do ombro com os lábios crispados. –
Você parece um homem que gosta do que faz. Parece ser decidido também e
tem uma postura impecável. Você é perfeito.
— Perfeito?!

— Sim, perfeito! Você já pensou em ser um CEO de uma multinacional? —


Mesmo ele estando apressado, minha proposta faz seu corpo girar lentamente
em minha direção com os ombros retos.

— Como disse? Não estou compreendendo muito o que está querendo


dizer...

— Eu preciso de alguns meses para espairecer e você é um profissional


altamente capacitado... É isso! – penso, ao mesmo tempo que verbalizo, no
plano que aparentemente parecia insano, mas brilhante. — E se você ficasse
no meu lugar?

— Perdão. Continuo sem entender. – Ele faz uma breve pausa e me


compenetra com o olhar. — Como eu iria ocupar seu lugar? Nem se
quiséssemos...

Interrompo-o:

— Casando comigo.

Phill transfere seu peso de uma perna para outra. Ele semicerra os lábios e
pousa as mãos na cintura. Eu não tinha muito experiência com os tipos de
seus olhares, mas a forma como está me encarando não é tão difícil de
deduzir que a palavra “ensandecida” seja um dos adjetivos que ele está
prestes a me caracterizar.
CAPÍTULO DEZ
Phill
— Você está pirada.

Murmuro, tão baixo, que não sei exatamente se ela escutou.

— Não, não estou – ela replica.

— No mínimo, sem juízo algum, suponho – retruco, o que dá no mesmo,


estudando nela algum resquício de sanidade de mental.

— Por que diz isso? Eu sei que parece loucura, mas seria perfeito para ambas
as partes. Além de minha avó estar encantada com você, não seria muito
difícil de fazê-la engolir a história de um romance avassalador e repentino.
Eu a conheço muito bem para saber que ela iria adorar ter você como genro e
funcionário da Sullivan.

— Por que você confiaria em um cara como eu?

— Você me salvou...

— Eu sou um homem quase desconhecido para você – argumento, tentando


dar alguma chance a ela de se tocar do tamanho da tolice de sua proposta,
antes que eu comece a repensá-la.

— Não, não é. Matt conhece você há muito tempo.

— Esse é seu parâmetro? Fala sério!

— Você me salvou ontem, eu acho que isso é um bom parâmetro.

— Com todo respeito, acho que você deve seriamente rever seus parâmetros
de confiança. Isso pode te levar a lugares perigosos.
— Quem irá me levar? – Ela se aproxima, trazendo seu nariz empinado e
atrevido a centímetros do meu. – Ui, ui, ui! Você?! Mais um motivo para eu
querer me casar com vossa senhoria. – Ela sopra as últimas palavras, com
aquele tom de mulher petulante que já estar começando a me dar nos nervos.

— Você não quer entrar em um jogo comigo. – Murmuro.

— Isso não será bem um jogo, está mais para encenação. No entanto, se for
esse o problema, eu amo jogos! – Ela dá de ombros e diz por fim: — Só vou
saber se eu experimentar, não é mesmo?! — Seu olhar é tão decidido, que
mal consigo arguir contra qualquer pensamento seu. Ela parece ser uma
pessoa teimosa demais para dar pra trás a qualquer ideia sua.

Faço uma longa pausa, quando ela se afasta um pouco e me observa pensar.
Então finalmente pergunto:

— No que exatamente está pensando?

Vejo seu peito subir e descer suavemente, e ela titubeia antes de dizer:

— Não pensei em tudo detalhadamente, obviamente, mas a ideia é um


contrato de seis meses: nós nos casamos; você como meu esposo, me ajuda
com a presidência enquanto vivo a minha vida da forma que eu quero. – Coço
a ponta do nariz com o dorso da mão enquanto ela explica: — Ah, e você
recebe o salário integral de presidente durante esse tempo. Findado o prazo
de seis meses, nos divorciamos, fazemos a rescisão do contrato e seguimos
com nossas vidas normalmente.

Ela termina e me encara, ansiosa por minha resposta. Inspiro fundo, tentando
conter uma risada:

— Por que diabos pensa que deixaria meu emprego para participar de seu
plano maluco? Você acha que vou largar meu emprego por seis meses
levando uma vida de CEO de uma multinacional? E depois disso?

Ela pisca duas vezes aquelas grandes esferas azuis-turquesa e diz, pensativa:
— Ah, claro! – Ela parece ter um insight e diz firme, no mesmo instante: —
Depois disso eu consigo para você um emprego de diretor na Sullivan. – E
acrescenta: — Ganhando o dobro que você ganha como gestor da Hill.

Oh, talvez eu tenha subestimado essa garota. Ela é maluca, no entanto, sabe
negociar. Sem dúvidas, aparentemente, é uma proposta tentadora. Uma
empresa como a Sullivan está em um patamar muito superior diante de uma
rede de supermercados local. Se Caleb não estivesse envolvido no sequestro
dela, eu aceitaria prontamente.

No entanto, eu havia de pensar com mais cautela. Talvez seja mais seguro
romper o vínculo com essa família o quanto antes. No entanto, não me parece
uma boa recusar sem antes pensar com mais cautela.

— Eu preciso de um tempo para pensar.

— Ok! Você tem até amanhã à tarde para pensar.

Olho para o relógio em meu pulso e digo rapidamente:

— Certo! Eu tenho que ir agora.

Cumprimento-a com um menear de cabeça e giro meu corpo em direção à


porta de vidro da sala de estar. Encontro os olhares ao longe da senhora
Sullivan e seu filho... hum...Ben. Pareciam estar nos observando.

Quando dou um passo à frente, meu punho é tomado pelos finos dedos da
mulher astuta de cabelos castanhos. Viro-me para soltar sua mão, e sou
surpreendido pelo toque dos lábios cálidos e macios.

Ela desliza seu corpo para frente e se gruda em mim, elevando sua mão
gélida até minha nuca, enquanto permaneço examinando sua ação de olhos
abertos. Com destreza, ela tão logo serpenteia seu corpo para longe do meu,
abrindo seus olhos dramaticamente. Ela sorri, como um anjo. E sussurra
como uma calculista:

— Se for aceitar amanhã minha proposta, acho bom que já se comece a dar
sentido a essa história.

Ela me lança uma piscadela e acrescenta:

— Agora sim, está liberado, senhor Castallaneta. E não se preocupe, eu sei


onde encontrá-lo.

— Sabe? – Franzo o cenho, confuso.

— Não há nada que eu não saiba.

Pisco duas vezes e sorrio, pensando: — Se soubesse, não seria tão tola.

— Ok, então. Tchau! – Despeço-me.

Desta vez não aceno e apenas sigo meu caminho, agradecendo rapidamente a
senhora Sullivan e os demais membros da família.

Percorro as ruas adentro da cidade noturna, em direção às redondezas de


Edgefield. Às dez da noite de uma quarta-feira comum, as calçadas estavam
desertas e quase não se ouvia nada além do ronco do motor.

Estaciono na vizinhança arborizada, e subo pela escada da varanda da


humilde casa de um andar de cores frias. Bato três vezes com os nós dos
dedos na madeira maciça, e sou recebido pelo gato roliço de Alexa.

— 9:20? – A mulher de cabelos curtos e tatuagens tribais diz, arqueando uma


sobrancelha.

— Ainda dá tempo para uma cerveja? – pergunto, a admoestando.

Ela sorri abertamente, me dando espaço para que eu passe.

— Sempre! Só não venha com seu maldito Whisky.


CAPÍTULO ONZE
Claire
— Pronta? – escuto minha avó perguntar ao meu lado, ainda no banco
traseiro de um Maserati novinho. Pela janela, eu observava o grandioso
saguão do prédio da Sullivan, o qual visitei apenas três vezes em minha
infância.

Matt e eu quase nunca tínhamos tempo para visitá-la em seu escritório, pois
sempre estávamos em algum curso de francês, alemão ou apenas praticando
algum esporte. Aliás, foi ela própria quem me matriculou nas aulas de
academia de teatro de Martha quando eu ainda tinha dez anos. A certa altura,
eu não tinha muita noção do mundo, mas sabia precisamente que amava subir
aos palcos.

Olho para o retrovisor central e vejo o acenar de olhos gentil de Tom.

— Não há pessoa mais pronta que eu neste momento, vó! – sorrio, tentando
dar um pouco de satisfação a ela.

— Oh! Antes que eu me esqueça... você gostou do carro?

Olho para os lados e pergunto, confusa:

— Esse Maserati? – toco com as mãos o estofado de couro marrom e


respondo: — Gostei, ele muito elegante. Por quê?

— Por que ele é seu.

— Não!? – arregalo meus olhos, incrédula, não contendo a felicidade em


mim

Apesar de eu sempre ter levado uma boa vida, eu nunca tive um carro em
toda minha existência.
Minha avó sempre dizia que dá demais aos filhos acaba estragando bons
profissionais, então resolveu estabelecer uma idade mínima para cada coisa a
ser ganhada ou conquista. Um carro estava na faixa etária dos 21 anos.

Já faz dois anos que completei 21, mas como eu estava em Nova Iorque,
permaneci sem carro mesmo. Digamos que em Nova Iorque, um carro não
tinha muita utilidade; mas em Nashville, a logística era diferente.

— Sim, querida! A partir de hoje você será uma das figuras mais importantes
do comércio de ferragens nacional e internacional, vá se acostumando...
Apesar do árduo trabalho, ser presidente há várias vantagens – ela falava
enquanto eu namorava o interior daquele bebê que seria meu. – Deixemos
disso e vamos à luta! – ela disse soltando uma gargalhada gostosa.

A porta ao seu lado se abre, assim como a minha. Em seguida, somos


recebidas por um grupo de pessoas que parecem nos escoltar até o elevador
com perguntas de rotina, que, naturalmente, eram todas respondidas pela
senhora de blazer vermelho ao meu lado.

— O presidente do grupo Lamar solicitou uma reunião para o próximo


sábado, senhora – diz um ruivo alto obedecendo sua vez.

— Confirme com ele, Morrison! – minha avó responde. — Clark, a agenda


da manhã!

Vejo a mulher de pele dourada caminhar a nossa esquerda e responder ao


chamado de minha vó.

— Reunião com os colaboradores às nove horas. Cotação, às onze horas.


Almoço com os chefes de departamento, às doze.

— Certo! – vovó assente.

— James, tem alguma novidade sobre o requerimento da semana passada?

— Foi aprovado, senhora.


— Maravilha!

As perguntas não param por aí, e apenas conseguimos sossego quando


entramos no elevador, sozinhas.

Antes que as portas se fechem, minha avó diz àquelas pessoas ao lado de
fora:

— Senhores, quase me esqueci de apresentar. Esta ao meu lado é minha


famosa neta Claire, minha sucessora, contudo futura presidente do grupo
Sullivan.

Os olhares abandonam minha avó, e eu engulo em seco com tantos olhos


curiosos e avaliativos sobre mim.

— Até mais, senhores!

As portas do elevador se fecham, enquanto aquelas pessoas assentem


respeitosamente. Quando o silêncio tornasse nossa única companhia, sinto
um alívio estranho desmanchar em meu peito.

— Todos os dias são sempre assim?

— Nem sempre, querida. Os fins de semana são mais tranquilos.

— Fins de semana – repito, murmurando.

— Algum problema?

— Nenhum. — Forço um sorriso. – É que são tantas informações -, explico.

— Não se preocupe, Claire. Você não viu nem o começo, mas tenho certeza
de que está pronta para isso. Logo, logo você se acostuma.

Mal sabia o que estava por vir. Cumprir a agenda de compromissos de minha
avó em cima de um salto alto me deixou exausta. Mesmo estando apenas ali
para observar, a sensação de voltar para casa às sete da noite foi como se um
trator tivesse me atropelado por cima de um arame farpado.

Confesso que subestimei aquela velhinha risonha, ela é mais forte que parece
— fisicamente e mentalmente.

Nunca pensei que ser presidente da Sullivan lhe atribuísse tantas missões em
um só dia. Eu sabia que não era fácil, claro; apenas não sabia que o ritmo
fosse tão frenético. E pensando bem, minha cabeça ainda está girando com
tantas reuniões, papéis, assinaturas, lembretes e pedidos. Céus, confesso que
estudar e estagiar era até mais agradável do que isso.

Estou relaxando em minha cama depois de uma longa ducha, quando, em um


ímpeto, um nome vem a minha mente. “Phill!”

Levanto de supetão, sussurrando: — Quase me esqueci!

Como eu posso me esquecer dele?! – Penso trazendo o novo aparelho celular


para minhas mãos nervosas. O antigo se perdeu em meio a confusão do
sequestro e, gentilmente, tio Ben me conseguiu um novo aparelho, logo pela
manhã.

Digito na barra de procura do Google: “Supermercado Hill” “Gestor" “Phill


Castaneletta”

Clico no primeiro resultado: o perfil oficial da empresa chamada Hill


Supermercados.

Não encontro o nome de Phill entre as informações, e antes de sair da página


e tentar outra, corro com olhos rapidamente pelas avaliações das lojas. Dentre
elas, uma me chama a atenção, cujo o título é: “Gestor tesudo da loja
central”.

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12. 09. 2019

“Eles têm ótimos preços e uma padaria de encher os olhos. Tive um pequeno
problema com a caixa, mas tudo foi resolvido por um dos gestores da Hill;
muito simpático, por sinal, que despertou em mim fortes desejos carnais com
aquela voz e cara de macho alfa safado. Minha calcinha está molhada até
agora e acho que voltarei amanhã. Obrigada, senhor Castallaneta. Se estiver
olhando essa avaliação, saiba que estou de olho em você. Rsrs ???? ”

Pisco os olhos duas vezes e inspiro fundo, pensando alto: — “Que despertou
em mim fortes desejos carnais? ”... Puxa vida, isso foi... intenso. – Engulo em
seco, involuntariamente, imaginando Phill sob a ótica daquele comentário.

Afasto aqueles pensamentos e retorno à barra de pesquisa, à procura das


redes sociais do tal “Hill supermercados", na esperança de encontrar algo por
lá. Sinto que há uma grande chance do Castallaneta mencionado por essa
mulher ser o mesmo que estou procurando, já que seu sobrenome não deve
ser muito comum aqui Nashville.

Abro o perfil do Instagram e desço um pouco a barra de rolagem, e bingo! Lá


estava ele, entre funcionárias sorridentes, no meio de uma confraternização
que havia acontecido hoje.

Abro mais a foto com a função zoom e não resisto a tentação de ampliar o
seu corpo e — Nossa, tenho que concordar com aquela mulher, ele é um
homem quente. Sua postura autoritária, quase beirando a esnobe; suas curvas
másculas e bem-feitas e um meio sorriso nos lábios transpiram sensualidade;
roubando um pouco o oxigênio de meu cérebro.

Vejo o horário encimado na tela, e concluo que já é tarde demais para


persegui-lo em seu trabalho. Então salvo o endereço gravado na descrição da
página, decidida a procurá-lo de manhã cedinho, antes de ir à Sullivan.

Amanhã você não me escapa... Phill Castaneletta – digo, umedecendo os


lábios e desligando a tela.
CAPÍTULO DOZE
Phill
Dou mais um gole espesso do café na porcelana em minha mão, enquanto
observo a cidade acordar pela vidraça da sala de estar. Todos os dias são
assim: Eu acordo às cinco da manhã, faço a higiene matinal, coloco terno e
gravata, e faço o café antes de ir ao trabalho, não importa o lugar em que
estou.

Abandono a xícara na bancada da cozinha e vou até o quarto de solteiro no


segundo andar do apartamento, ligando a luz e batendo com os nós dos dedos
na perna do garoto desacordado.

— Acorda! – ordeno.

Ele solta um grunhido, remexendo o corpo preguiçoso no colchão e tornando


a dormir.

— Levanta! – agora digo em um tom mais grave e autoritário, puxando de


uma só vez o lençol de cima do seu corpo.

Ele ergue a cabeça de supetão e resmunga:

— O que houve, primo? – Ele levanta de supetão e confere rapidamente as


horas no celular.

— “O que houve? ” – Recrimino-o com o olhar. — Já está na hora de ficar


de pé. Não quero marmanjo dormindo em meu apartamento até tarde.

— Seis horas? Sério? Eu tenho que acordar seis horas? Me respeita, primo!
Eu fui dormir três horas da manhã trabalhando para você.

Caleb sempre foi um talento nato em qualquer coisa que envolvesse


computadores e programação, e me ajudava com alguns serviços
cibernéticos, mais especificamente a criação de aplicativos de avalição de
serviço.

Quando eu estava em Nova Iorque, pensei que o ajudaria dessa forma; no


entanto, agora vejo que Caleb deveria ter entrado em uma universidade há
séculos.

— Sobre isso: eu já decidi. Não vai mais trabalhar para mim, procure outro
emprego. Eu não quero você envolvido em meus negócios.

— O quê? Com que eu vou trabalhar?

— Há várias lanchonetes aí precisando de novos funcionários.

Ele pisca duas vezes, atônito, e, em seguida, resfolega.

— E mais uma coisa: se quiser ficar nesta casa, vai ter que estudar. Não
quero mais um programador sem diploma. Procure uma universidade. – Sou
enfático ao dizer.

Não passaria mais a mão na cabeça de adolescente indisciplinado.

***

Antes de ir a subir para o escritório da Hill no andar de cima da loja central,


dou uma volta pelos corredores vazios do supermercado, a fim de conferir se
estava tudo em ordem.

Enquanto passo pelos caixas já ocupados, Lia — a supervisora de estoque


— conversa com uma atendente novata. Tento ignorá-la, mas ela é mais
rápida em se colocar em minha frente.

A ruiva de olhos azuis me encara um tanto petulante e diz:


— Está me evitando, senhor gerente?! – ela arqueia uma sobrancelha.

Olho de soslaio os olhares curiosos dos demais funcionários. Pigarreio e


respondo com cautela, me arrependendo amargamente de ter trepado com a
supervisora no início da manhã de ontem.

Porra! Eu queria liberar a energia depois de Caleb me presentear com uma


noite de puro estresse. Ela deu corda, e eu não apenas deixei passar.

— Por que a evitaria?

Ele abre um sorriso e diz em seguida:

— Venha comigo! Tenho algumas planilhas para apresentar ao senhor. – Ela


agarra meu punho e me arrasta para o estacionamento, que faz caminho para
a entrada do escritório da Hill no andar de cima.

Ela larga minha mão e vai na frente, rebolando aquela bunda farta naquele
vestido branco transparente, deixando a amostra a marca da minúscula
calcinha preta fio dental.

Ela para em minha frente, quando pegamos uma distância considerável da


porta de entrada, e se vira com aquele tipo de olhar de mulher endiabrada,
então vou direto ao ponto:

— Não tem nenhuma planilha – suponho.

Ela meneia a cabeça em negativa fisgando os lábios de carmim, com os olhos


maliciosos me caçoando:

— Eu só queria dividir o sonho que tive com o senhor. Acordei cheia de


tesão, molhada e fervendo.

Inspiro fundo e explico tentando não lhe parecer grosso:

— Senhorita Lia, foi muito prazeroso trepar aquele dia com você, mas acho
que devamos parar por aqui... – sou interrompido pelo seu corpo, mãos e
lábios eufóricos, me envolvendo despudoramente em um beijo.

Em um ímpeto, desvencilho-me dela, ofegando em um tom mais rouco que o


normal:

— Desculpe, tenho uma puta lista de problemas para resolver ainda hoje, até
mais ver.

Aceno respeitosamente para a mulher atordoada, quando ela diz:

— Com o que eu posso ajudar? – Tais palavras não eram direcionadas a mim,
mas sim a alguém entre os carros ali. — A entrada do supermercado é do
outro lado... – informa Lia a mulher de cabelos castanhos, de olhos cor de
mel inconfundíveis.

Ela resvala o olhar da senhorita Lia para mim, e sussurra algo dando alguns
passos para trás.

— Perdão! Eu não queria atrapalhar – escuto Claire dizer, iniciando uma


fuga pelos corredores de carros.

— Acho que fomos pegos, — Lia murmura em tom de troça.

— Senhorita, você está de folga? – pergunto, um pouco apressado.

— Não. Por quê? Não estou aqui em sua frente?! – Ela indaga, confusa.

— Já que não está de folga, retome suas atividades. Com licença.

Abandono Lia ali, e saio em busca da Claire Sullivan, pelos corredores de


carros.

Corro por duas fileiras até avistá-la:

— Ei! Ei! – me aproximo dela e toco seu ombro direito.

Em um rompante, ela se vira, com a expressão facial denotando


constrangimento e dizendo:

— Perdão! Perdão mesmo, cara! Não tinha certeza de que era


comprometido...

— E eu não sou – respondo firmemente.

— Aquela mulher parecia muito...

— Aquela mulher é a supervisora do supermercado, — mesmo sem ter a


obrigação de explicar, digo.

— Se ela não é sua namorada, então... está tendo em um romance casual com
a supervisora – ela conclui, sem qualquer julgamento, porém, capturo um
resquício de decepção em sua voz

Penso rapidamente no motivo de ela estar aqui, e pondero que será melhor
dizer:

— Não é bem assim... Lia é uma mulher... sabe... – reluto em dizer.

— “Uma mulher...”!? – ela me incentiva a concluir.

— Persistente.

Ela pisca os olhos duas vezes, e, em seguida, leva a mão a boca:

— Ah, meu Deus! – ela exclama. – Ela está assediando você? – Ela pensa
um pouco mais e vai além: — Aqueles peitos em seu celular... naquele dia,
no avião... foi ela quem mandou?

Com o dorso da mão, coço ponta do nariz, pensando em algo mais próximo
do real.

— Assédio não é bem a palavra... Mas o caso é que não temos nada, e não
pretendo ter... – Desconverso: — Mas, você... O que trouxe você aqui?
Alguma notícia sobre a identidade dos delinquentes? Como anda o inquérito
na polícia? Veio sozinha?

Ela enfia as mãos nas calças jeans, erguendo os ombros relaxados e


responde:

— Estou acompanhada – ela olha para o lado e reconheço um dos seguranças


daquela casa à paisana. — Polícia? Não, definitivamente não vim aqui falar
disso... – observo ela morder o canto do lábio inferior, enquanto estudo
atentamente ela dizer: – Na verdade, eu vim saber da sua resposta. Você ficou
me devendo uma.

— Não.

— Não!? – Ela titubeia. – Como assim “não”? Tão rápido. – Ela solta o ar
pesadamente. – Você pensou direito?

— Não me parece inteligente entrar em um plano maluco a essa altura da


minha vida. – Engambelo, me dando um pouco de valor, apesar de eu ter
feito outras coisas bem mais reprováveis do que entrar em um casamento
falso. Eu só queria me livrar dela, sem poder explicar o verdadeiro motivo. –
Sinto muito, senhorita.

— Você não gostou da proposta? Eu posso rever as condições... aliás, você


sempre trabalha assim tão elegante? Bonito blazer –, ela tem aquele tipo de
sorriso de mulher audaciosa, tentando me fazer ponderar melhor minha
decisão.

Ignoro seus elogios e sou franco:

— Perdão, senhorita. É uma proposta realmente tentadora, eu pensei com


cuidado, e não me interessa participar disso. Sugiro que pense um pouco mais
sobre seu plano, pode ser perigoso para você. O mundo está cheio de gente
mal-intencionada—; inclusive, eu. — Se me der licença, tenho uma pilha de
autorizações para assinar. Bom dia! – Assinto, viro-me, me preparando para
retornar ao meu ofício.
— Eu só propus isso a você porque ninguém me parece mais confiável neste
momento. No entanto, se não quer fazer isso, eu acho que posso encontrar
outro alguém que esteja disposto – ela termina dizendo, com uma admirável
teimosia para tolices.

Por cima do ombro, profiro:

— Boa sorte!

Sem olhar novamente para trás, caminho até a escada no canto do


estacionamento, em que levava ao andar de cima.

Bato a porta do escritório e afundo-me no estofado da cadeira, ainda com


aquela mulher impregnada em minha mente. Não sabia o motivo exatamente,
mas algo me dizia que não seria uma péssima ideia aceitar. Mas a porra da
razão vinha, e eu abominava completamente a hipótese de aceitar casar com
aquela mulher maluca.

Quando torno a me concentrar nos papéis diante de mim, o celular vibra em


meu bolso; e quando vejo o nome da Madre Angelina, isso ganha meu dia,
genuinamente.

***

Sinto a água quente descer pelos meus músculos rígidos, e percebo que nem
um banho quente no fim do dia pode me relaxar.

Olho-me no espelho em frente, enquanto enrolo a toalha em minha cintura.


Encaro-me por alguns segundos, me perguntando o que exatamente tem me
perturbado. Desisto de pensar muito sobre, ponderando que o sabor
anestésico de um bom Whisky resolvesse o problema. Foi o que fiz: depois
do banho, coloquei um moletom e abri uma garrafa de Whisky na adega ao
lado da cozinha americana; enquanto Caleb preparava um lámen no fogão da
bancada.

Ding, dong!
Caleb se move atrás do fogão e eu digo:

— Não se preocupe, deixa que eu atendo.

Caminho para a sala, cortando caminho até a porta. Quem será uma hora
dessas? – Pergunto-me ao puxar a maçaneta de metal, e lá estava aquela
mulher. Na frente do meu apartamento, em cima de um salto alto, trajando
um vestido azul escuro, estilo empresarial. Em sua face havia um misto de
cansaço e desespero, e um olhar de quem estava disposta a tudo.

— Pensou que fugiria tão fácil de mim? – Ela arqueia uma sobrancelha, com
um ar de vitória, talvez por ter descoberto mais uma vez meu endereço. Aliás,
onde ela está conseguindo tantas informações sobre mim. Confesso que eu
estou surpreso com seu empenho. Antes de desferir qualquer palavra, ela
pede mandona: — Por favor, case-se comigo!
CAPÍTULO TREZE
Claire

Suas intensas íris esverdeadas ainda estão sobre mim, com a testa vincada e
os lábios franzidos. Suas roupas confortáveis só o deixavam ainda mais
másculo e com cara de turrão, aliada aos seus olhares não tão receptivos. Ele
parecia ser um homem difícil, não cederia tão fácil a minha proposta, o que
me confirmava mais ainda a ideia de que ele era a pessoa perfeita. Aliás,
depois do dia que tive hoje, é certo que eu não desistiria tão fácil assim.
— Devo lhe confessar que estou realmente surpreso. – Ele sorri sem vontade
e pergunta curioso: — Onde conseguiu meu endereço?
Dou um passo à frente, esperando que ele recuasse um pouco – mas não o faz
— e respondo com um meio sorriso no rosto:
— Google.
Resvalo meu corpo para o lado, entrando em seu apartamento e exclamo,
realmente impressionada:
— Nossa! Seu apartamento é realmente de muito bom gosto.
Para um gestor de supermercado, não esperava tanto luxo – e claro que eu
não iria verbalizar isso a ele.
— Conseguiu o endereço do meu trabalho lá também?
Sorrio, ainda observando cada detalhe da sala de estar;
— Não imagina como a internet pode ser útil... – reflito, escondendo um
pouco da verdade.
Na verdade, depois daquele fora que levei pela manhã, consegui arrancar seu
endereço com um office-boy de seu escritório.
Torno a fitá-lo. Ele desliza as mãos para os bolsos da calça de moletom e
pergunta mais uma vez:
— E o que te traz aqui?
Suspiro levemente, sorrindo.
— Você sabe o que me trouxe aqui.
Ele me olha, confuso; meneando a cabeça em negativa.
— Não, realmente não sei. Lembro-me de ter dado a resposta a senhorita hoje
pela manhã, e espero que eu tenha me feito claro. – Ele retira as mãos dos
bolsos e relaxa o corpo dizendo: — A não ser que a senhorita esteja
interessada em alguma coisa a mais.
Minhas bochechas queimam violentamente, enquanto flagro um sorriso
discreto naqueles lábios. Que safado! Parece se divertir com minha vergonha.
Decerto, fez isso de propósito. E é claro não deixarei barato.
— Essa coisa a mais quer dizer “você”? – indago, provocativa.
Seu olhar escure, e eu continuo, me aproximando daquele grandalhão,
dizendo cara a cara, num compasso de voz moroso, tão lento que chegava a
ser ridiculamente obsceno. Por fim, olho para sua boca com os olhos cheio de
desejo, escondendo o tremor dentro de mim por estar perto demais daquele
homem.
— Você e eu em um matrimônio daqui a uns dias.
Ele olha para minha boca como se minhas palavras estivessem reverberando
em um eco demorado. No entanto, dá um passo para trás e abre um sorriso
silencioso, me apontando e balançando o dedo em riste.
— Você é muito boa.
— PRIMO, QUEM ERA? – a voz estrangulada reverbera ali perto.
Olho para os lados, procurando pelo dono daquela voz.
— É o seu primo? Caleb? – pergunto a Phill, que assente em positiva. –
Como ele está? Como está sendo a recuperação do braço... – institivamente
viro meu corpo; e Phill se coloca em minha frente rapidamente, falando em
uma oitava mais alta:
— CLAIRE SULLIVAN ESTÁ AQUI, CALEB! – aquilo soa estranho, como
ele estivesse decodificando outra mensagem além daquelas palavras.
— Cavalo selado?! – escuto a voz um pouco mais baixa.
— Ele falou “cavalo selado”? – Sorrio. – Vocês têm um cavalo aqui? –
pergunto, confusa; me divertindo com aquilo. É claro que não deveriam ter;
ou têm?!
Phill parece inquieto; e quando vejo alguém se aproximar da sala, sou
surpreendida por um abrupto avançar de corpo até o limite da sala. Por
instante, reconheço o rosto familiar do garoto daquela noite e, ao mesmo
tempo, meu coração gela com a brutalidade com que Phill o chuta para fora
da sala. Tudo acontece muito rápido. Tão rápido que meu cérebro demora a
processar o que exatamente houve ali.
— AIII! SEU FILHO DA PUTA! VOCÊ ESTÁ LOUCO? – escuto o garoto
gritar, gemendo.
Phill está com o peito subindo e descendo em um ritmo frenético, enquanto
não tira os olhos de mim. Quando meu cérebro volta funcionar, esbravejo:
— Ah, meu deus! Ele está machucado, seu idiota! – digo avançando, e sou
parada pelo corpo em minha frente.
— Ele está bem! – Phill ofega.
— Não, ele não está. – Digo desviando de seu corpo, no entanto, sua mão
segura meu braço, me trazendo de volta à sua frente.
— Ele está nu. Não pode ir até lá...
— Nu?
Ele dá de ombros e responde grosso:
— É um costume nosso: andar nu em casa.
— Você está mentindo... vi que ele está usando uma camisa vermelha... –
retruco, apesar de eu ter capturado apenas isso.
— Ele está sem calças. CALEB, DIGA A ELA QUE ESTÁ BEM!
— Estou ótimo! Uma maravilha! — Ouço a voz dizer ironicamente.
Torno a olhar o homem de péssimo humor em minha frente e ele indaga:
— Satisfeita? – Não esperando por minha responda, ele apenas rosna: — Vá
embora!
— Não – retruco, sem um pingo de medo de cara feia.
— O que quer mais para tirar os pés da minha casa?
— Você! Como meu noivo e novo presidente executivo da Sullivan.
Ele bufa, pousando as mãos na cintura.
— Você não tem jeito mesmo – ele murmura se aproximando mais ainda e
curvando um pouco para envolver minhas pernas com seus enormes braços.
— O que está fazendo? – Pergunto e dou um grito quando meu corpo é
elevado ao seu ombro, de modo tão rápido e fácil como se fosse o corpo de
uma criança.
— Retirando uma intrusa do meu apartamento! – Ele diz sacolejando meu
corpo em seu ombro.
— Está bem! Está bem! Eu saio. – Rendo-me.
Sinto ele estancar os passos, ponderar um pouco a veracidade de minhas
palavras e suas mãos libertarem meus membros inferiores. Antes que ele me
ponha no chão, deslizo minhas pernas pelo seu corpo e as enlaço em sua
cintura, apertando-as bem forte ali, fazendo com que meu vestido se
encolhesse consideravelmente.
Estamos frente a frente quando envolvo seu pescoço com os braços enquanto
ele parece fugir de meus olhares efusivos. No entanto, ele diz:
— Estou começando a achar mesmo que a senhorita está interessada em algo
mais.
Sorrio ao vê-lo sem jeito, e, droga, ele fica terrivelmente lindo desse jeito.
— Quero muito, você. – Ele torna a me encarar, apertando os lábios e,
lentamente, estuda meus olhos, nariz e boca com aquele intenso verde em seu
olhar que pareciam perfurar minha pele. Uma atmosfera diferente nos
envolve, e agora é a minha vez de ficar sem jeito. Pigarreio e continuo: — Dê
suas condições, eu acato todas elas!
— Você não vai desistir mesmo, não é?
— Pouco provável – respondo firme.
Seus dedos longínquos desvencilham minhas mãos e pernas de seu corpo;
enquanto desço minhas saia abarrotada, ele diz:
— Por que não encontrar alguém que você goste de verdade?
Automaticamente, me lembro dos meus relacionamentos fracassados e penso
no quanto isso é difícil. Sorrio ao dizer:
— Sim... por que não? no entanto, não seria o mesmo... eles não são tão
qualificados quanto você. Minha avó não iria entregar a direção da empresa
para qualquer um... mas você! – digo lembrando da noite retrasada. – Os
olhos dela até brilharam. – Inspiro fundo e completo, na tentativa de não
inflar mais o ego dele: — No entanto, se não aceitar, eu procuro outro.
Ele cruza os braços contra aquele peitoral forte e malhado, e caçoa:
— Você a mesma coisa pela manhã. Por que ainda não foi atrás de outro?
Gaguejo:
— Não tive tempo.
Ele ri olhando para o lado e respira fundo, parecendo pensar.
— Amanhã você estará no escritório da empresa de sua família?! – pergunta,
pensativo.
Por que ele estar perguntando?... Ah! Céus! Ele está aceitando?!
— Sim, vou estar lá o dia todo. – Respondo controlando a voz para não
surtar.
— Ótimo, amanhã te pego para um almoço – ele desliza as mãos para os
bolsos. – Ok?
Disfarço a explosão de alegria misturada com vitória dentro de mim e
respondo contida:
— Ok!
CAPÍTULO QUATORZE
Claire
Olho para o celular pela enésima vez e... nada. Que safado! – Resmungo
mentalmente enquanto minha avó e eu somos servidas pelo garçom ao lado,
me sentindo completamente enganada por aquele bonitão de olhos verdes.
Ele estava mentindo quando aceitou minha proposta? Por que ele não me
responde?!Ahh, se ele achar que vai conseguir me enganar desse jeito...
— Algum problema, Claire? – Minha avó indaga na cadeira a frente, no
restaurante da empresa do terraço do prédio.
— Nada, vó! – forço um sorriso, dando um gole da água na taça de cristal.
— Você disse não iria ficar para o almoço, mas até agora... – ela comenta,
mexendo pela primeira vez no prato, interessada no assunto. – O que houve?
— A pessoa com quem eu iria almoçar hoje até agora não deu as caras –
digo, sincera, e abandono o celular no canto da mesa, desgostosa.
— Posso saber quem era a pessoa com quem ia se encontrar? Uma amiga? –
minha avó pergunta, avaliativa; talvez desconfiando de algo. Ela sempre foi
muito controladora, no entanto, quando se tratava de minha vida amorosa, ela
costumava ter mais cautela e não interferir, pois sempre soube que eu não
tinha sorte neste quesito.
Ela me deixava até mais à vontade com isso, talvez com receio que me
atrapalhasse.
Ao abrir a boca para responder, paraliso no mesmo instante quando olho por
cima de seu ombro a imagem do deus grego de óculos Ray-ban Aviator. Ele
veste uma camisa social branca sem gravata e continua caminhando pelo
corredor de mesas por ali, em nossa direção. É ele, Phill; chamando a atenção
de alguns olhares femininos curiosos das mesas ao lado.
Ele para ao lado de nossa mesa, tirando aqueles óculos de sol de playboy
metido e me compenetra com o olhar. Vejo minha avó esgueirar o olhar para
o lado e percebê-lo ali.
— Oh! Phill?! – minha avó titubeia, limpando o canto da boca com o
guardanapo de tecido. – Meu querido, o que está fazendo aqui?
Ele demora um pouco a responder e o faz olhando nos olhos de vovó:
— Perdão, senhora Sullivan. Que deselegância a minha. Boa tarde. Eu vim
buscar Claire para almoçarmos.
Neste momento, sou mirada pelos olhos reluzentes da senhora em minha
frente, que diz baixinho:
— Sabia que tinha caroço neste angu – ele sorriu, se divertindo. – Sente-se,
querido! Sente-se!
Phill me fita por um momento e o faz, ocupando a cadeira ao meu lado,
alisando aquelas pernas de jogador de vôlei por cima do tecido fino da calça
social. Olho ao redor e percebo que nossa mesa recebe mais olhares que o
normal, principalmente das mulheres do escritório. A essa altura eu já deveria
saber que Phill que era um homem que deve provocar muitos pensamentos
libidinosos por onde passa, apenas não sabia que isso poderia ser tão intenso
em tantas outras mulheres.
— Por que não me atendeu? Eu iria descer... – pergunto baixinho a ele.
— Você me disse ontem que faz companhia a sua avó durante o almoço,
pensei que não seria educado deixá-la sem companhia; então vim convidá-la
também – ele responde, fazendo minha avó abrir um sorriso largo.
— Quanta educação, querido!... mas eu não tenho tempo para sair desse
prédio – ela chama um garçom e pede: — Por favor, traga mais um prato para
nosso convidado.
Minha avó nos encara de forma curiosa e constrangedora, com os olhos
brilhando mais que um diamante contra a luz, unindo as mãos e embrenhando
os dedos uns nos outros.
— Almoçando juntos? Uau, suponho que estão cada vez mais próximos...
Meneio a cabeça em positiva, engolindo em seco. Na verdade, eu não estava
preparada psicologicamente para isso. Bem que ele poderia ter me avisado.
— Vocês estão namorando?; “Ficando”, como vocês jovens dizem; ou apenas
se pegando? – ela é tão direta quanto um campo minado, me fazendo quase
engasgar com saliva. A idade estava cada vez mais aguçando esse lado dela.
— Vó, por favor – digo entre uma tosse e outra.
De repente, sinto a mão cálida de Phill tocar minha perna, no pedaço de pele
em que não é alcançado pelo vestido bege, e sinto meu corpo estremecer o
simples contato. Ele acaricia ali e diz com a voz sedosa:
— Ainda não intitulamos o que temos, senhora. No entanto, sinto que estou
vivendo um dos melhores momentos da minha vida; e isso se deve a sua neta
– ele completa a última frase me fitando de forma tão profunda, que quase
acredito naquelas palavras infundadas e me apaixono ali mesmo. Que safado!
A Broadway definitivamente está perdendo um ator.
Ele torna a atenção para frente.
— Eu fico muito feliz em saber que minha neta está conhecendo um rapaz
como você. Estou realmente... maravilhada! – a senhora Sullivan diz,
radiante. Mal disfarçava a felicidade nos olhos de uma avó que nunca viu a
vida amorosa da neta alçar voos maiores que três meses.
— Desse jeito Phill irá pensar que sou uma encalhada – digo bebericando
novamente água em minha frente.
— Ah, não! Claro que não, querido. Não pense isso – Ela diz sorridente e
confidencia baixinho ao homem ao meu lado: — Ela só não teve muita sorte
com rapazes, uns molecotes da universidade que não souberam valorizar a
joia rara que é minha neta.
— Vó, por favor! – Aperto os olhos e lembrando por um momento do
passado recente, quando sou surpreendida pelas palavras de Phill:
— Tudo bem. Eu também não tenho um passado amoroso muito sucedido.
Sorrio e comento de soslaio:
— Duvido muito.
— Não duvide. – Ele pigarreia e complementa: — Foi muito doloroso ter que
ver a primeira namorada terminando e assumindo um relacionamento no dia
seguinte com um amigo próximo.
Isso é uma mentira – penso ao virar meu rosto e encarar sua postura e feição
endurecida. Isso é realmente verdade?
— Que babacas! – sussurro.
— Sinto muito, querido! – vovó diz, enternecida.
Ele inspira fundo e diz espantando o clima ruim:
— Nada! Isto já foi superado há muito tempo. Aliás, já que estamos aqui... na
frente de sua avó – ele se vira na cadeira para me fitar com os olhos
semicerrados -, seria o momento ideal para fazer isso.
Ele pega minha mão esquerda, beijando-a como um cavalheiro e diz:
— Claire Sullivan, você aceita continuar partilhando de bons momentos
como minha namorada?
Mordo o lábio inferior involuntariamente; enquanto vejo de esguelha minha
avó assistir aquilo quase aceitando o pedido por mim.
— Eu aceito.
— É claro que ela aceita. – vovó murmura com um sorriso de orelha a orelha,
abrindo os braços e arrancando um pequeno de Phill.

***
— Querido, fique! Será uma honra tê-lo conosco esta tarde – vovó diz. –
Posso lhe apresentar a empresa...
— Eu adoraria, mas não posso ficar. O trabalho me espera – ele responde
enquanto caminhamos em direção aos elevadores. – Talvez, se surgir outra
oportunidade.
— Tudo bem. Na verdade, seria uma honra ter um profissional qualificado
como você trabalhando para Sullivan – ela continua, então Phill e eu nos
entreolhamos discretamente. Eu sabia de seu encantamento profissional por
ele, o que tornava meu plano ainda mais perfeito. – Se precisar de um
emprego, não hesite em me procurar.
— Claro! Muito obrigado, senhora.
As portas do elevador se abrem e minha avó adentra o espaço a nossa frente;
enquanto permaneço ao lado de Phill.
— Claire, não vem comigo? – ela pergunta.
— Ainda não, vó. Não se preocupe, em um minuto eu subo.
Ela abre um sorriso sapeca e assente, se despedindo de Phill, e exclamando
baixinho enquanto as portas se fecham: — “jovens! ”. Espero as portas se
fecharem por completo para me pôr na frente do senhor bonitão:
— Já está tudo encaminhado.
— Tenho que concordar que seu plano não vai ser tão difícil de se executar;
mas ainda continua sendo perigoso.
Rolo os olhos nas órbitas e pergunto:
— Quer dizer que ainda não aceitou.
— Se não tivesse aceitado, não pediria sua mão em namoro na frente de sua
avó minutos atrás. Quando digo “perigoso”, refiro-me a várias coisas. Aliás,
temos que estabelecer as cláusulas do nosso contrato. Acredito que queira
formalizar isso.
— Então o bonitão aceitou? –
Ele assente, levo a mão ao peito que expira aliviado, sorrindo em me
imaginar longe daquele prédio por um bom tempo.
– Desculpe-me, é que eu estou tão feliz! — Eu mal pus os pés nesta empresa
e já vivia pensando no dia que sairia correndo dali livre, leve e solta. Pelo
menos, por um tempo. – Conheço um advogado que pode formalizar
discretamente.
— Ok, hoje à noite busco a senhorita em sua casa para acertamos e
estabelecermos as cláusulas, vedações e condições.
— Poderia ser sem normas – brinco, apesar de ter ciência de que aquilo
necessitava de um contrato, sinto que adoro provocá-lo.
Entretanto, Phill dá um passo em minha direção, puxa meu corpo pela cintura
e sela nossos lábios em beijo rápido, tão rápido que mal deu para processar o
que aconteceu, apenas sentir a textura do toque dos seus lábios reverberando
nos meus. E para completar, ele sussurra em meu ouvido, naquele tom rouco
que voz que me deixava quente dentro do vestido:
— Sem normas, eu poderia fazer o que eu bem entendesse, não?
Ele se afasta um pouco com seu olhar de molhar calcinha, estudando meu
rosto que deve estar no núcleo da terra a uma hora dessas.
— Regra número: não me provoque, eu sempre irei reagir.
As portas do elevador se abrem mais uma vez atrás de mim e ele diz antes de
adentrá-lo:
— Eu tenho que ir, estou atrasado. Até mais tarde.
Ele me deixa ali, depois de me atiçar e me beijar sem aviso prévio. E não
nego que eu estou cada vez mais animada com a ideia de casar com aquele
pedaço de mal caminho, mesmo que se trate de um casamento forjado. Eu sei
que não devo misturar as coisas, no entanto, para mim era quase impossível
não misturar quando estou em sua frente, tendo incessantes pensamentos
pecaminosos com nós dois quentes e suados. Se aquela era sua reação, então
acho que não será uma má investir mais pesado em minhas provocações.
CAPÍTULO QUINZE
Claire
— Senhorita Claire, há um rapaz lhe esperando na sala! – Liz aparece na
porta do meu quarto, enquanto encaixo o segundo brinco de pérola na orelha.
— Avise que estou indo, Liz! – Amarro meu cabelo em rabo de cavalo
frouxo, borrifo um pouco de perfume no pescoço, coloco meus tênis brancos
e pego o bloco de notas em cima da cama, indo ao encontro do meu futuro
marido, que mais parecia ser um primo distante daquele ator, Henry Cavill.
Quando chego à sala, para minha surpresa, Phill não está sozinho. Minha avó,
que normalmente já deveria estar na cama, parecia ter entrado naqueles tipos
de conversas para lá de demoradas e tive que esperá-los educadamente
sentada no braço do sofá, enquanto os observava.
Phill, como sempre, está arrebatadoramente gato e elegante, em uma t-shirt
que deixa seus bíceps malhados em evidência, me fazendo umedecer os
lábios instintivamente.
A forma como ele prestava atenção em cada palavra de minha avó, deixava-o
ainda mais sexy; com um ar mais maduro e experiente. E claro, minha avó
estava amando poder contar um pouco dos fins de semana que passávamos na
fazenda de nossa família nos arredores de Nashville, e parece decidida
convencê-lo a passar o próximo fim de semana com a gente.
Ela está tão empolgada, que de repente me sinto culpada por isto não ser real.
No entanto, ao mesmo tempo, sinto que eu não posso mais voltar atrás. Eu já
estava decidida. Se aquele homem me acompanhar em meu plano maluco,
estaremos casados dentro de algumas semanas.
Depois de um bom tempo de conversa, reivindico Phill a minha avó, que tem
dificuldade em liberá-lo, mas o faz com uma alegria descomunal em me ver
saindo com aquele que seria, segundo os critérios dela, um partidão.
— Desculpe pela minha avó, ela parece ter gostado muito de você – disse
enquanto saíamos para o jardim e caminhávamos em direção ao Porsche
prata estacionado ao lado da mureta de flores.
— Gosto muito da conversa dela também – ele diz com um meio sorriso no
rosto; educado, nada mais que isso.
Entramos em seu carro, e ele completa:
— Já que seremos marido e mulher, é melhor que eu me dê muito bem com
sua avó. – Ele dá partida logo em seguida, enquanto tentava assimilar aquelas
palavras saindo entre os lábios daquele homem: marido e mulher. Soava
muito bem em sua boca.
— Vamos a sua casa? – pergunto, curiosa.
Ele me olha de soslaio, e responde inexpressível:
— Não. Pensei em algo melhor.
Diferente de alguns minutos atrás, ele estranhamente não parece mais tão
receptível a conversas. Ele não é grosseiro, porém algo me diz que devo
deixar o colóquio para depois, para quando ele parar o veículo novamente.
Seguimos taciturnos por um bom tempo, enquanto percorríamos pela avenida
principal de Downtown.
Tudo parecia estar dentro do normal, até ele pegar uma estrada de chão
desconhecida, fazendo com que eu e ele sacolejássemos dentro do carro
trepidante no caminho de pedras. Definitivamente, esse carro não foi feito
para este tipo de estrada.
— Onde estamos indo? – pergunto mais uma vez, porém não recebo resposta.
Agora, sim, isto foi grosseiro! – Onde está me levando? – insisto mais uma
vez, mais incisiva.
— Se vai ser minha mulher, tem que confiar em mim! – ele diz com a voz
mais rouca que o normal.
Apesar de confiar nele, eu estou começando a achar estranho o breu naquela
estrada, em que a única fonte de luz advém dos faróis do porsche de Phill.
Neste instante, devido a trepidação, bato a cabeça no vidro do carro; e
resmungo alto, já perdendo a paciência.
— Se vai ser meu homem, eu acho bom você me dizer para que tipo de
buraco está me levando.
Ele me ignora totalmente e continua a dirigir por mais um longo pedaço de
buraqueira, enquanto tento me segurar para não bater a têmpora no vidro
novamente. Antes que eu pudesse resmungar mais uma vez, o carro se
estabiliza em uma estrada de areia mais fina e estaciona em frente ao que
parecia ser um enorme barranco.
Recupero-me daquela sessão de treme-treme e vejo com mais atenção as
luzes adiante.
Noto que estamos em cima de um morro com visão de toda a cidade lá
embaixo e... Puta merda! – resfolego, deixando escapar: – Isto é... muito
lindo! — Nem a visão do último andar do prédio da Sullivan proporcionava a
vista que estou tendo neste momento. O horizonte de luzes acesas (umas
constantes, outras bruxuleantes) parecia ser a coisa mais fascinante que já vi
em toda minha vida. Desde pequena, nutro um amor por essa cidade, onde
tenho as melhores lembranças de minha vida, e vê-la ali de cima, estava me
deixando um pouco emotiva, devido ao longo período que passei distante
daqui.
Resvalo meus dedos para a porta ao lado e antes que pudesse abri-la, ao meu
lado, Phill trava o carro, não me deixando sair. Desvio o olhar para ele, que
se mantém inexpressível quando diz:
— Ficaremos mais confortáveis aqui dentro!
Ele vira e espicha o corpo para pegar algo no banco de trás. Ele traz um
notebook para o seu colo e o abre, ligando e direcionando o sistema para o
Word. Escondo meu bloco de notas no canto do banco do carona, enquanto
ele diz:
— Vamos ao contrato! – era para eu estar fazendo aquilo, no entanto, ele
parecia tão proativo, que deixei ele tomar as rédeas.
— Ok.
Ele coça a ponta do nariz e vejo seus olhos fitaram os meus pela primeira vez
na noite.
— Há alguma particularidade específica que queira contemplar além das você
explicitou nas últimas vezes em que nos falamos?
Confesso que quando estava me arrumando horas atrás, não pensei que este
encontro seria tão formal. Entretanto, aquele homem pareceu incorporar um
daqueles caras das reuniões da Sullivan, tecnicista e pouco flexível. E
pensando bem, acho ótimo que ele seja tão responsável, já que irei
praticamente confiar o império de minha avó a ele.
— Além do casamento e de sua disponibilidade para assumir a presidência,
não tenho nada a acrescentar. E você?! Há alguma ressalva além do que foi
discutido?
Ele abre um sorriso de canto de boca e responde seriamente, enquanto
inevitavelmente desvio o olhar para seu braço e peitoral másculo, e minha
nossa senhora! Que homem!
— Sim. Algumas.
Torno ao olhar seus olhos e ele começa a ditar vários detalhes referentes a
gestão da empresa. Basicamente, ele queria que eu o deixasse livre para fazer
“sua gestão”, sem minha intromissão durante os seis meses. Dou minha
palavra de que não o farei, no entanto, não posso garantir isso por parte de
minha avó. Ele compreende bem e diz que pode alinhar seus pensamentos de
acordo com os dela.
Ao passo que acertávamos as cláusulas, ele ia digitando e materializando o
que seria o contrato de nosso matrimônio. Tudo ia bem até chegarmos a
cláusula 7.
— Vamos a cláusula sete: não quero que se intrometa em minha vida
particular. Isso incluir visitar meu apartamento.
Fico um pouco embasbacada e argumento:
— Não entendi. Como assim “não visitar seu apartamento”?! Nós iremos
casar... É natural que...
— Eu tenho um sobrinho, Caleb. Ele continuará morando lá...
— Não espero que me leve para morar com vocês. Eu já tenho um imóvel de
minha família em mente que podemos nos mudar, só achei estranho tratar o
apartamento como “seu apartamento”. Soou como se quisesse levar uma vida
dupla.
— Soou? – ele pergunta, em tom de curiosidade.
— Sim, soou.
— A senhorita vê algum problema nisso?
Sorrio, desdenhando:
— Você não vê?
— Não, não vejo – ele parece acreditar firmemente.
— Então quer dizer que podemos levar vidas duplas durante esses seis
meses? Podemos sair com quem quisermos?
Ele olha para o lado, fechando os olhos.
— Como um ator, eu espero que você mergulhe profundamente no papel de
meu marido nesses seis meses.
— Você quer dizer “passar seis meses sem foder”?
Ele pergunta de forma chula, no entanto, aquela palavra acabou saindo tão
natural da boca daquele homem, que o deixou absurdamente mais sexy,
imaginado qual seria o significado de fazer isso com ele.
— Sim. Sem sexo, é o que eu espero.
Ele abre um sorriso largo, um tanto debochado.
— Desculpe, eu não sou tão bom ator. – Ele me fita com aquele olhar de que
sua liberdade não estava disponível a negociação. – O que posso fazer em
relação a isso é ser discreto.
Ajeito-me no banco, alinhando os joelhos para frente e pensando um pouco.
Por que eu estou tão relutante em relação a isso? Phill não irá ser meu
marido de verdade, não posso simplesmente obrigá-lo a se tornar um monge
por seis meses. Desde que ele ocupe meu lugar na presidência, o contrato
ainda me parecia vantajoso.
— Ok! – Aquiesço. – Você tem mais alguma cláusula? – torno a inclinar meu
corpo em sua direção.
— Não.
— Ótimo. – Em um rompante, espicho meu tronco para cima dele, a procura
do dispositivo que trava as portas enquanto peço: — Me envie este arquivo
por mensagem. Pedirei ao Dr. Gilbert para que redija o contrato. – Corro com
os olhos sobre o painel do motorista, e penso alto: — Onde fica mesmo o
botão?
— Aqui! – ele passa o braço na brecha entre o flanco dos meus seios e suas
pernas, pressionando um botão na lateral do volante. Escuto o click, que
indicava as portas abertas.
Viro meu rosto em direção ao dele, provocativa, e sussurro a centímetros da
sua boca: — Obrigada!
Lanço-me para fora de seu carro, deixando Phill para trás, sendo guinada por
uma eletricidade lasciva. Bato a porta e encaro a escuridão do lado de fora,
sentindo o vento vir de encontro com a quentura do meu corpo.
Caminho pela areia fina até a frente do porsche prata, onde dava de ter uma
visão melhor da cidade lá embaixo. E poxa, perco mais uma vez o ar com
aquele espetáculo de vista.
Esfrego os braços com as pontas dos dedos devido a brisa forte que chegava a
arrepiar minha pele. E, de repente, os faróis atrás de mim se acendem, me
aquecendo um pouco com a luz cálida. Olho para trás, por instante,
afundando as mãos nos bolsos da calça jeans.
Devido à forte claridade, não é possível ver por trás do vidro, mas posso
imaginar seu olhar verde intenso me compenetrando, e aquilo me aquece um
pouco mais.

Confesso que o humor austero de Phill e sua seriedade me deixam mais à


vontade para cometer a loucura que eu estou prestes a cometer: me casar com
alguém sem amor. Ele deve pensar que sou uma desmiolada, uma patricinha
fútil e caprichosa que quer fugir a todo custo de seus deveres. E talvez, é
melhor que ele acredite nisso mesmo. Eu também quero acreditar nisso.
Crescer me dedicando aos planos de minha avó tem para mim, de certa
forma, fez com que ao longo dos anos eu me sentisse coadjuvante de minha
própria vida. Eu só quero viver, ser livre para fazer o que quiser, sem pressão
de estar sob o jugo de uma obrigação familiar.
CAPÍTULO DEZESSEIS
Dias depois...
Claire

Céus! Qual é a dificuldade desse homem em responder minhas mensagens?!


Pego o celular pela enésima vez e nem sinal de vida daquele homem.
— Definitivamente, Claire se tornou uma bela mulher! – elogiou Margareth
Snow, esposa de Bille, um dos amigos íntimos e parceiro comercial de minha
avó que passava os fins de semana na fazenda de nossa família.
Enquanto eu torrava no sol na espreguiçadeira na beira da piscina, escutava
as senhoras que papeavam, se refrescando com Chandon gelado.
É perceptível como minha avó não gosta de Margareth, cuja a conversa é um
verdadeiro purgante. Com o discurso velado, sua maior fonte de divertimento
é falar de como a vida dos colegas da alta sociedade de Nashville iam de mal
a pior.
Com toda certeza, vovó só a aguentava pois é amiga de Billie bem antes deles
se casarem; que, aliás, é um doce de pessoa, que faz companhia ao meu avô
no terraço do casarão atrás, de onde irrompe a música alta que nos envolve,
um country antigo.
Depois de eu receber o elogio da cobra ruiva traiçoeira, ela dá outro gole da
bebida e completa, sorrindo:
— Infelizmente só perde para minha doce Morgana – ela se referia à sua filha
à mesa, a garota de 20 anos de pele pálida e cabelos avermelhados como os
da mãe.
— Ela é realmente linda – vovó elogia, tocando ternamente o braço da garota
que também tem o mesmo ar de superioridade da mãe.
— Vocês acreditam há uma pilha de garotos correndo atrás dela? – Margareth
comenta.
— Acredito – Vovó diz, sorrindo.
— Para, mãe! Assim a senhora me deixa sem jeito. – Abaixo um pouco os
óculos para ver Morgana balançando a mão no ar, nem um pouco sem jeito.
— E Claire? Quando vai casar? – Margareth inicia a sessão de perguntas
indiscretas, e torno a empurra meus óculos de sol contra o rosto, fingindo não
estar ali.
— Se minha neta tiver sorte; logo, logo Margareth! – Vovó responde.
— Já tem um namorado então? – a cobra ruiva parece se interessar no
assunto.
— Sim, Claire engatou um namoro recentemente – Vovó enche a boca para
dizer, e sorrio discretamente com sua felicidade. – Ele provavelmente se
juntará a nós hoje, aliás, já era para ele ter chegado. Claire, você já... –
quando minha avó ia me chamar para a conversa, ela estanca e exclama: —
Ah! Ali está ele.
Deito minha cabeça para o lado e abaixo os óculos de sol, até o meio do
nariz, semicerrando os olhos para o homem bronzeado de óculos escuros e
camisa florida que desfilava em nossa direção. Ele estava uma mistura de bad
boy da cidade com bon-vivant praiano; que mais parecia estar adequado para
qualquer tipo de evento, menos para uma fazenda nos arredores de
Nashville.
— Senhoritas! – A imagem de bad boy se esvai pelo ralo quando ele
cumprimenta as mulheres ali, com sua voz rouca séria e extremamente cortês.
Margareth desce lentamente taça de champanhe para a mesa, lambendo toda a
extensão do rosto e do corpo de Phill, e pergunta pausadamente:
— Este é o namorado de Claire?
— Ele mesmo, Margareth. Meu futuro genro, Phill. – Vovó profetiza. – Phill,
essa é Margareth e sua filha, Morgana.
— Prazer em conhecê-la, senhora... – ele desliza o olhar para Morgana e
completa, respeitosamente — ... e senhorita.
Margareth não para de piscar e acaba soltando, parecendo encantada com o
bronzeado de Phill:
— Onde foi que vocês arranjaram um homem como esse?!
Levanto e coloco-me ao seu lado, de biquíni mesmo, dispensando o roupão
pendido na cadeira ao lado.
— Oi! – Cumprimento-o; e, meio desajeitados, nos aproximamos.
Com a intenção de beijar sua bochecha, ele inclina um pouco o rosto,
pousando a mão em minha lombar desnuda, e acabo encontrando seus lábios
em um beijo molhado e rápido.
Viro-me e anuncio formalmente minha saída, sob os olhares curiosos de
Margareth Snow e sua filha:
— Peço licença a vocês, meninas. É a primeira de Phill aqui, sabem como é
que é: vou ter que apresentá-lo a fazenda.
— Claro, querida. Fique à vontade para mostrar a fazenda a seu namorado –
vovó diz enfatizando a palavra “namorado” de forma empolgada, de modo
que me seguro para não rir.
Giro os calcanhares para trás e caminho lentamente a beira da piscina com
Phill ao meu lado.
— Por que demorou? – Murmuro.
— Problemas em casa.
— Aconteceu algo com Caleb?
— Não. – Ele é sucinto ao me responder.
— Onde foi que conseguiu esse bronzeado?
— Dirigi até aqui com a capota recolhida. Pensei que assim estaria mais
adequado ao ambiente... – O que faz sentindo já que a última vez que o vi,
sua pele estava mais alva que a de um Cullen.
— Com essa camisa floral? – Sorrio.
— Perdão. Apesar de residir em Nashville, sou mais adepto às praias
californianas.
— Então é lá onde passa suas férias? Na Califórnia? Soube que as garotas de
lá são quentes...
Ele desvia de minhas perguntas informais e diz calculista:
– Precisamos começar a pôr em prática seu plano.
— Não estamos o colocando em prática? – Indago, confusa. – Você está aqui
comigo como meu namorado, não?
Ele estanca os passos, para, me olha, sussurra ombro a ombro:
— Acha mesmo que sua avó irá cair nesse papo de casamento repentino sem
um bom roteiro?
— Roteiro? Olha só, não foi você quem disse que não era um bom ator e já
até falando de roteiro? – não perco a oportunidade de provocá-lo.
Em um ímpeto, sua mão espalma o meio de minhas costas e quase tenho uma
síncope quando ele a desliza para o limite entre minha pele e a calcinha do
meu biquíni.
— Naturalmente, ninguém se casa de repente sem estar louco de amor. – Ele
sussurra ao meu ouvido, arrastando aquela voz rouca: – Se quer que as coisas
aconteçam rápido, é melhor passarmos paixão ao público. — Discretamente,
olho por cima do ombro e vejo os olhares atentos do outro lado da piscina.
Com toda sua magnitude e virilidade, ele vira meu corpo e beija canto da
minha boca, de forma morosa que faz meu corpo inteiro entrar em estado de
combustão em poucos segundos.
Ele espalha alguns beijos por minha bochecha, têmporas e queixo, de modo
tão romântico que quase acredito por um instante que aquele homem está
verdadeiramente interessado em mim. Ele embala nossos corpos lentamente
no ritmo da música antiga que vinha do casarão e permanecemos assim por
um momento, ao som de It’s a heartache – uma do disco favorito do meu avô
da cantora galesa Bonnie Tyler.
De repente, me empolgo e começo a dar ritmo ao meu corpo também. Não
sei exatamente em que momento, mas quando Phill decide ousar um pouco
mais e pegar minha mão para girar meu corpo para frente, ridiculamente caio
na piscina, e uma explosão de água, bolhas de ar em polvorosa e zunidos se
faz.
Tão logo, depois do susto, elevo minha cabeça a superfície, com o coração
desregulado.
Ele permanecia inerte ao pé da piscina, com as mãos pousadas na cintura, me
observando assim como minha avó e companhia embaixo do ombrelone de
madeira.
— Como está a água, Claire? – ele pergunta, sério, no entanto, o canto
risonho de sua boca parecia se divertir com minha vergonha.
— Que cretino! Isso foi de propósito – resmungo, baixinho. Sacudo a cabeça,
ajeitando a postura e respondo em uma oitava mais alta: — Está ótima! Que
tal vir aqui conferir por você mesmo?
Ele abre um meio sorriso, olhando para o lado e depois me fita aquele tipo de
olhar que encarou aquilo como um desafio.
Quase não acredito quando ele começa a desabotoar a camisa florida, se
livrando dos sapatos. Ai meu pai! Ele não está fazendo isso... Ou está? Ele
passa a calça pelas pernas e fica apenas de sunga, e, de repente, parece que
estou em um daqueles programas de televisão com homens bonitões e
malhados pulando em câmera lenta na piscina. Oh, céus! Se meu rosto não
tivesse com o rosto molhado, a baba escorrendo no canto da minha boca com
certeza estaria visível.
Ele nada em minha direção, se levantando exatamente em minha frente, com
todos aqueles braços enormes, abdômen e pernas malhadas, me fitando com
tamanha intensidade, que estremeço por dentro, repuxando o lábio inferior.
Sem aviso prévio, aquele homem passa a mão em minhas coxas embaixo
d’água e, em um ímpeto, me ergue em seu colo e toma meus lábios em um
beijo lento e quente.
Tudo acontece tão rápido, que mal dá tempo de meu cérebro processar o que
exatamente está acontecendo, principalmente quando sua língua invade
minha boca sem nenhum pudor e em seguida chupa meu lábio inferior com
ardor, enquanto sinto todos os seus contornos encaixados nos meus. Ele
mordisca meu lábio e gemo vergonhosamente, enquanto ele parecia estar
disposto a nos levar para o lado oposto da piscina e me imprensar contra a
parede, intensificando o ritmo, me fazendo arfar. Em dado momento, ele
separa nos rostos e me encara resfolegando e sussurrando:
— Como está nosso público?
Tento recobrar o oxigênio em meu cérebro e olho por cima do seu ombro,
com a respiração cansada também, vendo Margareth se abanando, minha avó
observando atentamente, já com os óculos de grau encaixados no rosto.
— Animadas – respondo, tornando a encarar o homem que ainda me segura
em seus braços fortes e ousados. — Acho que podemos animá-las mais
ainda... – sussurro, tomando sua boca para mim e descendo minha mão pelas
suas costas, iniciando uma nova sessão de pegação na piscina, aos olhares
atentos de minha avó e nossas visitas. Eu não sabia o porquê exatamente, mas
tenho a sensação de que casar com Phill será bem mais vantajoso do que eu
imaginava.
CAPÍTULO DEZESSETE
Claire

Depois de trocarmos beijos quentes na piscina, Liz chega ao jardim


anunciando o almoço já servido à mesa. Aproveitamos para sair da piscina e
levar nossa encenação aos senhores que estavam jogando xadrez no terraço.
Assim como eu havia previamente avisado, Phill trouxe uma muda de roupas
para passar o fim de semana em nossa fazenda, e assim que se trocou, se
juntou ao meu vo e Billie, e depois nos encontramos na copa ao lado do meu
jardim favorito da fazenda: o das laranjeiras.
A tarde chegou e, como já era de se imaginar, Phill se deu muito bem com
Billie e ganhou ainda mais a confiança de meu avô elogiando sua coleção de
xadrez. Ele prestava atenção em cada minúcia das peças antigas e parecia
curioso a cada detalhe que avô fazia questão de explicar.
A noite caiu, e consigo trouxe uma preguiça gostosa que passeia pelos
corredores da casa. Todos os empregados já se recolheram, inclusive nossos
hóspedes, com exceção de um: Phill, que andava de um lado para o outro no
hall da piscina falando ao telefone.
Desço pelo caminho de pedras que ligava o casarão a área de lazer, fechando
meu kimono de seda vermelha e me aproximando das cadeiras de vime.
Uma brisa fria me acerta e eu estremeço um pouco ao chegar perto de Phill,
que nota minha presença e se apressa em se despedir ao telefone:
— Está bem. Amanhã retorno a ligação!
— Algum problema? – pergunto.
Ele desliza o celular no bolso, e murmura baixinho.
— Preciso relaxar, preciso de um Whisky.
— Eu posso pegar, tem na adega da minha avó...
— Não, não se incomode -, ele se senta em uma das cadeiras de vime,
claramente mais rígido do que o normal, olhando para a água da piscina, com
os antebraços apoiados nas coxas.
— Não é nenhum incomodo...
— Não traga. De qualquer forma, não causaria uma boa impressão para um
futuro genro encher a cara no primeiro fim de semana na casa da família da
noiva.
— Tenho que concordar, não seria uma boa ideia encher a cara – anuo. – O
que mais te faz relaxar?
Faço a pergunta ingenuamente, querendo resolver o problema de meu
parceiro de negócios; e me surpreendo com sua resposta clara:
— Sexo.
Ele ainda está olhando para piscina, mas, de repente, seu olhar desvia para
minhas pernas, e poxa! Posso jurar que o vi lambendo levemente o canto
inferior do lábio. Entretanto, ele ergue o olhar rapidamente para o meu rosto.
Ele inspira fundo e complementa:
— Eu posso lidar com a falta dessas duas coisas.
Poderia? Minha mente rebobinava para o dia que ele disse não abdicaria de
sua “vida pessoal” em razão do nosso contrato. Ele afasta meus pensamentos
dizendo:
— Por que está aqui? Sem sono?
— Não. Vim perguntar se está tudo bem com seus aposentos... Vi você da
janela, pensei que não custaria nada vir saber como estar.
— Ótimo – ele olha para os braços e pernas, e anui: — aparentemente, estou
bem. – Ele parece mais gentil comigo quando diz: — Se era isso o que veio
fazer, pode subir para o quarto. Eu realmente estou bem.
— Ok! – Aquiesço sonoramente, girando os calcanhares, parando, tendo um
breve insight e me virando de novo para ele.
— Tenho uma ideia. Sei de algo que pode relaxar você! – digo a ele que me
fita como se não achasse minhas ideias inteligentes.

***

— Suponho que nunca tenha montado em um cavalo! – digo seguindo pelo


chão frio do estábulo, com Phill em meu encalço.
— Não em um de verdade – ele observou. – Na verdade, era um touro.
— Já montou em um touro mecânico? – arregalo os olhos.
— Por que a surpresa?
Cruzo os braços contra o peitoral, olhando-o de esguelha:
— Nada. Só não imagino essa cena, sabe?!...
— Essa cena como?
— O poderoso chefão em cima de um touro mecânico.
Ele esboça um sorriso contido.
— A universidade nos leva a experimentar muitas coisas. – Ele desliza as
mãos para os bolsos e inspira fundo. – No entanto, essa será a primeira vez
que montarei em um de verdade.
— Quanta honra em participar de sua primeira vez – Caçoo, liberando a porta
de Rulus, meu hanoveriano favorito em toda a fazenda.
Phill passa a mão no flanco de Rulus, acariciando seus pelos espessos e
pretos, como breu.
— Parece ser uma criatura mansa.
— E é.
— Como subo nele? – ele me pergunta correndo com os olhos pela barriga de
Rulus, me fazendo rir.
— Calma aí, principiante.
Phill parecia ser aquele tipo de homem que é bom em tudo o que faz, e ver
sua inexperiência com cavalos, me fez o olhar em outra perspectiva. Um
pouco menos inflexível e ansioso para apreender; e apesar de estar um pouco
distante daquela postura rigorosa que aparentemente sabe tudo, Phill ainda
me parece absurdamente sexy — como o pôr do sol, que nunca perde a
graciosidade.
— Você andará em minha garupa hoje. Amanhã, peço ao capataz que lhe
ensine, será bem mais seguro se ele o fizer. – Abro um sorriso largo e
soberbo, dizendo: — Apesar de eu ser uma habilidosa amazona, não sou uma
professora.
— O que seria uma amazona? – ele está curioso, o que é natural a dúvida
para um homem que demonstrou nenhuma intimidade com a vida bucólica
desde que colocou os pés na fazenda.
— É o feminino de cavaleiro. Mulher que monta em cavalos – explico, e tão
logo ele se faz entendido.
Empurro o ferrolho do grande armário ao lado da baia, pegando uma manta e
a sela. Faço toda preparação em Rulus, junto a barrigueira de um lado a
outro, apertando e me certificando de que estava seguro para cavalgar.
Em seguida, aos olhares atentos de Phill, apoio meu pé esquerdo no estribo e
passo uma perna sobre Rulus, finalmente montada nele.
Rulus anda para frente e para trás, até parar completamente ao lado de Phill.
Ergo minha mão para o meu futuro noivo e o incentivo como se ele tivesse
pouca idade:
— Vamos lá! Será divertido...
Ele ignora completamente minhas palavras, enquanto continua a fitar de
forma estranha, difícil de decifrar o que se passa em sua mente.
— O que foi? Está com medo?
Ele parece despertar dos seus pensamentos e dizer:
— Não. Estou só impressionado. Você parece muito legal aí em cima.
Sorrio ao pensar:
— Nunca viu uma mulher montar em um cavalo? – pergunto, incrédula. –
Tem certeza de que cresceu em Nashville?
Ele desliza as mãos para os bolsos e reflete:
— Devo ter visto em algum lugar por aí, em programa de tevê, talvez, mas
você me pareceu mais elegante.
— Elegante? – Sorrio outra vez. — Vamos logo, antes que eu me apaixone
por sua gentileza! – Ergo a mão novamente, o convidando para ocupar a
garupa.
Ele aceita o convite e segura minha mão, encaixando o pé no estribo,
guinando o corpo para trás do meu, em um movimento um tanto
desengonçado, porém, para uma primeira vez, Phill se saiu muito bem.
— Razoável? – ele indaga, se mantendo uma distância segura de minhas
costas.
Sorrio e respondo:
— Por aí.
Libero o cabresto e impulsiono Rulus a andar.
O frio ainda nos segue enquanto cavalgamos taciturnos em uma cadência
tranquila pelo terreno alto da fazenda. E apesar de eu estar kimono, o tecido
de seda parece não me aquecer muito, no entanto, não é algo que eu não
possa suportar.
Entre uma respiração e outra, pesco as reações de Phill através da respiração
quando tínhamos vista das colinas vizinhas e dos açudes, que à noite,
pareciam enormes espelhos d’água. Quando Matt e eu erámos pequenos,
costumávamos chamá-los de espelhos da lua, devido ao reflexo que se
formava nas águas calmas; e ainda depois de muitos anos, ainda continua um
espetáculo.
Desperto de meus devaneios quando sinto meu corpo inteiro arrepiar quando
a respiração de Phill bate em minha nunca, me fazendo apertar com mais
força as cordas do cabresto.
— Muitos homens já montaram em sua garupa? – escuto ele calar silêncio,
em tom de curiosidade.
Inevitavelmente, recobro em minha mente algumas cenas de anos felizes.
— Você é segundo. – Faço uma pausa para refletir, e completo: — O
primeiro foi o meu pai.
O clima de repente fica um pouco mais reflexivo. Eu sempre quero falar o
quanto eram incríveis as memórias que tenho dos meus pais, no entanto, ao
mesmo tempo, isso é difícil de se fazer quando se estar com as lágrimas
preenchendo os olhos e com a voz entrecortada, então não prossigo com o
assunto.
Percebendo meu desconforto, Phill me alenta com sua voz inexpressível:
— Tenho certeza de que foi um ótimo pai!
— Sim, ele foi! – me limito a dizer, sentindo meus lábios se mexerem por
conta própria, devido ao frio que subestimei.
— Teremos que voltar agora! – aviso com a voz tremulando.
— Algo de errado?
Sorrio por cima do ombro em negativa:
— Não. Só estou sentindo um pouco de frio.
Em um ímpeto, sinto o peitoral do homem atrás de mim colar minhas costas e
em seguida, deslizar braços longínquos por cima meus braços e tomando para
si as rédeas do cabresto.
— Eu deveria ter trago um casaco. – Ele comenta resmungando, que apesar
de estar vestido em uma camisa de malha fina, o calor do seu corpo pareceu
me aquecer imediatamente; levando-me a pensar se ele estava quente mesmo
ou foi só o meu corpo que começou a ferver quando senti seus contornos
tocando minhas costas, lombar e bumbum. – Se quiser, eu assumo a partir
daqui – Apesar de me dar a opção, aquilo não soou como uma opção. — Isso
não deve ser tão difícil de pilotar! –, ele estala a língua no céu da boca em um
muxoxo, segurando as rédeas.
— Mova os cotovelos para trás e para frente, puxando as rédeas, de acordo
com a direção que quer seguir. – Minha voz sai ridiculamente trêmula, mas
não hesito em lhe ensinar como fazer, já que eu não recusaria nem por um
decreto aquele calor gostoso que experimentava neste momento.
— Ok!
Ele puxa com cuidado a rédea para esquerda, no entanto, Rulus não se move
um centímetro. Ele tenta mais vez, mais cuidadoso que da primeira, mas sem
sucesso.
Escuto sua respiração pesada em meu ombro, e solto um riso fraco.
— Você terá de puxar com firmeza, caso não fizer, e se mostrar displicente,
ele entenderá que é um principiante. Cavalos tendem a não obedecer
principiantes.
— Sério?! – ele exclama.
— Uhum! – aquiesço. – Tente outra vez.
Phill inspira fundo e torna a puxar a rédea para esquerda, com mais segurança
e precisão, então Rulus obedece prontamente, enquanto escuto Phill soltar
uma respiração de satisfação.
— Não sabia que cavalos poderiam ser tinhosos!
— Iria se surpreender o quanto podem ser. – Sorrio ao pensar.
Depois de ter pegado jeito, Phill nos conduz até a base colina, passando pelo
campo que separava o casarão do estábulo. Enquanto fazíamos este trajeto,
aproveitai para sorver o perfume almiscarado que vinha de sua pele, uma
deliciosa combinação de frescor e virilidade.
— Você me perguntou se muitos homens costumavam subir em minha
garupa. Por que me perguntou isso? – Penso alto, com estranheza, já que ele
sabia que eu tinha acabado de retornar de Nova Iorque. Deveria imaginar que
a única coisa que andei nos últimos anos foi em vagões de metrô.
Ele pigarreia e responde:
— Não sei... Quero conhecer melhor minha futura esposa.
Meus pensamentos vão além e indago um pouco ofendida:
— Quer saber se eu sou rodada antes de se casar? – o fito por cima do ombro
o rosto inexpressível do safado.
— “Rodada" não seria a palavra adequada; mas fiquei curioso com a
quantidade de homens que já se relacionou. Sua avó disse que não tem muito
sucesso nesta área, então...
— Imaginou que sou uma mulher triste no amor que tem uma longa lista de
namoros fracassados?
— Não. Não imaginei isso... – Ele é calmo ao se explicar.
— Pois tem razão. Eu tenho uma longa e espessa lista de relacionamentos
fracassados. Aliás, lista a qual tenho muito orgulho, todos eram uns babacas
desprezíveis.
— Não exagere, você não namorou mais que dois rapazes.
Viro-me novamente para encarar seu rosto por cima do ombro, deparando-me
com seus lábios mais avermelhados que o normal, devido ao frio noturno.
— Como pode ter tanta certeza?
Ele abre um sorriso de canto de boca que faria qualquer mulher derreter por
dentro e, por um momento, ele parece engendrar uma resposta mais
elaborada:
— Sua inexperiência... suas mãos inquietas na piscina hoje pela manhã, seu
corpo quente ao tocar o meu ainda mais cedo e seu coração barulhento em
sua caixa torácica neste exato momento. – Droga! Meu peito até desfalece
neste momento, tamanha a tensão que se formou em meu corpo. Ele percebeu
isso? — Suas bochechas ficam sexys também tingidas nesta cor. – Ele
completa com aquela maldita voz rouca.
Apenas vire o corpo, Claire. Por favor, apenas vire-se!
Obedeci meus pensamentos e me voltei a olhar para frente vagarosamente,
mas não hesito em questionar:
— Se sabia a resposta, por que a pergunta então?
Sinto ele dá de ombros e responder:
— Curiosidade! Como eu disse, já que iremos nos casar, é bom estar
inteirado da sua vida. Para mim não faz diferença nenhuma se relacionou
com 2, 3, 10 caras; eu só quero saber quantos relacionamentos moldou a
pessoa que você é hoje. Se vamos conviver por seis meses, melhor que se
conviva com alguém que se conhece, não?
Cada vez que ele falava que nós nos casaremos; sinos, vestido e chuva de
arroz começam a invadir minha mente e começo a cair na real o quão louco é
o meu plano.
Nos filmes pareciam tudo fluir e se encaixar perfeitamente bem, mas a vida
real é diferente. Havia mais responsabilidade do que personagens moldados
para uma narrativa manipulada para que os pontos se fechem completamente.
— E você? O quão rodado você é?
— Ainda há tempo de desistir. – Ele murmura um pouco mais sério enquanto
passávamos pelo jardim ao lado da piscina. Cruz-credo, que homem sem
senso de humor. Eu faço uma pergunta descontraída a ele, e já me vem com
uma resposta que parecia mais um intimado.
— Você quer desistir? – pergunto a ele.
Ele se cala por um instante e responde firme:
— Não.
— Pois não há nada que impeça esse casamento de acontecer – afirmo
categoricamente.
De repente, Rulus começa a ficar mais relutante em seguir em frente ao
entrecortarmos o jardim ao lado da piscina, sacudindo o corpo para trás como
estivesse assustado. Phill tenta domá-lo com mais firmeza, perguntando em
uma oitava mais alta:
— O que está acontecendo?
— Não sei. – Corro com os olhos na grama, enquanto Rulus fica ainda mais
exasperado. – Parece que tem algo na grama que está lhe assustando.
Em um rompante, Rulus ergue as duas patas dianteiras, reproduzindo um
relincho forte e alto, nos deixando cair para trás, no chão duro, fazendo a
volta, cavalgando no sentido contrário da piscina.
A grama amorteceu um pouco a queda, mas gemo alto com a dor nas costas,
que dói pra caramba.
— Cacete! – Phill grunhe ao meu lado. E em seguida, inclina a cabeça em
minha direção: — Tudo bem?
Assinto, apesar da dor. Phill se levanta e ajuda a me pôr de pé.
— O que houve com ele? – sua pergunta vem acompanhada de um longo
suspiro pesaroso. – Oh, pensei que já fossemos amigos...agora estou me
sentindo completamente rejeitado.
Sorrio o interrompendo:
— Não tem nada a ver com você.
Olho para grama ao lado e avisto o copo laranja de néon. Vou até lá e o
apanho do chão.
— Parece que Matt esteve dando uma festa nestes últimos tempos. Que
safado! Vai ter de dar outra e me convidar, senão não me chamo Claire. –
Ergo o copo em direção a Phill e explico: — Ele deve ter se assustado com a
luz disso. Cavalos se assustam muito fácil com objetos estranhos.
Phill está com as mãos apoiadas na cintura olhando para o lado, e quando
retorna sua atenção para mim, parece não ter escutado nada o que eu falei.
Ele se aproxima, puxando com um braço meu corpo contra o dele, elevando a
outra mão aos cabelos, pondo-os atrás da orelha. Aperto meus dedos na
malha de camisa, totalmente alheia ao que estar acontecendo. O que deu
nele? – penso ao arrepiar violentamente dos pés à cabeça quando sua mão
resvala para minha nuca e seus lábios hipnotizante toma os meus em beijo
lento e demorado. Em seguida, ele cola nossas testas, sua respiração batendo
contra o meu rosto, e sussurra com a voz quase quebrando:
— Não olhe, mas todos estão nos assistindo de suas janelas.
Que droga! O relincho de Rulus deve ter os acordados.
— É o momento, perfeito! – Ele roça lentamente a ponta do nariz contra o
meu, como naqueles filmes em que casais estão perdidamente apaixonados.
Ele se afasta de mim, sem tirar os olhos dos meus, e como se tivesse ensaiado
aquela cena, ele se ajoelha solenemente e tira algo do bolso da frente,
apertando o punho e em seguida revelando a mim na palma de sua mão um
singelo e charmoso anel com uma pedra brilhante na superfície da fina
circunferência prateada, enquanto ao nosso redor só é possível de se ouvir o
som de grilos e um crocitar distante de coruja.
— Você comprou um anel e não me disse nada! – mesmo que seja quase
impossível que alguém ouça nossa conversa do casarão, sussurro, com a
adrenalina correndo em minhas veias com aqueles olhos verdes selvagens
domados em uma expressão de benevolência fingida diante de mim,
ajoelhado como se ele fosse meu genuinamente.
— Que tipo de noivo eu seria se lhe avisasse uma coisa dessas – ele pega
minha mão e, com aquele terrível olhar molha calcinha, ele deixa um beijo
ali. – Você aceita... – ele deposita o segundo, soprando seu hálito contra a
minha pele... – ser minha mulher... – ele ergue o olhar me roubando toda
minha alma corpo... – na saúde... na doença... – e por fim, ele diz: — até que
o contrato nos separe?
Sorvo um pouco de ar e espio de rabo de olho a plateia ao nosso lado que se
dividia em quartos diferentes. Eu poderia sentir a energia da minha avó
esperar ansiosamente pelo o desenrolar daquilo, e vejo com mais clareza
Margareth com um minúsculo binóculo bisbilhotando da sacada, ao lado da
filha.
Torno a olhar o homem que aguardava pacientemente em minha frente,
engolindo em seco com aquilo que eu mesma criei. Casamento por contrato.
Caramba! Eu realmente havia ido longe demais.
Faço uma longa pausa dramática e digo:
— Eu aceito.
Ele abre um sorriso descomunalmente lindo, como se aquilo fosse real, e se
levanta e encaixando a circunferência em meu dedo anelar. Ele guarda o beijo
para o final, me erguendo em sua cintura e sussurrando antes que eu pudesse
saborear sua boca: “Honrarei nosso contrato. Eu prometo! ”
Um pouco antes de voltar a Nashville, eu prometi a mim mesma que nunca
mais me apaixonaria, pois quando isso acontecia, o fim sempre era muito
dolorido. No entanto, quando nós fazemos este tipo de promessa, estamos
machucadas e sem esperanças, com o sangue correndo frio nas veias; longe
daquele calor que aquecia todo nosso corpo como quando estamos
começando a nos apaixonar. Mas a paixão é inevitável. Não há como
simplesmente sufocá-la, ela sempre vai estar lá, brotando em doses
homeopáticas e quando menos você espera, é ela que estar te sufocando,
deliciosamente.
CAPÍTULO DEZOITO
Claire
Depois daquela noite na piscina, na manhã seguinte, entendi por que Phill
disse que aquele era o momento perfeito para fazer o pedido. Tudo soaria
mais estranho se ele o fizesse pela primeira vez em uma mesa de jantar, não
convenceria nem mesmo minha avó que estava muito satisfeita com meu
namoro repentino com aquele que seria perfeito para sua neta ter ao lado.
Todavia, a cena de dois jovens à piscina sob luar e regidos por uma atmosfera
de amor tornou mais fácil reforçar a ideia de que estávamos perdidamente
apaixonados.
Contudo, na manhã seguinte, ele seguiu o protocolo e pediu minha mão aos
meus avós assim que Matt chegou da cidade na companhia do tio Ben e
Camila. Aliás, Matt foi o único que achou aquilo muito estranho, e ainda
temo de que terei de contar meu pequeno segredinho uma hora ou outra.
Ficamos oficialmente noivos em uma manhã de domingo, e neste meio
tempo, Phill só vinha subindo implacavelmente no conceito de minha avó,
que lhe adotou como se fosse um legítimo Sullivan.
E cá estamos, três domingos depois, trocando alianças, pousando para fotos e
cumprimentando as pessoas em uma cerimônia para poucos convidados, em
um salão com mais de 20 mil flores brancas, entre elas rosas, alstroemérias e
lisianthus.
Phill dá mais gole do champanhe na taça cravada entre os dedos, forçando
um sorriso para o meu tio avô, Charles, que chamava sua atenção enquanto se
remexia ao som de Help na pista de dança. Na verdade, tio Charles está
atormentando Phill desde o início da festa.
— Parece você ganhou toda minha parentela! – comento, sorrindo enquanto
tio Charles balançava a bengala no ar.
Entre um gole e outro, ele responde:
— Imagina se tivesse o conhecido antes da cerimônia – ele ironiza.
Apesar ele tentar às vezes o bom-humor, uma das coisas que me incomodava
em Phill era seu sarcasmo. Mas quanto a isso, eu não poderia fazer mais
nada, já havíamos trocado as alianças e legalmente erámos marido e mulher.
Entretanto, havia algo que me incomodava muito mais: essa mania dele ser
terrivelmente gostoso dentro de um terno bem recortado. Definitivamente, ele
nasceu para estar dentro dessas roupas. Mas também não me incomodaria se
o visse fora delas. Na verdade, mal poderia esperar pela lua de mel!
— Queridos, podem me conceder um minuto do tempo de vocês! – minha
avó aparece ao nosso lado, nos convidando para salinha ao lado do salão
principal.
— Claro! – Phill e eu respondemos quase em uníssono. Entreolhamo-nos, e
minha avó solta uma risada baixinha.
— Isso é conexão, meus filhos! Sinal de que o casamento irá bem! – vovó
comenta, risonha; e nos conduz para a sala ao lado, onde o barulho do salão
já não nos alcança.
Ela tira algo da bolsa de mão, o que parecia ser uma chave eletrônica e nos
entrega.
Phill dá mais outro gole do champanhe e pesco a chave em sua mão para
mim.
— O que é isso, vó!?
— A chave do apartamento novo de vocês... meu presente de casamento
como avó e mãe da noiva.
Arrasto uma mecha solta de cabelo para trás da orelha, dizendo:
— Não precisava. Nós já tínhamos combinado que viveríamos naquele antigo
apartamento.
— Não, não. Faço questão de que construam a história de vocês em um lugar
novo. E outra, não estou pedindo que aceite meu presente, ele já é seu. – Ela
diz toda autoritária.
— Tem certeza de que ela não é sua avó? – pergunto a Phill.
Ele respira fundo e diz:
— Infelizmente não tive tamanha a sorte.
— Sempre gentil! – vovó exclama, com os olhos brilhando para Phill, que
apesar de abrir os dentes, sabia que ele havia sido sarcástico mais uma vez, e
dessa vez, o sarcasmo era direcionado a mim.
A porta se abre ao nosso lado e uma cerimonialista avisa:
— A limousine já está aqui em frente.
— Parece que a hora de curtir chegou, não é mesmo?! – minha avó abre os
braços com um sorriso sapeca no rosto que me fez rir de nervoso. Ela
direciona seu olhar a mim e instantaneamente seus olhos cheios de orgulho se
enchem d’água, levando os meus a lacrimejarem também, mesmo que isso
sendo uma farsa. – Oh, minha menina! Você cresceu tanto – ela me envolve
em seu abraço cálido, dando leves batidinhas em minhas costas.
Com o mesmo entusiasmo, ela envolve Phill com seus braços ternos. E em
seguida se afasta suspirosa, nos deixando partir pelo salão a fora, ao som do
mestre da cerimônia anunciando nossa partida.
A mão de Phill cai sobre minha lombar me guiando para limousine preta
estacionada em frente à casa de festas mais requisitada pelos casamentos de
famílias tradicionais de Nashville; enquanto deixávamos o meu clã aos
brados de vitória, já que eu deveria ser muito cotada para tomar o cargo de
presidente solteirona da família.
— Você se saiu muito bem – Phill elogia enquanto folga a gravata quando
finalmente ficamos sozinhos dentro do carro extenso, no banco comprido
revestido a couro.
— Obrigada! Você também se saiu muito bem –, digo tirando meus sapatos
de tiras, que estava quase cortando meu calcanhar. – Lembre-me de nunca
usar sapatos novos quando eu for me casar novamente -, resmungo baixinho.
— Como? – ele indaga, alheio às minhas palavras, pegando algo no frigobar.
— Você vai beber novamente? – pergunto, despretensiosamente. – É assim
que vai passar a noite de núpcias?
Ele me olha por cima do ombro, e fecha o frigobar, voltando a colar a coluna
no estofado de couro; olhando em meus olhos e os descendo rapidamente
para o meu decote. Ele ergue o olhar, fazendo a pergunta:
— Há algo que queira sugerir?
Ele me devora com suas írises esverdeadas em um tom mais escuro, e
pergunto-me se era ali que iriam tirar minha virgindade pela segunda vez
depois de tanto tempo sem sexo. Engulo em seco quando o toque monofônico
de telefone nos resgata, eliminando toda a tensão sexual entre nós.
Phill retira o aparelho do bolso do paletó, enquanto sentia meu peito subir e
descer suavemente.
— Alô!? Diga Harry! – Phill atende a chamada.
Mas que droga! Meio decepcionada com aquele maldito toque de celular,
meu corpo murcha um pouco ao seu lado, enquanto ele ainda trata de
questões comerciais da rede de supermercados Hill. Agora que casamos,
poderemos finalmente colocar nosso plano em prática, e tão logo ele
assumiria o lugar da presidência na Sullivan.
Incomodada com todo aquele tecido do vestido repuxando minhas costas,
levo meu corpo para o banco da frente, posiciono meu corpo de lado, de
forma que eu alcançasse os botões em minhas costas. Começo a desbotá-los
enquanto ouço a conversa de Phill.
Quando minhas mãos conseguem desprender todos os botões, sinto a voz de
Phill estancar. Furtivamente, o flagro do outro lado da limousine com o olhar
fixo no final de minhas costas, que faz minha espinha gelar. Observo
atentamente o rápido lamber de lábios quando desceu o olhar para minha
bunda, e tão logo torna a fitar a janela ao lado, conversando com a pessoa do
outro lado da linha como se nada tivesse acontecido.
Ele me deseja – é o que penso de início, com um punhado de felicidade se
alastrando pelo meu corpo, pois Phill nunca havia se mostrado de fato
interessado em mim durante todos esses dias que temos sustentado um teatro
perante minha família.
E caramba! Eu não sabia como era tão bom ser olhada com desejo por ele.
Apesar do pouco tempo que o conheço, sei muito bem que ele não é o tipo de
cara gira o pescoço na rua por causa de um rabo de saia, e aquilo me excitava
ainda mais.
Claro que eu não penso que ele é um santo, mas só de ele ter me fitado dessa
forma por longos breves segundos, foi como se eu me sentisse a própria
Megan Fox de fio dental em uma praia em Ibiza.
Apesar dos beijos apaixonados que havíamos trocado nas últimas semanas,
tudo era estritamente observado pelos olhares curiosos de minha família. Fora
disso, ele se mostra ser um homem sério e contratual, pouco flexível e frio
comigo. Não que eu achasse ruim, pois isso apenas mostrava que ele estava
sendo profissional e respeitoso comigo, tirando as vezes que me respondia
com um sarcasmo velado, vezes as quais segurava minha língua para não
retrucar com o meu típico deboche. Eu ainda não estava tão confiante para
me mostrar da forma que eu sou: impaciente e desbocada. Vai que o homem
resolvia não assinar o contrato. Mas agora que ele o fez... me parece um
desperdício não o provocar um pouquinho.

CAPÍTULO DEZENOVE
Claire
Passei a viagem inteira escutando a conversa de Phil ao telefone, e imagino
que o outro cara do outro lado da linha não saiba que ele acabou de sair de
uma cerimônia de casamento, talvez nem saiba que ele era o noivo.
Caramba! Eu sabia que não tínhamos envolvimento amoroso algum, mas bem
que ele poderia respeitar o nosso casamento. No entanto, engulo meu
descontentamento que soava sem sentido e fundamentos.
Agora sou eu a abrir o frigobar e pesco uma garrafa de Whisky. Despejo o
líquido amadeirado no copo largo e dou um espesso gole da bebida que desce
queimando por minha garganta.
Apenas quando chegamos ao saguão do hotel, ele encerra a chamada:
— Perdão. Tive de atender – ele guarda o celular no bolso do paletó, e a porta
esquerda é aberta pelo chofer.
Apresso-me a pular para fora do carro quando Phill segura meu braço,
descendo o olhar para minhas costas desnudas:
— Seu vestido está aberto. – Ele me avisa, talvez esperando que eu retorne ao
banco e abotoe outra vez.
— Eu sei! – Respondo o ignorando e saindo pela porta traseira.
Agradeço o chofer e ando para o saguão com o vestido de noiva
completamente aberto nas costas, enquanto todas as atenções ali se voltaram
para a gente em uma crescente.
Não sei exatamente o que chamava atenção daquelas pessoas: o vestido de
noiva ou ele estar inadequadamente em meu corpo, mas só de Phill estar
andando atrás de mim feito um cão de guarda, eu já me sentia vingada por ele
ter me feito escutar sobre administração de materiais por quase quarenta
minutos e agisse como se nosso casamento não fosse nada.
Poxa, nosso casamento era de mentira, mas a emoção de estar casando pela
primeira foi como se tivesse sendo de verdade.
— Você está chamando a atenção de todos! – ele murmura atrás de mim.
— Por quê? Importa-se com isso? – Pergunto tirando os grampos dos meus
cabelos, bagunçando-os, imitando seu tom inexpressível e caminhando em
direção a recepção.
— Cobertura, torre 2 –, Phill diz a recepcionista.
Dou um passo para trás, esperando que a garota ruiva confirmasse o check-in,
realizado por Phill antes da cerimônia.
Enquanto isso, um moreno de pele dourada adentra a recepção, me fitando
fixamente meus olhos como se nos conhecêssemos. Puta merda! Ele é um
gato, com certeza ainda não nos conhecíamos. Decerto, não esqueceria esses
olhos cor cinzentos nem por decreto. Cambaleio para trás, um pouco zonza,
mas ainda sustento o olhar.
Trocamos olhares até Phill nos flagrar e ele me puxar para a bancada ficando
atrás de mim, me imprensando contra o mármore gelado.
— O que é isso? – eu murmuro enquanto sorria sem graça para a
recepcionista que nos olhava com uma expressão ressabiada.
— Estou te protegendo de um possível assédio. – Ele sussurra de volta em
meu ouvido, me fazendo arrepiar por inteiro.
— Eu não estava sendo assediada –, retruco. — Estávamos apenas nos
olhando. Aliás, fui eu quem comecei a paquerá-lo.
— Apenas “nos olhando”? Você quer enfeitar minha cabeça publicamente em
nossa noite de núpcias, é isso mesmo? – pela primeira vez, escuto o tom de
Phill mudar drasticamente; e ao invés de eu me preocupar, me divirto,
engolindo o riso e respondendo inocentemente:
— Ué!? Mas não foi você quem disse não deixaria de viver sua vida por
causa de um contrato? Por que eu deixaria de viver a minha?
Ele bufa atrás de mim, enquanto a recepcionista nos entrega a chave
eletrônica.
Sinto o corpo de Phill se afastar um pouco e me viro para encará-lo. Ele
recobra o tom mais frio e me responde:
— Faça isso em minhas costas. Em minha frente, jamais! – ele gira os
calcanhares e vai na frente, me deixando para trás.
Saio em disparada em seu encalço, dizendo:
— Pois eu farei mesmo. Namorarei muito, senhor Castallaneta. Ou você
pensa que eu não sei que tem se encontrado com outra mulher nestas últimas
semanas? – Eu conseguia sentir o cheiro adocicado impregnado em suas
roupas quando nos visitava sagradamente todas as noites para reforçar toda
aquela farsa.
— Por favor, fale mais baixo! – ele para em frente aos elevadores ao lado de
um senhor de cabelos grisalhos que parecia atento a nossa conversa.
Agora me direciono ao senhorzinho, me lamuriando:
— O senhor pode imaginar como é começar um casamento sem amor?
— Por favor, Claire! – Phill se vira para mim, mais firme, talvez temendo um
vexame.
— Ele nem mesmo sorriu em nossa cerimonia, senhor. Ele me tratou como se
fosse um... um... um vaso no altar – solto, dramatizando.
— Chega! – ele reclama entre dentes, pegando meu corpo para si, com a
facilidade de quem pega uma criança de dez anos nos ombros. Ele dá um tapa
em minha bunda, marchando para a lateral do saguão, subindo as escadas
com se tivesse levando consigo um saco de batatas em um ritmo tão
frenético, que eu tenho a sensação de que havíamos subido pelo menos uns
sete andares.
— Eu vou cair. Para. – Alarmo, meio zonza. – Para. Para. Para! – Digo pela
primeira vez estapeando suas costas.
Ele continua irredutível aos meus pedidos, e acabo involuntariamente
acertando seu estômago com um chute, fazendo com ele estagne no piso
seguinte e me largue bruscamente no chão.
— Dá para parar de agir feito uma porra de adolescente mimada?
Cambaleio para trás, com o mundo girando ao meu redor. Levo a mão a testa,
e ele segura meu corpo com um de seus braços antes que eu caísse para trás.
— Acho que bebi demais! — murmuro tomando consciência da alteração de
meus sentidos.
Ele me estuda veementemente, franzindo o cenho e prendendo o canto
daqueles lábios inferiores deliciosamente sensuais:
— Foram apenas dois copos de Whisky! – ele murmura. Ele contou?
— O suficiente! – retomo o bom humor e abro um sorriso de orelha a orelha.
— Claro! Fraca para bebida. – ele bufa. – Era de se imaginar. – Ele sussurra,
pensando alto.
Nossos corpos estão próximos, que mal posso raciocinar direito, se não
bastasse o maldito álcool na cabeça. No entanto, ainda consigo lembrar:
— Quem é a mulher?
Ele pisca duas vezes, indagando:
— Que mulher? Não há mulher.
— A do perfume. Não me faça de boba, eu sei que está transando com
alguém. Só me resta saber se é algo casual ou...
— Ela é minha irmã – ele grunhe.
— Irmã? – balbucio. – Espera aí! Você nunca mencionou uma irmã. –
Cambaleio para trás, tentando raciocinar melhor: — Pelo que eu sei, você só
tem Caleb de família... – Que, aliás, foi o único convidado de Phill que
compareceu à cerimônia.
Ele suspira fundo, como se fosse um grande incomodo ter que explicar:
— É uma longa história. Ela não é minha irmã de sangue, mas o fato é que
não estou transando com ela.
Faço uma longa pausa, averiguando se havia verdade no que ele estava
dizendo.
— Ok! Mas eu quero conhecer essa sua irmã – digo apontando o dedo em
riste no seu peito.
Ele olha para o lado, suspirando pela enésima vez e segurando minha mão.
— Vamos logo, antes que brote mais caraminholas nessa sua cabeça criativa,
— ele diz me arrastando para o elevador do andar.
As portas do elevador se abrem, e lá está ele: o senhorzinho que assistiu tudo
lá embaixo. Ok! Onde tem um vaso para eu enfiar minha cabeça?
— Podemos esperar outro, amor! – digo baixinho ao seu lado, colocando uma
mecha de cabelo para trás da orelha, totalmente desconcertada.
— Vai demorar muito! – ele apenas minha arrasta para o canto do elevador
enquanto digo com as pernas cruzadas ao senhor:
— Boa noite.

***

Chegando à suíte principal da cobertura do hotel Hilton, nos deparamos com


a enorme extensão de chão salpicado por pétalas e velas estrategicamente
organizadas. Em cima da cama, um enorme coração vermelho formado
também por pétalas vermelhas.
Aquilo seria tão romântico... se fosse de verdade.
— Uau! Eu acho que minha avó... caprichou! – Sussurro enquanto me
aproximo da cama e sento ali, mirando meu esposo do outro lado da suíte,
incrivelmente sexy enquanto retira o paletó, ficando apenas de camisa social,
gravata e suspensórios. Eu já falei que amo homens que usam suspensórios?
Sim, me perdoe, mas tinha de comentar mais uma vez, pois é a minha tara.
Ele que olha para o lado, como se tivesse sentindo falta de algo.
— Algum problema?
— Não há sofás.
— Não há problema, a cama cabe nós dois –, tento controlar a animação em
minha voz devido ao álcool, mas não obtenho sucesso, fisgando o lábio
inferior. Ele pousa as mãos na cintura e me olha como se eu fosse um
problema. – Qual é? Não vou agarrar você no meio da noite, se é isto que
está pensando...
— Não estou pensando nisso. Mas por vias das dúvidas, é melhor manter
distância. Eu não quero correr o risco de transar com uma mulher que fica
bêbada com dois copos de Whisky.
— Essa mulher, a partir de hoje, é sua esposa, — digo me arrastando para
trás na cama, elevando o vestido, deixando minhas pernas à mostra. – Depois
da cerimônia, não é a hora que se consuma o casamento? – digo arrastando a
voz, um tanto oferecida. Sabia que eu iria me arrepender depois, mas estou
tão obstinada em ter esse homem prudente, que pouco me importo com o dia
de amanhã se o arrependimento batesse em minha porta.
Há quase um mês penso na mesma coisa — como seria com ele, suas mãos
másculas me tocando, seu hálito refrescante invadindo em minhas
comissuras, enquanto o sentia dentro de mim. Oh, céus! Eu tinha altas
expectativas em relação a Phill.
Encosto a ponta do dedo do pé no tecido de sua calça e, vagorosamente,
trilho um caminho até a braguilha, enquanto seus olhos atentos parecem
observarem minha perna audaciosa tocar seu corpo. Daria tudo para saber o
que se passava em sua mente neste momento. Ele estaria me desejando?
Vou além e manobro o dedão para a sua virilha por cima da calça, arrancando
dele uma respiração profunda; e, não me contenho, e sorrio, vitoriosa com
aquilo.
— Verei o que posso fazer em relação em como dormiremos separados! – ele
diz desconversando e caminhando para o closet ao lado da parede de vidro.
Reviro os olhos pensando no quão insurportavelmente centrado ele poderia
ser. Eu nem estou tão bêbada, só um pouco alucinada.
— E eu vou tomar um banho antes que sua chatice me contamine – dou um
solavanco para fora da cama e me direciono ao banheiro, descontente com o
banho de água fria que aquele homem me jogou.
Fecho a porta e solto o ar violentamente pelas narinas, completamente
frustrada enquanto me olho no espelho e noto a presença de uma caixa
vermelha fosca em cima de uma das cubas de mármore do banheiro.
Pego o cartão para mim e percebo que se trata de um bilhete de minha avó.
Em letra cursiva está escrito em papel vergê:
Que a noite seja doce como um favo de mel!
De sua avó, Elizabeth.
Leio achando muito fofo e desembrulho aquilo que estava coberta por um
fino papel branco.
Quando vi e tirei as peças íntimas da caixa, quase carbonizo de vergonha.
Trata-se um conjunto sexy de lingerie preta, com uma calcinha tão estreita
que me pergunto se foi feito para regos, contrastando um lacinho discreto
entre as interseções dos fios e uma tiara de perna de renda mais romântica.
Caramba! Eu sabia que minha avó havia ficado muito animada com esse
casamento, mas acho que agora ela foi um pouco além da conta.
— Será que ficará bonita em mim? – murmuro esticando a calcinha e me
olhando no espelho.
De repente, o calor em meu corpo se ascendeu outra vez, e quando vi, já
estava tramando provocá-lo outra vez.
Tomo um banho demorado e visto a lingerie preta, me virando, e passando os
olhos sobre o meu corpo seminu. Nossa, até que caiu super bem! Espio por
cima do ombro o reflexo do meu bumbum no espelho.
Com a sensação de estar se sentindo a própria deusa do amor, estou confiante
de que irei pelo menos perturbar a mente de Phill, amaciando um pouco meu
ego ferido.
Abro a porta e não o encontro na cama. Procuro no closet e na salinha ao lado
e... nada!
Onde foi que esse homem se meteu? – Pergunto-me cruzando os braços
contra o peito. – Será que ele saiu? – olho para a porta.
— Que seja! – Jogo meu corpo na cama e me divirto fazendo umas poses
sensuais com as pernas, pensando na cara que ele faria quando abrisse a porta
e me encontrasse desse jeito. No entanto, tomo um susto quando vejo um
corpo jogado ao lado da cama.
Levo-a mão ao coração descompassado, me recuperando quando vejo que se
trata de Phill deitado de bruços em cima de uma colcha de cama. Ele não usa
camisa, apenas a calça grafite que vestiu na cerimônia. Com cuidado, deito
meu corpo na beira do colchão, e cutuco suas costas, sussurrando:
— Phill!?... – Cutuco-o mais uma vez, murmurando: — Você está bem?
Sua respiração fica um pouco mais alta, denunciando que ele está em sono
profundo.
Eu não deveria ter demorado no banho – me frustro outra vez, com a cabeça
deitada no colchão e inclinada para o chão onde Phill está, mapeando as
sardas em suas costas com a ponta dos dedos. Eu não sabia se era resquício
de álcool ou apenas frustação mesmo que estava me deixando reflexiva, mas
acabei passando boa parte da minha noite de núpcias admirando suas costas,
cobiçando seu querer.

CAPÍTULO VINTE
Phill
Ao alvorecer da manhã seguinte, eu estava de pé atrás da vidraça, observando
Nashville acordar.
Olho por cima do ombro, fitando minha falsa esposa deitada no colchão,
somente usando um sutiã preto de renda e uma calcinha provocante que me
deixava duro dentro da calça, no entanto, desvio o olhar e me concentro em
ver o tempo passar.
Claire, apesar do rosto angelical, é uma mulher provocante e sensual,
daquelas que desperta desejos carnais em qualquer homem. Confesso que na
noite passada foi difícil de desviar de suas investidas, mas foi preciso.
Um homem escravo de seus próprios desejos, é apenas um escravo – essa é a
minha máxima. Nunca ouvi falar de um homem que chegou ao topo usando a
cabeça de baixo; e a ideia de me deitar com Claire casualmente me parecia
perigosamente tentadora para ser apenas algo inofensivo como é com as
mulheres que me deito. Por isso, pondero que seja melhor que misturemos as
coisas.
Quando os raios solares invadem o quarto com mais vigor, observo pelo
reflexo do vidro Claire acordar preguiçosamente e se dá conta de suas vestes
ou a “semi falta” delas.
Ela geme morosamente até se calar de repente.
Em apenas dez segundos, ela toma consciência de si, pula para fora da cama e
sai nas pontas dos dedos em direção ao banheiro, se trancando lá por um bom
tempo.
Ela só sai quando o café da manhã é servido na mesa do quarto, e mesmo
assim não me olha nos olhos nem por um instante quando estamos a mesa.
Pegamos nossas coisas e descemos até o saguão.
— Poderíamos ficar mais um pouco -, Claire finalmente volta ao seu normal
enquanto seguimos para frente do prédio. – Dizem que a piscina daqui tem
uma vista maravilhosa.
— Tenho que estar hoje à tarde na Hill... pedirei demissão.
— Aleluia! Pensei que nunca pediria. – Ela exclama.
— Acho que já deve me conhecer o bastante para saber que não tomaria
atitudes precitadas.
— Sim, conheço. – Ela aquiesci e completa: — E que homem difícil! – Ela
arregala aqueles olhos chamativos azul-turquesa, em tom de troça.
Esboço um pequeno sorriso, me divertindo com seu deboche e avistando
Caleb dentro do carro de vidros abertos a metros dali. Também vejo do outro
lado da rua os seguranças de Elizabeth Sullivan, à espreita de nossa saída.

Caleb muda para o banco do carona e Claire senta atrás, cumprimentando o


garoto com a cara inchada de sono e cabelos desgrenhados.
— Eu sou Claire. A esposa do seu primo, à propósito. – Ela ergue a mão a
Caleb que a aperta meio desconfiado.
— Eu sei. Ontem eu estava na cerimônia.
— Ah, claro. Eu o vi de longe também... E naquele dia no galpão... – ela
lembra do fatídico dia do sequestro, e Caleb me olha de esguelha. — Só
queria me apresentar formalmente já que o mal-educado do seu primo não o
fez durante todo esse tempo.
— Eu estava esperando pelo momento certo -, me defendo.
— Você é cheio de momentos. – Ela replica.
Ficamos em silêncio por um momento, e ela demora a perguntar:
— Ele sabe?!
— De exatamente tudo – confirmo.
Ela faz mais uma pausa e depois engata novamente a conversa.
– Aliás... – ela direciona a Caleb, observadora e confusa: — Seu braço já está
melhor?
— Por que não estaria? – Caleb indaga, me fazendo apertar o volante
imaginando em fazer aquilo com seu pescoço quando saltássemos do carro.
— Phill disse que estava com o braço engessado, pois naquele dia...
Caleb tem um insight e vai logo respondendo.
— Ah, claro! O gesso! Claro, o gesso. Essa merda ainda estava aqui até
semana passada. Graças a Deus me livrei disso.
— Assim tão rápido? – ela questiona, ressabiada e pensativa. – Por que de
repente tenho a sensação de que vocês estão mentindo?
De soslaio, Caleb e eu nos entreolhamos discretamente.
— Por que estaríamos mentindo? – tomo a rédea da conversa, devolvendo a
pergunta, sem emoção alguma na voz, fitando pelo retrovisor central seu
delicado cenho franzido.
Ela faz uma longa pausa, e depois assente reflexiva:
— Tem razão! Por que estariam mentindo, não é mesmo?
De repente, o celular começa a vibrar em meu bolso e a tela de multimídia
exibe a chamada de Alexa, e desligo rapidamente antes que os grandes olhos
bisbilhoteiros de Claire vejam.
Segundos depois, Alexa insiste, e antes que eu fosse mais rápido, Claire
pergunta no banco traseiro:
— Não vai atender?
Porra! Caleb e eu trocamos olhares mais uma vez no momento em que digo a
Claire:
— Quando pararmos o carro, eu retorno à ligação...
— Qual é, cara! – ela exclama, relaxada. — Uma chamada em modo viva-
voz, você pode fazer isso.
— Não me parece muito seguro. – Replico.
Ela solta aquele riso forçado, como se quisesse mostrar que não estava caindo
no meu papo, já que é uma baita teimosa.
— Pode ser algo urgente!
Em um rompante, Claire espicha o corpo no vão entre os bancos da frente e
prevendo o que ela iria fazer, tento impedi-la com uma mão.
— Quieta!
No entanto, não adianta muito, e ela acaba alcançando o painel e atendendo a
chamada com um click de tela.
— Oh, hello, Alexa! Aqui quem fala é a esposa de Phill. Ele está dirigindo no
momento, mas eu posso dar a recado mais tarde quando estacionarmos. É que
meu marido não sabe fazer duas coisas ao mesmo tempo.
Por um instante, não ouvimos a voz de Alexa, como é esperado. Ela
provavelmente estaria processando as palavras de Claire.
— Esposa? – imagino que Alexa esteja com uma sobrancelha arqueada e a
mão na cintura uma hora dessas.
— Sim, esposa.
— Impossível! Phill não casaria sem antes me dizer...
Sinto que é o momento de eu interferir:
— Alexa, sou eu, Phill! Estamos no trânsito, mais tarde eu retorno. Ok?!
— Espera aí, Phill! Que história é essa de casamento? Isso é verdade? – ela
começa a ralhar.
Olho pelo retrovisor minha petulante falsa esposa no banco de trás, atenta a
nossa conversa.
— Sim -, confirmo.
— Pilantra! Caleb sabe ao menos disso?
— Ele está aqui ao lado de Phill -, Claire dedura.
— Fodeu! Alexa vai nos queimar vivos -, Caleb murmura baixinho, mas
Alexa acaba escutando do outro lado da linha.
— Eu não vou queimar vocês. Eu vou esquartejar vocês, seus merdas! —
Alexa pragueja, enfurecida.
— Alexa, eu tenho uma boa explicação para isso. Mais tarde nós
conversamos – tento tranquiliza-la.
— É bom mesmo, Castallaneta. É bom mesmo.
Ela desliga e posso sentir o clima hostil que instaurou entre mim e Alexa.
— Primo... é melhor o senhor se preparar! Quando Alexa chama o senhor de
Castallanetta, é por que a fera está furiosa mesmo.
— Quem é ela? – Claire pergunta, conseguindo a proeza de me irritar pela
segunda vez desde que casamos ontem.
— Clausula 6°, página dois: não se intrometa na minha vida! — Respondo,
com a voz mais rude que o normal.
— Clausula 13°: não tratar o cônjuge com arrogância, em hipótese alguma. –
Ela replica, e pergunta mais firme: — Quem é ela?
Solto a respiração pesadamente e respondo, parando no sinal vermelho.
— Alexa é minha irmã.... Satisfeita? – fito seus olhos no reflexo do
retrovisor, no entanto, ela me ignora, e direciona a pergunta ao meu primo:
— Caleb, isso é verdade?
Vejo o sinal abrir e acelero enquanto Caleb responde:
— A mais pura verdade, dona.
Vejo Claire finalmente recostar a coluna no banco traseiro, parecendo
finalmente acreditar. Apesar de eu estar um pouco preocupado com o que
Alexa esteja pensando, talvez planejando acertar minhas bolas com seu
joelho; no entanto, se eu tivesse o poder de ler a mente de uma pessoa neste
mesmo instante, seria a dela: Claire. Apenas por ela ter o incrível poder de
me tirar a porra do sério.
CAPÍTULO VINTE E UM
Claire

Encosto a chave na maçaneta, e a porta de carvalho é liberada.


Estou tão ansiosa para saber como é o interior do meu novo lar ao lado do
meu marido, quer dizer, do meu falso marido, que me sinto um pouco
culpada por desperdiçar essas primeiras sensações com uma farsa.
— Oh, meu deus! – digo compassadamente ao entrar no espaço iluminado,
revestido de porcelanato e mármore.
Ando mais para frente e toco o sofá capitonê ainda revestido de plástico,
enquanto Phill para atrás de mim com uma das caixas e a mala que pegamos
em seu apartamento quando deixando Caleb há alguns minutos.
No braço do sofá, havia um envelope azul marinho chamativo. Abro, tirando
o papel timbrado e leio em voz alta:
— Minha querida e amada Claire, este é o seu novo lá. Eu desejo com todas
as forças que você tenha nesta casa muitos momentos felizes ao lado do seu
marido, Phill; e seu futuros... – Engulo em seco – filhos.
P.S: não precisa ir à empresa nestes próximos três dias. Aproveite para
namorar muito e comprar roupas de cama, toalhas e utensílios. Decore do
jeito que quiserem, minha princesa. O apartamento é de vocês! – Ela reforça.
— Onde será que fica o banheiro? – Phill pergunta ao meu lado, correndo
com os olhos pelas portas e depois para escada no canto da parede de vidro. –
Preciso de uma ducha. Acho bom você se arrumar. Pelo visto, não há comida
por aqui, almoçaremos fora e depois irei a Hill.
— Como assim? Temos muito o que fazer aqui.
— Eu pedirei demissão. Suponho que queira que eu faça isso o quanto, não?
– ele questiona.
Ele tem razão.
Aquiesço.
— Tudo bem. Como estou de folga hoje, aproveitarei e começarei a organizar
isso aqui. No entanto, amanhã não há desculpas. Você irá me ajudar também.
– Digo erguendo o dedo indicador em riste, em seguida, deslizando as mãos
para os bolsos traseiros da calça e girando os calcanhares em outra direção.
— Sem problema. – Ele responde, e no mesmo instante, o espio por cima do
ombro, flagrando novamente seu olhar fixo em minha bunda.
Sinto o quente em minhas bochechas, provavelmente tingidas de vermelho,
não sabendo reagir a isto, apesar da noite anterior eu ter baixado a
autoconfiança de Marilyn Monroe.
Ele pigarreia, abandonando a caixa no sofá, espantando a energia lasciva que
havia se alastrado entre nós.
No entanto, em contrapartida, ele começa a desabotoar os primeiros botões da
camisa de linho azul, fazendo com que eu escorregue os olhos para os pelos
ralos no vão de seu peitoral e de repente me sinto atordoada.
Antes que os movimentos de Phill se configure um pequeno striptease, ele
corta a sala em passos firmes, dizendo: – “deve haver um banheiro lá em
cima”. Ele sobe pela escada de mármore para o andar de cima, em busca de
uma ducha de água quente, me deixando ali sozinha com meus pensamentos
pecaminosos.
Pergunto-me se ele faz isso de propósito ou apenas é coisa da minha cabeça.
Toda vez que estamos prestes a iniciar um flerte sincero, ele parece
simplesmente fugir. No entanto, não vou quebrar minha cabeça tentando
saber o rola na mente dele, que de perto, parece ser mais complexa do que
aparenta ser.
Nós acabamos almoçando em um restaurante perto da Hill, e depois
aproveitei o resto do dia para bater perna no centro e tomar um café e
reencontrar Martha, diretora da academia de teatro a qual eu frequentava até
anos atrás antes de embarcar para Nova Iorque e me dedicar integralmente ao
curso de Negócios. Prometi a ele que retornaria a sua academia assim que eu
estivesse livre.
Chegando ao apartamento, aproveitei para abastecer a geladeira e tirar os
plásticos dos móveis. Retirei também meus pertences das caixas que minha
avó havia deixado, e anunciei na internet uma vaga para governanta para
tratar dos assuntos do lar.
Passei quase a noite inteira desembalando as compras e passando pano nos
móveis, e nada de Phill. Ele simplesmente não dormiu em casa, não deu
notícias, tampouco atendeu minhas ligações.
Eu não sabia muito bem qual era o limite da nossa relação, mas o certo que é
fiquei puta em ter de fazer tudo sozinha, enquanto ele talvez estivesse se
divertindo por aí, despreocupado.
Adormeci em cima dos lençóis novos, na cama de casal no quarto que na
teoria seria nosso. Eu estava mortinha de cansaço e provavelmente eu só
abriria os olhos novamente quando o sol saísse.
Levantei às sete, fazendo a higiene matinal no banheiro da suíte mesmo, e saí
corredor a fora em busca de algo para comer, no entanto, estanquei os passos
quando ouvi o som de chuveiro aberto vindo do quarto de hóspedes.
Phill?! – Seu nome vem à mente, no entanto, um medo invade meu corpo ao
cogitar a ideia de que não fosse Phill que estivesse ali. Exatamente o mesmo
medo que tomou conta de mim no dia em que vivi o pesadelo de sequestrada.
Bobagem, Claire! Claro que é Phil. Quem mais entraria neste apartamento
além dele? Se fosse alguém mal-intencionado, decerto não tomaria um banho
antes de fazer alguma maldade, certo? – uso a lógica, tentando acalmar
minhas mãos que já suavam exacerbadamente.
Mas por vias das dúvidas, irei verificar.
Passo pela porta entreaberta e caminho furtivamente até a porta do banheiro,
que se encontra também entreaberta.
Quando coloco minha cabeça para dentro do lavabo, vendo o corpo molhado
atrás do box de vidro. Seus cabelos dourados estavam molhados, em tom
mais escuro, enquanto a água escorria de sua cabeça para o restante do corpo,
desaguando em suas nádegas firmes e perfeitas. Céus! Que homem gostoso!
Vejo suas duas esferas cintilantes me flagrar e desligar o chuveiro em
seguida.
— Claire! – escuto a voz grave e rouca reverberar. – Desde de quando está
aí?
— Desculpe! – Digo antes de puxar minha cabeça para o quarto. Ele pega
uma toalha e vem atrás de mim.
— Estava me espiando?
Rolo os olhos nas órbitas, pois realmente minha intenção a priori nunca foi
essa: “espiá-lo”. Me viro para encará-lo, cruzando os braços contra o peito.
— Você passa a noite toda fora, eu acordo, escuto alguém tomando banho no
quarto de hóspedes, penso que um maníaco pode ter invadido esta casa e eu
estou espiando o gostosão do meu falso marido? – ironizo.
Ele inspira fundo, pousando as mãos na cintura. Seus cabelos ainda estavam
ensopados, assim como seu peitoral. Puta merda! Aqueles ralos pelos em seu
peito estavam molhados e isso é absurdamente tão sexy.
— Perdão por não ter avisado.
— Onde estava?
— Acabei dormindo em casa... quero dizer, na minha outra casa. Tomei
cuidado ao despistar os seguranças de sua avó.
— Claro! – assinto, fingindo não me importar. – Faça o que quiser, desde
que cumpra sua parte no trato.
Se não era recíproco, me parecia ridículo ter que cobrar algo que não existe
entre nós. Giro meus calcanhares, suprimindo o desejo que tenho por esse
homem.
— Eu fui me encontrar com uma amiga ontem. — Ele admite atrás de mim. –
Eu precisava de sexo.
Por que ele está me dizendo isso? Já bastava eu ter feito tudo sozinha, agora
ele quer esfregar na minha cara dizendo que enquanto eu estava ralando feito
a gata borralheira, ele estava trepando com outra por aí? É muita audácia
mesmo.
Em seguida, explica:
— Cláusula 15: seja sincero com seu parceiro. Em hipótese alguma, esconda
a verdade.
Tento digerir o quanto isso me incomoda, porém trato de não demonstrar meu
desgosto, limito-me apenas em dizer:
— Satisfeito? – pergunto em tom calmo e compreensível.
Ele solta o ar violentamente e diz tom de confissão:
— Não. De alguma maneira essa noite não me satisfez.
Olho por cima do ombro, e encontro suas mandíbulas trincadas e seu olhar
duro, indecifrável. Engulo em seco com tamanha intensidade, tentando não
ceder à tentação de descer o olhar para o peitoral molhado e nu, mas
questiono:
— Por quê?
Ele continua me fitando daquela forma visceral, até seu olhar cair para o lado,
parecendo pensar bem na resposta, apertando os lábios. No entanto, ele
apenas diz meneado a cabeça de um lado para o outro:
— Eu não sei.
Suspiro estranhamente decepcionada com sua resposta. O que o meu
subconsciente queria exatamente ouvir? No fundo, eu sei como me sinto. E
para falar a verdade, eu cansei de ser sempre a pessoa que se apaixona
sozinha.
— Eu vou tomar banho... – titubeio – quero dizer... tomar café. Bom dia!
Fujo daquele quarto com uma profusão de pensamentos invadindo meu
cérebro de forma desordenada, e somente quando chego a cozinha, consigo
sorver uma boa quantidade de ar, imaginando se os próximos seis meses
serão assim.
CAPÍTULO VINTE E DOIS
Claire

A pedido de minha avó, Tom traz o maserati para a garagem do prédio, e eu


aproveito para dirigir até a academia de Martha novamente. Lá participo de
uma aula inaugural, e me interesso pelos ensaios para o novo festival de
música e de teatro de inverno.
De lá, fui novamente ao centro, e comprei mais algumas coisas para o lar:
pratos, colheres e mais roupas de cama, tentando esquecer por um momento
Phill.
— Esta parece muito confortável – a voz rouca familiar soa atrás de mim, me
assustando, enquanto analisava uma colcha branca de flores delicadas.
Viro-me com as batidas do coração desreguladas com o susto, e encontro o
homem em uma camisa despojada azul marinho. Merda. Como?
— Como... Como me encontrou? – pergunto, confusa.
Ele olha rapidamente para o lado, onde está dois dos seguranças que minha
avó havia “me emprestado".
— Claro! – expiro, tornando a olhar a colcha em minhas mãos. – O que veio
fazer aqui? – pergunto, em tom de desinteresse.
Ele se encosta na mesa ao lado, ficando descaradamente bem próximo ao
meu corpo, inclusive do meu rosto.
— Vim cumprir com meu papel de recém-casado – ele responde, soprando
aquele hálito inebriante e quente contra meu pescoço.
Olho rapidamente para ele e mudo de prateleira, abrindo uma colcha lilás,
sendo seguida por ele.
— Estou realmente tocada com seu interesse.
— Essa eu não gostei – Ele comenta sobre o edredom em minhas mãos,
ignorando meu deboche, e continua me seguindo e dando palpite em todas as
coisas que eu pego para olhar.
Quando a atendente volta do depósito com algumas colchas diferentes, ela
não consegue parar de olhar para Phill. Como se ele fosse algum tipo de ímã
para seus olhos. Na verdade, isso acontecia sempre quando saíamos em
público. A maioria mulheres, alguns homens também.
— Aqui estão, senhora. – Ela me entrega os pacotes e pergunta: — Seu
marido?
— Não – respondo ao mesmo tempo que Phill responde “sim".
Ela nos olha, confusa, e Phill explica:
— Somos recém-casados. Claire ainda não se acostumou.
— Ah, recém-casados! Que maravilha! Então quer dizer que farão uma ótima
compra hoje. – Ela se anima. – Temos uma colcha muito bonita ali: vermelha,
da cor da paixão; o fabricante a descreve como perfeita para apimentar a
relação.
— Oh, não! – paro a moça que se empolga com facilidade. – Não dormimos
juntos.
Ela franze a testa, arma uma expressão esquisita no rosto.
— Não me digam que vocês estão em crise? – ela pergunta, indiscreta. – Oh,
meu deus, tão cedo! Que triste. – No mesmo instante, ela fita Phill com
outros olhos, e poderia jurar que ela havia endireitado mais a postura, de
forma que o seu decote se acentuasse dentro da blusa.
— Não é isso – sorrio e pigarreio, comentando baixinho, como se fosse um
segredo: — É que meu marido está com um sério problema de flatulências.
Um problema sério no intestino, o coitado não consegue parar de soltar,
sabe? Durante a noite o caso fica insuportável e mal consigo dormir devido
ao fedor.
— Oh, meu deus! – ela exclama baixinho, olhando para as calças de Phill e
levando a lateral da mãos para o nariz, não mais insistindo em empurrar
colchas vermelhas que despertam tesão em recém-casados.
Phill permanece imóvel, com as mãos nos bolsos, me fitando com um olhar
condenador.
— Precisava disso? – ele sussurra enquanto andamos de uma prateleira para
outra.
— Eu estava com ciúmes, ela estava descaradamente dando em cima de você
– digo, segurado a risada.
— Depois dessa propaganda, ela não chegará nem perto.
Levo a mão a boca abafando o riso.
Acabamos fazendo uma boa compra e deixando várias atendentes felizes e
sorridentes.
Phill coloca as sacolas no porta malas do meu Maserati levante, e me escolta
em seu carro até em casa, assim Fred e Sean, os seguranças da minha família.
Quando adentramos o apartamento, com as compras nas mãos, temos uma
pequena surpresa. A senhora Elizabeth Sullivan, em nossa sala de estar,
parece estar nos esperando há algum tempo.
— Vovó?!
— Ah, meus queridos! – ela se levanta do sofá, caminhando em nossa
direção.
— Aconteceu alguma coisa? – pergunto, preocupada, enquanto ela me
envolve com seus braços cálidos.
— Claro que não, Claire. Só vim saber como estão! – ela se afasta um pouco
e abraça Phill. – Se estão precisando de alguma coisa. Se gostaram da casa...
Ela dá um passo para trás e digo, um tanto ressabiada com sua visita
repentina:
— Está tudo bem.
— Vejo que tiraram a tarde para fazer compras – ela diz olhando para as
sacolas. – Phill você conseguiu uma folga hoje?
— Phill não trabalha mais na Hill, vó! – respondo por ele.
— Sério, querido?!
Phill e eu nos entreolhamos, e ele responde:
— Sim. Pedi demissão ontem, senhora?
— Senhora não. Pode me chamar de vó.
— Tudo bem... vó.
— Mas estou curiosa para saber o que aconteceu, querido.
Ele pega uma boa lufada de ar, explicando muito bem:
— A empresa não vinha mais correspondendo com a forma que trabalho.
Achei melhor tomar essa decisão, antes que isso refletisse na gestão.
— Oh, querido! Sinto muito. – Vovó lastima.
— Não se preocupe, eu consigo outro fácil. – Ele continua atuando e tenho
que confessar que o safado é quase um profissional. Me preparo para entrar
em cena, no entanto, minha avó mesma se apressa em dizer:
— Por que não trabalha conosco?
— Oh, não quero me aproveitar... – Ele começa, mas minha avó é incisiva.
— Meu querido, não tem o que se preocupar. Você agora é esposo de Claire,
é como se fosse meu neto também.
— Minha avó tem razão, amor. Você pode me ajudar com a presidência, não
é vó?
— Ótima ideia, querida. Com um profissional experiente ao seu lado, ficaria
muito mais tranquila ao me aposentar da Sullivan.
— Então... – me direciono a Phill: — Você aceita?
Ele faz uma pausa dramática, e sorri sem jeito dizendo:
— Como poderia recusar com as senhoritas me pedindo assim?
Os olhos de minha avó brilham como eu nunca havia visto.
Que safado! Não é que ele um ótimo ator? – penso soltando fogos de
artifícios, me vendo dando tchau para aquele escritório chato. Ou pelo menos,
dando um até logo.
— Maravilha! – vovó diz ao meu lado. – Claire, leve seu marido a Sullivan
quarta-feira! Eu encontro com vocês lá...
— Quarta-feira, vó? – indago, choramingando.
— Sim, quarta-feira. Perdão, Phill, mas preciso de Claire na Sullivan logo. –
Ela direciona a palavra a Phill, e depois me fita: – Já que se irá ocupar meu
lugar, acho bom você se acostumar o recesso de fim de ano.
— Recesso de fim de ano? Vó, me dá um desconto. Eu acabei de casar, nem
viajamos e tenho várias coisas para fazer aqui...
— Eu sei, querida, mas...
Em um ímpeto, antes que ela dissesse qualquer coisa, contra-argumento:
— Tive uma ideia. E se Phill ocupasse a presidência por um tempo, até que
nossas coisas se ajeitem por aqui?
Minha avó parece digerir o que disse e refletir a ideia, me deixando ansiosa
pela sua resposta.
— Até que essa ideia de afastamento não me parece uma má ideia. Phill é
qualificado e experiente, poderá te ensinar melhor do que eu quando você
voltar a Sullivan. – Ela se vira para Phill e diz: — Eu confio grandemente em
sua índole, meu querido. – E depois abre os braços animada: — Então por
que, não?
Vibro muito por dentro, mas apenas me contenho ao dizer com um sorriso
largo nos lábios.
— Maravilha!
— Agora deixem-me ir que não quero atrapalhar mais a lua de mel de
ninguém – ela diz me dando dois beijos, um em cada lado do rosto, fazendo o
mesmo com Phill. – Quarta-feira esteja na Sullivan, querido!
— Ok! – Phill assente, enquanto vovó caminha a porta da sala em seus saltos
plataformas, balançando a mão no ar.
— Ótimo. Se amem bastante esta noite, queridos! Esse momento é único,
usem e abusem da jovialidade – ela nos joga uma piscadela e enrubesço
levemente.
— Vó.
— Bye Bye! – ela some pela porta de entrada, e tudo o que havia sobrado era
o silêncio e os meus pensamentos.
— Puta merda, nós conseguimos! – murmuro baixinho antes de explodir de
felicidade e pular em cima de Phill, enlaçando minhas pernas em seu tronco e
sacudindo meu corpo: — PUTA MERDA, NÓS CONSEGUIMOS.
Em seguida, recuo, dizendo ainda sobressalta:
— Desculpe. Me empolguei.
Ele me lança um sorriso de lado elogiando:
— Você foi ótima. Confesso que pensei que iria dar mais trabalho para sua
avó confiar a presidência a mim.
— Sabe o que é isso? Talento.
Ele ri, questionando:
— Para mentira?
— Não, atuação.
— Não deixa de ser uma mentira – ele reflete.
Mostro a língua para ele e depois digo aos brados:
— Ah, meu deus! EU ES-TOU LI-VRE – grito para o universo, olhando para
cima e abrindo os braços, rindo à toa.
CAPÍTULO VINTE E TRÊS
Claire

Com o passar dos dias, tudo ia se encaixando perfeitamente bem.


Phill havia assumido a presidência da Sullivan, ganhando elogios não
somente de minha avó, mas de todos os colaboradores. Definitivamente, o
sonho de minha avó estava se realizando, não como ela havia planejado, no
entanto, finalmente ela poderia se afastar tranquilamente da Sullivan com um
profissional como Phil em seu lugar.
Enquanto isso, eu visitava as aulas de teatro da academia senhorita Martha,
reencontrando colegas de adolescência que nunca desistiram do teatro.
Eu estava tão ansiosa pelo festival de inverno, que mal poderia esperar para
estrear no palco de Tennessee Performing Arts Center. Meus olhos ardiam só
de pensar no calor dos holofotes sobre o palco e o quão especial seria em
mostrar nossa leitura da obra magna de Shakespeare, Hamlet Romeo y
Julieta.
Interpretarei a ama de Julieta, que será interpretada por Khlóe, uma das
alunas mais experientes da academia. Os ensaios estavam fluindo com tanta
naturalidade, que dificilmente algo poderia dar errado.
— Tenho que admitir você ficou ainda mais linda – Martin elogia enquanto
caminhamos para a porta de saída da academia, ao lado de outros alunos
também que se dispersavam em polvorosa depois ensaio.
Martin e eu nos conhecemos há alguns anos aqui na academia de teatro,
quando ainda estávamos no auge de nossa adolescência. Ele sempre foi um
rapaz gentil e na época namorava uma garota chamada Taylor, que apenas
usava saias e salto alto.
Ele ficou com o papel de Romeo, escolha tão merecida quanto a de Khlóe.
— Você está de carro? Posso te dar uma carona – Martin oferece, e,
gentilmente, recuso:
— Não precisa. Obrigada!
— Eu insisto! – ele diz enquanto passávamos pela guarita.
— Quem te viu, quem te ver, Martin! Todo galante para o lado da novata.
— Não precisa mesmo. Talvez em outra oportunidade.
Phill havia combinado de me buscar hoje, já que o pneu do meu carro havia
estourado no dia anterior. É sexta-feira, e ele prometeu fazer um esforço para
sair trinta minutos antes para que desse tempo de vir me buscar; então achei
melhor dispensar a carona de Martin.
— Nossa senhora das calcinhas molhadas, de onde esse deus grego surgiu? –
Ruthe, uma colega de turma exclama para as outras atrás da gente.
Procuro por aquele que havia impressionado Ruthe, e deparo-me com ele,
recostado no capô do Porsche prata, distraído, fuçando algo no celular. Noto
que ele usa um terno azul, calça grafite e um óculos escuros Ray-Ban aviator,
fazendo o tipo gostosão nova Iorquino, só que avulso nas ruas de Nashville.
Tenho de confessar que meu falso marido era um espetáculo de homem. Eu
até já havia me acostumado com os olhares de mulheres, as quais eu não
julgava de modo algum.
Até eu quando estou tomando café pela manhã e ele passa em minha frente
confortavelmente de short e camiseta, fico me perguntando se a beleza desse
homem é desse mundo.
Phill retira os óculos escuros do rosto quando me avista, com o ar de
soberania de um legítimo lorde inglês, acenando com um menear rápido de
mão:
— Com licença! Até quinta-feira, Martin. – Despeço-me, e sou surpreendida
pelos braços de Martin que me envolve em um abraço apertado.
— Até amanhã... Claire.
Timidamente, sorrio e me afasto enquanto ele se despede.
Caminho em direção a Phill enquanto escuto os últimos cochichos audíveis
atrás de mim: “A novata conhece esse gato?! ... Será que ela precisa de uma
nova amiga? ”
Phill também vem ao meu encontro e me surpreende com um beijo demorado
em minha bochecha, fazendo todas as minhas entranhas estremecerem com
um simples beijo.
O que deu nele? Por que de repente está tão carinhoso? – reflito aturdida.
— O que está fazendo? – murmuro.
Ele encara Martin que passava ao nosso lado, com o semblante mais soturno
do que o normal; e depois olha para o lado, fitando os seguranças de minha
avó do outro lado da calçada.
— Faz tempo que não damos essa cena a eles –, ele diz se referindo aos
seguranças, com um meio sorriso nos lábios.
Ah, Phill! Você só tenta me enganar. – Penso sorrindo de volta e caminhando
em direção à porta do passageiro.
Entro no carro e tão logo ele dá partida.
Enquanto ele dirige pela cidade iluminada pela tonalidade alaranjada do
crepúsculo, me dou conta de que estou observando descaradamente Phill, que
está tão sexy com uma mão no volante e a outra na têmpora, com o cotovelo
apoiado na porta ao lado.
— O que foi? – sua voz rouca reverbera, sem desviar os olhos do trânsito.
— Nada. – Recuo lentamente, tornando a olhar para frente.
— Quem era aquele cara? – ele pergunta, e escondo um pequeno sorriso
vitorioso nos lábios.
— Que cara? – indago, a fim de instigá-lo mais.
— O cara que te abraçou em frente ao teatro. – Ele desvia o olhar para mim
pela primeira vez rapidamente e tão logo torna a encarar o trânsito.
— Martin? Ah, um velho amigo de turma.
— Ele sabe que está casada?
— Não, por quê?
— Nada. As pessoas gostam de saber dessas coisas.
— Não vejo a necessidade de dizer. Até porque Martin e eu somos apenas
amigos.
— Não sei você, mas pelo que notei, ele não a vê como apenas uma simples
“amiga”.
— Como assim?
— Fique atenta! – ele diz, encerrando o assunto, apertando os lábios.
Isso foi uma ordem, um alerta ou uma recomendação?!
Será que ele viu algo que eu não vi? Ou apenas se incomodou com a
concorrência? – Pergunto-me, quebrando a cabeça com suas palavras, e tão
logo desisto. Oh, Phill, por que tão complicado!?
Como se ele tivesse escutando minha mente, suas mãos resvalam sem pudor
para minha perna desnuda.
Ele move as pontas dos dedos em minha pele, acariciando ali e me fazendo
arrepiar em lugares inimagináveis. Ele faz isso em movimentos lentos e
circulares, me provocando no baixo ventre uma combustão quando ele sobe
um pouco a barra do meu vestido. Ofego, e ele tira suas mãos de mim,
tornando a apertar o volante.
— Nunca, sob hipótese alguma, deixe-o tocar seu corpo assim.
— E se eu quiser que ele toque meu corpo? – Provoco.
Um silêncio sepulcral se faz.
Vejo ele crispar os lábios e ele dizer em seguida, nada amigável:
— Eu me referi caso você queira. Em outro caso, se fizer qualquer coisa
contra sua vontade, eu quebro todos os ossos dele.
Pelo tom de voz, algo me diz que aquelas palavras não eram apenas um mero
pleonasmo, nos colocando em um clima desconfortável.
O desconforto é interrompido pelo barulho violento de uma moto que nos
corta, e em seguida, diminui a velocidade de forma que ficasse ao lado da
janela de Phill, na mesma cadência de seu Porsche.
Phill olha para o lado e fica assim por quase longos cinco segundos, como se
conhecesse quem estava atrás do intenso fumê do capacete.
Ele torna a fitar a avenida a frente com seu mesmo semblante inexpressível,
afundando o pé no acelerador, injetando uma dose alta de adrenalina em
minhas veias.
Quando o carro atinge uma velocidade perigosa, aperto a baia do meu vestido
com o coração na mão.
— O que está acontecendo? – pergunto a Phill, extremamente concentrado
em deixar aquela moto para trás. – Você o conhece? – insisto, porém sem
obter respostas.
Entre uma manobra perigosa e outra, por pouco Phill não encosta na traseira
da moto em nossa frente; o que devo saber que é suficiente para ser fatal para
o motoqueiro que está mais vulnerável.
Depois de se recuperar do susto, o motoqueiro de preto acelera em uma
velocidade surreal quando adentramos a ponte suspensa, me deixando ainda
mais aflita com isso.
— Phill...
— Não há o que se preocupar. – Ele está impassível ao lado, com aquela
velha e maldita calma enquanto nos conduzia em uma velocidade insana.
Olho pelo retrovisor, e vejo a Land Rover preta logo atrás de nós.
No instante que olho para frente, vejo o motoqueiro diminuir a velocidade em
uma distância considerável a que estamos e dá a volta, parando exatamente
no meio da pista, levando Phill a frear bruscamente.
Quando o carro estanca completamente, meu corpo dá um pequeno solavanco
para frente.
Fico estática por alguns segundos e observo o motoqueiro, ainda cima da
moto, levantar o capacete. E, bem... Não se tratava de motoqueiro... mas sim
de uma mulher.
Ela tem cabelos curtos e castanhos, as pontas levemente onduladas e
douradas. Seu ar é selvagem e seu olhar sombrio como o de Phill, que aliás,
está a encarando por trás do para-brisa neste momento.
Ela desce da moto e tão logo vejo os seguranças de minha avó também
descendo do carro atrás, apontando as armas para a jovem mulher, a cercando
em nossa frente.
Phill imediatamente abre a porta ao lado, e quase no mesmo segundo, faço o
mesmo, me colocando para fora do carro, andando pelo asfalto até onde o
ponto de tensão havia se formado.
— Que merda é essa? – escuto a mulher murmurar para Phil, sob a mira dos
revólveres de Fred e Sean.
— Tudo bem, pessoal! Ela é minha irmã – Phill diz, pedindo para que
abaixem as armas.
Em seguida, Fred me lança um olhar avaliativo, e eu assinto:
— Tudo bem, Fred!
Eles abaixam os revólveres e torno a observar aquela mulher, que espera as
armas abaixarem completamente para manchar em direção à Phill e lhe dá
uma forte bofetada no rosto.
— Seu idiota! Eu quase fui ao chão – Ela rosna.
Com a intensidade com que a mão dela encontrou o rosto do meu falso
marido, sua cabeça caiu para o lado, com as veias sobressaltas no pescoço.
Ele ergue o rosto, com a postura impassível inabalável.
— “Minha irmã”?! – repito murmurando ao seu lado.
E, por fim, direciono meu olhar a mulher de preto a minha frente, que faz o
mesmo, me examinado de cima a baixo:
— Alexa. – Concluo.
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
Claire

— Espere um momento, meu cérebro travou. Se não são irmãos de sangue, e


Alexa não é adotada, como... – fico confusa ao perguntar.
— Phill e eu nos conhecemos há muito tempo em um orfanato ligado a um
convento.
Depois de todo aquele estresse, acabei convidando Alexa para tomar algo em
nosso apartamento.
Phill parecia meio relutante com meu convite, apesar de não verbalizar, mas
também não se opôs.
— Vocês cresceram em um convento? – desço o olhar para as roupas
rebeldes de Alexa e a forma irreverente como ela se senta de pernas abertas
na cadeira.
— Por que a surpresa? – Phill indaga enchendo mais um copo de Whisky;
enquanto Alexa dá um gole espesso da cerveja no copo em sua mão. Com
certeza, eles parecem muito diferentes, mas iguais ao mesmo tempo.
— Porque... porque – me enrolo. — Porque digamos que não é algo comum.
Quantas pessoas eu conheço que foram criadas por freiras? – Questiono, e eu
mesma respondo: — Apenas vocês.
— Caleb também foi criado neste mesmo convento – Phil complementa, me
deixando reflexiva.
— Espere um momento, meu cérebro travou outra vez. E por que chama
Caleb de primo? Não deveria chamá-lo de irmão como Alexa?
Ela e Phill se entreolham, antes de que ele me responder:
— Caleb e eu temos o mesmo sangue, somos primos legítimos.
— Como? Sua mãe e sua tia abandonaram... – mordo a língua quando vejo
que cruzei a linha da indelicadeza. – Perdão... eu não queria... sabe...
— Tudo bem. – Phill enche os pulmões e depois expira: — É uma longa
história.
Alexa olha para Phill por um instante ao seu lado, dá uma cotovelada gentil
em seu braço como se já soubesse de toda a história há muito tempo, o que
deixa estranhamente enciumada por ela saber mais do que eu.
Ela toma mais gole espesso da cerveja e nos olha em seguida.
— Estou intrigada. Conhecem tão pouco um sobre o outro, mas se casaram
tão rápido. Aí tem coisa... – Alexa diz.
— “Aí tem coisa”? Como assim? – pergunto fisgando uma batatinha frita que
peguei em cima do prato na bancada e mastigo concentrada no que Alexa tem
a dizer, disfarçando meu leve incômodo com seus olhares persistentes sobre
minhas mãos e pernas, como se quisesse capturar algum sinal de nervosismo.
— Eu conheço Phill o bastante para saber que ele não faz o tipo que se casa
repentinamente. Ou melhor, eu duvidava muito que algum dia que ele fosse
firmar um compromisso sério depois de tanto tempo.
— As pessoas mudam, Alexa. Meus gostos já não são mais os mesmos, assim
como os seus não são.
— Concordo. – No entanto, ela replica: — Mas não subitamente.
Ele inspira fundo e diz sem gentileza:
— Acredite se quiser.
— Então ficarei com a opção de não acreditar.
— Ótimo -, Phill dá de ombros.
O som da campainha recende pela primeira no espaço desde que nos
mudamos, e Phill me encara com aquele tipo de olhar que conheço bem. O
som dispara mais uma vez, e na terceira tentativa, Alexa pergunta:
— A campainha está tocando, vocês não vão atender? – sinto ela estudar
nossos rostos.
Droga. Quem seria uma hora dessas?
— Eu vou atender – digo saltando da banqueta enquanto Phill me segue com
o olhar.
Saio da cozinha e cruzo a sala, rezando para que não seja minha avó, já que
ter que fingir na frente dela e Alexa, não me soava uma boa ideia.
Conto até três e abro a porta, dando de cara com o loiro de 1.75 de altura.
— Matt? – indago, surpresa e um pouco aliviada, mas ainda tensa.
— De todas as recepções que eu esperava, essa foi a mais estranha.
Pisco duas vezes. Merda! Eu devo estar com uma expressão de espanto
marcada no rosto.
— Aconteceu alguma coisa? – ele pergunta.
— Não, não aconteceu nada. – Respondo, nervosamente.
— Não vai me convidar para entrar? – ele espia por cima do meu ombro. –
Há algo de errado, Claire? – me inquiri um pouco mais sério.
— O quê? Claro que não – balanço a mão no ar e digo: — Entre logo! –
sorrio, dizendo, alisando o tecido do vestido.
Seja o que Deus quiser.
— Eu acho que eu deveria ter avisado, mas já faz uma semana desde o
casamento e estava curioso para saber como estão as coisas.
— Você não foi ao escritório do tio Ben hoje? – pergunto, caminhando em
seu encalço, balançando levemente os braços descontraidamente.
— Sim. Acabei de saí de lá. Hoje foi foda!
— Que ótimo – sorrio, não entendendo muito bem o que ele acabou de dizer.
Ele para e me olha.
— Claire, tem certeza de que está bem?
— Eu?
— Uhum.
— Estou ótima. Por quê?
Ele estuda meu rosto com seus olhos avaliativos, dizendo gesticulando com a
mão:
— Sei lá... Está tão “sorridente”...
— Eu não costumo sorrir? Não sabia que aparentava ser uma pessoa
deprimente. – Brinco.
— Sei lá... seu sorriso está diferente. Onde está seu marido? Phill. Não me
diga que ele está te oferecendo drogas?
— Drogas!? Claro que não. Phill nunca faria isso!
Ele ri, se divertindo.
— Eu sei, bobinha. Só estou tirando com sua cara.
— Vá se danar, Matt Sullivan!
— Que barulho é esse? – ele apura os ouvidos, perguntando: — Estão com
visitas?
— Ah! É só a irmã de Phill. Ela veio nos visitar.
— Irmã? Estranho, nunca soube de nenhuma irmã de Phill. – Matt enruga o
cenho. — De qualquer forma, vou dar uma olhada. Vai que ela é gata. Onde
estão? Na cozinha? – ele anda em direção ao outro lado da sala. – Onde é que
fica a cozinha?
— Matt... – começo elaborar uma boa desculpa para ele ir embora, no
entanto, ele acaba encontrando a porta da cozinha antes disso, avistando
Alexa e Phill na bancada em uma cena descontraída de irmãos.
Phill abraça Alexa e esfrega o punho fechado em cima da cabeça dela,
enquanto eles riem feito crianças. Nunca havia visto Phill assim: relaxado e
gargalhando, sem a armadura do homem sério e obstinado que vive comigo
vinte e quatro horas.
Se Phill não me dissesse que Alexa é sua irmã, afirmaria fácil que havia uma
certa química entre eles.
Eles param quando nos percebem na entrada da cozinha. Phill toma
novamente sua banqueta, e Alexa dá um último gole espesso da cerveja em
seu copo.
— Matt. – Phill o cumprimenta.
— E aí, cara!? – Matt o responde, com os olhos em cima de Alexa. – Eu
conheço você.
Alexa fixa o olhar em Matt e indaga:
— Deve estar enganado. Nunca te vi na vida – ela diz, desinteressada.
— Você flagrou minha bunda em 2008. Eu lembro muito bem, seu cabelo era
mais comprido; mas o rosto, o mesmo. Se não me engano, você foi buscar
alguma coisa com Phill no acampamento e invadiu nosso quarto. Era você!
Alexa inclina a cabeça para o lado, como se recobrasse algo em sua mente e
dispara:
— Não me diga que aquela bunda branquela ridícula era a sua?
Matt gargalha, aproveitando a deixa:
— Ela está bem mais bonita atualmente. Se quer quiser dá uma olhada,
estamos aí! – ele joga uma piscadela para Alexa, que espreme uma careta.
— Que nojo. Prefiro comer estrume.
Matt gargalha novamente, sem malícia, e fica ali fazendo perguntas Alexa
que revida com sarcasmo. Levando-me a questionar se foi ela quem aprendeu
ser sarcástica com Phill ou foi ela quem ensinou ele.
— Esse apartamento é muito foda, Phill – Alexa diz olhando cada canto da
cozinha. – Parabéns. Esse superou o último.
— Gostou? – Matt se intromete na conversa. – Foi eu e minha avó quem
escolhemos. Foi um presente de casamento.
Alexa olha para Phill e diz:
— Pensei que fosse você que tivesse comprado. O que você fez com o outro?
— Caleb ainda mora lá.
— Ah, claro. Caleb.
Ela torna a me olhar e exclama, enchendo o copo novamente:
— Quer dizer que você é uma bacana também?
— “Bacana” do tipo legal?
Vejo Phill abrir um meio sorriso silencioso.
— Não. “Bacana” do tipo cheia da grana, montada na bufunfa.
Mordo o canto do lábio, pensando em algo legal para responder:
— Então não sou tão “bacana”. Sou apenas neta de uma “bacana”. No fim
das contas, não tenho tanta bufunfa assim.
— É tão bonito rico se fazendo de humilde.
Phill se intromete, dizendo:
— Está tarde. Que tal voltar para casa, Alexa?! – ele sugere, gentilmente.
— Eu posso deixar você – Matt se voluntaria.
Ela cruza os braços contra o peito e diz baixinho a Phill sobre Matt:
— Acho que esse santo quer rezar.
Matt solta uma risada sonora.
— Se “rezar” é se conhecer, eu estou disposto fazer a essa reza – Matt
comenta, cheio de segundas intenções. Quem te viu, quem te vê, Matt
Sullivan; penso me divertindo com as investidas do meu primo.
Agora é a vez de Phill dizer:
— Acho que você não aguentaria a pressão dessa reza.
É o suficiente para minha cabeça começar a criar várias interpretações da
ambiguidade do comentário de Phill.
— Como sabe tanto dessa reza? – indago Phil, quebrando todo o clima de
descontração.
Recebo os olhares de todos ali e um silêncio progride. Todo o humor havia
desaparecido.
— Eu acho que vou indo – Alexa se levanta e acena para gente. – Obrigada
pela recepção. – Ela me agradece, enquanto Matt faz o mesmo e sai ao lado
de Alexa, prometendo voltar qualquer dia.
Quando finalmente ficamos a sós na cozinha, indago:
— Já transou com sua “irmã”? – Questiono enquanto ele me ajuda a tirar os
copos e pratos da bancada.
Ele para e me olha como se eu tivesse o ofendido.
— Por que está perguntando isso?
— Me pareceu bem próxima a relação de vocês.
— Céus! – ele pousa a mão na cintura olhando para cima, soltando o ar com
força.
— Então... transou ou não transou?
— Isso é incesto.
— Você mesmo disse que não são irmãos de sangue...
— Nós crescemos juntos...
— O que não significa nada. Há várias pessoas se apaixonam assim. Alexa é
uma mulher bonita, esperta e atraente. Aliás, eu senti uma química entre
vocês. – Não consigo parar de falar.
— O que foi? Está ciúmes? – Ele fica em minha frente, me desafiando a
encará-lo assim tão de perto.
Não dei para trás e fiquei ali, aceitando o desafio.
— E você? Ficou com ciúmes hoje? Acho que aceitarei a carona de Martin
amanhã –, provoco-o. Eu já estou cansada de Phill ser sempre o garanhão da
história que sai para flertar por aí.
— Você não faria isso – ele grunhe, olhando fixamente para minha boca.
— Quer apostar?
— Sabe o que você precisa? – ele indaga, subindo os olhos para os meus.
— O quê?
— De uma lição – ele diz puxando meus quadris contra o seu corpo.
Diferente dos seus olhares impassíveis, suas írises esverdeadas pareciam estar
fumegando uma energia lasciva que se alastrou por todo o meu corpo,
enquanto sua mão estar espalmada com firmeza no meio da minha lombar,
pressionando todos os meus músculos frontais contra os dele, me arrancando
um ridículo arquejo quando o sinto duro feito dentro das calças. Ele lambe o
canto dos lábios rapidamente, compenetrado em minha boca. Céus! Inspiro
fundo mais uma vez tentando me livrar do controle descomunal que esse
homem exerce sobre o meu corpo.
— Eu não sou sua criança para você me dá uma lição – reúno um pouco de
altivez para retrucar.
— Tem razão, você não é minha filha. No entanto, é minha esposa.
— Falsa esposa -, lembro a ele, inclinando minha coluna para trás, que
deveria encurvada como um arco.
Ele desce a mão para minha coxa, me ascendendo completamente. E, em
seguida, me diz com aquela maldita voz rouca cheia de tesão:
— Meu sonho é ter uma criança. Que tal fazermos filhos também? Assim, a
mentira fica completa. – Ele diz, completamente fora de si.
Ele me toma com seus lábios cálidos, invadindo minha boca com sua língua
quente. Tudo acontece tão rápido e demoro a processar o que está
acontecendo. Suas palavras, olhar e beijo. Como assim Phill tem o sonho de
ter uma criança – meu cérebro não processa isso muito bem.
Na verdade, já não estava mais funcionando direito com sua língua em minha
boca, com suas mãos percorrendo minhas pernas por baixo do vestido, até
apertar meu bumbum. Gemo em satisfação.
Ele ergue meu corpo na bancada atrás e se coloca entre o meu meio, me
elevando a um alto nível de tesão quando ele diz baixinho com a voz quase
rasgando:
— Não irei perdoá-la hoje, Claire. – Ele diz colando nossas testas, roçando
nossos corpos lentamente. Minha boca alcança seu pescoço e
involuntariamente chupo ali. – Porra. Isso é muito gostoso – ele grunhe.
Sorrio em contentamento ao pensar que eu também tenho poder sobre seu
corpo. Faço isso mais uma vez, desabotoando sua camisa social branca,
enquanto ele beija meu ombro e aperta minha bunda tão força como se fosse
sua propriedade.
No entanto, estanco meus dedos afoitos quando avisto a marca de batom
vermelho escondido embaixo da gola de sua camisa.
Phill continua subindo seus beijos e chupadas para o meu pescoço. Ele estava
com outra mulher? Oh, céus! Nós não temos nada, é claro que é possível ele
ter estado com outra mulher... Mas quando exatamente? Ele passou o dia
todo na Sullivan.
Aquelas dúvidas giravam como um espiral em mente, enquanto espalmei
minha mão contra seu peito e empurrei seu corpo para longe do meu.
Ofegante, ele pergunta, analisando cada expressão do meu rosto:
— O que houve?
Sei que não deveria me sentir assim, mas é inevitável. Como uma chama que
se apaga depois de um balde de água fria.
Depois de ir a cama com Phill, eu serei apenas mais um de seus
passatempos? A diferença seria que eu teria que olhá-lo todos os dias e
fingir que nada aconteceu?
Quando estamos tomados pelo desejo, não pensamos muito bem o que vem
depois dele. Na verdade, nestes momentos, não pensamos em nada além de
saciar o desejo a qualquer custo. No entanto, ver aquela mancha de batom,
em meio a minha vulnerabilidade, me fez perceber a besteira que eu estava
prestes a cometer.
— Eu não consigo.
Pulo de cima da bancada e sou sucinta ao dizer:
— Acho que vou subir para o meu quarto. Boa noite.
Deixo-o ali com sua confusão, no entanto, ele não diz uma sequer palavra,
apenas me observa se afastar.
Adentro meu quarto e tão logo coloco-me no banheiro, entro no box e ligo o
chuveiro, acertando meu corpo com o jato de água fria, ensopando meus
cabelos e vestido, tentando assimilar que eu acabei de recusar o que venho
desejando tanto nos últimos dias.
Eu fiz certo. – Murmuro repetindo comigo como um mantra, embrenhando os
dedos em meus cabelos completamente inundados, rechaçando a ideia de
voltar à cozinha e terminar o que começamos. – Eu fiz certo – murmuro outra
vez.
CAPÍTULO VINTE E CINCO
Claire

Estou a quase meia hora presa em um engarrafamento no centro da cidade,


tentando chegar a uma loja de figurinos perto do prédio da prefeitura da
cidade. No entanto, pelo andar da carruagem, acho que passarei pelo menos
mais quarenta minutos naquela avenida lotada de carros.
Ainda pela manhã, Sean levou meu carro para consertar, assim eu não
precisaria da ajuda dos meus seguranças para me locomover, e muito menos
dele, Phill.
Aperto as mãos no volante me lembrando do episódio da noite passada, os
beijos quentes e a marca de batom em seu colarinho.
Ele anda se encontrando com outra mulher? Ou era apenas a mesma? – As
dúvidas retornam nublando minha mente.
Ou pior, a dona do batom trabalha na Sullivan? Ele não faria isso –
resmungo baixinho – ou faria?
De repente, essa ideia gruda em minha mente e não paro de pensar nisso, já
que não vedei expressamente essa situação em nosso contrato.
Olho para ruela ao meu lado, lembrando que o prédio do escritório da
Sullivan fica aqui perto. Não penso duas vezes e dobro a direita, desviando
do engarrafamento e pegando a outra avenida livre, em direção à Sullivan.
Se ele estivesse de caso com alguma funcionária, chegar de surpresa teria
uma alta possibilidade de pescar alguma coisa no ar.
Passei pela guarita do prédio e dei logo de cara com um dos antigos
secretários de minha avó, Robert, que parecia dar uma pausa para o café no
saguão.
— Boa tarde, Robert.
— Boa tarde, senhorita. – Curioso, ele pergunta: — O que lhe traz aqui?
— Meu marido está aqui?
— Phill? Sim. Provavelmente lá em cima, na sala da presidência.
— Obrigada, Robert. – Agradeço gentilmente e subo pelo elevador central do
prédio.
Quando a adentro o salão da Sullivan, o único som que escuto são dos meus
saltos altos fincando o chão enquanto recebo olhares discretos e silenciosos
dos funcionários ali.
— Boa tarde – cumprimento o grupo de administradores na sala ante a aérea
a diretoria.
— Boa tarde, senhorita – dois deles me respondem quase em uníssono,
parecendo surpresos com minha visita repentina.
Adentro a área da secretaria, que, aliás, se encontra deserta. Então não penso
duas vezes e coloco minha mão em cima da maçaneta da sala da presidência.
Desço a peça de metal com cuidado, abrindo a porta e me deparando com
aquela cena no mínimo suspeita.
Suspeita não, está mais que explícita.
A loira alta curvilínea está na frente de Phil, que se apoia na mesa de ébano
atrás.
Joice está quase colada ao corpo do meu marido, com a boca a centímetros do
seu pescoço e as mãos cravadas em seu colarinho.
— Claire? – escuto a voz grave reverberar, enquanto vejo Joice, secretária
que minha avó havia contrato nas últimas semanas, se virar e me notar ali.
Não tivemos muito contato, mas o pouco que observei nos dias passei aqui,
ela me pareceu uma mulher muito fogosa.
— Estou atrapalhando? – Sou incisiva.
— Ah, meu deus. Claire! – Joice exclama. – Não é nada disso que você está
pensando...
— Não estou pensando nada. Apenas me deixe a sós com meu marido, por
favor.
Ela ajeita a postura, se afastando de Phill e saindo pela a porta ao meu lado,
enquanto fulmino meu falso marido com o olhar.
— É sério? Na Sullivan? Com a secretária? Há quanto tempo está transando
com ela?
Ele desce as mãos para os bolsos, dizendo com a mesma calmaria
insuportável inerente a ele:
— Não houve nada.
Aperto os lábios antes, detestando ter que falar essa frase novamente:
— Não é o que parece. Vocês pareciam bem próximos.
Ele acaricia com o dedo indicador o lábio inferior, me respondendo:
— Não parece. Somos próximos. – Que audácia! – Afinal, ela é secretária
exclusiva da presidência. Você sabe disso.
— Aí você aproveitou o ofício e está transando com ela nas horas vagas?
— Não estou trepando com ninguém nos últimos dias. Muito menos com a
secretária. – Ele parece se irritar. – Acha que eu seria tão burro de trair a filha
da dona da empresa com sua secretária? Por favor, Claire.
— E o que ela estava fazendo grudada em seu pescoço?
— Ela estava ajustando a porra da gravata. Eu não pedi, mas ela sempre
insiste.
— Ah, claro, aposto que adora quando ela aproveita para esfregar aqueles
peitos em você...
Ele leva o dedo indicador a têmporas esquerda, parecendo perder a paciência
comigo.
— Direi a ela nunca mais toque em minha gravata, ok?
— Ok.
É o mínimo que ele pode fazer. Se quiser sexo, que procure bem longe daqui.
Principalmente, bem longe dos olhares de minha família.
— Tenho uma reunião com alguns clientes agora.
— Eu vou com você – afirmo.
Ele vai atrás da mesa para pegar algo, me olhando de soslaio e aquiescendo,
dando de ombros.
— Tudo bem.
CAPÍTULO VINTE E SEIS
Claire
Estávamos na sala de reuniões, recebendo um dos nossos principais clientes:
John Sang, da rede hoteleira cujo o nome tem seu mesmo sobrenome. O
senhor com traços asiáticos parece supervisionar o homem mais jovem que
arrisco dizer que é seu filho. E nossa, que espetáculo de filho! O senhor Sang
caprichou.
Sabe aqueles atores asiáticos altos e estilosos que se ver por aí na internet e
em séries? Ele é tudo isso e mais um pouco.
— Senhor... – John enruga o cenho, como se quisesse lembrar do nome de
Phill.
— Você sabe quem eu sou. – Ele Phill responde sério e com um meio sorriso
impecável no rosto.
— Você conhece o senhor Sang? – sussurro ao seu lado, no entanto, John
parece dispor de uma audição invejável por muitos jovens.
— Phill já trabalhou conosco. – Seu Sang diz, unindo as mãos e encarando
Phill como se estivéssemos em uma zona de conflito de alguma cena no
faroeste. – Não imaginei quando sairia de Nova Iorque para fechar negócio
com minha velha amiga Elizabeth, me depararia com você.
— Como dizem por aí, o mundo é pequeno, John. – Phill responde
amigavelmente.
Apesar do clima de tensão, isso não atrapalhou nem um pouco quando Phill
começou a tratar dos Negócios. Muito pelo contrário, é visível a confiança
que John tem em Phill quando ele estar falando sobre preços, números e
mercado. Definitivamente, eu não encontraria alguém melhor para estar no
lugar de minha avó.
Em dado momento da conversa, o olhar de Matthew, filho de John cruza o
meu, e tenho a impressão de que um flerte se inicia quando o Seu John
começa a tratar das suas expectativas sobre as compra e exportação de nossa
obra prima para a América do Central, onde ele estar planejando erguer
novos resorts.
Matthew desce o olhar para o meu decote e sinto que vou engasgar com
saliva, no entanto, meu coração gela quando a mão cálida de Phill toca a
superfície e o interior de minha coxa.
Pego sua mão e a retiro sem cerimônia de cima de mim. Porém ele agarra
minha mão, embrenhando nossos dedos e as pondo em cima da mesa, de
forma de Matthew possa ver.
John observa e comenta:
— Essa bela moça ao seu lado...
— Ela é minha esposa -, Phill sorri para mim.
— Sou neta de Elizabeth Sullivan. – Acrescento.
— Então é uma Sullivan? – ele nos examina com o olhar. – Confesso que
estou surpreso, não sabia que Phill é casado e muito menos com uma
Sullivan.
É claro que ele não sabia.
— Pois é, John. A vida tem dessas.
Phill lhe lança outro sorriso comedido, não soltando minha mão mais nem
por um momento até reunião acabar. Estragando completamente o clima
entre Matthew e eu. No entanto, não me importei muito pois uma hora ou
outra o filho de John saberia que sou casada que sou casada com o cara ao
lado, e para fins legais, não sou uma mulher livre e desimpedida.
E para falar a verdade, eu estou nem um pouco a fim de paquerar alguém
neste momento. Só me agradava a ideia de Phill saber que ele não é o único
homem por quem sinto atração, apesar de ele ter dominado quase todos os
meus pensamentos ultimamente.
No início da noite, descemos para a garagem e sigo em direção ao meu
Maserati na garagem subterrânea, enquanto Phil anda em meu encalço.
— Está estranha. Aconteceu algo? ... quero dizer, além do mal-entendido
com a gravata?
— Não aconteceu nada.
Ele me puxa pela mão e gira meu corpo de forma que eu ficasse de frente
para o par de olhos flamejantes, soprando aquele hálito de hortelã inebriante
em meu rosto. Ele é tão sexy, másculo e perfeito, que mal consigo olhá-lo
fixamente por muito tempo. Beije-me, Phil. Beije-me – Meu subconsciente
implora, enquanto meu corpo continua estático, observando ele mirar minha
boca e dizer:
— Se eu lhe fizer uma pergunta... – Ele crispa os lábios com os olhos em
minha boca. — Você me responderá com honestidade?
Aquiesço, inebriada com seu cheiro almiscarado.
— Por que recusou ontem? – ele troca o peso do corpo de uma perna para a
outra, enrugando o cenho.
Aperto os lábios, mas digo com sinceridade:
— Não significaria nada para você... eu seria mais uma. Achei melhor não
misturar as coisas.
Ele silencia.
— Estou certa?
Ele olha para lado, parecendo ponderar algo.
— Foi o que eu pensei.
É inegável o resquício de decepção em minha voz, porém não me abalo,
muito menos fico chateada com aquilo. Não há razões para isso pois Phill
nunca deu a entender que quissesse qualquer relacionamento extracontratual.
Apenas digo por fim:
— Quem cala, consente.
Solto sua mão do meu braço lentamente e torno a caminhar em direção ao
meu carro. Destravo e abro a porta quando escuto sua voz atrás de mim
chamar:
— Sullivan!
Viro o rosto por cima do ombro, e o chão some debaixo dos meus pés quando
o vejo caminhar em minha direção em passos decididos.
— Nem sempre quem cala, consente. – Ele disse pegando meu rosto com as
duas mãos e tomando meus lábios, fechando a porta atrás de mim.Ele me
empurra com os quadris contra a superfície gélida de aço, enfiando sua língua
com a perícia de quem sabe muito bem o que está fazendo.
Ele chupa lentamente o meu lábio inferior, ele lambe minhas comissuras e
depois soca minha boca com sua língua novamente sob uma onda de
eletricidade que anestesiava cada partícula do meu corpo. Seu beijo é tão
sexy e intenso, conseguindo superar nossas cenas recheadas de paixão que
sempre me deixava com um gostinho de “quero mais”. No entanto, parece
que tudo fica exponencialmente melhor quando é real.
— Eu quero beijar cada canto do seu corpo – Ele ofega, entre um beijo e
outro.
De repente, seus beijos ficam rápidos e seus toques mais urgentes. Ele ergue
uma de minhas pernas e afunda sua ereção em meu centro, soltando um
gemido rouco que me leva a loucura. Oh, céus! Eu preciso dele dentro de
mim.
Depois de descolar seus lábios dos meus, com nossas respirações
entrecortadas, sinto sua mão na lateral perna subindo para o interior de
minhas coxas invadindo a base de meu vestido, me levando a outra dimensão
quando seus dedos tocam o meu centro pulsante, ainda por cima do tecido
úmido.
Bimp! Bimp!
O carro a nossa direita apita e escuto as vozes masculinas se aproximarem.
Tento levantar minhas costas de supetão, mas Phill me acalma com suas
mãos e me instrui a me movimentar devagar, ocupando o espaço ao seu lado.
Os donos das vozes entram em nosso campo de visão, na companhia de pelo
menos cinco homens de preto. John Sang e Matthew Sang.
— Ainda por aqui, John?
— Ah, Phill! – Ele exclama, rindo em seguida. – Aproveitei para tomar um
café na cobertura. Belíssimo restaurante que vocês têm aqui.
— Sim.
O olhar de John alterna de Phill para mim e possa jurar que vi um risinho no
canto de seus lábios;
— Tenham uma boa noite, senhores! – John acena antes de dizer: —
Mandem lembranças para Elizabeth.
Eles adentram o automóvel alto ao nosso lado e ficamos ali, esperando eles
desaparecerem no corredor de carros do estacionamento.
Quando ficamos totalmente envolvidos pelo silêncio, escuto Phill dizer ao
meu lado:
— Eu não desisti de beijar todo o seu corpo – ele diz com seu mesmo tom de
voz impenetrável e me sinto meu rosto enrubescer;
Me viro para contemplá-lo mais uma vez. Ele mira minha boca como se
quisesse mais, no entanto, escuto a vibração frenética que vinha do bolso de
Phill, nos interrompendo.
Ele pesca o celular da calça.
— Desculpe. É Alexa.
Ele diz baixinho ao ler a mensagem: – Porra. Havia me esquecido.
Ele ergue o olhar para mim, dizendo com cuidado.
— Podemos deixar para outro dia?
— Ok. – Respondo, complacente, ao passo que seus olhos verdes sorriem
para mim.
— Obrigado. – Ele diz plantando um beijo rápido em meus lábios e saindo
pelo corredor de carros, provavelmente em busca do Porsche prata. Fico
observando ali ele se afastar com rapidez enquanto uma profusão de
pensamentos invade minha mente, tentando processar ainda o que aconteceu
minutos atrás.
Ele me quer. Meu falso marido me deseja tanto quanto eu o desejo. Parece
que minha alma está incrivelmente mais leve, dançando fora do meu corpo.
Me dou uma leve sacolejada, a fim de me recompor um pouco e retorno para
dentro do meu massareti.
Mas uma dúvida surge em minha mente: se ele me quer tanto, porque quase
saiu correndo com as mensagens de Alexa?
Oh, céus!
Pare com isso, Claire –, me policio. – Alexa é sua irmã. Pare com essa
desconfiança tola.
Certa vez, vi em um filme a seguinte frase: “ É mais fácil acreditar nas coisas
ruins”. E talvez isso seja verdade. Quando nos acostumamos que algo dê
errado em alguma área de nossa vida, simplesmente duvidamos quando algo
bom começa a acontecer.
Phill está acendendo algo em mim que jurei há meses que nunca mais
sentiria. Ao tempo que lhe confiava meu gostar e subia gradualmente em uma
montanha de russa de sentimentos, eu percebi que todos devem estar
dispostos a cair se quisermos sentir o vento na cara, o frio na barriga e a
paixão escorrendo pelas veias. E eu estava disposta a isso. Decidi neste
momento que estou disposta a me envolver, para poder sentir todas as
sensações, mesmo que eu venha a me arrepender depois, eu estou disposta a
sentir e se arriscar.
Dou partida e saio devagar da vaga no estacionamento, e observo pelo
retrovisor a Ranger Rover preta saindo logo atrás na vaga em frente à minha,
me lembrando tardiamente da presença de Fred e Sean.
Espere um momento!
Que droga! Eles estavam aí o tempo todo? – queimo de vergonha com a
possibilidade de eles terem visto tudo.
CAPÍTULO VINTE E SETE
Claire

Já é meio dia de um sábado ensolarado e nada dele.


Depois de passar a noite fora, ele sumiu completamente e se limitou em
apenas me mandar uma simples mensagem pela manhã avisando que passará
o dia fora;
Depois disso, ele pareceu ficar totalmente incomunicável. Minhas ligações só
caiam na caixa postal, e isso já está começando a me dar nos nervos.
Que tipo de compromisso tão importante que ele tinha com Alexa que
demandava passar a noite fora e o sábado inteiro incomunicável?
— Alô. Matt?
— E aí, prima. Algum problema? – sua voz embargada denunciava que havia
acabado de acordar.
— Não... – fisgo o lábio inferior, dizendo: — Só queria saber se você
conseguiu o número de Alexa naquele dia em que esteve aqui.
— Da morena tatuada? – ele parece despertar mais com o assunto. – Mas é
claro. Você acha que eu perderia a oportunidade?
— Poderia me passar agora?
— Seu marido não está em casa?
— Não. É justamente por isso que quero o número dela. O dele só cai na
caixa postal, e ele está com ela.
Ele faz uma breve pausa e diz com voz macia:
— Já vi tudo. Está com ciúmes.
— Não. Claro que não.
— Eu te conheço, Claire Sullivan.
— Não conhece não.
— Conheço sim. Mas só entre nós aqui: sai dessa! Alexa tem namorado e
tudo, ela me contou a história toda na portaria do apartamento de vocês. Eu
fiquei arrasado.
Ouço seu suspiro decepcionado do outro lado da linha.
— Sério? E por que está me contando isso?
— Para você saber que não tem nenhuma possibilidade de existir ou ter
existido algo entre eles. Deveria confiar mais no seu marido. Apesar de não
serem irmãos de sangue, a relação deles é realmente como se fossem irmãos
legítimos.
— Eu não disse nada.
— Mas pensou.
Revirou os olhos nas órbitas quando ele diz:
— De nada por tirar essas caraminholas de sua cabeça. Aliás, tem algo muito
estranho nessa história de casamento, que eu ainda vou descobrir...
— Passa logo esse número, Matt.
— Ok. Calma. Anota aí.
Matt tinha razão, apesar de negar para mim mesma, no fundo eu desconfiava
de que algo pode rolar entre Phill e Alexa; pois no fundo, me sinto insegura
por saber tão pouco sobre ele.
Disco o número de Alexa, e me animo um pouco ao toque da primeira
chamada. Pelo menos não caía na caixa postal.
— Alô. Quem fala?
Inspiro fundo antes de dizer.
— Alô, Alexa. Sou eu, Claire. A esposa de Phill. Ele está aí com você?
— Claire?! — ela parece surpresa. – Como conseguiu meu número?
— Matt.
— Ah, claro – ela suspira, sorrindo. Sua voz parecia estar até mais leve do
que eu me lembro. – Phill estava comigo até a uma hora atrás. Ele foi
comprar um saco de maças.
— Saco de maçãs?
De repente, a ligação é preenchida por gritos agudos e animados que parecia
pertencer a crianças.
Escuto Alexa falar mais alto:
— Sim. Como hoje é o dia das crianças, viemos passar aqui no orfanato das
Irmãs. É algo que nós fazemos todos os anos, já é um costume nosso. Ele não
lhe avisou?
— Não... quer dizer, sim. – Apesar de me avisar que passaria o dia todo fora,
não me explicou a razão.
— Claire, eu vou ter desligar, estou no meio de uma guerra – ela diz entre
risos -, se não se importa. Direi a Phill que ligou...
Apresso-me em dizer:
— Alexa, só um minuto! Você pode me dizer onde fica esse orfanato?
— Está bem.
Ela me explica rapidamente o endereço, e tão logo a chamada se encerra.
Dia das crianças?! – Murmuro, soltando o ar e abrindo um sorriso.
CAPÍTULO VINTE E OITO
Claire

O endereço que Alexa me passou fica próximo a uma antiga de fábrica de


tecidos no subúrbio de Nashville. Avisto o portão enferrujado ladeado de um
muro grande e extenso, e adentro o lugar que parecia mais silencioso do que
eu imaginava.
Sou recebida por uma freira franciscana que pergunta o motivo de minha
visita e digo que vim ver as crianças e cito Alexa como referência. Ela
assente alegremente e avisa que hoje é um dia de comemoração e que as
crianças me receberiam com muito amor.
Caminho para dentro da construção sustentada por várias vigas, chegando ao
jardim e não encontrando nada além de um terraço vazio, algumas árvores no
canto esquerdo do que seria um bonito lago de águas claras. Escuto apenas o
som do Sino dos ventos tilintando suavemente pendido no teto ao lado de um
Filtro dos sonhos, dando aquele lugar uma atmosfera de paz que ultrapassa o
entendimento.
Olho para os lados, esperando encontrar mais alguém, além da simpática
freira na entrada; no entanto, não encontro mais freiras; muito menos,
crianças. Apenas silêncio.
— Olá?! – Digo em uma oitava mais alta: — Alguém? Tem alguém aí? –
Tento sem sucesso.
Tiro meus sapatos, afastando-os para os lados e coloco meus pés na grama
viçosa que preenchia o enorme jardim.
De repente, escuto um barulho estalado vir entre as árvores ao lado, seguidos
de risos infantis.
— Ah, encontrei vocês! – exclamo baixinho; esfregando as mãos e
caminhando em direção ao lado esquerdo do jardim, de onde parece vir o
barulho.
Caminho entre as árvores, procurando pelas crianças, e mais uma vez, não
encontro nada além de silêncio. Piso em uma poça sem querer, respingando
lama em meu macacão branco.
— Argh – espremo uma careta fitando as manchas marrons na barra de meu
macacão branco.
De repente, como se eu não pudesse ficar mais suja, sou acertada pelo o que
parecem ser bolhas de lamas voadoras. Pelo menos umas cincos estalam em
meu tronco, pernas, cabelos e pescoço, enquanto protejo o rosto com
antebraço, a fim de salvar meus olhos, boca e nariz.
Quando estou completamente suja, olho por cima do meu antebraço
lentamente e encontro um garotinho de aproximadamente dez anos com uma
bacia de balões de lama penduradas no seu tronco.
Seus olhos arredondados estão tensos, como se expressassem: Ops, alvo
errado!
Semicerrei os olhos para o garotinho, que engoliu em seco; e em um
rompante, peguei um pouco de terra molhada do chão e acertei seu corpinho.
Ele me olha surpreso, e depois sorri, enquanto outra criança vocifera ali:
GUERRAAA!
Em um ímpeto, todas as crianças saem de seus esconderijos atirando suas
bolhas de lamas umas contra as outras, rindo alto e pulando. Confesso que
não resisti, e atirei alguns punhados de lama também me divertindo. Essa
brincadeira perdurou pelo menos por quarenta minutos.
Todos haviam se escondido novamente, e eu caminhava nas pontas dos dedos
em direção a uma moita ao lado de uma árvore baixa e de galhos e folhas
rechonchuda. No entanto, sou interrompida pela voz grave.
— Quem é você? – meus ombros crescem um pouco, como se eu tivesse sido
pega. Olho por cima do ombro, com o rosto lavado de lama. – Como
conseguiu entrar aqui?
É ele, Phill. Em uma camisa cinza clara e jeans escuro. Ele me olha com o
cenho franzido e olhos atentos enquanto parecia forçar a mente para
reconhecer quem estava por trás de toda aquela lama.
— A feira me deixou entrar. – Respondo em um fio de voz.
— Claire? – ele gagueja, finalmente me reconhecendo. – É você?
Ele se aproxima e tira uma boa quantidade de terra do meu rosto.
— Sim. Parece que sou eu – respondo constrangida e afastando uma mecha
de cabelo para trás da orelha.
Ele pisca duas vezes, arregalando aqueles olhos verdes e depois uma explode
uma risada.
— Perdão. O que fizeram de você? – ele pergunta entre risos.
— Não sei. Só cheguei aqui e fui convocada para participar de conflito bélico
de lama e terra – digo em tom de troça e ele solta uma risada gostosa.
— Desculpe, mas as crianças daqui gostam muito desse tipo de brincadeira...
— Não se preocupe. Parece meio porquinho, mas me diverti muito. Você
quer tentar? – Eu pergunto, desafiadora.
Ele pigarreia mudando de assunto e pousando as mãos na cintura.
— Acho melhor deixarmos para outro dia. – Ele diz passando os olhos por ali
e chamando em um brado: — CRIANÇAS, O LANCHE ESTÁ PRONTO!
— Êêêê! – Pelo menos vinte bonequinhos de lama saem de seus esconderijos
pulando e fazendo uma festa danada: — Tio, Phil voltou! Tio Phill voltou!
Êêêê!
— Todos para o jardim! Alexa está esperando vocês para um banho antes do
lanche.
— Qual é o lanche de hoje tio? – um garotinho de aparenta ter dez anos
pergunta a Phill.
— Tortilha de maçã e salgados da Madre Angelina.
— Êêêêêêê! Isso muito bom, tio.
Eles saem pulando pelo caminho de árvores até o jardim, enquanto nós
ficamos ali, parados, apenas observando eles se afastarem.
— Quer tomar um banho também? – encontro os olhos de Phill em mim,
passeando por minhas roupas e pés. Coro violentamente e agradeço por estar
coberta de lama. – Que bobagem a minha. É claro que você quer tirar essa
lama.
Nós dois sorrimos.
Aos poucos, a risada ia perdendo força e nossos olhares ganhando vigor. Não
sei se isto é normal, mas toda vez que o olhava eu desejava veemente beijá-
lo, ardentemente.
— Onde fica esse banho? – Interrompo o clima que havia se formado.
— Ah! Logo ali. Venha comigo.
Andamos um do lado do outro enquanto ele pergunta, confi:
— Como sabia que eu estava aqui? – ele pergunta, confuso.
— Alexa.
— Claro. Alexa. Eu deveria imaginar – ele diz, sorrindo de uma forma leve.
Muito diferente do Phill de ontem o qual estava sentado à mesa de reuniões
com os Sang's.
— Você viu minha mensagem hoje pela manhã?
— Uhum — respondo, dando mais um passo à frente no chão de cascalhos.
— Desculpe por ter saído daquela forma. Alexa e eu passamos a noite
embrulhado presentes.
— Você poderia ter me falado – aperto os lábios, enfiando as mãos nos
bolsos. – Eu teria gostado de ajudar.
— Pensei que você estaria no Teatro hoje. Não queria cansá-la.
— Martha havia cancelado o ensaio.
— Ah, sim. – Ele diz enfiando as mãos nos bolsos, parecendo imitar meus
movimentos. – No próximo dia das crianças eu com certeza a chamarei – ele
diz, gentil.
— No próximo dia das crianças estaremos juntos? – pergunto, arqueando
uma sobrancelha.
Ele desce o olhar para minha boca e depois inspira fundo, parecendo pensar
na resposta, e me responde com um sorriso marcado nos lábios:
— Veremos, Sullivan. Veremos.

CAPÍTULO VINTE E NOVE


Phill

Depois de uma longa jornada procurando um simples saco de maçãs,


finalmente encontrei no mercado Central, do outro lado da cidade.
— Parece que maçãs estão em falta, Madre – digo descarregando o saco em
uma bacia larga na cozinha do convento, enquanto a Madre Angelina sovava
a massa branca a qual eu bem me lembrava.
Quando eu era criança, gostava de ficar sentado em um caixote ali pertinho só
para observar como a Madre Angelina trabalhava na cozinha. Apesar de a
“chefe" entre as freiras, ela nunca se negou em pôr na massa. Talvez ela seja
uma das minhas primeiras referências do significado de ser um “líder”.
— Não me diga, filho. Se eu soubesse, havia pedido amoras ao invés de
maçãs.
— Tudo bem, Madre. A torta de maçã de qualquer modo é mais saborosa.
Onde estão as crianças?
— Devem estar no jardim, fazendo estripulias com a lama — ela diz,
sorrindo.
Noto que seus braços estão fadigados demais ao sovar a massa e prontamente
me ofereço:
— Eu posso ajudá-la a sovar.
Ela se afasta um pouco da bancada de mármore e limpa uma gota de suor da
testa com a antebraço, aceitando minha ajuda.
Lavo as mãos com água e sabão, e me direciono à pedra, me recordando dos
velhos tempos e rindo das travessuras das crianças que a Madre Angelina me
contava.
Quando tudo estava pronto para o lanche, me direciono para as árvores em
busca da criançada. E para minha surpresa, não encontro apenas as crianças,
mas também... Claire.
Ela estava coberta de lama dos pés e a cabeça, irreconhecível; no entanto,
parecia também muito feliz por estar ali. Aquela mulher sabia como me
surpreender.
Enquanto Claire toma banho de mangueira junto a crianças e Alexa, sento ao
lado da Madre Angelina que estar descascando castanhas em uma das bacias
no terraço. Fiquei ali, observando minha falsa esposa e Alexa dá banho nas
crianças, apesar de Claire estar tão suja quanto as crianças ali. Seus olhos
também brilham tanto quanto os delas.
— Quem é a garota? – escuto Madre Angelina perguntar.
Fito-a por cima do ombro, refletindo um pouco.
— Claire, minha esposa, Madre.
Ela para de descascar as castanhas, então me levanto e sento ao seu lado,
pescando uma castanha da bacia e tirando a pele que a envolvia, enquanto a
Madre Angelina me olha.
— Você casou, menino? – A surpresa é inevitável.
— É uma longa história, Madre.
Ela apenas me observa, taciturna. A madre Angelina me conhecia como
ninguém e sabia que neste momento eu não preciso receber muitas perguntas.
— Quando eu me casar novamente, tenha a certeza de que a quero na
primeira fileira – abro um sorriso para a senhora de véu marrom.
Neste momento, meu olhar cruza com o de Claire. Ela aperta os lábios e tão
logo ela desvia a atenção para Pipoca, um garotinho de seis que chegou no
ano retrasado aqui.
— Não sei com quem irá se casar novamente, meu filho, mas o jeito como
você olha para sua esposa, tenho a impressão de que vocês já pertencem um
ao outro.
As palavras da Madre continuam soando em minha mente como um ecoo.
Durante muito tempo fechado para o amor, minhas noitadas se resumiam a
álcool e sexo sem compromisso. Nunca precisei de uma mulher ao lado para
ir bem nos negócios. Eu sempre gostei de ser livre para conquistar o que é
meu, sozinho. De certa forma, sou um filho da puta egoísta que só pensa em
subir na vida. E isso nada tem a ver com decepções amorosas que tive na
adolescência. Eu carregava isso comigo desde a infância. Eu nunca cogitei a
possibilidade de me envolver amorosamente, pois essa vida de apaixonado
não combinava com minha árdua jornada de chegar ao topo e sempre estive
convicto de que esse é o meu caminho, já estava arraigado dentro de mim. No
entanto, por que tenho a sensação de que essa mulher poderia me tirar do eixo
e me levar a sentimentos perigosos?
Ela é tão linda e delicada por fora. Graciosamente petulante e uma boca que
só me enlouquece de olhar. Ah, Claire. Você é definitivamente uma ameaça
aos meus planos.
CAPÍTULO TRINTA
Phill
Estamos um ao lado do outro, sentados na beira da ponte flutuante no lago
atrás do convento; sentindo o frescor da água em nossos pés e a brisa
deliciosamente fria que escorre das árvores ali perto e balança os cabelos
castanhos de Claire.
Alexa havia oferecido a ela uma de suas roupas que havia trago na mochila
depois do banho. As crianças também se trocaram, e depois Alexa realizou
uma sessão de dinâmicas que havia iniciado pela manhã, e só agora a tarde
terminou em tortilha de maça e presentes.
— Você costuma visitar sempre esse lugar? – Claire pergunta, balançando os
pés na água.
— Nos últimos meses não tanto como eu queria. – Crispo os lábios
lembrando do longo período que passei em Nova Iorque.
Minha relação com esse lugar é como se fosse a casa de uma mãe, em que
sabemos que podemos visitar a todo momento e o mesmo sentimento de
nostalgia e saudade nos engole em uma bolha acolhedora de carinho.
A Madre Angelina e as freiras desse lugar foram minhas mães por muito
tempo, fazendo o sentimento de gratidão eterno dentro de mim.
Claire faz uma pausa, ainda com os olhos azuis turquesa na água em nossos
pés.
— Com quantos você chegou aqui?
Ela levanta o olhar lentamente, então umedeço os lábios.
— Onze. – Respondo me lembrando automaticamente daquele dia. Sorrio ao
dizer: — Eu era um menino magricela e sobressaltado.
— Caleb também?
— Caleb não veio de imediato para cá. Ele tinha acabado de nascer e passou
uma temporada da UTI de um hospital -, semicerro os lábios. – Ele havia
acabado de perder a mãe em um acidente a qual levou a minha também.
Claire continua me olhando com seus olhos gentis e tão logo se desculpando:
— Perdão. Se não quiser falar, não continue.
— Não há problema. Já é algo superado. – Quer dizer, quase superado. Ainda
sinto o gosto amargo de toda a irresponsabilidade e injustiça que
experimentei ainda muito cedo. – Foi em um desabamento de um antigo e
tradicional Shopping daqui de Nashville... em 1998.
Claire parece forçar a mente, tentando pescar algo em sua memória.
— É impossível que você lembre de algo. Provavelmente, você ainda era um
bebê.
— Tem razão.
Ela me olha como se quisesse saber o resto da história. Fitando-a neste
momento, me sinto à vontade para me abrir e falar de minhas próprias feridas
que não hesitei em contar:
— Neste dia, havíamos ido passear ao shopping com meus tios. Minha tia
estava grávida de Caleb, me lembro que ela estava animada pois estava
prestes a dar à luz e havia acabado de realizar o sonho de comprar a casa
própria... O fato é quando estávamos prestes a sair do shopping, todas as
vigas começaram a trepidar fortemente. – Aperto os punhos, me recordando
do som impetuoso do tremor que me atormentou por longos anos. — As
coisas começaram a cair nas lojas, e o teto a despencar. Foi tudo tão rápido e
só deu tempo de olhar uma última vez para minha mãe do outro lado do
corredor, jogando o papel do doce que havíamos comido. Também me
lembro dos braços de minha tia me envolvendo em um abraço desesperado
quando tudo começou a ruir rapidamente... – faço uma pausa, inspirando
fundo, e digo por fim: — Dentro de poucos minutos, tudo o que eu podia ver
era apenas escombros, ferros e poeira.
Claire resfolega, como se tivesse lhe faltado o ar por um momento. Seus
arregalados, talvez estupefata, o que é normal, já uma tragédia nunca soa
doce aos ouvidos.
— Eu-eu sinto muito – ela gagueja, processando o que havia dito. E depois
de um tempo, ela pronuncia assombrada: — E Caleb?
Encho o pulmão de ar e o olho focalizo os olhares nas árvores do outro lado
do lago.
— Minha tia foi a única pessoa que encontrei depois do desabamento.
— Então...
— Ela estava com a perna... presa em uma das ferragens ali. Mas ainda estava
viva e acordada... – Engulo em seco, pois talvez esse fosse um dos
momentos mais difíceis da minha vida. – Ela começou a sentir as dores do
parto e me instruiu para que eu fizesse algumas coisas... A verdade é que ela
deu à luz sozinha. Ela fez tanta força, como sua vida dependesse daquilo. No
entanto, ao... despejar Caleb, ela não resistiu.
— Ah, Phill... – Claire lastima, abrindo e fechando a boca repetidas vezes: —
Eu sinto muito... não sei o que dizer...
— Tudo bem. Não precisa...
Ficamos em silêncio por um longo momento, enquanto escutava o silêncio de
seus pensamentos.
Ela parece deliberar algo para dizer e questiona:
— E seu pai?
Sou pego de surpresa. Durante a adolescência tive que lidar com todos os
meus monstros, e um deles com certeza era a palavra “pai". No entanto, já se
passou tanto tempo, que minhas inseguranças e medos já não me atingem
como antes.
— Nunca tive contato próximo com ele, mesmo antes do desabamento. Ele se
casou com outra mulher dois anos depois que eu nasci.
— Ele deixou você vir para um orfanato? – Ela pergunta, indignada; no
entanto, tão logo se retrata: — Desculpe.
— Você se surpreenderia com a frieza do meu progenitor – digo sorrindo,
lembrando daquele magnata desgraçado e ambicioso. Talvez eu tivesse
puxado um pouco do seu sangue ruim, viciado em trabalho e poder.
— Ele não te ajudou com nada durante todo esse tempo? Como pode?
— Ele tentou se retratar alguns anos atrás me colocando em um internato de
elite, mas nossa relação sempre foi muito complexa. — Tentei entrar em
contato com ele depois quando ainda eu era um pivete. Nesta época eu estava
disposto a fazer os responsáveis por aquele desabamento pagarem, então
engoli todo o meu orgulho para pedir ajuda a ele. Mas ninguém foi de fato
responsabilizado, o caso foi arquivado e esquecido pela polícia, pela mídia e
até mesmo pela sociedade... — Podemos deixar para falar sobre isso depois?
Digamos que essa história é mais complicada do que aparente ser... Podemos
conversar depois.
— Tudo bem! – ela me mostra um sorriso alentador.
— Fale um pouco sobre você – digo.
Apesar de ter sido bem-criada, desconfiava que aquela menina-mulher de
nariz empinado não era virgem dos baques da vida. Na verdade, dentro de
todo mundo há uma pequena tragédia – pequena, como um grão de arroz; ou
astronômicas e terrivelmente doloridas – mas a verdade que todos têm algo
que lhe marcou e moldou; não importa a magnitude.
Claire fita as mãos como se aquilo ainda doesse.
— Eu os perdi em um acidente de carro. – Ela diz com dificuldade, enquanto
pego sua mão e a aperto forte.
— Se ainda doer, não precisa falar sobre isso.
Ela levanta aquele rosto angelical para mim, me mostrando aquele par de
olhos azuis nos quais estou viciado.
— Parece temos muito em comum, não? – ela sorri fraco.
Ergo sua mão contra o meu peito e arrasto meu corpo para mais perto,
envolvendo-a com o meu outro braço livre; desistindo de fazer de tudo para
não sentir, beijando o topo de sua cabeça.
Não sei explicar a sensação, mas me sentia completamente em casa com o
cheiro do shampoo de rosas entrando em minhas narinas e se alojando em
meus pulmões. Estar desfrutando do fim de tarde com ela naquele lugar e lhe
contar meus segredos, me faz perceber que quero mais daquilo. Porra. Eu
quero muito mais. Eu a quero por completo.
TRINTA E UM
Claire

— Você quer ir para casa agora? – Phill pergunta enquanto assistíamos ao


pôr do sol, com minha cabeça deitada em seu ombro, não acreditando que
estávamos neste clima gostoso, sem sarcasmo ou indiretas, completamente
em paz.
— Uhum. Pode ser. – Digo levantando a cabeça, e tão logo arrastando o
corpo para trás, me pondo em pé de supetão.
Phill faz o mesmo, se colocando em minha frente, olhando para meus lábios
como estivesse se segurando para não fazer algo. Devido a sua intensidade,
dou um passo para trás e lamentavelmente meu pé engancha entre as ripas de
madeira e me desequilibro para trás, sendo abraçada pela a água gélida do
lago.
Antes que eu voltasse à superfície, vejo algo afundar ao meu lado também,
sentindo uma mão impulsionar meu braço para cima. Quando encontro o ar,
sorvo uma boa quantidade dele, dando de cara com Phill flutuando à tona da
água, apenas com os ombros e rosto visíveis.
— Qual o seu problema em desequilibrar perto da água? – Ele graceja, me
fazendo cair na risada.
Minha risada se dissipa quando seu olhar cai novamente para minha boca,
como se existisse uma energia magnética nisso. Céus! Ele fica muito sexy
fazendo isso. Esse homem deveria ser interditado de tão lindo.
— Venha! – ele puxa minha mão, me conduzindo para a escada da ponte e
encaixando seus pés logo embaixo dos meus. Ele vira nossos corpos, de
forma que exista nem um sequer espaço vago entre nós.
A luz alaranjada reflete em seu rosto, deixando-o ainda mais lindo, parecendo
uma pintura em meio ao brilho da água. Olhando por aquele ângulo, sentindo
seus braços apertando minha cintura e seus olhos me roubando o fôlego,
desfruto do delicioso gosto do inefável.
Enquanto suas mãos sobem pelas minhas costas, ele devora meus lábios em
um beijo lento e molhado, sem pressa, como se o mundo parasse para nós.
Passo um braço em seu pescoço enquanto ele afundava os dedos no
emaranhado dos meus cabelos, os segurando com firmeza, me dando ainda
mais tesão.
— Aqui não! – gemo em sua boca.
— Tem razão. – Ele concorda, sussurrando: – Vamos para outro lugar.
Ele deposita um beijo demorado em meus lábios e em seguida flutua para
longe da escada, dando espaço para que eu possa subir nas ripas de madeira.
Tão logo ele está ao meu lado e me acompanha caminhando para dentro do
refeitório, onde crianças ainda se divertiam com os presentes distribuídos.
Phill se despede da Madre enquanto falo uma última vez com aquelas doces
criaturas.
— Tia, a senhora vai voltar? – Pipoca pergunta, fazendo um biquinho muito
lindo. – A senhora é muito legal.
— Claro, meu amor. Assim que eu puder, venho visitar para a gente fazer
mais outra guerra de lama. Prometo trazer presentes lindos também.
— ÊÊÊÊÊÊ! – as outras crianças comemoram em polvorosa enquanto sorrio.
Pipoca chama minha atenção puxando minha calça e dizendo baixinho:
— Tia, tem um telefone na sala da tia Raquel. A senhora pode me dá o seu
número para eu ligar de lá?
Olho para Phill, e ele assente.
— Claro, meu bem. – Ele imediatamente pega um papel e uma caneta da
mesa ao lado como se estivesse esperando por isso. Anoto o número do meu
celular e digo com carinho para o garotinho de olhos arredondados: — Ligue
sempre que quiser.
Pisco o olho para ele, e ele imita meu gesto piscando os dois olhos.
Depois de Phill se despedir das crianças, seguimos para o seu carro
estacionado em frente ao convento.
— Parece que você conquistou o coração da garotada, Sullivan – Phill me diz
entregando uma camisa seca no banco do seu carro, a qual ele levava consigo
em caso de urgência. Ele veste uma também, no entanto, esperaríamos chegar
ao apartamento para trocarmos as partes de baixo.
Alexa já havia ido embora, pois iria comemorar o aniversário do namorado à
noite. De toda forma, já estava na hora de nos retirarmos. A madre Angelina
falou que depois das sete horas, as crianças entram no banho novamente e
vão para a cama rigorosamente às oito e meia depois da sopa.
Para falar a verdade, eu havia amado e me sentia agradecida por cada
segundo que passei neste lugar.
Retiro a calça cinza de Alexa, ficando apenas de calcinha no banco do carona
esticando um pouco a camisa de Phill para minhas coxas, enquanto ele me
observa de soslaio, antes de dar partida. De repente, ele sai do carro e
atravessa a rua, me deixando completamente sem entender nada.
Ele para ao lado da janela da Ranger Rover preta do outro lado da rua e
conversa algo com Fred e Sean.
Vejo Fred assentir, e Phill retorna ao carro.
— O que disse a eles? – pergunto, e ele dá partida.
— Hoje você estará inteiramente sob minha responsabilidade.
Sorrio ao decifrar suas palavras.
— Eles concordaram? – pergunto, surpresa.
Ele enruga o cenho, coçando o queixo com o dedo indicador, respondendo:
— Eles ficaram meio relutantes, mas garantiram não virão atrás.
Sua mão resvala para minha perna, apertando minha coxa.
— Para onde estamos indo? – pergunto.
— Para onde exista apenas eu e você.
Confesso que essa ideia me deixa extremamente animada e ansiosa ao seu
lado.
Penso um pouco e pergunto, tolamente:
— Para casa?
Ele sorri, com aquele timbre rouco que amo.
Depois de cessar o riso, ele encara a avenida um pouco mais sério.
— Segredo, Sullivan. – Ele toma minha mão, afundando seus dedos entre os
espaços dos meus e levando a costa de minha mão para sua boca. E beija ali,
compenetrado na avenida à frente.
Depois de alguns minutos após entrarmos em uma estrada de terra, já não era
mais um segredo. Eu sabia muito bem qual era o nosso destino.
Ele parou de frente para o mar de luzes lá embaixo enquanto o teto do
porsche começou se movimentar em uma cadência mecânica para trás, até a
capota estar totalmente recolhida.
Contemplo o céu em nossas cabeças, enquanto escuto ele comentar ao meu
lado:
— Percebi que gostou desse lugar na última vez que viemos... pensei que
seria... –
Interrompo-o:
— Eu amei. É perfeito.
Exclamo, admirando aquele homem ao meu lado, com uma ansiedade
tomando o meu corpo enquanto ele fitava cada parte do meu corpo sentado.
Estamos sozinhos – meu subconsciente soltava fogos de artifícios. Não vejo a
hora de pôr as mãos nele – é isso o que penso querendo pular em seu colo
imediatamente.
Ele se inclina para me beijar, mas antes ele parece me pedir permissão com o
olhar. Toco seu rosto com minha mão direita e ele conduz sua boca até as
minhas comissuras, me invadindo com todo o seu frescor.
Destravo o cinto de segurança e, no mesmo instante, Phill parece ler minha
mente e me ajuda a sentar em seu colo, arrancando um pequeno gemido de
satisfação quando sento em cima de sua haste dura feito pedra apontada para
cima dentro das calças.
— Você me deixa maluco, Sullivan.
Ele desliza o banco mais para trás, de forma que tivéssemos mais espaço, e
torna a explorar cada canto de minha boca de forma mais rápida e urgente.
Tomada pelo desejo, me livro de sua camisa em meu corpo e ele faz o mesmo
com a sua.
Ele fica por um momento ali, como se contemplasse meu corpo com o olhar
fixo em meus seios ainda vestidos pelo sutiã de renda preta, me fazendo
sentir uma deliciosa onda de poder sobre aquela impetuosa criatura.
Minhas mãos desabotoam o feixe atrás enquanto ele segue cada movimento
meu com o olhar.
Dispo meus seios completamente e assisto o rápido lamber de canto dos
lábios, com o meu corpo desmanchando em cima da sua excitação.
Que droga! Eu estou completamente sedenta por ele.
Ele se aproxima com cuidado, enquanto deito minhas costas no volante e sua
mão apalpa meu seio direito. Sua língua toca o outro com cuidado, fazendo
movimentos circulares ao redor do bico inchado.
Céus! Ele sabe fazer isso tão bem – penso, jogando a cabeça para trás ao
passo que sua mão desliza lentamente por minha barriga e invade minha
calcinha.
Ele me leva a loucura com as pontas de seus dedos, me deixando
completamente nua em seu colo e ensandecida, implorando para que ele me
preencha por completo.
Quase estou quase chegando lá, suas mãos abandonam meu corpo e
rapidamente ele abre calça, deixando sua excitação descomunal acertar o pé
de minha barriga, me dizendo com a voz quase rasgando e beijando meus
lábios:
— Você não sabe o quanto eu tenho pensado nisso.
— Eu também – resfolego.
Ele abre um sorriso que me faz parar de respirar, com um brilho lascivo no
olhar. Em seguida, ele me invade de uma vez só, por completo, me tirando
um longo suspiro pesado ao senti-lo apertado entre minhas paredes que o
recebia, se acostumando a sua funda estocada.
Phill era compenetrado e intenso no sexo, não diferente de todas as áreas de
sua vida. Ele me subia e descia freneticamente como se aquele fosse nosso
último momento, como se estivesse com fome daquilo há muito tempo.
Nos amamos de todas as formas possíveis naquele carro, criando aquelas
memórias para nós mesmos sob o testemunho do céu estrelado em nossas
cabeças.
Voltamos para o apartamento ao alvorecer e passamos a manhã do domingo
dormindo juntos na mesma cama. Acordamos apenas quando meu celular
começa a tocar freneticamente na mesinha ao lado.
— Alô. – Atendo, sentando no colchão, bocejando, apenas de calcinha.
— Até enfim, Claire. Já estava começando a ficar preocupada.
— Vó? Por quê? – olho por cima do ombro e admiro a obra de arte do meu
falso marido me observando atentamente.
— Estou ligando desde às oito. Fred me disse que Phill que deu folga para
eles pelo resto da semana, pois iria cuidar de você. Não entendi muito bem.
Cubro o telefone com as mãos e sussurro para Phill:
— Você deu folga para os seguranças pelo resto da semana? – Sussurro para
ele.
Ele dá de ombros, dizendo:
— Acho que posso ficar de olho em você.
Se não estivesse tão sexy em cima daquela cama com as pálpebras levemente
inchadas dos lados, eu talvez replicaria. No entanto, apenas caio na risada. E
confirmo com minha avó.
— De qualquer forma, tomem cuidado. Só deixarei, pois confio cegamente
em meu genro. – Vejo Phill se levantar e sentar ao meu lado, depositar um
beijo molhado meu pescoço, enquanto minha avó ainda continua falando do
outro lado da linha: — Eu quero vocês hoje para o almoço. Estejam aqui em
uma hora. – Arrepio inteira quando Phill suga o nódulo da minha orelha,
empalmando a mão em minha barriga.
— Não vai dar vó, hoje nós... – começo elaborando uma boa desculpa.
— Não, não. Não é um convite. – Ela bate o pé. — É uma ordem. Estou
esperando vocês, quero a família toda reunida. – Ela diz por fim, mandona,
antes de encerrar a chamada.
— Temos um almoço para comparecer... – digo quando seu beijo desliza para
minha boca.
— Eu sei, eu ouvi. Ainda temos uma hora – ele puxa meu corpo de volta para
cama, se livrando de minha calcinha. – Vai ser rápido e gostoso. – Ele me
beija os lábios. – Basta apenas relaxar.
Vejo ele descer pelo meu corpo entre o vão de meus seios que sobem e
descem lentamente. Minha nossa! Isto estar ficando cada vez melhor.

CAPÍTULO TRINTA E DOIS


Phill

Elizabeth Sullivan nos recebe com a mesma benevolência de sempre. Apesar


de estarmos em constante contato, nunca mais havíamos nos encontrado fora
dos telefonemas.
Depois da segunda semana assumindo a frente da presidência sob sua
supervisão, suas visitas ficaram cada vez menos constantes, e os telefonemas
mais frequentes. Sinto que ganho mais a confiança da avó de Claire, e talvez
eu goste disso mais do que eu deveria.
Uma das coisas que eu mais venho apreciando nesta história maluca é a
sensação de que ganhei uma nova família quando Elizabeth me acolheu com
tanto amor e afeto. Ela fazia com que eu me sentisse um Sullivan legítimo.
— Um brinde à família! – A senhora de cabelos grisalhos eleva sua taça
depois da saborosa refeição de domingo e completa: – nosso maior bem e
tesouro.
— Um brinde! – Claire ergue sua taça, assim como todos ali.
Ela parece incrivelmente sexy em um vestido amarelo solto, que deixa à
mostra um pouco da lateral de seus seios. Mal espero para ficarmos a sós
novamente.
Claire parece se tornar algum tipo de vício para mim, e estou pouco me
fodendo para todas as minhas amarras que eu mesmo me coloquei. Eu estou
maluco demais por essa mulher para trocá-la por qualquer outra coisa que
não seja nós dois em uma cama fazendo amor.
Passamos o dia inteiro na mansão dos Sullivan e voltamos para nosso
apartamento quando a noite caiu. Mais uma vez, fizemos amor com a mesma
energia de dois adolescentes apaixonados. Parecia que Claire havia me
levado de volta ao tempo em que eu me entregava aos sentimentos de corpo e
alma.
A semana passou voando ao lado dela.
Quando não estava ao meu lado, ela dava um jeito de marcar presença em
meus pensamentos durante o trabalho; e porra! Aquela mulher se tornou
literalmente minha dependência.
Todos os dias eu a buscava sem falta nas aulas de teatro, e fazia que questão
de ouvir cada detalhe do seu dia longe de mim. Às vezes, voltamos para o
apartamento e saímos juntos para tomar um drink em algum pub em
Downtown; outras vezes, nem conseguíamos sair de casa e ficávamos a noite
inteira fazendo amor na cama que convencionamos chamá-la de nossa.
A vida estava fluindo mais leve, e até Caleb, que tem me dado trabalho nos
últimos meses, conseguiu emprego em uma desenvolvedora de softwares
aqui na capital. Ainda tenho esperanças de vê-lo dentro da sala de aula de
alguma universidade, mas não o iria força-lo a nada.
— Eu terei de viajar à América do Sul a trabalho na próxima semana –
comento. — Fechamos um ótimo contrato de compra de bens com o governo
argentino.
— Sério?! – minha menina parecia meio anuviada hoje. Quase não prestava
nas coisas que eu dizia.
— Chegarei a tempo da sua apresentação no próximo fim de semana.
— Que bom.
— Há algo de errado, Claire? – pergunto com complacência. — Parece meio
distante.
— É impressão sua – ela diz pegando os pratos em cima da bancada, me
abrindo um sorriso. — Que tal pedirmos comida japonesa?
Ela pergunta enquanto se coloca nas pontas dos dedos para guardar os pratos
no armário de cima. Sua camisola sobe um pouco, mostrando as bochechas
daquela bunda gostosa que adorava apertar.
Levantei da banqueta e me coloquei atrás dela, pegando os pratos em sua
mão.
— Me parece uma boa ideia. – Beijo a curvatura do seu pescoço e guardo os
pratos no armário, fechando-o em seguida.
— Obrigada – ela agradece se virando para mim e alcançando meus lábios
em um beijo rápido.
— Não me contou como foi seu dia.
Ela olha para o lado como se estivesse se esquivando do assunto.
— Foi bem... difícil.
— Difícil como? – Ergo o olhar, curioso. – Você sabe que pode me contar
tudo, Claire?
— Sei. Eu sei, Phill. Mas não sei se você vai gostar de saber...
— Gostar de saber o quê? – Arqueio uma sobrancelha. – Primeiro você me
conta, depois eu decido se eu gosto ou não.
Ela inspira fundo e diz:
— Lembra do Martin?
— Sim, o que tem ele? – Já começo a ficar impaciente com essa história.
Ela aperta os olhos e confessa:
— Ele tentou me beijar hoje no camarim.
— Ele tentou o quê? – Meu sangue esquenta nas veias, apertando os punhos.
— Eu vou quebrar a cara desse filho da puta -, digo rosnando.
Claire interfere, intercedendo por ele:
— Não, Phill. Você não vai fazer isso. Eu só contei isso antes, pois ele
ameaçou falar com você no fim da próxima aula e dizer que foi eu quem
estava dando em cima dele.
— Eu avisei a você que tomasse cuidado com ele. Ficar de papinho com
vagabundo dá nisso.
Ela abre a boca, pousando as mãos na cintura, enfezando o rosto.
— Você está insinuando que eu provoquei isso? – ela pergunta com
incredulidade armada na voz.
— Se tivesse feito o que eu disse e não dado confiança...
— Eu não dei confiança! – ela ralha em um tom mais alto. — Ele é meu
colega de teatro, Phill. O que você queria que eu fizesse? Ignorasse ele?
— É o mínimo.
— Então isso é minha culpa? Ele simplesmente me beijou sem permissão, e a
culpa é minha?
— Esqueça o que eu disse. Não é o que eu queria dizer.
— Foi sim o que você quis dizer.
— Então me desculpe... – digo acalmando um pouco os nervos e tocando sua
mão.
Ela rechaça meu toque, saindo da minha frente e andando para fora da
cozinha com uma expressão de decepção no rosto.
— Claire...
— Agora não, Phill. Eu vou decorar meu texto de amanhã.
Ela me deixa ali, sozinho, me xingando mentalmente por ser uma porra de
um babaca.
Quando eu estava tomado pelo ódio, não pensei muito bem nas besteiras que
falei e, muito menos, no quanto isso poderia magoá-la dessa forma. No
entanto, eu ainda sinto que quero quebrar a cara daquele desgraçado.
CAPÍTULO TRINTA E DOIS
Claire
Eu não acredito que Phill possa ser tão estúpido ao ponto de me culpar por
algo que eu não fiz. – Penso caindo na cama atrás e encarando o teto do nosso
quarto... quer dizer, do meu. Eu não deixaria ele entrar aqui hoje nem por um
decreto.
Dessa forma, liguei para Matt, a fim de desabafar sobre o que aconteceu.
Apesar de eu não ter coragem de confessar ao meu primo sobre o que tem
acontecido realmente em minha vida no último mês, ele ainda continuava
sendo o meu melhor amigo.
— Phill vacilou. Mas concordo com ele. Me chame quando Phill for quebrar
a cara dele...
— Matt!
— O que foi? Phill não está errado nesta questão. É bom que esse Martin
aprende a ser homem.
— Phill irá preso se o fizer.
— Faço questão de ir à delegacia pagar a fiança dele.
— Eu pensei que conversaria com alguém sensato essa noite...
— Desculpe se não atendi suas expectativas, mas preciso desligar...
— Precisa mesmo?
— Sim, estou lendo um livro aqui, e você me ligou no meio da leitura.
— E desde de quando você lê? – Pergunto, impressionada.
— Por que a surpresa? Eu leio de vez em quando.
— De vez em nunca – corrijo-o. — Aí tem coisa.
— “Aí tem coisa” o quê?
Me aprumo nos travesseiros e pergunto:
— Pode falar quem é a mulher.
— Que mulher?
— A que você quer impressionar.
— Ah, Claire! – ela inspira fundo, piscando os olhos: — Você acha que estou
lendo um livro para impressionar uma mulher?
Meneio a cabeça em positiva, esperando sua resposta.
Ele é durão no início, mas diz:
— Promete que não vai rir?
— Prometo – respondo, cruzando os dedos.
— Ela é uma escritora.
Caio na risada.
— Ei, você prometeu não rir.
— Eu sabia – comemoro me encostando novamente nos travesseiros. – E aí?
Como ela é?
Ele faz uma longa pausa, parecendo recobrá-la em sua mente;
— Linda, doce e inteligente. A conheci na semana passada em um clube em
Downtown
— Ih, já está apaixonado! – brinco lhe arrancando um sorriso. – Você sabe o
que acontece quando nós dois ficamos apaixonados, né?
Ele pensa um pouco e sei que seu sorriso morreu do outro lado do telefone, e
pronunciamos juntos mortificados:
— Nos fodemos!
Ele repensa melhor e diz:
— Quer dizer, você me deixou sozinho no clube dos fracassos
amorosamente. Até se casou...
— Como você já viu: meu casamento está passando por uma crise.
— Não por muito tempo. Quando Phill entrar nesse quarto, duvido que essa
crise não acabe – ele diz me arrancando um sorriso bobo.
— Obrigada, primo. Foi bom conversar com você. Vou deixa-lo ler seu livro.
— Por nada, besta. Beijo.
— Boa sorte com a escritora. Beijo.
Encerramos a chamada e fico pensando no que Matt disse. Será que peguei
muito pesado com Phill?
De qualquer forma, eu estava certa. Mas e se ele se atrapalhou mesmo com as
palavras?
Levanto-me já com saudades dele e desço as escadas até a cozinha, não o
encontrando. Antes que eu me vire para sair dali, encontro o bilhete em cima
da bancada.
Fui encontrar Alexa. Não me espere para dormir.
Me perdoe por tudo.
Sou louco por você
Leio as aquelas palavras com o som doce de sua voz rouca em minha mente,
pronunciando cada palavra como quando estávamos abraçados
preguiçosamente na cama hoje pela manhã. Apesar de ele ser um homem
estoico com as pessoas ao seu redor, depois daquele dia no orfanato, Phill
passou a me tratar com mais doçura quando estávamos juntos, e eu amava
isso. Pois eu sentia que eu tinha uma versão dele só para mim.
Phill errou em me dizer aquelas palavras, e eu fiquei profundamente chateada
com isso, e é certo que eu não devo desmanchar minha postura diante dele
por um bom tempo; no entanto, eu gosto demais desse homem para deixar
que um mal-estar desnecessário estrague a relação que estamos começando a
construir.
CAPÍTULO TRINTA E TRÊS
Claire

Levanto às oito e ponto, passando a mão no pedaço de cama vazio ao meu


lado.
Suspiro fundo, afastando a tristeza. Phill deve ter um bom motivo para passar
a noite com Alexa, então trato logo de me pôr de pé e colocar uma música
animada para eu acordar completamente.
Não quero alimentar esse mal-estar entre a gente, muito menos ficar ligando
igual uma desesperada perguntando onde ele está. Uma das coisas que
apreendi nos últimos anos é que as pessoas só se prendem ao que liberta. E
Phill não é diferente.
Faço minha higiene matinal, tomo meu café da manhã e ponho minhas roupas
de ginástica, descendo para a academia do prédio, a fim de gastar energia.
Encaixo os fones de ouvidos nas orelhas e faço meia hora de esteira. Fico na
academia até umas dez horas e retorno ao meu apartamento.
Procuro-o por toda a casa. E nem sinal dele.
Ele tem um bom motivo – penso eu entrando no banho.
Desço novamente para o andar de baixo e decido cozinhar alguma coisa, já
que a senhora Roberts – a governanta que eu aproveitei para contratar nos
últimos dias — estava de folga hoje. Oh, o peixe na grelha dela é divino e
cairia tão bem hoje. Minha boca enchia d’água só de pensar.
Abro o Google e procuro por algo bom para um almoço de sábado, pensando
na cara de Phill quando chegasse e visse algo inédito: eu me arriscando com
as panelas e o fogão.
Antes de eu começar a pôr a mão na massa, avisto meu celular tocar na
bancada.
No visor aparecia um número o qual não conheço e o atendo prontamente,
imaginando talvez fosse Phill ou alguém próximo a ele.
— Alô!?
— Alô, tia. – A vozinha infantil reverbera ao telefone, parecendo meio
tristinha. – Aqui quem fala é o Pipoca. A senhora lembra?
— Sim, meu amor. Claro. Aconteceu alguma? Sua voz parece meio tristinha.
– Assinalo.
— É que meu passarinho morreu hoje, tia – escuto o garotinho quase chorar
do outro lado da linha.
— Oh, meu amor! – exclamo, com o coração em frangalhos.
— A senhora disse que eu poderia ligar se sentisse vontade.
— Sim, meu amor. Pode ligar quando você quiser... aliás, o convento está
aberto a visitas hoje?
— Está sim, tia.
— Pois eu estou indo para aí.
Sinto ele altera a voz em um tom agudo:
— É SÉRIO?
— Sim, meu bem. Dentro de uma hora, estou chegando aí.
— Tá bom, tia. Tá bom, tia. Eu vou desligar pois preciso procurar uma roupa
legal para receber a senhora. Tchau.
Ele encerra a chamada apressado enquanto fico encantada com aquela fofura,
não dando tempo de falar que não precisa trocar de roupas.
Desligo o fogo da água fervendo e desisto da minha receita.
Pego as chaves do carro e desço para o estacionamento, entrando no carro e
dando partida em direção ao convento das Irmãs.
Cheguei a tempo do almoço, entrando no refeitório ao lado do jardim,
surpreendendo as crianças ali.
— Olha lá! A “tia de lama” – um garotinho ruivo aponta o dedo em riste para
mim, chamando a atenção de absolutamente todos.
— Claire? – A Madre Angelina se levanta da cadeira atrás da última mesa,
caminhando em minha direção, tão surpresa quanto as crianças. – O que faz
aqui?
— Perdão chegar assim, Madre. É que vim visitar o Pipoca.
— Pipoca?
Madre Angelina passa os olhos entre as crianças ali e para no garotinho de
cabelos pretos e pele corada, acenando com um sorriso largo nos lábios.
— Ele me disse que seu passarinho havia partido então eu vim animá-lo um
pouco. Não que eu ache minha presença muito importante para alegrar uma
criança, mas...
— Entendi, querida. – Ela diz, complacente. – Por que não se junta a nós e
almoça também?
Balanço a mão no ar, dizendo meio sem jeito:
— Não se incomode comigo, Madre. Eu não lhe avisei que viria... E também
nem estou com fome. Comi antes de vir para cá.
Neste mesmo instante, meu estômago me desmente roncando alto e desejo
que a terra me engula imediatamente por mentir na frente de uma Madre.
Ela pigarreia e diz com o mesmo tom amistoso:
— Não é incômodo nenhum. Temos comida para todos. Eu insisto.
Sorrio nervosamente e aceito o convite.
Sento no banco em frente a Pipoca, enquanto ele comia parecendo bem mais
alegre do que horas atrás quando me ligou.
Depois do almoço, fui ao jardim com Pipoca até o túmulo improvisado para
seu passarinho.
— Ele foi um bom pássaro – Pipoca diz com a voz tristinha.
— Tenho certeza de que ele foi – digo, respeitosamente.
— Agora ele está no céu, tia? – olho para baixo, me deparando com seus
doces olhos inocentes.
— Sim, meu bem. Ele está no céu.
Depois de um breve período em frente a minúscula montanha de areia na
grama, caminhamos para o terraço e sentamos nas cadeiras de macarrão.
Pipoca falava um pouco sobre a rotina no orfanato e que tinha pegado frieira
na última semana e estava fazendo o tratamento com uma pomada branca
“antifúdinda”. De repente, eu me vi curiosa para saber mais e mais sobre a
vida no convento. Era como se eu estivesse me colocando no lugar deles por
alguns minutos e podendo me sentir como àqueles garotos. Queria poder
experimentar os anseios, as alegrias, as estranhezas e dores de estar aqui.
Apesar de eu ter perdido os pais muito cedo, nunca parei para pensar muito
qual é exatamente a sensação de estar sozinho. E uma explosão de gratidão
invade meu peito por ter vivido uma boa vida sob o cuidado e proteção de
meus avós.
— Qual o seu maior sonho, Pipoca?
— Conhecer o mundo. Quer dizer, esse é o sonho de quando eu crescer; mas
o que desejo mesmo agora é que meus irmãos aqui possam um dia ter um lar.
Tipo com papai e mamãe. – Ele sorri.
— Você também não pensa em ter um lar com papai e mamãe?
Ele olha para o chão, envergonhado e dizendo:
— É. Talvez um dia...
— Então você gosta muito daqui?
— Gosto sim, tia. Prefiro ficar aqui do que alguém me levar e me devolver
depois...
— Isso já aconteceu com você? – gaguejo.
— Não. Pelos menos, ainda. Já aconteceu com alguns dos meus irmãos... se
acontecesse comigo, eu iria ficar muito triste. Parece que as pessoas pensam
que somos uma dessas caixas que as tias daqui recebem e devolvem quando
não gostam.
— Não vai acontecer com você, meu amor – digo com o coração do tamanho
de uma ervilha por ver uma criança tão nova se preocupando com problemas
tão complexos.
— Qual é a sua comida preferida? – Pergunto, mudando de assunto.
Ele pensa um pouco e responde decidido:
— Bolo de morangos com Chantilly. Sabe aqueles que parecem bem bonitos
na televisão? – ele comenta lambendo os beiços, me arrancando um sorriso
silencioso.
Depois de nos juntarmos a outras crianças em uma brincadeira de roda no
jardim, o tempo voou. Quando percebi já havia anoitecido e me dado conta
de que eu teria de ir embora.
Me despedi de Pipoca e das outras crianças com a sensação de que aquelas
crianças precisavam muito mais do que lhe era dado.
— Você por aqui mais uma vez? – A freia de nariz encurvado pergunta ao
esbarrar comigo em frente ao convento.
— Parece que sim, — digo sorrindo.
— O menino Phill também está aqui?
— Phill? Não, não. Ele está com Alexa.
— Alexa, nossa menina?
— Sim. Ela mesma – respondo, sorrindo.
— Esses dois não tomam jeito mesmo. Eu até achava bonito eles juntos
quando eram crianças. Nunca entendi por que eles terminaram o namoro.
Pareciam que eram feitos um para o outro.
— Acho que você está enganada, irmã. Alexa e Phill nunca namoraram...
— Não, querida. Não estou enganada. Eu mesma já tive que separar muito
esses dois no jardim.
Minha mente dá um nó.
— Tem certeza? – gaguejo.
— Absoluta, minha filha. Eu estou velha, mas isso aqui – ela aponta o dedo
para a cabeça -, nunca envelhece.
— Pergunte você mesma a Phil ... aliás, qual a sua ligação com o nosso
menino Phill?
A profusão de pensamentos me faz dá um passo para trás.
Inacreditável! Eu deveria ter desconfiado. Quer dizer, eu desconfiei. E ele
mentiu? Ele me garantiu... Oh, Deus! Eu não quero julgar antes de saber a
verdade da boca dele, mas se isso o que a irmã está falando é verdade, tudo
ficará muito confuso e nebuloso em minha mente.
— Eu tenho que ir, irmã. – Aceno com a cabeça, respeitosamente; — Boa
noite.
— Boa noite, filha.
Atravesso a rua, entro no meu carro e fecho a porta ao lado, soltando um
demorado suspiro.
CAPÍTULO TRINTA E QUATRO
Phill

Cheguei ao fim da tarde ao apartamento, louco para ver o rosto da minha


menina outra vez. Eu precisava relaxar depois de uma noite em claro. Eu só
queria deitar na cama e poder aninhar o corpo dela em meu peito e beijar o
topo de sua cabeça, sorvendo o cheiro do seu shampoo de rosas.
Procuro por todo o apartamento e nem sinal dela. Olho para minha lista de
chamadas perdidas e não a encontro por lá também.
Temo que Claire ainda esteja chateada comigo depois da minha infeliz
colocação de palavras depois da noite de ontem. Na verdade, eu fui um
idiota. Claire tinha toda razão em ficar de brava, e eu iria apenas respeitar seu
espaço.
Ao invés disso, tomei um banho quente no banheiro do andar de cima,
coloquei uma camisa branca de algodão e um moletom confortável pra
cacete; e comecei a pesquisar alguns editais de licitação no Google. Eu queria
ganhar todas as licitações possíveis que a Sullivan poderia participar e fazer
crescer, exponencialmente, a receita. Minha meta é aumentar a receita três
vezes do que estava quando eu entrei.
Fingi não me preocupar com sua ausência até anoitecer.
Abandonei os editais no computador depois de algumas horas de pesquisa e
decidi espera-la no sofá da sala, olhando para a porta fixamente.
Me auto analiso por um momento e penso que não pegaria bem se ela
entrasse por aquela porta e me visse a esperando desse jeito.
A não ser que eu pareça descontraído.
Olho para os lados e encontro as revistas de teatro de Claire. Pego a primeira
que vejo e a abro. Começo a ler os artigos e penso que não pareceria muito
convincente essa minha descontração.
Em vez disso, pego o controle e ligo a tevê no mesmo instante que a porta
abre ao meu lado e vejo Claire adentrar o apartamento usando um moletom
cinza e um semblante inexpressível, me confirmando que ela ainda estava
chateada comigo.
— Boa noite. – Digo com os olhos na Tevê enquanto ela cruza a sala. –
Podemos conversar sobre ontem?
Ela finge não me ouvir e sobe o primeiro degrau da escada, e quando penso
que vou ficar falando sozinho, ela estanca e se vira, dizendo:
— Que se dane! – ela parece estar em algum tipo de diálogo interno, quando
caminha em direção e despeja em mim: — Por que mentiu sobre Alexa?
Porra.
Ela continua:
— Por que não me disse a verdade? Que Alexa é sua ex-namorada.
— Quem disse isso a você?
— Quem me disse não importa agora. É verdade ou não?
Apesar de tentar manter a calma, seus olhos azuis-turquesa me fulminam,
enquanto vejo seus punhos apertarem.
Olho para o lado, me condenando por não ter dito a verdade logo no início.
— Sim. É verdade – confesso.
— Mas eu posso explicar – digo me levantando e me aproximando. Ela dá
um passo para trás, um pouco atordoada. – Lembra da nossa noite de
núpcias? Você já chegou com a teoria de que eu estava transando com a dona
do perfume, que é Alexa. Se eu contasse que tive um relacionamento com ela
no passado...
— Você é um mentiroso. Me fez acreditar que ela era sua irmã.
— E é.
— Ah, sim, claro. Irmãos que se beijam – ela ironiza batendo as mãos nas
coxas. – Conte-me outra, Phill. Aliás, como foi a noite com sua irmã?
— Claire! – Suspiro, impaciente; pensando em algo suficiente claro para
dizer a ela: — Eu passei a noite com Alexa em um hospital com Harry, seu
namorado. Harry também é meu irmão, crescemos juntos e erámos muito
amigos no passado. E agora... e agora ele está doente. – Digo por fim.
— Doente?
Encaro o chão e em seguida digo lembrando das palavras do Doutor Dawson.
— Câncer de esôfago... Infelizmente, o câncer se espalhou para os demais
órgãos... e... é provável que ele venha partir muito cedo.
Ela aperta os lábios e seus olhos se perdem por um momento, como se ela
estivesse processando as informações.
Apesar de passar muito tempo sem falar com Harry, nós superamos nossas
desavenças anos atrás. Eu vi que não valia à pena guardar rancor de algo que
ficou no passado.
E agora, quando o vi nesta situação, sinto ainda mais agradecido por estar
tendo a chance de ficar mais próximo dele novamente.
— Era ela. – Ela diz. – Era ela a garota que terminou com você e ficou com
seu melhor amigo?
De repente, recordo-me de ter dito algo assim em algum momento.
Aquiesço.
— Sim. Era ela... Mas Claire, isto não significa mais nada para mim há muito
tempo...
— Tudo bem, Phill. Eu só preciso ficar sozinha um tempo – ela diz, sem
olhar nos meus olhos.
— Está bem! – assinto dando um passo para trás, respeitando mais uma vez o
espaço que ela está me pedindo; mesmo que minha vontade seja de toma-la
para um beijo e dizer o quanto ela me faz bem.
Mas isso não resolveria o problema, no máximo, a faria esquecer por uma
noite; e na manhã seguinte, o problema ainda estaria lá, em seus
pensamentos. Então melhor que ela pense bem sobre tudo isso antes que tome
sua decisão.
CAPÍTULO TRINTA E CINCO
Claire
Quatro dias depois...
O início do inverno está chegando e com ele os dias mais frios. Entro debaixo
da água quente e relaxo em um banho demorado, pensando nele pela enésima
vez desde que eu acordei hoje pela manhã.
Eu estou um pouco carente e agradeci por Phill estar na Argentina a uma hora
dessas, cuidando dos negócios da minha família. Caso ainda estivesse aqui,
nós já estaríamos na cama, fazendo um sexo matinal antes de ir à Sullivan; e
isso não me parecia bom, pelo menos, não agora.
Mentira e relacionamento são duas palavras que não combinam. No entanto,
quando se estar se relacionando com alguém, precisamos ter a maturidade de
analisar o contexto. Por mais que eu fosse defensora da verdade, há
momentos que simplesmente a ocultamos para não sermos mal interpretados,
na ilusão de que ela nunca aparecerá e tornar a situação ainda mais
complicada. Eu entendi perfeitamente que isso aconteceu com Phill.
Ok. Alexa e Phill não têm mais nada. Alexa está em outra há muito tempo. O
namorado de Alexa estava em um momento complicado.
No entanto, e se Harry não existisse nessa história ou se simplesmente a
química de Alexa e Phill ainda estivesse adormecida, apenas esperando um
momento para vir à tona.
E eu? Como eu ficaria? É algo definitivamente a se pensar.
Eu não poderia fazer nada se Phill escolhesse Alexa. Caso isso aconteça,
ficarei sozinha e, pior ainda, presa em um casamento de mentira com o
homem que amo.
Afasto meus pensamentos, saindo do banho e me vestindo para ir ao teatro.
Nossa apresentação está cada vez mais próxima e sinto que vou morrer de
ansiedade até lá.
Desço e tomo café na cozinha, conversando sobre o clima com a senhora
Roberts e perdendo a hora. Me despeço tão logo, saindo às pressas, ligando
para uma loja de bolos e encomendando um de morangos com Chantilly bem
bonito.
O ensaio estava marcado para acontecer no local em que vai acontecer o
festival – o famoso Tennessee Performing Arts.
Minhas mãos suam quando encontro com a imensa arquibancada em frente
ao palco, imaginando todas aquelas as cadeiras ocupadas. Ah, meu Deus! É
real. Depois de um mês sonhando com esse dia, finalmente está cada vez
mais próximo.
— Onde está Khloé? – Martha pergunta impaciente pela décima vez, só
faltando a nossa Julieta para o ensaio começar.
— Eu consegui falar com ela, Martha. – Taylor, uma das amigas de Khloé
entra no camarim dizendo: — Ela pegou uma virose e está muito mal no
hospital.
— Como? Uma virose? – Martha pergunta, mortificada. – Pelas barbas de
Homero. Não pode ser.
— Infelizmente, Martha. Pelo visto, você vai ter que escolher outra Julieta –
Taylor diz levantando mais os ombros. – Pelo menos para o ensaio de hoje.
Martha leva as mãos à cabeça, mas tão logo diz:
— Tem razão, Taylor. Espero que Khlóe esteja disposta até sábado – ela
olhando para os lados, para as meninas ali. Seu olhar para em mim e meu
coração pula no peito quando ela exclama: — Claire! Pegue o figurino no
armário. Você interpretará Julieta Capuleto nesta tarde.
— A novata? – Taylor indaga, indignada.
— Por que não? – Martha questiona.
— Não sei. Não parece mais lógico escolher alguém com mais experiência
para interpretar o papel principal?
— Taylor, querida, não costumo explicar minhas decisões mas abrirei uma
exceção hoje. – Martha não direciona a palavra apenas a Taylor, sendo justa
com todas: — Vocês têm papéis com mais falas do que Claire, que é a ama
de Julieta. Trocar o papel de qualquer uma de vocês, iria atrapalhar mais
ainda o desenvolvimento dos ensaios. E digo mais: quem melhor do que a
ama de Julieta para saber mais as falas da própria Julieta? – isso ela tinha
razão. Como eu não tinha muitas falas, aproveitava para me divertir recitando
as frases de Julieta durante o banho.
Todas ali se entreolham concordando com Martha.
— Vá trocar de figurino, Claire. Começaremos em vinte minutos.
Ela bate palmas e as pessoas começam se dissiparem. Antes de eu adentrar à
sala de figurino, Martin diz encostado na porta ao lado:
— Quem diria que hoje irei beijar a sua boca de novo, gatinha. – Ele fala
baixinho.
— Vá para o inferno! – entro dentro da sala e tranco a porta, com o coração
nervoso.
Não sei se estou preparada para esse papel. No entanto, se Martha me
escolheu, ela deveria saber o que estar fazendo. Confiança, garota! –
murmuro para mim mesma.
Porém havia outro agravante que estava me deixar ainda mais nervosa:
Martin.
Ele não usaria de um papel para fazer gracinha. Aí dele! – aperto os punhos.
— Ou usaria?
Ah, Deus, me proteja! – digo passando o vestido pela cabeça e pedindo ajuda
a uma das meninas ali para apertar o espatilho.
Saio direto para o palco, e vejo o elenco apenas me esperando para dar início
ao ensaio. Martha dá sinal para que as luzes abaixem e os holofotes se voltem
para mim, e então, começo o monólogo.
Durante o ensaio, apesar dos olhares maliciosos que Martin me lançava,
felizmente ele não tentou nenhuma besteira. No fim do ensaio, vendo que
Romeu tomou o veneno no boticário, tomo o punhal de Romeu para mim e
lanço-o contra o meu corpo, caindo em cima de Martin, representando a
morte.
Martha aplaude da arquibancada, então me levanto agradecendo.
— Perfeita, minha julieta – Martin se levanta e sussurra atrás do meu ouvido,
me enojando.
Aperto os lábios e caminho para o camarim atrás das cortinas, evitando o
máximo aquele ser inconveniente que é Martin.
Por sorte, consigo trocar de roupas e sair do teatro sem esbarrar com ele
novamente.
Entro em meu carro e sentindo falta dos dias que encontrava Phill me
esperando depois dos ensaios. Ah, Phill! Como será que você está?
Já é noite quando chego ao apartamento e preparo uma coisa rápida para
comer, sozinha, com uma saudade absurda no peito. O telefone toca ao lado
da pia então puxo o aparelho prontamente, o encostando na orelha:
— Alô.
— Tia, sou eu. Pipoca – a voz animada soa alegrando minha noite solitária.
— Oiii, meu amor. Com o que posso ajudar?
— Nadinha, tia. Só liguei para agradecer mesmo. O bolo estava delicioso, eu
não sabia que poderia ser tão gostoso assim... Ele veio igualzinho ao da tevê.
— Por nada, meu amor. Mas agora eu fiquei confusa. Você não disse era seu
bolo favorito?
— E era, tia. Só que nunca havia provado. Aqui no convento nós não
costumamos comer muito bolo, sabe? Muito obrigado mesmo, tia! A senhora
é demais.
— Por nada, meu amor.
— Que dia a senhora vem aqui? Preciso mostrar a cama que improvisei para
os gatinhos. Ficaram muito lindas.
— Que legaal! Que tal na próxima semana, meu bem? Nessa semana eu terei
de ensaiar para uma peça em que irei atuar no sábado...
— Teatro? – ele diz, animado. – A senhora é uma atriz, tia?
— Digamos que estou aprendendo...
— Que máximo, tia! Eu posso assistir?
— Claro, meu bem. Mas terá de ir com algum acompanhante.
— Deixa comigo, tia. Eu até sei quem vou levar aqui do convento.
Fiquei ouvindo Pipoca contar mais sobre o seu dia e me diverti muito com
suas peripécias com gatinhos do convento durante a manhã. Pipoca sem
dúvidas é uma criança muito cativante, daquelas que deixam seu coração
quentinho, quentinho só de conversar. Eu espero que alguém nesse mundo
descubra isso e o dê um lar cheio de amor.
Depois de comer o lamén que preparei, subi para o quarto, tomei um banho,
coloquei a roupa de dormir e me aninhei entre os travesseiros ali.
Não demorou muito para que o protagonista de meus pensamentos invadisse
minha cabeça e com isso as lembranças de quando deitávamos juntos nesta
mesma cama começarem a surgirem.
Tudo o que eu queria era me enfiar em seus braços e dizer o quanto eu sentia
sua falta... falta do seu cheiro, da sua mão apalpando cada canto do meu
corpo, dos seus lábios me beijando com ardor e até de seus gemidos roucos.
Queria dizer que distância estava me sufocando aos poucos...
Pego o celular ao lado no colchão, mas desisto logo em seguida quando a
insegurança toma conta de mim.
Eu ainda não tinha certeza de que Phill sentisse o mesmo por mim. Não sabia
se ele voltaria atrás em sua decisão e ficaria com Alexa, caso ela o quisesse
de volta.
Bem lá no fundo, sei que isso não passa de uma insegurança. No entanto, é
também uma tentativa de autoproteção.
Mas, droga! Eu preciso dele perto de mim. E quando ele retornar, não sei se
sustentarei por tanto tempo essas barreiras. Por mais que eu tente,
simplesmente não posso esvaziar minha mente e tirá-lo a força de lá.
Eu espero que todas essas dúvidas desapareçam e que algum dia eu possa
amá-lo o tanto que eu quero.
Antes de dormir, vou até o closet e pego o perfume esquecido por ele. Volto
para o quarto e borrifo seu cheiro nos travesseiros e me deitado, abraçando-os
na tentativa de fabricar um pouquinho de sua presença nesta noite.
CAPÍTULO TRINTA E SEIS
Claire
Três dias depois...

— Não acredito que essa menina não se recuperou! – Martha anda de um


lado para o outro atrás das cortinas, levando as mãos à cabeça; depois de
ouvir que Khloé não poderia vir devido às restrições médicas.
As arquibancadas já estavam começando a serem ocupadas lá fora quando
ainda tínhamos esperanças de que Khloé pudesse vir e se apresentar. No
entanto, não foi o que aconteceu.
Martha para e me fita com aquele olhar exasperado que só ela tem.
— Esta será uma peça sem ama. – Ela aponta o dedo para mim e ordena: —
Já para o camarim. Troque de figurino, hoje você interpretará Julieta.
— Ok! – Obedeço e caminho para a portinha escura ao lado.
— Claire! – Ela me chama.
— Sim?!
Ela pede como uma súplica:
— Por favor, faça exatamente do jeito que ensaiamos nestes últimos dias.
Aquiesço.
— Tudo bem, Martha. Darei o melhor – digo antes de sair com coração
disparado para o camarim.
Eu posso fazer isso. Eu já fiz duas vezes. Eu posso fazer perfeitamente uma
terceira vez. – Repito mentalmente com o coração na mão.
Sorvo uma boa quantidade de ar, colocando o vestido e correndo para o
estúdio de maquiagem e cabelo.
Depois de Jay e Jucy mexerem em meu cabelo e rosto, respectivamente,
olho-me no espelho irreconhecível. Meus cabelos caem em ondas em minhas
costas, sobre o vestido extremamente colado na cintura e volumoso na saia. A
maquiagem parece imperceptível, mas realçou bem os pontos positivos de
meu rosto – a boca e os olhos.
— Nada mal. Até que eu combino com o século XVI! – Sussurro, girando e
vendo meu reflexo no espelho atrás das cortinas.
A arquibancada já está quase toda ocupada lá fora, enquanto memorizo o
texto e espio as pessoas chegarem.
Vejo de longe o garotinho chegar em uma camisa social ao lado da senhora
de véu preto – a Madre Angelina. Pipoca estava muito fofo com o cabelo
penteado para trás e com uma rosa na mão, olhando para todos os lados do
teatro, admirado.
— Achei você! – meu coração vai na goela quando levo um cutucão nas
costas.
Me viro automaticamente, quase desfalecendo e praguejo quando vejo o rosto
do homem loiro de sorriso maroto.
— Que merda! Você quase me mata do coração. – Digo com a mão no peito.
— Desculpe – Matt sorri, coçando o topo da cabeça.
— O que está fazendo aqui? – Sussurro olhando para os lados. – Não era para
estar aqui.
— Sério? Pensei que qualquer um pudesse entrar, ninguém reclamou de nada.
Eu apenas entrei.
— Agora você irá sair. A peça vai começar logo. Não quero que te peguem
aqui.
— Tudo bem. Mas antes deixe-me dar meu abraço de boa sorte – ele me
rodea com seus braços e diz: — Queria avisar também que avisar que Kristen
está aqui. Vim saber se podemos sair para comemorar ao final da peça.
— Kristen? A escritora?
Ele ri com o rosto corado, levando a mão para o topo da cabeça outra vez.
— Claro. É uma ótima ideia. – Na verdade, eu estou fugindo da possibilidade
de qualquer festa pós-peça com a presença de Martin.
— Maravilha! Aliás, onde está Phill? Até agora não o vi.
— Ele não chegou de viagem ainda – digo, me lembrando dos dias que passei
sem ele, e de como não consigo me acostumar com sua falta.
— Que cara é essa? – ele examina meu rosto, pescando algo. – Não vá me
dizer que se desentenderam de novo?
— Não...
— Claire... – Matt arqueia uma sobrancelha, ele me conhece como ninguém.
— Não nos falamos desde que ele embarcou para a Argentina.
— Você sabe que eu sempre achei toda essa história de casamento muito
estranho, não é? – Matt faz questão de me dizer: – Vocês casaram há pouco
tempo e já tem dez vezes mais desentendimentos do que a vovó e o vovô...
agora você me diz que não fala com seu Phill há uma semana... Que tipo de
relacionamento vocês têm?
— Acho que Phill não me quer da mesma que forma que eu o quero. –
Interrompo-o, precisando confessar isso a alguém.
— Como assim seu “marido” não quer te quer da mesma forma...
Inspiro fundo, não aguentando mais esconder isso de Matt.
— Phill e eu não somos casados de verdade. Quer dizer, o processo do
casamento é legal, mas existe também outro contrato.
Ele pisca os olhos duas vezes, abre a boca e depois fecha. No entanto, ele
abre a boca novamente para dizer:
— Eu não estou entendendo o que você está querendo me dizer, Claire; mas
algo me diz que a coisa é bem mais maluca do que eu imaginava.
Aperto os lábios, pensando se fiz certo em começar a contar a verdade a Matt,
no entanto, já é tarde demais.
— A verdade é que propus a Phill ser meu marido por seis e ocupar meu
lugar na presidência da Sullivan para que eu pudesse ter mais tempo para
minhas próprias coisas. – Confessei em uma só respiração.
Matt recebe aquelas informações e fica pensativo, como se estivesse ainda
concatenando as ideias, e em seguida, arregala seus olhos azuis, estupefato;
como se tivesse finalmente entendido a mensagem.
— Você não fez isso... – Matt duvida.
— Fiz.
— Não.
— Eu fiz.
— Puta merda! Você é maluca mesmo.
Ele respira fundo e pousa as mãos na cintura.
— E também tem outra coisa.
— Outra coisa? – sua voz soa mais aguda, preocupada.
— Eu me apaixonei por Phill.
Ele bufa, exclamando:
— Ufa! Eu pensei que estivesse grávida. Menos mal.
Ignoro o que Matt disse e apenas confesso com os ombros murchos:
— O que poderia ser pior do que amar e não ser correspondida? – penso
mirando a parede atrás dele.
Matt parece se acostumar com o que eu acabei de dizer e entende finalmente
meu desalento.
— Nunca amar. Isso é pior, Claire. Não saber amar é pior.
Matt me envolve com seus braços perguntando:
— Você já conversou com ele a respeito?
— Não como eu queria – confesso.
— Pois quando ele chegar, aconselho você que converse abertamente sobre
seus sentimentos. A vida é muito curta para se viver de maus entendidos.
Faça sua parte e deixe que o destino se encarregue de fazer o resto.
— Falando desse jeito até parece que você se dá bem no amor.
— Vá se danar, Claire Sullivan – ele ri, apertando mais o abraço.
Matt fica ali por alguns minutos me abraçando. Apesar de temer esse tempo
todo, Matt não me condenou como pensei que iria fazer. Muito pelo
contrário, me ajudou a encontrar a melhor solução para resolver meus
conflitos. É por essa e outras que eu considerava Matt a melhor pessoa desse
mundo.
TRINTA E SETE
Claire

SENHORA CAPULETO — Pois foi para falar em casamento que te


chamei. Filha Julieta, dize-me: em que disposição para isso?
Taylor, que representa a senhora Capuleto, indaga do outro lado do palco à
minha personagem, sua filha, Julieta. Então respondo prontamente, com o
queixo arrebitado:

JULIETA — É uma honra com a qual jamais sonhei.


De vez em quando, eu dava uma espiadinha na plateia, especialmente em
Pipoca, que parecia concentrado em entender o texto. Era tão fofo quando ele
cutucava o braço da Madre Angelina, talvez perguntando o significado das
palavras;
Em uma dessas olhadas, flagro o homem em uma camisa social branca,
impecável, e jeans escuro, descendo pelos degraus da escada lateral e
sentando em uma cadeira vaga próximo ao canto direito do palco na primeira
fileira.
Estou olhando para ele enquanto seguro a respiração, como se o mundo
tivesse parado. Mesmo que as luzes estivessem em minha direção, ele parecia
brilhar mais ali diante do meu coração tremulante.
Seu olhar flamejante esbarra com o meu, então paraliso naquele dado
momento, enquanto ouço o silêncio ao meu lado e desconfio que seja a minha
vez de fala.
Meus olhos se voltam para Taylor, que me fita com estranheza – talvez
condenando novamente Martha por colocar alguém tão experiente como
protagonista. O silêncio se alastra por todo o teatro, e percebendo que eu me
distraí, Taylor pigarreia e torna a dizer:
SENHORA CAPULETO — Ocupada bastante, não? Necessitais de mim?
Me situo no texto e respondo, como Julieta:
JULIETA — Não, senhora; escolhemos, tão somente, quanto nos pareceu
mais necessário para amanhã vestir na cerimônia. Assim, vos peço me
deixes sozinha, dormindo a ama esta noite em vosso quarto, pois sei que
vos achais assoberbada de ocupações para esta festa súbita.

Meu coração bate descontroladamente dentro peito, me deixando receosa que


o microfone reproduzisse o som para todos ali. Então decido evitar olhar para
o lado, onde Phill se encontrava, tentando me proteger de uma possível
gagueira no meio da peça.
Tudo corre incrivelmente bem, até mudarmos de cena e me encontrar na
frente de Martin – Romeu.
ROMEU — Os santos e os devotos não têm boca?

Minha mente alerta de que o beijo está próximo. Graças a sutileza e


ingenuidade da peça original, os beijos são meros detalhes singelos: daquele
que apenas se encostam os lábios fechados e as cortinas se fecham seguidas
de um longo silêncio. Caso não fosse assim, as famílias com crianças na
plateia não poderiam desfrutar da peça.
Por sorte não teria de sentir o hálito de Martin, muito menos suas mãos
nojentas em meu corpo. No entanto, eu teria de ser profissional suficiente
para emprestar meus lábios à Julieta por menos de cinco segundos.

JULIETA — Sim, peregrino, só para orações.

ROMEU — Deixai, então, ó santa! que esta boca mostre o caminho certo
aos corações.

JULIETA — Sem se mexer, o santo exalça o voto.


Martin dá um passo à frente e diz por fim, vindo ao meu encontro:
ROMEU — Então fica quietinha: eis o devoto. Em tua boca me limpo dos
pecados.

Martin puxa meu corpo com força contra o seu e enfia seus lábios nos meus,
introduzindo sua língua nojenta dentro da minha boca, descumprindo
totalmente com o protocolo.
Vejo o corpo de Phill se retesar na plateia e se segurar nos braços da cadeira.
Com minhas mãos, tento empurrar Martin para longe de mim, sem sucesso.
Sua mão segura meu pescoço atrás com brutalidade, enfiando mais uma vez
sua língua na minha goela e depois me soltando.
Com o peito subindo e descendo freneticamente, procuro por ele pela plateia.
E o encontro de pé, com os olhos furiosos e o punho apertado, enquanto as
pessoas ao seu lado o observavam.
Por sorte, as cortinas se fecham e retomo o fôlego.
Vejo Martin em minha frente e caminho até ele e afundo um tapa em seu
rosto.
Ele massageia o rosto, e depois ergue o olhar vindo em minha direção, irado:
— Sua vadia, como ousa?
Antes que ele me acerte com uma bofetada, um dos assistentes de palco
chega a tempo, e Martha me puxa pela mão, me levando ao camarim.
— O que foi isso?
— Perdão por aquele beijo, Martha. Eu não queria estragar o roteiro de sua
peça... eu não pude fazer nada... Martin passou dos limites...
— Beijo? Que beijo? Você acabou de dar uma bofetada no seu parceiro de
cena... – Dou um passo para trás enquanto ela ralha comigo em volta alta,
indignada: — Martin é homem, deve estar com a autoestima péssima... Isso
pode atrapalhar muito em cena, garota!... Espero que se redima com Martin
antes que as cortinas se abram, caso o contrário, nunca mais pise em minha
academia. Se pensa que só por que você é uma ricaça, eu irei tolerar isso, está
muito enganada.
Suas palavras eram um ultimado, e me senti completamente envergonhada de
mim mesma por estar aqui ouvindo aquilo.
Martha caminha até a porta do camarim e me apresso em dizer:
— Não se preocupe, já estou voltando ao palco. Não me passou pela cabeça a
abandonar a peça. E sobre sua academia de teatro: se preocupe menos ainda,
eu mesma faço questão de nunca mais pisar nessa merda.
Pego o frasco de veneno fictício jazido na mesa próxima aos espelhos, e
retorno ao palco, passando por Martha.
Puxei com força uma boa quantidade ar e me coloquei ao lado de Martin, que
me esperava com um olhar atravessado, soltando fogos pelas ventas. As
cortinas se abrem e damos a plateia o desfecho da história com uma
adrenalina mórbida correndo em minhas veias. Graças aos céus, não há mais
nenhuma outra cena de beijo. Somos seguidos pelos calorosos aplausos e
assovios ao final.
O elenco se reúne no palco, inclusive Martha, e agradecemos nos curvando
diante do público.
Foi apenas a cortinas se fecharem para eu apressar o passo e procurar a saída.
Fui à primeira a chegar à sala do camarim, seguida de Martin latindo:
— Você acha mesmo que o tapa que você me deu vai ficar por isso mesmo?
— Ignoro-o, pegando minha bolsa no armário e a colocando nas costas,
enquanto aquela sala começa a receber mais pessoas. Eu precisava sair logo
dali, com vestido e tudo. Amanhã eu me resolvia com Martha, mas eu apenas
deveria sair dali. – Hein, vagabunda? – Martin segura meu braço e o aperta
com força, me obrigando a olhá-lo nos olhos.
No entanto, um frio irrompe em minha espinha quando vejo Phill entrar
naquela sala, voando para cima de Martin com o olhar transtornado, como se
estivesse esperando para fazer isso. Ele puxa o corpo de Martin para ele,
dizendo ao mesmo tempo que ele eleva o punho cerrado:
— Vou te ensinar a nunca mais tocar na minha mulher. – Ele abate um soco
na face de Martin, levando ao chão no mesmo segundo.
Fico paralisada, tensionada com que acabou de acontecer. Todos naquela sala
estavam parados como eu, atônitos, enquanto Phill recebia olhares
amedrontados.
Não satisfeito, Phill levanta o corpo de Martin pela gola da camisa de linho, e
desferi outro murro em seu estômago, conseguindo parecer ainda mais
dolorido, fazendo com que as costas de Martin encontrem a mesa e batam no
vidro.
— Phill! – ponho em sua frente temendo que uma tragédia aconteça, mas não
adianta muito. Ele me afasta para o lado com o olhar irascível e vai em
direção a Martin.
Avisto Matt entre as pessoas na entrada da sala, com um rolo de algodão doce
na mão. Passo entre as pessoas e corro para o lado dele:
— Matt – seguro seu braço em desespero, como se ele fosse minha salvação.
– Você tem que fazer uma coisa.
— Por quê? – Matt diz calmamente e desmanchando um pedaço de algodão
doce na boca. – Phill está claramente ganhando.
— Matt! – grito, desesperada.
— Tudo bem! Segura isso – ele me entrega o palito de algodão doce e fala
antes de caminhar: — E não coma!
Ele se vira e vai até Phill. Matt encaixa seus braços nele e o segura pelas
costas, tentando domar a fera e admoestando:
— Ei! Ei! Já chega, cara! – Phill reluta, no entanto, ele para de se mexer
gradualmente, até afastar Matt para longe e ofegar olhando para Martin.
Ele aponta o dedo em riste e deixa o recado:
— Espero que tenha aprendido. Se tocar nela novamente, ou pelo menos, se
ousar tentar, eu vou até inferno atrás de você.
Martin se rasteja no chão, com o rosto ensanguentado enquanto todos
permanecem emudecidos e horrorizados com aquela cena. A voz de Martha
eclode do outro lado da sala, ralhando:
— Fora daqui vocês três! Foraaa!
Phill ainda está imóvel, agora olhando para Martha vociferar.
Matt toca seu braço dizendo:
— Vamos, cara! Não nos misturemos com essa gente.
Phill parece obedecer Matt pela primeira vez e vir em minha direção, que
ficava mais próximo da saída.
— Claire! – Martha rosna do outro lado da sala.
Me viro para olhá-la, então ela diz:
— Mande o vestido pelo correio. Espero que nunca mais ter o desprazer em
vê-la em minha frente. Você e o animal do seu marido!
Sorvo uma boa quantidade, dizendo:
— Não há o que se preocupar. O desprazer é todo meu. – Digo tocando o
braço de Phill e o conduzindo para fora da sala.
Caminhamos, taciturnos, até a ala de circulação, enquanto Matt reivindica seu
algodão doce.
— Sua testa! – reparo ao olhar o alto da cabeça de Phill sangrando ao
alcançarmos uma boa luz. – Está sagrando. – Murmuro, preocupada.
Phill toca o sangue com a lateral da mão e analisa-o na mão, dizendo:
— Isso não é nada. Devo ter me machucado em algum dos estilhaços
daquelas lâmpadas no espelho. Não é nada grave...
— Temos de tratar isso o quanto antes. Eu tenho um kit primeiros socorros lá
no apartamento.
Quando chegamos à ala da bilheteria, Matt nos avisa:
— Eu vou buscar Kristen lá dentro, esperem um momento!
— Matt! Eu acho que já vamos indo. Eu não estou com cabeça pra sair para
comemorar, entende? Se há o que comemorar...
— Oh, não. Tudo bem, Claire. Entendo perfeitamente. Talvez em uma outra
oportunidade...
— Diga a Kristen que ainda quero conhece-la. Talvez em uma noite mais
calma.
Matt assente e se despede de mim e Phill, entrando no primeiro portão do
salão.
— Vamos? – Digo ao homem que não desvia os olhos sérios de mim nem por
um segundo.
— Ok! – ele anui enquanto caminhamos para a saída.
Antes que passemos pela rampa que leva à rua, noto o menino e a senhora de
véu sentados em um dos bancos da entrada;
— Espere, Phill! – Oh, céus! Me esqueci completamente.
Pipoca está com os ombros levemente curvados, segurando uma flor,
parecendo cansado de tanto esperar.
Sinto Phill seguir meu olhar e encontrá-los assim como eu.
— É a Madre? – seu o tom de voz nebuloso ganha resquícios de curiosidade.
Caminhamos até eles, e ao notar minha presença, Pipoca levanta os ombros
rapidamente, abrindo um sorriso que poderia iluminar todo aquele teatro.
— Tia!
Ele se levanta e vem ao meu encontro com os abraços abertos, segurando a
flor em uma das mãos.
Pego-o no colo e o giro, rodopiando a saia volumosa em meus pés. Depois de
alguns segundos, devolvo Pipoca ao piso, enquanto ele me entrega a flor
vermelha:
— Para a senhora.
— Obrigada, meu bem. Não precisava... – digo me abaixando para deixarmos
nossas cabeças da mesma altura.
— Precisava sim, a senhora foi perfeita – ele dizia os olhos brilhando. –
Parecia até uma artista de cinema.
— Madre –, Phill cumprimenta a Madre Angelina beijando sua mão. – O que
a senhora faz aqui?
Ela olha para Pipoca explicando:
— Vim trazer esse garotinho que me passou a semana inteira falando dessa
peça.
Sorrio junto com Pipoca.
— Ele queria tanto vir, que achei que seria um pecado se não o trouxesse.
— A senhora gostou? – pergunto, gentilmente.
— Muito bom o texto, confesso que não assistia uma peça de tão boa
qualidade há tempos. – Ele completa falando baixinho: — Só achei uma parte
um pouco inapropriado para crianças... mas tirando isso, foi um belo
espetáculo – ela sorri, unindo as mãos.
— Fico muito feliz em saber que gostaram – torno a olhar Pipoca. – E que tal
uma xícara de chocolate quente agora? – dou a ideia.
Pipoca ergue os braços no alto, festejando.
Me levanto e me coloco ao lado de Phill dizendo baixinho:
— Não se preocupe, será rápido. Logo estaremos cuidando do seu ferimento.
— Fique à vontade. Você tem o tempo que precisar – ele diz, sério; talvez
ainda envolvido pela energia ruim do acontecimento anterior.
Pego a mão de Pipoca e saímos em busca do carro de Phill, que estava
estacionado bem em frente ao teatro. E acabamos indo a um empório
próximo dali.
Enquanto a Madre conversa com Phill, fico me divertindo com Pipoca,
provando não somente o chocolate quente, mas também os bolinhos
amanteigados saborosos. Recebo atenções a mais de outras crianças ali
devido ao vestido, que me pediam para tirar foto.
Não demoramos muito, pois a Madre Angelina já apresentava alguns indícios
de sono; então nos apressamos em deixá-los no convento antes das dez horas
da noite.
Pipoca se empertigou em meu colo e acabou adormecendo antes de chegar ao
convento. Phill o carregou nos braços até o dormitório em que as crianças já
haviam pegado no sono, e tão logo nos despedimos da Madre e retornamos
ao carro.
Phill ainda permanece quieto, com a postura endurecida, sério — do que jeito
que me lembro de ter o conhecido. Ele liga o rádio e a melodia de Its a
heartache invade o carro, me fazendo abrir um meio sorriso.
Tão logo chegamos em nosso apartamento e aperto o passo até o andar de
cima para retirar aquele vestido do meu corpo que pesava pelo menos uns
cinco quilos.
Coloco uma regata branca e um shortinho cinza de alfaiataria, pegando a
caixa de primeiros-socorros no armário do banheiro e reprimindo meus
cabelos em um rabo de cavalo.
Desço para o primeiro andar, onde deixei Phill e o encontro sentando no
braço do sofá, revirando algo na tela de seu celular. Como sempre, ele está
exuberante. E me impressiono como ainda meu coração pode ir de 90 a 150
batimentos cardíacos por minutos em poucos segundos só de estar em sua
presença.
Fecho os olhos quase instintivamente antes de caminhar em sua direção, e
quando abro os olhos, dou de cara com suas endurecidas esferas esverdeadas
sobre mim, com uma expressão impenetrável cravada no rosto.
Vendo que eu havia petrificado por sua causa, ele larga o celular atrás no
estofado do sofá e relaxa a postura endurecida. E inesperadamente, ele
gesticula com o dedo indicador me chamando para mais perto.
Que droga! Quando penso que ele atingiu seu nível máximo de beleza, ele
me vem com essa e me choca.
Balanço minha cabeça desnorteada e caminho até ele, abrindo minha caixa de
primeiros socorros e a apoio ao lado de seu corpo, enquanto seu cheiro
almiscarado começar a impregnar minhas vias respiratórias.
Apesar de ele usar a mesma fragrância que tem me colocado para dormir, era
diferente quando estava em sua pele. Como se o cheiro fabricado se
misturasse ao seu natural.
Molho uma gaze no álcool 70 e passo em seu rosto, lambendo o ferimento em
sua testa. Esperei por qualquer gemido ou reclamação dele, mas ela não veio.
Phill parecia não sentir dor – ou pelo menos não demonstrava.
Ao invés disso, sua postura de ferro está armada impecavelmente, fazendo
com que nossas cabeças ficassem da mesma altura, mesmo que ele esteja
sentado no braço do sofá.
Faço aquele processo por toda sua testa, eliminando qualquer germe que
venha adentrar seu ferimento. Faço isso em silêncio, mas tão logo digo o que
eu tenho sentido vontade desde que saímos do teatro:
— Obrigada por não invadir o palco.
No fundo, tenho que reconhecer que Phill demandou de muito autocontrole e
esperou até o fim da peça para fazer qualquer coisa. Apesar de eu ser
terminantemente contra a violência, sabia que ele pensou muito bem em
como eu me sentiria caso ele interrompesse a peça.
— Em contrapartida, consegui provocar sua expulsão da academia...
— Não! Não! – fito seus olhos que parece se autopunirem e desfaço aquele
mal-entendido. – Eu já havia feito isso...
— Vai desistir do teatro? – ele pergunta, franzido o cenho.
— Jamais. Há outras academias na cidade.
Aproveito para jogar as gazes na lixeira da cozinha e volto para colar um
Ban-Aid em sua testa, tudo sob os rigorosos olhares atentos de Phill.
— Prontinho! – digo ainda com minhas mãos em sua testa.
Posso ver seu olhar entre meus braços enquanto deslizo minhas mãos para o
rosto, enquanto sinto suas duas mãos tocaram minhas pernas, no pedaço onde
o short não cobria.
Ele embala meu corpo levemente e desfere com sua rouquidão:
— Eu quase sucumbi devido à falta disso – ele aperta os lábios em uma linha
dura, inclinando a cabeça para meu colo, muito próximo aos seios, e me beija
ali esgueirando suas para minha bunda e me trazendo para perto.
Ele sobe os beijos para minha boca e me consome com sua língua, em um
beijo que destrói todas minhas estruturas, enquanto ele sobe minha blusa. Por
sorte, estou sem sutiã e aquilo parece animar Phill que desce a boca para
meus seios e brinca com os bicos túrgidos. Ele chupa um; e depois faz a
mesma coisa com o outro, me puxando para mais perto, quase fundidos
nossos corpos.
— Eu preciso de você agora – ele se levanta, beijando minha boca enquanto
dou alguns passos para trás com seu corpo me engolindo na frente.
Antes que ele me leve a qualquer lugar, fico nas pontas dos pés e chupo seu
pescoço devagar.
— Espere. Antes eu quero fazer algo – digo mordendo seu queixo e o
observando seu rosto pasmar quando meus dedos ágeis conseguem desbotoar
a braguilha de sua calça.
Ajudo-o tirar a camisa rapidamente, deixando à mostra aquele tórax rígido de
molhar qualquer calcinha. Começo a beijar brandamente seus ombros
deslizando minha língua pelo seu peitoral. Dali ergo o olhar para Phill que
me espera ansiosamente em desejo.
Deslizo minha língua por toda a sua barriga até chegar no Sul de sua barriga,
ficando de cócoras diante dele. Minhas mãos o retira de dentro da calça me
fazendo engoli em seco. Começo devagar, brincando suas terminações
nervosas e depois o beijo com vontade sem perder o contato visual
— Oh... Perfeito, Claire... Continue... Ahh... – ele geme enquanto o empurro
para dentro da minha boca, com meu corpo tão excitado quanto ele. –
Cacete... Ahh!
Em um ímpeto, Phill puxa minha mão para si, impulsionando meu corpo para
cima.
— Eu não vou aguentar por muito dentro – ele invade minha boca com ardor
nos conduzindo para o sofá.
Tiro a regata e o short em poucos segundos e, em um movimento quase
sincronizado, deito minhas costas no estofado frio enquanto ele desliza o
corpo para meu, tocando minha fenda com seus dedos longínquos e sinto-o,
em seguida, entrar dentro de mim por completo. Ele move-se em estocadas
lentas até entrarmos em um ritmo frenético de vai e vens deliciosos.
Nós ficamos ali até nossos corpos estarem completamente ensopados de suor,
depois de ele empurrar mais forte, rasgar um gemido sôfrego nos levando ao
topo.
Deito minha cabeça em seu peito, ouvindo seu coração bater forte, enquanto
seus braços me envolvem em um abraço, pronunciando no topo da minha
cabeça e desejando um beijo ali.
— Por favor... nunca mais nos afaste de nós!
CAPÍTULO TRINTA E OITO
Claire
O roçar de lábios em meus cabelos faz com que eu abra os olhos e deite o
lado do rosto no colchão, vislumbrando o Deus grego que ocupa o outro lado
da cama. Céus. Como pode ser tão gostoso em plena nove e horas da manhã?
— Bom dia. – Ele move seu corpo para mais perto, sussurrando em meu
ouvido: — Dormiu bem?
— Maravilhosamente bem –, sorrio, me encaixando em seu corpo desnudo,
que trajava apenas uma cueca boxe.
— Acho que não consigo mais ficar sem fazer amor com você – ele beija
meu ombro. – Vou ter que te precisar todos os dias...
— E eu vou querer te dar isso todo os dias com todo o prazer, gemidos e tudo
mais.
Ele me planta um beijo matinal e maduro nos meus lábios e em seguida
engato a conversa:
— Como foi de viagem? – Finalmente, tenho tempo para perguntar.
— Foi uma tortura – ele diz levando a ponta do dedo indicador para o bico do
meu seio, fazendo movimentos circulares ali. – Definitivamente, você me
acostumou mal.
Sorrio e subo em seu corpo, unindo nossas barrigas e apoiando meu queixo
no vão de seu peitoral, enquanto ele pega um travesseiro e arrasta para trás da
cabeça.
— Matt sabe de tudo.
— De tudo...?
— Que nosso casamento é uma farsa.
Ele franze o cenho, fazendo uma careta:
— Pensei que não fosse mais.
Seus dedos tocam minha bunda, me pressionando contra sua excitação.
— O que exatamente você quer dizer?
— Que eu não vejo problema algum em ficar casado com você para sempre.
Engulo em seco e depois gaguejo:
— Isso é um pedido de casamento?
Ele franze os lábios pensando em algo.
— Tecnicamente, não. – Ele beija meus lábios, segurando meu rosto com as
duas mãos. – Mas que tal uma renovação de votos? Pisco duas vezes e, em
seguida, caio na risada.
— Renovação de votos? Ainda não se estar muito cedo para isso?
Ele sorri levantando uma sobrancelha e tornando a pousar as mãos em meu
bumbum.
— Em se tratando de você, eu não me importo com contratos desde que você
seja minha... – ele me dá um selinho e diz: — Mas podemos pensar em
alguma cerimônia se assim você desejar.
Abro um sorriso largo, pensando o quanto eu estou feliz neste momento. Ele
gira nossos corpos, nos trocando de posições, ficando em cima de mim. Ele
me fita com aquele olhar malicioso enquanto sua boca molha minha barriga
em um beijo quente. Quando as pontas de seus dedos invadem o interior de
minha calcinha, o celular de Phill nos interrompe tocando furiosamente na
mesinha ao lado da nossa cama.
Phill fica parando me olhando, como se precisasse de minha permissão.
— Está tudo bem. Atenda!
Ele beija o pé da minha barriga e se coloca para fora da cama, pegando o
celular em cima da mesa e atende a chamada prontamente:
— Alô.
Depois de alguns segundos assistindo seu olhar esmorecer gradativamente,
seu corpo perde a rigidez e sua mão aperta o aparelho contra a orelha.
Ele fica escutando a pessoa do outro da linha por alguns minutos e depois
encerra a chamada dizendo, com a voz amuada, de uma forma que nunca
havia o visto antes:
— Tudo bem. Em uma hora estou aí.
Ele encerra a chamada, ainda fitando o celular. Em seguida, ele senta na beira
da cama, levando as mãos lentamente para cabeça.
Sinto que perguntas não seriam bem-vindas neste momento, então só me
aproximo cuidadosamente e abraço suas costas, tentando consolar uma parte
dele que foi baqueada.
CAPÍTULO TRINTA E NOVE
Claire

O padre profere algumas palavras de conforto e fala sobre o céu em frente ao


caixão marrom envernizado, enquanto as lágrimas preenchem os olhos de
Alexa, inchados de tanto chorar pela perda do amado.
Ao redor há uma pequena concentração de freiras e motoqueiros barbudos e
tatuados em profunda consternação enquanto Phill me abraça de lado,
plantando um beijo em minha cabeça, com os vidrados no caixão daquele que
foi seu amigo por anos.
A cerimônia dura até o caixão ser totalmente submerso por flores e terra. Eu
não conseguia imaginar a dor deles, mas algo me dizia que Harry foi um
homem muito querido.
Ao final do funeral, Phill nos conduz em direção ao seu carro, quando sou
abordada pela mão quente da Madre Angelina:
— Pode me dar um segundo de prosa, minha querida? – Ela completa fitando
Phill: — À sós.
Olho para Phill, e ele assente:
— Tudo bem. Eu espero você no carro.
Ele se despede deixando um beijo em minha têmpora e em seguida, beija a
mão da Madre respeitosamente.
Quando Phill se afasta, me concentro no que a Madre Angelina tem a me
dizer, e sinto a severidade em sua voz:
— Serei breve, querida. O que tenho para conversar com você é em relação
ao pequeno Pipoca.
Crispo os lábios, perguntando, preocupada:
— Aconteceu alguma coisa com ele?
— Não, não. Ele está perfeitamente bem de saúde. No entanto, ando um
pouco preocupada com o menino. Ele só tem falado sobre a “tia Claire” vinte
e quatro horas e isso tem me preocupado bastante.
Aperto os lábios, um pouco receosa com o que estava por vir.
— O que quero saber é que se você tem alguma intenção de adotar o garoto.
A madre Angelina me pega de surpresa e mal sei o que responder.
— Madre... eu-eu não sei – gaguejo, mas inspiro fundo sendo sincera: – A
verdade é que não se estou preparada para criar uma criança. Desculpe-me.
A madre permanece me olhando firmemente e diz:
— Não há o que se desculpar, sei que havia a possibilidade de eu escutar essa
resposta... – ela pausa e como se tivesse esperado para me dizer isso, ela o
faz: — No entanto, peço para que se afaste do garoto. – Meu coração aperta.
– Não é justo ele alimentar esperanças infundadas. Sei que suas intenções são
as melhores, mas eu também sei muito bem como isso funciona. E acredite:
um coração de uma criança não é lugar para se depositar expectativas. O
coração de uma criança é lugar unicamente para depositar a certeza de um
amor seguro. – Ela disse enquanto meus olhos ardem. – Eu espero que a
senhorita compreenda.
Com a voz embargada, aquiesço e peço outra vez:
— Desculpe-me.
— Tudo bem. Tenha um bom dia! – A madre Angelina vira as costas e se
junta às outras freiras, enquanto eu simplesmente não consigo mais segurar as
lágrimas e desabo em um choro torturadamente silencioso. Só Deus sabe o
quanto eu não queria ser uma jovem imatura, cheia de incertezas, e poder
dizer sim. No entanto, só fiquei ali chorando aprisionada em minha
impotência e com uma dor enorme consumindo meu peito.
— Esteve chorando? – Phill pergunta quando sento no banco do carona
enquanto examinava meu rosto. – Seus olhos me parecem vermelhos. A
madre Angelina lhe disse algo de ruim?
Passo as mãos nos cabelos, me escondendo um pouco e digo sem um pingo
de ânimo:
— Não é nada. Não se preocupe.
Phill parece entender e torna a ficar em silêncio, dando partida e nos levando
de volta para casa enquanto fico ali encarando a janela, com os pensamentos
ao longe.
Sinto a mão livre de Phill tomar minha mão para a dele e falar com a voz
macia, compenetrado no trânsito:
— Seja lá o que a Madre disse a você, saiba que você é a pessoa mais doce
que já conheci. – Ele beija o dorso da minha mão, sussurrando aquelas
palavras de alento: — Eu sei que nunca foi sua intenção. – Suas palavras
soam como se soubesse, abraçando meu coração por completo. Talvez ele
tivesse interpretado algo ao me observar silenciosamente com Pipoca.
Funguei, engolindo mais uma vez a vontade chorar.
— Se quiser, pode encostar a cabeça em meu ombro. Eu prometo que não
vou olhar.
Ele liga o rádio, em uma sintonia aleatória, me deixando mais à vontade.
Lentamente, deito minha cabeça em seu ombro, enquanto ele continua a
dirigir. Aos poucos, deixo minhas lágrimas caírem silenciosas, molhando sua
camisa.
CAPÍTULO QUARENTA
Claire
Três meses depois...
— Vó, para que todos esses exames? Eu já até melhorei, vamos embora. Eu
estou ótima. – Tento escapar da preocupação da minha avó depois de ser
arrastada para o hospital quando passei mal em sua casa hoje mais cedo.
Ela até mesmo não poupou o vovô Christopher, e o arrastou com a gente.
— Não, senhora. Não arredamos o pé daqui até sabermos se tem um bisneto
aí dentro-, Vovó dizia na sala de espera, convicta de que eu estava grávida.
Onde já viu? Não pode mais nem regurgitar depois do almoço e minha avó já
pensa que tenho uma criança dentro da barriga.
— Sabe, eu até sonhei com um enxoval de menina nestes últimos dias.
— Vó – advirto morosamente, tentando não alimentar a ilusão.
Pelo menos, não há indício algum de que estivesse grávida a não ser pelo fato
de transar muito com Phill, no entanto, eu estava tomando rigorosamente meu
anticoncepcional.
— Não custa nada tentar – ela dizia com os olhos vidrados no celular com a
bolsa de valores aberta.
Hoje Phill iria anunciar finalmente a parceira com uma das maiores empresas
petroleiras do mundo, nos levando a crer que ações minoritárias da Sullivan
disparariam no mercado.
Digamos que Phill se tornou nos últimos meses o braço direito da famosa
empresária aposentada, Elizabeth Sullivan, a quem só dava orgulho e
resultados grandiosos. Ela gosta tanto de Phill que até sinto que perdi o
favoritismo na família.
— Phill e eu combinamos de almoçarmos depois do pronunciamento. Se
ficarmos aqui...
“Claire Reagan Sullivan compareça por favor ao consultório nove”
A secretária de cabelos alaranjados anuncia, fazendo com que a senhora ao
meu lado abrisse um resplendor entre os meus lábios.
— Não há mais jeito. Sua vez chegou – ela diz, vitoriosa.
— A senhora não tem jeito! – digo me levantando e caminhando pelo
corredor branco.
Meus avós adentram comigo o consultório nove, e avisto o doutor de traços
orientais ao lado de uma maca e um pequeno televisor na mesa de aço.
— Claire Sullivan?
— Sim. Sou eu.
— Deite-se na maca e levante a blusa até o limite de sua barriga.
— Ok! – anuo, fazendo o que ele me pede. – O senhor já viu meus exames de
sangue?
— Sim, eles chegaram ainda agora. É por isso que está aqui.
Ele passa um gel em minha barriga e encosta um aparelho de superfície lisa.
Para que tudo isso?
O doutor empurra as lentes grossas contra os olhos e fita o televisor,
exclamando:
— Ah, aí está!
— Está o quê? – gaguejo me espichando para ver o que aquele homem estava
vendo. – Parabéns, mamãe! Você está grávida de seis semanas.
Vovó bate palmas com os olhos brilhando, explodindo de alegria.
— Eu-eu estou grá-grávida? – gaguejo, outra vez.
O doutor assente, e eu sinto que vou desmaiar. Oh, meu Deus! Eu estou
grávida. Como vou contar isso a Phill?
Vovô Christopher sorri dizendo a minha avó:
— Não é você tinha razão, danada.
— Eu sempre tenho, benzinho – ela diz dando um selinho no vovô, que se
animou todo. – Seremos bisavós. Duplamente avós.
— Uma benção, querida! Uma benção! – Vovô exclama.
Vovó comemora enquanto questiono baixinho aflita:
— Será que ele vai gostar? – A pergunta nubla minha mente que pensa no
melhor jeito de contar esta notícia: com muita calma e cautela.
Vovó fala mais alto, indagando:
— Quem? Phill. Ele já vai saber. Deve estar chegando
— Como? – pergunto, sobressaltada.
— Ah, querida, eu estava sentindo que você está grávida. Coisa de mãe.
Quando meu bisneto nascer, você vai entender... Então resolvi chamar o pai
da criança também. Nada mais justo.
— Vó, por favor! – Levo a mão a testa. – Eu queria contar em um momento
mais tranquilo...
Escuto o doutor se pronunciar ao lado:
— Desculpe interromper, mas aquele na porta é o pai da criança?...
Levanto a cabeça um pouquinho e o vejo paralisado na soleira da porta. Ele
usa camisa social azul por baixo do casaco longo. Seus olhos
fulgurantes parecem se petrificarem no televisor ao meu lado.
Minha avó dá espaço e ele caminha até o lado da maca, segurando minha
mão e plantando um beijo selinho demorado em meus lábios.
— O pronunciamento... – digo.
— Eu adiei.
— Mas...
— Por você, eu adiaria até uma reunião com o presidente dos Estados unidos,
quanto mais um pronunciamento – ele ofega, com nossas testas coladas.
Phill olha para o lado, onde o doutor estava e pergunta:
— O que a minha mulher tem, doutor?
O doutor faz uma pausa dramática, mas diz:
— Uma criança no ventre... Parabéns, papai! Sua esposa está grávida de seis
semanas.
Vejo seus olhos hidratarem e empoçarem uma quantidade significativa de
lágrimas. Ele vira o rosto para o lado rapidamente, esfregando os olhos para
não deixar as lágrimas caírem dizendo com a voz grave embargada:
— Desculpe.
— Tudo bem. Eu também chorei quando vi o meu filho nascer. – Confidencia
o doutor.
Phill sorri para ele e se coloca novamente ao meu lado, beijando minha
cabeça.
— Eu sou o homem mais feliz desse mundo. – E desce os lábios para minha
boca, dizendo: — Eu te amo. Com tudo o que há em mim, Claire. Eu te amo.
CAPÍTULO QUARENTA E UM
Claire
Nunca pensei que fosse tão cansativo organizar um chá de revelação do sexo
de bebê. Oh, céus! Por mais que eu tivesse ajuda de todos os funcionários da
casa da minha avó, eu me via preocupada com cada detalhe, a fim de deixar
aquele evento impecável.
Eu queria que meu filho visse nossas fotos no futuro e se alegrasse em ver
aquelas lembranças tão felizes guardadas em incontáveis álbuns de fotografia
caprichados por mim.
— Por favor, Fred! Você pode mudar essa mesa para o outro lado.
— Sim, senhora.
Fred move a mesa de docinhos para o outro lado do jardim, onde estaria mais
acessível aos convidados quando chegassem.
Meu olhar resvala para a pipoca dentro dos baldinhos em cores azul e rosa, e
neste minuto, o nome Pipoca vem em minha mente – o nome do meninho que
ganhou meu coração meses atrás – e no mesmo instante, meu peito se
comprime me lembrando da conversa definitiva que tive com a Madre
naquele cemitério.
Depois que me afastei dele naquela época, não consegui ficar um dia sequer
sem pensar nele. Eu me senti muito culpada por não ter feito o que meu
coração estava pedindo, pois eu simplesmente me sentia insegura — não me
achava pronta e totalmente perdida; sendo assim, preferi não me arriscar
pensando muito mais nele do que em mim. Mas agora...
Os convidados começam a chegar, e as primeiras pessoas a adentrar o jardim
da casa de minha avó são Charlize e Molly, amizades que fiz nos últimos
meses na nova academia de teatro que tenho frequentado. Ultimamente, tenho
me dedicado mais aos contos infantis dos irmãos Grimm, e Charlize e Molly
tem sido minha fonte inesgotável de ânimo dentro do teatro.
É quase quatro e meia da tarde, e nada do meu marido chegar.
Phill havia garantido que conseguiria sair do escritório às quatro horas e me
ajudar com os últimos preparativos, já que ele foi fonte de muitas ideias dessa
festa.
Avisto Matt chegando com um chapéu estilo Michael Jackson na cabeça e
um lenço que envolve todo o seu cabelo.
Sorrio quando ele se aproxima:
— O que é isso? Estilo novo?
— Oh, não ria.
— Aconteceu alguma coisa com seu cabelo? – Digo organizando as
lembrancinhas na estante branca.
— Digamos eu pintei ele de vermelho e não deu certo.
— Você pintou de quê? – Gargalho. – Se o tio Ben ver isso...
— Por isso que vim de chapéu, para não ter perigo de ele me pegar.
Olho para os lados e pergunto com estranheza:
— Onde está Kristen? Não veio com você?
Ele retesa o lábio inferior, confessando:
— Não estamos mais juntos. Acabou não dando certo.
— Oh, Matt – largo as lembrancinhas, dizendo para meu primo cabisbaixo. –
Sinto muito.
— Tudo bem, já estou acostumado.
Por cima de seus ombros, vejo a mulher em um vestido vermelho colado e
braço tatuado adentrar pela porta de vidro, meio perdida.
— Olha só quem acabou de chegar – digo animando meu primo.
— Quem?
Matt gira o pescoço no mesmo instante e para quando seus olhos encontram
Alexa.
— Parece que essa tarde não será tão solitária para você – sorrio, atrás dele.
— Priminha, foi um prazer falar com você, mas já vou dar uma circulada no
recinto.
Assinto sorrindo, e ele me retribui com uma piscadela, andando em direção a
Alexa enquanto volto a alinhar as lembrancinhas na estante.
— Estou muito atrasado? – O tom enrouquecido sopra em minhas costas e
sinto os braços cuidadosos me envolverem em um abraço.
— Nem tanto – Sorrio, girando meu corpo louca para tocar seus lábios outra
vez. – Dia difícil?
— Trânsito difícil – ele diz em minha boca enquanto os convidados
conversavam pelo jardim.
Ele estava de calça grafite, camisa social e suspensórios, com aquele ar de
que havia trabalhado muito para estar aqui neste horário, me deixando
levemente excitada.
— Você fica muito sexy de suspensórios – sussurro em cima da sua boca,
enquanto ele massageia minhas costas. – Me deixa louca para fazer amor.
A verdade é que eu estava muito sensível nos últimos dias. Tudo o que sentia
antes, estou sentindo agora exponencialmente maior. Alegria, tristeza,
irritação e, também, tesão. O que torna tudo difícil já que Phill tem ficado
paranoico em relação ao sexo desde quando nós soubemos da gravidez, me
deixando com um enorme desejo que me pegasse de quatro e saciasse o fogo
dentro de mim, como nos velhos tempos.
— Eu penso nisso vinte e quatro horas. Quando nosso filho ou filha nascer,
precisarei de alguns dias para te amar de todas formas. — Ele diz moroso, me
deixando com mais tesão do que eu já estava.
Ele pigarreia e diz, baixinho:
— Vamos parar por aqui antes que alguém me pegue duro – ele diz, me
fazendo percebê-lo ereto dentro da calça.
— Tudo bem, amor. – Beijo-o no rosto e ficamos abraçados até o volume em
sua calça amortecer.
Minha avó inicia a pequena cerimônia e concede espaço para que Molly e
Charlize comecem a realizar as dinâmicas, chamando Phill e eu à frente.
Nos divertimos muito com as brincadeiras elaboradas pelas meninas, e ao
final, ficamos a cara toda suja de batom devido à última dinâmica.
— Agora é o momento. A revelação! – Charlize anuncia, enquanto Molly nos
conduz para os enormes balões posicionados no centro do jardim.
Depois de uma enrolação sem fim de Molly, não me aguentando de
ansiedade, finalmente elas nos dão os espetos.
Phill murmura mentalizando: menina, menina; mais ansioso do que eu. Quem
diria que o homem viciado em trabalho e de poucas palavras se curvaria à
ansiedade de saber o sexo do bebê.
— No três – combino com Phill, que anui.
— Um – ele diz.
— Dois – Eu digo.
— Três – nós dizemos furando os balões e olhando para os papeizinhos
dourados caindo sobre nossas cabeças. Sim, dourados! E que merda é essa?
Olho para as meninas que ficaram responsáveis por pegar o exame no
hospital, e elas simplesmente dão de ombros.
Ok! O que está acontecendo? Antes que eu comece a surtar, Matt chama a
atenção de todos dizendo em uma oitava mais alta:
— EI, PAPAIS! Tio Matt tem uma informação para vocês! – olho para Matt,
que recolhe o chapéu da cabeça, enquanto eu não entendia absolutamente
nada; e Phill, menos ainda.
Matt desenrola a badana de seda da cabeça, e minha nossa! Matt estava com
os cabelos pintados de rosa-choque.
— Hey man, eu serei titio de uma garota!
Nossos convidados gritam em polvorosa e eu não sei gargalho ou choro.
Então apenas faço os dois ao mesmo tempo enquanto Phill meu envolve com
seus braços calmos, com um sorriso exalando felicidade.
— Solta o som DJ. – Matt eleva a voz, sendo seguido por uma música alta e
animada de Bruno Mars.
Phill e eu recebemos alguns abraços acompanhados a felicitações, e ficamos
ali agradecendo e conversando.
— Parabéns, pessoal! – Alexa nos abraça ao mesmo tempo. – Lembro-me de
que seu sonho era ter uma menina, Phill. Você deve estar radiante por dentro.
– Alexa comenta.
— Estou sim, Alexa. É uma alegria indescritível.
— Só um minuto, meu celular está tocando — ela retira o aparelho da sua
bolsa de ombro, atendendo: – Alô...
— Você está cada vez mais linda – Phill declara palavras doces em meu
ouvido enquanto sentia Alexa preocupada com aquela ligação.
— Não. Tudo bem. Estou indo agora, madre. – Escuto suas palavras e meu
coração apertar.
Ela desliga e diz apressada:
— Pessoal, eu sinto muito, mas terei de sair agora.
— Como assim? Aconteceu alguma coisa? – pergunto.
— Parece que uma criança do orfanato se afogou no lago do convento –
minha boca amarga e perco uma batida do coração.
— Eu tenho que ir, sinto muito.
— Espere, Alexa! Quem é a criança? Você pode me dizer quem é?
— Pipoca. – Dou um para trás, enquanto sou aparada pelas mãos de Phill. É
como se essa notícia me nocauteasse e algo dentro de mim se contorcesse em
dor, com os olhos vidrados de lágrimas.
— Eu vou com você, Alexa. – Eu afirmo, com a voz embargada.
— Sua festa...
— Eu levo vocês. — Phill diz ao meu lado, afirmando também, sabendo o
quanto Pipoca é importante para mim.
— Tudo bem. Mas vamos logo que a madre está totalmente desnorteada no
hospital.
— Ok! – Phill aquiesce e nós saímos em disparada para o estacionamento em
frente do casarão.
Enquanto Phill dirigia, eu pedia a Deus para que não aconteça nada de mal ao
meu pequeno, com as mãos trêmulas e as lágrimas jorrando para fora de
meus olhos e inundando meu rosto.
Chegamos ao pronto socorro, encontrando a madre Angelina aos pratos:
— Madre! – Alexa diz.
— Alexa, minha filha! – ela se levanta com dificuldade e é abraçada pela
jovem garota.
— O que aconteceu?
A madre responde totalmente desolada:
— Eu não sei, minha filha. As crianças estavam brincando no jardim quando
a freira Kate saiu para buscar um lanche, nós apenas ouvimos os gritos das
crianças... foi tudo muito rápido... quando vi, Tim já havia tirado Pipoca da
água... isso nunca me aconteceu...
— Tudo bem, madre. Ele ficará bem... – Alexa abraça a madre novamente.
— Quem são os responsáveis por Thomaz Arcanjo de La Veiga?
— Eu, doutor – Madre Angelina se coloca à frente.
— Me acompanhe.
— Posso ir também? – Alexa pergunta. – Preciso acompanhar a Madre.
— Tudo bem.
— Doutor, eu também posso? – Eu pergunto com o coração angustiado.
— Infelizmente, não, senhorita. Apenas duas pessoas por vez. Quando essas
senhoras saírem, você poderá entrar.
— Tudo bem – assinto, fungando.
As lágrimas insistiam em marejar meus olhos até despencaram outra vez.
Phill me conduz para os bancos ao lados, com as mãos amparando minhas
costas. Ficamos ali por um bom tempo, sentados nas cadeiras, taciturnos, à
espreita de qualquer notícia.
Madre Angelina e Alexa aparecerem novamente na recepção. O semblante da
madre está mais calmo; e os olhos, não mais empoçados.
— Ele está bem! – a voz emotiva da Madre revela e meu peito esvazia em
alívio.
— Eu posso entrar?
Madre Angelina me delibera com o olhar, mas concorda no final;
Phill me acompanha pelos corredores frios até o leito divido em duas partes
por um lençol azul. Avisto o garotinho de pele dourada em sono profundo,
enquanto me aproximo da maca parando ao seu lado.
Com as pontas dos dedos, afasto uma mecha de cabelo grudada em sua testa,
fazendo com que seus olhos abrissem em um ritmo letárgico.
— Tia Claire? – sua voz doce está fraquinha assim como seu corpinho
esguio.
— Oi, meu bem! – Respondo disfarçando a instabilidade em mim.
— Eu estou dormindo?
— Não, meu amor.
— A senhora está aqui mesmo? – ele toca minha testa com o dedo indicador.
— Em carne e osso.
Ele sorri. E depois desmancha o sorriso em choro.
— Tia, Claire. Eu tive tanto medo de morrer – ele confessa com a vozinha
embargada e me abraçando fortemente. Minhas lágrimas verteram, quando
ele disse: — Não me deixe só, tia Claire. Eu tenho tanto medo. Eu tenho
tanto! – ele repetia.
Olhei para Phill ao nosso lado, e como se ele tivesse o poder de ler minha
mente, assente com um menear de cabeça.
— Eu não te soltarei, meu bem. Eu não te soltarei nunca mais. – Disse a voz
chorosa, porém decidida, com o coração se enchendo de uma energia
reconfortante de estar segurando meu filho em meus braços.
CAPÍTULO QUARENTA E DOIS
Claire
Dois anos depois...
Há uma brisa revolta que lambe todos meus fios de cabelo para trás, enquanto
saboreio o horizonte de mar com o sol beijando minha pele e da minha
menina em meus braços.
Minha pequena Emma já está com um ano e meio de idade, e ainda não caiu
a ficha de que todos os dias quando eu acordo e encontro a felicidade, até
mesmo nos dias ruins, eu tinha sempre algo a agradecer.
Depois do natal, antes do ano novo, Phill e eu decidimos tirar uma folga e
viemos para o litoral de Santa Bárbara com nossa pequena família, depois de
um produtivo e árduo ano na Sullivan, que rendeu a Phill resultados
astronômicos com seu excelente empenho.
Especialmente hoje, alugamos um iate, e passeamos por toda a costa
californiana, experimentando a liberdade da rotina.
— Mama... mama... – Emma dizia com os olhos esverdeados e sérios como
os do pai enquanto apontava o dedinho para Fred e Sean que nos cercavam
com Jet-skis. – “Fed”... “Fed”... “Fed” – ela repetia balançando a mão para
Fred.
Viro meu corpo para o convés enquanto vejo meu marido e meu filho
caminharem em nossa direção. Phill usa uma sunga preta e óculos escuros.
Desço o olhar sua pele deliciosamente bronzeada, com seu abdômen
refletindo o sol em nossas cabeças. Oh, céus! Me sinto imensamente
agradecida por eu ter esse pedaço de mal caminho em minha cama todos dias.
Apesar do tempo, Phill ainda conseguia me deixar boba, não somente pelo
físico, mas mais pela postura imponente e pelo amor inabalável que ele tem
por nossa família.
— Mãe, a senhora viu?! – Pipoca chega todo entusiasmado contando a nova:
— Papai me deixou conduzir o iate. Era eu que estava no comando ainda
agora.
— Que orgulho, meu amor.
Phill e eu conseguimos a guarda de Pipoca há nove meses, depois de um
longo processo de adoção, e, desde então, nunca mais nos desgrudamos.
Durante esse tempo de processo, Phill e eu amadurecemos muito e comecei a
admirar mais ainda meu marido, que em nenhum momento se desanimou ou
deixou de acreditar que nós nascemos para ser os pais de Pipoca, mesmo
vivendo dias atribulados no trabalho e me apoiando para que eu não
desistisse do teatro durante a gravidez.
— Eu posso segurar a Emma agora? – Pipoca diz estendendo a mão para sua
irmã em meus braços.
Emma impulsiona o corpinho para baixo e dá os braços a Pipoca.
— Com cuidado, meu bem. – Digo encaixando Emma nos braços do meu
menino, que depois senta no largo sofá ao lado.
Pipoca fica brincando com Emma enquanto Phill me abraça por trás
sussurrando baixinho em meu ouvido:
— Eu tenho muita sorte – ele beija meu pescoço fazendo meu estômago
gelar. – Uma família linda e uma bela esposa ao lado, um homem não poderia
desejar mais nada. - Ele sussurra aquelas doces palavras em meu ouvido,
enquanto permanecíamos dentro do próprio reino de amor que construímos
para nós.

FIM

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