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outra forma de cessão, sem prévia autorização da autora Ângela Maria.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n° 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
PRÓLOGO
Phill Castallaneta
Eu tenho o controle de tudo. Tudo acontece exatamente da forma que eu
prevejo. Até quando as coisas estão fora do controle, a margem de erro já foi
milimetricamente calculada por mim. Eu não perco, eu invisto. Eu não ganho,
eu permaneço incansavelmente em busca do topo. Não nasci berço de ouro,
tampouco tive regalias até aqui, porém estou tão louco pelo sucesso, que nem
mesmo o destino poderá me parar de erguer meu próprio império.
— Passageiros com destino a Nashville, portão liberado na entrada G. – A
chamada ecoa em um dos altos falantes do aeroporto, enquanto traço o
percurso que eu bem conheço.
O celular em meu bolso toca, e atento no terceiro toque vendo que se trata de
Ethan. Ele já havia ligado pelo menos umas trinta vezes desde que sol saiu
hoje pela manhã.
— Alô.
Depois de um longo e pesado suspiro, ele exclama aliviado como se ele
estivesse literalmente encurralado entre a cruz e a espada.
— Céus, ainda bem que atendeu! O Seu John Sang está aqui na empresa
desde às sete horas da manhã querendo falar com o senhor. Ele quase nunca
vem aqui e está muito impaciente com sua ausência, a coisa está ficando bem
feia, — ele faz uma longa pausa e diz pesaroso: — Ele está com a carta. –
Ethan é secretário exclusivo da presidência da rede de hotéis do grupo Sang,
empresa a qual me contratou para presidi-la nos últimos onze meses, já que
John não tem mais o mesmo fôlego de quando era jovem para gerir uma
multinacional lotada de compromissos; no entanto, com muita insistência do
pai, o filho mais velho de John Sang, Matthew, subitamente começou a se
envolver nos negócios da família há alguns meses. Era de se imaginar que eu
seria carta fora do baralho mais cedo ou mais tarde.
— Diga a ele não vou poder comparecer. No momento estou embarcando
para Nashville.
— Embarcando para Nashville? O senhor está no aeroporto? Por quê? –
Ethan parece nervoso do outro lado da linha. — Perdão, mas o senhor não
pode simplesmente sair da cidade agora...
— Infelizmente não posso estar aí, Ethan, diga ao John que mande a carta de
demissão por e-mail, amanhã terei de estar assumindo minhas atribuições em
outra companhia.
— Espera! O senhor já está trabalhando em outro Grupo?
— Amanhã será meu primeiro dia...
— O senhor vai apenas desistir da Sang!? Essa empresa estará um caos daqui
a algumas semanas... – Ethan exagera, puxando meu saco.
— O filho do John não é tão ruim assim – talvez daqui a dois meses, penso
dentro das possibilidades reais.
No entanto, eu não poderia fazer nada. E na verdade, pouco me importa, já
não é mais minha responsabilidade. Que John fizesse bom proveito da gestão
de sua cria.
Entrego o cartão de embarque no portão G-05 enquanto Ethan persiste ao
telefone.
— Senhor...
— Mande lembranças ao velho John.
Guardo o celular no bolso do blazer, e a linda morena de cabelos cacheados
me devolve o cartão de embarque, dizendo com um sorriso tímido:
— Tenha uma boa viagem, senhor.
— Obrigado, senhorita!
CAPÍTULO UM
Claire
Agora, em Nova York, eu desejava com todas as minhas forças estar em casa
novamente. Descanso! Era disso o que eu precisava. Principalmente, devido
os acontecimentos que marcaram meus últimos meses de graduação.
Não que estivéssemos muito tempo sem nos vermos, na verdade, de dois em
dois meses ela costumava vir me visitar em Manhattan e só não fazia mais
pois, se bem a conheço, estava ocupada demais com as reuniões da Sullivan,
a empresa de nossa família. Além de ela detestar ficar em hotéis. Elizabeth
Sullivan é uma senhorinha muito geniosa, não gosta de nada que não é de seu
gosto, isso também inclui as escolhas dos netos.
Levo a garrafa d’água aos lábios e desvio o olhar para a janela do avião, e
agradeço pela poltrona ao meu lado ainda estar desocupada. Abro o
Instagram e me animo com a notícia de que a academia de Teatro de Martha
abriria uma nova turma daqui a um mês. Atuar é um sonho antigo, mas eu já
havia o enterrado há muito tempo quando comecei a me dedicar
integralmente ao curso de Negócios, e provavelmente continuaria enterrado
por vários anos.
— Boa tarde, poderia me dar licença?! – Ouço a voz rouca e ao mesmo
tempo suave reverberar ao meu lado.
Olho para cima e me deparo com as írises esverdeadas sobre mim. Apesar de
estarmos na primeira classe, as poltronas ali não eram separadas por
espaçosos vãos de voos internacionais.
Apesar da enorme estatura, com agilidade, ele passa com facilidade e se senta
ao meu lado.
Ah, céus! Eu não creio que eu esteja virando uma mulher amargurada, que
julga as pessoas sem conhece-las. Apenas durma e pare de pensar bobagens,
Claire!
Ele era bonito, muito bonito. Não uma beleza que se enjoa fácil, muito menos
comum. Seu nariz tem uma curvatura perfeita, assim como sua boca. Ele me
olha de soslaio e depois me encara. Droga! Por que ele está me
encarando? Por que você está o encarando, Claire?! – meu subconsciente
responde sem paciência. Mas por que eu não consigo parar de encará-
lo? Parecia que eu havia petrificado, feito uma colegial.
— Errr... A senhorita aceita? – ele diz me oferecendo o chiclete de menta.
Ele não parece constrangido, nem algo do tipo, apenas incomodado com
meus olhares persistentes, levando-o a tomar uma atitude.
— Sim, legal! – abro um sorriso amarelo. Eu sei o que ele quis dizer.
— Devia pedi-las.
— Não, não curto revistas – respondo, tornando a olhar para frente a fim de
encerrar o papo, mas ele fala baixinho:
— Deveria gostar!
— Aconselho o senhor peça uma, já que está tão incomodado. Acho que eles
devem ter uma de conteúdo adulto.
Uma senhorinha na poltrona a frente arregala os olhos para mim, arrastando
as grossas lentes para rosto que antes estavam penduradas no pescoço.
Meu primo sempre foi um homem muito bonito. Cabelos castanhos estilo
surfista, músculos bem divididos e um queixo quadrado de arrancar suspiros.
Oh, ele é um partidão! Além de ser uma pessoa maravilhosa.
Seus olhos risonhos resvalaram para meu lado por um segundo, tempo
suficiente para reconhecer alguém que saía também da porta de desembarque
atrás de mim.
— Não. Não. Não. Eu não acredito! – diz Matt em minha frente. Olho para
trás e vejo o tarado do avião se aproximar. Ele usa um casaco longo branco e
óculos escuros. – Não acredito, é você mesmo, irmão?
O tarado retira os óculos e olha com surpresa para Matt, no entanto, não tão
entusiasmado quanto meu primo.
— Matt Sullivan? – sua voz rouca indaga.
— Phill Castellaneta?
O tarado identificado como Phill aperta a mão de Matt, que o puxa para um
abraço de "Brothers".
— Por onde você andou, cara? – Matt pergunta, enquanto o olhar esverdeado
recaí sobre mim. – Ah, deixe-me apresentar minha prima Claire.
Enquanto Matt salva o número em sua agenda, minha atenção ainda continua
no homem que atendia pelo nome de Phill. Seus passos eram firmes e
precisos, características de pessoas confiantes. Não nego que ele tem estilo.
Mas tinha alguma coisa de errado nele, talvez não soubesse identificar
naquele momento, mas com certeza existia algo de errado com ele.
Matt empurra o carrinho com minhas malas, me convidando a sairmos dali.
— Sério?! Que tenso – ele foge o olhar do celular em sua mão para mim,
enquanto empurra o carrinho com a outra mão. – Foi muito forte?
— Ainda bem. Imagina se esse avião não chegasse aqui. Eu iria ficar órfão de
prima – ele dramatizou, e eu sorri dizendo:
— Bobo!
Seus olhos tornam a fitar a tela do celular, enquanto ele entorta a boca ao
dizer:
— Acho que eu devo ter digitado o número de Phill errado. Está dizendo aqui
que esse número não existe.
— Sim, naquela mesmo. Ele era um cara fechadão, era o único bolsista da
sala, deve ser por isso que ele sempre tirava as notas mais altas, não gostava
muito de interagir com ninguém. Eu até o achava meio metido. Mas o cara é
muito gente fina. Ficamos amigos num passeio de escola em que foi apenas
ele e eu. Todo o restante dos alunos havia ido viajar, não tinha muito o que
fazer a não ser caçoar com Phill do sotaque esloveno do Sr. Mischer.
Ele repuxou o lábio inferior e fez uma cara de quem acabou de fazer merda.
— Era pra ser, mas eu estraguei tudo pelo visto. Desculpa, prima. Não prestei
atenção ao que a vovó me falou antes de eu vir pra cá. – Eu ri alto com
aquilo. Eu simplesmente amo minha família.
— Segredo nosso. Vou usar todo meu talento de atriz da Broadway, não se
preocupe. Será como se nunca você tivesse deixado escapar – disse lhe
lançando uma piscadela. Ele meneia a cabeça, rindo com os ombros mais
relaxados, enquanto avistávamos um dos carros pretos de vovó parado em
frente ao aeroporto, com o pisca-alerta ligado.
— Olá, Tom! Como vai? – digo entrando pela porta de trás enquanto Matt
senta no banco do carona.
Tom era o motorista da família há anos, muito antes do meu nascimento ele
já trabalhava para minha avó.
Chegar em Nashville e o ver ali, me traz um sentimento que estou realmente
de volta, em casa, deixando meu peito quentinho, quentinho, mesmo que
ansiosa para viver o meu mais novo ciclo de vida.
— Estou bem. Só com uma estranha sensação: parece que foi ontem que você
me deixou neste aeroporto. Cinco anos se passaram e voilà, aqui estou
novamente.
Mesmo sem ter a intenção, as palavras de Tom era tudo o que eu precisava
ouvir. Talvez esquecer um pouco os desejos dos outros e ir em busca da
minha felicidade era o melhor a se fazer.
Quase todas as boas memórias que eu tenho com meu avô são assim: no fim
de tarde no jardim de casa, enquanto minha avó trabalhava incansavelmente
na Sullivan. Vovô foi diagnosticado com osteoporose avançada aos cinquenta
anos, e desde então, está sempre em casa, tomando banhos de sol pela manhã
e no fim de tarde, cuidando da saúde, jogando xadrez, contando piadas e
rindo muito com os velhos amigos que vinham o visitar sagradamente às
sextas à tarde.
Era sempre muito bom poder sentar ao seu lado e poder conversar desde as
coisas mais triviais aos assuntos mais complexos da vida. Eu sinto que tenho
sempre muito a aprender com ele.
Quando a noite cai, subo para meu quarto com o intuito de tomar uma ducha
quente e trocar de roupa. Tudo estava exatamente do jeito que deixei: a
parede cor de rosa bebê, a penteadeira ao lado da janela de vidro que dava
vista para o jardim, e os móveis em marfim.
Opto por um vestido amarelo soltinho fresco, ideal para a reunião familiar
que já acontecia na sala. Abro minha mala outra vez e procuro pelo meu
celular. Não encontro e o busco em minha bolsa de mão. E, bingo, estava lá!
"Esse é meu celular. Você acabou trocando o seu pelo o meu no avião.
"Oi, senhor. Desculpe-me, mas agora não terei como trocar, tenho uma
reunião familiar. Podemos nos encontrar amanhã pela manhã?"
"Acho que sei. Fica entre a 8th Avenue South e a 12 Avenue South?"
"Sim"
Minha avó havia trocado alguns móveis, claro, porém todos continuam com a
mesma tonalidade bege e em tons bem clarinhos, enquanto os vasos
recheados de plantas gramíneas parecem fazer o ar respirar e dar mais vida
àquele ambiente da casa.
— Minha doce Claire! – Minha avó vem ao meu encontro, com uma taça de
champanhe nas mãos.
Ela me abraça pela primeira vez desde que cheguei, e eu sussurro baixinho
em seus braços:
— Acho que o Dr. Jackson não ficaria feliz se soubesse dessa taça em suas
mãos.
Desvencilho-me dela e a rechaço com o olhar.
Minha avó foi diagnosticada com diabetes aos sessenta anos, e diferente do
meu avô, ela sempre resistia em seguir as recomendações médicas.
— Pare de ser velha. Nem eu que sou velha não sou velha.
O jazz que recendia na sala fica mais alto e minha avó começa a mexer os
ombros enquanto Matt vem estalando os dedos de acordo com o ritmo da
música e eu começo a rir, estalando os dedos também.
Matt pega minha mão e me rodopia, assim como fazíamos quando crianças.
Começamos a dançar ao som da minha avó cantando Frank Sinatra, enquanto
meu tio Ben se entretém com o champanhe e meu avô fazendo o que ele sabe
fazer de melhor: ganhar o Seu Charles, amigo da família, no xadrez de ouro
que ele herdou do meu bisavô Robert.
Certas coisas não mudam e talvez eu goste disso. Faz-me sentir segura. No
entanto, eu sabia que essa segurança talvez pudesse soar perigosa, comodista.
No entanto, é esta a segurança que eu mais amo: o alento da minha família.
CAPÍTULO QUATRO
Claire
Depois do jantar delicioso encomendado por vovó, sentamos novamente nos
sofás da sala, saboreando a mouse de limão siciliano. Eu conversava com
Matt sobre sua vida amorosa, e fiquei feliz em saber que eu não era a única
fracassada amorosamente nesta família.
No meio da sala, minha avó chama a atenção de todos ali e diz animada:
— Será?!
— Está mais que preparada, meu amor. Veja só: eu assumi a empresa quando
seu bisavô faleceu, e eu nem ao menos tinha um diploma.
Não era surpresa para ninguém ali que eu iria assumir a presidência. A
história da nossa família não é como nos filmes em que todos querem herdar
a presidência do grande grupo empresarial. Na verdade, é o contrário. Parecia
que todos ali pareceram fugir da obrigação de ocupar a presidência.
Meu tio tem seu próprio negócio desde os vinte anos, e sempre deixou claro
que não assumiria a presidência, pois não havia como conciliar o grupo
Sullivan com sua empresa do ramo automobilístico, a qual Matt iria herdar
seu cargo logo, logo.
Era para meu pai assumir essa obrigação, mas como ele não estar entre nós,
caiu sobre os meus ombros a grande responsabilidade de gerir uma empresa
com muitos anos de história.
— Alô!
— Estou em frente à sua casa. Venha até aqui e traga o celular! – A voz rouca
do outro lado da linha soa grosseira.
— Espere um momento.
Aceno para o porteiro para que abra o portão, que me olha meio desconfiado,
mas faz o que eu peço.
Diferente do casaco pesado que ele usava da última vez em que o vi, Phill
agora usa uma blusa de manga azul escura que se agarra muito bem em seus
músculos definidos. A calça jeans surrada lhe dava um ar revel e confesso
que... sexy.
Ele me olha por cima, desconfiado, porém abaixa o braço e desliza a mão
para o bolso da calça:
— Pegue!
— Você acha que eu estou com tempo para criancices de uma patricinha?
Devolve logo essa porra de celular! – ele rosna.
— Ih, patricinha? Que termo mais antiquado – provoco o machão. Olho para
o Porsche atrás dele e digo: — Que carrão, hein?! Você é por um acaso um
mauricinho?
— Pegue! Não vou mais tomar seu tempo. – Eu digo sacando o celular do
casaco e lhe entregando.
— Você deu o número errado no aeroporto, algo me diz que foi proposital.
— Nada pessoal. Eu só não sou a mesma pessoa que seu primo conheceu.
Vai por mim, melhor deixar seu primo longe de um cara chato feito eu. – Ele
diz por fim, abrindo a porta e entrando no Porsche prata.
Ele dá partida, e eu fico sozinha ali, no meio da rua, enquanto vento frio
sacude meus cabelos castanhos com minha mente tentando entender o que
aquele cara quis dizer.
No entanto, sei que isto não se trata de que um sonho ruim, isto estava
mesmo acontecendo. Eu estava suando frio, sendo levada por três brucutus
ossudos e nervosos. Um sequestro — concluo. O maior pesadelo da minha
avó estava acontecendo e não quero nem imaginar quando ela souber disso.
— Não acredito que conseguimos assim tão rápido — O homem que dirigia o
veículo exclama, batendo com as mãos no volante.
De esguelha, olho para o outro homem encapuzado a meu lado, que percebe
meus olhos atentos.
— Até que você é nada mal, princesa! — a voz fina diz em um tom nojento,
tocando minhas costas com a mão gelada e me fazendo sentir o cheiro azedo
de roupa suja. — Aposto que essa boca rosadinha faz loucuras...
Ele puxa meus cabelos com tanta força, que sinto que meu couro cabeludo
poderia descolar a qualquer momento de minha cabeça.
— Sei lá, porra. Eu acho que era ele que estava com a bacana na frente da
casa. — O outro homem de voz mais estrangulada responde.
Com o corpo inteiro tremulando, viro o rosto cuidadosamente para trás para
espiar.
Vejo dois homens saírem do carro e arrancarem a mulher a força da rua para
dentro do carro. O carro dá a volta rapidamente e passa por mim novamente,
em alta velocidade. Só que dessa vez, eu estou mais atento e observo a placa
do carro de números familiares.
"J2 435"
— Caleb! — Balbucio.
Porra! O que esse idiota pensa que está fazendo? — aperto o punho, socando
o volante, e vou atrás do desgraçado do meu primo. Ligo para seu celular,
que cai na caixa postal.
— Porra!
***
Depois de um banho quente, visto roupas limpas e vou até a adega ao lado da
sala em busca de uma boa dose de Whisky. Encho o copo com o líquido
avermelhado e me sento no sofá de linho, ao lado da porta.
Encaro o relógio em meu pulso e vejo que faltam apenas meia hora para a
meia noite e nada daquele moleque ter chegado. Ligo novamente, no entanto,
diferente da última vez, a ligação não cai na caixa postal, mas, dessa vez, é
recusada.
— Que garota? Você trouxe alguma mulher hoje? — ele pergunta sem
entender.
— Eu estava lá.
— Estava lá? Onde? Espera, primo o senhor não está bêbado, não é?
— Escuta aqui, moleque! Eu mal cheguei nesta cidade e já descubro que você
virou uma porra de bandido. Se quiser ferrar sua vida, se foda sozinho. Não
use um carro meu para fazer merda. Você vai me dizer agora onde essa
menina está!
— Calma, primo.
— Já pedimos o resgate.
Caralho!
— Mas pedimos sigilo, primo. Eles não irão envolver a polícia, ao menos,
não agora.
— Eu não vou primo. Com todo respeito, mas eu não vou levar você lá. Vai
estragar tudo. Isso é negócio meu.
***
Ainda é noite. O ar está mais úmido do que horas atrás, quando coloco meus
pés no piso oleoso do galpão atrás de uma borracharia no centro da cidade.
— Teu primo? Por que trouxe esse maluco pra cá? Está louco? Se o J9 souber
disso...
Enquanto Caleb discutia com o outro magricela, saco uma pistola calibre 380
e aponto para os dois, indo em direção à garota no chão.
— Tu não disseste que ele é teu primo, irmão? — o amigo de Caleb grasna.
Ele olha de esguelha para a arma ao lado então rosno mirando o braço do
garoto:
— Mãos na cabeça. Se tentar tocar no revólver, eu te deixo sem punho.
Resvalo o olhar para a garota, que parece acordar com o meu brado.
Ela geme alguns sons sem nexo, e, num ritmo letárgico, abre as pálpebras
arroxeadas. Seus olhos azuis-turquesa me encaram confusos, e seus lábios
desidratados se incomodam com o pano calando sua voz.
— Onde? — pergunto.
Ela pressiona a mão contra o ventre, se contorcendo para frente. Deslizo meu
olhar para o seu vestido e, neste instante, meu cérebro congela quando vejo a
enorme mancha vermelha na barra atrás de vestido amarelo.
Acordo ao som do timbre grave de uma voz familiar e me esforço para não
dormir novamente. Lentamente, resvalo meu olhar para cima, para o conjunto
de pernas. Pelos grunhidos, aquelas pessoas parecem estar discutindo até um
deles me perceber acordada.
Minha mente processa aos poucos a imagem do homem em minha frente, que
possui um revólver apontado para outro alguém naquele galpão. Algo dentro
de mim suspira aliviado quando vejo que se trata do homem sério de cabelos
dourados e íris esverdeada. O “safado” do avião, Phill. Ele veio mesmo atrás
de mim.
Ah, não! Justo hoje?! – Penso, desvanecendo aos poucos com a dor pungente
decorrente ao início dos meus dias vermelhos.
Vejo seus olhos se arregalarem quando descem para a barra do meu vestido.
No mesmo instante, sigo seu olhar para o que ele estava mirando e dou de
cara com a enorme mancha de sangue na parte traseira de meu vestido.
Ele havia atirado no chão, fazendo o garoto de cabelos amarelados cair para
trás, arrastando o corpo contra o chão.
— Consegue se levantar?
Olho para os lados, temerosa. Não entendo quando foi que o sequestro havia
acabado. Os dois meninos a minha direita seriam de confiança ou apenas seu
primo? Argh, isso está tão confuso! Onde estão o resto dos homens que vi
naquele carro?
— Claro!
— Caleb! Pegue aquelas cordas ali. – Phill acena com a cabeça para cima da
carcaça de um Chevette antigo.
— Você sabe o que fazer – Phill responde e olha por fim para o magricela
loiro tremulante na mira de sua arma.
Dou o primeiro passo, no entanto, tão logo estanco. Quando ele percebe
minha relutância, me encara com a testa franzida.
Alterno meu peso de uma perna para outra, tentando me fazer entendida da
maneira mais rápida.
— Mais vale uma jaqueta suja do que o banco do meu carro manchado. –
Pela forma grosseira com que falou, isso não era uma opção, mas sim uma
exigência.
— Obrigada por me deixar sujar sua bela jaqueta – desdenho, fazendo o que
ele me pede.
Ele caminha em minha frente e sigo em seu encalço até o Porsche prata.
— As pessoas não costumam usar essa palavra em minha frente. Mas sim.
Sou órfão.
— E o seu primo?
Ele olha novamente para o banco em nossa frente e finalmente faço o que ele
pede, enquanto faz a volta no carro. Logo ele está ao meu lado dando partida.
— Não.
— Onde estão o resto dos homens que estavam no carro? Quer dizer, me
lembro pelo menos de mais dois caras. Onde eles estão?
— Quando cheguei, havia apenas um. Mais uma pergunta? Não? Que
maravilha – ele diz sem me dar tempo de responder.
— Graças a Deus!
Phill envolve minha cintura com seus braços cálidos, enquanto Matt vem
minha direção e me carrega nos braços para o sofá da sala. A partir disso,
tudo acontece mais rápido.
— Sim, mas por que ele estava com minha neta? – vovó ainda está meio
alterada.
Ele sabe meu nome – penso ao ouvir pela primeira vez meu nome sendo
pronunciado por Phill. Algo me diz que ainda ouviria isso muitas vezes, e, de
alguma forma, gosto dessa ideia.
Tão logo, sou medicada e levada ao banho. Depois disso, não me lembro de
muitas coisas, apenas que apaguei em minha cama de lençóis limpos, com as
cortinas do quarto fechadas, impedindo que os raios solares adentrassem o
local.
CAPÍTULO OITO
Claire
Acordei com a imagem das bochechas rechonchudas e as curiosas esferas cor
de âmbar me encarando.
— Não pense nisso agora, querida! Depois do que aconteceu com você
ontem, seu único trabalho hoje é descansar. Aliás, já descansou o bastante. Já
está até com as pálpebras inchadas – ela observa.
— Ah, querida! Era isso o que eu vim fazer aqui: dizer para você tomar um
banho quente, colocar um vestido bonito e descer para o jantar especial de
hoje à noite.
A verdade é que pareceu que ele fez aquilo a contragosto. Como se eu fosse
um grande fardo que ele teve que carregar, atrapalhando seus planos para a
noite – mas eu não queria ter que explicar uma impressão que tive a minha
avó. Impressão não é algo preciso, certo; por isso não teria muita relevância
para ela, se bem a conheço, ela dá mais credibilidade a inflexibilidade dos
pensamentos palpáveis.
Ela vai até a porta do quarto e antes de desaparecer pelo corredor, ela
adverte:
— Não se atrase, minha filha. Quero começar cedo para terminar cedo.
Amanhã teremos um longo dia de trabalho.
Abro a torneira e enxáguo o rosto com uma boa quantidade de água, e afasto
aqueles pensamentos ansiosos. No entanto, outro tipo inquietação toma conta
do meu corpo, esquentando-me debaixo da pele. Phill estará aqui em uma
hora, e eu estou estranhamente ansiosa para isso.
CAPÍTULO NOVE
Claire
— Até que enfim, Claire! Já estava quase subindo para chamá-la novamente.
— Não há o que se desculpar. O convidado ainda nem deu caras. Não sabe
como é sua avó? – Tio Ben comenta do outro lado da sala, segurando um
copo com Whisky de sua esposa, Camila.
Liz aquiesci.
— Bem!
Tão logo o homem alto de cabelos úmidos adentra a sala, usando uma camisa
de tricô cinza embaixo de um estiloso sobretudo marrom escuro, combinando
com a calça jeans surradas e as botas Chelsans.
Liz se oferece para guardar seu casaco, e ele aceita tirando o sobretudo e
entregando a ela, murmurando um “Obrigado! ”.
O silêncio permanece na sala por alguns instantes até a voz rouca dele
reverberar, cumprimentando:
— Boa noite! Perdão pelo atraso, eu estava no trabalho e tive que voltar ao
meu apartamento para tomar um banho e trocar de roupas.
— Atraso? Não, querido. Você não está atrasado! Chegou na hora. Venha,
vamos sentando! – Ela se coloca ao lado de Phill e o incentiva a se aproximar
do conjunto de sofás.
— Não há problema. A morte é uma das poucas certezas que temos nesta
vida, não é mesmo?
Minha avó inspira fundo, pensando por um momento, talvez recobrando algo
da história de nossa família e, por fim, concorda:
— Sim, disse bem! É uma das poucas certezas que temos. – Dando-se conta
do comentário mórbido, ela completa: — Mas não devemos provocá-la
também.
Phill expande o olhar pela sala e cumprimenta Matt ao meu lado, que o
responde com um “E aí, cara? ”
— Não exagere, vó! Não éramos amigos, estava mais para colegas de turma.
Phill nunca me deu muito abertura.
— Phill, eu não tenho palavras para agradecer o que fez ontem pela minha
família. Estou até agora sem palavras, meu querido. Você poderia contar um
pouco mais sobre o que aconteceu ontem à noite? – Vovó pergunta ao seu
lado, tocando seu braço. – Desculpe-me, ontem estávamos tão atordoados
pela manhã, que mal conseguimos compreender direito o que houve.
Vejo seu olhar deslizar para frente e me encarar. Ele solta um leve suspiro,
disfarçando, talvez, o desconforto imperceptível; e pergunta com um sorriso
de lado:
— Tudo? Parece-me um bom pedido. Pois bem. Por onde começo?... – Ele
suspira mais uma vez. – Sua neta e eu estávamos em frente a esta casa ontem
à noite e...
— Perdão! Por que você estava aqui com Claire ontem? – Matt indaga,
confuso.
— Feito isso, entrei em meu carro e presenciei toda a ação dos delinquentes.
Eu segui o carro e fiquei à espreita no galpão esperando a hora apropriada
para entrar.
— Espere... nós deixamos Caleb e o loiro amarrado para trás... o que houve
depois? A polícia prendeu o garoto?
— Como foi dito em meu depoimento à polícia: mais outros dois garotos
chegaram ao balcão e renderam Caleb com um taco de beisebol.
— Não se preocupe! Caleb está bem. Ele teve o antebraço faturado, mas nada
tão grave. Isso poderia ter sido mais dramático se eles usassem a arma de
fogo, por exemplo.
— Agradeço, mas não é preciso. Ele já está em casa desde o início da tarde.
— Esses são os jovens que nosso país está formando? Esses vermes merecem
passar alguns longos atrás das grades. Só assim para virarem gente decente! –
Meu avô resmunga ao meu lado, indignado. E é seguido pela dura promessa
de minha avó:
— Eles pagarão pelo que fizeram, Robert! Essa semana mesmo irei a polícia
me certificar de que irão tirar esses garotos das ruas. Não podemos deixar que
fique por isso mesmo e correr o risco de acontecer algo a nossa Claire outra
vez.
— E ainda saiu para trabalhar hoje à tarde, meu querido? – Vovó indaga a
Phill, com um ar maravilhado, e ele assente formalmente. – Aliás, você
trabalha com o quê?
Ele cola as costas na cadeira atrás, pousando as mãos em cima das coxas.
— Hill Supermercados.
Apesar de ter ficado exilada por um tempo de Nashville, eu sabia muito bem
que a rede de supermercados que mais cresce e domina todo a região de
Tennessee era a do grupo Hill.
— Poxa vida! Ainda bem que você não nasceu como meu primo, Phill! –
Matt brinca.
— Oh, não! Não é para tanto! De que vale ter a formação se não temos a
própria empresa? Eu sou apenas um funcionário tentando a vida. Não sou
melhor que ninguém, apenas consegui a sorte de uma bolsa em uma boa
escola como a qual nós estudamos.
— Não acho que isso seja apenas sorte! – Vovó prossegue com a voz macia:
– Se não for muito incômodo, meu querido, você pode dar algumas dicas a
nossa Claire? Ela irá assumir meu lugar na presidência do grupo
empresarial de nossa família e seria enriquecedor se ela recebesse
algumas dicas de um profissional tão capacitado como você. Não é mesmo,
Claire?
Aquiesço:
— Claro, seria muito enriquecedor! Se não for muito incômodo para Phill,
claro!
Ele franze um a testa e pela primeira vez na noite sinto o olhar esverdeado
flamejante sobre mim.
— Acho vocês que fariam o belo casal! – Minha avó comenta, criando uma
nuvem de embaraço entre nós.
***
Ele me fita não muito receptivo como antes, quando estava ao lado de minha
avó.
— Eu tenho um compromisso marcado ainda essa noite. Se pudesse ser
rápida e fazer suas perguntas, me faria um grande favor.
— Não, eu não tive tempo para me sentir assim, mas já ouvi muito relatos de
colegas de turma que se sentiram assim.
— Eu só queria respirar, sabe? Fazer algo que realmente gosto, não apenas
pular de um estresse, que é a Universidade, para outro.
— Que vida difícil! – ele solta um longo suspiro e isso soa meio sarcástico. –
Fiquei curioso! O que faria se não tivesse esse terrível fardo de ser presidente
de uma empresa multimilionária e estável como a Sullivan.
Se havia alguma dúvida de que ele estava sendo sarcástico, agora não há
mais.
— Atuaria.
— Sim, antes de entrar na Universidade, meu sonho era ser uma atriz
profissional de teatro, mas parei de praticar há muito tempo. Seria ótimo
poder voltar e sentir novamente a adrenalina de ensaiar e me apresentar em
um palco. Só por uns meses, isso abasteceria muito minhas baterias.
— Perdão mais uma vez, mas por que deve ser você a ocupar o lugar de sua
avó? Por que não Matt?
— Entendo. Talvez se tivesse mais parentes em sua família, você não teria
que carregar esse fardo sozinha. – Ele diz reflexivo. – Estou realmente muito
tocado com seu difícil dever, mas eu tenho que ir.
Interrompo-o:
— Casando comigo.
Phill transfere seu peso de uma perna para outra. Ele semicerra os lábios e
pousa as mãos na cintura. Eu não tinha muito experiência com os tipos de
seus olhares, mas a forma como está me encarando não é tão difícil de
deduzir que a palavra “ensandecida” seja um dos adjetivos que ele está
prestes a me caracterizar.
CAPÍTULO DEZ
Phill
— Você está pirada.
— Por que diz isso? Eu sei que parece loucura, mas seria perfeito para ambas
as partes. Além de minha avó estar encantada com você, não seria muito
difícil de fazê-la engolir a história de um romance avassalador e repentino.
Eu a conheço muito bem para saber que ela iria adorar ter você como genro e
funcionário da Sullivan.
— Você me salvou...
— Com todo respeito, acho que você deve seriamente rever seus parâmetros
de confiança. Isso pode te levar a lugares perigosos.
— Quem irá me levar? – Ela se aproxima, trazendo seu nariz empinado e
atrevido a centímetros do meu. – Ui, ui, ui! Você?! Mais um motivo para eu
querer me casar com vossa senhoria. – Ela sopra as últimas palavras, com
aquele tom de mulher petulante que já estar começando a me dar nos nervos.
— Isso não será bem um jogo, está mais para encenação. No entanto, se for
esse o problema, eu amo jogos! – Ela dá de ombros e diz por fim: — Só vou
saber se eu experimentar, não é mesmo?! — Seu olhar é tão decidido, que
mal consigo arguir contra qualquer pensamento seu. Ela parece ser uma
pessoa teimosa demais para dar pra trás a qualquer ideia sua.
Faço uma longa pausa, quando ela se afasta um pouco e me observa pensar.
Então finalmente pergunto:
Vejo seu peito subir e descer suavemente, e ela titubeia antes de dizer:
Ela termina e me encara, ansiosa por minha resposta. Inspiro fundo, tentando
conter uma risada:
— Por que diabos pensa que deixaria meu emprego para participar de seu
plano maluco? Você acha que vou largar meu emprego por seis meses
levando uma vida de CEO de uma multinacional? E depois disso?
Ela pisca duas vezes aquelas grandes esferas azuis-turquesa e diz, pensativa:
— Ah, claro! – Ela parece ter um insight e diz firme, no mesmo instante: —
Depois disso eu consigo para você um emprego de diretor na Sullivan. – E
acrescenta: — Ganhando o dobro que você ganha como gestor da Hill.
Oh, talvez eu tenha subestimado essa garota. Ela é maluca, no entanto, sabe
negociar. Sem dúvidas, aparentemente, é uma proposta tentadora. Uma
empresa como a Sullivan está em um patamar muito superior diante de uma
rede de supermercados local. Se Caleb não estivesse envolvido no sequestro
dela, eu aceitaria prontamente.
No entanto, eu havia de pensar com mais cautela. Talvez seja mais seguro
romper o vínculo com essa família o quanto antes. No entanto, não me parece
uma boa recusar sem antes pensar com mais cautela.
Quando dou um passo à frente, meu punho é tomado pelos finos dedos da
mulher astuta de cabelos castanhos. Viro-me para soltar sua mão, e sou
surpreendido pelo toque dos lábios cálidos e macios.
Ela desliza seu corpo para frente e se gruda em mim, elevando sua mão
gélida até minha nuca, enquanto permaneço examinando sua ação de olhos
abertos. Com destreza, ela tão logo serpenteia seu corpo para longe do meu,
abrindo seus olhos dramaticamente. Ela sorri, como um anjo. E sussurra
como uma calculista:
— Se for aceitar amanhã minha proposta, acho bom que já se comece a dar
sentido a essa história.
Pisco duas vezes e sorrio, pensando: — Se soubesse, não seria tão tola.
Desta vez não aceno e apenas sigo meu caminho, agradecendo rapidamente a
senhora Sullivan e os demais membros da família.
Matt e eu quase nunca tínhamos tempo para visitá-la em seu escritório, pois
sempre estávamos em algum curso de francês, alemão ou apenas praticando
algum esporte. Aliás, foi ela própria quem me matriculou nas aulas de
academia de teatro de Martha quando eu ainda tinha dez anos. A certa altura,
eu não tinha muita noção do mundo, mas sabia precisamente que amava subir
aos palcos.
— Não há pessoa mais pronta que eu neste momento, vó! – sorrio, tentando
dar um pouco de satisfação a ela.
Apesar de eu sempre ter levado uma boa vida, eu nunca tive um carro em
toda minha existência.
Minha avó sempre dizia que dá demais aos filhos acaba estragando bons
profissionais, então resolveu estabelecer uma idade mínima para cada coisa a
ser ganhada ou conquista. Um carro estava na faixa etária dos 21 anos.
Já faz dois anos que completei 21, mas como eu estava em Nova Iorque,
permaneci sem carro mesmo. Digamos que em Nova Iorque, um carro não
tinha muita utilidade; mas em Nashville, a logística era diferente.
— Sim, querida! A partir de hoje você será uma das figuras mais importantes
do comércio de ferragens nacional e internacional, vá se acostumando...
Apesar do árduo trabalho, ser presidente há várias vantagens – ela falava
enquanto eu namorava o interior daquele bebê que seria meu. – Deixemos
disso e vamos à luta! – ela disse soltando uma gargalhada gostosa.
Antes que as portas se fechem, minha avó diz àquelas pessoas ao lado de
fora:
— Algum problema?
— Não se preocupe, Claire. Você não viu nem o começo, mas tenho certeza
de que está pronta para isso. Logo, logo você se acostuma.
Mal sabia o que estava por vir. Cumprir a agenda de compromissos de minha
avó em cima de um salto alto me deixou exausta. Mesmo estando apenas ali
para observar, a sensação de voltar para casa às sete da noite foi como se um
trator tivesse me atropelado por cima de um arame farpado.
Confesso que subestimei aquela velhinha risonha, ela é mais forte que parece
— fisicamente e mentalmente.
Nunca pensei que ser presidente da Sullivan lhe atribuísse tantas missões em
um só dia. Eu sabia que não era fácil, claro; apenas não sabia que o ritmo
fosse tão frenético. E pensando bem, minha cabeça ainda está girando com
tantas reuniões, papéis, assinaturas, lembretes e pedidos. Céus, confesso que
estudar e estagiar era até mais agradável do que isso.
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“Eles têm ótimos preços e uma padaria de encher os olhos. Tive um pequeno
problema com a caixa, mas tudo foi resolvido por um dos gestores da Hill;
muito simpático, por sinal, que despertou em mim fortes desejos carnais com
aquela voz e cara de macho alfa safado. Minha calcinha está molhada até
agora e acho que voltarei amanhã. Obrigada, senhor Castallaneta. Se estiver
olhando essa avaliação, saiba que estou de olho em você. Rsrs ???? ”
Pisco os olhos duas vezes e inspiro fundo, pensando alto: — “Que despertou
em mim fortes desejos carnais? ”... Puxa vida, isso foi... intenso. – Engulo em
seco, involuntariamente, imaginando Phill sob a ótica daquele comentário.
Abro mais a foto com a função zoom e não resisto a tentação de ampliar o
seu corpo e — Nossa, tenho que concordar com aquela mulher, ele é um
homem quente. Sua postura autoritária, quase beirando a esnobe; suas curvas
másculas e bem-feitas e um meio sorriso nos lábios transpiram sensualidade;
roubando um pouco o oxigênio de meu cérebro.
— Acorda! – ordeno.
— Seis horas? Sério? Eu tenho que acordar seis horas? Me respeita, primo!
Eu fui dormir três horas da manhã trabalhando para você.
— Sobre isso: eu já decidi. Não vai mais trabalhar para mim, procure outro
emprego. Eu não quero você envolvido em meus negócios.
— E mais uma coisa: se quiser ficar nesta casa, vai ter que estudar. Não
quero mais um programador sem diploma. Procure uma universidade. – Sou
enfático ao dizer.
***
Ela larga minha mão e vai na frente, rebolando aquela bunda farta naquele
vestido branco transparente, deixando a amostra a marca da minúscula
calcinha preta fio dental.
— Senhorita Lia, foi muito prazeroso trepar aquele dia com você, mas acho
que devamos parar por aqui... – sou interrompido pelo seu corpo, mãos e
lábios eufóricos, me envolvendo despudoramente em um beijo.
— Desculpe, tenho uma puta lista de problemas para resolver ainda hoje, até
mais ver.
— Com o que eu posso ajudar? – Tais palavras não eram direcionadas a mim,
mas sim a alguém entre os carros ali. — A entrada do supermercado é do
outro lado... – informa Lia a mulher de cabelos castanhos, de olhos cor de
mel inconfundíveis.
Ela resvala o olhar da senhorita Lia para mim, e sussurra algo dando alguns
passos para trás.
— Não. Por quê? Não estou aqui em sua frente?! – Ela indaga, confusa.
— Se ela não é sua namorada, então... está tendo em um romance casual com
a supervisora – ela conclui, sem qualquer julgamento, porém, capturo um
resquício de decepção em sua voz
Penso rapidamente no motivo de ela estar aqui, e pondero que será melhor
dizer:
— Persistente.
— Ah, meu Deus! – ela exclama. – Ela está assediando você? – Ela pensa
um pouco mais e vai além: — Aqueles peitos em seu celular... naquele dia,
no avião... foi ela quem mandou?
Com o dorso da mão, coço ponta do nariz, pensando em algo mais próximo
do real.
— Assédio não é bem a palavra... Mas o caso é que não temos nada, e não
pretendo ter... – Desconverso: — Mas, você... O que trouxe você aqui?
Alguma notícia sobre a identidade dos delinquentes? Como anda o inquérito
na polícia? Veio sozinha?
— Não.
— Não!? – Ela titubeia. – Como assim “não”? Tão rápido. – Ela solta o ar
pesadamente. – Você pensou direito?
— Boa sorte!
***
Sinto a água quente descer pelos meus músculos rígidos, e percebo que nem
um banho quente no fim do dia pode me relaxar.
Ding, dong!
Caleb se move atrás do fogão e eu digo:
Caminho para a sala, cortando caminho até a porta. Quem será uma hora
dessas? – Pergunto-me ao puxar a maçaneta de metal, e lá estava aquela
mulher. Na frente do meu apartamento, em cima de um salto alto, trajando
um vestido azul escuro, estilo empresarial. Em sua face havia um misto de
cansaço e desespero, e um olhar de quem estava disposta a tudo.
— Pensou que fugiria tão fácil de mim? – Ela arqueia uma sobrancelha, com
um ar de vitória, talvez por ter descoberto mais uma vez meu endereço. Aliás,
onde ela está conseguindo tantas informações sobre mim. Confesso que eu
estou surpreso com seu empenho. Antes de desferir qualquer palavra, ela
pede mandona: — Por favor, case-se comigo!
CAPÍTULO TREZE
Claire
Suas intensas íris esverdeadas ainda estão sobre mim, com a testa vincada e
os lábios franzidos. Suas roupas confortáveis só o deixavam ainda mais
másculo e com cara de turrão, aliada aos seus olhares não tão receptivos. Ele
parecia ser um homem difícil, não cederia tão fácil a minha proposta, o que
me confirmava mais ainda a ideia de que ele era a pessoa perfeita. Aliás,
depois do dia que tive hoje, é certo que eu não desistiria tão fácil assim.
— Devo lhe confessar que estou realmente surpreso. – Ele sorri sem vontade
e pergunta curioso: — Onde conseguiu meu endereço?
Dou um passo à frente, esperando que ele recuasse um pouco – mas não o faz
— e respondo com um meio sorriso no rosto:
— Google.
Resvalo meu corpo para o lado, entrando em seu apartamento e exclamo,
realmente impressionada:
— Nossa! Seu apartamento é realmente de muito bom gosto.
Para um gestor de supermercado, não esperava tanto luxo – e claro que eu
não iria verbalizar isso a ele.
— Conseguiu o endereço do meu trabalho lá também?
Sorrio, ainda observando cada detalhe da sala de estar;
— Não imagina como a internet pode ser útil... – reflito, escondendo um
pouco da verdade.
Na verdade, depois daquele fora que levei pela manhã, consegui arrancar seu
endereço com um office-boy de seu escritório.
Torno a fitá-lo. Ele desliza as mãos para os bolsos da calça de moletom e
pergunta mais uma vez:
— E o que te traz aqui?
Suspiro levemente, sorrindo.
— Você sabe o que me trouxe aqui.
Ele me olha, confuso; meneando a cabeça em negativa.
— Não, realmente não sei. Lembro-me de ter dado a resposta a senhorita hoje
pela manhã, e espero que eu tenha me feito claro. – Ele retira as mãos dos
bolsos e relaxa o corpo dizendo: — A não ser que a senhorita esteja
interessada em alguma coisa a mais.
Minhas bochechas queimam violentamente, enquanto flagro um sorriso
discreto naqueles lábios. Que safado! Parece se divertir com minha vergonha.
Decerto, fez isso de propósito. E é claro não deixarei barato.
— Essa coisa a mais quer dizer “você”? – indago, provocativa.
Seu olhar escure, e eu continuo, me aproximando daquele grandalhão,
dizendo cara a cara, num compasso de voz moroso, tão lento que chegava a
ser ridiculamente obsceno. Por fim, olho para sua boca com os olhos cheio de
desejo, escondendo o tremor dentro de mim por estar perto demais daquele
homem.
— Você e eu em um matrimônio daqui a uns dias.
Ele olha para minha boca como se minhas palavras estivessem reverberando
em um eco demorado. No entanto, dá um passo para trás e abre um sorriso
silencioso, me apontando e balançando o dedo em riste.
— Você é muito boa.
— PRIMO, QUEM ERA? – a voz estrangulada reverbera ali perto.
Olho para os lados, procurando pelo dono daquela voz.
— É o seu primo? Caleb? – pergunto a Phill, que assente em positiva. –
Como ele está? Como está sendo a recuperação do braço... – institivamente
viro meu corpo; e Phill se coloca em minha frente rapidamente, falando em
uma oitava mais alta:
— CLAIRE SULLIVAN ESTÁ AQUI, CALEB! – aquilo soa estranho, como
ele estivesse decodificando outra mensagem além daquelas palavras.
— Cavalo selado?! – escuto a voz um pouco mais baixa.
— Ele falou “cavalo selado”? – Sorrio. – Vocês têm um cavalo aqui? –
pergunto, confusa; me divertindo com aquilo. É claro que não deveriam ter;
ou têm?!
Phill parece inquieto; e quando vejo alguém se aproximar da sala, sou
surpreendida por um abrupto avançar de corpo até o limite da sala. Por
instante, reconheço o rosto familiar do garoto daquela noite e, ao mesmo
tempo, meu coração gela com a brutalidade com que Phill o chuta para fora
da sala. Tudo acontece muito rápido. Tão rápido que meu cérebro demora a
processar o que exatamente houve ali.
— AIII! SEU FILHO DA PUTA! VOCÊ ESTÁ LOUCO? – escuto o garoto
gritar, gemendo.
Phill está com o peito subindo e descendo em um ritmo frenético, enquanto
não tira os olhos de mim. Quando meu cérebro volta funcionar, esbravejo:
— Ah, meu deus! Ele está machucado, seu idiota! – digo avançando, e sou
parada pelo corpo em minha frente.
— Ele está bem! – Phill ofega.
— Não, ele não está. – Digo desviando de seu corpo, no entanto, sua mão
segura meu braço, me trazendo de volta à sua frente.
— Ele está nu. Não pode ir até lá...
— Nu?
Ele dá de ombros e responde grosso:
— É um costume nosso: andar nu em casa.
— Você está mentindo... vi que ele está usando uma camisa vermelha... –
retruco, apesar de eu ter capturado apenas isso.
— Ele está sem calças. CALEB, DIGA A ELA QUE ESTÁ BEM!
— Estou ótimo! Uma maravilha! — Ouço a voz dizer ironicamente.
Torno a olhar o homem de péssimo humor em minha frente e ele indaga:
— Satisfeita? – Não esperando por minha responda, ele apenas rosna: — Vá
embora!
— Não – retruco, sem um pingo de medo de cara feia.
— O que quer mais para tirar os pés da minha casa?
— Você! Como meu noivo e novo presidente executivo da Sullivan.
Ele bufa, pousando as mãos na cintura.
— Você não tem jeito mesmo – ele murmura se aproximando mais ainda e
curvando um pouco para envolver minhas pernas com seus enormes braços.
— O que está fazendo? – Pergunto e dou um grito quando meu corpo é
elevado ao seu ombro, de modo tão rápido e fácil como se fosse o corpo de
uma criança.
— Retirando uma intrusa do meu apartamento! – Ele diz sacolejando meu
corpo em seu ombro.
— Está bem! Está bem! Eu saio. – Rendo-me.
Sinto ele estancar os passos, ponderar um pouco a veracidade de minhas
palavras e suas mãos libertarem meus membros inferiores. Antes que ele me
ponha no chão, deslizo minhas pernas pelo seu corpo e as enlaço em sua
cintura, apertando-as bem forte ali, fazendo com que meu vestido se
encolhesse consideravelmente.
Estamos frente a frente quando envolvo seu pescoço com os braços enquanto
ele parece fugir de meus olhares efusivos. No entanto, ele diz:
— Estou começando a achar mesmo que a senhorita está interessada em algo
mais.
Sorrio ao vê-lo sem jeito, e, droga, ele fica terrivelmente lindo desse jeito.
— Quero muito, você. – Ele torna a me encarar, apertando os lábios e,
lentamente, estuda meus olhos, nariz e boca com aquele intenso verde em seu
olhar que pareciam perfurar minha pele. Uma atmosfera diferente nos
envolve, e agora é a minha vez de ficar sem jeito. Pigarreio e continuo: — Dê
suas condições, eu acato todas elas!
— Você não vai desistir mesmo, não é?
— Pouco provável – respondo firme.
Seus dedos longínquos desvencilham minhas mãos e pernas de seu corpo;
enquanto desço minhas saia abarrotada, ele diz:
— Por que não encontrar alguém que você goste de verdade?
Automaticamente, me lembro dos meus relacionamentos fracassados e penso
no quanto isso é difícil. Sorrio ao dizer:
— Sim... por que não? no entanto, não seria o mesmo... eles não são tão
qualificados quanto você. Minha avó não iria entregar a direção da empresa
para qualquer um... mas você! – digo lembrando da noite retrasada. – Os
olhos dela até brilharam. – Inspiro fundo e completo, na tentativa de não
inflar mais o ego dele: — No entanto, se não aceitar, eu procuro outro.
Ele cruza os braços contra aquele peitoral forte e malhado, e caçoa:
— Você a mesma coisa pela manhã. Por que ainda não foi atrás de outro?
Gaguejo:
— Não tive tempo.
Ele ri olhando para o lado e respira fundo, parecendo pensar.
— Amanhã você estará no escritório da empresa de sua família?! – pergunta,
pensativo.
Por que ele estar perguntando?... Ah! Céus! Ele está aceitando?!
— Sim, vou estar lá o dia todo. – Respondo controlando a voz para não
surtar.
— Ótimo, amanhã te pego para um almoço – ele desliza as mãos para os
bolsos. – Ok?
Disfarço a explosão de alegria misturada com vitória dentro de mim e
respondo contida:
— Ok!
CAPÍTULO QUATORZE
Claire
Olho para o celular pela enésima vez e... nada. Que safado! – Resmungo
mentalmente enquanto minha avó e eu somos servidas pelo garçom ao lado,
me sentindo completamente enganada por aquele bonitão de olhos verdes.
Ele estava mentindo quando aceitou minha proposta? Por que ele não me
responde?!Ahh, se ele achar que vai conseguir me enganar desse jeito...
— Algum problema, Claire? – Minha avó indaga na cadeira a frente, no
restaurante da empresa do terraço do prédio.
— Nada, vó! – forço um sorriso, dando um gole da água na taça de cristal.
— Você disse não iria ficar para o almoço, mas até agora... – ela comenta,
mexendo pela primeira vez no prato, interessada no assunto. – O que houve?
— A pessoa com quem eu iria almoçar hoje até agora não deu as caras –
digo, sincera, e abandono o celular no canto da mesa, desgostosa.
— Posso saber quem era a pessoa com quem ia se encontrar? Uma amiga? –
minha avó pergunta, avaliativa; talvez desconfiando de algo. Ela sempre foi
muito controladora, no entanto, quando se tratava de minha vida amorosa, ela
costumava ter mais cautela e não interferir, pois sempre soube que eu não
tinha sorte neste quesito.
Ela me deixava até mais à vontade com isso, talvez com receio que me
atrapalhasse.
Ao abrir a boca para responder, paraliso no mesmo instante quando olho por
cima de seu ombro a imagem do deus grego de óculos Ray-ban Aviator. Ele
veste uma camisa social branca sem gravata e continua caminhando pelo
corredor de mesas por ali, em nossa direção. É ele, Phill; chamando a atenção
de alguns olhares femininos curiosos das mesas ao lado.
Ele para ao lado de nossa mesa, tirando aqueles óculos de sol de playboy
metido e me compenetra com o olhar. Vejo minha avó esgueirar o olhar para
o lado e percebê-lo ali.
— Oh! Phill?! – minha avó titubeia, limpando o canto da boca com o
guardanapo de tecido. – Meu querido, o que está fazendo aqui?
Ele demora um pouco a responder e o faz olhando nos olhos de vovó:
— Perdão, senhora Sullivan. Que deselegância a minha. Boa tarde. Eu vim
buscar Claire para almoçarmos.
Neste momento, sou mirada pelos olhos reluzentes da senhora em minha
frente, que diz baixinho:
— Sabia que tinha caroço neste angu – ele sorriu, se divertindo. – Sente-se,
querido! Sente-se!
Phill me fita por um momento e o faz, ocupando a cadeira ao meu lado,
alisando aquelas pernas de jogador de vôlei por cima do tecido fino da calça
social. Olho ao redor e percebo que nossa mesa recebe mais olhares que o
normal, principalmente das mulheres do escritório. A essa altura eu já deveria
saber que Phill que era um homem que deve provocar muitos pensamentos
libidinosos por onde passa, apenas não sabia que isso poderia ser tão intenso
em tantas outras mulheres.
— Por que não me atendeu? Eu iria descer... – pergunto baixinho a ele.
— Você me disse ontem que faz companhia a sua avó durante o almoço,
pensei que não seria educado deixá-la sem companhia; então vim convidá-la
também – ele responde, fazendo minha avó abrir um sorriso largo.
— Quanta educação, querido!... mas eu não tenho tempo para sair desse
prédio – ela chama um garçom e pede: — Por favor, traga mais um prato para
nosso convidado.
Minha avó nos encara de forma curiosa e constrangedora, com os olhos
brilhando mais que um diamante contra a luz, unindo as mãos e embrenhando
os dedos uns nos outros.
— Almoçando juntos? Uau, suponho que estão cada vez mais próximos...
Meneio a cabeça em positiva, engolindo em seco. Na verdade, eu não estava
preparada psicologicamente para isso. Bem que ele poderia ter me avisado.
— Vocês estão namorando?; “Ficando”, como vocês jovens dizem; ou apenas
se pegando? – ela é tão direta quanto um campo minado, me fazendo quase
engasgar com saliva. A idade estava cada vez mais aguçando esse lado dela.
— Vó, por favor – digo entre uma tosse e outra.
De repente, sinto a mão cálida de Phill tocar minha perna, no pedaço de pele
em que não é alcançado pelo vestido bege, e sinto meu corpo estremecer o
simples contato. Ele acaricia ali e diz com a voz sedosa:
— Ainda não intitulamos o que temos, senhora. No entanto, sinto que estou
vivendo um dos melhores momentos da minha vida; e isso se deve a sua neta
– ele completa a última frase me fitando de forma tão profunda, que quase
acredito naquelas palavras infundadas e me apaixono ali mesmo. Que safado!
A Broadway definitivamente está perdendo um ator.
Ele torna a atenção para frente.
— Eu fico muito feliz em saber que minha neta está conhecendo um rapaz
como você. Estou realmente... maravilhada! – a senhora Sullivan diz,
radiante. Mal disfarçava a felicidade nos olhos de uma avó que nunca viu a
vida amorosa da neta alçar voos maiores que três meses.
— Desse jeito Phill irá pensar que sou uma encalhada – digo bebericando
novamente água em minha frente.
— Ah, não! Claro que não, querido. Não pense isso – Ela diz sorridente e
confidencia baixinho ao homem ao meu lado: — Ela só não teve muita sorte
com rapazes, uns molecotes da universidade que não souberam valorizar a
joia rara que é minha neta.
— Vó, por favor! – Aperto os olhos e lembrando por um momento do
passado recente, quando sou surpreendida pelas palavras de Phill:
— Tudo bem. Eu também não tenho um passado amoroso muito sucedido.
Sorrio e comento de soslaio:
— Duvido muito.
— Não duvide. – Ele pigarreia e complementa: — Foi muito doloroso ter que
ver a primeira namorada terminando e assumindo um relacionamento no dia
seguinte com um amigo próximo.
Isso é uma mentira – penso ao virar meu rosto e encarar sua postura e feição
endurecida. Isso é realmente verdade?
— Que babacas! – sussurro.
— Sinto muito, querido! – vovó diz, enternecida.
Ele inspira fundo e diz espantando o clima ruim:
— Nada! Isto já foi superado há muito tempo. Aliás, já que estamos aqui... na
frente de sua avó – ele se vira na cadeira para me fitar com os olhos
semicerrados -, seria o momento ideal para fazer isso.
Ele pega minha mão esquerda, beijando-a como um cavalheiro e diz:
— Claire Sullivan, você aceita continuar partilhando de bons momentos
como minha namorada?
Mordo o lábio inferior involuntariamente; enquanto vejo de esguelha minha
avó assistir aquilo quase aceitando o pedido por mim.
— Eu aceito.
— É claro que ela aceita. – vovó murmura com um sorriso de orelha a orelha,
abrindo os braços e arrancando um pequeno de Phill.
***
— Querido, fique! Será uma honra tê-lo conosco esta tarde – vovó diz. –
Posso lhe apresentar a empresa...
— Eu adoraria, mas não posso ficar. O trabalho me espera – ele responde
enquanto caminhamos em direção aos elevadores. – Talvez, se surgir outra
oportunidade.
— Tudo bem. Na verdade, seria uma honra ter um profissional qualificado
como você trabalhando para Sullivan – ela continua, então Phill e eu nos
entreolhamos discretamente. Eu sabia de seu encantamento profissional por
ele, o que tornava meu plano ainda mais perfeito. – Se precisar de um
emprego, não hesite em me procurar.
— Claro! Muito obrigado, senhora.
As portas do elevador se abrem e minha avó adentra o espaço a nossa frente;
enquanto permaneço ao lado de Phill.
— Claire, não vem comigo? – ela pergunta.
— Ainda não, vó. Não se preocupe, em um minuto eu subo.
Ela abre um sorriso sapeca e assente, se despedindo de Phill, e exclamando
baixinho enquanto as portas se fecham: — “jovens! ”. Espero as portas se
fecharem por completo para me pôr na frente do senhor bonitão:
— Já está tudo encaminhado.
— Tenho que concordar que seu plano não vai ser tão difícil de se executar;
mas ainda continua sendo perigoso.
Rolo os olhos nas órbitas e pergunto:
— Quer dizer que ainda não aceitou.
— Se não tivesse aceitado, não pediria sua mão em namoro na frente de sua
avó minutos atrás. Quando digo “perigoso”, refiro-me a várias coisas. Aliás,
temos que estabelecer as cláusulas do nosso contrato. Acredito que queira
formalizar isso.
— Então o bonitão aceitou? –
Ele assente, levo a mão ao peito que expira aliviado, sorrindo em me
imaginar longe daquele prédio por um bom tempo.
– Desculpe-me, é que eu estou tão feliz! — Eu mal pus os pés nesta empresa
e já vivia pensando no dia que sairia correndo dali livre, leve e solta. Pelo
menos, por um tempo. – Conheço um advogado que pode formalizar
discretamente.
— Ok, hoje à noite busco a senhorita em sua casa para acertamos e
estabelecermos as cláusulas, vedações e condições.
— Poderia ser sem normas – brinco, apesar de ter ciência de que aquilo
necessitava de um contrato, sinto que adoro provocá-lo.
Entretanto, Phill dá um passo em minha direção, puxa meu corpo pela cintura
e sela nossos lábios em beijo rápido, tão rápido que mal deu para processar o
que aconteceu, apenas sentir a textura do toque dos seus lábios reverberando
nos meus. E para completar, ele sussurra em meu ouvido, naquele tom rouco
que voz que me deixava quente dentro do vestido:
— Sem normas, eu poderia fazer o que eu bem entendesse, não?
Ele se afasta um pouco com seu olhar de molhar calcinha, estudando meu
rosto que deve estar no núcleo da terra a uma hora dessas.
— Regra número: não me provoque, eu sempre irei reagir.
As portas do elevador se abrem mais uma vez atrás de mim e ele diz antes de
adentrá-lo:
— Eu tenho que ir, estou atrasado. Até mais tarde.
Ele me deixa ali, depois de me atiçar e me beijar sem aviso prévio. E não
nego que eu estou cada vez mais animada com a ideia de casar com aquele
pedaço de mal caminho, mesmo que se trate de um casamento forjado. Eu sei
que não devo misturar as coisas, no entanto, para mim era quase impossível
não misturar quando estou em sua frente, tendo incessantes pensamentos
pecaminosos com nós dois quentes e suados. Se aquela era sua reação, então
acho que não será uma má investir mais pesado em minhas provocações.
CAPÍTULO QUINZE
Claire
— Senhorita Claire, há um rapaz lhe esperando na sala! – Liz aparece na
porta do meu quarto, enquanto encaixo o segundo brinco de pérola na orelha.
— Avise que estou indo, Liz! – Amarro meu cabelo em rabo de cavalo
frouxo, borrifo um pouco de perfume no pescoço, coloco meus tênis brancos
e pego o bloco de notas em cima da cama, indo ao encontro do meu futuro
marido, que mais parecia ser um primo distante daquele ator, Henry Cavill.
Quando chego à sala, para minha surpresa, Phill não está sozinho. Minha avó,
que normalmente já deveria estar na cama, parecia ter entrado naqueles tipos
de conversas para lá de demoradas e tive que esperá-los educadamente
sentada no braço do sofá, enquanto os observava.
Phill, como sempre, está arrebatadoramente gato e elegante, em uma t-shirt
que deixa seus bíceps malhados em evidência, me fazendo umedecer os
lábios instintivamente.
A forma como ele prestava atenção em cada palavra de minha avó, deixava-o
ainda mais sexy; com um ar mais maduro e experiente. E claro, minha avó
estava amando poder contar um pouco dos fins de semana que passávamos na
fazenda de nossa família nos arredores de Nashville, e parece decidida
convencê-lo a passar o próximo fim de semana com a gente.
Ela está tão empolgada, que de repente me sinto culpada por isto não ser real.
No entanto, ao mesmo tempo, sinto que eu não posso mais voltar atrás. Eu já
estava decidida. Se aquele homem me acompanhar em meu plano maluco,
estaremos casados dentro de algumas semanas.
Depois de um bom tempo de conversa, reivindico Phill a minha avó, que tem
dificuldade em liberá-lo, mas o faz com uma alegria descomunal em me ver
saindo com aquele que seria, segundo os critérios dela, um partidão.
— Desculpe pela minha avó, ela parece ter gostado muito de você – disse
enquanto saíamos para o jardim e caminhávamos em direção ao Porsche
prata estacionado ao lado da mureta de flores.
— Gosto muito da conversa dela também – ele diz com um meio sorriso no
rosto; educado, nada mais que isso.
Entramos em seu carro, e ele completa:
— Já que seremos marido e mulher, é melhor que eu me dê muito bem com
sua avó. – Ele dá partida logo em seguida, enquanto tentava assimilar aquelas
palavras saindo entre os lábios daquele homem: marido e mulher. Soava
muito bem em sua boca.
— Vamos a sua casa? – pergunto, curiosa.
Ele me olha de soslaio, e responde inexpressível:
— Não. Pensei em algo melhor.
Diferente de alguns minutos atrás, ele estranhamente não parece mais tão
receptível a conversas. Ele não é grosseiro, porém algo me diz que devo
deixar o colóquio para depois, para quando ele parar o veículo novamente.
Seguimos taciturnos por um bom tempo, enquanto percorríamos pela avenida
principal de Downtown.
Tudo parecia estar dentro do normal, até ele pegar uma estrada de chão
desconhecida, fazendo com que eu e ele sacolejássemos dentro do carro
trepidante no caminho de pedras. Definitivamente, esse carro não foi feito
para este tipo de estrada.
— Onde estamos indo? – pergunto mais uma vez, porém não recebo resposta.
Agora, sim, isto foi grosseiro! – Onde está me levando? – insisto mais uma
vez, mais incisiva.
— Se vai ser minha mulher, tem que confiar em mim! – ele diz com a voz
mais rouca que o normal.
Apesar de confiar nele, eu estou começando a achar estranho o breu naquela
estrada, em que a única fonte de luz advém dos faróis do porsche de Phill.
Neste instante, devido a trepidação, bato a cabeça no vidro do carro; e
resmungo alto, já perdendo a paciência.
— Se vai ser meu homem, eu acho bom você me dizer para que tipo de
buraco está me levando.
Ele me ignora totalmente e continua a dirigir por mais um longo pedaço de
buraqueira, enquanto tento me segurar para não bater a têmpora no vidro
novamente. Antes que eu pudesse resmungar mais uma vez, o carro se
estabiliza em uma estrada de areia mais fina e estaciona em frente ao que
parecia ser um enorme barranco.
Recupero-me daquela sessão de treme-treme e vejo com mais atenção as
luzes adiante.
Noto que estamos em cima de um morro com visão de toda a cidade lá
embaixo e... Puta merda! – resfolego, deixando escapar: – Isto é... muito
lindo! — Nem a visão do último andar do prédio da Sullivan proporcionava a
vista que estou tendo neste momento. O horizonte de luzes acesas (umas
constantes, outras bruxuleantes) parecia ser a coisa mais fascinante que já vi
em toda minha vida. Desde pequena, nutro um amor por essa cidade, onde
tenho as melhores lembranças de minha vida, e vê-la ali de cima, estava me
deixando um pouco emotiva, devido ao longo período que passei distante
daqui.
Resvalo meus dedos para a porta ao lado e antes que pudesse abri-la, ao meu
lado, Phill trava o carro, não me deixando sair. Desvio o olhar para ele, que
se mantém inexpressível quando diz:
— Ficaremos mais confortáveis aqui dentro!
Ele vira e espicha o corpo para pegar algo no banco de trás. Ele traz um
notebook para o seu colo e o abre, ligando e direcionando o sistema para o
Word. Escondo meu bloco de notas no canto do banco do carona, enquanto
ele diz:
— Vamos ao contrato! – era para eu estar fazendo aquilo, no entanto, ele
parecia tão proativo, que deixei ele tomar as rédeas.
— Ok.
Ele coça a ponta do nariz e vejo seus olhos fitaram os meus pela primeira vez
na noite.
— Há alguma particularidade específica que queira contemplar além das você
explicitou nas últimas vezes em que nos falamos?
Confesso que quando estava me arrumando horas atrás, não pensei que este
encontro seria tão formal. Entretanto, aquele homem pareceu incorporar um
daqueles caras das reuniões da Sullivan, tecnicista e pouco flexível. E
pensando bem, acho ótimo que ele seja tão responsável, já que irei
praticamente confiar o império de minha avó a ele.
— Além do casamento e de sua disponibilidade para assumir a presidência,
não tenho nada a acrescentar. E você?! Há alguma ressalva além do que foi
discutido?
Ele abre um sorriso de canto de boca e responde seriamente, enquanto
inevitavelmente desvio o olhar para seu braço e peitoral másculo, e minha
nossa senhora! Que homem!
— Sim. Algumas.
Torno ao olhar seus olhos e ele começa a ditar vários detalhes referentes a
gestão da empresa. Basicamente, ele queria que eu o deixasse livre para fazer
“sua gestão”, sem minha intromissão durante os seis meses. Dou minha
palavra de que não o farei, no entanto, não posso garantir isso por parte de
minha avó. Ele compreende bem e diz que pode alinhar seus pensamentos de
acordo com os dela.
Ao passo que acertávamos as cláusulas, ele ia digitando e materializando o
que seria o contrato de nosso matrimônio. Tudo ia bem até chegarmos a
cláusula 7.
— Vamos a cláusula sete: não quero que se intrometa em minha vida
particular. Isso incluir visitar meu apartamento.
Fico um pouco embasbacada e argumento:
— Não entendi. Como assim “não visitar seu apartamento”?! Nós iremos
casar... É natural que...
— Eu tenho um sobrinho, Caleb. Ele continuará morando lá...
— Não espero que me leve para morar com vocês. Eu já tenho um imóvel de
minha família em mente que podemos nos mudar, só achei estranho tratar o
apartamento como “seu apartamento”. Soou como se quisesse levar uma vida
dupla.
— Soou? – ele pergunta, em tom de curiosidade.
— Sim, soou.
— A senhorita vê algum problema nisso?
Sorrio, desdenhando:
— Você não vê?
— Não, não vejo – ele parece acreditar firmemente.
— Então quer dizer que podemos levar vidas duplas durante esses seis
meses? Podemos sair com quem quisermos?
Ele olha para o lado, fechando os olhos.
— Como um ator, eu espero que você mergulhe profundamente no papel de
meu marido nesses seis meses.
— Você quer dizer “passar seis meses sem foder”?
Ele pergunta de forma chula, no entanto, aquela palavra acabou saindo tão
natural da boca daquele homem, que o deixou absurdamente mais sexy,
imaginado qual seria o significado de fazer isso com ele.
— Sim. Sem sexo, é o que eu espero.
Ele abre um sorriso largo, um tanto debochado.
— Desculpe, eu não sou tão bom ator. – Ele me fita com aquele olhar de que
sua liberdade não estava disponível a negociação. – O que posso fazer em
relação a isso é ser discreto.
Ajeito-me no banco, alinhando os joelhos para frente e pensando um pouco.
Por que eu estou tão relutante em relação a isso? Phill não irá ser meu
marido de verdade, não posso simplesmente obrigá-lo a se tornar um monge
por seis meses. Desde que ele ocupe meu lugar na presidência, o contrato
ainda me parecia vantajoso.
— Ok! – Aquiesço. – Você tem mais alguma cláusula? – torno a inclinar meu
corpo em sua direção.
— Não.
— Ótimo. – Em um rompante, espicho meu tronco para cima dele, a procura
do dispositivo que trava as portas enquanto peço: — Me envie este arquivo
por mensagem. Pedirei ao Dr. Gilbert para que redija o contrato. – Corro com
os olhos sobre o painel do motorista, e penso alto: — Onde fica mesmo o
botão?
— Aqui! – ele passa o braço na brecha entre o flanco dos meus seios e suas
pernas, pressionando um botão na lateral do volante. Escuto o click, que
indicava as portas abertas.
Viro meu rosto em direção ao dele, provocativa, e sussurro a centímetros da
sua boca: — Obrigada!
Lanço-me para fora de seu carro, deixando Phill para trás, sendo guinada por
uma eletricidade lasciva. Bato a porta e encaro a escuridão do lado de fora,
sentindo o vento vir de encontro com a quentura do meu corpo.
Caminho pela areia fina até a frente do porsche prata, onde dava de ter uma
visão melhor da cidade lá embaixo. E poxa, perco mais uma vez o ar com
aquele espetáculo de vista.
Esfrego os braços com as pontas dos dedos devido a brisa forte que chegava a
arrepiar minha pele. E, de repente, os faróis atrás de mim se acendem, me
aquecendo um pouco com a luz cálida. Olho para trás, por instante,
afundando as mãos nos bolsos da calça jeans.
Devido à forte claridade, não é possível ver por trás do vidro, mas posso
imaginar seu olhar verde intenso me compenetrando, e aquilo me aquece um
pouco mais.
***
CAPÍTULO DEZENOVE
Claire
Passei a viagem inteira escutando a conversa de Phil ao telefone, e imagino
que o outro cara do outro lado da linha não saiba que ele acabou de sair de
uma cerimônia de casamento, talvez nem saiba que ele era o noivo.
Caramba! Eu sabia que não tínhamos envolvimento amoroso algum, mas bem
que ele poderia respeitar o nosso casamento. No entanto, engulo meu
descontentamento que soava sem sentido e fundamentos.
Agora sou eu a abrir o frigobar e pesco uma garrafa de Whisky. Despejo o
líquido amadeirado no copo largo e dou um espesso gole da bebida que desce
queimando por minha garganta.
Apenas quando chegamos ao saguão do hotel, ele encerra a chamada:
— Perdão. Tive de atender – ele guarda o celular no bolso do paletó, e a porta
esquerda é aberta pelo chofer.
Apresso-me a pular para fora do carro quando Phill segura meu braço,
descendo o olhar para minhas costas desnudas:
— Seu vestido está aberto. – Ele me avisa, talvez esperando que eu retorne ao
banco e abotoe outra vez.
— Eu sei! – Respondo o ignorando e saindo pela porta traseira.
Agradeço o chofer e ando para o saguão com o vestido de noiva
completamente aberto nas costas, enquanto todas as atenções ali se voltaram
para a gente em uma crescente.
Não sei exatamente o que chamava atenção daquelas pessoas: o vestido de
noiva ou ele estar inadequadamente em meu corpo, mas só de Phill estar
andando atrás de mim feito um cão de guarda, eu já me sentia vingada por ele
ter me feito escutar sobre administração de materiais por quase quarenta
minutos e agisse como se nosso casamento não fosse nada.
Poxa, nosso casamento era de mentira, mas a emoção de estar casando pela
primeira foi como se tivesse sendo de verdade.
— Você está chamando a atenção de todos! – ele murmura atrás de mim.
— Por quê? Importa-se com isso? – Pergunto tirando os grampos dos meus
cabelos, bagunçando-os, imitando seu tom inexpressível e caminhando em
direção a recepção.
— Cobertura, torre 2 –, Phill diz a recepcionista.
Dou um passo para trás, esperando que a garota ruiva confirmasse o check-in,
realizado por Phill antes da cerimônia.
Enquanto isso, um moreno de pele dourada adentra a recepção, me fitando
fixamente meus olhos como se nos conhecêssemos. Puta merda! Ele é um
gato, com certeza ainda não nos conhecíamos. Decerto, não esqueceria esses
olhos cor cinzentos nem por decreto. Cambaleio para trás, um pouco zonza,
mas ainda sustento o olhar.
Trocamos olhares até Phill nos flagrar e ele me puxar para a bancada ficando
atrás de mim, me imprensando contra o mármore gelado.
— O que é isso? – eu murmuro enquanto sorria sem graça para a
recepcionista que nos olhava com uma expressão ressabiada.
— Estou te protegendo de um possível assédio. – Ele sussurra de volta em
meu ouvido, me fazendo arrepiar por inteiro.
— Eu não estava sendo assediada –, retruco. — Estávamos apenas nos
olhando. Aliás, fui eu quem comecei a paquerá-lo.
— Apenas “nos olhando”? Você quer enfeitar minha cabeça publicamente em
nossa noite de núpcias, é isso mesmo? – pela primeira vez, escuto o tom de
Phill mudar drasticamente; e ao invés de eu me preocupar, me divirto,
engolindo o riso e respondendo inocentemente:
— Ué!? Mas não foi você quem disse não deixaria de viver sua vida por
causa de um contrato? Por que eu deixaria de viver a minha?
Ele bufa atrás de mim, enquanto a recepcionista nos entrega a chave
eletrônica.
Sinto o corpo de Phill se afastar um pouco e me viro para encará-lo. Ele
recobra o tom mais frio e me responde:
— Faça isso em minhas costas. Em minha frente, jamais! – ele gira os
calcanhares e vai na frente, me deixando para trás.
Saio em disparada em seu encalço, dizendo:
— Pois eu farei mesmo. Namorarei muito, senhor Castallaneta. Ou você
pensa que eu não sei que tem se encontrado com outra mulher nestas últimas
semanas? – Eu conseguia sentir o cheiro adocicado impregnado em suas
roupas quando nos visitava sagradamente todas as noites para reforçar toda
aquela farsa.
— Por favor, fale mais baixo! – ele para em frente aos elevadores ao lado de
um senhor de cabelos grisalhos que parecia atento a nossa conversa.
Agora me direciono ao senhorzinho, me lamuriando:
— O senhor pode imaginar como é começar um casamento sem amor?
— Por favor, Claire! – Phill se vira para mim, mais firme, talvez temendo um
vexame.
— Ele nem mesmo sorriu em nossa cerimonia, senhor. Ele me tratou como se
fosse um... um... um vaso no altar – solto, dramatizando.
— Chega! – ele reclama entre dentes, pegando meu corpo para si, com a
facilidade de quem pega uma criança de dez anos nos ombros. Ele dá um tapa
em minha bunda, marchando para a lateral do saguão, subindo as escadas
com se tivesse levando consigo um saco de batatas em um ritmo tão
frenético, que eu tenho a sensação de que havíamos subido pelo menos uns
sete andares.
— Eu vou cair. Para. – Alarmo, meio zonza. – Para. Para. Para! – Digo pela
primeira vez estapeando suas costas.
Ele continua irredutível aos meus pedidos, e acabo involuntariamente
acertando seu estômago com um chute, fazendo com ele estagne no piso
seguinte e me largue bruscamente no chão.
— Dá para parar de agir feito uma porra de adolescente mimada?
Cambaleio para trás, com o mundo girando ao meu redor. Levo a mão a testa,
e ele segura meu corpo com um de seus braços antes que eu caísse para trás.
— Acho que bebi demais! — murmuro tomando consciência da alteração de
meus sentidos.
Ele me estuda veementemente, franzindo o cenho e prendendo o canto
daqueles lábios inferiores deliciosamente sensuais:
— Foram apenas dois copos de Whisky! – ele murmura. Ele contou?
— O suficiente! – retomo o bom humor e abro um sorriso de orelha a orelha.
— Claro! Fraca para bebida. – ele bufa. – Era de se imaginar. – Ele sussurra,
pensando alto.
Nossos corpos estão próximos, que mal posso raciocinar direito, se não
bastasse o maldito álcool na cabeça. No entanto, ainda consigo lembrar:
— Quem é a mulher?
Ele pisca duas vezes, indagando:
— Que mulher? Não há mulher.
— A do perfume. Não me faça de boba, eu sei que está transando com
alguém. Só me resta saber se é algo casual ou...
— Ela é minha irmã – ele grunhe.
— Irmã? – balbucio. – Espera aí! Você nunca mencionou uma irmã. –
Cambaleio para trás, tentando raciocinar melhor: — Pelo que eu sei, você só
tem Caleb de família... – Que, aliás, foi o único convidado de Phill que
compareceu à cerimônia.
Ele suspira fundo, como se fosse um grande incomodo ter que explicar:
— É uma longa história. Ela não é minha irmã de sangue, mas o fato é que
não estou transando com ela.
Faço uma longa pausa, averiguando se havia verdade no que ele estava
dizendo.
— Ok! Mas eu quero conhecer essa sua irmã – digo apontando o dedo em
riste no seu peito.
Ele olha para o lado, suspirando pela enésima vez e segurando minha mão.
— Vamos logo, antes que brote mais caraminholas nessa sua cabeça criativa,
— ele diz me arrastando para o elevador do andar.
As portas do elevador se abrem, e lá está ele: o senhorzinho que assistiu tudo
lá embaixo. Ok! Onde tem um vaso para eu enfiar minha cabeça?
— Podemos esperar outro, amor! – digo baixinho ao seu lado, colocando uma
mecha de cabelo para trás da orelha, totalmente desconcertada.
— Vai demorar muito! – ele apenas minha arrasta para o canto do elevador
enquanto digo com as pernas cruzadas ao senhor:
— Boa noite.
***
CAPÍTULO VINTE
Phill
Ao alvorecer da manhã seguinte, eu estava de pé atrás da vidraça, observando
Nashville acordar.
Olho por cima do ombro, fitando minha falsa esposa deitada no colchão,
somente usando um sutiã preto de renda e uma calcinha provocante que me
deixava duro dentro da calça, no entanto, desvio o olhar e me concentro em
ver o tempo passar.
Claire, apesar do rosto angelical, é uma mulher provocante e sensual,
daquelas que desperta desejos carnais em qualquer homem. Confesso que na
noite passada foi difícil de desviar de suas investidas, mas foi preciso.
Um homem escravo de seus próprios desejos, é apenas um escravo – essa é a
minha máxima. Nunca ouvi falar de um homem que chegou ao topo usando a
cabeça de baixo; e a ideia de me deitar com Claire casualmente me parecia
perigosamente tentadora para ser apenas algo inofensivo como é com as
mulheres que me deito. Por isso, pondero que seja melhor que misturemos as
coisas.
Quando os raios solares invadem o quarto com mais vigor, observo pelo
reflexo do vidro Claire acordar preguiçosamente e se dá conta de suas vestes
ou a “semi falta” delas.
Ela geme morosamente até se calar de repente.
Em apenas dez segundos, ela toma consciência de si, pula para fora da cama e
sai nas pontas dos dedos em direção ao banheiro, se trancando lá por um bom
tempo.
Ela só sai quando o café da manhã é servido na mesa do quarto, e mesmo
assim não me olha nos olhos nem por um instante quando estamos a mesa.
Pegamos nossas coisas e descemos até o saguão.
— Poderíamos ficar mais um pouco -, Claire finalmente volta ao seu normal
enquanto seguimos para frente do prédio. – Dizem que a piscina daqui tem
uma vista maravilhosa.
— Tenho que estar hoje à tarde na Hill... pedirei demissão.
— Aleluia! Pensei que nunca pediria. – Ela exclama.
— Acho que já deve me conhecer o bastante para saber que não tomaria
atitudes precitadas.
— Sim, conheço. – Ela aquiesci e completa: — E que homem difícil! – Ela
arregala aqueles olhos chamativos azul-turquesa, em tom de troça.
Esboço um pequeno sorriso, me divertindo com seu deboche e avistando
Caleb dentro do carro de vidros abertos a metros dali. Também vejo do outro
lado da rua os seguranças de Elizabeth Sullivan, à espreita de nossa saída.
ROMEU — Deixai, então, ó santa! que esta boca mostre o caminho certo
aos corações.
Martin puxa meu corpo com força contra o seu e enfia seus lábios nos meus,
introduzindo sua língua nojenta dentro da minha boca, descumprindo
totalmente com o protocolo.
Vejo o corpo de Phill se retesar na plateia e se segurar nos braços da cadeira.
Com minhas mãos, tento empurrar Martin para longe de mim, sem sucesso.
Sua mão segura meu pescoço atrás com brutalidade, enfiando mais uma vez
sua língua na minha goela e depois me soltando.
Com o peito subindo e descendo freneticamente, procuro por ele pela plateia.
E o encontro de pé, com os olhos furiosos e o punho apertado, enquanto as
pessoas ao seu lado o observavam.
Por sorte, as cortinas se fecham e retomo o fôlego.
Vejo Martin em minha frente e caminho até ele e afundo um tapa em seu
rosto.
Ele massageia o rosto, e depois ergue o olhar vindo em minha direção, irado:
— Sua vadia, como ousa?
Antes que ele me acerte com uma bofetada, um dos assistentes de palco
chega a tempo, e Martha me puxa pela mão, me levando ao camarim.
— O que foi isso?
— Perdão por aquele beijo, Martha. Eu não queria estragar o roteiro de sua
peça... eu não pude fazer nada... Martin passou dos limites...
— Beijo? Que beijo? Você acabou de dar uma bofetada no seu parceiro de
cena... – Dou um passo para trás enquanto ela ralha comigo em volta alta,
indignada: — Martin é homem, deve estar com a autoestima péssima... Isso
pode atrapalhar muito em cena, garota!... Espero que se redima com Martin
antes que as cortinas se abram, caso o contrário, nunca mais pise em minha
academia. Se pensa que só por que você é uma ricaça, eu irei tolerar isso, está
muito enganada.
Suas palavras eram um ultimado, e me senti completamente envergonhada de
mim mesma por estar aqui ouvindo aquilo.
Martha caminha até a porta do camarim e me apresso em dizer:
— Não se preocupe, já estou voltando ao palco. Não me passou pela cabeça a
abandonar a peça. E sobre sua academia de teatro: se preocupe menos ainda,
eu mesma faço questão de nunca mais pisar nessa merda.
Pego o frasco de veneno fictício jazido na mesa próxima aos espelhos, e
retorno ao palco, passando por Martha.
Puxei com força uma boa quantidade ar e me coloquei ao lado de Martin, que
me esperava com um olhar atravessado, soltando fogos pelas ventas. As
cortinas se abrem e damos a plateia o desfecho da história com uma
adrenalina mórbida correndo em minhas veias. Graças aos céus, não há mais
nenhuma outra cena de beijo. Somos seguidos pelos calorosos aplausos e
assovios ao final.
O elenco se reúne no palco, inclusive Martha, e agradecemos nos curvando
diante do público.
Foi apenas a cortinas se fecharem para eu apressar o passo e procurar a saída.
Fui à primeira a chegar à sala do camarim, seguida de Martin latindo:
— Você acha mesmo que o tapa que você me deu vai ficar por isso mesmo?
— Ignoro-o, pegando minha bolsa no armário e a colocando nas costas,
enquanto aquela sala começa a receber mais pessoas. Eu precisava sair logo
dali, com vestido e tudo. Amanhã eu me resolvia com Martha, mas eu apenas
deveria sair dali. – Hein, vagabunda? – Martin segura meu braço e o aperta
com força, me obrigando a olhá-lo nos olhos.
No entanto, um frio irrompe em minha espinha quando vejo Phill entrar
naquela sala, voando para cima de Martin com o olhar transtornado, como se
estivesse esperando para fazer isso. Ele puxa o corpo de Martin para ele,
dizendo ao mesmo tempo que ele eleva o punho cerrado:
— Vou te ensinar a nunca mais tocar na minha mulher. – Ele abate um soco
na face de Martin, levando ao chão no mesmo segundo.
Fico paralisada, tensionada com que acabou de acontecer. Todos naquela sala
estavam parados como eu, atônitos, enquanto Phill recebia olhares
amedrontados.
Não satisfeito, Phill levanta o corpo de Martin pela gola da camisa de linho, e
desferi outro murro em seu estômago, conseguindo parecer ainda mais
dolorido, fazendo com que as costas de Martin encontrem a mesa e batam no
vidro.
— Phill! – ponho em sua frente temendo que uma tragédia aconteça, mas não
adianta muito. Ele me afasta para o lado com o olhar irascível e vai em
direção a Martin.
Avisto Matt entre as pessoas na entrada da sala, com um rolo de algodão doce
na mão. Passo entre as pessoas e corro para o lado dele:
— Matt – seguro seu braço em desespero, como se ele fosse minha salvação.
– Você tem que fazer uma coisa.
— Por quê? – Matt diz calmamente e desmanchando um pedaço de algodão
doce na boca. – Phill está claramente ganhando.
— Matt! – grito, desesperada.
— Tudo bem! Segura isso – ele me entrega o palito de algodão doce e fala
antes de caminhar: — E não coma!
Ele se vira e vai até Phill. Matt encaixa seus braços nele e o segura pelas
costas, tentando domar a fera e admoestando:
— Ei! Ei! Já chega, cara! – Phill reluta, no entanto, ele para de se mexer
gradualmente, até afastar Matt para longe e ofegar olhando para Martin.
Ele aponta o dedo em riste e deixa o recado:
— Espero que tenha aprendido. Se tocar nela novamente, ou pelo menos, se
ousar tentar, eu vou até inferno atrás de você.
Martin se rasteja no chão, com o rosto ensanguentado enquanto todos
permanecem emudecidos e horrorizados com aquela cena. A voz de Martha
eclode do outro lado da sala, ralhando:
— Fora daqui vocês três! Foraaa!
Phill ainda está imóvel, agora olhando para Martha vociferar.
Matt toca seu braço dizendo:
— Vamos, cara! Não nos misturemos com essa gente.
Phill parece obedecer Matt pela primeira vez e vir em minha direção, que
ficava mais próximo da saída.
— Claire! – Martha rosna do outro lado da sala.
Me viro para olhá-la, então ela diz:
— Mande o vestido pelo correio. Espero que nunca mais ter o desprazer em
vê-la em minha frente. Você e o animal do seu marido!
Sorvo uma boa quantidade, dizendo:
— Não há o que se preocupar. O desprazer é todo meu. – Digo tocando o
braço de Phill e o conduzindo para fora da sala.
Caminhamos, taciturnos, até a ala de circulação, enquanto Matt reivindica seu
algodão doce.
— Sua testa! – reparo ao olhar o alto da cabeça de Phill sangrando ao
alcançarmos uma boa luz. – Está sagrando. – Murmuro, preocupada.
Phill toca o sangue com a lateral da mão e analisa-o na mão, dizendo:
— Isso não é nada. Devo ter me machucado em algum dos estilhaços
daquelas lâmpadas no espelho. Não é nada grave...
— Temos de tratar isso o quanto antes. Eu tenho um kit primeiros socorros lá
no apartamento.
Quando chegamos à ala da bilheteria, Matt nos avisa:
— Eu vou buscar Kristen lá dentro, esperem um momento!
— Matt! Eu acho que já vamos indo. Eu não estou com cabeça pra sair para
comemorar, entende? Se há o que comemorar...
— Oh, não. Tudo bem, Claire. Entendo perfeitamente. Talvez em uma outra
oportunidade...
— Diga a Kristen que ainda quero conhece-la. Talvez em uma noite mais
calma.
Matt assente e se despede de mim e Phill, entrando no primeiro portão do
salão.
— Vamos? – Digo ao homem que não desvia os olhos sérios de mim nem por
um segundo.
— Ok! – ele anui enquanto caminhamos para a saída.
Antes que passemos pela rampa que leva à rua, noto o menino e a senhora de
véu sentados em um dos bancos da entrada;
— Espere, Phill! – Oh, céus! Me esqueci completamente.
Pipoca está com os ombros levemente curvados, segurando uma flor,
parecendo cansado de tanto esperar.
Sinto Phill seguir meu olhar e encontrá-los assim como eu.
— É a Madre? – seu o tom de voz nebuloso ganha resquícios de curiosidade.
Caminhamos até eles, e ao notar minha presença, Pipoca levanta os ombros
rapidamente, abrindo um sorriso que poderia iluminar todo aquele teatro.
— Tia!
Ele se levanta e vem ao meu encontro com os abraços abertos, segurando a
flor em uma das mãos.
Pego-o no colo e o giro, rodopiando a saia volumosa em meus pés. Depois de
alguns segundos, devolvo Pipoca ao piso, enquanto ele me entrega a flor
vermelha:
— Para a senhora.
— Obrigada, meu bem. Não precisava... – digo me abaixando para deixarmos
nossas cabeças da mesma altura.
— Precisava sim, a senhora foi perfeita – ele dizia os olhos brilhando. –
Parecia até uma artista de cinema.
— Madre –, Phill cumprimenta a Madre Angelina beijando sua mão. – O que
a senhora faz aqui?
Ela olha para Pipoca explicando:
— Vim trazer esse garotinho que me passou a semana inteira falando dessa
peça.
Sorrio junto com Pipoca.
— Ele queria tanto vir, que achei que seria um pecado se não o trouxesse.
— A senhora gostou? – pergunto, gentilmente.
— Muito bom o texto, confesso que não assistia uma peça de tão boa
qualidade há tempos. – Ele completa falando baixinho: — Só achei uma parte
um pouco inapropriado para crianças... mas tirando isso, foi um belo
espetáculo – ela sorri, unindo as mãos.
— Fico muito feliz em saber que gostaram – torno a olhar Pipoca. – E que tal
uma xícara de chocolate quente agora? – dou a ideia.
Pipoca ergue os braços no alto, festejando.
Me levanto e me coloco ao lado de Phill dizendo baixinho:
— Não se preocupe, será rápido. Logo estaremos cuidando do seu ferimento.
— Fique à vontade. Você tem o tempo que precisar – ele diz, sério; talvez
ainda envolvido pela energia ruim do acontecimento anterior.
Pego a mão de Pipoca e saímos em busca do carro de Phill, que estava
estacionado bem em frente ao teatro. E acabamos indo a um empório
próximo dali.
Enquanto a Madre conversa com Phill, fico me divertindo com Pipoca,
provando não somente o chocolate quente, mas também os bolinhos
amanteigados saborosos. Recebo atenções a mais de outras crianças ali
devido ao vestido, que me pediam para tirar foto.
Não demoramos muito, pois a Madre Angelina já apresentava alguns indícios
de sono; então nos apressamos em deixá-los no convento antes das dez horas
da noite.
Pipoca se empertigou em meu colo e acabou adormecendo antes de chegar ao
convento. Phill o carregou nos braços até o dormitório em que as crianças já
haviam pegado no sono, e tão logo nos despedimos da Madre e retornamos
ao carro.
Phill ainda permanece quieto, com a postura endurecida, sério — do que jeito
que me lembro de ter o conhecido. Ele liga o rádio e a melodia de Its a
heartache invade o carro, me fazendo abrir um meio sorriso.
Tão logo chegamos em nosso apartamento e aperto o passo até o andar de
cima para retirar aquele vestido do meu corpo que pesava pelo menos uns
cinco quilos.
Coloco uma regata branca e um shortinho cinza de alfaiataria, pegando a
caixa de primeiros-socorros no armário do banheiro e reprimindo meus
cabelos em um rabo de cavalo.
Desço para o primeiro andar, onde deixei Phill e o encontro sentando no
braço do sofá, revirando algo na tela de seu celular. Como sempre, ele está
exuberante. E me impressiono como ainda meu coração pode ir de 90 a 150
batimentos cardíacos por minutos em poucos segundos só de estar em sua
presença.
Fecho os olhos quase instintivamente antes de caminhar em sua direção, e
quando abro os olhos, dou de cara com suas endurecidas esferas esverdeadas
sobre mim, com uma expressão impenetrável cravada no rosto.
Vendo que eu havia petrificado por sua causa, ele larga o celular atrás no
estofado do sofá e relaxa a postura endurecida. E inesperadamente, ele
gesticula com o dedo indicador me chamando para mais perto.
Que droga! Quando penso que ele atingiu seu nível máximo de beleza, ele
me vem com essa e me choca.
Balanço minha cabeça desnorteada e caminho até ele, abrindo minha caixa de
primeiros socorros e a apoio ao lado de seu corpo, enquanto seu cheiro
almiscarado começar a impregnar minhas vias respiratórias.
Apesar de ele usar a mesma fragrância que tem me colocado para dormir, era
diferente quando estava em sua pele. Como se o cheiro fabricado se
misturasse ao seu natural.
Molho uma gaze no álcool 70 e passo em seu rosto, lambendo o ferimento em
sua testa. Esperei por qualquer gemido ou reclamação dele, mas ela não veio.
Phill parecia não sentir dor – ou pelo menos não demonstrava.
Ao invés disso, sua postura de ferro está armada impecavelmente, fazendo
com que nossas cabeças ficassem da mesma altura, mesmo que ele esteja
sentado no braço do sofá.
Faço aquele processo por toda sua testa, eliminando qualquer germe que
venha adentrar seu ferimento. Faço isso em silêncio, mas tão logo digo o que
eu tenho sentido vontade desde que saímos do teatro:
— Obrigada por não invadir o palco.
No fundo, tenho que reconhecer que Phill demandou de muito autocontrole e
esperou até o fim da peça para fazer qualquer coisa. Apesar de eu ser
terminantemente contra a violência, sabia que ele pensou muito bem em
como eu me sentiria caso ele interrompesse a peça.
— Em contrapartida, consegui provocar sua expulsão da academia...
— Não! Não! – fito seus olhos que parece se autopunirem e desfaço aquele
mal-entendido. – Eu já havia feito isso...
— Vai desistir do teatro? – ele pergunta, franzido o cenho.
— Jamais. Há outras academias na cidade.
Aproveito para jogar as gazes na lixeira da cozinha e volto para colar um
Ban-Aid em sua testa, tudo sob os rigorosos olhares atentos de Phill.
— Prontinho! – digo ainda com minhas mãos em sua testa.
Posso ver seu olhar entre meus braços enquanto deslizo minhas mãos para o
rosto, enquanto sinto suas duas mãos tocaram minhas pernas, no pedaço onde
o short não cobria.
Ele embala meu corpo levemente e desfere com sua rouquidão:
— Eu quase sucumbi devido à falta disso – ele aperta os lábios em uma linha
dura, inclinando a cabeça para meu colo, muito próximo aos seios, e me beija
ali esgueirando suas para minha bunda e me trazendo para perto.
Ele sobe os beijos para minha boca e me consome com sua língua, em um
beijo que destrói todas minhas estruturas, enquanto ele sobe minha blusa. Por
sorte, estou sem sutiã e aquilo parece animar Phill que desce a boca para
meus seios e brinca com os bicos túrgidos. Ele chupa um; e depois faz a
mesma coisa com o outro, me puxando para mais perto, quase fundidos
nossos corpos.
— Eu preciso de você agora – ele se levanta, beijando minha boca enquanto
dou alguns passos para trás com seu corpo me engolindo na frente.
Antes que ele me leve a qualquer lugar, fico nas pontas dos pés e chupo seu
pescoço devagar.
— Espere. Antes eu quero fazer algo – digo mordendo seu queixo e o
observando seu rosto pasmar quando meus dedos ágeis conseguem desbotoar
a braguilha de sua calça.
Ajudo-o tirar a camisa rapidamente, deixando à mostra aquele tórax rígido de
molhar qualquer calcinha. Começo a beijar brandamente seus ombros
deslizando minha língua pelo seu peitoral. Dali ergo o olhar para Phill que
me espera ansiosamente em desejo.
Deslizo minha língua por toda a sua barriga até chegar no Sul de sua barriga,
ficando de cócoras diante dele. Minhas mãos o retira de dentro da calça me
fazendo engoli em seco. Começo devagar, brincando suas terminações
nervosas e depois o beijo com vontade sem perder o contato visual
— Oh... Perfeito, Claire... Continue... Ahh... – ele geme enquanto o empurro
para dentro da minha boca, com meu corpo tão excitado quanto ele. –
Cacete... Ahh!
Em um ímpeto, Phill puxa minha mão para si, impulsionando meu corpo para
cima.
— Eu não vou aguentar por muito dentro – ele invade minha boca com ardor
nos conduzindo para o sofá.
Tiro a regata e o short em poucos segundos e, em um movimento quase
sincronizado, deito minhas costas no estofado frio enquanto ele desliza o
corpo para meu, tocando minha fenda com seus dedos longínquos e sinto-o,
em seguida, entrar dentro de mim por completo. Ele move-se em estocadas
lentas até entrarmos em um ritmo frenético de vai e vens deliciosos.
Nós ficamos ali até nossos corpos estarem completamente ensopados de suor,
depois de ele empurrar mais forte, rasgar um gemido sôfrego nos levando ao
topo.
Deito minha cabeça em seu peito, ouvindo seu coração bater forte, enquanto
seus braços me envolvem em um abraço, pronunciando no topo da minha
cabeça e desejando um beijo ali.
— Por favor... nunca mais nos afaste de nós!
CAPÍTULO TRINTA E OITO
Claire
O roçar de lábios em meus cabelos faz com que eu abra os olhos e deite o
lado do rosto no colchão, vislumbrando o Deus grego que ocupa o outro lado
da cama. Céus. Como pode ser tão gostoso em plena nove e horas da manhã?
— Bom dia. – Ele move seu corpo para mais perto, sussurrando em meu
ouvido: — Dormiu bem?
— Maravilhosamente bem –, sorrio, me encaixando em seu corpo desnudo,
que trajava apenas uma cueca boxe.
— Acho que não consigo mais ficar sem fazer amor com você – ele beija
meu ombro. – Vou ter que te precisar todos os dias...
— E eu vou querer te dar isso todo os dias com todo o prazer, gemidos e tudo
mais.
Ele me planta um beijo matinal e maduro nos meus lábios e em seguida
engato a conversa:
— Como foi de viagem? – Finalmente, tenho tempo para perguntar.
— Foi uma tortura – ele diz levando a ponta do dedo indicador para o bico do
meu seio, fazendo movimentos circulares ali. – Definitivamente, você me
acostumou mal.
Sorrio e subo em seu corpo, unindo nossas barrigas e apoiando meu queixo
no vão de seu peitoral, enquanto ele pega um travesseiro e arrasta para trás da
cabeça.
— Matt sabe de tudo.
— De tudo...?
— Que nosso casamento é uma farsa.
Ele franze o cenho, fazendo uma careta:
— Pensei que não fosse mais.
Seus dedos tocam minha bunda, me pressionando contra sua excitação.
— O que exatamente você quer dizer?
— Que eu não vejo problema algum em ficar casado com você para sempre.
Engulo em seco e depois gaguejo:
— Isso é um pedido de casamento?
Ele franze os lábios pensando em algo.
— Tecnicamente, não. – Ele beija meus lábios, segurando meu rosto com as
duas mãos. – Mas que tal uma renovação de votos? Pisco duas vezes e, em
seguida, caio na risada.
— Renovação de votos? Ainda não se estar muito cedo para isso?
Ele sorri levantando uma sobrancelha e tornando a pousar as mãos em meu
bumbum.
— Em se tratando de você, eu não me importo com contratos desde que você
seja minha... – ele me dá um selinho e diz: — Mas podemos pensar em
alguma cerimônia se assim você desejar.
Abro um sorriso largo, pensando o quanto eu estou feliz neste momento. Ele
gira nossos corpos, nos trocando de posições, ficando em cima de mim. Ele
me fita com aquele olhar malicioso enquanto sua boca molha minha barriga
em um beijo quente. Quando as pontas de seus dedos invadem o interior de
minha calcinha, o celular de Phill nos interrompe tocando furiosamente na
mesinha ao lado da nossa cama.
Phill fica parando me olhando, como se precisasse de minha permissão.
— Está tudo bem. Atenda!
Ele beija o pé da minha barriga e se coloca para fora da cama, pegando o
celular em cima da mesa e atende a chamada prontamente:
— Alô.
Depois de alguns segundos assistindo seu olhar esmorecer gradativamente,
seu corpo perde a rigidez e sua mão aperta o aparelho contra a orelha.
Ele fica escutando a pessoa do outro da linha por alguns minutos e depois
encerra a chamada dizendo, com a voz amuada, de uma forma que nunca
havia o visto antes:
— Tudo bem. Em uma hora estou aí.
Ele encerra a chamada, ainda fitando o celular. Em seguida, ele senta na beira
da cama, levando as mãos lentamente para cabeça.
Sinto que perguntas não seriam bem-vindas neste momento, então só me
aproximo cuidadosamente e abraço suas costas, tentando consolar uma parte
dele que foi baqueada.
CAPÍTULO TRINTA E NOVE
Claire
FIM