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A Campanha das Cem Flores: Educação e os Intelectuais na China entre

1951-57

Barbara

Resumo

Esse artigo busca debater a educação e os intelectuais na China nos


anos 50, período anterior ao Grande Salto Adiante. O artigo irá debater a
relação controversa e entre o Partido Comunista Chinês e os intelectuais, em
especial, em relação a escritores: Wu Xun, Yu Pingbo e Hu Feng, escritores
que acabaram combatidos pelo partido e associados ao liberalismo. Esses
escritores chineses foram combatidos por campanhas do partido. Wu Xun é
hoje considerado o pioneiro da educação pública chinesa. Igualmente, iremos
falar sobre como essa Campanha ficou ligada à chamada Campanha dos Cem
Flores (conhecida na China como Campanha da Retificação), seguida pela
Campanha Antidireitista. Especialmente interessante é a trajetória dos
indivíduos criticados pelo partido, tais como Wu Xun. Ele é um dos símbolos do
liberalismo chinês e por isso é um filme inspirado em sua vida foi o primeiro
filme proibido na República Popular da China. Há todo um contexto envolvendo
essa radicalização, como a participação da esposa de Mao e de Mao mesmo
no processo. Wu foi pioneiro da educação pública chinesa e hoje teve sua
reputação restaurada, após um período de banimento durante a revolução
cultural chinesa. A ´partir daí, podemos entender como formou-se a moderna
pedagogia chinesa.

Palavras-chave: China, educação, escritores, intelectuais, pedagogia

1.Introdução

O interesse desse período chinês e o dessa pesquisa deve-se ao fato de


que existe muito pouco material em português. Nesse período surgiram
grandes campanhas de caráter educativo, campanhas essas que marcam a
política educativa do estado chinês até hoje, daí a importância em estudá-las.

A educação chinesa da República Popular da China foi marcada pelas


grandes campanhas populares de caráter educativo. Campanhas como essa
existem até hoje, mas em menor escala. Hoje em dia o cidadão é menos

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estimulado a criticar autoridades. Na história da China, a tendência é ocorrer
uma abertura de crítica ao sistema e, logo a seguir, um fechamento. O último
movimento nesse sentido ocorreu nos anos 80. O sistema, no entanto, não
estimulou tanto a crítica ás autoridades como nos anos 60.

Testadas em menor escala nos anos 50, com a Campanha de Retificação e


a Campanha Antidireitista, as grandes campanhas educativas, com grande
participação da população, mostraram a vitalidade e a capacidade dos
socialistas chinesas de conseguirem grandes feitos. De certa forma, as
campanhas dos anos 50 foram um embrião da Grande Revolução Cultural
Proletária que ocorreu a partir dos anos 60.

2. Campanha Contra Wu Xu

A primeira controvérsia na década de 50 foi em torno de Wu Xu,


educador chinês que viveu entre 1838 e 1896. O livro A Vida de Wu Xu, filme
lançado em 1950, contou a vida desse educador e fez grande sucesso na
China. Inicialmente, as recepções foram calorosas.

Wu originalmente era Wu Qi. Nasceu em Wuzhuang, hoje parte do


condado de Guan. Depois da morte de seu pai, Wu ficou só e muito pobre, sem
poder frequentar a escola local. Wu, então, passou a defender publicamente a
educação gratuita universal. Ele pedia contribuições, vivendo como um
mendigo sem endereço fixo. No entanto, mesmo assim, estudou por contra
própria e reuniu algum dinheiro e mostrou grande talento para
empreendimentos comerciais. Tornou-se, então, um empresário. Ao tornar-se
grande fazendeiro, criou suas próprias escolas, todas beneficentes, voltadas
para a caridade. O nome Xun foi uma homenagem da corte imperial a ele
(dinastia Quing), ocorrida posteriormente.

Wu Xun foi venerado com um templo memorial no condado de Guan e


ele foi celebrado como um herói adepto das ideias do sábio chinês Confúcio. O
espírito de Wu Xun virou sinônimo de ideal de progresso através da educação,
bem como as ideais tradicionais de serviço confucionistas.

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Após recepção positiva, surgiram críticas ao filme sobre a vida de Wu
Xun, que foi tida como contrarrevolucionária por intelectuais do partido. A
esposa de Mao, posteriormente uma líder que presidiu o país, iniciou uma
campanha contra o filme e contra o reformismo burguês representado por Wu
Xu. Mao, inspirado por Jiang Qing, foi denunciado como promotor da cultural
feudal. Os críticos ligados ao Partido Comunista Chinês diziam que a história
tinha sido falsificada e que Wu era, na verdade, um latifundiário que estava
sendo mistificado, o que resultava na promoção da cultura feudal. Por fim, o
filme acabou proibido. Na Revolução Cultural, houve novamente uma tentativa
de destruir o culto de Wu. Ele foi julgado como contrarrevolucionário e seus
restos mortais, queimados publicamente pelos Guardas Vermelhos. Depois da
morte de Mao e da derrubada da esposa em 1976, a reputação de Wu foi
restaurada. O jornal Diário do Povo tocou no assunto em 1985, ajudando Wu a
recuperar seu prestígio como educador e ídolo do liberalismo chinês. Na
atualidade, com a reputação de Wu restaurada, o filme foi exibido em sessão
privada em 2005 lançado em DVD em 2012.

Mao Tsé pessoalmente criticou Wu como sendo um liberal em cujos


programa de alfabetização considerava-se que a revolução não era necessária.
Foi o primeiro caso de uma campanha contra um filme na República Popular da
China, e isso depois do filme ter entrado entre os dez melhores filmes daquele
ano de 1950.

A partir daí, o partido passou a interferir na indústria do cinema chinesa.


A reputação do filme e de Wu Xun só foram completamente restauradas em
1986.

3. Campanha contra Yu Bingbo

Outro caso de uma campanha ocorreu contra Yu Pingbo (1900-1990),


um ensaísta, poeta, historiador e crítico literário. Foi um estudioso seguidor de
Hu Shih, que não era apoiador do comunismo, o que comprometeu Yu Pingbo
posteriormente, pois Hu Shih chegou a escrever contra os comunistas.

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Depois da revolução de 49, quando Yu Pingbo estava como professor
em Pequim, a ordem era reinterpretar os clássicos do pensamento e da cultura
chinesa com as ideias de Marx e do materialismo histórico.

Em 1923, Yu publicou uma crítica a Sonho do Quarto Vermelho, dando


força à interpretação de que os primeiros oitenta capítulos do original Sonho do
Quarto Vermelho tinham sido escritos por Cao Xuegin e os demais por Gao.
Ele estabeleceu, então, um novo campo de estudo que, basicamente, reforçou
o movimento de Nova Cultura que substituiria a antiga cultura chinesa por uma
versão ocidentalizada. O texto Águas de Primavera, publicado ao lado de
“Diário de um Louco” de Lu Xun no jornal A Juventude, foi considerado uma
das primeiras composições a serem escritas em vernáculo chinês
contemporâneo.

Uma crítica ao estudo de Li Pingbo foi promovida por Mao Tsé Tung de
dois estudantes recém-formados para poder criticar o idealismo de Hu Shih,
grande mestre de Pingbo. Mao escreveu pessoalmente uma carta aos dois
estudantes, elogiando sua coragem ao criticar uma autoridade estabelecida,
“uma grande peruca burguesa”, no entender de Mao. A Revolução Cultural
Chinesa foi muito marcada por atitudes como essa: alguém, mesmo num
estrato inferior, numa perspectiva hierarquicamente mais baixa, sem
efetivamente estar consolidado profissionalmente e sendo jovem, podia
ativamente criticar uma autoridade estabelecida. O critério da origem de classe
e da necessidade da classe operária dirigir tudo era muito levado em conta,
para além dos meros critérios técnicos.

Para o entendimento pedagógico maoísta, que influencia o moderno


sistema educacional e pedagógico chinês, como se pode ver no filme
Rompendo com Velhas Ideias (1976) e no Livro Vermelho de Mao Tsé, a teoria
não pode ser dissociada da prática, ambas sempre devem andar juntas.

Uma grande intensidade dramática é o que podemos encontrar em


Rompendo com Velhas Ideias, um filme da República Popular da China -que foi
um país socialista até 1976- e cuja filmagem ocorreu durante o Grande
Proletariado Revolução Cultural daquela nação (1966-1976), liderada pelo ex-
presidente Mao Tse Tung. Lançado em 1975, sob a direção de Wenhua Li, é

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considerado uma das poucas obras cinematográficas que ampliou a
visualização da importância de transformar o antigo ensino em uma educação
proletária, científica a serviço do povo. No decorrer da história, destaca-se o
tema central, a reforma da educação e em seu caráter essencial e peremptório
pôr fim aos problemas da classe trabalhadora da cidade e do campo, onde esta
última é a que apresenta com mais dificuldades, que são muito diversas, tanto
para aquele contexto quanto para o momento atual.

Resistir na busca por métodos populares de ensino para construir tijolo


por tijolo a nova sociedade foi a missão dos líderes, que apesar das
incessantes barreiras impostas pela burguesia, levantaram essa luta aplicada
unindo a teoria à prática. Ressaltando o título deste filme, segue-se que
devemos romper com velhas ideias, com aquelas que nos permitem naturalizar
mas que exigem modificação forç

3. Campanha contra Feng Xuefeng

Feng Xuefeng (1903-1976) foi um escritor e ativista chinês que, após ter
contribuído significativamente para a crítica literária socialista, era membro
importante do partido comunista chinês, era também especialista no escritor Lu
Xun, mas foi acusado de contrarrevolucionário e passou o final da vida sob
perseguição.

Como Feng era um militante antigo e consagrado do partido comunista


chinês, redigiu editoriais críticos ao governo e, a seguir, foi rotulado de
contrarrevolucionário. Foi, então, pego na Campanha Antidireitista e obrigado a
passar por reeducação pelo trabalho. Posteriormente, em 61, foi absolvido.
Não conseguiu, no entanto, terminar o romance que ambicionava escrever
sobre a Longa Marcha. Viveu até 1976, quando morreu de câncer no pulmão.
Igualmente, o escritor e crítico literário Hu Feng (1902-1985), militante histórico
do Partido Comunista, tinha uma teoria literária própria e que recusava as
formas nacionais, consideradas historicamente ligadas ao confucionismo.
Nisso, ele entrava em choque com Mao Tse Tung e outras autoridades. Ele foi,

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no entanto, reabilitado parcialmente em 1980 e, postumamente, totalmente
reabilitado em 1988.

4. Campanha da Retificação ou das Cem Flores

O nome da campanha foi tirado de uma fala histórica, ainda do tempo da


monarquia, quando foi proclamada a liberdade de pensamento e de religião e,
por fim, prevaleceram o confucionismo e o taoísmo.

Depois das campanhas contra escritores e intelectuais em geral, pode-


se dizer que o partido viu que foi longe demais e proclamou que todos
apresentassem suas críticas. Muitas eram apresentadas nas escolas em
grandes murais chamados dazibaos. Os intelectuais estavam, devido ás
campanhas anteriores, muito afastados do partido. Como as críticas foram
ganhando força, o partido lançou, logo a seguir, a Campanha Antidireitista, que
prendeu e processou muitos intelectuais, educadores e escritores entre 1957-
59. Mao, ao abrir a Campanha das Cem Flores, fez uma alusão ao período da
história chinesa chamada período dos reinos combatentes.

A Campanha Antidireitista direcionou-se muito contra as críticas que


supostamente não eram construtivas. Afetaram muito os educadores chineses
que tinham estudado e permanecido ligado a instituições ocidentais.

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5. Conclusão

Pode-se dizer que, através dessa pesquisa, ficamos sabendo mais sobre
uma tema a respeito do qual há muito pouco material em português: as
campanhas movidas contra intelectuais considerados contrarrevolucionários no
período 1951-57. Especialmente interessante para nossa área de atuação foi a
história da vida de Wu Xu, educador chinês considerado o ídolo dos reformistas
burgueses e liberais chineses, filme proibido em 1950 na República Popular da
China. Posteriormente, nos anos 80, Wu Xu teve sua reputação restaurada e o
filme saiu em DVD e passou a passar em sessão privada na China.

As questões envolvendo a educação, literatura e pedagogia chinesas,


como pudemos observar nessa pesquisa, envolvem a opção realizada por
grandes campanhas nacionais de caráter educativo desde os anos 50. Aqui foi
analisada a primeira dessas campanhas, a campanha de Retificação,
conhecida também como Campanha das Cem Flores. Ela foi seguida pela
Campanha Antidireitista. Os intelectuais acima citados foram todos criticados e
punidos na Campanha Antidireitista. A Campanha dos Cem Flores evocava
uma raiz histórica, um período onde floresceram várias linhas de pensamento
no tempo da monarquia. Há também a hipótese de que Mao e seu grupo
desejavam, com isso, saber quem eram os inimigos do comunismo. Sendo
assim, deixar as cobras saírem de suas tocas seria um objetivo dessa
campanha, daí a punição logo a seguir. No entanto, através dos dazibaos
(grandes cartazes com jornais) sem dúvida a crítica chegou às massas. O
período da Campanha Antidireita coincide com a leitura do Relatório Kruschev
na URSS e o levante húngaro de 1956, eventos que o partido julgou
ameaçadores. No entanto, houve um consenso de que havia contradições no
seio do povo e que deveriam ser resolvidas através da educação e não da
repressão. A Revolução Cultural, ocorrida nos anos 60, foi um desdobramento
que gerou novas grandes campanhas educativas, campanhas que existem até
hoje. Essas campanhas marcam uma grande diferença entre o socialismo

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tecnocrático da União Soviética e o socialismo chinês. Os chineses sempre
convocavam as massas para suas realizações.

6, Referências:

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8
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