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Um exemplo estético da mediação e a ética do diálogo da comunidade do

Rodeadouro em Juazeiro – BA.


Isabela Esteves Gomes - Mestranda em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos
(PPGESA) da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)

INTRODUÇÃO
O espaço urbano é um território composto por materialidades e imaterialidades
derivadas das relações humanas e coleciona suas marcas indeléveis, pois “o território não
é apenas o resultado da superposição de um conjunto de sistemas naturais e um conjunto
de coisas criadas pelo homem. O território é o chão e mais a população, isto é, uma
identidade, o fato e o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence.” (SANTOS, 2001,
p. 96).
As ações humanas registradas no território, ao longo do tempo, materializam as
experiências coletivas daquele grupo social em interação cotidiana e constituem o seu
patrimônio. Sendo interação, relação, é diálogo, portanto é troca e, enfim, é comunicação.
A busca por compreender esta história escrita pela ação humana no espaço comunitário
perpassa pela vinculação teórica com os estudos culturais latino-americanos que afirmam
ser essencial pensar a cultura a partir da “compreensão da sua natureza comunicativa. Isto
é, seu caráter de processo produtor de significações” (MARTÍN-BARBERO, 2015, p.
289).
A cultura de um grupo, então, é produzida pelas trocas das experiências vividas
coletivamente, onde ao relacionar-se com o seu espaço/território e das tentativas de
compreendê-lo e intervir nele, institui-se um vínculo comunitário e a composição
ecossistêmica vital e local, seguir estes rastros impressos é desvelar o poder gerador da
sinergia social. Todas essas ações e significações vinculam-se pelo ato das mediações
exercitadas pela comunidade. Segundo o dicionário virtual Priberam, mediar é “ficar no
meio”, “passar-se (entre dois fatos ou duas épocas). Intervir, interceder”. Apropriando-se
do termo, Martín-Barbero utiliza-o para compreender o movimento comunicativo interno
das comunidades, então, para ele mediação seriam os “modos de interpelação dos sujeitos
e de representação dos vínculos que dão coesão à sociedade” (MARTÍN-BARBERO,
2015, p. 14) e assim, a mediação é “socialmente produtiva” de acordo com os estudos
deste teórico.
Este trabalho segue na lógica de investigação deste conceito na prática social de
uma comunidade urbana de Juazeiro, ao norte do Estado da Bahia, o Rodeadouro. A
pesquisa está em curso a nível de mestrado realizado dentro do Programa de Pós-
graduação em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos (PPGESA) da Universidade do
Estado da Bahia (UNEB), encontra-se em fase de trabalho de campo e está devidamente
registrada e aprovada no Comitê de Ética da referida instituição. Este trabalho representa
uma parte importante dos resultados desta pesquisa, encampa uma investigação
epistemológica pela compreensão da identidade da comunidade e assim, poder
caracterizar o ecossistema comunicativo do Rodeadouro, ou seja, buscar entender as
plurirrelações entre os elementos constitutivos do grupo, visto a importância do território,
o fator lugar assume grande relevância para a investigação.

OBJETIVO
Compreender a estética da mediação e a ética do diálogo na coexistência das duas igrejas
católicas do Rodeadouro.

RESULTADO
Durante o primeiro dia do trabalho em campo, entre as primeiras impressões, o
fato de existirem duas igrejas, uma ao lado da outra, chamou minha atenção. Uma maior
e de construção mais recente, mantém as cores azuis iguais com a antiga, recebe as missas
e as visitas, enquanto a mais velha, permanece fechada. Conforme demonstra a figura 1
Figura 1 – as duas igrejas do Rodeadouro: passado e presente, conflito e diálogo.

Fonte: Isabela Esteves Gomes.


Para compreender a razão disso, questionei a D. Ovídea, líder comunitária, que,
resumidamente me contou sobre a vontade de realizar a demolição da igreja menor e mais
antiga, datada dos anos 60, dando espaço para uma “praça mais bonita”, já que outra
maior e mais nova foi construída. Todavia, o projeto encontrou resistência dos anciãos da
comunidade, impedindo tal ação com a justificativa de manutenção da memória e
encontrou ecos de defesa em alguns estudiosos da região que, consultados sobre a ideia
original, concordaram com os resistentes e aconselharam a não destruir.
É possível a identificação de um conflito enfrentado pela comunidade, onde um
grupo deseja ‘modernizar’ o espaço sem considerar sua memória patrimonial, enquanto
outro defende a permanência em respeito à história local.
A igreja como símbolo material religioso “os significados só podem ser
‘armazenados’ através de símbolos” (GEERTZ, 2008, p. 93), tanto para o grupo que
defende a demolição da antiga construção, quanto aquele que resiste, lutando pela sua
manutenção, movem suas justificativas por sentidos religiosos: de devoção,
modernidade/melhoria ou memória. Todas elas revestidas na crença sobre o benefício
comunitário. Considerada como lugar sagrado pelos devotos, mobiliza sentimentos e
ações de compromisso social, ora para mantê-la originalmente rememorando rituais de
iniciação religiosa.
A evidência materializada pela coexistência das duas igrejas, simbolicamente,
exprime o processo de mediação vivido pela comunidade e num exercício de abstração,
a mera construção civil cuja intenção é a prática da fé, amplia seu significado social e
adquire um status sacrossanto.

REFERÊNCIAS
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e
hegemonia. 7ª ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2015.
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência
universal – 3ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 2001.
BREVE RESUMO CURRICULAR DA AUTORA

Mestra em Extensão Rural pela Universidade Federal do Estado da Bahia (UNIVASF),


mestranda em Educação, Cultura e Território pela Universidade do Estado da Bahia
(UNEB), especialista em Educação, Contemporaneidade e Novas Tecnologias pela
Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) e em Docência no Ensino
Superior pelo Centro Universitário SENAC e Bacharel em Comunicação Social com
Relações Públicas pela Universidade Católica do Salvador (UCSal).
Link Lattes: http://lattes.cnpq.br/6474609860653307

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