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OH, DÚVIDA CRUEL!

Exercício Cênico de Interpretação

Texto de:
JULIO CARRARA

Escrita em 1999
Julio Carrara Oh, Dúvida Cruel! 1

PERSONAGENS:
CACAU
PATY
KIKA
3 FEIRANTES:
VENDEDORA DE REPOLHOS
VENDEDOR DE LARANJAS
VENDEDOR DE TOMATE
4 TRANSEUNTES:
MADAME COM CACHORRINHO
MENINO COM CARRINHO DE FEIRA
VELHINHO MÍOPE
SENHORA RABUGENTA
HOMENS E MULHERES

ÉPOCA: Atual

CENÁRIO: Rotunda preta. Palco nu. Apenas uma arara com os figurinos no
fundo do palco. Os atores, no decorrer da história, irão compondo o cenário.
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PRÓLOGO
(Palco na penumbra. Todos os atores em cena, sentados, formando um semicírculo no
palco, de costas para a plateia, num silêncio completo. O público, ao entrar no teatro,
irá se deparar com os atores se concentrando. O diretor do espetáculo sobe ao palco.
Um foco de luz o ilumina.)

DIRETOR
Boa noite! (Ou bom dia ou boa tarde. Olha para o relógio de pulso.) São
exatamente (Fala a hora.) Meu nome é... (Diz seu nome.) e sou diretor dessa
brincadeira. A ideia de realizar esse trabalho é muito simples. Normalmente,
quando vocês vem ao teatro, vem com a intenção de assistir a um espetáculo,
seja ele um drama, uma comédia, uma farsa, uma tragédia, um musical, um
monólogo, uma ópera; um espetáculo realista-naturalista, expressionista,
surrealista, simbolista; seja das metodologias de Stanislavski, Brecht, Artaud,
Peter Brook, Grotowsky, Mayerhold, Antunes Filho, Gerald Thomas, Zé Celso,
enfim, um espetáculo agradável ou desagradável, de acordo com a sua
preferência. Há uma série de espetáculos em cartaz no Brasil e no mundo
todo, de dramaturgos clássicos e contemporâneos: Ésquilo, Sófocles,
Eurípides, Aristófanes, Shakespeare, Tchekhov, Arthur Miller, Ionesco,
Tenessee Williams, Nelson Rodrigues, Plínio Marcos, Dias Gomes, Mário
Bortolotto, Martins Pena, alguns dos autores mais encenados - poderia citar
outros, também importantes, mas, ficaríamos aqui até amanhã - de diversos
gêneros e estilos. Alguns autores e diretores em seus trabalhos seguem uma
linha linear, com a apresentação das personagens, os conflitos, clímax e
desfecho; outros uma linha não linear, com diversos flashbacks, não seguindo
uma ordem cronológica, misturando, passado e presente, presente e futuro,
passado e futuro, presente, passado e futuro, e assim por diante; e logo após o
black-out final ou quando o pano se fecha e os atores aparecem para os
agradecimentos, ouvem-se os aplausos calorosos - ou frios - da platéia, que,
em seguida, levanta-se das poltronas e saem do teatro falando bem - ou mal -
do que assistiram. E, infelizmente, vocês não acompanham toda a etapa pela
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qual o ator ou atriz passa antes de subir ao palco, antes de iniciar o espetáculo.
E é o que nós do grupo (Diz o nome do grupo.) iremos mostrar... Vocês
acompanharão todo o processo da preparação de um ator e da construção do
personagem que ocorre nos ensaios: o relaxamento, o aquecimento corporal e
vocal e uma série de jogos teatrais, que são a base disso tudo, propostos por
Viola Spolin, Olga Reverbel e Augusto Boal, que na realidade, são brincadeiras
que qualquer criança realiza, na rua, na escola, em casa. Esses exercícios que,
durante algumas semanas, fizeram parte do processo de ensaio da “sketch”
“Oh, Dúvida Cruel!”, espetáculo pelo qual os exercícios são direcionados e que
vocês irão assistir logo após os exercícios. A “sketch” é um exercício cênico de
interpretação para atores-mirins, para ser assistido também por um público
mirim, mas isso não impede que jovens e adultos o vejam, enfim, um
espetáculo, que, apesar de ser feito por e para crianças, abrange todas as
idades. A “sketch” tem como tema a sexualidade e retrata a dúvida de três
crianças em relação ao nascimento dos bebês. Bem, a todos um bom
divertimento.

(Luz geral sobre o palco. Os atores continuam em cena. O diretor fica sentado em uma
cadeira à direita do proscênio, bem no cantinho. Um foco de luz sobre ele. Ele
permanece ali durante todo o espetáculo, dando as orientações para os atores. A partir
daí, fica a critério dele como conduzir o trabalho. Os atores seguem a ordem da direção,
desmancham o semicírculo e cada um procura um espaço no palco e deitam-se. A
sequencia dos exercícios segue-se abaixo.)

1.ª ETAPA DOS EXERCÍCIOS –


(RELAXAMENTO E RESPIRAÇÃO)

1.º EXERCÍCIO: Deitados de costas, de olhos cerrados, os atores procuram a melhor


forma para relaxar todos os músculos do corpo. A respiração nessa etapa do exercício é
importantíssima. Deve-se inspirar e expirar lentamente pelo nariz.
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2.º EXERCÍCIO: Quando os atores sentirem o corpo totalmente relaxado, começam a


trabalhar lentamente com as articulações dos dedos dos pés e das mãos, depois
passando para as outras articulações do corpo, procurando sentir cada movimento.
Depois que todas as articulações foram trabalhadas, esticar o corpo o máximo possível,
espreguiçando exageradamente.

3.º EXERCÍCIO: Os atores deitam-se novamente de costas e inspiram lenta e


totalmente pela narina direita, tapando a esquerda, e expelir pela esquerda, tapando a
direita; depois inverter.

4.º EXERCÍCIO: Inspirar lentamente todo o volume de ar possível e expirar todo o ar


violentamente pela boca.

2.ª ETAPA DOS EXERCÍCIOS -


(MASSAGEM E AQUECIMENTO CORPORAL)

1.º EXERCÍCIO: Os atores formam um círculo no centro do palco, tomando a


distância dos braços e iniciam uma massagem no companheiro da frente, começando
pela cabeça, massageando o couro cabeludo com movimentos circulares ascendentes
com as pontas dos dedos. Depois iniciam a massagem nos ombros, com os dedos bem
firmes, como se os dedos fossem pregadores de roupa. Dos ombros, vai passando para
as costas, massageando toda a coluna vertebral, com movimentos circulares. Depois
deixar as mãos em formato de concha e dar tapinhas, não muito forte, nem muito fraco,
na área massageada anteriormente.

2.º EXERCÍCIO: Realizar um denso alongamento: das pernas, dos braços, da coluna,
do pescoço, para poder entrar nos exercícios mais puxados.

3.º EXERCÍCIO: Rolamento. Os atores deverão rolar de um lado para o outro, com o
corpo inteiro, dar diversas cambalhotas para frente e para trás. Embora possa parecer
estranho, isto ajuda um ator em seus momentos de maior exaltação e inspiração
criadora.
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4.º EXERCÍCIO: Corrida. Correr para frente, depois de um tempo, para trás, para
direita e para a esquerda, depois misturar os andares, correndo para todos os lados, sem
uma seqüência e misturando os ritmos: normal, lento e rápido.

5.º EXERCÍCIO: O ator deverá imaginar que está dentro de uma enorme “bolha” de
sabão. Realizar movimentos com a cabeça, troncos e membros. Esses movimentos
deverão ser bem amplos, para cima e para baixo, para direita e para a esquerda, enfim,
em todas as direções possíveis.

3.ª ETAPA DOS EXERCÍCIOS –


(AQUECIMENTO VOCAL)

1.º EXERCÍCIO: Os atores deverão ficar de frente para a platéia e ouvindo as


orientações do diretor. Esse exercício tem como objetivo relaxar a musculatura vocal:
abrir a boca, como se fosse dizer a vogal “o” e procurar bocejar bastante, até o
relaxamento.

2.º EXERCÍCIO: Realizar a respiração diafragmática. Colocar a língua no “céu-da-


boca” e fazer uma vibração, com a consoante “erre”. Quando o ar se esgotar, inspirar
novamente e repetir o exercício.

3.º EXERCÍCIO: Esticar a língua o máximo possível, abrindo a boca e movimentando-


a para baixo pronunciando a vogal “a” e para cima, pronunciando a consoante “eme”.
Repetir diversas vezes.

4.º EXERCÍCIO: Dar “beijinhos”, fazendo um biquinho e esticando os lábios para


fora; em seguida desmanchar o bico e puxar os lábios para dentro e continuar
mandando beijo. O som produzido é do “pê”. Repetir diversas vezes essa seqüência.
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5.º EXERCÍCIO: Mastigar, com a boca fechada, os sons das vogais e das consoantes,
sem parar. Logo em seguida, esticar e fechar os lábios, fazendo o maior número de
caretas possíveis ainda emitindo o som.

6.º EXERCÍCIO: Andar pelo palco todo, “ad libe”, emitindo um som qualquer. Esse
som deverá pouco a pouco se uniformizando. O andar, pouco a pouco, deverá se
transformar no andar do personagem de cada um, assim como a forma de olhar e de
falar.

4.ª ETAPA DOS EXERCÍCIOS –


(JOGOS TEATRAIS)

1.º EXERCÍCIO: O diretor passará um número para cada ator. O ator deverá
memorizar esse número. O diretor explica como funciona o exercício para os atores e o
público. Seguindo sua ordem, os atores começam a andar pelo palco. O diretor diz um
número, por exemplo: 7. O ator que estiver com esse número, deverá gritar e se jogar
para trás, como se fosse desmaiar. Todos os outros, deverão correr até ele e impedir que
ele caia no chão, e assim sucessivamente. Se quiser, o diretor poderá dizer de dois a três
números ao mesmo tempo, para testar a atenção dos atores. Esse exercício recebe o
nome de “O Desmaio de Frejus”, criado por Augusto Boal.

2.º EXERCÍCIO: Deverá ser formado um círculo no centro do palco. Os atores deverão
observar muito bem quem está do seu lado direito e esquerdo. Desmancham o círculo e
andam pelo palco. O diretor grita: “Pára”. Os atores param onde estão e estendem sua
mão direita para quem estava à sua direita, e com a esquerda a mesma coisa. (Se um
errar, invertendo as mãos, o exercício estará perdido.) Formou-se um nó. Esse nó
deverá ser desfeito até que os atores voltem na posição inicial do círculo. Não poderá
haver comunicação verbal entre os atores.

3.º EXERCÍCIO: Formam-se duplas. O nome desse exercício é “Hipnotismo


Colombiano”. Um ator coloca a palma da mão, a um palmo de distância dos olhos de
outro ator, que a olha fixamente. O ator deverá mover a mão em diversas direções e
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outro deverá acompanhar a mão, como se estivesse realmente hipnotizado. Depois


trocar, quem era hipnotizador, agora é o hipnotizado.

4.º EXERCÍCIO: Os atores deverão tremer o corpo todo, como se estivesse coberto por
formigas. Deverão correr, ainda tremendo, e falar em blablação.

(Finalizado os exercícios, os atores colocam o figurino. o figurino deverá ser posto por
cima do colan cor da pele, que o elenco deverá estar vestido para a realização dos
exercícios. Todo o material de figurino está em uma arara ao fundo do palco, assim
como os adereços. Quando todos estiverem prontos, sairão do palco indo para as coxias.
Dois atores deverão tirar a arara, deixando o palco nu. Luz vai descendo em resistência
até a penumbra.)

CENA 1
(Num curto espaço de tempo, é dado os três sinais. Luz sobe em resistência revelando
uma praça. Três crianças, um menino e duas meninas, Cacau, Paty e Kika entram
correndo e brincam de pular corda, cantando a música.)

OS TRÊS
Um homem bateu em minha porta e eu abri
Senhoras e senhores ponham a mão no chão
Senhoras e senhores pulem com um pé só
Senhoras e senhores dê uma agachadinha
E vá pro olho da rua...

(Terminando a brincadeira da corda, começam a brincar de pega-pega. Uma cena que


deverá ser ágil, com muita energia e muita movimentação. Em seguida, brincam de
ciranda-cirandinha.)

OS TRÊS
Ciranda, Cirandinha
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Vamos todos cirandar


Vamos dar a meia volta
Volta e meia vamos dar

O anel que tu me destes


Era vidro e se quebrou
O amor que tu me tinhas
Era pouco e se acabou.

(Os três esparramam-se no chão. Os outros atores que estarão nas coxias deverão
acompanhar as três crianças, cantando e gritando em “off”. Cacau brinca com um
carrinho, enquanto Paty e Kika brincam com bonecas.)

PATY
Sabem o que minha mãe me disse?

KIKA
O que?

PATY
Que eu vou ganhar um irmãozinho e ela vai à feira comprar.

CACAU
Ih, sua tonta, os bebês não são vendidos na feira.

PATY
Claro que são. Minha mãe me disse que eles estão na barraca de repolho.

CACAU
Não é não. A minha mãe me explicou direitinho. E eu sei como nascem
os bebês.
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KIKA
(Curiosa.) Então conta pra gente!!!

CACAU
Tá bom. Quando minha mãe tava esperando minha irmãzinha, ela
ficava toda a tarde deitada na cama descansando, deixava a janela aberta e
ficava esperando a cegonha.

AS DUAS
Cegonha?

CACAU
É. A cegonha é uma ave, que tem um bico enorme que traz o bebê
embrulhado numa fralda.

PATY
Eu não acredito nisso.

KIKA
Então seus pais encomendaram o bebê?

CACAU
Encomendaram. Eles escreveram uma carta e pediram uma menina
porque eles já tinham um menino, que sou eu. A barriga da mamãe ia ficando
grande e depois de nove meses a cegonha veio trazer minha irmãzinha.

PATY
E por que a barriga dela cresceu?

CACAU
Ah, isso eu não sei.
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KIKA
Ela não tava com barriga d’água?

CACAU
(Chateado.) Já disse que não sei.

PATY
Eu ainda não acredito nisso.

KIKA
Eu também não. Acho isso muito estranho!

CACAU
Vocês são duas chatas.

PATY
(Levanta para brigar.) Chato é você.

CACAU
Você.

PATY
Você.

(Os dois estão quase se pegando. kika entra no meio dos dois e impede a briga.)

KIKA
Parem com isso. Brigar não vai resolver nada... Eu tive uma ideia. Por
que a gente não vai à feira e compra um repolho pra ver se o bebê vem mesmo
dentro dele?
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PATY
Mas eu não tenho dinheiro comigo.

KIKA
Eu tenho dinheiro. Vamos lá?

PATY
Vamos.

CACAU
Eu acho tudo uma bobagem...

KIKA
Pára de ser chato, Cacau. Vamos?

CACAU
Tá bom, Kika. Vocês venceram. Vamos lá.

(Saem correndo.)

CENA 2

(Forma-se uma feira. Muito burburinho, pregões dos feirantes, que vão entrando e
anunciando o produto que vendem. Essa cena deverá ter muita poluição auditiva, com
os feirantes, que se esgoelam. Movimentação habitual, como em qualquer feira. Nesse
cenário está uma madame com um cachorrinho “poodle” branco, um menino com um
carrinho de feira, uma senhora rabugenta e um velhinho míope, além de muitos outros
personagens, se o grupo for grande. Cabe aos atores e ao diretor criarem mais tipos que
podem ser facilmente encontrados em qualquer feira. A vendedora de repolho, como o
vendedor de tomate e o vendedor de laranjas, estão em suas barraquinhas, chamando a
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atenção dos fregueses. Nessa bagunça, aparece Kika, Cacau e Paty, que se aproximam
da barraca de repolho.)

PATY
Quanto é o repolho, moça?

VENDEDORA DE REPOLHO
(Tirando as moscas de sua barraca.) Um Real.

PATY
Tudo isso?

VENDEDORA DE REPOLHO
Mas procês eu faço mais barato. Cinquenta centavos.

KIKA
Melhorou.

VENDEDORA DE REPOLHO
Pode escolher. Fique à vontade. (Grita.) Repolho, repolho, repolho.
Repolho de Porto Feliz. Quem vai querer.

VENDEDOR DE TOMATE
Olha o tomate! Tomate fresquinho para o molho do seu macarrão.
Vamo, vamo, minha gente. Venha, venha, dona Maria, traga a sacola e traga a
bacia. Olha o tomate...

VENDEDOR DE LARANJA
Olha a laranja. Laranja da boa. Tudo de boa qualidade para você fazer
aquele suquinho natural. Laranja tem Vitamina C, meu povo. Pra você que
anda meio gripado, não existe meió remédio. Vamo, minha gente.
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(Enquanto fazem os pregões, as crianças estão pregadas na barraca de repolho e


discutem qual repolho vão comprar. Aos outros transeuntes cabe criar situações, mas
sem tirar o foco das crianças.)

CACAU
Vamos levar esse aqui. É maior!

PATY
Tá bom.

(Entregam o dinheiro para a vendedora de repolho. Ela pega uma arcaica calculadora e
começa a fazer a conta para dar o troco às crianças. Entrega umas moedas para elas. Os
feirantes vão se retirando e as crianças se aproximam do proscênio. Abrem o repolho e
frustram-se quando não encontram nada dentro dele.)

CACAU
Não falei que sua mãe não sabe de nada, Paty?

PATY
Droga... Eu queria tanto saber como nasce um nenê.

CACAU
E agora? O que a gente faz?

KIKA
Já sei. Minha mãe tem um livro que fala sobre isso. Como sou burra.
Como não pensei nisso antes? Vou pegar o livro e já volto.

(Sai correndo. Cacau e Paty cruzam os braços e ficam esperando. Kika entra correndo
com um livro na mão.)
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KIKA
Tá aqui. (Abre o livro e lê.) Capítulo I – Como nascem os bebês... Para
conceber um bebê é necessária a união entre o homem e a mulher através do
ato sexual. O ato sexual ocorre quando o homem introduz o pênis na vagina
da mulher. Se a mulher está no seu período fértil e o homem tendo ejaculado
dentro dela, ocorre a fecundação. A fecundação resulta do encontro do óvulo
com o espermatozóide. Este penetra de cabeça no óvulo e aí se fixa. Algumas
horas depois, óvulo e espermatozóide formam uma única célula, que muito
em breve serão duas, depois quatro, depois um conjunto de células. Ao fim de
alguns dias, as células se alojam na mucosa do útero, que sob a influência dos
hormônios ovarianos está preparado para recebê-las. É aí que o óvulo, tornado
em feto, permanecerá durante os nove meses de gravidez. No fim de um mês,
se transforma em um embrião de cerca de um centímetro que se assemelha a
um girino. Ao completar o quarto mês, dá-se o nome de feto e ele apresenta
um aspecto muito mais humano. Confortavelmente instalado dentro de um
saco membranoso, o âmnio, ele recebe o alimento e o oxigênio através de uma
espécie de filtro, a placenta, ao qual está ligado por um cordão. É o cordão
umbilical que se corta depois do nascimento e que formará o umbigo. (Todos
olham para o umbigo.) A mulher grávida começa a sentir pequenas dores,
geralmente nos últimos dias de gravidez. Um dia, de repente, as dores
aumentam e seu ritmo se acelera. O bebê chega ao exterior pela vagina, unida
à mãe apenas pelo cordão umbilical.

CACAU
Você leu, leu e eu não entendi nada. Pelo contrário, me confundiu ainda
mais.

PATY
Eu também já fiquei maluca.
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KIKA
Calma gente. Não é um bicho de sete cabeças. É assim mesmo. Vou
explicar para vocês como eu entendi...

(Entra música. Kika faz com Paty e Cacau uma cena silenciosa, explicando tudo. Uma
música sublinha seus gestos.)

EPÍLOGO
(Quando Kika começa a falar, vai abrindo um foco vermelho no centro do palco e todas
as meninas do elenco, exceto Kika e Paty, formam um círculo no centro e fazem uma
dança sensual, mas sem ser apelativa. Os meninos entram, por diversos lados, se
rastejando. O número de meninas deve ser exatamente igual ao número de meninos.
Estão vestidos novamente com o colan cor da pele. A ideia desse trecho é passar para o
público através de símbolos, o espermatozoide fecundando o óvulo. Os meninos
representariam os espermatozoides e as meninas, os óvulos. Os meninos entram por
baixo das pernas das meninas e formam outro círculo dentro daquele. há uma violenta
explosão e todos caem no chão, ficando numa posição de feto, como um bebê dentro da
barriga da mãe. permanecem nessa posição.)

PATY
Que repolho, o quê! Nem cegonha! Agora eu entendi tudo. Agora eu sei
porque cresce a barriga da mamãe e sei como meu irmãozinho vai nascer. Que
legal!

KIKA
(Com ar de intelectual.) Nada que um bom livro não responda e que uma
menina inteligente como eu consiga entender essas palavras complicadas.

CACAU
Eu só não entendi uma coisa... Como o bebê entra na barriga da mamãe
e por onde e como ele sai?
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KIKA
Eu já li isso, Cacau, você que é distraído e não prestou atenção.

CACAU
Me explica de novo.

KIKA
Não. Se você não entendeu, pergunta, ué.

CACAU
Mas pra quem?

OS TRÊS
Oh, Dúvida Cruel!!!

(Os três unem as faces e ficam com um ar de dúvida. enquanto outros atores, deitados
na posição de feto, fazem contrações com o corpo, adquirindo vida, como um bebê
recém-formado. luz desce em resistência, só ficando o foco do diretor.)

DIRETOR
É isso. Um espetáculo simples e ingênuo. A apresentação de um ensaio,
que nenhum de vocês, infelizmente, pode ver. Espero que tenhamos
proporcionado à vocês momentos de alegria e descontração, apesar de
estarmos tratando de um assunto sério e polêmico, tanto para os pais, quanto
para os filhos. Boa noite (Bom dia ou boa tarde.) a todos e muito obrigado pela
presença.

FIM

Novembro/1999
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ALGUMAS OBSERVAÇÕES A RESPEITO DO


ESPETÁCULO.

• Se o espetáculo for cumprir uma longa temporada, cabe ao diretor variar os


exercícios, mas seguindo corretamente as seqüências de: relaxamento,
massagem e aquecimento corporal, aquecimento vocal e jogos teatrais. Os
exercícios propostos no roteiro são baseados nos livros “Improvisação para
o Teatro”, de Viola Spolin; “O Teatro na Sala de Aula”, de Olga Reverbel;
“200 Exercícios e Jogos para o Ator e o Não-Ator com Vontade de Dizer
Algo através do Teatro”, de Augusto Boal, além de outros criados pelas
crianças com as quais eu trabalhei nessa montagem. Se o diretor quiser
utilizar outros livros de outros autores, fica em aberto. Teatro é uma arte
que não pode, nem deve ser limitada, como qualquer outra arte.
• Uma arara deverá ficar no fundo do palco, no centro, com o figurino dos
atores. Cada ator deverá ter uma garrafinha de água, que será colocada
com os seus devidos nomes, nas extremidades do palco.
• A iluminação, durante os exercícios, deverá ser composta uma geral
branca, (ou apenas com a luz do palco, como ele é durante o dia). Quando a
“sketch” tiver início, as luzes deverão possuir um clima “quente” e
agradável. As gelatinas das cores vermelha, amarela e âmbar, de contraluz,
são as mais indicadas para o espetáculo.
• Os bastidores deverão ficar visíveis da platéia. O diretor ficará sentado em
um banquinho devidamente colocado à direita do proscênio, bem no canto,
iluminado por um foco de luz branco.
• Os atores deverão estar vestidos com um colan cor da pele, para os
exercícios. Os figurinos deverão ser colocados por cima do colan e deverão
ser bem coloridos.
• O trabalho pode ser apresentado em qualquer ambiente: na sala de aula,
em um teatro de bolso, numa arena, praça pública, biblioteca, etc.

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