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WBA1041_V1.

PRINCÍPIOS BÁSICOS DO
PROCESSO TERAPÊUTICO
EM TERAPIA COGNITIVO-
COMPORTAMENTAL
2

Gessyka Wanglon Veleda

PRINCÍPIOS BÁSICOS DO PROCESSO


TERAPÊUTICO EM TERAPIA COGNITIVO-
COMPORTAMENTAL
1ª edição

São Paulo
Platos Soluções Educacionais S.A
2022
3

© 2022 por Platos Soluções Educacionais S.A.

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Revisor
Rogério Adriano Bosso

Editorial
Beatriz Meloni Montefusco
Carolina Yaly
Márcia Regina Silva
Paola Andressa Machado Leal

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


_____________________________________________________________________________
Veleda, Gessyka Wanglon
Princípios básicos do processo terapêutico em terapia
V436p
cognitivo-comportamental / Gessyka Wanglon Veleda. – São
Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A., 2022.
32 p.

ISBN 978-65-5356-187-8

1. Terapia cognitivo-comportamental. 2. Processo


terapêutico. 3. Técnicas cognitivas. I.Título.
CDD 616.8914
_____________________________________________________________________________
Evelyn Moraes – CRB: 010289/O

2022
Platos Soluções Educacionais S.A
Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César
CEP: 01418-002— São Paulo — SP
Homepage: https://www.platosedu.com.br/
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PRINCÍPIOS BÁSICOS DO PROCESSO TERAPÊUTICO


EM TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

SUMÁRIO

Apresentação da disciplina ___________________________________ 05

Avaliação inicial do paciente e primeira sessão _______________ 06

Sessões subsequentes em TCC e aliança terapêutica_________ 18

Técnicas Cognitivas e Técnicas Comportamentais ____________ 30

Encerramento do processo terapêutico e prevenção da


recaída________________________________________________________ 43
5

Apresentação da disciplina
Seja bem-vindo! Na disciplina Princípios básicos do processo terapêutico
em Terapia Cognitivo-Comportamental, você conhecerá um pouco mais
sobre como a psicoterapia cognitivo-comportamental acontece na
prática, discutindo seus objetivos e sua estrutura.

No primeiro Tema, você aprenderá sobre o início do processo


terapêutico, a partir da avaliação inicial, e os passos que devem ser
seguidos. Em seguida, no segundo Tema, serão abordadas a estrutura
das sessões subsequentes e a importância da aliança terapêutica para a
psicoterapia cognitivo-comportamental.

Já no terceiro Tema, é o momento de conhecer as principais técnicas


cognitivas e comportamentais que podem ser utilizadas ao longo da
intervenção terapêutica, a fim de identificar e alterar tanto estruturas
cognitivas do paciente, pensamentos automáticos e crenças subjacentes
e nucleares quanto seu repertório comportamental. Por fim, no quarto
Tema, você poderá verificar também sobre o encerramento do processo
psicoterapêutico e as práticas da prevenção de recaída.

Como é possível perceber, nesta disciplina você estudará todas as


etapas do processo terapêutico, buscando uma interlocução entre os
conceitos teóricos e as atividades práticas. O objetivo aqui é ajudar
você a desenvolver o processo terapêutico da melhor maneira possível,
a partir das ferramentas que a TCC proporciona. Para maximizar
a sua prática, ao final de cada Tema, você também estudará casos
clínicos inspirados em demandas reais, possibilitando o exercício das
habilidades aprendidas ao longo da disciplina. Certamente as discussões
presentes aqui contribuirão ainda mais para a sua formação.

Bons estudos!
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Avaliação inicial do paciente e


primeira sessão
Autoria: Gessyka Wanglon Veleda
Leitura crítica: Rogério Adriano Bosso

Objetivos
• Apresentar o processo de avaliação inicial e primeira
sessão na Terapia Cognitivo-Comportamental.

• Oferecer ferramentas úteis para a realização da


avaliação inicial e da primeira sessão.

• Propor uma interlocução entre os achados empíricos


e os aspectos práticos associados à avaliação clínica
inicial e à primeira sessão.
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1. Avaliação inicial: objetivos e estrutura

Para desempenhar uma prática clínica efetiva na Terapia Cognitivo-


Comportamental (TCC), é necessária, além de um conjunto de teorias e
técnicas bem desenvolvidas, a formulação de planos de tratamento que
orientem as intervenções do terapeuta. Nesse sentido, a avaliação inicial
tem papel fundamental para a TCC, visto que, para ser efetiva, requer
que o terapeuta avalie, formule e conceitue o caso de modo adequado e,
assim, planeje a intervenção (BECK, 2013; WRIGHT et al., 2018).

Para compreendermos como conduzir as sessões de avaliação,


inicialmente precisamos identificar os seus objetivos. Em resumo,
a avaliação para o tratamento cognitivo-comportamental inclui
colher informações e identificar possíveis hipóteses diagnósticas,
além de atentar-se aos problemas presentes do paciente que
possivelmente o trouxeram à terapia. Ainda, é necessário investigar
suas relações interpessoais, seus pontos fortes pessoais e sua base
sociocultural, levando em consideração os impactos da história de
seu desenvolvimento, os fatores genéticos e biológicos e os possíveis
diagnósticos médicos (DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT et al., 2018).

A avaliação de um paciente inicia-se normalmente com uma série de


entrevistas, que podem ser complementadas através da aplicação
de instrumentos padronizados de avaliação psicológica. Além das
entrevistas não estruturadas, mais comuns na prática clínica, temos
as entrevistas estruturadas e semiestruturadas já desenvolvidas
(entrevista clínica estruturada para os transtornos do DSM-5, cujo nome
original é Structured Clinical Interview For DSM Disorders – SCID-5, por
exemplo), bem como modelos de anamnese completa. Vale destacar
que a escolha desses instrumentos deve considerar suas adequação e
sustentação empíricas, ou seja, o ajuste desta ao contexto real, além de
suas propriedades psicométricas, como a validade e a fidedignidade da
medida.
8

Na plataforma Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI),


o terapeuta poderá encontrar medidas que estão de acordo com as
adequações psicométricas citadas anteriormente. Contudo, ressalta-se
que esses instrumentos são dirigidos especialmente para a identificação
diagnóstica, que, apesar de importante, é limitada para a avaliação na
TCC, visto que esta requer informações consideráveis que superam
esses aspectos, necessitando de outras ferramentas para o seu processo
de avaliação (ARAÚJO; SHINOHARA, 2002; DOBSON; DOBSON, 2009;
WRIGHT et al., 2018).

Ainda não está disponível nenhum formato padronizado ou entrevista


estruturada específica para a avaliação cognitivo-comportamental.
Contudo, Beck (2013) elenca as áreas e os aspectos essenciais que devem
ser identificados na avaliação inicial, como fica evidente no quadro a seguir:

Quadro 1 – Áreas investigadas na avaliação inicial na TCC


• Dados pessoais.
• Queixas principais e problemas atuais.
• História da doença atual e eventos desencadeantes.
• Estratégias de enfrentamento (adaptativas e desadaptativas), atuais e passadas.
• História psiquiátrica, incluindo tipos de tratamento psicossocial (e opinião sobre a
validade desses tratamentos), hospitalizações, medicação, tentativas de suicídio e
situação atual.
• História de abuso de substância e situação atual.
• História médica e situação atual.
• História psiquiátrica familiar e situação atual.
• História do desenvolvimento.
• História geral familiar e situação atual.
• História social e situação atual.
• História educacional e situação atual.
• História vocacional e situação atual.
• História religiosa/espiritual e situação atual.
• Pontos fortes, valores e estratégias de enfrentamento adaptativas.
• Descrição de um dia típico.

Fonte: Beck (2013, p. 69).


9

Cada uma dessas áreas exige que o terapeuta levante diferentes


informações, as quais, apesar de parecerem pouco úteis em um primeiro
momento, podem ser significativas no decorrer da terapia ou mesmo no
caso de encaminhamento desse paciente (ARAÚJO; SHINOHARA, 2002).
Para potencializar a sessão de avaliação, é possível coletar parte dessas
informações antes do primeiro atendimento. O terapeuta poderá solicitar
ao paciente que envie relatórios relevantes de diferentes profissionais,
incluindo profissionais da saúde (check-up médico, por exemplo) e saúde
mental. Outro recurso que poderá ser utilizado é o preenchimento, com
antecedência, de questionários de autorrelato, como o Inventário de
Depressão de Beck (BDI-II) (BECK, 2013).

Outras fontes de informação que podem ser consideradas são os pais,


cônjuges, parceiros ou professores, possibilitando a coleta de dados a
partir do ponto de vista de outro indivíduo. Porém, para levantar dados
com essas pessoas, é essencial o consentimento do cliente (DOBSON;
DOBSON, 2009; WENZEL, 2018). Beck (2013) recomenda que, antes da
sessão de avaliação, o psicólogo informe ao paciente sobre a possibilidade
da companhia de um familiar, parceiro ou amigo de confiança, com o
objetivo de fornecer outras informações importantes; contudo, não se
trata de uma obrigatoriedade, sobretudo na avaliação de adultos. Em
geral, na sessão de avaliação, é desejável encontrar, no primeiro momento,
apenas o paciente e então decidir em conjunto sobre a necessidade de o
acompanhante ser chamado, próximo ao final da sessão.

Além de entrevistas e instrumentos padronizados, a observação clínica


é uma forte aliada no processo de avaliação inicial. Os psicólogos são
treinados para observar o paciente de forma cuidadosa, o que inclui
as comunicações verbal e não verbal que ocorrem desde o primeiro
contato. Ainda, tanto o conteúdo quanto os aspectos subjacentes
das respostas aos instrumentos também podem fornecer dados
importantes. Vale destacar que o comportamento do paciente
durante a avaliação pode ser entendido como uma “amostra” do seu
comportamento geral e por isso deve ser observado com cuidado.
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Fazer anotações sobre esse comportamento (após sua comunicação


e consentimento) ao longo da sessão, juntamente com fragmentos de
suas frases de maior destaque, auxilia no processo de avaliação inicial
(DOBSON; DOBSON, 2009).

Por fim, outro objetivo da avaliação inicial é a identificação da


elegibilidade do paciente para o tratamento com TCC e as chances
de essa intervenção fornecer resultados satisfatórios a curto e médio
prazos (BECK, 2013). Apesar de não haver contraindicações absolutas
ao uso da TCC, uma análise inicial de diferentes dimensões do sujeito
pode auxiliar o terapeuta a verificar a sua adequação para a terapia,
aumentando as chances de bom prognóstico (WRIGHT et al., 2018).

Wright et al. (2018) indicam sete dimensões que devem ser avaliadas
para a verificação da adequação do paciente à terapia, como fica
evidente no quadro a seguir.

Quadro 2 – Dimensões a serem consideradas ao avaliar


pacientes na TCC
• Cronicidade e complexidade.

• Otimismo em relação às chances de sucesso na terapia.

• Aceitação de responsabilidade pela mudança.

• Compatibilidade com a linha de raciocínio cognitivo-comportamental.

• Capacidade de acessar pensamentos automáticos e identificar as emoções que os


acompanham.

• Capacidade de envolver-se em uma aliança terapêutica.

• Capacidade de manter e trabalhar dentro de um foco orientado para o problema.

Fonte: Wright et al. (2018, p. 47).

As duas primeiras dimensões (“cronicidade e complexidade” e “otimismo


em relação às chances de sucesso na terapia”) são importantes
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indicadores de prognóstico. Problemas complexos e presentes há muito


tempo podem demandar acompanhamentos mais longos, aspecto
que precisa ser avaliado por terapeutas que oferecem programas de
tratamento com durações de 12 a 16 semanas, por exemplo. Ainda,
altos níveis de pessimismo podem reduzir a capacidade de um paciente
responder e se engajar no processo terapêutico, influenciando, assim,
na sua resposta ao tratamento (WRIGHT et al., 2018).

A TCC é um modelo de terapia colaborativa que busca o envolvimento


ativo do paciente e do terapeuta na resolução dos problemas
(ARAÚJO; SHINOHARA, 2002). Desse modo, as dimensões “aceitação
da responsabilidade pela mudança” e “compatibilidade com a linha de
raciocínio cognitivo-comportamental” são essenciais para a continuidade
do tratamento. Para isso, é indicado que ainda na sessão de avaliação o
terapeuta possa começar a familiarizar o paciente com a estrutura e o
processo terapêutico e verificar assim sua aceitação e adequação (BECK,
2013; WRIGHT et al., 2018).

Já a dimensão “capacidade de acessar pensamentos automáticos e


identificar as emoções que os acompanham” indica uma inclinação real
para a TCC, que poderá ter implicações diagnósticas positivas, tendo
em vista as especificidades do modelo. A sexta dimensão (“capacidade
de envolver-se em uma aliança terapêutica) também está intimamente
associada a uma maior adesão ao tratamento e assim a melhores
resultados. Perguntas sobre a história de relacionamentos íntimos e a
observação de comportamentos na sessão podem transferir algumas
informações sobre como será a relação terapêutica. Destaca-se que na
avaliação inicial já é indicado o início do desenvolvimento da aliança
terapêutica com o paciente (ARAÚJO; SHINOHARA, 2002; BECK, 2013;
WRIGHT et al., 2018).

A última dimensão a ser considerada aborda a presença de


comportamentos potencialmente disruptivos como tentativas de
controlar excessivamente os conteúdos durante a entrevista, evitação de
12

materiais emocionalmente carregados ou mesmo um discurso prolixo


e tangencial. Repertórios como esses podem dificultar o andamento
e a evolução do tratamento ao longo do tempo. A baixa capacidade
de trabalhar com base na estruturação da TCC da mesma forma pode
limitar os efeitos da terapia (WRIGHT et al., 2018).

Assim, estando atento a essas dimensões, juntamente com todos os


outros aspectos indicados, o terapeuta poderá definir se tanto ele como
o paciente estão apropriados para o início do acompanhamento. Ainda,
esses fatores podem auxiliar na construção de hipóteses sobre possíveis
fatores potencializadores e desafiadores do tratamento, bem como guiar
o pensamento do terapeuta no desenvolvimento de um plano inicial
(BECK, 2013; WRIGHT et al., 2018).

Após coletar as principais informações e estando próximo ao fim


da sessão, é indicado que o terapeuta explique ao paciente sobre a
necessidade de um tempo para examinar as anotações, os formulários e
os relatórios anteriores. Contudo, é conveniente discutir as impressões
iniciais e as expectativas do tratamento junto com o paciente ainda
na sessão de avaliação, além de questioná-lo se existe alguma outra
informação importante ou mesmo dúvidas que precisem ser discutidas
(BECK, 2013).

Há muitas tarefas a serem cumpridas na sessão de avaliação; entretanto,


é importante destacar que a avaliação inicial não está limitada ao
primeiro encontro, visto que a cada sessão o terapeuta continuará
coletando dados significativos. A avaliação na TCC é um processo
dinâmico e contínuo, que precisará sofrer repetições e aprimoramentos
ao longo do acompanhamento (BECK, 2013 DOBSON; DOBSON, 2009).

1.1 Formulação e conceituação inicial do caso

Após coletar as informações mais relevantes, é necessário que o


terapeuta as analise e sintetize com o objetivo de desenvolver uma
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conceituação inicial do caso. A conceitualização ou formulação de caso


pode ser definida como o processo pelo qual os terapeutas aplicam
a teoria cognitivo-comportamental para entender os fatores que
precipitam, mantêm e exacerbam as apresentações clínicas do paciente.
Na conceitualização, não são levados em conta apenas os aspectos
relativos ao momento presente, mas toda a história de desenvolvimento
do paciente (ARAÚJO; SHINOHARA, 2002; BECK, 2013; WENZEL, 2018).

Para a construção da conceitualização de caso, o terapeuta deverá


considerar todos os achados importantes da sua avaliação. Wright et
al. (2018) propõem um fluxograma que reúne os principais domínios
presentes na avaliação, como indicado a seguir.

Figura 1 – Fluxograma da conceitualização de caso

Fonte: Wright et al. (2018, p. 49).

Por ser construída logo no início da terapia, a conceitualização de caso,


neste momento, pode ser apenas um esboço, o qual será aprimorado ao
longo do acompanhamento. O importante é que esta não seja considerada
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uma verdade absoluta e estática. Inclusive, todas as hipóteses levantadas


devem ser discutidas em conjunto com o paciente, que poderá validá-las
ou não (ARAÚJO; SHINOHARA, 2002; WRIGHT et al., 2018).

Desse modo, semelhantemente a uma bússola, a formulação de caso


orienta o terapeuta para o seu trabalho com o paciente. Apesar de
não ficar em destaque no tratamento, esta será um suporte para toda
intervenção durante o tratamento, guiando o plano de intervenção
(ARAÚJO; SHINOHARA, 2002; WRIGHT et al., 2018). Existem diferentes
perspectivas que auxiliam na estruturação da formulação de caso,
contudo a abordagem beckiana tradicional ainda é a mais utilizada.
De qualquer forma, todos os diferentes enfoques partem do modelo
cognitivo, no qual as emoções, os comportamentos e as reações
fisiológicas dos sujeitos são influenciados pelas percepções dos eventos
e das situações (BECK, 2013; WENZEL, 2018).

2. Primeira sessão: objetivos e estrutura

Ao finalizar a sessão de avaliação, muitos estudantes e profissionais se


perguntam “o que fazer agora?”. Assim, para auxiliar nesse processo, são
elencados a seguir passos importantes para realizar a primeira sessão,
após a avaliação inicial, de maneira efetiva (DOBSON; DOBSON, 2009).

Após a construção da conceituação e do plano de tratamento inicial, o


terapeuta já poderá conduzir a primeira sessão. Nesse momento, será
importante que o profissional comunique ao paciente suas hipóteses
para que assim possam juntos estabelecer as metas da terapia.
Apesar de parecer uma tarefa simples, esse processo é parte crucial e
está intimamente ligado ao envolvimento e ao comprometimento do
paciente a longo prazo, bem como à postura de trabalhar para atingir
esses objetivos (DOBSON; DOBSON, 2009).
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Wright et al. (2018) defendem que o desenvolvimento de metas de


tratamento é uma das primeiras intervenções do tratamento, além de
ser uma grande oportunidade de ensinar ao paciente a importância
do estabelecimento de alvos objetivos e mensuráveis para a mudança.
No quadro a seguir, são elencados alguns tópicos importantes a serem
levados em conta no planejamento e na psicoeducação das metas com o
paciente:

Quadro 3 – Dicas para estabelecer metas na TCC


• Instrua o paciente sobre as técnicas de estabelecimento de metas.

• Tente evitar metas muito generalizadas e abrangentes que possam ser difíceis de
definir ou atingir. Por parecerem pesadas e inatingíveis, a formulação de metas desse
tipo pode fazer com que o paciente se sinta pior, pelo menos temporariamente.

• Seja específico.

• Oriente o paciente a escolher metas que tenham a ver com preocupações ou


problemas significativos.

• Escolha metas de curto prazo que você acredite terem probabilidade de serem
alcançadas no futuro próximo.

• Desenvolva algumas metas de longo prazo que exijam trabalho mais extensivo na
TCC.

• Tente usar termos que tornem as metas mensuráveis, ajudando-o a medir o


progresso.

Fonte: Wright et al. (2018, p. 61).

Ao longo de todo o processo de tratamento, essas metas devem ser


revistas e revisadas. É possível que os problemas destacados no início do
tratamento não façam sentido ao longo do tempo, ou mesmo que novas
metas surjam devido à progressão da terapia, sendo necessários ajustes
no método de tratamento. É importante estabelecer maneiras de avaliar
os resultados e o cumprimento dessas metas, possibilitando que o
paciente identifique as evoluções no tratamento. Vale registrar as metas
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por escrito, em sessão, ou ainda solicitar que o paciente as aprimore em


casa (BECK, 2013 DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT et al., 2018).

A concordância explícita entre paciente e terapeuta sobre as metas


pode levar a uma melhora já no início do processo. Em concomitância,
o terapeuta pode estabelecer também um contrato formal ou informal
com o paciente. Contratos formalizados são impressos ou digitais e
solicitam assinatura de todos os atores envolvidos no processo. Em boa
parte dos ambientes clínicos, os contratos informais são mais comuns;
todavia, vale ressaltar que os contratos formais ampliam a adesão e a
motivação do paciente, além de evitar que o próprio terapeuta se desvie
dos propósitos da dupla (DOBSON; DOBSON, 2009).

Além da discussão com o paciente sobre a conceitualização, a


definição de metas e o contrato de tratamento, a primeira sessão tem
como propósito o estabelecimento de confiança com o paciente, a
familiarização deste com o modelo cognitivo e o processo de terapia,
além de ser o início da resolução de problemas importantes. Apesar de
ter início na primeira sessão, esses tópicos serão trabalhos também ao
longo das sessões posteriores. Em síntese, desenvolver uma relação
terapêutica efetiva e estimular o paciente a aliar-se para atingir os
objetivos da terapia são tarefas fundamentais da sessão inicial, as quais
aumentam as chances de o paciente retornar para as próximas sessões
(BECK, 2013; DOBSON; DOBSON, 2009).

Referências
ARAÚJO, C. F.; SHINOHARA, H. Avaliação e diagnóstico em terapia cognitivo-
comportamental. Interação em psicologia, [s.l.], v. 6, n. 1, 2002.
BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. 2. ed. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2013. 348p.
DOBSON, D.; DOBSON, K. S. A terapia cognitivo-comportamental baseada em
evidências. Por Alegre: Artmed, 2009.
17

KNAPP, P.; BECK, A. T. Fundamentos, modelos conceituais, aplicações e pesquisa da


terapia cognitiva. Brazilian Journal of Psychiatry, [on-line], v. 30, suppl., p. s54-s64,
2008.
WENZEL, A. Inovações em terapia cognitivo-comportamental: intervenções
estratégicas para uma prática criativa. Porto Alegre: Artes Médicas, 2018.
WRIGHT, J. H. et al. Aprendendo a Terapia Cognitivo-Comportamental: Um Guia
Ilustrado. Porto Alegre: Artmed, 2018.
18

Sessões subsequentes em TCC e


aliança terapêutica
Autoria: Gessyka Wanglon Veleda
Leitura crítica: Rogério Adriano Bosso

Objetivos
• Apresentar os objetivos e a estruturação das
sessões subsequentes na Terapia Cognitivo-
Comportamental.

• Oferecer ferramentas úteis para a realização das


sessões subsequentes, elencando potencialidades e
desafios.

• Discutir a função e a relevância da aliança


terapêutica no tratamento baseado na Terapia
Cognitivo-Comportamental.
19

1. Sessões subsequentes: estruturação e


objetivos

Após o processo de avaliação inicial e primeiro atendimento na Terapia


Cognitivo-Comportamental (TCC), a segunda sessão e todas as sessões
subsequentes seguem um formato aproximado. Isso porque as sessões em
TCC são planejadas a partir de uma estruturação com diferentes elementos
que maximizam a resolução das metas e dos objetivos estabelecidos pelo
paciente e pelo terapeuta na primeira sessão. Seguir o formato estruturado
de sessão permite uma maior colaboração entre paciente e terapeuta,
potencializa a eficácia e eficiência do tratamento e auxilia na compreensão
do processo da terapia por parte do paciente (BECK, 2013; KNAPP, 2009).

Mesmo para pacientes com diferentes diagnósticos ou estágios do


tratamento, alguns componentes da sessão são mantidos; entretanto,
momentos iniciais da terapia acabam necessitando de maior estrutura.
É nessa etapa que os sintomas tendem a se apresentar de maneira
mais intensa e a habilidade de enfrentar problemas pode ser diminuída,
sendo a estruturação das sessões uma aliada. Ao passo que pacientes
vão progredindo e assumindo uma maior responsabilidade pelo controle
do processo terapêutico, a estruturação da sessão pode sofrer maiores
flexibilizações (BECK, 2013; WRIGHT et al., 2018).

De modo geral, o roteiro usual da segunda sessão e das posteriores em


TCC inclui os seguintes passos:

Quadro 1 – Roteiro de estrutura de sessão


Parte Inicial da Sessão
1. Fazer uma verificação do humor.
2. Definir a pauta.
3. Obter uma atualização.
4. Revisar o exercício de casa.
5. Priorizar a pauta.
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Parte Intermediária da Sessão


6. Trabalhar em um problema específico e ensinar habilidades da
Terapia Cognitivo-Comportamental naquele contexto.
7. Discutir o seguimento com a prescrição colaborativa de exercícios de casa relevantes.
8. Trabalhar em um segundo problema.
Parte Final da Sessão
9. Apresentar ou solicitar um resumo.
10. Revisar as novas prescrições de exercícios de casa.
11. Solicitar feedback.

Fonte: adaptado de Beck (2013, p. 120-121).

1.1 Parte inicial da sessão: elementos e estrutura

Na primeira parte da sessão, o terapeuta deverá revisar o humor do


paciente, podendo utilizar avaliações objetivas preenchidas antes
do início da sessão. O Inventário de Depressão de Beck-II é uma das
possibilidades quando é necessário mensurar sintomas depressivos, por
exemplo.

A verificação de humor também pode ser registrada de modo mais


breve, por meio de escala de pontos. Para isso, o terapeuta questiona
o paciente sobre como ele se sente, atribuindo uma nota de zero a
dez, em que zero equivale a nenhuma depressão ou ansiedade e 10 a
muita depressão e ansiedade. São igualmente úteis perguntas abertas
como: “Como você está se sentindo esta semana em relação a semana
passada?”. A verificação do humor, além de ser uma oportunidade para
o terapeuta demonstrar interesse pela semana do paciente, traz uma
avaliação importante do progresso do tratamento (BECK, 2013; KNAPP,
2009; WRIGHT et al., 2018).

Em seguida, paciente e terapeuta, em conjunto, deverão definir uma


pauta inicial ou agenda da terapia. O objetivo maior dessa estrutura é o
estabelecimento de uma hierarquia nos assuntos que serão discutidos
21

na sessão, focando nos problemas a serem trabalhados e em suas


possíveis soluções. Uma agenda de atividades da sessão pode auxiliar
no maior rendimento de tempo de cada encontro (KNAPP, 2009; RANGÉ,
2001).

Ressalta-se que, para maior aproveitamento, é indicado que os tópicos


das pautas a serem trabalhadas na sessão voltem-se diretamente para
as metas gerais da terapia, estabelecidas no primeiro atendimento.
Ainda, as metas precisam ser específicas, mensuráveis e atingíveis. Caso
o paciente ainda não consiga estabelecer essas pautas, o terapeuta pode
tomar a frente na modelagem da agenda (WRIGHT et al., 2018).

Para a potencialização dos efeitos da TCC, as sessões devem estar


associadas, trazendo a percepção de continuidade do trabalho. Assim, é
indicado que o terapeuta estabeleça uma “ponte” com a sessão anterior,
fazendo comentários e perguntas sobres os aspectos mais importantes
trabalhados no último encontro. Ainda, nesse momento, o terapeuta
deve realizar uma rápida atualização da semana do paciente, ficando
atento a questões que podem ser importantes ao longo da sessão.

Outro aspecto a ser verificado trata-se da realização da tarefa de casa. É


importante que esta seja revisada e discutida junto com o paciente, a fim
de extrair da tarefa todo o aprendizado possível. Destaca-se que ignorar
essa etapa influenciará no engajamento do paciente em tarefas futuras
(DOBSON; DOBSON, 2009; KNAPP, 2009).

Após o seguimento de todas as etapas anteriores, é o momento de


resumir os tópicos que serão abordados em sessão, já que, após
coletar dados sobre a semana e verificar a realização de tarefa de casa,
é provável que outros pontos tenham sido acrescentados à agenda.
Colaborativamente, a dupla terapêutica define os tópicos de fato
essenciais para serem trabalhados naquela sessão e os que podem ser
trabalhados em sessões futuras. Igualmente deve ser definido o tempo
médio para cada tópico escolhido (BECK, 2013).
22

1.2 Parte intermediária da sessão: elementos e


estrutura

Na parte intermediária da sessão, com a pauta já construída, é indicado


perguntar ao paciente por quais problemas ou tópicos ele deseja
começar. Esse processo auxilia no desenvolvimento de uma postura
ativa do paciente e no reconhecimento de suas responsabilidades no
acompanhamento terapêutico.

Nessa etapa, o objetivo é trabalhar a situação-problema através


das ferramentas cognitivas e comportamentais, além de reduzir o
sofrimento imediato do paciente, caso necessário. Um dos objetivos
de todas as intervenções utilizadas em TCC é ajudar o paciente a
desenvolver habilidades mais adaptativas que poderão ser utilizados
na resolução de problemas presentes e futuros (BECK, 2013; DOBSON;
DOBSON, 2009).

A partir dos pontos trabalhados na sessão, o terapeuta deverá solicitar


uma tarefa ou exercício de casa que possibilite a continuidade do
aprendizado. Este é um dos componentes essenciais para a prática
clínica em TCC que permite a generalização de mudanças e a resolução
de problemas reais para além do contexto de terapia. Além disso, as
tarefas de casa são elementos-chave no processo de estruturação da
terapia, sendo um item comum da agenda de cada sessão e um elo
entre as sessões.

Para que a tarefa de casa seja bem-sucedida, é imprescindível que a


decisão final sobre a atividade seja colaborativa, específica e clara. Ela
precisa estar relacionada com as metas gerais do tratamento, devendo
o paciente dispor de recursos e habilidades para realizá-la. Entre os
diferentes tipos de tarefas, podemos incluir desde a leitura de materiais
psicoeducativos e a orientação de experimentos comportamentais até
práticas de habilidades apreendidas em sessão (DOBSON; DOBSON,
2009; RANGÉ, 2001; WRIGHT et al., 2018).
23

Em seguida, se ainda houver tempo disponível na sessão, é indicado


trabalhar em um segundo problema a partir de técnicas cognitivas e
comportamentais específicas, as quais serão abordadas com maior
aprofundamento na próxima seção. Para maximizar a compreensão dos
problemas, é indicado fazer um resumo dos conteúdos trazidos ao longo
da sessão de forma clara e concisa e apresentá-lo ao paciente, inclusive
usando suas próprias palavras, a fim de possibilitar uma compreensão
mais adequada para ambos, além de manter o foco no problema
principal (BECK, 2013).

1.3 Parte final da sessão: elementos e estrutura

Com o propósito de compreender o que foi descoberto juntamente com


o fortalecimento da memória desses novos aprendizados, no período
final da sessão é solicitado que o paciente faça um resumo dos tópicos
mais importantes. É possível que nas sessões iniciais o próprio terapeuta
faça um resumo e ao longo do acompanhamento, conforme progressão,
o paciente aponte os principais aprendizados da sessão (BECK, 2013;
KNAPP, 2009).

Por fim, o terapeuta solicita ao paciente um feedback da sessão,


questionando como ele se sentiu, se algum dos assuntos foi
desconfortável ou mesmo se algo importante não foi trabalhado.
O objetivo dessa etapa é manter a estruturação da sessão,
investir na aliança terapêutica e estimular e corrigir distorções no
processamento de informações. Contudo, deve ficar claro para
o terapeuta que, ao dar feedback, é importante que este seja
verdadeiro e não ultrapasse limites com afirmações extremamente
positivas ou críticas. É indicado o uso de comentários construtivos
que reconheçam pontos fortes do paciente e seus ganhos ao longo
d tempo, sugerindo também maiores oportunidades de mudança
(RANGÉ, 2001; WRIGHT et al., 2018).
24

Apesar de estarem estruturados próximo ao término da sessão, os


feedbacks podem ser recebidos e dados a qualquer momento. Ainda,
devem ser solicitados ao paciente feedbacks do processo geral de
tratamento e do progresso terapêutico. Caso seja necessário que ele
trabalhe a habilidade de dar e receber feedbacks para além da terapia,
esses momentos, em sessão, poderão ser úteis para o aprendizado a
partir da modelação (aprendizado pela observação) de formas eficazes
de processar feedbacks (KNAPP, 2009; WRIGHT et al., 2018).

Ainda que a estruturação da sessão seja uma importante aliada na


prática clínica cognitivo-comportamental, é comum que terapeutas
mais novos tenham dificuldades para compassar a sessão, inclusive
superestimando a quantidade de trabalho que é possível ser realizada.
Alguns sinais que denotam problemas em relação ao compasso da
terapia e merecem mais atenção são: sessões imprecisas sem foco
específico, poucos itens da agenda abordados, dificuldades em tomar
decisões com o paciente sobre o direcionamento da sessão, nenhuma
sensação de movimento ou progresso ao término dos encontros e
pouco aprofundamento de um tópico importante (DOBSON; DOBSON,
2009; WRIGHT et al., 2018).

Identificando problemas na condução da terapia, é recomendado que


os terapeutas desenvolvam habilidades de aproveitamento do tempo
e de elaboração de perguntas mais precisas que facilitem o manejo
das transições entre as diferentes etapas da sessão. Em conjunto com
a supervisão clínica, outra sugestão que pode melhor a percepção de
tempo e manejo da sessão é usar a regra 10-30-10, que indica que
devem ser dispendidos 10 minutos com a parte inicial da sessão, 30
minutos com a etapa intermediária e 10 minutos com o momento
final, totalizando os 50 minutos de sessão tradicional. Desse modo,
próximo aos 40 minutos de sessão, o terapeuta já deverá estar atento
para encaminhar a etapa de finalização (DOBSON; DOBSON, 2009;
WRIGHT et al., 2018).
25

Finalmente, vale destacar que a estruturação e mesmo a construção


da agenda para a sessão não são um processo extremamente fixo ou
imutável que precisa ser seguido dogmaticamente. Questões mais
urgentes, como término de relacionamento, perda de emprego ou
mesmo o adoecimento de um familiar, serão destaques em uma sessão
mesmo que não estejam na lista de problemas inicial. Assim, ao utilizar
esses instrumentos de forma flexível, o terapeuta permitirá maior
espontaneidade e aprendizagem criativa do paciente, garantindo maior
eficácia e efetividade ao tratamento (KNAPP, 2009; WRIGHT et al., 2018).

2. Psicoeducação

Juntamente com todas as etapas descritas anteriormente, a


psicoeducação em TCC também agrega estrutura à terapia e está
presente em diferentes momentos do tratamento. Em definição, a
psicoeducação é o ensino de princípios e conhecimentos psicológicos
que sejam pertinentes ao paciente. Pode ser empregada com
diferentes objetivos, que vão desde informar o paciente sobre o
modelo cognitivo, apontando as conexões existentes entre situações,
pensamentos e emoções, e apresentar a estrutura das sessões
até mesmo informar sobre um possível diagnóstico (RANGÉ, 2001;
WRIGHT et al., 2018).

Existem diferentes materiais que podem ajudar no processo de


psicoeducação, como livros, cartilhas, filmes e recursos da internet
(vídeos em diferentes plataformas, por exemplo). Wright et al.
(2018) indicam o uso do caderno de terapia, no qual ficam descritos
e compilados vários materiais associados às sessões, como os
exercícios realizadas, as tarefas de casa e as anotações sobre
insights importantes. Esse instrumento possibilita ao paciente maior
aprendizagem, realização da tarefa de casa e fortalecimento dos
conceitos discutidos na sessão.
26

Além disso, o terapeuta poderá oferecer miniaulas durante a sessão


para ajudar o paciente a compreender diferentes conceitos. É necessário
que essas breves explicações não sigam um estilo palestra, mas sim
um modelo interativo, claro e amigável, inclusive levando em conta
exemplos da vida do paciente (DOBSON; DOBSON, 2009). A Figura 1
ilustra um modelo de cinco partes que pode ser utilizado em sessão,
auxiliando na psicoeducação sobre o modelo cognitivo.

Figura 1 – Modelo de cinco partes para a compreensão do modelo


cognitivo

Fonte: Greenberger e Padesky (2016, p. 7).

É importante que o terapeuta antes fique atento também a algumas


características do paciente que são determinantes para a escolha. Em
primeiro lugar, é necessário considerar a escolarização e a linguagem
do paciente, a fim de optar por um material que corresponda a esses
aspectos. Ainda devem ser priorizados os interesses, as habilidades e os
recursos disponíveis para ele que facilitem o acesso ao material. Por fim,
o terapeuta precisa garantir a qualidade dos materiais, examinando-os
com antecedência (DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT et al., 2018).
27

A psicoeducação traz inúmeros benefícios ao tratamento, visto que


o conhecimento sobre os problemas e seus precursores e gatilhos
leva a uma maior sensação de controle sobre eles, potencializando
as mudanças cognitivas. Além do mais, identificar que outras pessoas
escreveram, pesquisaram e discutiram sobre o seu problema traz
ao paciente uma sensação de alívio, identificação e apoio (DOBSON;
DOBSON, 2009).

3. Empirismo colaborativo e aliança


terapêutica

Na TCC, terapeuta e paciente formam uma equipe de trabalho em que


ambos têm um papel ativo e diretivo na detecção de estratégias que
podem ser utilizadas para enfrentar os problemas do paciente. Esse
estilo terapêutico colaborativo é denominado “empirismo colaborativo”
e tem um papel fundamental para a efetividade da terapia. Em conjunto,
a dupla terapêutica identifica pensamentos e comportamentos
disfuncionais, verifica empiricamente sua validade ou utilidade e planeja
estratégias de enfrentamento para dificuldades futuras. Contudo, para
que essa equipe trabalhe de modo afinado, é necessária a construção de
uma aliança terapêutica sólida desde o primeiro contato (KNAPP, 2009;
RANGÉ, 2001; WRIGHT et al., 2018).

Inúmeros fatores influenciam na construção de uma relação terapêutica


positiva, como confiança, empatia, autenticidade, respeito pelo
paciente, entre outras dimensões não específicas. Um dos enganos
comuns sobre a TCC é pensar que os terapeutas dessa abordagem são
secos e técnicos e não dão importância às emoções. Pelo contrário, os
terapeutas cognitivo-comportamentais reconhecem que, ao longo do
acompanhamento, empatia e afeto são fundamentais e precisam de
investimento (DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT et al., 2018).
28

Em contrapartida, é importante que o terapeuta fique atento e regule


adequadamente o quanto e quando essas expressões de empatia e afeto
são necessárias. Por exemplo, balançar a cabeça de modo afirmativo
enquanto o paciente relata cognições negativamente distorcidas poderá
validá-las, favorecendo que o paciente acredite que o terapeuta concorda
com essas afirmações. Por outro lado, ignorar uma demonstração
significativa de sofrimento igualmente poderá distanciar o paciente.
Portanto, manter a postura autêntica aliada à constante busca de
estratégias que reduzam o sofrimento do paciente são estratégias indicadas
para estabelecer empatia e afeto e construir uma relação terapêutica
significativa (DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT et al., 2018).

Outro fator importante a ser considerado no desenvolvimento da


aliança terapêutica é a demonstração adequada de boas habilidades
terapêuticas e compreensão acurada por parte do terapeuta. Ao
buscar um profissional, o paciente deseja receber um apoio efetivo e,
à medida que o terapeuta indica suas especialidades, poderá sentir-se
mais seguro com o acompanhamento a seguir. Entretanto, apesar do
conhecimento especializado, somente o paciente é o especialista em sua
própria história, funcionamento e problemas atuais, o que deve sempre
ser respeitado pelo terapeuta (BECK, 2013; DOBSON; DOBSON, 2009;
KNAPP, 2009).

No que diz respeito ao paciente, algumas características também podem


influenciar substancialmente na aliança terapêutica. Pacientes com
transtorno bipolar em episódios maníacos, por exemplo, podem ser
intrusivos e irritantes ou mesmo sedutores. Da mesma forma, traços
de personalidade também podem interferir na relação terapêutica,
a exemplo de pacientes com traços esquizoides, que podem ser
defensivos, dificultando na relação de confiança necessária para o
processo terapêutico (BECK, 2013; WRIGHT et al., 2018).

Para lidar com esses desafios, é necessário que o terapeuta fique


atento a possíveis problemas e possa adaptar seu comportamento
29

a esses casos mais complexos. É indicado que o profissional não


rotule o paciente, utilizando termos que podem ser entendidos como
pejorativos (como maníaco e alcoolista). Manter a serenidade e a
objetividade, mesmo em situações desafiadoras ou emocionalmente
carregadas, também é uma habilidade valiosa para lidar com pacientes
demandantes em relação à aliança terapêutica (WRIGHT et al., 2018).

Diferentes pesquisas apontam que alianças positivas estão fortemente


associadas ao resultado positivo do tratamento, tornando-se assim um
dos pilares fundamentais para a TCC. Desse modo, da mesma maneira
que a estruturação das sessões, a psicoeducação e outras ferramentas
recebem destaque na intervenção cognitivo-comportamental, o
empirismo colaborativo e a aliança terapêutica devem ser priorizados
(BECK, 2013; WRIGHT et al., 2018).

Referências
BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. 2. ed. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2013. 348p.
DOBSON, D.; DOBSON, K. S. A terapia cognitivo-comportamental baseada em
evidências. Porto Alegre: Artmed, 2009.
GREENBERGER, D.; PADESKY, C. A. A mente vencendo o humor: mude como você
se sente, mudando o modo como você pensa. Porto Alegre: Artmed, 2016.
KNAPP, P. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto
Alegre: Artmed, 2009.
RANGÉ, B. Psicoterapias cognitivo-comportamentais: um diálogo com a psiquiatria.
In: RANGÉ, B. Psicoterapias cognitivo-comportamentais: um diálogo com a
psiquiatria. Porto Alegre: Artmed, 2001. p. 567-567.
WRIGHT, J. H. et al. Aprendendo a Terapia Cognitivo-Comportamental: Um Guia
Ilustrado. Porto Alegre: Artmed, 2018.
30

Técnicas Cognitivas e Técnicas


Comportamentais
Autoria: Gessyka Wanglon Veleda
Leitura crítica: Rogério Adriano Bosso

Objetivos
• Apresentar as principais técnicas cognitivas e
comportamentais utilizadas no contexto clínico.

• Desenvolver habilidades para a aplicação de técnicas


cognitivas e comportamentais no contexto clínico.

• Discutir a importância e a finalidade das técnicas


cognitivas e comportamentais.
31

1. Técnicas cognitivas

A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) se baseia na ideia de que


estados de sofrimento, como a depressão e a ansiedade, são mantidos
ou acentuados por pensamentos exagerados ou tendenciosos. Sendo
assim, é papel do terapeuta auxiliar o paciente a identificar e examinar
estilos disfuncionais de pensamentos para poder modificá-los a partir de
dados lógicos e empíricos (LEAHY, 2018).

Para isso, a TCC se utiliza de diferentes métodos terapêuticos, como a


avaliação inicial, a estruturação das sessões e as técnicas cognitivas e
comportamentais. Apesar de ser reconhecida pelo grande arcabouço de
intervenções disponíveis, a prática da TCC não se concentra apenas na
aplicação de um punhado de técnicas cognitivas e comportamentais. Seu
diferencial está na ênfase que o terapeuta dá ao papel dos pensamentos
na causa e na manutenção do sofrimento, sendo as técnicas um dos
meios de acessar e alterar essas relações (KNAPP, 2009).

Ainda, apesar de o modelo cognitivo trazer contribuições relevantes para


esse arcabouço de intervenções, técnicas e outras orientações utilizadas
dentro de uma estrutura cognitiva são igualmente implementadas.
Intervenções inspiradas na Gestalt, em mindfulness e na ativação
comportamental são exemplos de procedimentos emprestados de
outras escolas terapêuticas, adaptadas para a mudança cognitiva (BECK,
2013; KNAPP, 2009; LEAHY, 2018).

Ao longo deste Tema, serão discutidas técnicas cognitivas e


comportamentais separadamente. Contudo, vale ressaltar que se trata
de uma divisão com propósito didático, já que tanto técnicas cognitivas
como comportamentais geram efeitos nessas duas estruturas (KNAPP,
2009). Para auxiliar na compreensão, um caso será descrito e utilizado
ao longo do texto, a fim de demonstrar a aplicabilidade das técnicas ao
contexto clínico:
32

Vicente, 33 anos, procura a terapia devido a sintomas depressivos e


ansiosos que se intensificaram após sua demissão da instituição em
que trabalhava há 8 anos. É enfermeiro e atuava em um hospital
privado como chefe de setor; contudo, devido a cortes de gastos, ele
e mais alguns colegas foram demitidos. Jeane, sua companheira,
trabalha como assistente social em uma instituição pública, mas o
casal tem dois filhos, o que preocupa a família em relação às despesas
mensais. Desde sua demissão, há 7 meses, Vicente tem ficado muito
preocupado com o futuro da família e se percebe triste, sem motivação
e sem perspectivas de encontrar outro emprego. Comenta que verifica
as vagas em aberto e no mês anterior se candidatou a um cargo
em uma clínica privada, mas não foi chamado. Desde então não se
candidata para outras vagas e tem passado os dias realizando tarefas
domésticas, cuidando dos filhos e assistindo a conteúdos na internet.

1.1 Técnicas cognitivas – Pensamentos automáticos

As técnicas voltadas para identificar, examinar e modificar os


pensamentos automáticos desadaptativos são centrais nas intervenções
cognitivo- comportamentais. Especialmente nos estágios iniciais,
os terapeutas auxiliam os pacientes a compreender o conceito de
pensamentos automáticos e avaliar sua precisão, identificando possíveis
distorções cognitivas (WENZEL, 2018).

Os terapeutas costumam acessar pensamentos automáticos ao longo


da sessão a partir de perguntas diretas sobre esses pensamentos,
principalmente quando o paciente descreve acontecimentos com alto
grau de emoção. Assim, nesse momento é indicado que, de forma
objetiva, o terapeuta questione o paciente sobre o que está pensando.
Essa abordagem direta é uma das técnicas possíveis para acessar esses
pensamentos, como fica evidente no caso de Vicente descrito a seguir
(KNAPP, 2009; DOBSON; DOBSON, 2009)
33

Na primeira sessão, quando Vicente comenta com o terapeuta sobre


a dificuldade em se candidatar para novas vagas, começa a ficar
com a voz trêmula e olhos marejados. Nesse momento, o terapeuta
comenta: “notei que você se emocionou ao falar sobre a dificuldade
em se candidatar para vagas de emprego. O que está passando pela
sua cabeça neste momento?”. Vicente responde: “Fico pensando que
nunca conseguirei um emprego, pois já fui demitido e agora não fui
selecionado em outra vaga.”.

Assim, a partir da intensificação do humor do paciente, o terapeuta


consegue identificar seus pensamentos automáticos e, com isso, pode
promover sua psicoeducação. Na fala de Vicente “nunca conseguirei
um emprego, pois já fui demitido e agora não fui selecionado em outra
vaga”, este é o pensamento automático associado à busca de vagas. O
Quadro 1 traz outras perguntas que podem ser feitas para identificar
esses pensamentos.

Quadro 1 – Perguntas objetivas para acessar pensamentos


automáticos
• O que estava passando na sua cabeça instantes antes de você começar a se sentir
assim?

• Que imagens ou lembranças você tem em relação a essa situação?

• Neste momento, você acha que pode ter pensado algo como (exemplificar com
pensamentos plausíveis, ex.: “já que ele não me cumprimentou, deve estar chateado
comigo”)?

• Se o (exemplifica com uma pessoa próxima ao paciente) estivesse nessa situação, o


que você acredita que ele pensaria?

Fonte: adaptado de Greenberger e Padesky (2016); Knapp (2009).

Após a identificação e o reconhecimento dos pensamentos automáticos,


os terapeutas podem utilizar o questionamento socrático para ajudar o
paciente a avaliar e identificar sua real precisão. Nessa técnica, inspirada
na linha de investigação do filósofo grego Sócrates, o objetivo é realizar
34

um série de perguntas gradativas que levem o paciente a avaliar


racionalmente seus problemas e as soluções a partir de uma perspectiva
mais distante. Vale destacar que a premissa dessa técnica não está
associada ao convencimento do paciente através de argumentos, mas a
sua autoexploração inquisitiva (WENZEL, 2018; KNAPP, 2009). O Quadro
2 traz exemplos de perguntas socráticas:

Quadro 2 – Perguntas socráticas para exame de pensamentos


automáticos
• Que evidência apoia esse pensamento automático? Essa evidência é factual? Que
evidência é incompatível com esse pensamento automático?

• Quais são as outras explicações para essa situação?

• Qual é o resultado da pior hipótese? Qual é o resultado da melhor hipótese? Qual é o


resultado mais realista?

Fonte: Wenzel (2018, p. 58).

Dando continuidade ao caso de Vicente, após identificar os pensamentos


disfuncionais, o terapeuta poderá questionar sua validade através de
perguntas similares, como fica evidente a seguir:

Em sessão, após identificar os seguintes pensamentos automáticos:


“nunca conseguirei um emprego, pois já fui demitido e agora não fui
selecionado em outra vaga”, o terapeuta comenta:

Terapeuta: Sobre o pensamento “nunca conseguirei um emprego”,


como você se sente logo após essa ideias aparecerem?

Vicente: Fico triste e preocupado, até mesmo sem esperança.

Terapeuta: E quais são as evidências que apoiam essa ideia?

Vicente: Eu fui demitido e não passei no primeiro processo que


tentei. Isso mostra que realmente não conseguirei e que não devo me
candidatar para novas vagas.
35

Terapeuta: Além desses pontos, quais outros fatores você acredita que
podem estar associados a conquistar um novo emprego?

Vicente: Boa qualificação, disponibilidade e experiência na atividade.

Terapeuta: Você acredita que tem alguma das características que citou?

Vicente: Eu posso considerar que tenho uma boa formação, já que


continuei me especializando após a graduação. Também tenho
disponibilidade, apesar de não estar me sentindo motivado. Além disso,
fiquei oito anos no hospital como chefe de setor e sei fazer algumas
coisas.

Terapeuta: Então, podemos considerar que suas chances de conseguir


um novo emprego não são nulas, tendo em vista que você apresenta
boa parte dos requisitos necessários para ser contratado?

Vicente: Pensando assim, acho que que pode fazer sentindo.

Após identificar e examinar o pensamento automático, é o momento de


propor uma resposta adaptativa que substitua o pensamento original,
corrigindo os erros nesse pensamento, o que irá resultar em menos
dificuldades emocionais (WENZEL, 2018). Em sessão, essa proposta pode
ser aplicada da seguinte maneira:

Terapeuta: Agora que verificamos que suas chances de conseguir um


novo emprego não são nulas, podemos encontrar um pensamento
alternativo à ideia de nunca mais conseguir um novo emprego?

Vicente: Sim, talvez o pensamento mais razoável seja: “eu tenho


requisitos necessários para conseguir um emprego, apesar de ainda
não ter conseguido”.

Terapeuta: E como você se sente após identificar esse novo


pensamento?
36

Vicente: Eu me sinto um pouco mais animado e com esperança, apesar


de ainda estar preocupado.

O processo de identificação dos pensamentos automáticos disfuncionais


e de proposta de novas alternativas é denominado de restruturação
cognitiva e ocorre dentro e fora da sessão. Comumente, os terapeutas
solicitam como tarefa de casa o uso do registro de pensamentos
automáticos, o que possibilita realizar esse processo à medida que os
pensamentos surgem ao longo dos dias (BECK, 2013; WENZEL, 2018).
A seguir trazemos o registro de Vicente com base nos pensamentos
relatados.

Quadro 3 – Registro de Pensamento de Vicente


Data/ Pensamento Reposta
Situação Emoções Resultado
Hora automático adaptativa
15 horas. Verificar “Nunca Tristeza, “Eu tenho os Diminui a
novas vagas conseguirei ansiedade, requisitos intensidade
de emprego. um emprego, desesperança. necessários da tristeza.
pois já fui para conseguir
demitido e um emprego, Maior
agora não fui apesar de esperança.
selecionado”. ainda não ter
conseguido”.

Fonte: adaptado de Beck (2013).

1.2 Técnicas cognitivas – Crenças subjacentes e


nucleares

Além dos pensamentos automáticos, outras estruturas mais profundas


que os pacientes têm de si mesmos, dos outros e do mundo estão
associadas ao sofrimento psicológico e suscitam esses pensamentos.
Entre essas estruturas, estão as crenças subjacentes e as crenças
nucleares.

A crenças subjacentes são definidas como regras e pressupostos rígidos,


relacionados a afirmações como “deveria”, “tenho que” e “se... então”.
37

Essas crenças não costumam ser problemáticas em períodos estáveis;


contudo, mudanças significativas, como término de relacionamentos
e perda de emprego, tendem a ativá-las, resultando em sofrimento ao
paciente (BECK, 2013; LEAHY, 2018).

Uma das maneiras mais conhecidas de identificar crenças subjacentes é


a partir da técnica da seta descendente, que visa questionar o paciente
sobre os significados associados aos pensamentos automáticos até
chegar ao seu significado principal (WENZEL, 2018). A seguir a técnica da
seta descendente é aplicada na demanda de Vicente.

Vicente: Apesar de identificar uma alternativa em relação as minhas


chances de conseguir um novo emprego, ainda me sinto incomodado
com o fato de não estar empregado.

Terapeuta: Certo, entendi. Eu gostaria de compreender mais sobre seus


pensamentos. Por favor, tente completar a seguinte frase: “Não estar
trabalhando no momento me incomoda porque...

Vicente: Porque parece que sou um inútil e fracassado na minha


profissão.

Terapeuta: E parecer que é um fracassado e inútil significaria que...

Vicente: Eu realmente sou um fracassado.

A partir da intervenção anterior, o terapeuta pode identificar crenças


subjacentes como: “se eu não estou trabalhando, então sou um fracasso
na minha profissão” e “se sou um fracasso na minha profissão, então
sou um fracassado.”.

Vale destacar que a técnica da seta descendente também auxilia na


identificação de crenças nucleares, que são ideias e conceitos que se
encontram no nível cognitivo mais profundo e dizem respeito sobre
si mesmo, os outros ou o mundo. Ainda, são do tipo “tudo ou nada”
38

e originadas desde a infância. Contudo, para aplicar a técnica da seta


descendente na identificação da crença nuclear, é necessário perguntar
ao paciente o que esse pensamento diz sobre ele, e não somente o que
significa (GREENBERGER; PADESKY, 2016; KNAPP, 2009).

A partir da descrição da intervenção anterior, já podemos identificar


que Vicente possui uma crença nuclear de desvalor, descrita como
“sou um fracasso”. Esta está diretamente associada a suas regas e seus
pressupostos, além dos pensamentos automáticos disfuncionais que
aparecem em situações desafiadoras.

Após a identificação das crenças subjacentes e nucleares, a técnica das


vantagens e desvantagens pode ser utilizada com o objetivo de auxiliar
o paciente a avaliar e reconsiderar as crenças que mantêm o sofrimento
emocional. O propósito nessa intervenção é minimizar as vantagens e
potencializar as desvantagens, a ponto de que o paciente identifique que
a insistência nessa crença poderá lhe causar ainda mais sofrimento (BECK,
2013; WENZEL, 2018). A seguir trazemos a aplicação no caso de Vicente:

Terapeuta: Agora que identificamos uma regra importante, ou seja, “se


eu não estou trabalhando, então sou um fracasso na minha profissão”,
quais as vantagens de acreditar nessa ideia?

Vicente: Acho que isso me ajuda a não ficar parado, sabe? Pensando
assim, eu nunca vou desistir de trabalhar.

Terapeuta: Seria interessante verificar se você realmente precisa de


uma crença tão extrema para não desistir de trabalhar, mas podemos
conversar sobre isso mais tarde. Você consegue pensar em alguma
outra vantagem?

Vicente: No momento não.

Terapeuta: E quais são as desvantagens de acreditar que, se você não


estiver empregado, então é um fracasso na profissão?
39

Vicente: Acho que isso faz eu me sentir muito triste e ansioso,


especialmente nesse momento em que não estou trabalhando.
Inclusive, fico com vergonha de conversar com colegas. Também acabo
ficando bastante desesperançoso em relação a um emprego futuro.

Terapeuta: E isso ajuda você a encontrar um novo emprego ou tentar


outras oportunidades?

Vicente: Com certeza não, porque parece que tenho ainda mais medo
de tentar qualquer processo seletivo.

Terapeuta: Então, se por um lado essa crença ajuda você a não desistir
de trabalhar, por outro faz você se sentir triste, ansioso e desmotivado
com a ideia de tentar novas oportunidades, afastando inclusive você de
colegas e de novos processos seletivos?

Vicente: Isso mesmo.

Terapeuta: Então, será que poderíamos mudar essa ideia?

A partir daí, o terapeuta poderá utilizar estratégias para modificar e


formular uma nova crença mais adaptativa. Para isso, é importante que
o profissional se pergunte qual crença seria funcional e realista para
o paciente (BECK, 2013). No caso de Vicente, pode propor a alteração
de “se eu não estou trabalhando, então sou um fracasso na minha
profissão” para “se eu não estou trabalhando, não significa que sou um
fracasso, apenas que ainda não consegui minha nova oportunidade de
emprego”.

2. Técnicas comportamentais

A prática clínica da TCC envolve inevitavelmente técnicas


comportamentais, porque, além de aprimorar o repertório
comportamental do cliente, também possuem a capacidade de modificar
40

crenças que mantêm problemas específicos. Modificando as crenças


disfuncionais para ideias mais adaptativas, as expectativas futuras e
a disponibilidade para se engajar em estratégias comportamentais
igualmente aumentam, demonstrando assim os impactos mútuos
dessas diferentes técnicas (LEAHY, 2018).

Uma das técnicas extensamente utilizadas na prática clínica é a ativação


comportamental, especialmente para pacientes que apresentam humor
deprimido, padrões evitativos de comportamento e distanciamento da
resolução de problemas. Especialmente para sintomas depressivos,
essa técnica é uma estratégia central no tratamento, visto que o
enfrentamento evitativo é um dos maiores problemas nesses casos.
Paciente deprimidos são governados por reforço negativo, ou seja, são
gratificados apenas por comportamentos de fuga e esquiva, enquanto
carecem de comportamentos intrinsicamente gratificantes, o que leva
assim a um agravamento do quadro depressivo e o sujeito se torna cada
vez mais letárgico e com humor deprimido (DOBSON; DOBSON, 2009;
WENZEL, 2018).

Assim, a ativação comportamental é uma técnica prioritariamente


contextual que estimula o paciente a se tornar ativo apesar de sua
motivação ou de como esteja se sentindo no momento. Inicialmente, é
indicado seguir o modelo TRAP (Trigger – gatilho ou ativador; Response –
resposta; e Avoidance Pattern – padrão de evitação), ou seja, o paciente
identifica os gatilhos para a evitação e suas consequências. Em seguida,
sugere-se o modelo TRAC (Trigger – gatilho ou ativador; Response –
resposta; e Alternative Coping – enfrentamento alternativo) (DOBSON;
DOBSON, 2009).

No caso de Vicente, o paciente indica que tem realizado poucas


atividades e que, após a recusa em um dos processos seletivos, não tem
conseguido buscar novas vagas. O terapeuta poderá utilizar a técnica de
ativação comportamental e discutir os modelos TRAP e TRAC em sessão,
como identificado a seguir.
41

Figura 1 – Modelo TRAP aplicado à demanda de Vicente

Fonte: adaptada de Dobson e Dobson (2009).

Após identificar os gatilhos, as respostas e os padrões de evitação em


sessão, o terapeuta poderá discutir com Vicente sobre as alternativas
para a manutenção dessa condição. Vale ressaltar que, após essa
identificação, o objetivo é que o paciente se engaje na atividade, apesar
de sentimentos negativos ou desmotivação. Os comportamentos
alternativos bloqueiam padrões de evitação, rompendo o agravamento
do quadro depressivo (DOBSON; DOBSON, 2009). A seguir trazemos o
modelo TRAC.

Figura 2 – Modelo TRAC aplicado à demanda de Vicente

Fonte: adaptada de Dobson e Dobson (2009).

Por fim, vale ressaltar que a TCC apresenta um número vasto de


técnicas que vão muito além das debatidas nessa sessão, cabendo ao
terapeuta sua atualização e a escolha das intervenções mais adaptadas
às diferentes demandas do paciente. Vale lembrar que a técnica mais
valiosa e significativa será aquela que ajude o paciente a se sentir
cuidado e ouvido (LEAHY, 2018).
42

Referências
BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. 2. ed. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2013. 348p.
DOBSON, D.; DOBSON, K. S. A terapia cognitivo-comportamental baseada em
evidências. Porto Alegre: Artmed, 2009.
GREENBERGER, D.; PADESKY, C. A. A mente vencendo o humor: mude como você
se sente, mudando o modo como você pensa. Porto Alegre: Artmed, 2016.
KNAPP, P. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto
Alegre: Artmed, 2009.
LEAHY, R. L. Técnicas de Terapia Cognitiva: Manual do Terapeuta. Porto Alegre:
Artmed, 2018.
WENZEL, A. Inovações em terapia cognitivo-comportamental: intervenções
estratégicas para uma prática criativa. Porto Alegre: Artes Médicas, 2018.
43

Encerramento do processo
terapêutico e prevenção da recaída
Autoria: Gessyka Wanglon Veleda
Leitura crítica: Rogério Adriano Bosso

Objetivos
• Apresentar os objetivos e a estruturação da etapa
de encerramento do processo terapêutico cognitivo-
comportamental.

• Apresentar os objetivos e as etapas do modelo


de prevenção de recaída na Terapia Cognitivo-
Comportamental.

• Oferecer ferramentas para a aplicação do modelo de


prevenção de recaída no encerramento do processo
terapêutico cognitivo-comportamental.
44

1. Encerramento do processo terapêutico

Toda terapia chega a um fim, e, mesmo nessa etapa, alguns tópicos são
imprescindíveis para aumentar as chances de efetividade e manutenção
dos ganhos terapêuticos (DOBSON; DOBSON, 2009). Ao longo dos
últimos três Temas, foram abordadas diferentes etapas e estratégias
de intervenção para o acompanhamento cognitivo-comportamental.
Assim, antes de iniciar as discussões sobre a última fase do tratamento,
vale lembrar os principais tópicos abordados nas fases anteriores,
juntamente com as últimas intervenções a serem aplicadas, como
apresentado na figura a seguir.

Figura 1 – Fases da terapia e suas principais intervenções

Fonte: elaborada pela autora.

Salienta-se que algumas intervenções podem estar presentes em


diferentes etapas da terapia, a exemplo de algumas técnicas, como a
psicoeducação, devendo o terapeuta estar atento às especificidades
de cada fase (BECK, 2013). E como o terapeuta poderá identificar que
o processo terapêutico deve ser finalizado?

O propósito da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é facilitar


o alívio e a remissão dos sintomas do paciente, bem como ensiná-
lo novas habilidade que poderão ser usados na sua vida, sem
45

necessidade de tratamento contínuo. Em resumo, um dos objetivos


da TCC é preparar os pacientes para que sejam seus próprios
terapeutas. Assim, a terapia bem-sucedida vai além dos progressos
identificados na fase aguda e inclui o uso contínuo de intervenções
autodirecionadas que proponham uma melhor qualidade de vida
(BECK, 2013; DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT, 2012).

É importante lembrar que, por outro lado, a intenção da terapia


não é resolver todos os problemas do paciente. O terapeuta que
assume a responsabilidade de lidar com todas essas demandas
está favorecendo a dependência do paciente ao longo do tempo
e dificultando que ele teste e fortaleça suas habilidades (BECK,
2013). A verdade é que os problemas continuarão a aparecer na
vida do paciente e mesmo pensamentos automáticos disfuncionais
ainda poderão ser identificados; entretanto, após o treinamento
significativo de identificação, exame e alteração desses conteúdos,
essas habilidades passam a ocorrer “automaticamente” (BECK, 2013;
GREENBERGER; PADESKY, 2016).

Os terapeutas cognitivo-comportamentais costumam concordar que a


decisão de finalizar o tratamento deve ser tomada quando o paciente
atingir os objetivos da lista de problemas construída no início da terapia,
juntamente com a verificação do seu progresso em diversas situações de
vida e por tempo suficiente. A partir dessa descrição, o terapeuta pode
ficar com a impressão de que a finalização da terapia é um processo
fácil, com poucos desafios. Porém, na realidade clínica, os pacientes
costumam apresentar demandas complexas e crônicas associadas a
problemas e sintomas residuais que, mesmo após intervenção, podem
ser melhorados, mas não eliminados. Ainda, após a dupla terapêutica ter
estabelecido uma boa aliança e uma boa relação colaborativa, pode ser
difícil encerrar o tratamento, tornando-se mais um desafio dessa etapa
(KNAPP, 2009; DOBSON; DOBSON, 2009).
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Para auxiliar na decisão de finalizar o tratamento, alguns pontos


podem ser levados em consideração pelo terapeuta. De modo geral,
o profissional deve ter a condição técnica de avaliar o momento em
que os sintomas de um determinado diagnóstico psicológico foram
reduzidos ou eliminados e os objetivos atingidos, visto que esse é
o momento ideal para finalizar a terapia. Destaca-se aqui a ideia de
diminuição dos sintomas, e não somente sua eliminação. Muitos
transtornos psicológicos, como a esquizofrenia, apresentam mais
períodos de remissão parcial do que total da sua condição e isso
deverá ser avaliado pelo terapeuta no momento do encerramento
(DOBSON; DOBSON, 2009).

Em contrapartida, muitos pacientes buscam ajuda devido a uma crise


pessoal ou a uma transição de vida ou mesmo para solucionar um
problema difícil, e não devido a um transtorno psicológico. Um sujeito
que busca ajuda devido à morte de um ente querido, por exemplo,
poderá não apresentar sintomas graves, mas necessitar de auxílio
para lidar com as mudanças nesse momento. No encerramento, um
dos critérios que pode ser utilizado é identificar se houve a resolução
da crise ou do problema que levou o paciente para a terapia. Em
muitas situações, é possível que, a partir de intervenções mais breves,
o problema possa ser abordado e resolvido, indicando assim a
finalização do tratamento (DOBSON; DOBSON, 2009).

Também é possível levar em conta as mudanças nos fatores


causativos, como as crenças, os esquemas e as situações
precipitantes. É difícil identificar a quantidade de mudanças
necessária nesses pontos, porém verificar se algumas habilidades
cognitivo-comportamentais foram desenvolvidas e estão sendo
utilizadas no presente pode dar um direcionamento sobre o
encerramento do processo. A seguir, encontram-se algumas
habilidades a serem verificadas para auxiliar na decisão sobre
o encerramento do tratamento (DOBSON; DOBSON, 2009;
GREENBERGER; PADESKY, 2016):
47

Quadro 1 – Habilidades centrais que devem ser identificadas ao


final do tratamento psicoterapêutico
Próximo ao término do processo terapêutico, o paciente:
Nota as interações entre pensamentos, estados de humor, comportamentos, reações
físicas e ambiente?
Avalia a intensidade dos estados de humor?
Considera as vantagens e as desvantagens da mudança?
Identifica pensamentos automáticos e imagens?
Completa um Registro de Pensamentos?
Gera pensamentos alternativos ou compensatórios com base nas evidências coletadas?
Reúne mais evidências para fortalecer novos pensamentos?
Quando as evidências em um Registro de Pensamentos apoiam um pensamento
disfuncional, cria um plano de ação para resolver o problema?
Usa planos de ação para fazer uma mudança em sua vida ou para atingir um objetivo?
Identifica pressupostos subjacentes do tipo “Se... então...”?
Testa um pressuposto subjacente com experimentos comportamentais?
Desenvolve pressupostos alternativos que combinam com sua experiência de vida?
Identifica crenças nucleares?
Identifica novas crenças nucleares?
Anota evidências que apoiam e fortalecem novas crenças nucleares?
Avalia a confiança em novas crenças nucleares?

Fonte: adaptado de Greenberger e Padesky (2016, p. 273-274).

Não é necessário que todas essas habilidades estejam totalmente


construídas, e diferentes pacientes podem desempenhar essa
habilidade em graus variados. Contudo, esses pontos podem indicar
como o paciente se encontra em relação aos seus aspectos cognitivos
e comportamentais, ajudando na decisão de encerramento. Após
identificar que a terapia chegou a sua fase final, o terapeuta deverá
voltar suas intervenções para esse objetivo (BECK, 2013; GREENBERGER;
PADESKY, 2016).
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1.1 Preparação para o encerramento da terapia

A preparação para o encerramento da terapia começa na primeira


sessão, quando o terapeuta propõe a familiarização do paciente com o
modelo da TCC. Nessa etapa, o profissional comenta que o tratamento
será estruturado para durar o menor tempo possível, fazendo com que
o paciente se torne o seu próprio terapeuta (BECK, 2013).

Ao longo do tratamento, algumas intervenções são igualmente


imprescindíveis, a fim de preparar o paciente para a etapa final.
Atribuir o progresso ao paciente diante de suas melhoras no humor é
essencial para fortalecer sua autoeficácia na resolução de problemas.
Alguns pacientes tendem a atribuir toda a sua melhora a mudanças nas
circunstâncias, como o início do uso de psicotrópicos; nesses casos, o
terapeuta deverá ficar atento para que, ao longo do processo, possa
auxiliar em uma atribuição mais adequada, que leve em consideração
as mudanças dos conteúdos cognitivos. Em situações em que o paciente
insiste que não merece o mérito, vale investigar e trabalhar as crenças
associadas a essa inclinação (BECK, 2013).

Já próximo ao término, o terapeuta deve discutir o espaçamento


na frequência de sessões, visto que esse processo não ocorre
abruptamente. Incialmente, as sessões que costumam ser semanais
passam a ser quinzenais, mensais e logo são oferecidas algumas sessões
de reforço que podem acontecer 3, 6 e 12 meses após a finalização.
Ao discutir essa combinação, alguns pacientes podem ficar ansiosos
com a redução e com a futura finalização. Nesses casos, o terapeuta
poderá utilizar a técnica de vantagens e desvantagens, potencializando
os benefícios e reestruturando os prejuízos da decisão. Vale destacar
que a redução das sessões se inicia como um experimento, devendo a
cada nova sessão a combinação ser revisitada (BECK, 2013; DOBSON;
DOBSON, 2009; KNAPP, 2009).
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Próximo às sessões mensais, é indicado que o terapeuta incentive o


paciente a ler e organizar suas anotações mais significativas do processo
terapêutico, a fim de auxiliá-lo durante e após a redução e a finalização
do tratamento. Ainda, o terapeuta deverá preparar o paciente para
possíveis retrocessos após o encerramento. Aqui é importante esclarecer
que o progresso ocorre com períodos de melhora que são interrompidos
por flutuações e retrocessos, além do surgimento de novos problemas.
Apesar disso, essas mudanças não significam que o tratamento falhou
ou mesmo que é necessário retomar o processo integralmente, visto que
agora o paciente está mais equipado para lidar com essas demandas,
especialmente após a prevenção da recaída, que será discutida na Seção 2
(BECK, 2013; DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT, 2012).

Já as sessões de reforço acontecem com tempo maior de espaçamento.


Um de seus propósitos é conferir o bem-estar do paciente, tornando-
se também uma oportunidade de discutir as estratégias utilizadas
diante de novos problemas e avaliar se existiriam outras ferramentas
mais funcionais. Em caso positivo, a dupla poderá construir um plano
para lidar com essas situações ao longo dos próximos meses. De modo
geral, a própria programação de sessões de reforço tende a suavizar a
ansiedade do paciente em relação à manutenção de seu progresso a
longo prazo (BECK, 2013).

Por fim, existem outros cenários de encerramento da terapia que não


permitem preparação, como no caso dos pacientes que evadem sem
dar explicações. Nessas situações, cabe ao terapeuta tentar contactar o
sujeito pelos contatos disponíveis. Caso a desistência seja por conta de
uma percepção ineficaz da terapia, vale questioná-lo sobre o que o ajudou
a construir essa percepção. De qualquer forma, esses acontecimentos
devem ser avaliados para que a atuação do terapeuta possa ser ainda mais
potencializada a partir dessas experiências. A supervisão de caso poderá
ajudar o terapeuta a avaliar esse cenário e identificar se outras estratégias
poderiam ter sido utilizadas (DOBSON; DOBSON, 2009).
50

2. Prevenção da recaída
Compreende-se por recaída a recorrência de sintomas ou
comportamentos disfuncionais que aparecem logo após a remissão,
fazendo com que os critérios diagnósticos sejam novamente
encontrados. Especialmente em casos mais graves e crônicos, as
chances de recaída tendem a ser mais altas, o que preocupa os
terapeutas cognitivo-comportamentais. A fim de lidar com esse
desafio, a TCC inclui como parte integrante do tratamento o processo
de prevenção da recaída, que busca identificar o aparecimento
dos sintomas, revisar as estratégias relevantes da TCC e, por fim,
implementar um plano para o seu acompanhamento de maneira
contínua (DOBSON; DOBSON, 2009; WRIGHT, 2012).

Para iniciar a prevenção da recaída, é importante que terapeuta e


paciente identifiquem situações de alto risco, ou seja, as circunstâncias
que auxiliam o aparecimento dos sintomas. Como a grande maioria
dos pacientes com transtornos psiquiátricos já vivenciou mais de um
episódio da condição antes mesmo de chegar à terapia, poderá trazer
informações importantes sobre os estressores aos quais apresenta mais
vulnerabilidade (GREENBERGER; PADESKY, 2016; WRIGHT, 2012).

Logo após a identificação dos aspectos situacionais, é importante que


o paciente e a rede de apoio (como familiares, companheiros e amigos)
estejam alertas aos primeiros sinais que precedem os sintomas. Esses
sinais podem ser tanto alterações nos comportamentos quanto em
pensamentos, estados de humor e alterações físicas. A experiência
passada pode ajudar a identificar essas mudanças previamente. Indica-
se ainda que o paciente tenha uma planilha de resumo de sintomas
personalizada que permita a identificação dessas condições precoces.
Pacientes com transtorno depressivo maior, por exemplo, podem incluir
na sua planilha a perda de prazer nas atividades, a falta de motivação e
o aumento de apetite, caso estes sejam sintomas presentes em outros
episódios (GREENBERGER; PADESKY, 2016; WRIGHT, 2012).
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Após identificar as possíveis situações de gatilho e os sintomas


precoces, é importante construir um plano de enfrentamento.
Nesse momento, o objetivo é levantar diferentes possibilidades que
poderão ser desempenhadas pelo paciente fora do contexto da
terapia. Essas estratégias poderão ser técnicas e habilidades cognitivo-
comportamentais já desenvolvidas pelo paciente ao longo do processo
terapêutico ou mesmo outras ações que evitem o retorno completo dos
sintomas (WRIGHT, 2012).

Para ilustrar a prevenção de recaída, a figura a seguir descreve os três


momentos da intervenção a partir do caso de Janice, que se encontra
na fase final do tratamento. A paciente tem 47 anos e, após seis meses
de acompanhamento, encontra-se em remissão parcial dos sintomas
depressivos, juntamente com uma melhora global em vários aspectos de
sua vida. Em sessão, ela discute com seu terapeuta sobre a prevenção
de recaída, chegando ao seguinte planejamento:

Figura 2 – Prevenção de recaída aplicada ao caso de Janice

Fonte: elaborada pela autora.


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Para fortalecer o plano de enfrentamento, nas últimas sessões é


indicado utilizar técnicas como a dramatização para promover um
ensaio cognitivo-comportamental das estratégias elencadas. Outra
ferramenta importante é a técnica do cenário, isto é, “no pior caso...”,
para que o paciente encontre possibilidades de enfrentamento
mesmo em situações de sofrimento intenso. Vale destacar que uma
das estratégias poderá ser a retomada das sessões ou a procura do
terapeuta novamente (WRIGHT, 2012).

Outro aspecto que deve ser levado em conta, especialmente em casos


de psicopatologias mais graves, é a manutenção da farmacoterapia
após o encerramento das sessões. Esta está diretamente relacionada
a bons resultados a longo prazo, sendo indicado que o terapeuta
trabalhe a adesão do paciente ao longo da terapia e a inclua
como um dos cuidados que deverão ser mantidos. Vale lembrar
que a prescrição de medicamentos é uma conduta restrita aos
profissionais médicos, sendo necessário que o paciente mantenha
os atendimentos com esses especialistas. Mudanças no estilo de
vida, como a prática de exercícios físicos e a regularização de sono
e alimentação, também devem ser reforçadas pelo terapeuta como
pontos fundamentais para a manutenção dos ganhos terapêuticos a
longo prazo (WRIGHT, 2012).

O encerramento do processo terapêutico pode ser um momento


de muitos receios para o paciente e o terapeuta; contudo, as
pesquisas em TCC apontam uma vantagem: pacientes que passam
pelo processo terapêutico e continuam fazendo uso competente
de suas estratégias apresentam menores taxas de recaída. Diante
disso, é importante que os terapeutas empreguem a preparação
para o encerramento e a prevenção de recaída ao longo da
terapia, aumentando assim as chances de manutenção dos ganhos
terapêuticos a longo prazo (BECK, 2013; DOBSON; DOBSON, 2009;
WRIGHT, 2012).
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Referências
BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. 2. ed. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2013. 348p.
DOBSON, D.; DOBSON, K. S. A terapia cognitivo-comportamental baseada em
evidências. Porto Alegre: Artmed, 2009.
GREENBERGER, D.; PADESKY, C. A. A mente vencendo o humor: mude como você
se sente, mudando o modo como você pensa. Porto Alegre: Artmed, 2016.
KNAPP, P. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto
Alegre: Artmed, 2009.
WENZEL, A. Inovações em terapia cognitivo-comportamental: intervenções
estratégicas para uma prática criativa. Porto Alegre: Artes Médicas, 2018.
WRIGHT, J. H. et al. Terapia cognitivo-comportamental de alto rendimento para
sessões breves: guia ilustrado. Porto Alegre: Artmed, 2012.
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