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Introdução à Psicologia Cognitiva

Precursores da Psicologia Cognitiva

O termo “psicologia cognitiva” só surgiu em 1967; porém, muitos anos antes disso, já haviam
sido realizados experimentos que poderiam ser classificados como cognitivos.

O experimento sobre tempo de reação conduzido pelo fisiologista Franciscus Donders em


1868 foi um dos primeiros ligados ao estudo de processos cognitivos.

O experimento contava com duas etapas e usava duas medidas de tempo de reação: a)
medição do tempo de reação simples através do pedido para que os participantes
pressionassem um botão o mais rápido possível quando vissem uma luz acender; b)
medição do tempo de reação de escolha utilizando duas luzes e pedindo que os
participantes pressionassem o botão esquerdo quando vissem a luz esquerda acender e o
botão direito quando vissem uma luz direita acender. A partir da diferença encontrada
entre os dois tempos medidos, o fisiologista esperava descobrir a quantidade de tempo
necessária para que uma pessoa tome uma decisão.
Donders não conseguiria observar o
processo cognitivo de tomada
decisória objetivamente; por isso,
utilizou o tempo entre a apresentação
do estímulo e as respostas
comportamentais dos participantes
para inferir aspectos acerca de tal
processo (nesse caso, o tempo que
demorava para ocorrer). Nessa
perspectiva, o experimento descrito
ilustra um princípio importante para a
Ilustração esquemática do experimento de Donders (Goldstein, 2022)
pesquisa em Psicologia Cognitiva:
respostas e processos cognitivos não
Em 1879, Wundt funda o primeiro laboratório de podem ser medidos/observados
Psicologia Experimental e, a partir de seus diretamente, mas devem ser inferidas
experimentos, buscou estudar a consciência a partir do comportamento.
humana, enfatizando as experiências sensoriais.
Basicamente, Wundt acreditava que nossa experiência seria determinada pela junção de
componentes elementares. Dessa forma, objetivava-se que, diante da apresentação de
estímulos, os participantes descrevessem suas experiências conscientes em termos de seus
componentes mentais básicos. Para isso, utilizava-se a introspecção. Apesar de ter sido
extinta, a abordagem de Wundt contribuiu com a Psicologia ao impulsionar o estudo de
processos mentais em condições controladas.

O Associacionismo foi outra abordagem que pode ser apontada como precursora da Psicologia
Cognitiva. O foco do Associacionismo era a investigação de como os eventos e as ideias
poderiam se associar na mente para que a aprendizagem ocorresse. Tais associações, por sua
vez, seriam resultantes de relações de contiguidade, similaridade ou contraste existentes entre
as informações ligadas a tais eventos e ideias.
O Funcionalismo também foi outra abordagem que contribuiu com o estudo de processos
mentais no início do século XX. Discordando da abordagem de Wundt, os funcionalistas
enfocavam o estudo dos processos ligados à "como e porque a mente funciona da forma
funciona" a partir de uma ótica adaptacionista, em vez de investigarem possíveis estruturas da
experiência e/ou da mente humanas.

A Psicologia da Gestalt também está entre as precursoras da Psicologia Cognitiva e teve como
principais temas de estudo a percepção e a aprendizagem. O principal pressuposto dessa
abordagem afirma que os fenômenos psicológicos são mais bem compreendidos quando
estudados como todos organizados e estruturados. Dessa forma, não se poderia compreender
totalmente o comportamento quando se desmembram os fenômenos em partes menores. Ao
mesmo tempo, os gestaltistas também dedicaram seus estudos ao processo de insight, definido
como o evento mental não observável por meio do qual alguém passa da incompreensão ao
entendimento necessário para a resolução de um problema em um simples instante de tempo.

Apesar de estar em alta no final do século XIX e início do século XX, o estudo da mente na
Psicologia sofreu com a perda de interesse provocada pelo surgimento do Behaviorismo
Metodológico de Watson e do posterior Behaviorismo Radical de Skinner. Ambas as abordagens
defendiam o comportamento como objeto de estudo da Psicologia, a qual deveria abandonar o
estudo da mente e passar a utilizar métodos e dados mais objetivos a fim de se firmar como
disciplina científica.

A ótica behaviorista imperou na Psicologia de 1940 a 1960; porém, gradualmente,


o interesse por processos mentais voltou a ser fortalecido. A partir da década de
1950, teve início a chamada Revolução Cognitiva, uma mudança do paradigma
dominante na Psicologia - e que também repercutiu dentro de outras áreas da
ciência - que culminou na valorização de uma abordagem focada nos processos
inobserváveis referentes à mente humana.

Um dos fatores que impulsionou a Revolução Cognitiva foi o avanço tecnológico iniciado na
mesma época, dentro do qual se destaca a invenção do computador. O processamento da
informação por etapas realizado por tal dispositivo levou os psicólogos à criação da Teoria de
Processamento da Informação, cujos pressupostos se baseiam na ideia de que a mente
humana também processa a informação a partir de sequências de operações.

Fluxogramas mostrando a) o
modelo de processamento da
informação do computador e b) o
modelo de processamento da
informação pela mente segundo
Broadbent.

A partir disso, multiplicaram-se o número de estudiosos interessadas no novo paradigma, assim


como os modelos criados para explicar diferentes processos mentais. Além disso, foram
realizadas as primeiras conferências tratando sobre temas atinentes ao modelo cognitivo no
ano de 1956.
Em 1967, o psicólogo Ulrich Neisser publicou o primeiro livro de Psicologia Cognitiva (onde o
termo em si - "Psicologia Cognitiva" - foi cunhado). Nele, Neisser enfatizava o paradigma
cognitivista como proposta adequada para o estudo da mente humana.

O livro de Neisser fornece indicadores Nas décadas que se seguiram à publicação


dos principais temas que estavam sendo do livro de Neisser, estudos sobre o
estudados na Psicologia sob o paradigma funcionamento do cérebro foram
cognitivista na época: a assimilação e intensificados a partir de contribuições da
retenção de informações por curtos Eletrofisiologia e da Neuropsicologia, assim
períodos. Ao mesmo tempo, as lacunas como a partir da introdução de técnicas de
acerca dos processos psicológicos imageamento cerebral. Nos dias atuais, há
superiores (atenção, consciência, um grande corpo de conhecimento voltado
memória, etc) e da fisiologia destes na para a relação entre a fisiologia do Sistema
mesma época constituem os principais Nervoso e os processos cognitivos que
temas estudados pela Psicologia realizamos.
Cognitiva atualmente.

Definição e Pesquisa em Psicologia Cognitiva

Neisser definiu a Psicologia Cognitiva como o estudo de como as pessoas aprendem,


organizam, armazenam e utilizam o conhecimento; ou seja, como as pessoas processam
mentalmente a informação.
O objeto de estudo da Psicologia Cognitiva pode, portanto, ser apontado como todo e
qualquer fenômeno cognitivo.

A pesquisa em Psicologia Cognitiva visa a descrição, a formulação de hipóteses e o


desenvolvimento de teorias acerca de tais fenômenos.
Utiliza diferentes métodos para investigar os fenômenos cognitivos.
Experimentos controlados: visa obter amostras do desempenho dos participantes em
tempo e local determinados.
Pesquisa psicobiológica: estuda os cérebros humanos e animais, usando estudos
post-mortem e várias medidas psicobiológicas ou técnicas de imagem.
Autoavaliação: visa a obtenção de relatórios dos participantes sobre a própria
cognição em andamento ou a partir de lembranças.
Estudos de caso: envolve o estudo intensivo de um indivíduo ou de um pequeno grupo,
a partir do qual se tira conclusões sobre comportamento.
Observações naturalísticas: envolve a observação de situações da vida real, com
ênfase nas distinções ambientais e não nas diferenças individuais.
Simulações utilizando computadores ou IA: as simulações envolvem tentar fazer o
computador imitar o desempenho cognitivo humano em uma ou mais tarefas; enquanto
a utilização de IA serve para tentar fazer a máquina demonstrar o desempenho
cognitivo inteligente, independente de o processo ser semelhante ao processo
cognitivo humano ou não.

VOCÊ SABE QUAL A DIFERENÇA ENTRE...

Cognitivismo Ciência Cognitiva Psicologia Cognitiva


Movimento surgido a partir do Área interdisciplinar criada Estudo de como as
final da década de 1950 que objetivando o estudo da pessoas se utilizam de
buscou reafirmar a prioridade cognição de diferentes processos
da cognição como ponto de pontos de vista, seja mentais/cognitivos para
partida da investigação abstrato, humano ou lidar com a informação. É
psicológica. Abriu espaço para mecânico. É consequência do uma das "subáreas" da
a influência de modelos de movimento cognitivista. ciência cognitiva.
mente e métodos de pesquisa
inspirados na computação e na
neurociência. Surgiu a partir
de disciplinas como
Engenharia, Matemática e
Linguística.

Alguns Conceitos Importantes

Mente: conjunto de faculdades (experiências perceptivas, memórias, pensamentos,


sentimentos) resultante de processos biológicos que ocorrem no encéfalo.

Consciência: experiência subjetiva momentânea de uma pessoa acerca do mundo.

Cognição: atividade mental que inclui o raciocínio e os entendimentos que resultam dele.

Referências

Gazzaniga, M., Heatherton, T., & Halpern, D. (2018). Ciência Psicológica. (5ª ed.). Artmed.
Goldstein, E. B. (2022). Psicologia Cognitiva: Conectando a mente, pesquisas e experiências
cotidianas. (5ª ed.). Cengage Learning.
Neufeld, C. B., Brust, P. G., & Stein, L. M. (2011). Bases Epistemológicas da Psicologia Cognitiva
Experimental. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 27 (1), 103-112. https://doi.org/10.1590/S0102-
37722011000100013
Sternberg, R. J. (2010). Psicologia Cognitiva. (5ª ed.). Cengage Learning.

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